Pioneiros
Curi ba 2014
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Publicitários Entrevistados Eloi Zane | Ernani Buchmann | José Dionísio Rodrigues | Ney Alves | Paulo Vítola | Renato Mazânek | Re amozo | Zeno O o Organizadores Hilton A. Marques Castelo | André Tezza | Chris an L. M. Schwartz | Chris ane Monteiro Machado | Ricardo Pedrosa Macedo Pesquisadores Acadêmicos Arianna Lais da Silva | Bruno Mendes Gouvea | Daumyra Patrys da Silva | Elisa Cris na Filla | Estela Drugovich | Fernanda Cordeiro Mar ns | Fernanda Regina Rios Assis | Gabriela Afonso Kim | Gabriela Silva Almeida | Kamila Ruyz Fernandes | Leonardo Schultz | Lucas Cavalcante Siebert | Marcel Talamini Costa dos Santos | Marilia Isabel Carneiro da Silva Dias | Marina Trindade Vieira | Mayara Mar ns Prando | Nathalia Bidone Fernandes | Rafaella Silva de Hollanda | Simoni Rozendo da Silva | Soraya Souza Renfro | Thiago Sganzerla | Vanessa Mafra | Zé Luís Schmitz Âncoras Amanda Mercer de O. Ribas | Denis Arashiro | Guylherme Custódio | Hendryo André | João Nei de Almeida Barbosa | Marion da Rocha Ceschini | Ricardo Vieira | Suelen Ivanovski Fotógrafos Guylherme Custódio | Luciano Sarote
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O Sindicato das Agências de Propaganda do Estado do Paraná (Sinapro/PR) enaltece a edição do livro “Pioneiros”, inicia va louvável da Universidade Posi vo por promover e valorizar a produção e a cria vidade publicitária paranaenses. Parte da Coleção Memória da Publicidade, esta obra traz em seu conteúdo informações coletadas em entrevistas com os publicitários Elói Zane , Ernani Buchmann, Paulo Vítola, Renato Mazânek, Re amozo, Zeno O o, José Dionísio Rodrigues e Ney Alves de Souza. Citaria estes dois úl mos nomes como grandes expoentes da divulgação do trabalho publicitário desenvolvido pelo Paraná. Através do esforço e dedicação de ambos, o Sinapro/PR lançou recentemente o livro “Histórias e Histórias da Propaganda no Paraná”. A obra, escrita pelo falecido publicitário Ney Alves de Souza na gestão de José Dionísio Rodrigues frente ao Sindicato, reúne registros dos fatos da a vidade publicitária a par r do primeiro anúncio publicado em jornal e trata-se de um compêndio dos acontecimentos que marcaram o mercado nos úl mos anos. Este movimento de arquivar a memória através do seu registro histórico é importante para termos a chance de compar lhar com gerações futuras o talento da comunicação gerada no Paraná. Da mesma forma, serve para acompanhar o desenvolvimento tecnológico a que nossas profissões estão impostas co dianamente, o que demanda nosso aprimoramento e capacitação constantes. Acredito que inicia vas como estas – tanto “Pioneiros” quando “Histórias...” – devem ser reconhecidas e propagadas, pois, cada uma à sua maneira, homenageia as gerações que semearam o que hoje é o presente da propaganda do Estado. Para nós do Sinapro/PR, por meio do Departamento Cultural, fazer parte deste belo projeto da Universidade Posi vo é dar con nuidade a visão de valorização profissional que norteia as ações do Sindicato e que deve direcionar o trabalho de todos os profissionais que atuam com propaganda no Estado. Com os votos de uma excelente leitura, Elon César Isfer Garcia Presidente Sinapro/PR Gestão 2014-2016 l
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Esse livro tem contra-indicações. Os entrevistados de Pioneiros bem que tentam salvar o leitor dos efeitos colaterais, sem sucesso: falam das maravilhas da tecnologia, batem na tecla de que o melhor dos mundos se conjuga no tempo presente, tratam até do CONAR, da propaganda de cigarros e da publicidade para crianças. Em vão – o que dizem dá uma nostalgia danada das coisas que a gente não viveu. Banzo no úl mo grau. Não chorem muito, riam sem reservas, no mais, se esbaldem. Zane , Buchmann, José Dionísio, Ney Alves, Vítola, Mazânek, Re a e Zeno O o – não nessa ordem – são bons no riscado. E aqui, dão de nos assaltar nas lides do roman smo de uma era. A gente morde a língua. Não espanta se nove entre dez leitores não saírem maldizendo por não terem sido publicitários, por pelo menos uma hora. Fala o Ney ou fala o Re a, pronto, é o que basta para se imaginar dividindo o expediente com Paulo Leminski e Jamil Snege, num aparte com Solda. Múl pla, Opus, da P.A.Z, Umuarama... Quem dera brincar de casinha ou de cabana numa dessas agências. Esqueçam os es mulantes de supermercado – o que esses caras nos reservam é bem melhor: é de ontem, mas está fresco. Tão bom quanto ouvi-los é o espanto de constatar a pá de mudanças que promoveram. Não precisaram de guerrilha – melhor um jingle de Paulo Vítola. Creiam, essa turma deve ter alterado o eixo de Terra. Mesmo assim, insistem que passou, que chega de falar nisso. Chega, não. Como diz Zeno, esse papo “dá saudade nos coroas e provoca inveja nos jovens”. Negócio fechado.
Ana Amélia Filizola Gazeta do Povo
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Publicação dos Cursos de Jornalismo e Publicidade e Propaganda da Escola de Comunicação e Negócios da Universidade Posi vo Reitor José Pio Mar ns Pró-Reitora Acadêmica Márcia Sebas ani Pró-Reitor Administra vo Arno Antonio Gnoa o Diretor-Geral da Escola de Comunicação e Negócios (ECN) Rogério Mainardes Coordenadora do Curso de Comunicação Social - Jornalismo Maria Zaclis Veiga Coordenadora do Curso de Comunicação Social - Publicidade e Propaganda Chris ane Monteiro Machado Coordenador Adjunto do Curso de Comunicação Social - Publicidade e Propaganda Ricardo Pedrosa Macedo Projeto Gráfico e Diagramação Agência Modelo Prac ce - Larissa Meyer e Ricardo Pedrosa Macedo Revisão Chris an L. M. Schwartz
Dados Internacionais de Catalogação na Publicação (CIP) Biblioteca da Universidade Posi vo - Curi ba - PR
P662 Pioneiros / organização Hilton A. Marques Castelo ... [et al.]. – Curi ba : Universidade Posi vo, 2014. 156 p. : il. – (Memória da publicidade) ISBN 978-85-99941-15-7
1. Comunicação. 2. Publicidade e Propaganda. I. Castelo, Hilton A. Marques. II.Título.
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Sumário
Renato Mazânek
11
Criador e contador de histórias
Ney Alves
25
História viva da propaganda
Zeno Otto
41
“A voz era de um dono só”
Ernani Buchmann
55
Mul plicador de idéias
José Dionísio Rodrigues
73
O jornalista que virou publicitário
Paulo Vítola
95
Mito da criação
Eloi Zanetti
117
Bicho do Paraná
Rettamozo
139
Reinventando o novo
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Apresentação Diz o provérbio popular que de boas intenções o inferno está cheio. Bem, aparentemente, este livro é o resultado de algumas boas intenções. De um lado, é a parceria entre alunos e professores dos cursos de Publicidade e Propaganda e de Jornalismo da Universidade Posi vo, que desde o ano 2008, realizaram entrevistas com alguns dos principais pioneiros da publicidade paranaense e trabalharam no projeto que gerou este material. Por outro lado, este livro é também a disposição e a contribuição do mercado profissional em estabelecer um diálogo com a Universidade – diálogo dos mais importantes para professores e alunos. Finalmente, este livro é também uma homenagem àqueles profissionais que, sem nenhum medo de exagerar, podemos dizer que fundaram a publicidade profissional no Paraná. O Projeto Memória da Publicidade, coordenado pelo professor Hilton Castelo, recebeu o apoio dos coordenadores dos dois cursos – André Tezza e Alexandre Castro, no início do projeto, e Maria Zaclis Veiga e Chris ane Monteiro Machado, na ocasião da publicação. A inicia va contou ainda com o apoio do jornal Gazeta do Povo para a realização esta obra. Ainda que o saber da publicidade seja um saber rela vamente recente, sobretudo quando o comparamos com as demais ciências humanas, é importante ressaltar que o olhar histórico é salutar – como se sabe, a história não é só a memória, mas a chance da consciência e da transformação. Nas oito entrevistas que estão nas próximas páginas, o leitor poderá acompanhar as incessantes mudanças que aconteceram na publicidade do Estado do Paraná das úl mas décadas. Vai poder também percorrer detalhes minuciosos e únicos de agências e clientes, que somente seus protagonistas poderiam contar. E talvez este mesmo leitor possa concluir que, felizmente, a história da publicidade do Paraná é a história de um con nuo crescimento em importância, mercado e profissionalização. É também buscando o aprimoramento e a excelência que os cursos de Comunicação da Universidade Posi vo passam a fazer parte da Escola de Comunicação e Negócios. Mais do que enviar mensagens, as a vidades relacionadas a comunicar e a fazer Publicidade passam a ser formalmente tratadas como fundamentais no mundo dos negócios e no desenvolvimento da sociedade – só assim é possível garan r que os cursos preparem profissionais para o mercado do futuro, que certamente trará desafios ainda maiores do que os retratados nestas páginas.
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De boas intenções o inferno está cheio? Nem sempre! Com o resultado alcançado aqui, talvez seja mais lícito e justo pensar com outro provérbio: a árvore se conhece pelos frutos.
Chris ane Monteiro Machado e Ricardo Pedrosa Macedo Coordenadores do Curso de Publicidade e Propaganda
Maria Zaclis Veiga Coordenadora do Curso de Jornalismo
Curi ba, julho de 2014.
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Renato Mazânek Criador e contador de histórias
MEMÓRIA DA PUBLICIDADE PARANAENSE MEMÓRIA DA PUBLICIDADE PARANAENSE MEMÓRIA DA PUBLICIDADE PARANAENSE MEMÓRIA DA PUBLICIDADE PARANAENSE MEMÓRIA DA PUBLICIDADE PARANAENSE MEMÓRIA DA PUBLICIDADE PARANAENSE MEMÓRIA DA PUBLICIDADE PARANAENSE MEMÓRIA DA PUBLICIDADE PARANAENSE MEMÓRIA DA PUBLICIDADE PARANAENSE MEMÓRIA DA PUBLICIDADE PARANAENSE MEMÓRIA DA PUBLICIDADE PARANAENSE MEMÓRIA DA PUBLICIDADE PARANAENSE
Renato Mazânek
MEMÓRIA DA PUBLICIDADE PARANAENSE MEMÓRIA DA PUBLICIDADE PARANAENSE MEMÓRIA DA PUBLICIDADE PARANAENSE MEMÓRIA DA PUBLICIDADE PARANAENSE MEMÓRIA DA PUBLICIDADE PARANAENSE MEMÓRIA DA PUBLICIDADE PARANAENSE MEMÓRIA DA PUBLICIDADE PARANAENSE MEMÓRIA DA PUBLICIDADE PARANAENSE
Criador e contador de histórias
Há muito tempo atrás, numa pequena escola – dessas que nham cadeiras duplas para os alunos – dois garotos estudavam lado a lado. Um deles adorava falar sobre rádio. O outro, já fazia locuções em veículos locais. O primeiro era Renato Mazânek; o segundo, Nicolau Maeder. Maeder disse certa vez: “Um dia você vai trabalhar comigo, rapaz”. Foi como uma profecia. Quando completou 15 anos, Renato Mazânek fez um teste na Difusora Pla nense e entrou como locutor para cobrir férias. Começava ali a história de um dos maiores nomes da história da publicidade paranaense. Mazânek começou na propaganda numa época em que a profissão de publicitário ainda não exis a como a conhecemos hoje. Os veículos de comunicação nham “corretores” que serviam como ponte entre anunciantes e emissoras. Simples agenciadores de anúncios no início, foi só mais tarde que esses profissionais passaram a cuidar um pouco melhor da redação e do visual dos anúncios. “A par r daí é que começaram a se desenvolver as agências”, lembra Mazânek. A era român ca da publicidade é vista por ele como um tempo em que as pessoas nham mais vontade do que recursos para fazer propaganda. Um tempo, enfim, em que havia muito espaço para criar, já que ninguém sabia direito como fazer e todos aprendiam juntos, empiricamente. Dessa fase preciosa, Mazânek guarda histórias interessantes e diver das, várias delas contadas nas páginas seguintes. Sua trajetória foi pioneira e ousada. Ele ajudou a fundar diversas rádios e emissoras de televisão no Paraná, inclusive o canal 12, então TV Paranaense, hoje Rede Paranaense de Comunicação (RPC). A afinidade com a TV o levou a dedicar boa parte de seu tempo a comerciais para essa mídia. No começo, gostava da improvisação que ela proporcionava. A emoção do ao vivo, adrenalina pura. “Na televisão, exis am as anunciadoras, as garotaspropaganda”, conta. Elas decoravam os textos e diziam tudo sem muita preocupação. Hoje, opina Mazânek, os comerciais estão longos demais: “As emissoras fazem até seis minutos, seis minutos e meio de comercial. Isso é ruim para quem está assis ndo e para quem está anunciando”. Mas nem só de televisão e rádio se fez o extenso currículo de Renato Mazânek.
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Também o trabalho em agências esteve entre suas experiências – no início em atendimento, mais tarde na criação. Em 1978, ele abriu sua própria agência, a Teorema Propaganda. Com décadas de experiência, a recomendação do entrevistado para quem inicia hoje na profissão é leve e simples: “Tenham muita paciência e boa vontade, porque vocês vão se deparar com várias coisas di ceis”. Outras dicas e ó mas histórias seguem na entrevista. Denis Arashiro
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Como era o mercado de publicidade an gamente? Quais são as diferenças em relação ao mercado de hoje? An gamente exis am poucas agências. Era a época do rádio e, normalmente, os veículos de comunicação nham corretores – que eram as pessoas que faziam a ligação com os anunciantes. Com o tempo, esses corretores perceberam que a a vidade era lucra va e passaram a conduzir propagandas também para outros veículos, além dos que eles de nham. Funcionava assim: um corretor nha amizade com alguém de uma rádio e atendia essa emissora. Se o mesmo cliente nha necessidade de anunciar em outra emissora, o corretor se encarregava do trabalho. Foi a par r daí que começaram a se desenvolver as agências. Na realidade, por meio de corretores de rádio, que se transformaram em agências grada vamente. E uma boa parcela dos profissionais que formaram as agências também foi de elementos de dentro dos veículos, do departamento comercial, que procuravam par cipar dessa a vidade. Então não exis a uma profissionalização? Não. Absolutamente. A coisa acontecia naturalmente. Apenas alguns anos depois que o mercado se desenvolveu é que essas pessoas se estabeleceram – criando as agências. E mesmo sendo pequenas e construídas de forma empírica, foram elas que deram realmente o desenvolvimento para o mercado. Os clientes, à medida que eram atendidos, cresciam também. E Curi ba passou a contar com uma seqüência de clientes, anunciantes, muito bem atendidos. Os corretores funcionavam como vendedores de espaço? É. No início eles eram exclusivamente corretores. Mas logo começaram a agregar pessoas que sabiam redigir um pouco mais (já que, empiricamente, eles mesmos redigiam inicialmente). Começaram também a procurar bons desenhistas e, dessa forma, a coisa toda foi se desenvolvendo. Só muito depois é que pessoas ligadas às áreas de arte foram sendo introduzidas e criando as suas agências. Exis u uma época român ca na publicidade? Hoje ela é mais profissional? Sim. O roman smo já foi mais acentuado, porque todo mundo que
“O romanƟsmo já foi mais acentuado, porque todo mundo que estava dentro da propaganda fazia aquilo com carinho, com amor, com vontade. As pessoas Ɵnham mais vontade do que recursos ou resultados financeiros.” Coleção Memória da Publicidade - Pioneiros |Curi ba | p. 11-24 | 2014 | 13
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estava dentro da propaganda fazia aquilo com carinho, com amor, com vontade. As pessoas nham mais vontade do que recursos ou resultados financeiros. Havia uma ligação entre as pessoas e elas eram
“Enquanto não ơnhamos o computador, a coisa era muito melhor. Você Ɵnha que trabalhar realmente. A entrada da computação facilitou tudo, de certa forma, e desqualificou a propaganda de um modo geral.”
muito dedicadas, trabalhando dez a doze horas por dia. A revolução técnica e tecnológica foi inevitável tanto nos meios de comunicação quanto no mercado publicitário. Essa revolução foi também uma evolução? Ela trouxe melhorias ou não? É o seguinte: enquanto não nhamos o computador, a coisa era muito melhor. Você nha que trabalhar realmente. Hoje, dá para determinar uma área no computador, escolher a fonte, receber a imagem. An gamente não era assim. Você nha que estabelecer uma área de trabalho, fazer uma distribuição de texto – o pessoal da arte é que fazia isso –, encomendar a composição para alguém, casar as imagens com o texto. E, depois, o texto era colado em folhas, com cola de sapateiro. Por vezes ela sujava a arte, porque era uma cola de contato. O Arnaldo Delmonte, que teve uma agência e trabalhava com arte, uma vez foi acumulando o excesso da cola e formando um bolinho, que ele passou a chamar de “meleca”. O nome acabou pegando para todo mundo. Então, todos passavam “meleca” nas artes para poder limpar. Naquela época, o empenho, a qualidade, a competência eram espetaculares, e não nha retorno. O que se fazia nha que ser feito e pronto. A entrada da computação facilitou tudo, de certa forma, e desqualificou a propaganda de um modo geral. Aí, um sobrinho de um cliente que nha feito propaganda comprava um computador e fazia uma arte coloridinha. Ela podia ser até bonita, mas ineficaz. O computador deu 14 | Coleção Memória da Publicidade - Pioneiros |Curi ba | p. 11-24 | 2014
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uma agilidade muito grande para uma série de coisas, mas roubou realmente aquela essência, e isso está cada vez pior. Então a escassez de recursos ajudava no roman smo? Muito. Veja, era preciso pedir a composição para uma empresa, fazer a fotografia já no tamanho previsto, montar tudo isso – e naquela época não havia offset. Então, nha que enviar o trabalho para uma clicheria, que fazia o clichê a ser entregue aos veículos da mídia impressa. E houve uma época em que a composição que o jornal fazia ainda era com lino po – pos fundidos na hora com estanho para poder formar as ramas para imprimir. Quando a publicidade foi evoluindo, começou a par cipação do fotolito. E dessa forma a coisa foi evoluindo. Houve um período muito grande em preto e branco. Depois, o que se fazia era a composição de um fundo, por exemplo, dosando um azul com amarelo para fazer o verde e assim por diante. Trabalhava-se com cor dessa forma. Só depois é que nós pudemos trabalhar com fotolitos coloridos. Inclusive, ve a oportunidade de fazer o primeiro anúncio colorido para jornal, quando a Gazeta introduziu a cor. Apesar de o processo ser mais trabalhoso naquela época, alguma coisa era mais fácil de fazer? Não, fácil realmente não. Mas foi a dificuldade de fazer que proporcionou a entrada de novos profissionais na área no Paraná, em Curi ba em especial. Eu, no início, me dediquei mais ao atendimento, mas com o tempo concluí que para melhorar no atendimento eu devia conhecer também a criação. Tinha o pessoal de atendimento, mas se fazia questão que a pessoa se integrasse. O senhor tem saudades da “meleca”? Não, mas tenho a história guardada na memória para mostrar como se faziam as coisas. Então o senhor acha que a subs tuição da “meleca” foi uma evolução fantás ca? Fantás ca, nisso não tenho dúvida. O computador, visto sob esse aspecto, facilitou bastante. Eu inclusive, por insistência do meu filho,
“O que veio do rádio foi a experiência, a práƟca, os profissionais (apresentadores e arƟstas). O que contava com alguma influência do rádio era o teatro e os noƟciários – porque não havia material visual e era simplesmente o locutor lendo as noơcias.” Coleção Memória da Publicidade - Pioneiros |Curi ba | p. 11-24 | 2014 | 15
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introduzi a produção de anúncios com computação – até então o computador só era usado para folha de pagamento, coisas burocrá cas. O senhor foi um dos pioneiros no rádio e na televisão. A programação da televisão foi baseada na programação do rádio? Isso ocorreu também com a linguagem publicitária? Na realidade não aconteceu bem isso. Fala-se muito dessa hipótese, mas são dois veículos com composições diferentes. Um é exclusivamente de áudio e o outro tem também o vídeo. O que veio do rádio foi a experiência, a prá ca, os profissionais (apresentadores e ar stas). O que contava com alguma influência do rádio era o teatro e os no ciários – porque não havia material visual e era simplesmente o locutor lendo as no cias. Eu fui sonoplasta de rádio por um período, adorava o que fazia. Isso me deu a oportunidade de ser o primeiro diretor de TV. O primeiro grande estágio de mudança na relação entre o rádio e a televisão aconteceu posteriormente, quando nós fazíamos filmes que nham que ser posi vados (as câmeras de televisão somente aceitavam o filme posi vo). Aí, um sujeito fotografava, montava o filme das no cias e revelava esse filme. A própria caracterís ca do filme permi a que você posi vasse. Posteriormente, nós começamos a receber produtos de fora, informações dos consulados etc., o que rava mais ainda essa condição de rádio. A única coisa que nós fizemos na televisão mais ou menos como era no rádio foi teatro: peças inteiras, sem adaptação, com quatro atos. O rádio contribuiu violentamente tanto na área técnica quanto na área ar s ca, porque todo esse pessoal que você vê hoje [na televisão] – Ari Fontoura, Paulo Goulart, Nicete Bruno – todas essas pessoas par ciparam a vamente aqui do rádio, do teatro. [Mas] na realidade não podemos dizer que a coisa ficou calcada exclusivamente no rádio. O senhor acha que a linguagem publicitária se adaptou? Ela se adaptou, sim. Bom, quando surgiu a televisão, nem no rádio nós nhamos a possibilidade de gravação. Então, normalmente, eram textos falados ao vivo. Na televisão, exis am as anunciadoras, as
“[Na TV] ơnhamos um corpo grande de anunciadoras, de garotas-propaganda. Elas Ɵnham uma capacidade invejável: pegavam uma lauda, davam uma lida e apresentavam em seguida. A propaganda era um texto que exisƟa para o comercial ao vivo.” 16 | Coleção Memória da Publicidade - Pioneiros |Curi ba | p. 11-24 | 2014
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“O BoƟcário, quando chegou a um estágio de desenvolvimento do negócio, o que fez foi entregar a conta para o Washington OliveƩo. Mas o que se fazia aqui, com os recursos que se Ɵnha, era muito melhor do que faziam os caras de fora com mais recursos.” garotas-propaganda. Eram elas que realmente falavam a maior parte dos comerciais. Nessa época, comerciais filmados eram os vindos de fora, das grandes empresas nacionais, de produtos vendidos no Paraná. E como é que eram feitas as gravações dos comerciais na TV? Não nha gravação, não. Era ao vivo. Nós nhamos um corpo grande de anunciadoras, de garotas-propaganda, e cada uma fazia em média de seis a oito comerciais por noite. Elas nham uma capacidade invejável, porque pegavam uma lauda de papel A4, davam uma lida e apresentavam em seguida. A propaganda era um texto que exis a para o comercial ao vivo. Depois é que, grada vamente, foram-se incluindo slides em que o produto era mostrado. Posteriormente foram incluídos também filmes nos comerciais ao vivo. A improvisação era muito comum naquela época e, para facilitar os comerciais televisivos, o senhor inventou um equipamento chamado Gray Tellop. Como ele funcionava e para que servia? Como eu falei, a base dos comerciais era ao vivo. Aos poucos, foram introduzidos os slides nesses comerciais. Naquela época, para você fazer um slide levava mais de 48 horas. Então, o Gray Tellop é um equipamento que eu tentei construir baseado em um imenso aparelho que exis a na TV Record, em São Paulo. Ele servia para a projeção de opacos. Você fazia artes de 9 x 12 e nha uma câmera – em um processo especial que a gente montou – que as captava. Até mesmo cenários nós fazíamos nesse GT. Os programas – hora certa, previsão do tempo, todos os serviços que a televisão oferecia – usavam esse GT. A publicidade atua no âmbito nacional, regional e internacional. Curi ba é, ou já foi, uma cidade-teste? Na realidade, Curi ba foi uma excelente praça-teste, inegavelmente. Isso porque ela é uma cidade que tem uma população com excelente miscigenação étnica e uma condição excepcional de cultura. Quando as campanhas eram feitas em São Paulo, por exemplo, eles produziam as peças, usando o mínimo possível de material (porque era um teste), e vinham para cá. Naquela época usava-se muito o outdoor e o rádio. Eram criados comerciais, na sede, e depois se Coleção Memória da Publicidade - Pioneiros |Curi ba | p. 11-24 | 2014 | 17
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“O diploma é importante, mas não confere competência, e sim formação. O cara pode sair formado, mas ele tem que ter a humildade de reconhecer que aquilo que ele não sabe fazer vai ter que aprender mergulhando no trabalho.”
fazia uma pesquisa a respeito do aproveitamento da mensagem. Eles lucravam porque o sistema era barato. Quase todo o mundo vinha fazer teste aqui em Curi ba, porque a cidade sempre teve uma fama de lugar fechado. O senhor falou que vinham empresas de fora, agências de fora para anunciar aqui. Como o senhor vê o publicitário curi bano nesse contexto? O publicitário curi bano, paranaense de um modo geral, é um cara que deveria ser invejado por toda a sua história e sua competência. Eu cri co muito algumas empresas que não souberam valorizar o publicitário paranaense. Na realidade, algumas empresas que cresceram, apareceram no mercado graças ao trabalho dedicado dos profissionais. Vou dar um exemplo: O Bo cário. Quando a empresa chegou a um estágio de desenvolvimento do negócio, o que fez foi entregar a conta para o Washington Olive o. Porque ele nha nome. Não entregaram para o Ernani Buchmann, para outros amigos, nem para mim, porque não fazíamos a mise-en-scène que eles precisavam. O empresário, de um modo geral, é vaidoso e acaba indo atrás de coisas de fora. Mas o que se fazia aqui, com os recursos que se nha, era muito melhor do que faziam os caras de fora com mais recursos. O paranaense é bom e cria vo, até mesmo por necessidade. O senhor já atuou em vários veículos e em várias áreas e a publicidade, no começo, era feita de forma mais isolada. Como era o trabalho do publicitário nessa época em comparação à tendência atual de comunicação integrada? Dentro de veículos, fui diretor comercial – nha uma ligação direta com a propaganda. Tive muitas oportunidades porque, quando saí do rádio para a televisão, não exis am muitas agências aqui e grandes empresas de São Paulo precisavam ter alguém para cuidar dos seus interesses. Todos os comerciais que aconteciam naquele período, ou vinham de lá e a gente executava, ou eram criados aqui mesmo. Isso nos proporcionou uma idéia de como fazer produção e do desenvolvimento da propaganda em si. Tempos depois, isso facilitou a montagem da agência. 18 | Coleção Memória da Publicidade - Pioneiros |Curi ba | p. 11-24 | 2014
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Para dar um exemplo de como funcionava: nós nhamos um programa na televisão chamado “Aventura e Submarino”, que era apresentado na quinta-feira e reprisado no domingo. Nas quintas-feiras, ele era patrocinado pelo Rum Mon lla e, no domingo, pela Vodka Orloff. Na quinta-feira eram comerciais filmados que eles mandavam e no domingo eu criava os comerciais. Era tudo na base da brincadeira. Quem fazia os comerciais era o Jamur Júnior. Ele aparecia com duas garrafas de vodka nas costas – como se fosse oxigênio para mergulho e ele es vesse no meio do mar. As pessoas gostavam tanto que assis am o programa no domingo só para ver os comerciais. Isso permi u que nós entrássemos na criação. A comunicação integrada não é novidade, porque eu, por exemplo, já a adotava quando montei a agência, onde trabalhei na criação, no atendimento, no desenvolvimento e em todo o resto. E nós sempre trabalhávamos a parte de RP com um RP, a parte de jornalismo a gente entregava para um jornalista. Nós fazíamos a criação e o atendimento. Essa composição é indispensável. An gamente podíamos ficar meio mancos de um lado, mas hoje não dá mais. As empresas hoje precisam de outras ferramentas, como o endomarke ng, esse po de coisa. An gamente, o empregado era o úl mo a saber o que estava acontecendo na empresa. Hoje existe um trabalho de aproximação, de mostrar a campanha, de mostrar os obje vos da empresa, as pretensões dela e assim por diante. Algumas áreas da comunicação precisam ser exercidas por profissionais diplomados. Na publicidade isso não acontece. O senhor acha que isso é bom ou é ruim para a profissão?
