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Ópera
Cómica
“Guerras de Alecrim e Manjerona” Obra maior de O Judeu chega à sala Garrett
“ALygiaConfissão de Leontina ” Fagundes Telles em palco “Anfitrião ” Encanto para todas as idades “Vermelho Transparente ” Produção do Nacional estreia fora de Lisboa
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António Ramos Rosa comemora aniversário no Teatro Nacional
Terá lugar, no dia 17 de Outubro, pelas 18h30, no Salão Nobre do Teatro Nacional, uma sessão comemorativa do aniversário do poeta António Ramos Rosa. O evento é organizado pela revista “Textos e Pretextos”, do Centro de Estudos Comparatistas da Faculdade de Letras da Universidade de Lisboa, em parceria com o Teatro Nacional D. Maria II, a propósito do lançamento do nº9 da publicação inteiramente dedicada ao poeta. Com a presença do autor, a sessão será constituída pelo espectáculo “Rosa de Papel” (interpretação e concepção coreográfica de Catarina Câmara e Luiz Antunes), uma mesa redonda com vários escritores e a interpretação de dois poemas de Ramos Rosa por Amélia Muge.
Editorial Dos Clássicos e da Lusofonia
Quatro das ideias centrais do que nos propusemos realizar no Teatro Nacional estão aqui presentes de uma forma e com uma visibilidade que, pensamos, poucas dúvidas provocarão . Em primeiro lugar, reavivar a memória fundadora de um repertório do teatro português que é, efectivamente, referência não só a nível nacional. Falamos aqui naturalmente do ciclo António José da Silva e, especificamente, de uma obra que é uma mais valia para um projecto de internacionalização do teatro português, as “Guerras de Alecrim e Manjerona”. Este projecto, da responsabilidade do encenador Paulo Matos, é um dos espectáculos de referência destes últimos anos e não se pode perder na tendência para o esquecimento que geralmente atravessa a sociedade portuguesa e as gentes da cultura. É assim que o Teatro Nacional assume desta vez a sua produção e se propõe fazer, na continuação do que já tinha sido tentado, uma digressão internacional com as guerras. Em segundo lugar, já há sinais de que queremos dar um lugar de excelência à dramaturgia contemporânea portuguesa, o que acontece com a estreia de um texto que, garantimos, irá ser uma surpresa, o “Vermelho Transparente” de Jorge Guimarães, que assim regressa ao Teatro Nacional. Em terceiro lugar, o sentido da circulação começa a estar presente, digamos que ainda de uma forma tímida, com a estreia da nossa produção “VermelhoTransparente” fora de Lisboa, num projecto de articulação com a Artemrede – Teatros Associados, estrutura da região de Lisboa e Vale do Tejo que associa 17 autarquias. Finalmente o reforço da ligação com o Brasil, reforço que a nível institucional ganhou uma nova dimensão com o lançamento do prémio António José da Silva e que adquire uma outra sustentabilidade com a presença cúmplice nos projectos do Teatro Nacional de figuras tão prestigiadas como são Lygia Fagundes Telles e Chico Buarque. Estamos assim certos que, desta forma , contribuiremos para a afirmação de um Teatro Nacional que seja um espaço de referência de um teatro que se quer nacional e espaço de serviço público.
Carlos Fragateiro José Manuel Castanheira
Prémio de Dramaturgia António José da Silva
O Prémio de Dramaturgia António José da Silva foi apresentado no dia 12 de Setembro no Teatro Nacional D. Maria II. O prémio anual luso-brasileiro, no valor de 15 mil euros, tem como principal objectivo incentivar a criação de novas dramaturgias de Língua Portuguesa. A candidatura para o primeiro destes prémios decorre até ao próximo dia 31 de Outubro. Este novo galardão decorre de uma parceria entre a Fundação Nacional de Arte (Funarte), do Brasil, e o Instituto das Artes, o Teatro Nacional D. Maria II e o Instituto Camões (IC). Regulamento disponível em www.teatro-dmaria.pt.
Chico Buarque e Lygia Fagundes Telles no TNDM II
Dois dos maiores vultos da música e da literatura em língua portuguesa passarão pelo Teatro Nacional durante o mês de Novembro. O músico, dramaturgo e escritor Chico Buarque virá para falar do projecto “Budapeste”, adaptação à cena do seu romance homónimo e que terá estreia absoluta em Lisboa em 2007. Lygia Fagundes Telles estará entre nós a propósito da estreia nacional de “A Confissão de Leontina”, um espectáculo inspirado no seu conto com o mesmo título. “Budapeste” foi o regresso de Chico Buarque à literatura. Um romance que explora a duplicidade do sujeito. O espelho, a máscara, o sósia, são motivos que tornam este livro uma obra inesquecível, enigmática e, uma reflexão sobre a ‘persona’ e a identidade. Para além da música, títulos como “Benjamin”, “Fazenda Modelo” ou “Estorvo” confirmam a arte daquele que é já considerado um grande escritor.
Lançamento do DVD de Jacques Lecoq Em colaboração com a École Internacionale Jacques Lecoq, de Paris, e o Outil Théâtre, o Teatro Nacional anuncia o lançamento do DVD de Jacques Lecoq “Les Deux Voyages de Jacques Lecoq” (“As duas viagens de Jacques Lecoq”), com legendagem em português. Aqui se revelam os métodos de trabalho de uma companhia fundada em 1956 e que escreveu várias páginas da História do Teatro.
www.teatro-dmaria.pt
Antena 2 em directo do Átrio
RESERVAS>
Reservas@teatro-dmaria.pt Reservas> 21 325 08 35 Informações> 21 325 08 27
Ficha Técnica DIRECÇÃO> Carlos Fragateiro
COLABORAÇÃO> José Oliveira Barata
e José Manuel Castanheira
DOCUMENTAÇÃO> André Camecelha
COORDENAÇÃO> Pedro Mendonça
GRAFISMO> Nuno Patrício
COORDENAÇÃO EDITORIAL> A. Ribeiro dos Santos
FOTOGRAFIA> Margarida Dias
REDACÇÃO> A. Ribeiro dos Santos,
PROPRIEDADE> TNDM II, SA
Margarida Gil dos Reis, Ricardo Paulouro
IMPRESSÃO> Mirandela Artes Gráficas
A Antena 2 transmite em directo, durante o mês de Outubro, a partir do Átrio do Teatro Nacional, às 19h00, uma série de concertos de sonoridades marcantes, do jazz a Lopes-Graça, passando por Ligeti, Mozart, entre outros. A entrada é gratuita. Programa: Dia 19, João Paulo Esteves da Silva Dia 20, Projecto Ars Camerae Dia 26, Quinteto de sopros À-vent-garde Dia 27, Duo Alfa Arroba
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Anfitrião
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Bonecos de papel com vida própria Um “Anfitrião” para encantar públicos de todas as idades
Como reagimos ao facto de objectos inanimados ganharem vida própria, quer sejam máscaras, fantoches ou simples imagens? No Teatro de Formas Animadas de Vila do Conde (TFA) a magia da ilusão paira sobre a construção destas figuras que abandonam a sua forma inerte e nos surpreendem com aquilo que habitualmente se designa por anima, a alma de um corpo ou material.
tana, encenador e intérprete desta peça do Judeu, onde também participam os intérpretes Victor Madureira, Andreia Gomes e o dramaturgidta José Coutinhas. “Anfitrião” surgiu desde o início como um desafio pelo facto de se tratar de um texto originalmente escrito para marionetas. “António José da Silva compreendeu que o Teatro de Bonifrates, com as suas
e abriu o seu caminho para o futuro. A complexidade do espectáculo implicou para a equipa do TFA um maior investimento quer ao nível da invenção mas também da experimentação. Para Marcelo Lafontana, aquele que é já “o nosso Anfitrião” explora “elementos bastante próximos da ilustração, do cinema de animação e da banda desenhada”. Assim se justifica o re-
A complexidade do espectáculo implicou um grande investimento quer ao nível da invenção mas também da experimentação. “O nosso Anfitrião explora elementos bastante próximos da ilustração, do cinema de animação e da banda desenhada” Talvez por isso o TFA tenha já sido aplaudido por milhares de espectadores. Disso é um bom exemplo o espectáculo “Anfitrião”, de António José da Silva, estreado no âmbito do Festival Ponti’04, com várias temporadas estáveis na Área Metropolitana do Porto passando por diversas cidades do país. “Um factor marcante para o reconhecimento e a dignificação das Formas Animadas em Portugal”, no entender de Marcelo Lafon-
especificidades técnicas, seria o meio mais apropriado para chegar ao seu público e comunicar aquilo que lhe era importante”. A “intemporalidade” desta peça, inclusive o seu teor crítico, mesmo exigindo um profundo trabalho de adaptação, motivou desde o início toda a equipa. Assim nasceu esta co-produção do TFA de Vila do Conde com o Teatro Nacional São João, que contribuiu para o reconhecimento deste tipo de teatro
curso a soluções gráficas, em desenhos e formas bidimensionais. Destaque para o trabalho do talentoso criador das figuras, Luís Silva. Para Marcelo Lafontana, “o Luís definiu brilhantemente um estilo de desenho que sintetizou muito bem os elementos de rigor histórico, assim como os pressupostos de expressividade e funcionalidade técnica, numa representação final muito lúdica, forte, viva e actual”.
Depois, chegou o momento de animar, isto é, dar vida ou, como melhor diz Lafontana, “dar alma aos bonecos”. Cada figura tem assim uma alma tão rica como orgânica, verosímil e vibrante. “Procurámos trabalhar com intenções bem definidas e a compreensão das motivações de cada acção, de forma a poder suscitar sensações reais e momentos de maior interesse para os actores e espectadores. O efeito de distanciamento, expresso sobretudo pelos criados, é mantido e reforçado.” A utilização de um “código directo” e de uma “leitura imediata” faz com que o espectador se identifique instantaneamente, “libertando no riso (um riso franco e espontâneo) as opressões da realidade quotidiana”. Sobre o espectáculo fica apenas um desejo formulado para este “Anfitrião”: “como diz Mercúrio: ‘sempre a boca fala tarde quando madruga o desejo’, que ele cumpra o seu desejo na vista do seu público tão desejado: a exaltação do prazer de ver teatro, divertindo o espectador e comunicando com ele as nossas ideias, sensações e emoções.”
RP
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< Ciclo
Entrevista a
António José da Silva
Paulo Matos
Um espectáculo inesquecível chega à Sala Garrett
Um convite ao dos sentidos
prazer
Paulo Matos, o homem que está por trás do êxito “Guerras de Alecrim e Manjerona”, estreado na Fundação Gulbenkian, vai inscrever esta ópera cómica de António José da Silva no repertório do Teatro Nacional D. Maria II. Falámos com ele sobre a razão do seu sucesso Entrevista conduzida por A. Ribeiro dos Santos
A. Ribeiro dos Santos - Tanto quanto se sabe, o Paulo Matos foi responsável pela primeira montagem integral das “Guerras” de António José da Silva? Paulo Matos - Tanto quanto sei, sim. Não posso dizer, liminarmente, que nunca foram levadas à cena na íntegra porque é uma peça frequentemente trabalhada pelas companhias, até amadoras. Mas durante a minha investigação preliminar para este espectáculo não encontrei referências a isso e o mais comum é reduzir-se o texto às suas peripécias. Coisa que era impensável para si... Acho que essas experiências cortam precisamente o que é mais interessante neste teatro e que é a própria linguagem. A peripécia que, no fundo, vem da commedia dell’arte, que se espalha pela Europa e se repete até à exaustão, é um acessório. Fundamental é a retórica, a invenção. Claro que quando confrontei a equipa – alguns dos quais eu já tinha dirigido antes e sabia que iam responder bem a este tipo de trabalho –, e lhes expliquei que íamos fazer muito texto, a primeira reacção foi de susto. Mas foi esse trabalho que se tornou fascinante: a descoberta pormenorizada da riqueza retórica do texto do António José da Silva. Se há uma verdade que este espectáculo trouxe à luz foi revelar a riqueza incomensurável desse texto, a todos os níveis: comicidade, referenciais, inteligência, jogo, relações sociais... A ideia foi originalmente sua? Nasceu de conversas com a Capela Real (a orquestra barroca). Eles falaram-me dos manuscritos do António Teixeira, que tinham acabado de ser descobertos... Aliás, têm vindo a ser descobertos aos poucos. Primeiro foi Vila Viçosa, depois o Brasil... Achei que era um projecto fantástico: juntar os manuscritos ao texto integral da peça, que eu conhecia. Voltei a reler António José da Silva, o nosso ex-libris maior do Barroco, para me voltar a confrontar com este facto: é um autor europeu, do nível dos melhores que havia na época.
Decidiu-se pelas “Guerras” e não por outro texto qualquer porque faz parte do currículo escolar ou porque é por muitos considerada a obraprima do Judeu? Nem uma nem outra razões. Foi mesmo por causa da descoberta das partituras das óperas.