“O CONAR impede uma série de abusos que eu acho que deveriam depender muito mais das próprias agências, dos seus administradores, do que de qualquer determinação. O bom senso deveria definir o que fazer e de que forma fazer.”
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“Naquela época, você pegava um cidadão que saiu de uma Academia de Belas Artes e ele podia ser um diretor de arte. Você podia ter um bom redator formado em Direito. Era preciso lançar mão desses recursos para compor uma equipe.” Eu acho que o diploma é importante, apesar de que o diploma não confere competência, e sim formação. Tive a oportunidade de conferir isso muitas vezes. Se você vai fazer uma cirurgia, é importante ter um médico diplomado, mas que antes de tudo tenha treinado para fazer aquilo e tenha competência. No caso da propaganda é a mesma coisa. Quer dizer, o cara pode sair formado, mas ele tem que ter a humildade de reconhecer que aquilo que ele não sabe fazer vai ter que aprender mergulhando no trabalho. Mas acho que em todos os setores é indispensável a formação. Como o senhor compararia o mercado de trabalho de hoje ao do tempo em que não exis a a academia de publicidade? Hoje você tem um pessoal técnico, com um conhecimento teórico que an gamente só se adquiria na prá ca. O pessoal vinha para uma agência, qual agência fosse, e desenvolvia sua a vidade de uma maneira crescente. Naquela época, você pegava um cidadão que saiu de uma Academia de Belas Artes e ele podia ser um diretor de arte. Você podia ter um bom redator formado em Direito. Era preciso lançar mão desses recursos para compor uma equipe. Hoje não é mais assim. Bom, o que acho é que é indispensável uma formação superior, de qualquer forma. Apesar de a profissão não exigir profissionais diplomados, ela é regulamentada por um conselho de publicitários, o CONAR (Conselho de Auto-Regulamentação Publicitária). O senhor acha que esse conselho funciona? Eu não sou muito favorável a conselhos e sindicatos. São coisas que não me agradam muito. Por exemplo, o CONAR impede uma série de abusos que eu acho que deveriam depender muito mais das próprias agências, dos seus administradores, do que de qualquer determinação. O bom senso deveria definir o que fazer e de que forma fazer. Mas o senhor é a favor da proibição total da exibição de algum material? Eu acho que, se você ver um material que esteja trazendo um perigo de alguma forma, ele tem que ser balizado. Se a agência que está administrando aquela determinada conta excede, tem que ter uma sanção. 20 | Coleção Memória da Publicidade - Pioneiros |Curi ba | p. 11-24 | 2014
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O senhor acredita que uma campanha bem feita pode vender qualquer coisa? Sim, até a paz. O que uma campanha não pode ter é “vede smo”. Isso acontecia muito. Chegamos a um determinado ponto em que o camarada ia criar um anúncio para ganhar prêmio. Prêmio não interessa, prêmio é o resultado no caixa do cliente. Eu par cipei dos primeiros prêmios, depois não quis saber mais. Na realidade, o importante é o resultado da campanha com o cliente. A peça não pode ter valor como uma obra de arte e não ter resultado. Boa publicidade tem que ter eficácia na mensagem. Qual o conselho que o senhor dá aos profissionais e aos estudantes para trabalhar com liberdade de expressão sem ferir a é ca? Volto a falar no bom senso. Cada um vai ter que avaliar a situação e, em função disso, definir o que é ou não é bom, se tem condição ou não de veicular. Não tem receita, não. Cada um vai ter que saber analisar com profundidade o que está acontecendo. E se, por acaso, chegasse às suas mãos um produto que o senhor achasse ruim, como procederia? Acredito que eu tentaria vender, fazer a minha parte, só que sem men r. Eu teria que fazer colocações que mo vassem o consumo daquilo. Só não acho que se deve men r e criar coisas falsas. Você pode fazer com que o cara compre sem fazer promessas. A agência tem que ter condição de criar, de desenvolver peças que mo vem de outra forma. Há quantos anos aconteceu o anúncio do “Melhoral, é melhor e não faz mal”? E tem gente que lembra disso até hoje. Vocês não pegaram algumas campanhas, mas isso ficou registrado. “Inverno nas Casas Pernambucanas”, coisas assim. Isso deixou de acontecer hoje nas grandes agências. Pega fulano para dizer “toma esse comprimidinho porque acaba com não sei o quê”. Basta ter uma Rede Globo e as atrizes para fazer comercial. E não é por aí. A agência deixou de ter cria vidade. Como o senhor trabalharia, então, a cria vidade com a verdade? Você tem que criar uma série de condições. Mas não precisa trazer, por exemplo, o Pelé, que entende de futebol e não de dor de cabeça. Isso é
“O que uma campanha não pode ter é ‘vedeƟsmo’. Chegamos a um determinado ponto em que o camarada ia criar um anúncio para ganhar prêmio. Prêmio não interessa, prêmio é o resultado no caixa do cliente.” Coleção Memória da Publicidade - Pioneiros |Curi ba | p. 11-24 | 2014 | 21
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Renato Mazânek Criador e contador de histórias
uma forma men rosa de fazer o negócio, porque você está induzindo o cara a adquirir um produto por intermédio do Pelé. Eu acho que não deve ser feito dessa forma. Ao profissional de propaganda cabe criar a forma, encontrar os meios. Eu acho que tem que ir buscar um argumento posi vo, uma outra forma de fazer com que o consumo seja sa sfatório. Con nuo achando que tem que ter um envolvimento maior da agência, da criação, usar os recursos. Mesmo em São Paulo você não vê mais: nha várias lojas de roupa e de calçados que não precisavam u lizar ar sta. Então, eu acho que tem que exis r mais trabalho, porque dessa forma é simplesmente fácil para a gente. Ou é insistência do cliente, como acontecia muito aqui: às vezes, o cliente vendia pneus, mas queria botar o comercial na novela das sete, porque ele assis a. Você perde a essência da mídia numa condição dessas. O que o senhor acha da lei proibindo os outdoors em São Paulo? Eu acho que deveriam criar formas definidas para u lizar outdoor. São Paulo era horrível. Você pegava a 23 de março, era um atrás do outro. Os lugares mais bonitos da cidade você não via. E eu acho que é exatamente pela falta de bom senso. Tanto que eu sugeri a existência, e acabaram fazendo aqui, dos mini-outdoors nos pontos de ônibus. Apresentei e fizeram por conta. Mas de qualquer forma foi feito. Isso é o mais importante. Então, você vê que tem meios de u lizar o outdoor sem ser da forma desenfreada como era em São Paulo. Em relação aos novos rumos da profissão, como o senhor vê a chegada das novas tecnologias na publicidade? Hoje, independente dos equipamentos em si, nós temos a internet, que não pode ser desconsiderada, temos os canais por assinatura, a televisão aberta. E agora ainda vem o processo digital. O rádio, no meu entender, deve se beneficiar muito, porque é um veículo que nunca vai deixar de exis r – ele te permite ouvir fazendo qualquer coisa. Eu acompanhei a apresentação do rádio digital e é sensacional. Inegavelmente a tecnologia digital vai ser um divisor de águas de alguma forma. O que vai acontecer não dá para prever, mas que será de bom resultado não há dúvida. A TV digital fez surgir discussões dentro da publicidade também, como a possibilidade de acabarem os intervalos comerciais, que seriam subs tuídos por uma publicidade mais intera va. Qual a sua opinião sobre isso? Eu acho que hoje já se abusa muito do intervalo comercial. Apesar de eu não estar mais ligado diretamente com a televisão, tenho o 22 | Coleção Memória da Publicidade - Pioneiros |Curi ba | p. 11-24 | 2014
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“Não há necessidade de gritaria. É barulho simplesmente. Desde que você mostre um refrigerador com uma boa vantagem aparente, o cara vai comprar. Então, não precisa fazer coisa feia.” “micróbio” dela e sempre acabo acompanhando. Hoje as emissoras fazem até seis minutos, seis minutos e meio de comercial. Isso é ruim para quem está assis ndo e para quem está anunciando. Nós vemos um período em que se faziam comerciais de 10 segundos. Alguma campanha que o senhor se lembra que marcou? No geral, uma das campanhas boas que exis ram foi a do Bardal: “Tudo anda bem com Bardahl”. Foi uma coisa clara, uma colocação que todo mundo aceitava. E qual foi aquela em que o senhor não gostaria de ter par cipado, de ter feito? Casas Bahia. Por quê? Ah, é uma barbaridade o que se faz lá. É uma gritaria que não tem tamanho. Tenho uma piada de que, como nós não temos pena de morte no Brasil, eu pegaria o condenado e o botaria o dia inteiro assis ndo o comercial das Casas Bahia, o Gugu, o Ra nho, a Ana Maria Braga. Mas, sem brincadeira, não há necessidade de gritaria. É barulho simplesmente. Desde que você mostre um refrigerador com uma boa vantagem aparente, o cara vai comprar. Então, não precisa fazer coisa feia. O senhor acha que é muito apela vo? Eu acho que é, porque é agressivo. Para que o cara precisa gritar? Um Coleção Memória da Publicidade - Pioneiros |Curi ba | p. 11-24 | 2014 | 23
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“Acho que hoje está faltando criaƟvidade, porque só se pegam arƟstas, pessoas de nome para vender produto. AnƟgamente se fazia um comercial do Sonrisal e era simplesmente “Shhhh...”. Aquilo marcava.” pulando, um virando de ponta-cabeça? Não tem necessidade. Mostra o refrigerador, mostra a máquina de lavar, mostra o equipamento eletrônico de outra forma. Primeiro nha um cara horroroso que gritava. Alguém deve ter falado alguma coisa e raram o cara, colocaram outro que gritasse menos. Como o senhor analisa a criação publicitária atual? Como eu comentei, eu acho que hoje está faltando cria vidade, porque só se pegam ar stas, pessoas de nome para vender produto. An gamente se fazia um comercial do Sonrisal e era simplesmente “Shhhh...”. Aquilo marcava. São coisas que não precisam ter uma pessoa boni nha lá falando dessa forma. Fala-se em cria vidade. Não sei se você sabe uma historinha da pasta de dente: um dia, estavam reunidos vários diretores de uma empresa de pasta de dente que queriam vender mais, mas nham esgotado os recursos. Eles estavam discu ndo e nha um cara pregando cor na na sala. Aí, um deles, depois de duas horas discu ndo, disse: “Ô, Fulano”, para o cara que estava colocando as cor nas, “o que você faria para aumentar as vendas da pasta de dente?”. E o cara respondeu: “Aumentaria o buraco no tubo”. Que mensagem ou conselho o senhor deixaria para aqueles que estão se formando e ingressando no mercado de trabalho? Primeiro: tenham muita paciência e boa vontade, porque vocês vão se deparar com várias coisas di ceis. Porém, é uma a vidade de extrema importância e que deve ser levada a sério e com todo o carinho. O mais importante disso tudo é que aquele profissional que es ver mergulhado na publicidade abandone, exclusivamente, o desejo de aparecer. Que apareça em função do que realiza.
Pesquisadores Acadêmicos: Elisa Cris na Filla | Fernanda Regina Rios Assis | Marina Trindade Vieira Âncora: Denis Arashiro
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MEMÓRIA DA PUBLICIDADE PARANAENSE MEMÓRIA DA PUBLICIDADE PARANAENSE MEMÓRIA DA PUBLICIDADE PARANAENSE MEMÓRIA DA PUBLICIDADE PARANAENSE MEMÓRIA DA PUBLICIDADE PARANAENSE MEMÓRIA DA PUBLICIDADE PARANAENSE MEMÓRIA DA PUBLICIDADE PARANAENSE MEMÓRIA DA PUBLICIDADE PARANAENSE MEMÓRIA DA PUBLICIDADE PARANAENSE MEMÓRIA DA PUBLICIDADE PARANAENSE MEMÓRIA DA PUBLICIDADE PARANAENSE MEMÓRIA DA PUBLICIDADE PARANAENSE
Ney Alves
MEMÓRIA DA PUBLICIDADE PARANAENSE MEMÓRIA DA PUBLICIDADE PARANAENSE MEMÓRIA DA PUBLICIDADE PARANAENSE MEMÓRIA DA PUBLICIDADE PARANAENSE MEMÓRIA DA PUBLICIDADE PARANAENSE MEMÓRIA DA PUBLICIDADE PARANAENSE MEMÓRIA DA PUBLICIDADE PARANAENSE MEMÓRIA DA PUBLICIDADE PARANAENSE
História viva da propaganda
Os olhos de quem acompanhou a história da publicidade no Paraná, no Brasil e no mundo já não enxergam tão bem. O responsável pelo principal acervo de propaganda do Estado atribui à observação o seu principal aprendizado. Acompanhando de perto o trabalho na boca da gráfica, conferindo o material que chegava dos fornecedores e fazendo textos, revisão ou atendimento, a curiosidade se tornou conhecimento para o publicitário Ney Alves de Souza. Complicações de saúde raram quase toda a visão de Ney Alves. Mas seu empenho de uma vida inteira recortando e guardando anúncios, anuários, bole ns informa vos, embalagens, fotografias, guias, jornais, revistas e livros resultou em um acervo de mais de 15 mil itens. Seu livro História e Histórias da Propaganda no Paraná também reúne boa parte dessa trajetória, além dos casos que Ney viu e viveu na publicidade. Mas nem só observando Ney Alves de Souza desenvolveu a a vidade publicitária: ele mesmo pôs muito a mão na massa, numa carreira que começou logo pela gigante McCann Erickson. Na agência, uma das potências mundiais da propaganda, Ney trabalhou ao lado de alguns de seus então professores da Escola Superior de Propaganda de São Paulo. Como redator, passou por diversas outras agências, onde desenvolveu peças premiadas, mas foi na Umuarama – agência paranaense que se celebrizou pelos inesquecíveis comerciais do ex nto Banco Bamerindus – que Ney acredita ter vivido sua melhor fase. Durante quase 30 anos, Ney Alves de Souza foi colunista de propaganda, assinando colunas semanais em diversos jornais do Paraná, como Folha de Londrina, O Estado do Paraná, Diário do Paraná, Gazeta do Povo, Correio de No cias, Espaço de Comunicação e Indústria & Comércio. Par cipou ainda do júri do Prêmio Colunistas Paraná e, junto com Renato Castelo Branco e outros publicitários do país, assina o livro História da Propaganda no Brasil. Com a nostalgia de quem foi um dos primeiros publicitários registrados no país, Ney Alves de Souza fala com propriedade da “época român ca” da a vidade. Ele atribui à tecnologia, em grande medida, o fim desse roman smo. Para ele, em muitos casos a facilidade tecnológica destrói boas idéias e salva as más, mas “cria vidade não há tecnologia que tenha”. Coleção Memória da Publicidade - Pioneiros |Curi ba | p. 25-40 | 2014 | 25
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A burocra zação das agências publicitárias também é apontada por Ney como retrocesso: ele adverte que o verdadeiro profissional da área não é quem “comanda, organiza, paga, compra, [...] o publicitário mesmo é o que está ali vendo o que está acontecendo, vendo a necessidade do cliente e passando para o consumidor ou para o provável consumidor aquilo que o cliente precisa passar”. A atual dificuldade de enxergar não impede o veterano publicitário de ainda acompanhar o que acontece no ramo. Informação é algo que ele sempre busca – é com ela, segundo defende na entrevista a seguir, que pretende con nuar fazendo história e contando as histórias da propaganda no Paraná. Guylherme Custódio
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“Quando começou a veiculação de anúncios em rádio, aí é que começaram os primeiros agenciadores de propaganda. Eles visitavam o provável cliente, convenciam a anunciar, faziam o texto e já subiam para o primeiro andar para colocar no ar.” Quais eram as maiores dificuldades das agências no passado? O passado é muito vasto. A primeira agência no Paraná começou pra camente trabalhando com outdoor e anúncios em bondes e trens. Não havia agências trabalhando com jornais e, naquele tempo, nem exis a rádio ainda. Já exis a a Gazeta do Povo, que é de 1919, mas não exis a uma agência organizada. As agências apareceram com o desenvolvimento dos jornais e depois com o rádio. E o rádio ainda ficou durante muitos anos sem anúncio. Era sustentado pelos próprios sócios. Quando começou a veiculação de anúncios em rádio, aí é que começaram os primeiros agenciadores de propaganda. Eles visitavam o provável cliente, convenciam a anunciar, faziam o texto e já subiam para o primeiro andar para colocar no ar. E, na sua opinião, o que mudou na propaganda paranaense? O que mudou, principalmente, foram os clientes. Porque há pouco tempo atrás, sei lá, dez anos, havia muitos clientes locais que nham veiculação nacional, como o Bamerindus, o Banestado, a Refrigeração Paraná – que era a Prosdócimo. E o que mudou é que houve uma concentração de anunciantes pequenos, porque os grandes começaram a ser atendidos por agências de fora. O que ficou foi anúncio de varejo. Você vê o bombardeio de ofertas, de liquidações. Hoje ficaram poucos grandes anunciantes, como O Bo cário. E mesmo assim são anunciantes que são atendidos por agências de fora. Tem alguma campanha que o senhor possa citar, aqui no Paraná, que tenha sido marcante? Mais an ga, tem aquela da época de ouro da cria vidade no Paraná, que foi no começo da década de 1970 – a época da Múl pla, da Opus, da P.A.Z. A campanha era do Malucelli da Visconde, uma loja de varejo e de material de construção. A maioria dos materiais foi feita pelo Paulo Vítolla, que era e é um gênio até hoje. Ele é jinglista, é poeta, é redator de anúncio, é roteirista e a cria vidade dele é espontânea. A campanha se chamava “Natal cor-de-rosa Malucelli”. Ele criou tudo indo de carro da casa dele para a agência. No caminho, ligou o rádio e ouviu Noel Rosa cantando. Fez uma associação do “rosa” do Noel, com “O Rosa”, um personagem. Quando chegou na agência já estava Coleção Memória da Publicidade - Pioneiros |Curi ba | p. 25-40 | 2014 | 27
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“O que acontece hoje é que ou uma boa idéia se perde na tecnologia, ou a tecnologia é quem salva uma má idéia.” com o comercial e com a campanha na cabeça. Foi criado o boneco e o Natal cor-de-rosa foi uma campanha premiada, inclusive no [Prêmio] Colunistas nacional.
Cliente – Maluceli Campanha: Natal Título: Natal Cor-de-Rosa Comercial de TV 30” Cena 1: Fantoches estão ves dos de Papai Noel cor-de-rosa. Eles cantam, em coro, paródia da música “Com que roupa?”, de Noel Rosa. FANTOCHES: “Cheguei para mudar o ar da casa, Pra mandar brasa do telhado até o chão. Sou Papai Noel, sou cor-de-rosa Na roupa nova e no coração. Do piso ao teto, eu garanto Melhor preço em Maluceli Em Maluceli você pode confiar Papai Noel vai economizar Malucelar Em Curi ba, Londrina, Ponta Grossa, Cascavel Maluceli canta com Papai Noel”.
E das que o senhor fez, qual mais marcou pessoalmente? A minha melhor fase, vamos dizer assim, entre aspas, foi no tempo da Umuarama. Eu não era exatamente criador no tempo da Umuarama, 28 | Coleção Memória da Publicidade - Pioneiros |Curi ba |p. 25-40 | 2014
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mas eu criava e atuava como redator. Tinha a equipe que cuidava dos produtos do banco e eu ficava mais com a parte ins tucional. Inclusive, no próprio livro [História e Histórias da Propaganda no Paraná], tem um anúncio da Umuarama que fala assim: “quem pensa que a Umuarama só atende o Bamerindus, está muito enganado”. Porque nha a campanha da vacinação, nha a campanha pró-memória gaúcha, nha a campanha do Pantanal – esse anúncio foi um dos melhores, e era ins tucional da agência. Esse eu gosto muito. E, por outro lado, qual foi a campanha mais desastrosa que o senhor já fez? Sinceramente, nunca caiu essa ficha aqui. Até porque, uma boa parte do que a gente poderia considerar ruim, não vai para o ar, nem sai do estúdio. É verdadeiro afirmar que, no passado, houve uma época mais român ca da publicidade e agora é um período, digamos, mais profissional? Poxa! Eu tenho certeza que houve. O que acontece hoje é que ou uma boa idéia se perde na tecnologia, ou a tecnologia é quem salva uma má idéia. E, algum tempo atrás, pelo menos no começo da propaganda, da nossa história aqui, de anúncio de jornal e de rádio, ela era mais espontânea. Agora você tem tudo mais segmentado, o comercial de 15”, de 30” ou de 60”. Algum tempo atrás, era o que o redator queria escrever. Podia ser de 8”, de 15”, de 16”, 18” ou 19”. Ele não nha tempo, porque ele punha no rádio e o rádio não nha aquela seqüência de entrar o comercial seguinte 15” depois, então a cria vidade era mais solta e ele falava o que ele achava que interessava para o anunciante e podia informar o ouvinte. Era mais român co. Você pode ver que na Academia Brasileira [de Letras] nha vários publicitários. Alguns escritores, po Orígenes Lessa, eram publicitários. Pelo que eu sei até o próprio Machado de Assis escreveu anúncio. Era uma fase cria va que não nha tecnologia e se nha que convencer o leitor a ler do começo ao fim o texto. Então, havia uma obrigação de trabalhar bem o texto, com interesse para o leitor. Agora não, você vê uma imagem e já sabe que é aquele carro e tal e não precisa tanto daquela parte român ca de ligação entre o produto e o provável comprador, consumidor. E como foi começar a fazer publicidade já em uma grande agência como Mccann Ericsson? Ela ainda con nua sendo a maior agência do Brasil, mas, naquele tempo, só se chegava a ela no fim da carreira. Todo mundo que Coleção Memória da Publicidade - Pioneiros |Curi ba | p. 25-40 | 2014 | 29
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começava numa agência pequena sonhava em terminar, chegar até a Mccann, e eu comecei lá. Mas é o tal do QI, quem indica. No meu caso, eu já nha feito a Escola Superior de Propaganda e trabalhava na parte administra va da Nestlé. Tinha uma inquilina da minha sogra, que morava na edícula, e que era costureira do canal 4 (TV Tupi) e nha contato com o produtor da Mccann. O produtor ia lá para acertar roupa, gravar comercial. Um dia, ela falou: “Zé, você não quer apresentar um amigo meu lá na agência, ele já fez escola e podia se interessar?” Foi ele que me levou lá, me apresentou e no dia seguinte eu já estava fazendo teste, passei e só não fui admi do de imediato porque a Mccann não podia absorver funcionário de cliente grande. Nestlé era um cliente grande e a Mccann não podia me admi r, me rando da Nestlé. Fiz a quarentena e logo comecei a trabalhar. E eu comecei a trabalhar, exatamente, com o Ricardo Ramos, que era um escritor. Não era publicitário. Ele trabalhava na agência para sobreviver. Ele era filho do Graciliano Ramos. O grupo que eles chamavam de grupo General Motors, GM, era composto pela conta da General Motors, da Frigider e nha um varejo de sapatos, a Casas Eduardo. Eu ficava o tempo todo com o Ricardo, às vezes ia para reunião só para levar o layout debaixo do braço. Mas eu fazia muito texto também, principalmente do varejo, calçado. Era uma mul nacional, que era a maior aqui no Brasil e que nha os melhores profissionais. Inclusive uma boa parte deles era professor da Escola Superior de Propaganda. Então, eu trabalhava com eles durante o dia e ia ter aulas durante a noite. E an gamente era muito di cil para um publicitário ter seu próprio negócio? Era. Era porque ele nha que ter pelo menos um cliente fixo, que garan sse uma renda própria, um faturamento que man vesse a despesa da agência. Mas era muito perigoso também, porque se ele vesse só um cliente e perdesse esse cliente, perdia o patrimônio da agência. Por isso muita gente ou foi trabalhar em empresas, no departamento de propaganda – que, aliás, ainda hoje é um dos melhores mercados – ou então foi trabalhar em veículo. Para você ter um cliente grande era muito di cil, porque eles eram atendidos por agências grandes. Aconteceu com muita gente de se associar com o dono da agência grande, que nha uma conta grande, depois ficar com a conta e deixar o outro na mão.