Estava à espera de que este espectáculo, estreado em 2000, que fez digressão e foi reposto em 2002 no Teatro da Trindade, tivesse este impacto? A crítica e o público renderam-se-lhe unanimemente... A resposta muito honesta é: não estava à espera que corresse desta forma. Mas isso
Se há uma verdade que este espectáculo trouxe à luz foi revelar a riqueza incomensurável desse texto, a todos os níveis: comicidade, inteligência, jogo... Pôs os bonecos a contracenar com os actores porque acredita que no século XVIII o António José da Silva fazia o mesmo. Mas não há certezas... É um ‘feeling’ meu. A questão é esta: está provado, porque há muitas referências a isso, que as peças do António José da Silva se destinavam ao teatro de bonifrates. Há citações históricas, há relatos do que acontecia no Teatro do Bairro Alto... O que não consigo acreditar é que esta ópera de seis horas – que eram seis horas, como no Shakespeare, uma longa jornada onde se comia pelo meio e tudo... – fosse um universo confinado às marionetas. Tinha de haver, obrigatoriamente, uma belíssima orquestra, visível para o público, tinha de haver belíssimos actores, que diziam o texto... E esses actores não podiam estar sempre escondidos atrás dos bonecos... Como era possível? É só uma intuição, e não tenho forma de comprovar isto, mas achei que devia explorar esta possibilidade. Há um teatrinho de marionetas, que está num espaço semi-urbano, uma espécie de praça pública, e esse teatrinho vai tresvazando e deixando aparecer, por trás dele, os actores de carne e osso! A partir daí, todo o universo é possível. Mas volto a dizer que é apenas uma intuição. Não é uma descoberta científica nem histórica.
é uma constante. No teatro, nunca temos consciência completa daquilo que estamos a fazer. Investimos, somos responsáveis, trabalhadores... Procuramos. Mas a partir de certa altura deixamos de ter distanciamento. O que posso dizer é que, antes da estreia, no Acarte, onde só tivemos um mês para ensaiar dentro de um orçamento apertadérrimo, eu via, à minha volta, uma quantidade enorme de pessoas que confiavam em mim mas desconfiavam muito do resultado deste projecto. Fizemos um ensaio geral até às três e tal da manhã, mandei sentar toda a gente na plateia e disselhes: temos aqui um fresco maravilhoso. Mas do lado de lá, só via gente prostrada, cheia de olheiras... Mas a estreia foi eufórica... Foi. Eu próprio fiquei surpreendido. Um dos aspectos mais elogiados deste trabalho foi a perfeita articulação de todos os elementos: actores, músicos, marionetas... Acredita que seria assim no tempo do António José da Silva? Completamente. O António José da Silva foi não só um excelente dramaturgo como um homem muito sabedor do métier teatral. Muito sabedor, muito criador, com uma grande equipa, um conjunto de marionetistas excelentes e, acima de tudo, um grupo de músicos muito bons. O António Teixeira era um compositor da corte. Foi muito novo como bolseiro para Itália, pago pelo Rei, durante vários anos,
e voltou com a escola italiana. Há muita coisa que desapareceu dele, mas o que restou é maravilhoso. Ele compunha para a corte, mas depois vinha brincar com o povo e com o seu amigo, António José da Silva. Brincar, mas com a qualidade da corte. E de certeza que os músicos que iam ao Teatro do Bairro Alto eram músicos da orquestra do Rei, que vinham às escondidas ali tocar... nas folgas. Não é criminoso que nunca nos tenha sido oferecido o António José da Silva desta maneira? Em toda a sua plenitude? É pena. Faz parte da forma como nós encaramos a nossa cultura. Temos uma desconfiança, uma displicência, uma não-valorização do que é nosso... Está-nos no sangue, desde o D. Sebastião. Por exemplo, em todas as Histórias da Ópera aparece uma referência à ‘Ópera do Mendigo’, do John Gay, escrita na mesma altura em que o António José da Silva estava a escrever. Ora as “Guerras” é uma obra incomensuravelmente melhor do que a ‘Ópera do Mendigo’. A todos os níveis. No entanto, não há uma única História da Ópera que faça menção do António Teixeira e do António José da Silva. Não há. O que era preciso fazer? Tem de haver investimento do poder político. Não é pegar-se nas obras e fazer-se uma bela edição encadernada para os administradores oferecerem uns aos outros. É investir em material científico de qualidade e pô-lo na mão dos encenadores, dos directores musicais, dos estudiosos... Levá-lo até aos teatros. A cultura tem de ir aos locais onde pode ser canalizada para a produção. O que é que mudou nesta encenação, face a 2000? Praticamente nada. Simplesmente aproveitámos esta oportunidade para melhorar aqui e ali, na medida do possível. Algumas cenas não estavam completamente conseguidas, a luz foi sempre um aspecto do espectáculo que eu quis melhorar, fizemos uma revisão no texto... Mas, no geral, é rigorosamente o mesmo espectáculo. Melhor, imagino eu.
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Ensaio
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a biblio-
teca
de O
Judeu Texto de José Oliveira Barata*
Trabalhando actualmente no estabelecimento de uma edição crítica do teatro de António José da Silva, cada vez mais vou sedimentando a convicção de como será importante pensar na possível biblioteca do autor, no sentido borgiano do termo. No caso da obra de O Judeu parece verificar-se o paradoxo da simplicidade. Por um lado, toda a problemática da atribuição das várias óperas se tem feito com extrema facilidade, chegando até nós um corpus dramático que o estudioso aceita (quantas vezes acriticamente); por outro, o enigmático anonimato que cobriu as obras que correram mesmo ‘postmortem’, ou ainda a morte do autor nas
terreno propício para originais voos. Mas quais as fábulas que O Judeu aceitou como motes teatrais para testar a sua habilidade técnica? Não andaremos longe da verdade se reunirmos em dois grupos fundamentais as fontes escolhidas pelo nosso dramaturgo: a tradição greco-latina, vulgarizada pelos exemplos espanhóis, como no caso da “Esopaida”, dos “Encantos”, das “Variedades” ou ainda do “Precipício” e a tradição peninsular, quer no seu núcleo não teatral, quer no que lhe oferecia a herança dramática do filão vicentino ou camoniano. Assim se explica, quanto a nós, a conciliação de temas cavaleirescos, como o Palmeirim ou o Amadis de Gaula, com o Quixote cervantino, com
rente na época, quando “aceita”, “manipula” e “reescreve” os mitos tradicionais da herança clássica, oferecendo-os, sob novas vestes joco-sérias, ao público seu contemporâneo. Neste aspecto, “Anfitrião ou Júpiter e Alcmena” constituem uma oportunidade soberba para estudar tais mecanismos. Torna-se, pois, evidente como o painel mítico herdado assumia a forma de um puzzle, sempre apto a ser construído e manipulado em função do gosto de uma plateia. Mesmo quando os autores se não afastavam da trama essencial, não deixavam, no entanto, de procurar, em outras fontes, “condimentos” que fizessem aproximar o espectador da proposta cénica que oscilava entre o travesti e a paródia.
António José da Silva tipifica entre nós, de forma paradigmática, um procedimento corrente na época, quando “aceita”, “manipula” e “reescreve” os mitos tradicionais da herança clássica, oferecendo-os, sob novas vestes joco-sérias, ao público seu contemporâneo malhas de uma instituição que não descurava o domínio literário, levam-nos a pensar que, para o caso da produção de António José da Silva, são de reter as palavras de Rudler: «Nenhuma edição corrente tem autoridade, até ser devidamente verificada.» Se, por um lado, restringindo-nos à verdade dos processos inquisitoriais, nada nos pode levar a afirmar que os oficiais do Santo-Ofício teriam apreendido obras do autor, impressas ou manuscritas, ou ainda, por outro, nenhuma ilação se poder extrair analisando, em qualquer dos processos, a relação dos bens confiscados, tudo nos leva a concluir que, para fixarmos o legado dramático de O Judeu, teremos de ter presente uma situação frequente no domínio da crítica textual. Mas não apenas. A forma como António José da Silva trata os diversos mitos que suportam a acção dramática da maioria das suas óperas mostra-nos de modo eloquente como a invenção paródica e a espectacularidade encontravam
o aproveitamento dos Enfatriões de Camões. Também as “Guerras” — decerto a obra que, nas suas referências, mais evidencia uma estreita ligação ao quotidiano joanino — sendo em nosso entender, tributárias da mais próxima tradição portuguesa -, não excluímos, mesmo neste caso, que, mesmo que remotamente, não esteja “presente” o texto calderoniano de La banda y la Flor (Hacer del amor agravio). [...] Assim se glosavam, de modo inteligente e sensível, temas de carácter tradicional, introduzindo por vezes inovadores elementos irónicos, paralelamente a um maior aprofundamento ideológico. Não se propunha apenas uma reconstrução formal, uma vez que se procurava inflectir os temas reescritos para novas direcções, que estimulassem o pensamento e as emoções dos leitores ou espectadores. António José da Silva tipifica entre nós, de forma paradigmática, um procedimento cor-
Grande parte das inovações traduziamse na introdução de personagens que nada tinham a ver com o mito tradicional e que surgiam “transferidas” de mito para mito, ao sabor do gosto do dramaturgo e das expectativas do público. Não menos rara era a presença, ao lado de figuras míticas, de outras personagens “repescadas” na tradição dramática do tempo, nomeadamente nas obras dos maiores representantes do teatro ibérico, como por exemplo Calderón. O labiríntico mundo cénico de O Judeu não se nos afigura marcado por nenhum cânone teoricamente fundado. Perante a tradição legada ao “escritor de comédias”, ele terá, quando muito, intuído, numa visão pragmática do fenómeno teatral, que o segredo estava em ir ao encontro de um público, por certo não particularmente exigente. E a biblioteca lida e afectivamente assimilada era, em nossa opinião, as prestigiadas comedias dos ‘ingenios’ do Século de Ouro. [...]
A paródia aos mitos; a caricatura (tão ao gosto de uma estética do inacabado) conjugava-se, pois, perfeitamente com a nova orientação que parecia motivar as releituras tradicionais. Não sendo novo, o processo de parodiar permitia um variado jogo de associações que só ganhava com a total liberdade que se conferia à imaginação. Acreditamos que António José tinha plena consciência das apropriações que fazia, não hesitando mesmo em revelar, pela boca dos graciosos, a “antiguidade” dos temas que apresentava. Depois de Teseu narrar a Dédalo a forma como chegara a Colcos, Esfuziote exclama: (...) Tudo aquilo me contava minha avó [Labirinto, 20]. Mais adiante, o mesmo Esfuziote, perante a reticente intenção de Dédalo em se apresentar, logo se apressa a sugerir: (...) Vamos, senhor, diga alguma coisa, ainda que seja uma fábula [Ibidem, 22]. Tradição e inovação efabulada podiam harmonizar-se: “tudo o mais será uma invenção a arbítrio” em que «os acidentes da ópera serão prisões, punhais, venenos, cartas, montarias de ursos, leões e touros, tempestades, trovões, raios, sacrifícios, saltos, loucuras, etc., porque destas ‘cousas’ repentinas se comovem muito os espectadores. E se pudesse introduzir uma cena, em que seja preciso sentar-se algum dos actores, outro dormir em algum bosque, ou jardim, e ao mesmo tempo sair outro para o matar, e ele acordasse (o que nunca se tem visto nos nossos teatros), isso seria chegar ao non plus ultra da admiração.” Isto estava bem claro no Teatro à Moda do italiano Benedetto Marcelo que o editor Ameno traduziu. Servia ao dramaturgo que, com tão curto espaço de vida livre, se revelava (e nos revelou) como hábil e talentoso construtor de enredos, para “deleite de uns” e “curiosidade de outros”, como se escreveria em dedicatória do tempo.... * Professor Catedrático da Faculdade de Letras da Universidade de Coimbra. Texto na sua versão completa em
www.teatro-dmaria.pt
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Guerras de Alecrim e Manjerona
Almas
José Ramalho e Ildeberto Gama, pela preservação da arte da marioneta
Há mais de 20 anos que o Teatro de Marionetas de Lisboa se bate pela divulgação, pesquisa e renovação estética de um teatro pouco conhecido entre nós. Nas “Guerras” do Judeu, revela todo o peso da sua experiência Margarida Gil dos Reis A partir de Outubro, a Sala Garrett será invadida por pequenos actores, movidos por arames, enfatiados em roupas escolhidas a preceito para a ocasião que, logo num breve relance do olhar, parecem semelhantes às roupas de outros actores também em palco, estes de carne e osso. Falamos de marionetas, do Teatro de Marionetas de Lisboa, construídas exclusivamente para as “Guerras de Alecrim e Manjerona”, de António José da Silva, encenada por Paulo Matos. Desengane-se o espectador se pensa que assistirá a um teatro de ‘bonecos’ dedicado a um público infantil. Falamos sim do encanto de um trabalho artesanal, onde a distinção entre bonecos e marionetas deve ser bem feita. Esta é aliás a opinião, quase em uníssono, de José Ramalho, director artístico das Marionetas de Lisboa e Ildeberto Gama, presidente da direcção das Marionetas de Lisboa, desde a sua fundação, e autor destes pequenos actores com “alma de arame”. O binómio marioneta/infantilização, aquilo que José Ramalho define como um “pré-conceito e um preconceito” foi e deve continuar a ser ultrapassado. Nos últimos 25 anos, as marionetas têm conhecido um significativo desenvolvimento e visibilidade, em parte graças aos profissionais do meio e “o facto de o teatro de marionetas se cruzar com outras artes e de a marioneta ser usada como uma ferramenta artística por várias linguagens tem vindo a sedimentar públicos diversos”. E é de