“Alguns escritores, Ɵpo Orígenes Lessa, eram publicitários. Pelo que eu sei até o próprio Machado de Assis escreveu anúncio.” 30 | Coleção Memória da Publicidade - Pioneiros |Curi ba |p. 25-40 | 2014
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Atualmente a publicidade tem se u lizado de muitas outras formas de comunicação, como marke ng, assessoria de imprensa. Como era essa ar culação antes, ou nem exis a? Eu vejo pela minha experiência. Por exemplo, no tempo da Umuarama, eu era, teoricamente, do atendimento, mas eu fazia texto, fazia revisão, fazia o próprio atendimento. Eu sempre fui curioso. Eu acompanhava o trabalho na boca da máquina na gráfica. Eu ia conferir o material que chegou do fornecedor, eu estava integrado no que eu estava atendendo. O pessoal da produção, “ó, chegou tal material”, e eu ia ver o que chegou, separava o que interessava. Fiquei conhecendo muita gente, conhecendo muito material, muito processo de produção. Foi importante porque, para sugerir para o cliente, por exemplo, um folheto de duas dobras, poderia ser folha normal ou recortada, podia ter corte ou vinco. Eu conhecia isso para poder conversar com o produtor da agência, com o cliente e depois conferir se veio do jeito [certo]. O Bamerindus nha muito, muito, muito pedido pra fornecedor. Ele nha alguns preferenciais, mas nha sempre que ter um ou outro de reserva porque às vezes a quan dade era muito grande, e a velocidade que precisava ter o material, também. Tinha que distribuir material para 1.300 agências, então nha que ter uma logís ca que o próprio fornecedor já par cipava, fazendo pacotes de tantos exemplares para poder mandar para tal agência. Não adiantava você fazer um material bom e ficar armazenado na gráfica por quinze dias. Agência não é só criar. Tem muitos gênios criando, mas tem que finalizar. Hoje o computador ajuda muito, mas naquele tempo era tudo à mão. E qual é a importância dos publicitários pioneiros que trabalhavam aqui no Paraná para conquistar o espaço que se tem hoje? E o espaço, é maior agora ou reduziu? Qual foi a importância desses profissionais? O espaço reduziu, reduziu bastante. No começo da década de 1970, que foi quando surgiu a Opus, a Exclam, o Paraná nha excelentes estúdios de áudio e vídeo. Os melhores fora do eixo Rio-São Paulo e em alguns casos superiores até mesmo aos estúdios dessas capitais. Mas as agências de cá não pres giavam. O SIR Laboratórios nha clientes em Minas, na Bahia e muito pouca coisa no Paraná. Era uma baita produtora. Era a única produtora integrada, porque ela nha cinema, vídeo e áudio. As outras faziam o filme e mandavam gravar em estúdio. O SIR fazia tudo e fazia muita coisa. Estava lembrando agora que o Banco do Brasil está comemorando 200 Coleção Memória da Publicidade - Pioneiros |Curi ba | p. 25-40 | 2014 | 31
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anos. O SIR ganhou a concorrência para fazer o audiovisual dos 180 anos do Banco do Brasil. Foi um trabalho, inclusive, em que o Paulo Vítola fez o roteiro. Foi um audiovisual de 45 minutos gravado no Brasil inteiro, com cenários feitos aqui, em estúdio, com a própria marcenaria do SIR, com atores, como o Othon Bastos e não sei mais quem, e a equipe viajando, viajando de barco, viajando de caminhão para pegar aquelas agências lá do fim do mundo do Banco do Brasil. E isso aí é um trabalho que pouca gente sabe que foi feito aqui em Curi ba. E a que o senhor atribui a falta de conhecimento de que essa campanha foi feita aqui em Curi ba? Acho que faltava alguém falar, abrir a boca. O SIR nha clientes de fora, po Banco Nacional, nha Supermercados Disco, do Rio de Janeiro, nha aquele personagem do Tião Macalé. Lembra do Tião Macalé? No Rio ele era conhecido, mas ele vinha aqui todos os meses, gravar os comerciais do Disco. Era uma figura impressionante, aquele negrão, com os dentes de fora, meio banguela. Mas era uma figura que comunicava. Quantas vezes veio Irene Ravache, Othon Bastos, até aquele corredor de fórmula 1 que era aqui de Curi ba – ele vinha gravar aqui também. A turma do Casseta e Planeta veio gravar aqui. O SIR nha três estúdios grandes, fechados, e nha épocas que ele trabalhava com cinco produções simultâneas, uma em cada estúdio e mais duas equipes na rua. Tem muita gente que vinha fazer a produção aqui para poder ficar em Curi ba dois, três dias. E saía com um trabalho bem feito. Tinha o Banco Nacional. Eles chegaram a fazer um clipe deles, de uns seis minutos no estúdio, com chuva. Sabe, uma paródia do Dançando na Chuva. Eles fizeram dentro do estúdio e os atores dançando com o guarda-chuva. Teve um comercial do Banestado que era para vender as agências da praia e eles gravaram o comercial debaixo d’água. Alugaram a piscina, não sei se do Curi bano ou qual outro clube, e fizeram o cenário debaixo d’água e os atores debaixo d’água, com um peso de chumbo no pé para não subir. Tudo feito aqui em Curi ba. Aquele comercial do lançamento do freezer Prosdócimo, que eles foram vender freezer para esquimó, foi gravado no Colorado [EUA]. O senhor é o responsável pelo principal acervo de propaganda do Paraná. O que o senhor aprendeu ao reunir todo esse material? Eu aprendi que devia ter mais gente fazendo isso. Foi um custo. Eu fui, a vida inteira, recortando e guardando, recortando e guardando. Recortava até com es lete - eu fiz com tesoura e não deu. E guardando, e guardando, e quando chegou o tempo que o Sindicato quis fazer o 32 | Coleção Memória da Publicidade - Pioneiros |Curi ba |p. 25-40 | 2014
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registro da história, eu nha esse material. Se eles não vessem me convidado, talvez demorasse muito mais tempo para sair e não sei se com tantos detalhes como saiu. No livro, tem anúncio lá que só eu tenho. Para mim foi bom porque eu revi muita coisa de muita gente com quem eu não nha mais contato. O senhor citou há pouco que an gamente havia muitos profissionais de outras áreas, que não eram publicitários. O Paulo Leminski, por exemplo. O que o senhor acha de bom ou de ruim nessa relação de outros profissionais poderem exercer a publicidade? Poder exercer a publicidade qualquer um pode, porque, apesar de ser regulamentada, a publicidade não tem um conselho regional, não existe uma ordem. Eu, por exemplo, tenho o meu registro de publicitário, que foi um dos primeiros feitos no Brasil - a Mccann Ericsson registrou todos os profissionais quando saiu a lei. Ela foi a primeira agência que pegou toda a documentação de todos os profissionais e registrou no Ministério do Trabalho. Mas agora não é obrigado. Tem muita gente que se forma, trabalha em agência muitos anos e não tem o registro de publicitário porque não é obrigatório, como acontece com médico, com advogado. Se não ver a carteirinha da ordem, ele não pode exercer, e a publicidade, qualquer um pode. O Paulo Leminski, era tão versá l em várias coisas que, inclusive como publicitário, ele fez muita coisa, fez muita criação boa. Percebe a diferença? Porque tem muito publicitário que é dono de agência, é um burocrata. Ele é publicitário porque está dentro da a vidade de publicidade, mas não é o que faz a publicidade funcionar. Ele comanda, organiza, paga, compra, mas o publicitário mesmo é o que está ali vendo o que está acontecendo,
“Eu sempre fui curioso. Eu acompanhava o trabalho na boca da máquina na gráfica. Eu ia conferir o material que chegou do fornecedor, eu estava integrado no que eu estava atendendo.”
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vendo a necessidade do cliente e passando para o consumidor ou para o provável consumidor aquilo que o cliente precisa passar. Essa atuação de profissionais, não só publicitários formados, pode ser desastrosa também ou traz só bene cios? A boa propaganda não sustenta o mau produto e o mau profissional não se sustenta no mercado. Mas eu conheço também bons profissionais que estão fora do mercado. Tem um amigo que tem uma pousada na Ilha do Mel e foi durante muitos anos, inclusive, dono de agência. Ele se desencantou, perdeu clientes, não conseguiu mais voltar, mudou de profissão. Então, a recíproca é verdadeira, porque publicitário que não consegue comunicar pode até arrumar um lugar numa agência e ficar lá como burocrata, mas só para ver pedido de anúncio, bolar o anúncio, mandar de volta e não sai disso. O bom publicitário tem que fazer cursos, reciclagem, freqüentar congressos, viajar. Eu viajei e aprendi muito. Inclusive, tem algumas coisas que eu fotografei no exterior: outdoor etc. Além disso, sempre comprava revistas no exterior para comparar com o que estava sendo feito aqui. E você sempre ganha com isso. Viajar é um dos melhores treinamentos. O senhor acha que a propaganda é mais eficaz hoje ou an gamente? Mais eficaz? Depende do que você entende por eficaz. Porque a função da propaganda é informar sobre o produto e usar um apelo para que o consumidor vá procurar saber o que é e comprar. A função da propaganda é vender, mas para vender ela tem que informar, tem que mostrar, tem que interessar, fazer uma argumentação que seja oportuna para o cliente. Tem uma regra que eu aprendi, não sei se foi na escola de propaganda: o nome do produto deve aparecer nos primeiros 7” do comercial, e grande parte do que a gente vê ou ouve agora aparece na assinatura do comercial ou do jingle, no úl mo segundo, e no segundo seguinte já tem outro anunciante falando outra coisa. Percebe a dificuldade que eu vejo, que eu sinto? A cria vidade mostra coisas muito bonitas, mas não mostra o produto. Ou mostra o produto, mas não fala do produto. Principalmente porque o comercial é passado no intervalo, você está
“A função da propaganda é vender, mas para vender ela tem que informar, tem que mostrar, tem que interessar, fazer uma argumentação que seja oportuna para o cliente.” 34 | Coleção Memória da Publicidade - Pioneiros |Curi ba |p. 25-40 | 2014
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“Agência não é só criar. Tem muitos gênios criando, mas tem que finalizar. Hoje o computador ajuda muito, mas naquele tempo era tudo à mão.” ouvindo a novela e entra o comercial, muita gente vai na geladeira ou outra coisa e, se não es ver ouvindo, aquele comercial passa ba do. O comercial tem que mostrar. Mostrar o produto e falar sobre o produto. Muita gente lê anúncio e muita gente precisa ler anúncio para saber o que é o produto. Agora, você pega uma revista Caras, tem oito páginas seqüenciais com uma única frase de ponta a ponta mostrando o produto, mas não fala da qualidade do produto, da durabilidade, de como ele foi concebido, para o que serve, se tem outras opções de uso. Eu tenho essas minhas restrições pessoais, porque se fazem isso, são os grandes criadores e eles devem ter suas razão para fazerem isso. Eu não consegui perceber quais são ainda. Com a expansão da publicidade no Paraná, muitos profissionais acabaram vindo de outros Estados. Qual foi a contribuição desses profissionais para a publicidade local? A contribuição é profissional, porque o mercado já exis a. O que aconteceu foi que houve uma variedade de oferta de mão-de-obra, mas muita coisa ficou concentrada nas próprias agências grandes de São Paulo ou Rio. São Paulo principalmente. Porque uma boa parte das agências que atende cliente aqui e tem sede em São Paulo, tem uma filial aqui. Mas agora a maioria, principalmente com o computador, faz a criação on-line, simultânea. Um criador de São Paulo trabalhando junto com um criador daqui. Isso mexeu muito com o mercado local de profissionais. O ano de 1983 foi um ano ruim para a publicidade paranaense porque muitas contas foram remanejadas para outros Estados. Como as agências superaram esse ano ruim? Como elas saíram dessa fase? O que aconteceu é que algumas agências nossas, como a Opus Múl pla, foram buscar clientes em Santa Catarina. Fizeram a mesma coisa que São Paulo estava fazendo, pegando clientes daqui. E também diversificaram, começaram a dar mais atenção para a área imobiliária, para varejo e coisa e tal. A Opus, por exemplo, tem os melhores clientes em Santa Catarina. Então, houve uma passagem. Quem ia para São Paulo, parava aqui, e quem con nuou abriu caminho para lá. E o senhor acredita que a publicidade ajudou no desenvolvimento econômico do Brasil e do Paraná? Coleção Memória da Publicidade - Pioneiros |Curi ba | p. 25-40 | 2014 | 35
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“A proibição total é fogo! O conceito básico de publicidade é que ela não promove um mau produto, por melhor que seja a publicidade. E o conceito de mau produto varia de uma pessoa para outra.” Eu acho que a publicidade tem muito a ver com isso. A propaganda faz girar a oferta de produtos. Eu acho que tem muito a ver, absurdamente. Com o crescimento do número de agências, aqui no Paraná, foi criado o Sindicato das Agências de Propaganda do Estado do Paraná. Como o senhor avalia o trabalho que é feito pelo sindicato? O problema do número de agências é que houve muito a agência do “eu sozinho”, ou do “paitrocínio”, e essas agências não têm estrutura para se filiar ao sindicato. O sindicato tem aquelas exigências de número mínimo de funcionários, de funções, de atendimento. O sindicato representa o mercado, mas o mercado mais selecionado. Tanto que, a úl ma vez que eu soube, o sindicato estava com 60 agências filiadas e há mais de 300 no Paraná. A filiação ao sindicato é uma formalidade. O sindicato faz muita coisa, mas é um grupo um pouco fechado que par cipa. Ele reproduz legislação, reivindicações do mercado. E o que acontece também é o relacionamento com o governo. Agora eu não sei como está, mas até um tempo atrás, as agências que atendiam o governo eram aquelas que par cipavam da campanha eleitoral, então, a concorrência, que seria obrigatória, nem sempre acontecia. O sindicato é importante como en dade e como representa vidade, mas na prá ca diária de agência, não sei se sou eu que estou por fora, mas não dá para perceber. O sindicato é diferente de uma associação, ele tem representa vidade. Uma associação é mais de confraternização, de trabalho em conjunto, de fazer alguma coisa que não seja oficial. O senhor é a favor da proibição total de algum po de publicidade? 36 | Coleção Memória da Publicidade - Pioneiros |Curi ba |p. 25-40 | 2014
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A proibição total é fogo! O conceito básico de publicidade é que ela não promove um mau produto, por melhor que seja a publicidade. E o conceito de mau produto varia de uma pessoa para outra. Por exemplo, cigarro é uma coisa, bebida é outra, perfumaria é outra. O fato de proibir propaganda de cigarro não significa proibir o cigarro, e a propaganda é feita para incen var o uso, o consumo. Então, poderia aí haver uma restrição como existe o horário de seleção de público. Mas proibição total é di cil de acontecer. Como o publicitário deve agir quando é encomendada uma peça de um produto ruim, seja um eletrodomés co, algum polí co? A propaganda mostra o produto. Agora, se o produto sai com defeito de fábrica, isso já é outro problema, é problema para a defesa do consumidor. A propaganda já não tem a ver com isso. Se a propaganda incen va a compra do produto e na hora do uso ele não corresponde, já não é mais problema da propaganda, é problema do fabricante, do fornecedor, dos órgãos de defesa do consumidor. Na época da ditadura, houve agências e profissionais que trabalharam pela redemocra zação. Como o senhor vê a publicidade nesse momento da história? O que aconteceu na redemocra zação é que houve mais liberdade de expressão. Muita gente que estava lá no Chile, na Argélia ou em outros lugares e que nha como profissão escrever, por exemplo, voltou ao país para escrever. Eu acho que a abertura promoveu uma nova reciclagem de quem trabalhava nessa área. Porque o DIP, an go Departamento de Imprensa e Propaganda, era como temos hoje em alguns governos: uma agência no ciosa que só produz material para falar bem. Então, a ditadura fechou durante um tempo, mas nenhuma ditadura dura a vida toda. Tem ditadura que dura 40, 60 anos, mas não passa disso. O Mao Tsé-Tung fechou a China por anos e agora o país está em tudo que é mídia e abrindo espaço. Se bem que a gente não sabe muito o que está acontecendo lá dentro, mas dá para ver muita coisa diferente do que era no tempo do Mao. A relação entre as agências e o governo, nos mercados menores, geralmente é polêmica. Na sua avaliação, hoje há mais profissionalização nessa relação? Não. O que existe na relação entre cliente do governo e agência é troca de favores. Tem muita agência que, durante a campanha, trabalha de
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“A propaganda mostra o produto. Agora, se o produto sai com defeito de fábrica, isso já é outro problema, é problema para a defesa do consumidor. A propaganda já não tem a ver com isso.” graça sabendo que vai ter a conta do governo se o candidato ganhar. Até porque não há muita fiscalização de verba. Há muito desvio de verba e isso a gente sabe, não sou eu que estou falando, todo mundo sabe. No próprio livro tem alguma citação sobre isso: o governo fica os quatro anos sem fazer licitação porque, de qualquer forma, mesmo quem trabalha com agência escolhida, faz antes uma licitação com alguns detalhes que só aquela agência atende. Mas sim, tem governo nosso aí, que é recente, que não fez licitação, foi enrolando, foi empurrando com a barriga e não fez licitação. Como que as novas tecnologias estão impactando as a vidades dos publicitários? Uma boa pergunta. Eu acho que o problema com a tecnologia é exatamente a tecnologia. Porque cria vidade não há tecnologia que tenha. A idéia, o conhecimento de mercado, pesquisa, essas coisas, você tem métodos que a tecnologia facilita. Mas se não souber apertar um botão ou não souber fazer uma pergunta pra um ques onário de pesquisa, não tem tecnologia que resolva. Você tem que ter o seu talento para poder saber o que você quer, o que o cliente quer. Mesmo a parte gráfica e de televisão, de internet. Se você não tem um conteúdo na internet, ninguém vai abrir o seu site. Você tem que ter um site com conteúdo e divulgar esse conteúdo. Aí é que entra a propaganda também. O senhor acha que a internet pode ocupar o lugar da TV como uma mídia publicitária, pode rar a supremacia da TV? Eu acho que não. Quando apareceu o rádio, diziam que o jornal ia acabar. Quando apareceu a televisão, diziam que o rádio ia acabar. E depois veio a internet, que não subs tui a televisão, o jornal ou o rádio. A internet é um outro meio, um outro veículo. Principalmente porque a internet, como nos outros veículos de comunicação, faz propaganda nos intervalos, ou em janelas, ou em banners. Ela não vai subs tuir a publicidade. Você não vê uma página, um site, que tenha uma página inteira de anúncio. E na revista, você tem um anúncio inteiro, você pode parar para ler ou pode passar direto. Tem gente que vê a revista folheando ao contrário, mas a revista fica lá ou fica na sala de espera do den sta ou
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do médico e dura muito tempo, e a internet, não: você fez um click ali e já desapareceu, às vezes nunca mais volta, porque é coisa que eles vão reprogramando. O anúncio impresso, você vê pelo material que está aí: tem coisas aí de 100 anos que você está vendo agora. Tem produto que você pode comprar até hoje, o Toddy, alguma coisa assim, Cafiaspirina, que tem um anúncio feito há 100 anos e vale até hoje. E na internet, se você faz um anúncio agora, daqui a 10 minutos o site já rodou e você não vê mais.
Pesquisadores Acadêmicos: Fernanda Cordeiro Mar ns | Nathalia Bidone Fernandes Âncora: Guylherme Custódio
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MEMÓRIA DA PUBLICIDADE PARANAENSE MEMÓRIA DA PUBLICIDADE PARANAENSE MEMÓRIA DA PUBLICIDADE PARANAENSE MEMÓRIA DA PUBLICIDADE PARANAENSE MEMÓRIA DA PUBLICIDADE PARANAENSE MEMÓRIA DA PUBLICIDADE PARANAENSE MEMÓRIA DA PUBLICIDADE PARANAENSE MEMÓRIA DA PUBLICIDADE PARANAENSE MEMÓRIA DA PUBLICIDADE PARANAENSE MEMÓRIA DA PUBLICIDADE PARANAENSE MEMÓRIA DA PUBLICIDADE PARANAENSE MEMÓRIA DA PUBLICIDADE PARANAENSE
Zeno Otto
MEMÓRIA DA PUBLICIDADE PARANAENSE MEMÓRIA DA PUBLICIDADE PARANAENSE MEMÓRIA DA PUBLICIDADE PARANAENSE MEMÓRIA DA PUBLICIDADE PARANAENSE MEMÓRIA DA PUBLICIDADE PARANAENSE MEMÓRIA DA PUBLICIDADE PARANAENSE MEMÓRIA DA PUBLICIDADE PARANAENSE MEMÓRIA DA PUBLICIDADE PARANAENSE
“A voz era de um dono só”*
Zeno José O o, publicitário paranaense de renome, combina uma voz cansada – permeada de bemóis graves que dão um segundo tom às palavras – a uma fala irradiante: ele tem o dom de atrair interlocutores. Se por um lado a voz é fraca, por outro a fala tem a força e a fineza de quem resgata idéias inovadoras e cria vas. Por isso, Zeno não silenciou quando, por problemas de saúde, deixou de falar porque “a voz foi infiel, trocando de traquéia/E o dono foi perdendo a voz”. Ao invés de calar-se como um taciturno, o publicitário seguiu o conselho da música e decidiu que “a voz [dele] era de um dono só”: aventurou-se pelo mundo virtual e aprendeu a resmungar um “francês de japonês” – como na situação em que precisou u lizar ferramentas da internet para traduzir e-mails do belga para o inglês e, só então, para o português. O leitor dessa entrevista poderá compar lhar das radas inteligentes e espirituosas de Zeno: “Sempre houve ‘os anos dourados’. Daqui vinte anos vocês vão dizer que esta é a era dourada. Então, não era [uma época] român ca – é que dá saudades nos coroas e provoca inveja nos jovens”. A entrevista tem também a franqueza que desarma, quando Zeno afirma que sua primeira agência, a P.A.Z., teve tudo para não emplacar – pelo excesso de ar stas, tão espontâneos quanto desorganizados – ao mesmo tempo que o fazia se sen r orgulhoso: não é todo dia que se pode trabalhar lado a lado com Paulo Leminski. Filho de militar, Zeno nha como des no o cumprimento de ordens e assim o fez: organizou mentalmente os momentos especiais que viveu e os guardou na “memória de elefante fantás ca”, que gera espanto até nele próprio. Afinal, era necessária uma ordem em alto e bom som para o seu “arsenal de idéias”. Entretanto, foi o garoto travesso que nunca deixou de ser quem, no final dos anos 80, armou uma jogada de marke ng que fez história no futebol paranaense, no episódio quase cômico que resultou no nascimento do Paraná Clube. A fusão entre Colorado e Pinheiros só foi possível graças à afobação de um diretor deste úl mo clube: na pressa porque nha um encontro, assinou a fusão dos mes. “Não fosse a amante, não nha o Paraná”, brinca o publicitário, que tão bem combinou as virtudes militares às travessuras. Coleção Memória da Publicidade - Pioneiros |Curi ba | p. 41-54 | 2014 | 41
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Zeno O o - “A voz era de um dono só”
Para ele, quem faz boa propaganda é um “construtor de marcas fortes”. Para não fugir à analogia com o futebol, é aquele que cria uma empa a tão grande que consegue transformar o consumidor numa espécie de “torcedor” do produto ou serviço que está comprando. Nesta entrevista, Zeno relembra fatos e passa adiante, com o rigor de quem está de fato interessado em compar lhar conhecimentos, sua longa experiência. O leitor mais atento com certeza conseguirá ouvir ao fundo “a voz do dono”. Nela, Zeno recuperou a fala: “minha voz, se vós não sereis minha/ vós não sereis de mais ninguém”. É hora, portanto, de escutá-lo. *Trechos da canção “A voz do dono e o dono da voz”, de Chico Buarque de Holanda. Hendryo André
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Você costuma afirmar que a publicidade encontrou você. Como isso aconteceu, como e quando a publicidade descobriu você? Meu pai – ninguém é perfeito – era militar. Ele queria que eu fosse sargento. Eu imaginava: eu, sargento? Que coisa mais horrível! Nessa época, com as transferências do meu pai, eu conheci Belém do Pará, Recife, Salvador, Rio de Janeiro, São Paulo, Livramento, no Rio Grande do Sul, Palmas, Tibagi, Castro. E felizmente sempre ve uma memória de elefante – ela é fantás ca, nem eu acredito. Sou capaz de desenhar a planta da casa em que eu morei quando eu nha dois anos e tenho o hábito de rememorar, reavivar. Então, para a propaganda, abasteci muito o meu subconsciente. Eu nha um arsenal de idéias e, principalmente, sabia captar a personalidade de cada cidade, porque duas cidades iguais, é impossível. Quando eu nha 15, 18 anos, não nha nenhuma agência de propaganda em Curi ba – faculdade muito menos. E eu não sei por quê – intuição, uma vocação latejante – fui buscar em São Paulo, buscar nas agências de lá, como é que se fazia propaganda. Ninguém me ensinava, mas eu aprendia tudo. Vim para cá e comecei. Aí fui aprendendo às custas do dinheiro do cliente. Fui indo, fui indo, até o momento em que cheguei a ser um diretor de criação tão requisitado que fui o funcionário, vamos dizer assim, mais bem pago de uma agência nacional, morando em Curi ba. E foi dessa agência que eu fundei a P.A.Z. Mas a propaganda foi surgindo assim, aos trambolhões. Eu não nha essa ambição, essa determinação, não. Foi por acaso. É verdadeiro a gente afirmar que houve uma época român ca da publicidade e hoje ela está mais profissional? Quando eu era guri, meu o Tadeu contava as histórias de quando ele era jovem. Ele falava: “Aqueles eram os anos dourados”. Sempre houve “os anos dourados”. E a gente tem saudade é da gente, não é porque aqueles anos é que eram bons. Daqui a vinte anos vocês vão dizer que esta é a era dourada. Então, não era român co – é que dá saudades nos coroas e provoca inveja nos jovens. E quanto às agências de publicidade? Quais eram as dificuldades e quais são as dificuldades de hoje? Em termos de fazer e criar a propaganda, ficou bem mais fácil. O que
“Quando eu Ɵnha 15, 18 anos, não Ɵnha nenhuma agência de propaganda em CuriƟba – faculdade muito menos. Fui aprendendo às custas do dinheiro do cliente. A propaganda foi surgindo assim, aos trambolhões. Foi por acaso.” Coleção Memória da Publicidade - Pioneiros |Curi ba | p. 41-54 | 2014 | 43
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“Montar uma equipe com Paulo Leminski como redator (ele trabalhava com uma garrafa aqui do lado), ReƩamozo, Paulo Vítola, Solda, Miran... Era um bando de arƟstas, não podia dar certo. Não queriam vender propaganda, mas os clientes vinham comprar. Deu certo.” ficou mais di cil é que naquela época havia uma ingenuidade, mas um bom-cara smo, um grau de confiança. Quando nós pegamos, como cliente, o Posi vo e criamos um anúncio de um minuto produzido em película, em cinema, em São Paulo, que custou, se não me engano, 80 mil dólares, a produtora concordou em rachar o pagamento. Fomos para a Rede Globo para veicular. Hoje em dia, se você não ver um cadastro, um fiador, você não põe o comercial no ar. Eles punham. Bem, com esse comercial, com a boa vontade da produtora, com a boa vontade dos canais, o Posi vo, sem exagero, na época saiu de 297 alunos para 5 000 e pegou um bom bife de modernidade, de inteligência, deslanchou. Mas outra coisa que é ruim para vocês é que a maioria das agências, agora, pertence a mul nacionais. Então você acha que está ficando mais di cil ter o próprio negócio na área? Ter a própria agência? Olha, honestamente, eu não sei te responder. Porque isso é questão de sorte. De repente não nha nada para dar certo e deu certo. Eu acho que tem que tentar. Pior se arrepender por ter feito do que se arrepender por não ter feito. Na sua própria agência, a P.A.Z., você trabalhou com publicitários bem renomados que hoje a gente estuda aqui na faculdade. Por que você se desvinculou da agência? Todo mundo pensa que o Z da P.A.Z. é de Zeno. Não é. Eu nha um estúdio de arte chamado Phase, e eu nha um amigo, Gino Zandoná, que se chamava, na realidade, Adolar Zandoná, que nha uma agência 44 | Coleção Memória da Publicidade - Pioneiros |Curi ba | p. 41-54 | 2014
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chamada AZ. Fizemos uma junção: ficou o P da Phase mais o AZ. E o nome pegou. Depois o Gino mudou de rumo, mas o nome ficou. Agora, sobre a fauna da P.A.Z., dificilmente, no Brasil, haverá uma agência tão inviável quanto foi a P.AZ. Por quê? Montar uma equipe com Paulo Leminski como redator (ele trabalhava com uma garrafa aqui do lado), Re amozo, Paulo Vítola, Solda, Miran... O Miran, por exemplo, hoje em dia é um dos maiores ar stas gráficos do mundo – pena que não mora mais em Curi ba, não trabalha mais para cá. Mas era um bando de ar stas, não podia dar certo. Não queriam vender propaganda, mas os clientes vinham comprar. Deu certo. Com o avanço da tecnologia, como foi a sua adaptação? Eu não fiquei com medo. Com 50, 60 anos, no computador, aprendi fácil, gostei, e é muito fácil operar com o computador, principalmente quem teve o passado que eu ve, de criar anúncio, de fazer layout com guache, nanquim, pincel, letraset. Se o cliente mudasse uma coisinha na idéia, nha que simplesmente fazer tudo de novo. Então, a gente cuidava muito para não errar. Tinha que criar na cabeça antes. No computador, eu não vou criar com o dedo, vou executar – aí os recursos do computador são fantás cos, dá até para lapidar. Eu nha imaginado vermelho, mas acho que um bordô fica melhor: não precisa pintar tudo de novo. Você teve um problema grave de voz, que o deixou afônico. Como foi isso para um comunicador? Nem eu sei direito como é que eu consegui sobreviver. Mas eu sei. Vender idéias depende muito de entusiasmo, até de interpretação. Se você vai contar o roteiro de um filme, tem que contar com aquela arte, com a aquela graça com que se conta uma piada. Senão, o cliente não enxerga. Tem que saber contar. E sem voz? Já com voz não é fácil, sem voz, impossível. Sem voz, eu perdi todos os clientes, faturamento, e não nha para quem me queixar. Também foi uma época que eu nunca ouvi tanta pergunta idiota: “O que foi que houve?”
“Sempre houve ‘os anos dourados’. Daqui vinte anos vocês vão dizer que esta é a era dourada. Então, não era [uma época] românƟca – é que dá saudades nos coroas e provoca inveja nos jovens.” Coleção Memória da Publicidade - Pioneiros |Curi ba | p. 41-54 | 2014 | 45
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“Vender idéias depende muito de entusiasmo, até de interpretação. Se você vai contar o roteiro de um filme, tem que contar com aquela arte, com a aquela graça com que se conta uma piada.” Tive que vender casa, apartamento em Camboriú, chácara. Vendi tudo do jeito que deu porque precisava de dinheiro. Quebrei totalmente quebrado. E uma bela noite, olhando no espelho, eu disse: “Mas, Zeno, você sempre foi me do a besta, diz que é criador, então vamos ver. Você está com um belo problema, contrato você para resolver”. E pensei, pensei, pensei, e aí a internet foi a solução. Com a internet eu podia falar e mostrar. Claro que não é a mesma coisa, mas teve outras coisas que compensaram. Criei um site e eu comecei a criar mais programação visual para a Europa. Aqui no Brasil não consegui ninguém, nenhum cliente. Numa língua secreta chamada português, o cara viu, gostou, entrou em contato, falando “belga”, eu traduzindo aquele troço com o tradutor do computador, do “belga” para o inglês, do inglês para o português – sempre digo que ficava um francês de japonês. Mas deu para entender. Ele elogiava muito, que nós la nos sabíamos lidar com cor – o europeu não sabe. Eles são tristes, porque o mundo lá é sem cor. Vermelho não existe, o céu não é azulão. O nosso é azul cafona; lá, não. E foi ali que eu comecei a receber em euros e consegui equilibrar minha vida. Você costuma contar a história de um diretor de marke ng da Editora Abril que falava da ineficiência dos anúncios nos Estados Unidos. De que forma isso influenciou na sua carreira em criação? Esse sujeito soube, de alguma maneira, que foi feita uma pesquisa nos Estados Unidos e que 60% dos anúncios, lá, não sur am o efeito que poderiam sur r por falhas técnicas, erros crassos. “Se nos Estados Unidos, capital da propaganda, 60% dá errado”, ele falou, “acho que no Brasil são 102%”. Ele estava com um desafio de como ensinar agência de propaganda a fazer propaganda. Mas eu me encontrei com ele, paguei umas cervejas: “Quais são esses erros?” E ele me contou: são mais ou menos dezessete. Uma das coisas que eu aprendi foram os sete mandamentos para você fazer uma boa propaganda de venda – não uma propaganda ins tucional. Mandamento um: oferecer ao público-alvo o principal bene cio do produto. Vamos imaginar um vendedor do Baú da Felicidade, lá no Sí o Cercado; ele bate palma, a mulher abre a cor na: “A senhora quer ganhar um milhão?” Mandamento dois: a pessoa ficou curiosa, está com a cabeça aberta para te ouvir, então explique como é que ela pode ganhar um milhão. Mandamento três: 46 | Coleção Memória da Publicidade - Pioneiros |Curi ba | p. 41-54 | 2014
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as pessoas não são burras eternamente. Na metade da conversa, cai a ficha da mulher: “papo de vendedor”, “papo de propaganda”. Aí tem que ter algum argumento que comprove que é verdade. Provocar de alguma maneira: “Sua vizinhança toda comprou, só a senhora vai ficar sem?” Mandamento quatro: esse é o mais maquiavélico, dizem que é o que mais funciona – o que a pessoa perde se não comprar. As pessoas se preocupam mais em garan r o que têm do que em ganhar. Mandamento cinco: faça um repeteco de tudo que foi falado até agora. A síntese, porque é a primeira vez que a pessoa está ouvindo ou vendo, então é bom dar uma repe da: “Olha o milhão!” Até para dar um ritmo, um clima de chegada para fechar o negócio. Mandamento seis: dê um prazo – “Vá amanhã mesmo”, ou, sei lá, “Apenas quatro dias”, ou “Só até sexta”. Dê um jeito de dar um prazo. Mandamento sete: diga o que a pessoa tem que fazer. Muitos anúncios colocam o logo po, o endereço, e não dizem “compre”, “alugue”, “telefone”, nada. Tem que ter uma voz de comando para o anúncio. Há algum tempo atrás, as lojas C&A veram uma campanha do dia dos namorados barrada pelo CONAR por causa do conteúdo. Você já passou por algo semelhante na sua carreira? Infelizmente, já. E o pior: eu não nha razão. Achei que fui cassado honestamente, justamente. Nós nhamos um cliente que fazia esses exames de saúde, check-up. E o mote da campanha era para fazer um check-up para preservar a saúde, uma questão de prevenção. Era assim: “Existem muitas maneiras de brincar com a vida. Uma delas é não fazer check-up”. Só que a ilustração era um cara colocando bala no revólver para brincar de roleta russa. Foi proibido com a jus fica va de que, se esse comercial passa na casa de alguém que está emocionalmente abalado, pode ser um pequeno es mulo, a gota d’água. Segundo o website do CONAR, a missão do conselho é impedir que a publicidade enganosa ou abusiva cause constrangimento ao consumidor ou a empresas. Você acha que esse obje vo tem sido cumprido? Eu ainda con nuo vendo comerciais de remédios na televisão que são uma hipocrisia total, porque diz que faz milagre e depois: “Se não sur r efeito, consulte um médico”. Livrei a minha cara, men , pero no
“Vejo centenas de comerciais da área de telefonia na televisão. Eles são os campeões do PROCON, prometendo coisas que não vão cumprir. Eu acho que o CONAR deveria ser mais parceiro do PROCON.” Coleção Memória da Publicidade - Pioneiros |Curi ba | p. 41-54 | 2014 | 47
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mucho. Vejo centenas de comerciais da área de telefonia na televisão. Eles são os campeões do PROCON, prometendo coisas que não vão cumprir. Eu acho que o CONAR deveria ser mais parceiro do PROCON. Como você acha que o publicitário deveria agir em relação a uma campanha que é entregue a ele e ele tem consciência de que aquele produto é ruim? A boa propaganda apressa a falência do mau produto. Mais gente vai conhecer, experimentar o produto, encantada, e vai se decepcionar. Depois, recuperar um produto que perdeu a dignidade, o respeito... É melhor começar tudo de novo, porque não recupera mais. Toda propaganda devia pensar muito, e talvez nem devesse se chamar comunicação, nem propaganda. Deveria se chamar construção de marcas fortes. Uma marca forte tem um compromisso com o mercado consumidor. Ela provoca uma certa lealdade de confiança mútua. Chega um ponto em que o fabricante confia no seu público porque ele conquistou, merece o consumidor. Mas, infelizmente, o capitalismo é meio cruel. Eu concordo que o comunismo é uma porcaria, mas o capitalismo é outra. A maioria dos países mais pobres do mundo não foi comunista, mas o no ciário não mostra. É só aquele mundo encantado, de sucesso. Então, a comunicação tem esse poder muito grande, e devia ser feita com mais responsabilidade. A relação entre agências e governo, nos mercados menores, geralmente dá polêmica. Você acha que há mais profissionalismo nessa relação hoje em dia? A P.A.Z. nha 50 funcionários aqui em Curi ba, 80 em Porto Alegre e 20 em Blumenau. Eu vivia de avião pra lá e pra cá que nem um doido. Só uma vez nós atendemos uma conta de governo e, mesmo assim, porque foi uma concorrência e a P.A.Z. ganhou. Era a campanha do Zequinha, os pais de vocês deverão se lembrar. Tem números. Nós poderíamos dizer que algo em torno de 90% da população paranaense da época par cipou a vamente da campanha, colecionando aquelas figurinhas do álbum, para ganhar prêmio. Dificilmente outra campanha publicitária de governo terá tanta par cipação, tanto efeito. E o obje vo dessa campanha era trocar notas fiscais por um envelope com figurinhas. A receita do Estado cresceu barbaridade, porque todo mundo começou a pedir nota fiscal. Tanto é que eu fiz uma proposta – sou negociante, não sou burro. Cheguei para o secretário da Fazenda e falei: “Vamos fazer o seguinte: eu quero 1% do aumento [de receita] e eu pago a propaganda”. Ele não topou. Porque foi uma coisa avassaladora. E é gozado que, na época que se 48 | Coleção Memória da Publicidade - Pioneiros |Curi ba | p. 41-54 | 2014
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fez essa campanha (o governador era o Ney Braga), esse personagem, Zequinha, já era velho, já era coisa dos avós – um desenho an quado, feio, mas não dava para mexer, nha que respeitar. E por incrível que pareça, tempos depois, voltou a fazer sucesso. O Zequinha foi uma febre entre adultos e crianças, então? Total. Teve cenas assim, de um banco em que começaram a proibir a troca de figurinhas. Tinha jogo de bafo e estava tumultuando o expediente. A classe média no Brasil vem ganhando uma posição importante como consumidora. Isso muda o jeito de fazer publicidade, tem que inves r mais na classe média? Tem uma coisa que influencia: O Brasil foi administrado por uma elite durante 180 anos e essa elite, para se manter, não fez muita questão de esparramar cultura. Mas, de repente, aparece a liderança e muda. Talvez não seja o administrador ideal, mas ele aglu na. O que isso tem a ver com a tua pergunta? Cansei de ouvir clientes meus dizerem: “O povão é burro, o povão gosta de qualquer coisa, não vai entender isso”. Comecei a pensar melhor quando, conversando com uma ascensorista, perguntei: “Se ganhasse na loteria, o que a senhora faria?” “Eu compraria uma Ferrari e ia viajar para a Europa!” Então, tem muita gente que é ignorante, mas não é burra. Ignorante porque ignora, não teve a oportunidade de saber, mas burra não é. A propaganda tem que aprender. Vou dizer uma coisa que choca: se você pegar a revista Caras, que é da elite, vai ver que tem que inverter: a propaganda inteligente tem que ser para [o pessoal de] “baixo”.
“Vou dizer uma coisa que choca: se você pegar a revista Caras, que é da elite, vai ver que tem que inverter: a propaganda inteligente tem que ser para [o pessoal de] ‘baixo’.”
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“A boa propaganda apressa a falência do mau produto. Mais gente vai conhecer, experimentar o produto, encantada, e vai se decepcionar. Depois, recuperar um produto que perdeu a dignidade, o respeito... É melhor começar tudo de novo.”
Vendo as mudanças rápidas na profissão, o que você acha que deve ser mudado no ensino de publicidade? É aquilo: como entender o ser humano. Fazer texto, layout para conversar com o ser humano. Existe uma palavrinha muito safada que quem me ensinou foi o Paulo Leminski: proscênica. É de um estudo feito pelo Umberto Eco, o que ele chama a linguagem das distâncias. Existem distâncias amistosas, amorosas, hierárquicas. Existe uma distância certa para você examinar uma coisa. Então, fotografe dessa distância. Eu nha um cliente, Móveis Kastrup, que construiu o que seria um showroom, e estava vazio. Coloquei uma escrivaninha no meio e comecei a chamar pessoas para elas rodearem e verem qual era a distância, qual era o ângulo que elas mais gostavam – era quase aquele que vocês estão pensando. Antes, eu fotografava de baixo para cima – umas coisas loucas, bonitas, mas não vendia coisa nenhuma, porque ninguém compra móvel de quatro. Então, se nha um puxador na gaveta que chamava a atenção, comecei a usar [ali] essa técnica da proscênica, da distância certa. Mas a distância certa está até no linguajar. Tem horas que você tem que ser mais formal, tem hora que você tem que pôr a mão no ombro – e essas distâncias precisam ser medidas. Acho, por exemplo, que a IBM é uma empresa muito distante da gente. Ela nunca estendeu a mão: “Prazer!” É esse o medo que eu tenho de ficar muito mecanizado. Está faltando alguém colocar a mão no ombro, vamos conversar, respeitando a pessoa. O que eu recebo de spam, de telefonema no celular. Mas, em compensação, cada comercial que a gente vê na televisão, porque é possível fazer tudo hoje. Colocar um elefante aqui? Dá para pôr. An gamente não dava. É só ter cabeça, ter idéia. Você sempre ressalta a importância do retângulo áureo na criação de uma peça publicitária. Pode explicar um pouco essa técnica? Como ela ajudou você? Não tem nada de mágico, não tem nada de mís co. É simplesmente uma coisa meio aritmé ca e universal. Tem exemplos de “n” coisas coincidentes com essa proporção áurea. E eu ve a felicidade, quando estava começando, de conhecer um grande diretor de arte que me mostrou um livro desta grossura cheio de realizações, de coisas
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eternas: Ateneu, Partenon, Mona Lisa. Na frente de cada uma dessas ilustrações, nha um papel vegetal quadriculado, uma grade. Cada quadradinho era meio retangular. Você punha em cima, nha a base: onde estava o olho da Mona Lisa. A gente não vê as obras de arte nessa grade, mas sente que têm algo inexplicável. Entram em harmonia com um ritmo, ou sei lá o quê. Então, quando eu faço um anúncio, primeiro é a grade e parece que fica di cil, fica meio quadradão, cer nho. Quando eu trabalhava na P.A.Z. fazia anúncio dentro do retângulo áureo e eu mesmo achava que estava muito cer nho demais. Aí eu chegava para um louco, um Re amozo, um Solda: “Está muito cer nho, avacalha um pouco”. Um deles pegava um batom e fazia um olho, dava vida. Uma das teorias que você segue é a teoria dos três Cs. Você poderia contar um pouquinho pra gente sobre isso? Eu conheço outra, dos três Ts – técnica, talento, tutano e entusiasmo. É bom lembrar: para resolver um problema, você tem que entender, compreender; se você não prestar atenção, não ficar curioso, não entender, você não vai resolvê-lo. Isso explica por que eu só rava zero em matemá ca. Eu não conseguia prestar atenção no problema. Então, primeiro passo: vamos entender, vamos lá conhecer, e conhecer em primeira mão. É ir lá conversar – cliente nenhum morde e cliente gosta de conversar com o pessoal de criação. Só que não pode ser muito, porque, nós, profissionais de criação, saturamos. O cara é metódico, administrador; tem uma hora que enche o saco. O segundo dos Cs, depois de capacidade de compreender: capacidade de cri car. Cri car, não no sen do de cair de pau, mas no sen do de analisar, fazer uma análise crí ca. E, finalmente, criar. Aí você tem tudo. Você afirma que ser publicitário é colocar as placas. O que isso quer dizer? É di cil explicar isso – só com palavras e sem voz. Existem dois pontos que são muito importantes, fundamentais nas vidas de todos nós: há um momento em que a gente nasce e há um momento em que a gente morre. Entre esses dois pontos, cada um de nós poderia fazer o roteiro que quisesse, o caminho que quisesse. [Mas] na prá ca não é assim. Logo depois que a gente nasce, já colocam uma placa: teu nome
“Logo depois que a gente nasce, já colocam uma placa: teu nome vai ser esse, em tal religião, tal roupa você pode vesƟr, com tal coisa você pode brincar e vai até o úlƟmo ponto. Algumas dessas placas é o publicitário que faz, que coloca.” Coleção Memória da Publicidade - Pioneiros |Curi ba | p. 41-54 | 2014 | 51
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“Se você usa só o lado racional, deixa de ser comunicação para ser só comunicado, ‘por ordem do rei Arthur’. O só emocional é uma delícia de fazer, mas pode ficar meio babaca. Então, o bom é quando o emocional ilustra, ajuda o lado racional.” vai ser esse, em tal religião, tal roupa você pode ves r, com tal coisa você pode brincar e vai até o úl mo ponto. Algumas dessas placas é o publicitário que faz, que coloca. “Agora vocês vão gostar de rock’n roll, agora a moda é jeans – e quem não for, está por fora”. Muitas das placas somos nós quem colocamos. O profissional de publicidade deve equilibrar os apelos à razão e à emoção. É possível fazer uma propaganda u lizando só a razão, ou só a emoção? Que dá, dá. Mas, se você usa só o lado racional, deixa de ser comunicação para ser só comunicado, “por ordem do rei Arthur” – é totalmente racional. O só emocional é uma delícia de fazer, mas pode ficar meio babaca. Então, o bom é quando o emocional ilustra, ajuda o lado racional. Vou dar o exemplo do Mer olate, esse remedinho para criança, que arde e a mãe assopra. Aí fizeram um comercial muito bom, do Mer olate spray, que dizia que já vem com o assopro. Uma idéia óbvia. Outro case diver do da sua carreira foi a criação da iden dade visual do Paraná Clube. Na década de 80, você teve que conseguir alguma coisa para unir o Colorado e o Pinheiros. Conta pra gente, porque é diver da essa história. Eu vou ter que omi r nomes. Bem, como eu falei, sou muito intui vo. Eu nha um cliente chamado Waldomiro Perini, um grande representante de bebidas no Brasil – produtos da Amarula, Vodka Viborova. Um dia eu estava lá [no escritório dele] e chegou uma visita. Ele estava 52 | Coleção Memória da Publicidade - Pioneiros |Curi ba | p. 41-54 | 2014
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ocupado e me pediu para fazer sala. Essa visita era o presidente do Pinheiros, Melo Pacheco. Na época, eu não era mais Colorado – fui Ferroviário, [mas] quando mudou para Colorado, cortou o barato. E o único assunto que eu podia conversar com o Melo era sobre futebol. Aí baixa esse “caboclo” e eu resolvi men r. Descaradamente eu disse: “Olha, seu Melo, fiz uma pesquisa lá na agência, muito séria, muito profunda, e só existe uma saída para o Pinheiros: é uma fusão com o Colorado”. Ele: “Por quê?” “Porque o Pinheiros, nessa década, se não é campeão, ra o vice, e con nua com 16 torcedores. O Colorado é uma esculhambação, é um me emocional, mas tem 17% da torcida”. O Melo Pacheco disse: “É isso aí, é uma boa idéia. Mas eu não vou lá pedir”. O Perini chegou, mudou de assunto. Aquelas coincidências: estou num restaurante, o Bologna, de repente olho lá no canto, um diretor do Colorado, Darci Piana. Pensei: vou falar aquela coisa. Não, não vou. Vou, não vou. Fui. Contei a mesma história inver da e ele achou uma boa idéia. “Só que eu não vou lá.” Passou-se um tempo, me lembrei: Pinheiros, azul; Colorado, vermelho. Meio a meio. Pra não dar briga. E aí já fui criar o brasão, o uniforme. Fiz tudo e convidei as duas diretorias. Vieram, eu nha uma mesa de reunião enorme e coloquei todas as peças, que nem uma escola de samba, para impressionar. Chegou a comi va do Pinheiros. Na frente, um cidadão, que nha uma grande autoridade no clube. Deu uma olhada assim e disse: “É isso aí, pode fazer”, e foi embora. Depois é que chegou a turma do Colorado e aprovou também. Mas aprovou porque não nha outra solução e porque o Pinheiros já nha aprovado, não dava para negociar. Tempos depois, porque leva tempo a fusão de um clube de futebol, juridicamente é complicado, encontrei um diretor do Pinheiros e falei: “Poxa, bacana aquele cara lá”. E ele: “Ah! Aquele cara [o diretor que aprovara a fusão] é muito safado: ele tem uma amante e nha hora marcada. Só foi lá para ter habeas corpus!” Se não fosse a amante, não nha o Paraná. Outra história de sucesso foi a criação da logo do Posi vo, a famosa mãozinha. De onde veio a inspiração? Sabe que eu não sei? Nenhuma campanha, nenhum anúncio é de um homem só. Sempre tem um redator, um ilustrador e, depois, cada um deles põe no seu por ólio e vai procurar outro emprego, usando aquele
“Nenhuma campanha, nenhum anúncio é de um homem só. Sempre tem um redator, um ilustrador e, depois, cada um deles põe no seu porƞólio e vai procurar outro emprego, usando aquele anúncio.” Coleção Memória da Publicidade - Pioneiros |Curi ba | p. 41-54 | 2014 | 53
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anúncio. No início do Posi vo, havia uma certa sintonia, a energia era boa. Era uma turma que a gente sen a, a gente via sucesso no ar, captavam tudo, fácil: por mais absurda que fosse a idéia, apostavam. E, quando o cliente confia, você assume um compromisso que não tem desculpa. Então, nós éramos obrigados a fazer o melhor para o Posi vo, para funcionar. Porque senão, da outra vez, ele ia querer aprovar, mudar. Numa ocasião, no início, um dos comerciais – muito bom, emo vo – mostrava uma mãe costurando e ouvindo rádio, numa casa simples, numa casa de madeira com sarrafo. Ela ouvindo rádio, e o som, aquele resultado de ves bular. De repente o rapaz abre a porta: “Mãe, passei”, e ela vai em câmara lenta abraçar o filho e começa a se lembrar das coisas de criança. O filme era fantás co e muito bem produzido. Porque não adianta ter uma puta idéia e ser mal produzido. O diretor foi fantás co. E fantás co foi o Oriovisto [Guimarães, reitor da Universidade Posi vo], que chegou no final do copião e disse: “Eu só tenho uma coisa para rar”. “O quê?” “A assinatura, o logo po do Posi vo – não precisa. Esse comercial só pode ser do Posi vo.”