instrumentos artísticos que falamos, pois, no entender de Ildeberto Gama, que convive há largos anos com estes actores tão especiais, não existe uma ligação mística entre o criador e a marioneta, ao contrário do que habitualmente se pensa. As renovações que o teatro de marionetas tem sofrido, não só em Portugal, mas também na Europa Central, mostram-nos como pela sua gramática artística tão específica este teatro é transversal e especial. “Da mesma maneira que se diz que a ópera é uma arte total, também o é o teatro de marionetas”, salienta José Ramalho. Uma convicção de quem, apesar de constatar que em Espanha ou França o movimento em torno das marionetas é muito superior, se dedica há mais de 20 anos a esta área, inclusive à sua formação. “Somos [Teatro de Marionetas de Lisboa] a companhia que vem contribuir para recolocar o que é o teatro de marionetas numa perspectiva mais alargada, de pesquisa e renovação estética. Começámos logo com António José da Silva, com o ‘Dom Quixote e Sancho Pança’, que fez opera buffa mas sempre para o teatro de bonifrates. Hoje é considerado o patrono das marionetas portuguesas”. E como se posiciona o actor face à marioneta? José Ramalho e Ildeberto Gama reconhecem que há algo de quase filosófico nesta questão, uma ténue fronteira entre o ser e o parecer. A aposta das Marionetas de Lisboa “é que o actor seja uma figura presente à vis-
ta do público. Um trabalho de interacção, de mostrar que por detrás da marioneta existe um actor e vice-versa. É quase uma dicotomia entre quem manipula e quem é manipulado”. O marionetista assume todas as suas funções como actor mas “entrega a alma à marioneta, para que ela ganhe autonomia”. Vida própria, diríamos nós, pois não se trata apenas de manipulação de um objecto mas
marionetas para esta peça de António José da Silva a partir da dramaturgia. Uma proposta, no seu entender, “algo conservadora, mas no bom sentido da palavra. O mais provável é que as marionetas usadas fossem marionetas de varão, isto é, de manipulação superior. Por serem duplos actores estão vestidas de forma a serem réplicas dos figurinos dos actores”.
A aposta da companhia “é que o actor seja uma figura presente à vista do público. Um trabalho de interacção, de mostrar que por detrás da marioneta existe um actor e vice-versa” sim um exercício artístico. E nem todos podem ser marionetistas, senão ouçam-se os requisitos enunciados por José Ramalho: “Generosidade. O marionetista tem de cultivar a generosidade pois tem de partilhar com a marioneta uma grande parte da sua vida. Tem de perder o exercício de ‘narciso’ para a marioneta. O actor de marionetas nunca pode estar desconcentrado porque a sua desconcentração implica a morte de um ser que é mais importante do que ele.” Sobre esta questão reflecte também Ildeberto Gama, que pensou em cada uma das
Para José Ramalho, “deviam existir 300 companhias de marionetas em Portugal porque assim teríamos mais público interessado e mais partilha de saberes e técnicas artísticas”. Até lá, temos de o prazer de poder assistir a este tipo de produções, onde marionetas e homens convivem, pois por detrás de uma marioneta terá de estar um bom actor. Corpos de cortiça que nos fazem seguir todos os caminhos para onde a nossa imaginação nos levar.
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Guerras de Alecrim e Manjerona
arame decortiça de em corpos
O maestro Stephen Bull fala de como reconstituiu
a partitura perdida de António Teixeira “Na ópera barroca:
o que importa é despertar
emoções
”
A música que o público vai ouvir no palco da Sala Garrett, não é toda do colaborador de António José da Silva, o compositor barroco António Teixeira. Partes da partitura – nomeadamente os papéis masculinos, e árias inteiras – foram compostas pelo próprio maestro, Stephen Bull, que tem sido muito elogiado pelo seu trabalho de reconstituição. Com alguma modéstia, o próprio diz que não foi demasiado complicado escrever a música. Isto sendo ele um especialista em violino barroco. “É uma questão de confiança”, explica. “De resto, não inventei as letras, que estão todas na peça do António José da Silva. Portanto, com alguma especulação, foi relativamente fácil recriar a música que faltava.” Facilitou o facto das árias barrocas terem isto em comum: são árias que exprimem uma atmosfera muito específica, um afecto intenso como a raiva ou o amor. Neste tipo de música, tudo é exaltado. Stephen Bull afirma, com toda a simplicidade: “A ópera barroca é como a telenovela: o que importa é despertar emoções. Nos recitativos os acontecimentos sucedem-se com grande rapidez, até criar novos momentos de tensão, onde se canta.” É por isso que é tão fácil aderir à ópera barroca. Ainda para mais no caso presente, em que as letras do Judeu têm o seu quê de “picante”. “Pessoalmente, nunca tinha trabalhado numa ópera com letras tão ousadas, letras que provam ser esta, por natureza, uma ópera da rua, uma ópera escrita e pensada para o povo.” Apesar dos elogios que tem recebido pela sua partitura, porém, o maestro diz que continua a trabalhar na música das “Guerras”. “Todos os dias lhe encontro um novo pormenor que reformula a minha opinião sobre a música, que me faz vê-la a outros olhos”, conta. “Mas esse é o aspecto orgânico da música: ela está sempre a mudar. Aliás, há sinais de alterações que a partitura de António Teixeira foi sofrendo ao longo do tempo. Isso é evidente quando comparamos a peça e as partituras. E para um músico, isso é muito estimulante.”
O que a crítica disse
“A reposição da ópera joco-séria ‘Guerras de Alecrim e Manjerona’, de António José da Silva e António Teixeira, de 1737, é um acontecimento histórico. As dúvidas que pudessem restar quanto à partitura desvaneceram-se perante esta reconstituição inspirada de um genial exemplo setecentista de teatro por música cantada em português.”