Pesquisadores Acadêmicos: Arianna Lais da Silva | Estela Drugovich | Vanessa Mafra Âncora: Hendryo André
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MEMÓRIA DA PUBLICIDADE PARANAENSE MEMÓRIA DA PUBLICIDADE PARANAENSE MEMÓRIA DA PUBLICIDADE PARANAENSE MEMÓRIA DA PUBLICIDADE PARANAENSE MEMÓRIA DA PUBLICIDADE PARANAENSE MEMÓRIA DA PUBLICIDADE PARANAENSE MEMÓRIA DA PUBLICIDADE PARANAENSE MEMÓRIA DA PUBLICIDADE PARANAENSE MEMÓRIA DA PUBLICIDADE PARANAENSE MEMÓRIA DA PUBLICIDADE PARANAENSE MEMÓRIA DA PUBLICIDADE PARANAENSE MEMÓRIA DA PUBLICIDADE PARANAENSE
Ernani Buchmann
MEMÓRIA DA PUBLICIDADE PARANAENSE MEMÓRIA DA PUBLICIDADE PARANAENSE MEMÓRIA DA PUBLICIDADE PARANAENSE MEMÓRIA DA PUBLICIDADE PARANAENSE MEMÓRIA DA PUBLICIDADE PARANAENSE MEMÓRIA DA PUBLICIDADE PARANAENSE MEMÓRIA DA PUBLICIDADE PARANAENSE MEMÓRIA DA PUBLICIDADE PARANAENSE
Mul plicador de idéias
Ernani Buchmann não é apenas um grande publicitário, mas também um importante idealizador e formador. Graduado em Direito pela Universidade Federal do Paraná, rou o diploma, mas percebeu que sua verdadeira paixão era a área de comunicação. Começou como repórter de rádio, na década de 70, e até hoje atua como comentarista. Suas especialidades sempre foram o jornalismo espor vo e o cultural, que depois dividiram lugar com o mundo da publicidade. O futebol tem espaço ca vo na vida desse pioneiro. Além de ter sido presidente do Paraná Clube de 1996 a 1998, Buchmann também é autor de livros sobre o esporte, como Quando o futebol andava de trem e O ponta perna-de-pau. Em sua extensa bibliografia, também consta uma publicação especial sobre as curiosidades da vida curi bana, Onde me doem os ossos, além de outros seis livros. Catarinense, natural de Joinville, Ernani tem uma relação especial com Curi ba, pois foi aqui que começou a carreira e é onde mora há 49 anos. Foi ele quem trouxe para a então provinciana capital paranaense o conceito de dupla de criação, tão comum nas agências publicitárias de hoje, mas que na década de 60 só exis a em grandes capitais, como Rio de Janeiro e São Paulo. Ernani teve passagem por agências publicitárias de visibilidade nacional, nas quais trabalhou como revisor, redator e diretor de criação. Começou na LM Propaganda, trabalhando depois na SGB, ambas no Rio de Janeiro. Em Curi ba, foi redator da Foco Propaganda e da Múl pla; diretor da P.A.Z.; e sócio da Exclam, entre 1982 e 1988. No ano seguinte, criou, com Antônio Freitas, a Master Comunicação. Hoje presta consultoria a agências e grupos empresariais. Nessas andanças, o publicitário conviveu com grandes nomes da cultura, especialmente Paulo Leminski – amigo, professor e colega de trabalho, na P.A.Z. e na Exclam. Um dos mais famosos e cria vos comerciais de TV da história da nossa propaganda foi criado por Ernani Buchmann. O filme de lançamento do freezer Prosdócimo, no início dos anos 1980, que nha um esquimó como personagem, marcou não só pela inicia va inovadora de rodar as cenas em cenários gelados de verdade, nos Estados Unidos, e em tempo recorde, mas Coleção Memória da Publicidade - Pioneiros |Curi ba | p. 55-72 | 2014 | 55
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também pela competência da campanha: um dia depois de ter ido ao ar, não havia mais nenhum freezer nas lojas de todo o Brasil. Hipera vo, curioso, leitor assíduo de livros, jornais e textos da internet, falante, comunica vo, o veterano publicitário sabe expressar claramente suas idéias e não tem papas na língua. Ácido em algumas respostas, crí co consciente em outras e, acima de tudo, mostrando-se um profissional exigente e inovador, Ernani Buchmann prova mais uma vez, na entrevista a seguir, que é um mul plicador de idéias. Amanda Mercer de O. Ribas
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É possível afirmar que houve uma época român ca na publicidade e que hoje ela foi perdida? O momento de criação hoje é diferente? A gente idealiza muito o passado. Tudo aquilo que aconteceu há alguns anos fica na nossa memória só com as boas passagens. Então, claro que parece mais român co e a gente lembra como sendo mais român co. A publicidade era na verdade mais amadora. Morei e estudei em Curi ba pra camente a minha vida toda. Mas, assim que me formei em Direito, eu morei no Rio de Janeiro, onde trabalhei em jornal, em rádio. Nessa época, o Rio era a capital intelectual do país. Todo mundo sonhava em trabalhar lá, de preferência no Jornal do Brasil. Para mim, o jornalismo espor vo e o cultural eram as grandes paixões. Cinema, literatura e esporte. Como o Jornal do Brasil pagava um salário muito baixo, por uma necessidade de sobrevivência eu fui trabalhar em outras áreas. Nessa época fui revisor da Editora Laudas, porque ela me pagava quase três vezes o que o JB nha me oferecido, e depois entrei em publicidade, exatamente porque me pagava mais que a Editora Laudas. Voltei para trabalhar em Curi ba três anos depois de ter ido embora. Foram várias as razões. Uma delas é que eu já estava cansado do Rio. Cada vez que eu vinha pra cá, ia jantar com meus amigos, saía para jogar bola, namorar e acabei arrumando uma namorada com quem casei. Então, achei que era melhor vir embora. Eu já nha feito uma carreira razoável como publicitário, no Rio de Janeiro, durante dois anos. Tinha comprado um carro, coloquei minha mudança dentro e vim embora. Quando cheguei aqui, fui trabalhar na Associados Propaganda. A criação trabalhava à tarde e o redator nunca aparecia de manhã. Era o Maurício Távora, que é um grande autor teatral, um grande ator também, e ele só aparecia de tarde. O Paulo Leminski também era redator – nha sido meu professor no cursinho e era meu amigo – e só trabalhava à tarde. De manhã ele dormia, porque passava a madrugada criando, bebendo, fumando, essas coisas que a gente fazia de madrugada. E eu nha aprendido a trabalhar em propaganda no Rio de Janeiro, num mercado muito mais exigente, já muito mais profissional. Então, quando vim pra cá levei um susto, porque eu não sabia que a propaganda aqui ainda estava enga nhando daquela maneira. Outra coisa é que ninguém trabalhava em dupla de criação aqui. Exis a, nas agências, uma sala onde ficava o redator e uma outra onde ficava a
“Eu acho que toda época é melhor do que a anterior. Eu prefiro ver comerciais modernos que comerciais anƟgos.” Coleção Memória da Publicidade - Pioneiros |Curi ba | p. 55-72 | 2014 | 57
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“As pessoas têm que ter liberdade de escolher. Eu posso vender um produto, anunciar milhões e o meu produto bater na trave. As pessoas não vão consumir aquilo que elas acham que não deve ser consumido.” arte, assim era na Associados. Não havia o conceito de dupla de criação integrada. Fui eu que trouxe isso pra cá. Eu comecei a trabalhar com o Miran, que era o diretor de arte da Associados, e o Miran me olhava com uma certa desconfiança. Na Associados, a sala do Miran era uma sala ao lado da direção da agência e ele nha seu próprio assistente. O Miran, vocês conhecem, é um gênio das artes gráficas, considerado um dos cinco melhores diretores editoriais de arte do mundo. Mas a mesa onde trabalhava o redator ficava no corredor, no caminho do banheiro. Eu era a úl ma pessoa da agência com quem as pessoas cruzavam antes de entrar no banheiro e era ali, naquele can nho, com uma máquina, uma mesinha, que a gente criava. Nesse sen do era muito român co. O Paulo Leminski chegava depois do almoço na agência, via o que nha que fazer, fazia lá um texto e ia embora. O Leminski, por exemplo, nunca escreveu o vídeo de um comercial, porque para ele isso era uma coisa que não importava. [Mas] eu acho que toda época é melhor do que a anterior. Eu prefiro ver comerciais modernos que comerciais an gos. Acho que tem muita coisa maravilhosa que a propaganda fez e o passado é uma fonte de referência muito interessante. Mas eu gosto de ver tecnologia, eu implico com a cenografia an ga, implico com as legendas an gas por causa das fontes que eram usadas, com os figurinos an gos. Quer dizer, você não pode olhar para aqueles cabelos ridículos dos anos 70, ou aquelas calças boca-de-elefante, e achar que aquilo sobreviveria hoje. Pra mim, aquilo ficou muito pra trás. Eu não tenho muito essa nostalgia: “Ah!, se faziam coisas maravilhosas an gamente”. Eu acho que, de uma maneira geral, o mercado melhorou muito. O mercado ficou mais exigente. Hoje nós temos um processo cria vo 58 | Coleção Memória da Publicidade - Pioneiros |Curi ba | p. 55-72 | 2014
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fantás co no mercado de Curi ba. Quantos profissionais de criação premiados nós temos? Naquela época nós não nhamos. Profissionais daqui que iam embora para São Paulo eram muito poucos. Quando eu vim pra cá, eu dizia para as pessoas: “Olha, você tem que passar dois ou três anos trabalhando num mercado como São Paulo, porque se não for assim, você não sabe o que é a exigência”. E con nuo dizendo isso hoje para os meus alunos do curso de pós-graduação e digo isso para vocês aqui. O verdadeiro profissional se forma num mercado muito exigente. Hoje nós temos um mercado muito mais exigente, profissionais paranaenses formados aqui e trabalhando no mundo todo e, aqui, um núcleo cria vo da melhor qualidade. Se você pegar, fizer uma agência, um grupo de criação, uma equipe de criação só com os profissionais de primeiro nível que tem hoje nas agências de Curi ba, você consegue ficar no mesmo nível de qualquer grande agência de São Paulo ou do Rio, ou de qualquer outro lugar do mundo. Quando o senhor começou, a base dos anúncios eram os tulos. Com a informa zação, os so wares de criação, os anúncios passaram a ter um foco mais no visual. Como o senhor viveu essa mudança nas agências de propaganda? Desde que eu comecei, o foco sempre esteve na idéia e isso não muda. Se eu pego uma campanha para fazer, primeiro analiso o briefing e aí vou ver para onde o trabalho precisa ir, o que ele representa, o que ele precisa resolver, e só então vou ter uma boa idéia. Isso valia há 36 anos [quando Ernani Buchmann começou na profissão] e vale hoje. O que mudou foi o conceito gráfico, que se sofis cou. Nós nhamos poucos diretores de arte com informação naquela época. A grande revolução gráfica na propaganda foi dada pelo Pe t e pelo Zaragoza, dois catalães que vieram para cá nos anos 1950, já com uma formação ar s ca, uma formação de belas-artes na Europa, e trouxeram uma série de conceitos novos para a propaganda brasileira. A propaganda foi muito ar s ca nos anos 1930, nos anos 1920, ela nha muita referência do art-nouveau, mas depois ficou muito “varejeira”. A propaganda perdeu muito essa coisa de ser graficamente bem colocada, moderna e ousada. Nos anos 1960, as grandes agências de São Paulo já começaram a adotar o modelo da publicidade americana. O Alex Periscinoto trouxe para cá o conceito de dupla de criação no final dos anos 1950, muito baseado na DDB – que foi quem melhorou a qualidade da propaganda nos Estados Unidos nos anos 1960. Tanto que o Nizan Guanaes dizia nos anos 1990: “A propaganda Coleção Memória da Publicidade - Pioneiros |Curi ba | p. 55-72 | 2014 | 59
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precisa melhorar muito para chegar no nível dos anos 1960”. Porque o Nizan sabe que naquela época nha uma boa propaganda e ele falava isso como provocação. Eu aprendi a fazer propaganda escrevendo textos, quatro, cinco ou seis parágrafos – cortando de uma maneira febril. Cortando até o limite. É o que faz o Dalton Trevisan, que é um grande mestre nisso. Eu sempre digo que o Dalton vai chegar ao limite e ao seu máximo no dia em que ele começar um conto pelo ponto final, o resto ele cortou. Eu aprendi escrever propaganda assim: você nha que ter um belo tulo que gerasse uma leitura do texto; começar o texto com uma frase que fosse muito provoca va e terminar com o que se chamava, na época, de pay off, que era aquela finalização gra ficante. No meio daquilo você vendia um produto. Não importava se o texto fosse longo ou curto, ele nha que conter tudo, nha que ser interessante do começo ao fim. Foi assim, na verdade, que eu aprendi a escrever, porque eu tenho formação jurídica e ve que aprender no dia-a-dia a escrever como jornalista e depois como publicitário. Eu levei quase um ano, talvez, para conseguir desenvolver um bom texto publicitário. No Rio de Janeiro, meus diretores de criação eram pessoas que vinham do texto e todos diziam: corte isso aqui, corte mais, comece de novo, isso está ruim, muito advérbio, corte o adje vo, se você já está falando sobre o produto, não precisa adje var sobre o produto. Havia uma sofis cação de texto, hoje não. Hoje você trabalha telegraficamente ou com o texto interné co. Então, você trabalha com bullets, aqueles pon nhos, e o texto é mais rápido, não se pode mais perder tempo. Você tem que matar a cobra e mostrar o pau em dois segundos. Ficou muito mais rápido esse processo, e é um processo do qual você não pode voltar, não sou nostálgico em relação a isso. Acho que é melhor que seja assim, talvez seja essa a grande mudança. Curi ba nha contas enormes. A Prosdócimo, da época em que o senhor trabalhava na Exclam, por exemplo. E todas essas empresas estão hoje com contas em agências de São Paulo. O que o senhor acha que está levando essas empresas para São Paulo? As grandes empresas paranaenses acabaram. As empresas de capital paranaense acabaram, todas elas. Na época que essas empresas paranaenses começaram a crescer, nha a Refripar – que fabricava o freezer Prosdócimo, O Bo cário, Malas Ica, Batavo. Todas eram contas de agências locais. E ainda havia as lojas de departamentos: Hermes Macedo, Disapel, cadeias de lojas de roupa que anunciavam muito (Unidas, Universal). Todos 60 | Coleção Memória da Publicidade - Pioneiros |Curi ba | p. 55-72 | 2014
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esses foram entrando na mídia a par r dos anos 1960, e a par r do anos 1970 sofis caram a sua comunicação e as agências cresceram junto. À medida que eles foram sumindo, as agências veram que procurar outras alterna vas em outros lugares. Nos anos 1970, as agências locais nham clientes locais. Nos anos 1980, as maiores agências locais já buscavam clientes fora. A Exclam e a Opus armaram escritórios em Santa Catarina, suas filiais e tal. Depois a Exclam, já nos anos 1980, foi a Brasília, montou escritório no Rio e em São Paulo. A Master fez isso, a Heads faz isso hoje. Existem diversas agências que fazem isso. Mas, ao mesmo tempo em que os clientes locais sumiram, mul nacionais como a Renault, por exemplo, foram instaladas aqui. Mas nessas empresas as contas são alinhadas universalmente. Então, o que aconteceu? Vieram agências pra cá também para atender esses clientes. Isso ajudou a profissionalizar o mercado e as empresas locais sumiram, porque elas não nham mais condições de compe r. Cliente – Prosdócimo Campanha: Lançamento Freezer Prosdócimo Título: Made in Brazil Comercial de TV 30” Cena 1 Montanha gelada. A aparência é de frio extremo. Cães puxam trenó de esquimó e uma grande caixa de madeira na neve. Ao chegar em seu iglu, o esquimó é recebido pela esposa e dois filhos. Quando os familiares chegam próximo à caixa, percebe-se que nela está escrito “Made in Brazil”. A mulher e as crianças abrem a caixa de madeira. LOCUÇÃO EM OFF: Chegou o maior dos maiores. Cena 2 Percebe-se, então, que se trata de um freezer ver cal Prosdócimo, que agora já é mostrado fora da caixa. LOCUÇÃO EM OFF: Freezer Prosdócimo 260. MULHER: It’s wonderfull. ESQUIMÓ: Sure, it’s Prosdócimo. LOCUÇÃO EM OFF: Muito mais capacidade, muito mais economia. Novo Freezer Prosdócimo 260. O freezer tamanho família. Cena 3 Logomarca Prosdócimo escrita na neve. LOCUÇÃO EM OFF: Freezer é Prosdócimo. Pode perguntar.
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“A gente não pode esquecer o seguinte: o CONAR precisa ser provocado. Quantas centenas de comerciais são introduzidos no mercado todos os dias? O CONAR não tem olhos para tudo isso.” Ainda em relação à publicidade no passado, o senhor acha que hoje se tornou mais fácil ou mais di cil ter o próprio negócio nessa área? Eu acho que ficou mais di cil. Ficou mais di cil porque antes você nha a sua relação de amigos locais e você era uma referência para eles. Hoje não há mais o empresário picamente paranaense. Aquele sujeito que estudou comigo no Colégio Santa Maria não tem mais uma empresa anunciante. Hoje, nós estamos todos na diretoria da Associação Comercial – eu e uma série de amigos que estudaram comigo há 45 anos –, mas eles têm empresas que não são mais do ramo anunciante. Portanto, eles não usam os meus serviços, se eu fosse dono de agência. Quem usa o serviço da agência local? São as grandes corporações, e essas corporações trazem pessoas de fora que não têm nenhuma referência local. É muito forte, hoje em dia, a tese de que o consumismo desenfreado cria muitos problemas, desde as sociedades desiguais até a destruição do planeta. Uma vez que procura, quase sempre, es mular o consumo, como fica a publicidade nesse cenário? As pessoas têm que ter liberdade de escolher. Eu posso vender um produto, anunciar milhões e o meu produto bater na trave. As pessoas não vão consumir aquilo que elas acham que não deve ser consumido. Elas podem até consumir uma primeira vez, mas elas não voltam a consumir, portanto, o meu produto vai falir. Agora, o que eu não posso é querer censurar a publicidade nem censurar as pessoas: “Você não pode mais consumir tal coisa porque nós resolvemos que não deve mais ser consumido”. Não. Aí nós vamos voltar ao estado autoritário de anos atrás, contra o qual todos nós nos batemos. Em relação à defesa do planeta, acho que esse é um debate colocado na mídia no mundo inteiro. As pessoas sabem o que devem fazer e o que não devem fazer, inclusive para hábitos de higiene. Por exemplo, eu não vou jogar lixo pela janela do automóvel, coisa que me deixa revoltado, mas volta e meia eu vejo pessoas fazendo. Então, são coisas mínimas que a evolução natural das coisas da sociedade passou a exigir que as pessoas incorporassem. Eu não acho que nós estejamos indo para o desastre. Acho que há um exagero muito grande por parte dos alarmistas. É tudo uma questão de você colocar esse debate na mídia e a publicidade tem um papel importan ssimo nisso. Inclusive, no papel 62 | Coleção Memória da Publicidade - Pioneiros |Curi ba | p. 55-72 | 2014
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de consultor de seu anunciante. É fundamental que a gente faça isso. E não só a publicidade, o próprio jornalismo faz isso todo dia. Mas na publicidade, se você puder indicar a um cliente seu uma publicação que usa papel reciclado, isso faz bem à humanidade. Hoje as agências já fazem isso. Portanto, essa consciência verde, esse carimbo verde, é uma tendência. Talvez os dois debates que vão dominar a mídia nos próximos anos sejam a mobilidade urbana e a consciência em relação ao meio ambiente como um todo. E onde entra o CONAR nessa história toda? Porque a missão do conselho é proibir a propaganda enganosa, as propagandas abusivas. Esse obje vo tem sido cumprido? Tem sido cumprido, mas a gente não pode esquecer o seguinte: o CONAR precisa ser provocado. Quantas centenas de comerciais são introduzidos no mercado todos os dias? O CONAR não tem olhos para tudo isso. O CONAR não é um órgão big brother, o CONAR não existe fisicamente como um imenso estúdio com centenas de monitores em que as pessoas estão olhando para ver o que está entrando no ar. Você precisa provocá-lo. O CONAR funciona muito nessa questão de dirimir disputas. Idéias que são copiadas, idéias conflitantes entre dois produtos que estão vendendo a mesma coisa, situações de exposição de pessoas a situações vexaminosas, a u lização de crianças em propaganda em situações que não devem ser expostas. Em tudo isso o CONAR se manifesta, desde que seja provocado. O Código de Defesa do Consumidor condena a publicidade que se aproveita da deficiência de julgamento da criança. O senhor
“Eu acredito que todo o meio de informação, não é só o publicitário, pode ser usado para manipular as pessoas. Claro que pode. Porém, quanto mais informação as pessoas Ɵverem, menos perigo de serem manipuladas existe.”
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“Eu conheço diversos publicitários que perderam o emprego porque não quiseram trabalhar para determinado candidato. Perdia o emprego na agência, porque o dono acreditava naquele candidato. É um direito do dono da agência e é um direito do profissional.”
concorda que toda a vidade voltada para o público infan l explora, em diferentes níveis, essa deficiência de julgamento da criança? É di cil você falar isso porque a criança está exposta à publicidade durante todo o período do dia que ela liga a televisão. Fora isso, quantas telas nós temos disponíveis hoje? Na primeira metade do século vinte, [éramos] dependentes de uma tela, que era a tela do cinema. Na segunda metade do século vinte, nós viramos dependentes de duas telas – quando a televisão entrou todo mundo dizia que ia matar o cinema. O cinema se recriou e os dois conviveram muito bem durante 50 anos. De 10 anos para cá, quantas telas foram criadas? Nós temos computador, celular, nós temos as telas de publicidade nos ambientes públicos, nós temos outdoor eletrônico, nós temos um monte de telas às quais estamos expostos todos os dias, a criança também. Então, qualquer publicidade que a gente faça está expondo a criança a um julgamento. Agora, as crianças aprenderam a linguagem que é usada. Não é porque, num comercial, o sujeito ficou tão feliz que ganhou asas porque bebeu um energé co qualquer que as crianças vão pular pela janela. As crianças têm essa noção. Nós não podemos achar que as crianças não têm nenhum poder de análise. Não. Elas têm poder de análise. Muitas vezes o legislador se preocupa em resolver um problema, mas ele, às vezes, atua como se fosse uma grande madre superiora. O mundo não é assim. Ninguém é criado para viver dentro de uma redoma ou dentro do pá o de um colégio de freiras. Nós fomos criados para lutar pela vida e essa luta é dura, é uma selvageria. Hoje as crianças sabem disso e estão muito cedo aprendendo isso. Então, não há esse purismo tão exagerado. Claro que é necessário que haja um controle, mas nós não podemos rar da mente que as crianças têm esse poder de análise também. E no caso da publicidade do cigarro, como a proibição das propagandas prejudicou a indústria? Esse é um grande problema. A indústria tabagista tem sofrido já há muito tempo, é uma briga de uns vinte anos. Na Europa, já nos anos 1970, havia uma limitação. O que aconteceu? A indústria foi buscar outros caminhos. A Fórmula 1 é um exemplo. De uns anos para cá, isso também foi cortado. Então, vocês vêem hoje as equipes de Fórmula 64 | Coleção Memória da Publicidade - Pioneiros |Curi ba | p. 55-72 | 2014
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1 correndo na Europa com alguma outra coisa para mascarar aquela publicidade que eles não podem mais exibir lá. Essa é a razão pela qual a Fórmula 1 foi buscar novos mercados, como a Ásia, por exemplo. Não exis a a Fórmula 1 no Baren, na Malásia, na China. Agora existe isso, agora vai ter em Cingapura e por aí vai. Por quê? Porque lá pode fazer propaganda de cigarro. Então, há uma transformação. Essa transformação é normal, nos anos 1940 todo mundo entrava em cena, no cinema, fumando. Hoje ninguém mais fuma no cinema, ninguém mais fuma na televisão. Em compensação vocês fumam adoidado. Talvez a geração de vocês fume mais do que a minha geração. Eu sou um sujeito que sempre sofri de bronquite, fumei durante quinze anos. Hoje se fuma muito e a propaganda está muito limitada. E por que se fuma? Porque a indústria achou outro jeito de vender o seu produto e as pessoas con nuam achando, em determinado momento da vida, que fumar é charmoso e pronto. É normal que seja assim. A publicidade pode vender qualquer coisa? O regime nazista e as ditaduras usaram muito desse meio para propagar seus ideais. O que o senhor acha disso? Você pode vender sim, agora, você tem que saber se as pessoas querem comprar. E se as pessoas verem informação elas podem não querer comprar aquilo. Por isso a propaganda polí ca, como ela é feita no Brasil, é interessante. Porque você tem dois lados. A pessoa mostra o que tem, o outro ataca. Você tem informações sobre aquilo. Claro que às vezes vai se mascarar o defeito e aumentar as vantagens. Porém, isso faz parte da própria sociedade. Enquanto estou aqui falando com vocês, estou de certa forma vendendo um produto, o produto Ernani Buchmann. Eu não estou dizendo, por exemplo, que eu tenho frieira, que eu tenho eczema. Como todos vocês quando saem com uma pessoa qualquer e querem agradá-la, vocês irão exagerar nas suas vantagens. Não vão exagerar os seus defeitos, vão escondê-los. Então, é assim também na sociedade. Eu acredito que todo meio de informação, não é só o publicitário, todo o meio de informação pode ser usado para manipular as pessoas. Claro que pode. Porém, quanto mais informação as pessoas verem, menos perigo de serem manipuladas existe. Como o publicitário deve agir diante da encomenda de uma campanha ou de uma peça de um produto ruim? Seja um eletrodomés co, um automóvel ou um polí co?
“Quando as coisas estão andando direito, qualquer peça que você inclua se adapta bem. Igual Ɵme de futebol.” Coleção Memória da Publicidade - Pioneiros |Curi ba | p. 55-72 | 2014 | 65
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Dizendo exatamente ao seu cliente que po de produto ele está querendo vender. Aconteceu comigo diversas vezes. É só dizer: “Olha, eu lamento, isso aqui não vai dar, isso aqui é um produto que não vai vender”. Eu tenho que acreditar no produto, senão eu não consigo fazer alguma coisa decente. Eu conheço diversos publicitários que perderam o emprego porque não quiseram trabalhar para determinado candidato. Perdia o emprego na agência, porque o dono acreditava naquele candidato. É um direito do dono da agência e é um direito do profissional. Qual foi a campanha mais cria va, mais importante para o senhor? A campanha mais importante, com certeza, foi o lançamento do freezer da Prosdócimo, no início dos anos 1980. O freezer, até então, era um produto da área de serviço. Ele ficava na área de serviço, congelava peixe e gelava a cerveja para o churrasco de domingo. Servia para isso. Um freezer em casa era para isso. E a Prosdócimo resolveu trazer o freezer pra cozinha. Isso era um desafio muito grande, porque as cozinhas não nham espaço específico para o freezer. Então, nós começamos a fazer o lançamento desse produto pra camente um ano antes de lançar o produto. Primeiro fazendo eventos em diversas capitais com decoradores, arquitetos de interiores, pessoas ligadas à indústria de cozinha – mostrando como seria o produto que ia ser lançado, que era o freezer ver cal. Depois disso, nós vemos um outro grande desafio antes de colocar o produto na rua, que era o fato das pessoas não conhecerem culinária congelada. Como não exis am esses produtos nos supermercados, ninguém sabia que po de comida se podia fazer para colocar no freezer. Então, nós fomos obrigados a
“Eu acho que as escolas de comunicação precisam preparar os seus alunos para a próxima década. Nós temos que pensar nos próximos dez anos, no mínimo. O ano de 2015 é amanhã.”
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criar uma série de escolas no Brasil inteiro que, de segunda a sexta, ensinavam a cozinhar. Nós fizemos esses cursos, os Freezers Centers Prosdócimo, em Porto Alegre, Belo Horizonte, Rio de Janeiro, São Paulo, Brasília. Para fazer esse lançamento, criamos uma campanha que era basicamente aquela coisa de vender geladeira para esquimó. Fomos filmar isso nos Estados Unidos, e era um desafio imenso naquela época. Eu resolvi filmar, na verdade, fazer o comercial em vídeotape, e não em película, porque eu fiquei com muito medo do filme velar. Aí nós fomos para os Estados Unidos, eu, o diretor do filme, o fotógrafo e uma carcaça do freezer, o gabinete do freezer, sem motor, embalado. Desembarcamos em Nova York, locamos equipamento, montamos todo o processo, contratamos um produtor local. Achamos uma locação nas montanhas rochosas, no Colorado, onde havia um grande lago congelado com montanhas em volta. Desembarcamos na sexta-feira, sábado eu fui com o produtor americano para Denver, no Colorado, e examinamos a locação. Achamos perfeita, voltamos para Denver e começamos a produzir o comercial sábado à noite, ligando para as pessoas para contratar trenós, cachorros, atores, figurino, tudo. Em quatro dias nós produzimos tudo, alugamos dois caminhões, levamos todo o material de Denver até as montanhas rochosas, nos hospedamos num resort e filmamos tudo. Voltei para Nova York, finalizei o filme, peguei o avião sábado, desembarquei no domingo de manhã em São Paulo, entreguei na Globo e à noite estreou no Fantás co. Na segunda-feira não nha mais freezer nenhum em nenhuma loja de departamentos do Brasil inteiro. Com esse comercial nós ganhamos todos os prêmio no Brasil. Foi comercial do ano dos Profissionais do Ano, foi comercial do ano em vídeotape no Brasil. Ganhei uma série de prêmios, a Prosdócimo ganhou uma grande credibilidade, o slogan da Prosdócimo durante muito tempo foi “Freezer é Prosdócimo, pode perguntar”. O maior prêmio que eu ganhei foi o dia em que desembarquei em São Paulo, peguei um táxi e o cara disse: “No que o senhor trabalha?”. E eu falei: “Sou sócio de uma agência de publicidade”. O cara falou: “Ah! Gosto muito de publicidade e, olhe, propaganda boa mesmo é aquela do esquimó que chega em casa com o freezer Prosdócimo”. Esse foi um grande prêmio, entre todos que esse comercial nos deu. É considerado até hoje um dos cem comerciais que influenciaram a propaganda brasileira. E, por outro lado, a mais desastrosa? Talvez a mais desastrosa tenha sido uma campanha polí ca do Coleção Memória da Publicidade - Pioneiros |Curi ba | p. 55-72 | 2014 | 67
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“Se um cara muito criaƟvo, ou um grande planejador, ou um sujeito com talento para atendimento, não fez faculdade e quer trabalhar com publicidade, eu contrato, sem problema nenhum.” José Richa, quando ele tentou voltar ao governo em 1990. Foi uma campanha ruim. Do começo ao fim tudo deu errado. Quando as coisas estão andando direito, qualquer peça que você inclua se adapta bem. Igual me de futebol. Vou usar uma metáfora que o Lula gosta muito: “Quando as coisas vão mal, qualquer coisa que você coloca vai ser a cereja e desanda o bolo”. No caso do freezer Prosdócimo deu tudo certo e era uma coisa de alto risco. No caso do Richa, deu tudo errado. Talvez tenha sido a experiência mais frustrante na minha carreira. E, falando de novas tecnologias, hoje nós temos bastante u lização do celular e também da web. Como essas tendências estão impactando a a vidade publicitária? Ou a publicidade se adapta ou ela acaba. As agências de publicidade têm esse desafio. Lembro que há dez anos, doze anos, quando começou o fenômeno da internet, as pessoas diziam que nha que botar banner na internet. E eu dizia: “Mas quem é que vai comprar um banner na internet?” Hoje, o banner se transformou num popup e a coisa já mudou de figura. Hoje, já há grandes inves mentos via internet para o lançamento de produto, para o relançamento de produto. Ela é um grande veículo, já é um grande veículo. Mas os outros filhotes da tecnologia que nasceram nos úl mos anos ainda precisam de um processo mais de massa, eles ainda não estão devidamente massificados - o próprio celular vai ser um canal de propaganda. Quem não es ver preparado para criar e planejar principalmente para esse po de tecnologia, nem entre no mercado. É melhor sair daqui e fazer concurso para trabalhar em banco. Tendo em vista as rápidas mudanças na profissão, o que o senhor considera que deve ser mudado no ensino de publicidade? Eu acho que as escolas de comunicação precisam preparar os seus alunos para a próxima década. Nós temos que pensar nos próximos dez anos, no mínimo. O ano de 2015 é amanhã. Nós temos que estar lá na frente. Como é que as escolas podem u lizar essa tecnologia? Bem, elas podem não u lizar todas as tecnologias, mas elas têm que ensinar sobre essa tecnologia. O que eu vejo é que boa parte das escolas de comunicação, as menos sofis cadas no mercado, estão chegando aos anos 1990. Essa defasagem é muito perversa para os seus alunos.
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Quem não es ver ligado com a alta tecnologia que está à disposição no mercado, nem entre no mercado. É necessário que as pessoas se acostumem com isso como se acostumam a levantar, escovar dente, se ves r, fazer as coisas mais comuns da vida. A escola precisa tentar acompanhar essa revolução radical e brutal da tecnologia. O mercado está dando valor a quem tem uma formação na tecnologia. Claro que a geração de vocês toda já é uma geração do computador, mas nós não estamos falando só de computador: estamos falando de novas tecnologias e dá preparação intelectual do aluno. Eu sempre digo aos meus alunos que eles têm que falar uma outra língua. E quando digo isso, não falo do inglês. Inglês é básico. Estou falando de uma outra língua. Isso vale para o francês, italiano, japonês, alemão, espanhol, qualquer outra. Se a pessoa não for capaz de abrir o site da BBC e ler o que está escrito na primeira página da BBC na internet em inglês, também desista, porque é essa a exigência. E o fato de qualquer um poder fazer publicidade, é bom ou ruim? Eu acho que é o seguinte: profissões que envolvem riscos à vida humana só podem ser feitas por especialistas - é o caso da medicina, é o caso da engenharia, é o caso da biologia. Essas coisas não podem ser feitas por curiosos. Têm que ser feitas por pessoas que estudaram pra isso. Um médico estuda dez anos para entrar no mercado. Mas se um cara muito cria vo, ou um grande planejador, ou um sujeito com talento para atendimento, não fez faculdade e quer trabalhar com publicidade, eu contrato, sem problema nenhum. E acho que, se ele ver as ferramentas necessárias – e isso vai de um olho que brilha até um nível cultural sa sfatório para o meu padrão – eu contrato. Além de publicitário, o senhor também é advogado, jornalista e escritor. Como todas essas profissões influenciam na hora da criação de uma campanha? Sou professor também. Eu acho que é o seguinte: eu sempre fui muito a vo, talvez eu tenha sido hipera vo, talvez eu seja hipera vo. Eu não consigo ficar parado muito tempo, eu não consigo ficar sem fazer nada, eu gosto de fazer coisas e eu tenho algumas habilidades. Se você me perguntar para que serve a raiz quadrada, eu não sei, eu não tenho uma aula de matemá ca há mais de 40 anos, nunca ve
“Sou muito curioso e acho que a curiosidade é fundamental para você ter sucesso na vida. Eu não conheço ninguém que diga ‘eu não sou curioso’ e que seja uma pessoa de sucesso nesse Ɵpo de profissão.” Coleção Memória da Publicidade - Pioneiros |Curi ba | p. 55-72 | 2014 | 69
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“Preparem-se, falem boas línguas, estudem bastante, façam faculdade, botem um brilho bem grande no olho e se dediquem de manhã, de tarde e de noite. Vinte e quatro horas por dia estejam ligados nisso e vocês vão ter sucesso.” uma aula de sica. Quando eu fiz ves bular, as matérias eram todas de ciências humanas. Fui lá e fiz ves bular com o que eu aprendi na escola, estudei, fui lá, fiz e passei. Isso é impossível hoje em dia, mas naquela época, felizmente pra mim, funcionava. Eu sempre ve essas habilidades para escrever, fui radialista, fui repórter, sei escrever, sei falar. Com essas duas habilidades eu fiz a minha vida. Eu só sei fazer isso, por isso dou aula, por isso eu sou escritor, por isso eu sou marqueteiro polí co, sou publicitário e ponto. Eu só sei fazer isso. Nas agências de propaganda, quando que não era diretor de criação, eu era diretor de planejamento, eu era dono da agência, mas eu sabia vender o produto. Eu usava essa arma que eu tenho, que é o fato de saber falar de uma maneira razoável e escrever. Eu faço as duas coisas. Todas as a vidades que exerço estão ligadas a essas habilidades. É muito simples, foi assim que eu fiz a minha vida. Sou um sujeito de texto. Quando eu não estou fazendo alguma coisa, eu estou lendo. Eu leio tudo que me cai na frente, estou sempre lendo dois livros ao mesmo tempo. Eu não me lembro qual foi a úl ma vez na minha vida que eu fiquei sem ler um livro, porque o hábito da leitura é um hábito que eu trago da minha infância, depois da juventude. É uma coisa que eu gosto. Eu fico triste quando eu vejo o presidente da República dizendo que ler é muito chato. Mas eu sou um sujeito que lê muito e curte informação. Sou muito curioso e acho que a curiosidade é fundamental para você ter sucesso na vida. Eu não conheço ninguém que diga “eu não sou curioso” e que seja uma pessoa de sucesso nesse po de profissão. Nós temos que ter essa cultura geral e essa cultura geral você adquire vendo, se movimentando, acessando qualquer canal que você tenha e que te permita ter informação. Como funciona o processo cria vo na publicidade? De onde saem as idéias? O senhor acha que se aprende criação na universidade ou a própria pessoa carrega isso? As duas coisas são verdadeiras. Quando eu comecei em propaganda, eu pensei: “Não sei escrever isto aqui”. Onde eu vou achar uma idéia? Como é uma idéia? Hoje ter idéias é uma coisa muito simples pra mim. Enquanto nós estamos aqui já vemos 300 idéias. Talvez vocês não consigam ainda formatá-las e colocá-las no papel do jeito que elas devem ser colocadas, mas as idéias são coisas que a gente tem aos
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milhares. É só uma questão de você conseguir direcioná-las, e isso é uma questão de aprendizado. Você pode aprender na faculdade e pode aprender na vida. Eu crio a qualquer hora. Hoje de manhã, por exemplo, eu nha uma matéria para escrever. Eu saí de casa e montei a matéria na cabeça, depois escrevi tudo em 15 minutos. Eu escrevo deitado no escuro. Você vai dizer: você é louco. Não, é que escrevo na cabeça concatenando as idéias, eu tento montar um texto e no dia seguinte eu transformo aquilo numa idéia. Esses dias eu escrevi um roteiro para um longa-metragem com 75 mil caracteres de quinta-feira à noite até domingo, quando eu dei um ponto final. Eu escrevi 75 mil caracteres em quatro dias de trabalho. Eu faria isso na idade de vocês? Não. Na idade de vocês, talvez, eu não passasse da primeira página. Mas eu tenho 40 anos de experiência escrevendo. Quando eu penso muito, como já tenho essa habilidade treinada, eu sou capaz de escrever muito rapidamente. É um processo de aprendizado, uma questão de treino. Para finalizar, com 36 anos de profissão, quais são as dicas fundamentais que o senhor dá para a gente que está começando agora? Preparem-se, falem boas línguas, estudem bastante, façam faculdade, botem um brilho bem grande no olho e se dediquem de manhã, de tarde e de noite. Vinte e quatro horas por dia estejam ligados nisso e vocês vão ter sucesso. Se não for assim, desistam. Vão trabalhar em outra coisa. Essa é uma profissão que exige muita vontade, é preciso gostar disso. Eu tenho um filho publicitário e tenho filho jornalista também. Eu olho para os dois e penso que poderiam ter saído com o meu lado advogado, talvez es vessem ganhando mais dinheiro e talvez, se eu vesse ido por esse lado, de repente es vesse bem de vida para não precisar mais trabalhar. Talvez não es vesse nem vivo. Prefiro do jeito que foi. Vocês podem fazer isso. Se preparem, leiam, vejam e ouçam todo o tempo. Leiam, vejam e ouçam 24 horas por dia. Não parem nunca.
Pesquisadores Acadêmicos: Zé Luis Schmitz | Lucas Cavalcante Siebert | Mayara Mar ns Prando Âncora: Amanda Mercer de O. Ribas
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MEMÓRIA DA PUBLICIDADE PARANAENSE MEMÓRIA DA PUBLICIDADE PARANAENSE MEMÓRIA DA PUBLICIDADE PARANAENSE MEMÓRIA DA PUBLICIDADE PARANAENSE MEMÓRIA DA PUBLICIDADE PARANAENSE MEMÓRIA DA PUBLICIDADE PARANAENSE MEMÓRIA DA PUBLICIDADE PARANAENSE MEMÓRIA DA PUBLICIDADE PARANAENSE MEMÓRIA DA PUBLICIDADE PARANAENSE MEMÓRIA DA PUBLICIDADE PARANAENSE MEMÓRIA DA PUBLICIDADE PARANAENSE MEMÓRIA DA PUBLICIDADE PARANAENSE
José Dionísio Rodrigues
MEMÓRIA DA PUBLICIDADE PARANAENSE MEMÓRIA DA PUBLICIDADE PARANAENSE MEMÓRIA DA PUBLICIDADE PARANAENSE MEMÓRIA DA PUBLICIDADE PARANAENSE MEMÓRIA DA PUBLICIDADE PARANAENSE MEMÓRIA DA PUBLICIDADE PARANAENSE MEMÓRIA DA PUBLICIDADE PARANAENSE MEMÓRIA DA PUBLICIDADE PARANAENSE
O jornalista que virou publicitário
A publicidade no Paraná, como no Brasil e no resto do mundo, seguiu as transformações e o desenvolvimento de diferentes tecnologias. Se antes um anúncio bem feito sa sfazia o cliente, hoje é necessário muito mais que isso. Na visão do veterano José Dionísio Rodrigues, “o trabalho dos profissionais de comunicação está sendo conduzido a um grau extremamente elevado de precisão, ou seja, você tem que estudar muito bem o problema para que as suas ações de comunicação possam a ngir diretamente e com força os públicos-alvo a quem a mensagem precisa ser des nada”. Além dessa precisão, o desenvolvimento tecnológico colocou diante da propaganda o desafio da intera vidade e também da integração de diversas áreas da comunicação. Prato cheio para quem, como Rodrigues, soma habilidades de jornalista – sua experiência inicial – e de publicitário. Jornalista de formação mas publicitário por vocação, Rodrigues trabalhou, na década de 1970, nos jornais O Estado do Paraná e Gazeta do Povo, além de atuar na Rede Paranaense de Comunicação, afiliada da Rede Globo. Interessado em outras formas de comunicação, montou, ainda na mesma década, uma empresa de assessoria de imprensa. No entanto, o mercado revelou, na ocasião, uma oportunidade crescente na área da publicidade. Por isso, a empresa que antes se dedicava apenas à área jornalís ca, passou a se integrar com a propaganda. “No fundo, no fundo, sempre houve uma preocupação em fazer comunicação integrada”, revela o entrevistado. José Dionísio Rodrigues, o jornalista que é um dos publicitários mais importantes do Paraná, não se furta a dar a manchete principal para o sucesso na profissão: “O bom publicitário, o bom comunicador, deve entender um pouco de psicologia, entender muito de gente, de comportamento. E que cada classe social, cada grupo de consumidores tem comportamento dis nto”. Por fim, o publicitário deixa também algumas reflexões para os leitores e futuros profissionais da comunicação: será que a publicidade e o jornalismo são mais fáceis hoje, na era da informação? Ou, justamente porque ela se tornou abundante e disseminada, é mais di cil persuadir o consumidor? Descubra nas páginas a seguir. Suelen Ivanovsk
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Quando o senhor começou, ainda na década de 1970, era muito diferente a forma de fazer publicidade. Hoje se trabalha de uma forma mul disciplinar. Como era antes? A grande vantagem que você nha naquela época, em relação ao que é atualmente, é que você “despachava” com o dono da empresa. Não havia intermediários no processo. Normalmente, o grande desafio era criar um vídeo, um filme, um anúncio, um spot de rádio e, eventualmente, um material de ponto de venda, que se restringia basicamente a uma bandeirola. Os anunciantes importantes da época eram do setor de varejo. Então, você nha um cardápio básico de peças e a mídia se restringia a jornais, rádios, televisão e eventualmente um material de PDV [Ponto de Venda]. Qual a diferença que nós verificamos hoje em nossa a vidade? É que o briefing nem sempre pode ser colhido junto ao presidente da empresa, ele fica com a área de marke ng. E muitas vezes o pessoal não tem preparo para fornecer um briefing adequado. Em função disso, o trabalho dos profissionais da agência cresce de importância, porque é preciso fazer a sua parte do trabalho e a parte que deveria ser feita pelo anunciante. Isso significa que o diagnós co precisa ser muito mais profundo e, portanto, os profissionais das agências têm que ter muito mais competência. O profissional da área precisa ter uma visão abrangente da comunicação, conhecendo muito bem as ferramentas que estão hoje disponíveis, porque os meios de comunicação se mul plicaram. O mais di cil é integrar a comunicação. E hoje se percebe, no Brasil inteiro, uma preocupação em debater a integração da comunicação. No começo da carreira, o senhor teve uma empresa que aliava assessoria de imprensa e publicidade, mas optou por ficar apenas com a publicidade. Não sei se nós podemos chamar essa integração como comunicação integrada. Não dava certo na época, por isso o senhor optou só pela publicidade? A gente começou a a vidade como assessoria de imprensa, eu e meu sócio na época, o Rafael De Lalla. Nós vínhamos da Gazeta do Povo e éramos jornalistas. Nossa maior exper se era em jornalismo, por isso a gente fundou uma assessoria de imprensa. Com o passar do tempo, percebemos que nossos clientes queriam publicidade, então
“O profissional da área precisa ter uma visão abrangente da comunicação, conhecendo muito bem as ferramentas que estão hoje disponíveis, porque os meios de comunicação se mulƟplicaram. O mais diİcil é integrar a comunicação.”
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“Só mais recentemente a comunicação integrada começou a tomar forma – até como aƟvidade acadêmica – porque ficou muito complexo integrar todos os contatos que uma marca tem que ter com diferentes públicos, uƟlizando os diferentes meios de comunicação.” nos associamos a profissionais da área e criamos uma outra agência: Soma Assessoria de Imprensa e Soma Publicidade. Essas empresas conviveram um bom tempo no mercado, até que a publicidade começou a ganhar mais força e nós percebemos que a assessoria de imprensa poderia ser desenvolvida externamente e deveríamos nos dedicar mais à área de propaganda, que na época era muito limitada. Não significa que a gente abandonou a a vidade de assessoria de imprensa: deixamos de fazê-la na agência e passamos a contratar empresas especializadas que começaram a surgir na época. Por que a gente se focou fundamentalmente na publicidade e deixou a assessoria de imprensa? Porque percebemos que, em termos de negócios, era mais vantajoso. Permi a que ampliássemos a carteira de clientes de uma maneira mais rápida do que se a gente focasse só na assessoria de imprensa. No fundo, no fundo, sempre houve uma preocupação de fazer comunicação integrada – tanto que as mul nacionais de propaganda que vieram para o Brasil, inicialmente com propaganda, depois começaram a trazer as empresas associadas nas áreas de eventos, promoções, assessoria de relações públicas etc. O fato é que só mais recentemente a comunicação integrada começou a tomar forma – até como a vidade acadêmica – porque ficou muito complexo integrar todos os contatos que uma marca tem que ter com diferentes públicos, u lizando os diferentes meios de comunicação. Hoje temos uma intera vidade muito grande. A par r do advento da internet, vemos uma grande revolução na comunicação.