Alexandre Delgado, “Público”, 10/02/2000
“Esta ópera foi uma prova de que a música portuguesa está viva e de que os músicos e os artistas portugueses têm uma palavra a dizer. A obra é excelente e merece ser alvo de divulgação e de um tratamento cuidado, como o da presente produção; a equipa que nela investiu o seu amor, dedicação e profissionalismo (...) está de parabéns, pois conseguiu proporcionar momentos inolvidáveis de uma magia inebriante. Isto é que é espectáculo. E deste tipo, queremos ver mais.” Teresa Castanheira, “Expresso”, 19/02/2000
... O que seria um dos melhores espectáculos produzidos em Portugal nos últimos anos... Elisabete França, “Diário
de Notícias“ 03-02-2002
“É isso, repito, um acontecimento histórico. Não são assim tantos no nosso teatro e no teatro musical e no nosso teatro musical com marionetas e actores, para que não nos sintamos de facto felizes. (...) Seria lamentável que este espectáculo não viesse a ser visto e apreciado como o foi na estreia, com entusiasmo, alegria, emoção, por muito mais gente. Vá lá: façam dos espectadores de teatro portugueses gente feliz.” Carlos Porto, “JL”, 08/03/2000
“O grande segredo desta produção assenta nos seguintes factores: a alternância-fusão das marionetas com intérpretes reais (...), a adequação e eficácia dos cenários, a hilaridade dos textos, que se funde com a caracterização dos personagens, o enriquecimento dado pela parte e números musicais, o talento de actores dos intervenientes (...). Nunca três horas passaram tão depressa... E bem. Não percam!” Bernardo Mariano, “DN”, 01/03/2001
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Memória
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Teatro Nacional
Nos arquivos do Teatro Nacional, encontram-se os registos de dois espectáculos feitos a partir de peças de António José da Silva: “Os Encantos de Medeia” (na foto), em 1983, encenada por Castro Guedes; e “Guerras de Alecrim e Manjerona”, em 1986, sob a direcção de Carlos Avilez.
AntónioJosé
Biografia da Silva
António José da Silva, o Judeu, é um dos grandes nomes da História da Literatura Portuguesa e Brasileira. Nascido a 8 de Maio de 1705, no Rio de Janeiro, no seio de uma família de cristãos-novos, aí terá passado a primeira fase da sua infância. A família terá procurado na colónia sul-americana uma maior tolerância, numa altura em que os judeus eram perseguidos em Portugal e nas suas colónias. Os avós paternos, André Mendes da Silva e Maria Henriques já haviam escolhido o Rio de Janeiro, no segundo quartel do século XVII, como local de residência. António José da Silva era filho do advogado e poeta João Mendes da Silva, que conseguiu manter a fé judaica secretamente, e de Lourença Coutinho, filha de um proprietário de uma plantação de canade-açucar, que não conseguiu escapar das malhas inquisitórias. Em 20 de Fevereiro de 1712, Lourença Coutinho foi presa, acusada de ser judia, e foi deportada para Portugal, a bordo da nau “Calendária”, onde foi entregue à Santa Inquisição. João Mendes da Silva decide, nessa altura, partir para Portugal para estar próximo da esposa e leva consigo os filhos: António José (7 anos), Baltazar (doze anos) e André (dez anos). A 10 de Outubro desse ano desembarcam da
nau “Madre de Deus” e dez meses depois os pais de António José da Silva são condenados às penas de confiscação de bens, abjuração, hábito penitencial e cárcere, onde permanecem dez dias, acabando por se estabelecerem em Lisboa. Anos mais tarde, numa das suas “óperas”, António José da Silva chegará a escrever os seguintes versos: “Tirana ausência / que me roubaste e me levaste / da alma o melhor / Ai de quem sente / de um bem ausente / a ingrata dor.” Aos 21 anos já António José da Silva frequentava o curso de Direito na Universidade de Coimbra e destacava-se pela inteligência e pelas qualidades enquanto poeta. Entre os seus amigos, destacava-se o conde de Ericeira, em cuja casa se reunia regularmente um grupo de intelectuais como Francisco Xavier de Oliveira e o Padre Álvares de Aguiar. Interessado pela dramaturgia, “o Judeu” foi autor de uma sátira que serviu de imediato às autoridades como pretexto para a sua prisão. A 8 de Agosto de 1726, António José da Silva foi preso, juntamente com a mãe, e submetido a torturas que lhe fizeram perder a fala e que o deixaram parcialmente inválido. Após a abjuração, a penitência e o juramento de jamais cometer heresias, António José da
Silva foi libertado. Concluiu o curso em 1728 e regressou a Lisboa onde, com o pai, exerceu advocacia. Apesar de se ter iniciado na profissão, passou a dedicar-se à escrita. Por volta de 1734 e 1735 casou-se com sua prima Leonor Maria de Carvalho, natural da Covilhã, que já havia sofrido as perseguições do Santo Ofício. Deste casamento nasce, em 1735, a filha Lourença. O período de seis anos, entre 1733 e 1738, corresponde ao auge da criação literária de António José da Silva e à sua afirmação como dramaturgo. As suas sátiras e comédias ficaram conhecidas como a obra do “Judeu” e foram várias vezes encenadas com grande êxito. Foram-lhe atribuídas obras, publicadas em vida do autor, como: “Labirinto de Creta” (1736, editada por António Isidoro da Fonseca); “As Variedades de Proteu” (1737, idem); “Guerras do Alecrim e Mangerona” (1737, idem). Após a morte de António José da Silva, o editor Francisco Luís Ameno publicará estas e outras obras então inéditas: “Vida de D. Quixote”, “Esopaida ou Vida d’Esopo”, “Precipício de Faetonte”, “Anfitrião ou Júpiter e Alcmena” e “Os Encantos de Medeia”. António José da Silva, respeitado até pelo rei, viu-se preso de novo, a 5 de Outubro de 1737, juntamente com a
O Judeu no Salão Nobre às 18h Para complementar os espectáculos de António José da Silva apresentados no Teatro Nacional, dia 13 de Outubro será projectado o filme “O Judeu” de Jom Tob Azulay, e, no dia 14, assistiremos a uma conferência-debate com as participações de Liberto Cruz, José Oliveira Barata e Paulo Matos.
mulher e com a mãe, já viúva. A denúncia tinha sido feita pela escrava Leonor Nunes que acusou a família ao Tribunal do Santo Ofício. António José da Silva ficou detido na cela no6 do “corredor meio novo” da prisão dos Estaus durante um ano. Foi acusado de jejuns rituais, torturado, acabando por ser condenado como herege. Razão tinha “o Judeu” quando escreveu na sua última “ópera”, “Precipício de Faetonte”: “Ouve D’us os ecos, os clamores / de um mísero infeliz / a quem a sorte / dá na vida o rigor da mesma morte”. A 18 de Outubro de 1739, António José da Silva foi estrangulado e queimado num Auto-de-Fé, em Lisboa, no “Campo da Lã”. Um último momento ao qual assistiram Lourença Coutinho e Leonor Maria, que morreria pouco depois. A sua vida e a sua obra foram fonte de inspiração para muitos, entre eles, Camilo Castelo Branco, no romance “O Judeu” (1866), Bernardo Santareno na peça “O Judeu” (1966) e, mais recentemente, o filme “O Judeu” (1995), uma vida encenada por Jom Tob Azulay.