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Quando surgiu essa necessidade de trabalhar com comunicação integrada? As agências fora do eixo do Rio/São Paulo foram obrigadas a introduzir a comunicação integrada porque, normalmente, o cliente quer que você faça todas as ações de comunicação para ele, ao contrário dos grandes anunciantes de São Paulo, que têm departamentos de marke ng gigantescos e podem contar com prestadores de serviços diversificados. Precisa de uma embalagem, contrata um estúdio de design; precisa de uma ação promocional, contrata uma empresa de promoção; precisa de um evento, contrata uma empresa de eventos; precisa de uma assessoria de imprensa, contrata. Aqui no Paraná e no Sul, os clientes não têm departamentos de marke ng tão grandes como os dessas mul nacionais que operam em São Paulo e, por serem mais enxutos, têm necessidade de ter uma agência preparada para resolver a maior parte de seus problemas. Percebendo isso, a gente começou a trabalhar com o conceito de integração. Quer dizer, a gente empiricamente sabia que era preciso fazer a integração, havia uma necessidade de mercado, mas não se sabia direito como fazer – a não ser que os layouts nham que ter a cara muito parecida, o outdoor com o anúncio etc. Mas comunicação integrada não é apenas isso: é uma filosofia que deve ser comandada pelo próprio presidente da empresa e assimilada pelos profissionais de comunicação da área de marke ng, depois pelos profissionais de comunicação da agência, porque uma andorinha só não faz verão. Na nossa agência, a Opus Múl pla Comunicação Integrada, estamos pra cando isso há mais de 12 anos – desde o dia em que eu fui a São Paulo, num seminário, e ve a oportunidade de ver uma belíssima apresentação do Don Schultz – que é o papa da comunicação integrada nos Estados Unidos, de uma universidade de Chicago (ele escreveu um livro chamado Comunicação Integrada e Marke ng). Então, a comparação do trabalho que se fazia lá trás com o que se faz hoje é que a publicidade ganhou uma outra dimensão, uma outra escala, e eu diria que é muito mais di cil fazer comunicação hoje do que era fazer comunicação naquela época. Até porque naquela época havia um pouco mais de roman smo do que hoje. Hoje é tudo muito cartesiano, muito racional, tem que dar resultado a cada centavo que você investe. Não que naquela época não precisasse, mas nha uma aura mais român ca do que hoje. Hoje não existe mais esse roman smo? Não, hoje é precisão total. É precisão, é uma microcirurgia – ou uma nanocirurgia, se você pudesse chegar a esse ponto. O trabalho Coleção Memória da Publicidade - Pioneiros |Curi ba | p. 73-94 | 2014 | 77
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“Hoje é tudo muito cartesiano, muito racional, tem que dar resultado a cada centavo que você investe. Não que naquela época não precisasse, mas Ɵnha uma aura mais românƟca do que hoje.” dos profissionais de comunicação está sendo conduzido a um grau extremamente elevado de precisão, ou seja, você tem que estudar muito bem o problema para que as tuas ações de comunicação possam a ngir diretamente e com força os públicos-alvo a quem a mensagem precisa ser des nada. Quando o senhor fala em roman smo, que roman smo era esse? Eu me lembro que a gente fez uma campanha, que foi memorável no varejo do Paraná e do Brasil: a do Kid Malu. Para fazer o filme do Kid Malu, o Jamil Snege, que era nosso diretor de criação, entrou no banheiro da agência, pegou um guarda-chuva que nha lá, num canto, e saiu. Foi para a área de produção onde ia ser o set de filmagem com o guarda-chuva debaixo do braço. Ninguém entendeu absolutamente nada. Bom, quando eu vi o filme pronto – Kid Malu contra a inflação, a inflação sendo personificada por um bandido – acontecia uma explosão e o bandido ficava com a roupa toda esfarrapada. A roupa que estava esfarrapada foi feita do guarda-chuva que o Jamil nha levado da agência algumas horas antes da produção. Outra história interessante para mostrar esse lado mais român co é que às vezes eu nha que ir buscar o redator em casa para fazer um texto, horas antes de eu levar a campanha para o cliente. Ora, hoje eu não me imagino indo buscar um redator, ou um diretor de arte, ou um designer, em casa para fazer uma campanha horas antes de levá-la para o cliente, porque o grau de improvisação é muito menor. Mesmo assim faziam-se campanhas memoráveis: a cria vidade mais do que nunca era necessária – quanto mais improvisação, mais cria vo você precisa ser. Até alguns anos havia um encantamento com a publicidade – cantavam-se jingles e tudo mais. Hoje como o senhor vê essa relação do público com a publicidade? O rádio ainda exerce um papel importante, é uma mídia fantás ca, mas ele já teve um papel extremamente importante na comunicação por meio dos jingles, e alguns se tornaram de gosto popular, eram cantados por todo mundo. De uns tempos para cá, o que se percebe é que os recursos da comunicação não cresceram na mesma proporção do aumento dos meios de comunicação, ou seja, apareceram mais meios de comunicação, mas os recursos para inves mento na comunicação 78 | Coleção Memória da Publicidade - Pioneiros |Curi ba | p. 73-94 | 2014
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não cresceram na mesma proporção. Hoje, você tem que pegar um bolo de recursos que o anunciante coloca na tua mão e, como tem vários meios onde atuar, você coloca um pouquinho para televisão, um pouquinho para rádio, um pouquinho para web, um pouquinho para isso, um pouquinho para aquilo. O que significa? Significa que você tem mais meios beliscando a tua verba e, às vezes, não sobra um recurso muito expressivo para inves r em grandes jingles. Porque um grande jingle precisa de tempo, ele não pode ser feito do dia para a noite, precisa ter uma boa orquestração, bons cantores, além de uma grande idéia. As idéias até existem, mas às vezes você não tem os recursos para poder inves r tanto numa mídia tão fantás ca como essa. Tanto que quando a gente ouve um jingle que é excepcional, até acha estranho. Avaliando o mercado de ontem e de hoje, regredimos em algum ponto? É muito delicado o que eu vou falar, mas quando você tomava o briefing diretamente com o cliente – fosse numa mesa de bar, num almoço ou num jantar, ou mesmo no escritório dele – você estava discu ndo diretamente com quem nha o poder de aprovar. Hoje – e vocês são jovens, estão aí começando a carreira e talvez isso até sirva de entusiasmo e es mulo – normalmente a gente enfrenta pessoas que ainda não têm o preparo adequado para formular um bom briefing, então há um [grande] índice de “retrabalho” – talvez nem exista essa palavra. Mas você vai e volta muitas vezes com o mesmo anúncio, com o mesmo layout. Incompetência da agência? Incompetência do cliente? O fato é que isso, na minha visão, é uma regressão, porque a gente perde muito tempo em relação ao que era em outra época. A comunicação paranaense nha força no mercado dos anos 1970? Quais eram as dificuldades nessa época? Tinha muita força, sim. Na época, nós nhamos grandes agências no Brasil, além das mul nacionais: JJ Thompson, McCan Ericson, Leo Burnet etc. Tínhamos uma agência maravilhosa, que temos até hoje, a DPZ, que formou os grandes publicitários do Brasil. As gerações se sucederam ou em mul nacionais, ou na DPZ, que era a grande referência que a gente nha no Brasil em termos de criação – eram layouts extraordinariamente bem feitos, a pologia escolhida nha uma per nência, não só em relação ao meio, mas a marca com relação ao produto. Era um trio que existe até hoje – o Pe t, o Zaragoza e o Duailibi, dois diretores de arte e um redator. E as agências do Paraná que surgiram na época – a Múl pla, a P.A.Z. e nós mesmos – se Coleção Memória da Publicidade - Pioneiros |Curi ba | p. 73-94 | 2014 | 79
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espelhavam na DPZ como agência de criação e nas mul nacionais como mega-agências. Então, havia no mercado agências realmente muito competentes do ponto de vista cria vo. Era um mercado [o paranaense] cons tuído basicamente de anunciantes de varejo ou de serviço público (governo ou prefeitura). No varejo, havia uma compe ção: no domingo, você queria abrir o jornal para ver qual o anúncio mais bonito – e normalmente a P.A.Z. dava um show, a Opus dava um show, a Múl pla dava um show. Eram empresas que se destacavam no mercado regional e nham uma performance muito boa no mercado nacional. Nosso mercado é conservador? Curi ba tem uma caracterís ca atávica de ser conservadora. Até tem uma brincadeira de que a gente, para acontecer em Curi ba, primeiro tem que acontecer lá fora. Se você é projetado nacionalmente, então você é reconhecido no mercado local. Isso é uma caracterís ca desde o tempo em que eu entrei na Gazeta do Povo e no jornal O Estado do Paraná, lá em 1967. Não mudou muito, apesar de que hoje, em Curi ba, tem gente de todos os lugares. O fato é que nós estamos percebendo que empresários do Paraná estão começando a ter uma atuação muito expressiva nos mercados nacionais e mesmo nos mercados internacionais, portanto saindo de Curi ba. Posso citar um que é meu cliente: O Bo cário. O que o Bo cário tem de conservador? Absolutamente nada. É a maior rede de franquias de cosmé cos do mundo e tem pouco mais de 25 anos. Isso é uma demonstração da força dos empresários a par r do Paraná. Outro exemplo é o próprio Grupo Posi vo, que hoje é um dos maiores grupos empresariais do Brasil, com atuação expressiva não só na área gráfica como na de informá ca, na de ensino e educação. E poderia citar outros, mas a verdade é que os empresários de Curi ba estão atravessando o rio Atuba, como gosta de falar o Elói Zane – significa ir lá, em direção a São Paulo. Para o senhor, onde começa e onde termina a é ca do publicitário? É uma questão de educação: a gente aprende desde criança quais são os limites, foi preparado desde a faculdade. Mas se em algum momento a gente se perder – às vezes até pode acontecer – temos o CONAR, Código de Auto-regulamentação Publicitária, que foi criado no 3º Congresso de Publicidade, realizado há 30 anos. Esse código de auto-regulamentação permite que, se em algum momento um comercial ferir a é ca ou se aparecer alguma idéia que antes já foi desenvolvida por uma outra agência, por um outro anunciante, o 80 | Coleção Memória da Publicidade - Pioneiros |Curi ba | p. 73-94 | 2014
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consumidor ou a agência possam ligar para o CONAR, ou mandar um e-mail ou uma carta, pedindo que aquele comercial, aquela idéia seja re rada do ar. Há uma discussão muito grande hoje se, além do CONAR, o governo precisa ainda intervir? Precisamos de mais educação e menos restrição, porque o CONAR já é um órgão suficientemente qualificado para dizer à sociedade o que pode e o que não pode na comunicação. Não há necessidade de que o governo venha com algum po de restrição adicional. O CONAR tem agido com muita firmeza em todos os casos em que se extrapola o limite. Do seu ponto de vista, crianças devem ser proibidas de par cipar de comerciais? Vou citar um comercial que é extremamente bem feito, do Leite Ninho, em que o pai esperava que o bebê fosse um menino e veio uma menina. Ele começa a jogar bola com ela e o filme corta, enfim, para vários momentos; num deles, a menina jogando bola, aparece ele torcendo para ela fazer o gol, ela erra e tal. Eu pergunto para vocês: esse comercial, com essa criança, fere em algum momento algum princípio é co? É uma questão de bom gosto, de bom senso, da formação de cada um. E eu seria hipócrita se dissesse que a criança deveria ser proibida de par cipar. Depende da maneira como ela vai par cipar dos comerciais. Nesse caso, ela faz um papel extraordinariamente per nente e com uma carga emocional extraordinária. Vai fazer beber mais leite, esse é o obje vo, mas são momentos até de pureza. Poderíamos ficar aqui a noite toda citando outros exemplos. Então, é uma questão realmente de educação, de consciência, de razão e de emoção, de saber que as regras do convívio com uma sociedade sadia precisam ser respeitadas, não precisa haver mais censura. Insisto: precisamos de mais educação e menos restrição. Como o senhor falou, tem que ter aquela percepção, o bom gosto. O senhor acredita que uma pessoa com outra formação, com outro diploma, pode exercer a publicidade sem nenhum problema? Olha, a cria vidade não está restrita a nenhuma a vidade profissional, a nenhuma a vidade acadêmica. De um curso de publicidade podem nascer dez profissionais cria vos como pode não nascer nenhum.
“O trabalho dos profissionais de comunicação está sendo conduzido a um grau extremamente elevado de precisão, ou seja, você tem que estudar muito bem o problema para que as tuas ações de comunicação possam aƟngir diretamente e com força os públicos-alvo a quem a mensagem precisa ser desƟnada.” Coleção Memória da Publicidade - Pioneiros |Curi ba | p. 73-94 | 2014 | 81
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Assim como no curso de direito, no curso de letras, de design gráfico, de arquitetura. A cria vidade não é restrita a nenhum po de a vidade. Ela está dentro da gente, faz parte do nosso dia-a-dia e depende muito do talento inato; outra parte é desenvolvimento. Uma coisa eu digo e repito: é fundamental que o profissional de comunicação tenha uma boa formação, uma boa base acadêmica, porque o embasamento é fundamental para você propor uma campanha, uma ação de comunicação para qualquer anunciante, seja ele grande ou pequeno. Não acredito mais que você vá hoje vender uma campanha porque acha que é bonita. Você vai vender uma campanha porque ela é eficiente, porque funciona. E, para você poder jus ficar isso, tem que ter uma boa formação acadêmica. Então, quanto mais as universidades inves rem na formação, melhores profissionais nós vamos ter. E o senhor u liza muito a sua formação como jornalista nas suas campanhas? A primeira coisa que eu u lizei do jornalismo foi fazer um bom briefing. O que o jornalista faz? Ele pergunta o quê, como, quando, onde e por quê. O que você pergunta para um anunciante não é diferente: o que você quer fazer acontecer, quando você quer fazer acontecer, por que você quer fazer acontecer. Nossa parte é dizer “como vai acontecer” – se eu não disser o “como”, não precisa de agência. O jornalismo me deu o embasamento para eu coletar um bom briefing. Evidentemente não sou um redator – sou jornalista, escrevo, faço matérias, tudo bem, mas não sou um redator da minha agência porque descobri que o meu melhor talento não estava em fazer tulo de anúncio nem texto de anúncio ou de filme. Meu melhor talento estava em me relacionar com os clientes. E me relacionar com os clientes significa fazer atendimento. Minha habilidade maior é na área de relacionamento, talvez de relações públicas e da coleta de briefings, fazer um bom diagnós co. Mas o fato é que a área de jornalismo, embora pertença à área da comunicação, é muito específica. O texto jornalís co é muito diferente do texto da publicidade. O texto jornalís co é informa vo e argumenta vo. Quando se trata de você fazer um ar go e assinar, você pode até fazer uma argumentação, mas ele é basicamente informa vo. A publicidade tem uma outra função, que é a persuasão. Então, eu diria que você tem alguns traços comuns, mas a separação está ali: o jornalista não tem que persuadir você a acreditar na no cia. Ele tem que dar a no cia, informar. Pode até fazer um ar go comentando, mas aí a gente já entra num outro campo. A publicidade tem uma missão fundamental que é a de persuadir alguém a se apaixonar por 82 | Coleção Memória da Publicidade - Pioneiros |Curi ba | p. 73-94 | 2014
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“Precisamos de mais educação e menos restrição, porque o CONAR já é um órgão suficientemente qualificado para dizer à sociedade o que pode e o que não pode na comunicação. Não há necessidade de que o governo venha com algum Ɵpo de restrição adicional.”
determinada marca, determinado produto, e se levantar e ir lá comprar o produto. Ela tem um lado comercial extremamente acentuado. Também não adianta a gente tapar o sol com a peneira: a publicidade tem uma função que é ajudar a vender um produto, uma marca, até um candidato – enfim, uma idéia. O senhor já foi presidente do Sindicato das Agências de Propaganda do Paraná, o SINAPRO. O que é mais recorrente na relação agênciaanunciante? A primeira palavra que eu pensei aqui – refle um pouco mais para dizer qual é, pois isso está mudando – é respeito. Dá a ní da impressão que todo mundo sabe fazer publicidade. Até pegando um contraponto com a área de jornalismo, o cliente não vai fazer a matéria sair no jornal, mas ele quer fazer o anúncio. Quer fazer o tulo, quer fazer o texto, quer dar a idéia da cor, quer dar a idéia até da diagramação. Quando você vai ao médico, você não diz para o médico qual é o remédio que ele tem que te dar. Você conta para ele uma história; se ele precisar fazer alguma inves gação, ele manda fazer alguns exames; e aí ele monta um diagnós co e faz alguma recomendação. Está melhorando muito, mas às vezes o cliente quer contratar você e fazer a própria campanha. Aí é que eu digo: questão de respeito. Como presidente do sindicato, vi que isso pegava bastante, principalmente com as agências que estão começando, porque estão conquistando um espaço, um terreno, têm que se credenciar para poderem ser respeitadas. Mas, além disso, tem um outro aspecto que é a remuneração. Uma boa agência de
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propaganda ou uma boa empresa de comunicação integrada têm profissionais bem remunerados e altamente capacitados, portanto isso tem um preço. Essa era também uma questão muito discu da. O anunciante sempre procura pagar um preço mais compe vo e, às vezes, havia muita reclamação por parte das agências com relação a qual era o limite para se oferecer um bom trabalho. Respeito e remuneração – e uma coisa está relacionada com a outra, porque se você discute muito a remuneração é porque você não valoriza muito o trabalho que está sendo prestado. É verdadeira a idéia de que qualquer coisa, até o regime nazista ou outras ditaduras, pode ser vendida por um anúncio bem feito? Pode ser vendida bem ou mal. Você também mata um produto rapidamente com a publicidade, se ele for um mau produto. A publicidade tem uma função de ajudar a vender. Até não gosto muito do ajudar a vender, gosto mais de dizer assim: a comunicação tem um papel fundamental para ajudar a construir marcas e mercados. Goebbles, o publicitário do regime nazista que você citou, tentou e fez realmente um trabalho muito bem feito, mas a comunicação não resis u à má estratégia do Hitler, que em algum momento errou, tentou ocupar várias frentes ao mesmo tempo e o inverno matou-o na Rússia. Então, a comunicação pode, sim, construir marcas e mercados, mas também pode destruir tudo se a marca que eu estou ajudando a construir não corresponder à promessa que eu estou fazendo. E como um profissional deve agir diante de uma encomenda de um produto ruim, seja uma marca, um polí co ou um objeto? Olha, aí é uma questão muito pessoal, mas eu diria o seguinte: na nossa empresa, não fazemos porque é um princípio é co nosso. Se eu não acredito no produto que estou ajudando a vender ou na marca que estou ajudando a construir, então é melhor não fazer. Aí entra de novo aquela história da é ca: ela tem que começar dentro de casa. Eu estaria prestando um mau serviço se es vesse fazendo comunicação para um produto que eu sei que reconhecidamente não tem competência para estar no mercado, ou de um candidato que não tem consistência para poder cumprir aquilo que está prometendo. É muito forte hoje em dia a tese de que o consumismo desenfreado traz muitos problemas, desde a destruição do planeta até a desigualdade, uma vez que procura quase sempre es mular o consumo. Como fica publicidade nesse cenário? De novo eu digo para vocês: precisamos de educação. Não é porque 84 | Coleção Memória da Publicidade - Pioneiros |Curi ba | p. 73-94 | 2014
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eu fiz um comercial incen vando o consumo de tal produto que as pessoas têm que necessariamente comprar. Se já têm, por que vão comprar outro? É uma questão de disciplina e de educação das próprias pessoas. Acho que a publicidade tem um papel fundamental na promoção do desenvolvimento. Isso sem dúvida nenhuma: nós geramos mais empregos. E a publicidade pode e deve ser u lizada para ajudar causas comunitárias. Hoje temos em torno de 15 mil agências no Brasil; dessas, 4 mil estão cer ficadas pelo CENP, o Conselho Execu vo das Normas Padrão. O que ele faz? Cer fica as melhores agências do Brasil. Muito bem, se essas 4 mil agências, por exemplo, além de criar comerciais para persuadir as pessoas a comprar este ou aquele produto, encampassem uma causa social, nós teríamos aí no mínimo 4 mil causas sociais apoiadas pelas agências de propaganda. A Opus Múl pla tem como premissa básica devolver para a comunidade uma parte do que a comunidade lhe dá. Atendemos cinco ONGs, todas elas voltadas para algum po de a vidade social. Se as outras 4 mil, só as que estão no CENP, pudessem encampar uma causa dessas, estariam dando uma grande contribuição. As agências podem contribuir em causas sociais e a educar a população a consumir melhor. Porque não se trata de consumir mais, mas de consumir melhor. A relação entre agências e Estado, nos mercados menores, geralmente é polêmica. Na sua avaliação, hoje há mais profissionalismo nessa relação? Pode haver profissionalismo, sim, e deve haver. Porque o governo tem uma função importante que é a de informar a comunidade do que está realizando. Então, tem um lado da propaganda que é informa vo, que é a prestação de contas. Ora, deve ser feita com seriedade e com quem sabe fazer. Aí tem um outro lado. O governo tem um papel fundamental que são campanhas. Como campanhas de vacinação. Ora, campanhas de vacinação são educa vas. Tenho que fazer uma comunicação eficiente para sensibilizar as pessoas a atender ao meu apelo e, conseqüentemente, se elas aderirem e quanto mais aderirem, melhor é a condição de vida que o país vai ter. Essa comunicação deve ser feita por pessoas responsáveis, tanto da parte do anunciante, que é o governo, como da parte das agências. Eu sei que é um território muito delicado porque a relação entre agências e governo pode ser
“A criaƟvidade não é restrita a nenhum Ɵpo de aƟvidade. Ela está dentro da gente, faz parte do nosso dia-a-dia e depende muito do talento inato. De um curso de publicidade podem nascer dez profissionais criaƟvos como pode não nascer nenhum.” Coleção Memória da Publicidade - Pioneiros |Curi ba | p. 73-94 | 2014 | 85
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espúria. Pode. E nós vemos, evidentemente, um grande caso nacional, a história do “mensalão”, em que de repente uma ou outra agência era u lizada de uma maneira não é ca para atender alguns outros fins, que danificou, de maneira muito acentuada, a imagem das agências no Brasil. Essa a tude prejudicou seriamente a nossa a vidade. Tanto que fizemos o 4º Congresso Nacional de Publicidade exatamente para reunir todas as forças vivas que atuam na comunicação – veículos, fornecedores, agências etc. – para discu r qual era o papel da comunicação e mostrar para a sociedade que somos importantes como agentes do desenvolvimento e, sob o ponto de vista da é ca, podemos fazer um trabalho bem feito. Exceções existem em qualquer a vidade, mas a relação pode ser, sim, uma relação profissional e há vários mo vos para ser assim, como os que citei. E o publicitário ou agência que trabalha com polí ca pode ficar “marcado”: algum cliente que seja contra o par do para o qual a agência trabalhou não querer mais trabalhar com a agência? Não, não vejo isso. Até porque, se seguir isso que eu estou falando, a é ca e um trabalho profissional, trabalhar para algum candidato e depois para um órgão público é uma prestação de serviços como qualquer outra. Em relação ao que era a publicidade no passado, hoje está mais fácil ter o próprio negócio nessa área? Olha, abrir é fácil. O duro é manter e desenvolver. Por que é fácil? Se eu resolver agora criar uma fábrica de perfumaria, as barreiras de entrada são muito grandes. Primeiro porque tem grandes players no mercado, depois porque eu preciso montar uma fábrica, contratar técnicos em perfumaria etc. etc. Ora, para abrir uma agência de propaganda ou de comunicação, o que eu preciso? Da minha cabeça e um escritório, que pode ser até na minha casa inicialmente. Então, para abrir não tem problema nenhum. Mas para desenvolver um bom trabalho e para manter isso no mercado, aí é que é complicado. Você tem que definir claramente em que a vidade da comunicação vai trabalhar, ou se propõe a trabalhar na área de comunicação integrada. Uma vez que você definiu isso, o que você precisa? Você precisa, evidentemente, estar qualificado para aquilo. Um exemplo. Vou fazer
“O bom publicitário, o bom comunicador, deve entender um pouco de psicologia, entender muito de gente, de comportamento. E que cada grupo, cada classe social, cada grupo de consumidores, tem comportamento disƟnto.” 86 | Coleção Memória da Publicidade - Pioneiros |Curi ba | p. 73-94 | 2014
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uma empresa especializada em web, o que eu preciso conhecer? Preciso de programador ou terceirizo? Preciso de designer? Eu sou designer, não preciso. Mas preciso de alguém para trabalhar em mídia digital, que é uma nova área da mídia? Sim. Você tem que, na realidade, definir o teu foco de ação e ver se você tem todas as competências para fazer isso ou se associa a um grupo, a outros profissionais que tenham essas competências, ou se vai terceirizar esses serviços. A par r desse momento, você vai ter uma proposta específica para oferecer para o mercado. Aí, quem é que vai vender isso? Você mesmo. Então, além de designer, também vou fazer atendimento. Com relação a an gamente, con nua sendo tão fácil como antes abrir, mas mais di cil manter, eu diria até mais di cil hoje do que an gamente, porque hoje você tem que definir qual é a proposta de valor que vai oferecer ao mercado, se ela é mul disciplinar ou se ela é específica. Muitas vezes Curi ba é da como uma cidade-teste para produtos e serviços. Isso é verdadeiro ou é um mito? Não somos um ins tuto de pesquisa, mas a gente tem uma área de pesquisa na agência para apoiar o nosso planejamento. Alguns anos atrás, uns dez ou quinze anos, Curi ba realmente nha uma imagem de praça-teste. Por quê? Porque a pirâmide social era muito bem distribuída em Curi ba. Hoje tenho minhas dúvidas com relação a essa pirâmide sócio-econômica, porque já temos um cinturão de favelas ao redor da cidade. Houve um movimento muito grande, uma migração muito grande, nos úl mos anos, de pessoas de baixo poder aquisi vo, formando uma nova classe média. Não acredito que hoje Curi ba ofereça mais aquele po de pirâmide. Acho que somos teste ainda para algumas coisas: como somos uma cidade bastante eli sta, ainda o pessoal testa alguns espetáculos aqui para ver se efe vamente eles poderão ter sucesso lá fora. Se ver sucesso em Curi ba, provavelmente terá sucesso em outras cidades. Isso também já foi mais acentuado do que é hoje. Acho que hoje nós não somos mais uma cidade provinciana, somos uma metrópole, com pra camente dois milhões de habitantes, e já não podemos mais, na minha visão, ser enquadrados como uma cidade-teste. Como o senhor disse, há um aumento aparentemente significa vo no poder aquisi vo das classes que até pouco tempo estavam excluídas do consumo. Isso muda a maneira de fazer publicidade? Tem mudado, sim. Alguns fatores que a gente nota nos úl mos dois, três anos: por exemplo, as vendas a crédito voltaram a ter um papel predominante nas relações comerciais e, basta você ligar a televisão, Coleção Memória da Publicidade - Pioneiros |Curi ba | p. 73-94 | 2014 | 87
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o rádio ou jornal, para ver como a publicidade trabalha diariamente, a todo momento, em cima de ofertas. Com crédito muito mais fácil, a publicidade tem que também atuar, mostrando, informando ao consumidor essas facilidades novas que ele tem para adquirir bens e serviços. Essa é uma mudança substancial. Por outro lado, a gente também percebe uma mudança muito grande nas empresas, criando linhas e produtos para sa sfazer novas necessidades de mercado. Se antes você só vendia para uma classe mais privilegiada, hoje tem que desenvolver produtos para a ngir as classes que estão começando a acessar o consumo. Isso mexeu muito com os departamentos de marke ng de uma grande quan dade de empresas do mundo todo, e no Brasil inteiro. Algumas são retardatárias: só percebem o movimento muito tarde e evidentemente comem um pouco mais de poeira, como a gente diz. Mas ainda assim é um movimento muito grande no sen do de criar produtos e serviços que possam ser adquiridos por essa camada de população que está tendo acesso ao consumo de uma maneira mais organizada. O crédito é fundamental e novas linhas de produtos também e aí, conseqüentemente, o trabalho da comunicação é fundamental para atuar não só vendendo mais produtos, mas também oferecendo mais crédito. Qual foi a melhor campanha em que o senhor trabalhou e qual foi a mais desastrosa? Opa, a desastrosa a gente nunca conta! Talvez eu conte para vocês aqui. Mas, das campanha que mais me sensibilizaram em todos esses anos, uma delas foi de varejo, para o Malucelli da Visconde, que não existe mais. Era um cliente extremamente agressivo, no sen do de buscar novidades, e também expansionista: queria criar uma rede no Paraná. E num determinado momento ele se entediava com a comunicação. A comunicação hoje estava boa, amanhã não estava. Varejo é assim: você põe uma campanha no ar hoje e ela tem que dar a resposta no domingo ou na segunda-feira; se não der, ra do ar e faz outra. Na época, o Jamil Snege era meu diretor de criação – o Jamil já é falecido, eu chamava ele de turco, turco brilhante. Eu cheguei e disse: “Turco, nós precisamos dar uma virada no Malucelli”, e o turco, alguns minutos depois, veio na minha mesa com uma idéia: “Que tal: Ciro Bonzão contra o preção?”. Era uma campanha do Ponto Frio/Bonzão do Rio de Janeiro, o herói contra o bandido. Meia hora depois ele voltou e disse: “Que tal Kid Malu?”, “Tá bom, ok, mas Kid Malu contra o quê?”, “Contra a inflação”, “E como você vai dar personalidade a esta inflação?”, “Vou pegar um bandido, que vai ser a inflação, e o Kid vai bater no bandido”. Eu disse: “Maravilha!” E, como era uma época 88 | Coleção Memória da Publicidade - Pioneiros |Curi ba | p. 73-94 | 2014
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em que realmente a inflação era galopante, você nha que mostrar sempre os preços mais compe vos. Criamos a campanha do Kid Malu. Foi um sucesso extraordinário. Na hora da apresentação, a gente fez um churrasco na agência e chamou todo mundo: o cliente e seu staff – taí de novo, a gente falava direto com o cliente. Quando o Tota Malucelli chegou, viu todo mundo ves do de caubói. O atendimento da conta era o Eurico Budola, ves do de caubói, eu estava ves do de caubói, o Jamil, de caubói. Ele não entendeu muita coisa. Aí, no meio do churrasco, o chamamos para a sala de reuniões. Tínhamos posto, atrás das cor nas da sala de reuniões, todas as peças de comunicação, inclusive um barril daqueles de guardar man mentos em faroeste, nha um rifle em cima e tal, e nha um gibizinho – era a história da campanha. Pedimos para ele ler o gibi. Ele aprovou e a campanha foi um sucesso: ganhou medalha de ouro no Prêmio Colunistas do Paraná, como melhor campanha de varejo do ano e, logo em seguida, eu fui eleito o publicitário da década, até por ter es mulado essa campanha. Ganhamos também medalha de bronze no varejo nacional, concorrendo com todas as campanhas de varejo do Brasil. Isso no tempo da Opus, em 1980, porque a Opus Múl pla é o resultado da fusão da Opus e da Múl pla em 1986. Mais recentemente, nós vemos uma campanha que eu considero brilhante, já na Opus Múl pla, que foi a dos bichos [campanha educa va de trânsito] da Prefeitura de Curi ba. Quem não lembra da anta, do rato e da perua? Mais recentemente ainda, teve uma peça que era uma faixa de pedestres para o Shopping Curi ba. A gente pintou na faixa de pedestres o código de barras “linkando” para uma promoção do
“Às vezes as campanhas sofrem influência do próprio cliente. Ele quer mais ofertas, quer destacar mais isso ou mais aquilo e você acaba, ao invés de fazer uma boa campanha, fazendo um monstrinho.”