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Vermelho Transparente
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“Vermelho Transparente” estreia na Artemrede, antes de chegar a Lisboa
história
Uma de cortar a respiração
Jorge Guimarães escreveu, Rui Mendes encenou e Helena Laureano e Luís Esparteiro interpretam uma peça que penetra no mais profundo da alma humana e que nos reserva um final totalmente inesperado A. Ribeiro dos Santos A dramaturgia portuguesa chega à Sala Estúdio do Teatro Nacional, com o espectáculo “Vermelho Transparente”. A peça é da autoria de Jorge Guimarães (de quem vimos, anteriormente, no mesmo espaço, “Cenas de Uma Tarde de Verão”), e a encenação é de Rui Mendes. No palco, encontraremos dois actores bem conhecidos do grande público: Helena Laureano e Luís Esparteiro, que dão corpo, respectivamente a duas irmãs gémeas e ao psicanalista de ambas. Para encenador e intérpretes, esta aventura começou com um convite. Irrecusável. “Assim que li a peça pela primeira vez apercebi-me de que tinha duas grandes virtudes: conseguia, só com dois actores, contar uma história profunda sobre o relacionamento entre seres humanos, e conseguia prender-nos a atenção do princípio ao fim”, recorda Rui Mendes, no que é imediatamente secundado por Helena Laureano. “Eu não consegui largar a peça, desde que a comecei até a pousar. Li-a de uma assentada e eu, que até costumo ser bastante crítica relativamente às minhas leituras, gostei imediatamente do texto. Claro que não podia dizer que não a este
convite, até porque dar corpo, no mesmo espectáculo, a duas personagens distintas, é um desafio incrível. É um bombom para qualquer actriz.” Muito resumidamente, “Vermelho Transparente” conta a história de uma mulher que consulta um psicanalista para se pôr em ordem, mas acaba por desaparecer a meio do tratamento. Em seu lugar, aparece a sua irmã gémea, que assume as suas
mediavelmente e contra as suas expectativas, com uma das suas pacientes. “O meu trabalho, em relação ao da Helena (Laureano) é muito mais simples”, diz Esparteiro. “A peça é, basicamente, da Helena, enquanto eu assumo a voz do público: aquilo que o espectador vai querendo saber, é aquilo que eu vou perguntando às minhas pacientes. Esse é o processo.” Confessando que o trabalho foi duro
A peça consegue, só com dois actores, contar uma história interessante sobre o relacionamento entre seres humanos e prender-nos a atenção do princípio ao fim consultas no terapeuta e conta as mesmas histórias... de uma maneira completamente distinta. “O espectador só saberá a verdade no fim, quando juntar todas as peças do puzzle”, diz Rui Mendes, que escolheu o elenco para este projecto sem hesitações. A Luís Esparteiro cabe o papel de um psicanalista que acabará por se envolver, irre-
– dado que teve de compor duas mulheres diferentes, com personalidades e comportamentos distintos – Helena Laureano confessa-se amedrontada com a estreia do espectáculo, no Cartaxo, mas ao mesmo tempo cheia de curiosidade para saber como é que o público reagirá a esta proposta. Sobretudo tendo em conta que
a produção começará por rodar por várias localidades (Cartaxo a 7, Sintra a 22, Almeirim a 27), até chegar a Lisboa para cumprir a anunciada carreira na Sala Rey Colaço / Robles Monteiro. “Estou nervosa, mas acho que vai correr bem”, afirma. “Até porque as pessoas que não vivem em Lisboa têm mais sede de teatro do que as que estão na capital. Pelo menos, essa é a minha experiência...” Uma opinião corroborada por Luís Esparteiro. “As reacções do público são sempre um mistério. Mesmo uma peça que já tenha sido feita noutro lado qualquer, com bons resultados, nunca se sabe o que pode acontecer porque o público varia todos os dias e varia de sítio para sítio. Mas é isso mesmo que torna o teatro tão fascinante”, conclui. Ao que Rui Mendes acrescenta: “As pessoas estão fartas de televisão e sedentas de teatro. Mesmo com a oferta cultural que agora existe – que é muita e variada – o teatro terá sempre o seu lugar, pois oferece a magia da presença do actor. E isso é verdadeiramente único.”
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A Confissão de Leontina
Perfil Lygia Fagundes Telles: uma vida feita de letras
Em Novembro, o Teatro Nacional receberá um espectáculo que chega do Brasil, assinado pela pena inconfundível de um dos maiores vultos da literatura de língua portuguesa, vencedora do Prémio Camões em 2005. Aqui recordamos um percurso construído de palavras belas
Lygia Fagundes Telles nasceu em São Paulo, em 1923. Como o pai era advogado a exercer as funções de promotor público e delegado, Lygia acompanhou-o e viveu em cidades do interior paulista. Sertãozinho, Aipiai, Descalvado, Areias ou Itatinga foram algumas das cidades onde passou parte da sua infância. Influenciada pelas histórias que ouvia das empregadas da família, escreve as suas primeiras narrativas em cadernos escolares e conta-as em casa. Aos 15 anos escreve o seu primeiro livro, “Porão e Sobrado”, constituído por 12 contos, numa edição financiada pelo pai. Lygia nunca mais autorizaria a republicação do livro. De regresso a São Paulo, onde concluiu os estudos, termina, em 1939, o curso básico no Instituto de Educação Caetano de Campos e começa a frequentar a Escola Superior de Educação Física e o preparatório para a Faculdade de Direito do Largo de São Francisco (USP). Conclui o curso de Educação Física e dedica-se ao curso de Direito. O período de faculdade foi activo, do ponto de vista literário, para Lygia: a autora participa em tertúlias literárias e é apresentada a escritores como Oswald de Andrade e Mário de Andrade. Conhece o crítico de cinema Paulo Emílio Salles Gomes,
com quem casaria 20 anos mais tarde. Membro da Academia de Letras da faculdade, é colaboradora assídua dos jornais académicos “Arcádia” e “O Libertador” e publica o livro “Praia Viva” ao mesmo tempo que consegue emprego como funcionária da Secretaria de Agricultura do Estado de São Paulo e se forma bacharel em Ciências Jurídicas e Sociais. O período entre 1944 e 1949 é um período de reconhecimento literário na sua carreira. Em 49, publica o volume de contos “O Cacto Vermelho”, que conquista o Prémio Afonso Arinos da Academia Brasileira de Letras mas que não voltará a ser reeditado porque a autora o considera imaturo. Em 1950, casa-se com o jurista e ensaísta Goffredo da Silva Telles Jr., seu exprofessor de Direito, e tem um filho. Pouco depois, começa a escrever o seu primeiro romance, “Ciranda de Pedra”, publicado em 1954, e que seria o grande marco da sua maturidade intelectual. Em 1958, lança “Histórias do Desencontro”, obra premiada pelo Instituto Nacional do Livro, e é nomeada procuradora do Instituto de Previdência do Estado de São Paulo. Em 1963 publica o segundo romance, “Verão no Aquário” e vai viver com Paulo
Emílio Salles Gomes em São Paulo. Seguem-se os livros de contos “Histórias Escolhidas” (Prémio Boa Leitura), “O Jardim Selvagem” (Prémio Jabuti da Câmara Brasileira do Livro) e, em parceria com Paulo Emílio Salles Gomes, um argumento de cinema inspirado no romance “Dom Casmurro”, de Machado de Assis (que seria publicado em 1993, sob o título “Capitu”). Ao longo da década de 70, Lygia Fagundes Telles intensifica a sua actividade literária, publicando “Antes do Baile Verde” (Grande Prémio Internacional Feminino para Estrangeiros, em França); o romance “As Meninas” (prémios Jabuti, Coelho Neto e Ficção da Associação Paulista de Críticos de Arte); “Seminário dos Ratos”. Entre 1978 e 1982, assiste também à adaptação de vários dos seus contos para televisão: “Filhos Pródigos”; “O Jardim Selvagem”; “A Disciplina do Amor”; “Mistérios”. Entre Maio e Novembro de 1981, a Rede Globo exibe “Ciranda de Pedra”, uma novela baseada na sua obra homónima. A partir de meados da década de 80, começam a chover os prémios e as distinções, como reconhecimento de uma obra prolífera e profundamente original, enquanto a sua presença passa a ser uma constante na
vida literária brasileira. Entretanto, continua a publicar: em 1989, lança o romance “As Horas Nuas” e, a partir de 1991, reforma-se como funcionária pública e passa a dedicar-se exclusivamente à escrita. Na década de 90, sucedem-se os títulos da sua lavra: “A Noite Escura e Mais Eu” (prémios Melhor Livro de Contos, Prémio Jabuti e Prémio APLUB de Literatura); “Invenção e Memória” (Prémio Jabuti, “Golfinho de Ouro” e Grande Prémio da Associação Paulista dos Críticos de Arte). Em 1996, estreia o filme “As Meninas”, de Emiliano Ribeiro, baseado no seu romance homónimo. 2005 será o ano em que Lygia Fagundes Telles é galardoada com o Prémio Camões, o maior reconhecimento literário dedicado à Literatura em Língua Portuguesa. Os escritos de Lygia figuram em antologias nacionais e estrangeiras e a sua obra encontra-se traduzida em várias línguas, desde o alemão ao espanhol, passando pelo francês, inglês, italiano, russo, polaco, sueco e checo.
MGR
Ciclo do Conheciment
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Gianluigi Tosto / A Casa da Lenha >
Depois da sua passagem pela Mite’06, registada com grande sucesso, o actor italiano estará de volta com a “Ilíada”, a “Eneida” e a “Odisseia”, de Homero e Virgílio. Tosto conduzirá ainda um workshop para actores
Gianluigi Tosto
, de regresso ao Teatro Nacional
Gianluigi Tosto regressa em Novembro e Dezembro ao Teatro Nacional D. Maria II com a narração de três dos poemas mais antigos do mundo ocidental. Depois do sucesso da estreia na Mite’06, Tosto protagonizará um espectáculo entregue à voz de um só actor que nos surge como uma releitura de textos fundadores do género épico. A interpretação das três obras, encanta o espectador e desperta o impulso humano de contar histórias.
Um workshop sobre “O corpo do actor”
Com uma formação pluridisciplinar, tendo ainda estudado várias técnicas de interpretação teatral, Gianluigi Tosto conduzirá um laboratório de treino de corpo e voz para actores. O corpo do intérprete surge como o tema de trabalho deste workshop, na medida em que as sensações e o pensamento podem também ter uma expressão cénica. Algo que se traduz na respiração,
Já arrancaram, no espaço da Comuna – Teatro de Pesquisa, os ensaios de uma produção que promete arrebatar os amantes da música erudita.
“A Casa da Lenha”
, um original de António Torrado que evoca a vida e obra desse compositor maior da música nacional que foi Fernando
no gesto e na voz. Mente e corpo interagem no dia a dia mas o actor deve ter a consciência desta interacção de forma a poder tirar partido dela em cena. Serão elementos fundamentais do trabalho físico a coluna vertebral e o seu alinhamento, a relação do próprio peso com o solo, os pés que recebem o peso de todo o corpo, a articulação e movimento dos membros superiores e a cabeça. Será ainda contemplada a percepção dos mecanismos de emissão de voz e
do seu controlo, em prol da qualidade vocal. As inscrições para actores estarão abertas até dia 17 de Novembro, para um número limitado de pessoas. A inscrição, recebida no Teatro Nacional D. Maria II, deverá ser feita mediante a apresentação do CV com foto e o preenchimento da ficha disponível nas instalações do teatro.
MGR
Lopes Graça, será dirigido por João Mota e protagonizado por Carlos Paulo. Esta produção, que envolverá um grande número de intérpretes, conta com a participação de todos os actores do Teatro Nacional.
28 Set. a 8 Out.
SALÃO NOBRE
“Cozido à Portuguesa”
PRODUÇÃO
De José Eduardo Rocha Ensemble JER Direcção JOSÉ EDUARDO ROCHA
6 a 22 Outubro
SALA ESTÚDIO
“Anfitrião”
CO-PRODUÇÃO
De António José da Silva (O Judeu) Teatro de Formas Animadas de Vila do Conde e Teatro Nacional de São João Criação MARCELO LAFONTANA
12 a 29 Outubro
SALA GARRETT
“Guerras de Alecrim e Manjerona”
PRODUÇÃO
De António José da Silva (O Judeu) Teatro Nacional D. Maria II Encenação PAULO MATOS
7 Nov. a 23 Dez.
“Vermelho Transparente”
PRODUÇÃO
SALA ESTÚDIO
De Jorge Guimarães Teatro Nacional D. Maria II Encenação RUI MENDES
1 Dez. a 27 Mar.
“Ana & Hanna”
PRODUÇÃO
SALA GARRETT
De John Retallack Teatro Nacional D. Maria II Encenação ANTÓNIO FEIO
8 a 19 Novembro
“A Confissão de Leontina”
PRODUÇÃO
SALÃO NOBRE
De Lygia Fagundes Telles Dudu Sandroni Encenação ANTÓNIO GUEDES
16 Nov. a 30 Dez.
“A Casa da Lenha”
CO-PRODUÇÃO
SALA GARRETT
De António Torrado Teatro Nacional D. Maria II e Comuna - Teatro de Pesquisa Encenação JOÃO MOTA ESPLANADA NO ROSSIO DAS 10H ÀS 22H