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Cliente – Maluceli Campanha: Natal Título: Kid Malu Comercial de TV 30”
Cena 1 Papai Noel dorme encostado em uma charrete. Cano de rifle é encostado no peito do velhinho.
LOCUÇÃO EM OFF: Aprisionado pela terrível Inflação, Papai Noel corre o risco de não chegar a tempo do Natal. Cena 2 Inflação amarra Papai Noel em uma cadeira. LOCUÇÃO EM OFF: Entrementes, não longe dali... Cena 3 Corta para a casa de Kid Malu. Ele está fazendo a barba e ouvindo rádio.
babe
LOCUÇÃO EM OFF: Atenção, Papai Noel raptado pela Inflação quando passava pelo desfiladeiro do Preço Alto. O velhinho... Cena 4 Kid Malu sai apressado de casa para salvar Papai Noel. Cena 5 Corta para a terrível Inflação, que coloca uma bomba entre os pés do velhinho. Cena 6 Volta para Kid Malu, que cavalga velozmente. LOCUÇÃO EM OFF: Não percam o próximo episódio dessa sensacional aventura de Kid Malu. Cartaz PDV
Bandeirolas PDV 90 | Coleção Memória da Publicidade - Pioneiros |Curi ba | p. 73-94 | 2014
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Shopping Curi ba. Em todos os concursos que nós par cipamos [com a peça] ob vemos alguma premiação, inclusive fomos finalistas em Cannes e no Fes val de Nova Iorque. Que mais? Teve uma outra campanha também, que foi o lançamento da Vodka Viborova no Brasil, também do Jamil Snege. Ele criou uma campanha memorável: uma cadeira namoradeira, daquelas an gas, que ficava o namorado pra cá, a namorada pra lá, e em uma das cadeiras nha uma garrafa de Vodka Viborova; na outra nha um polonês e o tulo era assim: “Cruéis esses poloneses. Só depois de cinco séculos revelaram a Vodka Viborova pra gente”. E a campanha foi um sucesso, ganhou prêmios também. São peças memoráveis. E as campanhas mais desastrosas? O senhor vai contar pra gente? As mais desastrosas? Talvez campanhas de varejo que a gente punha no ar e não davam resultado imediato e a gente nha que trocar. Mas eu, sem cabo nismo, não me lembro de campanha desastrosa. Não perdi clientes por campanhas que eventualmente não tenham dado resultado. Perdi clientes, sim, mas não por esse mo vo. Agora, tem coisas que a gente não gosta. A gente faz uma auto-crí ca muito forte na agência. Às vezes as campanhas sofrem influência do próprio cliente. Ele quer mais ofertas, quer destacar mais isso ou mais aquilo e você acaba, ao invés de fazer uma boa campanha, fazendo um monstrinho. Então, também é papel da agência ter uma auto-crí ca e ver quando foi bem e quando foi mal. [Às vezes] o cliente não reclamou, tudo bem, mas nós estamos felizes com a campanha? Não. Então vamos “layoutar” de uma maneira diferente para ver como ela ficaria melhor. Isso acontece muito na agência. Quais os elementos que uma campanha deve ter para ser bemsucedida? É técnica, é inspiração ou depende muito de um publicitário nato mesmo? A gente segue uma regrinha, que os mais novos como vocês vão achar até chato eu falar, porque os professores falam isso na primeira aula de vocês: é a AIDA – atenção, interesse, desejo e ação. Esse é um clássico, porque uma campanha boa tem que despertar a atenção, o A; ela tem que criar um interesse, o I; ela tem que despertar um desejo; e ela tem que levar alguém a fazer uma ação principal –comprar o produto, votar no candidato. Mas a comunicação, independente de responder a essas quatro letrinhas, responde a psicologia, a comportamento, a antropologia. Então, o bom publicitário, o bom comunicador, deve entender um pouco de psicologia, entender muito de gente, de comportamento. E aí cada grupo, cada classe social, cada grupo de Coleção Memória da Publicidade - Pioneiros |Curi ba | p. 73-94 | 2014 | 91
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consumidores tem comportamento dis nto. Quando se está fazendo comunicação, não pode pensar só no contato que o consumidor tem na hora de adquirir o produto, mas em todos os momentos em que o consumidor tem contato com aquela marca. Vamos dar um exemplo: uma companhia aérea. Tenho contato com a minha agência de viagens, ou com a internet quando vou comprar a passagem, mas, na hora que eu entrar na fila para fazer o check-in, vou ter outro contato; na hora que eu entrar no avião, outro contato; na hora que a aeromoça vier me atender com algum lanchinho ou com alguma informação, outro. Então, todos esses momentos da marca com o público devem ser devidamente analisados pelo profissional de comunicação e ele deve levar em consideração que em cada momento o consumidor tem uma reação diferente. Na hora que eu vou comprar a passagem, uma reação; na hora que estou sentado na minha poltrona apertadinha, com as perninhas encolhidas, se não for viajar na classe execu va, outro po de reação – provavelmente vou estar muito irritado, então preciso de um outro po de comportamento ou até um outro po de mensagem. O trabalho do comunicador é realmente examinar bem, seguindo esse modelinho clássico, mas depois estudando comportamentos e adequando as mensagens de acordo com esses comportamentos. E quando o publicitário deve equilibrar os apelos, a emoção e a razão? Tem como fazer uma campanha só com razão ou só com emoção? Posso trabalhar o humor, que é uma forma de emoção, uma boa música, usar uma criança como naquele filme do Leite Ninho para provocar uma ação racional. E tem a campanha que é meramente racional, a campanha de ofertas, principalmente aquela gritada, que eu, pessoalmente, não sou muito fã, mas que às vezes a gente tem que fazer e aí é muito mais uma exigência do cliente do que nossa. Aquela campanha de berrar uma oferta na tua orelha. Dá a impressão que você não tem ouvido para ouvir uma mensagem um pouco mais suave. Você não precisa gritar para que os outros ouçam a tua oferta, mas isso é a razão pela razão, o que fica uma cha ce. O senhor já ganhou vários prêmios. Acredita que os prêmios são uma maneira de es mular novas idéias e servem para fazer surgir profissionais mais cria vos ou engajados? A nossa a vidade é persuadir as pessoas a adotar uma marca, a votar num candidato, a comprar um produto ou um serviço. Essa é a nossa a vidade principal, custa caro e nós precisamos cumprir a nossa missão – não é a arte pela arte. É a arte aplicada a persuadir alguém 92 | Coleção Memória da Publicidade - Pioneiros |Curi ba | p. 73-94 | 2014
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“[A publicidade] é a arte aplicada a persuadir alguém a comprar um produto, ou serviço, ou idéia.” a comprar um produto, ou serviço, ou idéia. Agora, se eu puder fazer bem feito o meu trabalho, se a campanha a ngiu o obje vo e ainda ganhou prêmio, que maravilha! Porque, efe vamente, o prêmio é um afago no ego e os publicitários, de uma maneira geral, os profissionais de comunicação, como têm muito poder, o prêmio é um grande afago no nosso ego e es mula, evidentemente, as pessoas a serem cada vez mais cria vas, cada vez mais brilhantes. Mas não é essa a nossa função. Sob o ponto de vista é co, é u lizar os recursos que o cliente colocou à nossa disposição para fazer um grande trabalho de comunicação e ajudar a vender a marca dele, o produto dele, construir marcas e mercados. Se ganhar prêmio, maravilha, a gente até merece um champanhe para comemorar com a equipe toda.
Pesquisadores Acadêmicos: Rafaella Silva de Hollanda | Gabriela Afonso Kim | Thiago Sganzerla Âncora: Suelen Ivanovski
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MEMÓRIA DA PUBLICIDADE PARANAENSE MEMÓRIA DA PUBLICIDADE PARANAENSE MEMÓRIA DA PUBLICIDADE PARANAENSE MEMÓRIA DA PUBLICIDADE PARANAENSE MEMÓRIA DA PUBLICIDADE PARANAENSE MEMÓRIA DA PUBLICIDADE PARANAENSE MEMÓRIA DA PUBLICIDADE PARANAENSE MEMÓRIA DA PUBLICIDADE PARANAENSE MEMÓRIA DA PUBLICIDADE PARANAENSE MEMÓRIA DA PUBLICIDADE PARANAENSE MEMÓRIA DA PUBLICIDADE PARANAENSE MEMÓRIA DA PUBLICIDADE PARANAENSE
Paulo Vítola
MEMÓRIA DA PUBLICIDADE PARANAENSE MEMÓRIA DA PUBLICIDADE PARANAENSE MEMÓRIA DA PUBLICIDADE PARANAENSE MEMÓRIA DA PUBLICIDADE PARANAENSE MEMÓRIA DA PUBLICIDADE PARANAENSE MEMÓRIA DA PUBLICIDADE PARANAENSE MEMÓRIA DA PUBLICIDADE PARANAENSE MEMÓRIA DA PUBLICIDADE PARANAENSE
Mito da criação
No Paraná, quando o assunto é criação publicitária, não há quem não pense em Paulo Vítola. Com 40 anos de estrada, o veterano publicitário não fez tanto sucesso à toa. Músico e escritor, a cria vidade de Vítola sempre foi um ponto marcante na sua carreira. Ele começou na propaganda quando tudo ainda era muito di cil e os comerciais, feitos ao vivo – hoje algo inimaginável dada a sofis cação do que se vê na hora do intervalo, seja na televisão, seja em outras mídias, para não falar da internet. Mais tarde, acompanhou o crescimento da a vidade, quando a propaganda passou a ter como obje vo ajudar o anunciante. Em 1972, fundou a agência P.A.Z. – e foi aí que começou a se destacar na criação publicitária. Paulo Vítola sempre defendeu que a publicidade é responsável por facilitar o acesso à informação, à cultura e – por que não? – também ao entretenimento. Para ele, mais do que comercial, a publicidade tem uma função social importan ssima. Pensando no lado social desse mercado, o publicitário – que várias vezes se destacou em campanhas de conscien zação e u lidade pública, como na mais famosa delas, a dos “bichos do trânsito” – defende que a criação tem um espaço de destaque exatamente por ser a responsável por despertar interesses e paixões nas pessoas. A publicidade pode ser considerada um dos ramos que mais reúnem talentos e es mulam a cria vidade. Para ser publicitário, é preciso saber lidar com inúmeras habilidades e ferramentas. Como um grande representante da área e um mito da criação publicitária, na entrevista das próximas páginas Paulo Vítola dá a dica e diz que as idéias estão no mundo – basta ser um profissional atencioso e conseguir extrair a idéia certa, na hora certa. Marion da Rocha Ceschini
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Ao longo dos seus 40 anos de carreira, como você avalia essa evolução da comunicação, quais são os pontos posi vos e nega vos? Bom, eu não costumo ver pontos nega vos nesse percurso de 40 anos. Ao contrário, acho que a a vidade só evoluiu nesse período. Comecei trabalhando com um sistema analógico de gravação de vídeo, na TV Iguaçu, canal 4. Era um sistema totalmente mecânico de edição. A gente nha que fazer os comerciais e muitos deles eram ao vivo, mas alguns deles eram também gravados. A gente nha que gravar no exato tempo de 30”, porque não havia modo de editar, a não ser cortando fisicamente a fita, na gilete, e emendando com fita durex. E isso era o máximo que havia em matéria de edição, a única edição possível depois que o material estava gravado. Então, de lá pra cá houve uma evolução fantás ca. Hoje todo sistema de televisão está informa zado, a gente faz edição em imagem já digital. É uma evolução extraordinária, muito mais prá ca, muito mais eficiente se tornou todo esse ferramental. Quando você começou a trabalhar com publicidade, como era a ro na dentro das agências? Era muito diferente do que é hoje. A gente nha os grupos de criação, que eram formados normalmente por uma dupla, como é até hoje, um redator e um diretor de arte, para cuidar de um determinado grupo de contas. Os jobs entravam normalmente, mas o processo todo era feito muito mais lentamente. O diretor de arte era um sujeito que trabalhava numa prancheta, que desenhava o anúncio inteiro. As fotografias eram feitas e aplicadas sobre o layout do anúncio, normalmente u lizando imagens recortadas de revistas. Havia pessoas que eram especializadas em desenhar tulos em determinados pos de letras. O diretor de arte determinava: “Eu quero que você faça esse tulo em mes new roman” - nha um sujeito lá que sabia desenhar as letras, todo o alfabeto mes new roman à mão pra fazer com que aquele tulo aparecesse no anúncio. Enfim, o processo todo era muito mais artesanal. Hoje a gente trabalha com telas em que o trabalho vai sendo construído e está sempre limpo, próximo de ser finalizado. Hoje a a vidade se tornou o mais próximo da fábrica, da indústria do que propriamente do artesanato. O salto foi muito grande.
“Eu acho que, nesse século passado, provavelmente a publicidade deve ter agluƟnado a maior parte do talento criaƟvo mundial. Dificilmente uma outra aƟvidade terá Ɵdo tanto talento reunido quanto a publicidade teve.” Coleção Memória da Publicidade - Pioneiros |Curi ba | p. 95-116 | 2014 | 97
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“Hoje a gente tem um arsenal enorme de ferramentas para uƟlizar na comunicação e o papel das universidades deve ser, principalmente, de formar pessoas para uƟlizar esse ferramental todo de modo a transformar a publicidade numa aƟvidade cada vez mais consistente, do ponto de vista do conteúdo profissional empregado ali.” É correto afirmar que, quando começou a publicidade no Brasil, havia uma tendência de copiar as propagandas americanas? E em Curi ba, essa tendência se confirmava? A propaganda americana realmente influenciou não só a publicidade brasileira, como a do mundo todo. Mas eu diria que, no momento em que os brasileiros assimilaram essa forma de fazer a publicidade, eles também deram seu próprio tempero, usaram ingredientes que são próprios da nossa cultura. Eu me lembro que quando eu me interessei pela primeira vez por publicidade e acabei criando a P.A.Z., junto com o Zeno O o e o Nilson Machado, o modelo de agência que havia no mercado era a DPZ – uma agência paulista, brasileira, que havia conseguido fazer a antropofagia correta de tudo aquilo que era influência de fora e se expunha de uma maneira brasileira, cria va, com jogo de cintura, uma coisa muito mais próxima da nossa cultura. Então, influência, sim, houve, mas ela foi devidamente aclimatada. Hoje, a publicidade brasileira é reconhecidamente uma das melhores do mundo. Se houve uma assimilação, ela foi muito bem traduzida em produtos de qualidade e é excelente. Você acha que a agência de propaganda passou a ter um outro papel quando se começou a pensar realmente em criação? A criação sempre teve um espaço de destaque dentro da a vidade, porque a gente lida, na verdade, com a arte de despertar o interesse das pessoas em relação às coisas que quer mostrar ou vender:
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produtos, serviços, idéias, enfim, as coisas que a gente quer vender para determinados pos de público. Por isso, a criação tem um papel fundamental que é compor essa cena capaz de fazer o espectador – ou o leitor do anúncio, ou aquele que recebe a peça publicitária – ser impactado, persuadido. Por isso, a criação sempre teve esse papel de destaque. Fora que ela sempre foi muito cercada de um glamour todo especial: havia concursos e há até hoje concursos nacionais, internacionais de publicidade. Eu acho que, nesse século passado, provavelmente, a publicidade deve ter aglu nado a maior parte do talento cria vo mundial. Dificilmente uma outra a vidade terá do tanto talento reunido quanto a publicidade teve. Não vejo nem nas grandes redes de televisão, nem nas grandes companhias de cinema, nos grandes estúdios. Impossível imaginar uma a vidade que congregue tantas habilidades diferentes, tantas ferramentas diferentes e tanta cria vidade somada, se você considerar isso em escala planetária. Dificilmente você vai ver isso ocorrer em outra área, em outra profissão. No final de 1968 surgiu o jornal O Pasquim. Como esse jornal ajudou a revolucionar a comunicação nacional? Foi um susto. O Pasquim foi uma revolução em toda a linguagem da imprensa e acredito que na própria linguagem corrente da população. Ele trouxe para a mídia uma leveza que não exis a, trouxe um senso de humor, uma visão crí ca, um olhar absolutamente diferente de tudo que até então a imprensa nha feito, por isso ele representou um avanço fantás co. A linguagem do jornal se tornou menos literária e mais coloquial, mais limpa de adje vos, mais sóbria – do ponto de vista de passar informação com mais qualidade. O Pasquim trouxe para o nosso universo de consumo de informação a novidade esté ca de ser um tablóide onde você encontrava contribuições de grandes cartunistas como Henfil, Ziraldo, Millôr Fernandes. Grandes cabeças da cultura brasileira, Paulo Francis, Jaguar. Enfim, havia uma concentração enorme de talentos naquele semanário, como eles falavam. Toda semana a gente esperava O Pasquim ansiosamente, era um programa ler O Pasquim. Então, teve sim uma grande influência, eu mesmo fui diretamente influenciado pelo Pasquim. Pela linguagem do semanário, quando comecei a trabalhar na televisão. É que, quando foi inaugurada a rádio Iguaçu, o diretor da rádio era o Euclides Cardoso e ele me pediu para criar uma linguagem especial para os comerciais da emissora e a minha tarefa era pegar os spots de rádio, que vinham normalmente gravados, e traduzi-los para uma linguagem que fosse própria da rádio. O Pasquim foi um pouco o meu espelho, nesse momento. Eu Coleção Memória da Publicidade - Pioneiros |Curi ba | p. 95-116 | 2014 | 99
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joguei para dentro da rádio uma linguagem totalmente despojada, diferente daquela que a rádio costumava u lizar naquele momento, e o resultado foi extraordinário. A gente conseguiu chamar um público para rádio que a rádio, até então, não nha. Enfim, O Pasquim foi um fenômeno ainda a ser estudado. Eu tenho 400 números do Pasquim e, hoje, olhando os 400 números do Pasquim, eu vejo a história daquele momento, daquele período, retratada com humor, às vezes com uma certa ironia, um sarcasmo. A gente estava ali vivendo um período de ditadura militar onde havia uma limitação grande das liberdades em geral e da liberdade de imprensa em par cular, e muitas vezes os números do Pasquim eram escritos dentro da prisão. Realmente foi um fenômeno extraordinário. A mim, sem dúvida nenhuma, ele influenciou de verdade. Mas eu acho que a maior parte dos redatores publicitários foi influenciada, sobretudo, pela propaganda americana, pelos art directors. É verdadeiro afirmar que houve uma época român ca e hoje prevalece uma publicidade mais profissional, e por quê? As pessoas que vinham para o mundo da publicidade nham interesses bem claros em relação ao mundo das artes. Então, era român ca, porque a gente conversava muito durante o expediente, provavelmente, muito mais a respeito de um poema ou de um filme que nha acabado de passar ou de uma música bacana, um novo LP, na época se chamava LP, que nha sido lançado. Enfim, a gente falava muito mais do universo cultural e, portanto, era uma conversa muito mais boêmia, vamos dizer assim, do que a publicidade pura e simples. A gente não ficava horas e horas discu ndo questões de linguagem publicitária, ou a forma. Cada um sabia bem o que estava fazendo ali em relação à publicidade – que era procurar dar a melhor forma possível para fazer com que aquele anúncio, aquela peça publicitária fosse eficiente. A gente nha um instrumental pra isso, a gente sabia o que estava fazendo, mas o nosso foco de interesse mais importante ainda era o mundo das artes de um modo geral. Eu já estava fazendo teatro, música. Eu vim, na verdade, da carreira musical pra dentro da televisão, até por proximidade. A música acontecia muito na televisão, a gente se apresentava muito em programas e eu acabei conhecendo pessoas que me convidaram para começar a trabalhar lá. Da televisão
“Acho que o álcool é uma droga igualzinha a qualquer outra droga que se encontra fora do mercado tradicional. Por mais que as pessoas tenham discernimento ou capacidade de escolha, a gente conhece o poder da comunicação, a gente sabe o que a comunicação pode fazer.” 100 | Coleção Memória da Publicidade - Pioneiros |Curi ba | p. 95-116 | 2014
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fui para a publicidade também por uma questão de proximidade. Os comerciais eram, muitas vezes, feitos na própria emissora de televisão, e eu acabei indo pra essa a vidade e nunca mais saí dela. Quer dizer, acabei de completar esses 40 anos de profissão quase que ininterruptamente fazendo publicidade. Quais as maiores dificuldades nas agências do passado e nas de hoje também? No passado, as maiores dificuldades eram as dificuldades de processos de produção, que na época eram muito limitados. Você nha que lidar com uma quan dade de recursos menor do que a gente tem hoje. Aconteciam coisas curiosas, por exemplo, eu fiz um comercial uma vez que foi o comercial de lançamento do iogurte Batavo com frutas. Eu resolvi fazer um jingle com uma porção de crianças dentro do estúdio, cantando e comendo iogurtes com frutas. E aquilo nha que ter 30”, exatamente a duração do comercial. Aquilo demorou uma manhã inteira e as crianças não agüentavam mais comer iogurte com frutas e era uma luta para conseguir terminar, mas acabou saindo a boa, como a gente chamava. A gente colocou esse comercial no ar e foi um grande sucesso. As crianças, provavelmente, nunca mais comeram iogurte com frutas, ficaram trauma zadas pro resto da vida. Mas você veja, eram dificuldades que a gente conseguia superar de alguma forma. Eu lembro de outro caso que foi bastante interessante. Quando eu comecei a trabalhar, a TV era em preto e branco. A TV a cores veio bem depois, acho que em 1970. Em 1968, quando eu comecei, era em preto e branco, e nha um sistema de trabalhar o branco sobre o fundo preto, que dava um efeito bastante interessante, ficava como se fosse um risco de giz. Então a gente construía elementos cênicos, assim com esse po de risco de giz e colocava um apresentador na frente para fazer o comercial e, normalmente, também costumavase u lizar roupas que dessem ênfase, o preto, o branco e o meio tom. Eu me lembro que uma vez a gente fez um comercial onde o apresentador aparecia como se ele es vesse tomando um banho de chuveiro. A gente desenhou esse chuveiro com esse risco de giz, tudo direi nho e ele entrou como se es vesse embaixo daquele chuveiro que ficou recortado e ele nha que dar o comercial como se es vesse tomando banho. Acontece que a água não aparecia e não aparecia porque o fundo era preto e não nha jeito aquilo, não nha solução, e a saída foi a mais absurda que vocês possam imaginar: eu mandei comprar vários pacotes de leite na esquina e ele tomou um banho de leite para escorrer aqueles pingos da água e aquilo virar um banho de chuveiro, ser visto como um banho de chuveiro. Quer dizer, coisas que Coleção Memória da Publicidade - Pioneiros |Curi ba | p. 95-116 | 2014 | 101
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não se imagina fazer, não há necessidade nenhuma de se recorrer a tanta traquitanagem. E por falar em traquitanagem, havia um diretor de TV naquela época, o Osni Bermudes, talvez o mais importante de toda a história paranaense, com quem eu aprendi muito, que nha essa habilidade extraordinária de criar traquitanas, ele criava objetos que nham um motorzinho, rodinha, nha hélice, se movimentava. Ele conseguia representar cenas inteiras que ficavam mecanicamente funcionando diante de uma câmera. Era um inventor, um professor Pardal, uma figura muito interessante, que vale a pena estudar. As traquitanas dele muito bem feitas, ele usava toca-discos velhos para fazer coisas girarem. Efeitos que a gente não nha eletronicamente na televisão ou digitalmente na televisão, ele conseguia obter u lizando recursos puramente mecânicos e com uma habilidade extraordinária. Mudando um pouco de direção, a cidade de Curi ba conseguiu construir uma imagem posi va aqui e internacionalmente também. Essa idealização prejudica ou prejudicou de alguma forma a publicidade daqui? Eu acho que não. Eu acho que a boa imagem de Curi ba, o fato de ela ter sido vista ao longo desse tempo todo como uma cidade que tem soluções muito cria vas, muito interessantes para velhos problemas urbanos, a primeira cidade que conseguiu criar um sistema de transporte diferente de tudo que havia até então, criar espaços de lazer como os parques que hoje a gente pode freqüentar, uma estrutura cultural como a que a gente tem hoje, só trouxe bene cios pra prá ca cria va de um modo geral. E a publicidade foi beneficiada com isso. Eu acho que Curi ba tornou-se um pólo importante na cultura brasileira desde o tempo em que a Universidade Federal do Paraná se instalou aqui. Ela foi chamada de cidade universitária durante muitos anos. Os avanços urbanís cos que houve nesse período, a par r dos anos 1970 até pra camente no fim da década de 1990, foram avanços importantes em outras direções, mas principalmente na direção do transporte cole vo, realmente uma novidade importante, a estrutura de lazer e meio ambiente, que foi forte e marcou a cidade, dis nguiu Curi ba dentre as demais, e a estrutura cultural, que foi bastante enfa zada e tornou a cidade um pólo cultural importante. E o conservadorismo dos curi banos não chegou a atrapalhar o mundo publicitário? Não. Esse negócio do conservadorismo desrespeita Curi ba e já não
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“A comunicação pode tanto promover a venda de determinados produtos, idéias, serviços, como pode funcionar como uma ferramenta didáƟca. Ela pode ensinar pessoas como se comportar, adquirir comportamentos corretos em relação à natureza, em relação à sociedade de um modo geral.”
existe mais. Hoje Curi ba é uma cidade cosmopolita, eu vejo assim. Não existe mais aquele curi bano conservador, que eu me lembro que exis a quando eu era criança. O que quebrou um pouco esse tradicionalismo do curi bano foi a grande imigração que houve no período dos anos 1970 pra cá, que trouxe gente do país inteiro. Hoje, a grande massa que vive em Curi ba não é nascida aqui, ela veio de fora. Então, essa Curi ba é nova, ela não tem uma iden dade bem definida, não dá para dizer que ela é conservadora, eu acho que ela é mais aberta a uma série de influências e tem hoje a cultura hip hop, os rappers, os grafiteiros, enfim, ela está aberta a influências do mundo. E tem uma terceira Curi ba, eu chamo assim, que é uma Curi ba meio flutuante, que é essa que veio com a úl ma revolução industrial, que veio com as indústrias automobilís cas. Muita gente que veio para ocupar espaço nas indústrias, principalmente execu vos, pessoas de um extrato superior, gente do mundo inteiro. Hoje você entra num restaurante e ouve conversas em francês, em inglês. Pessoas que pra camente usam a cidade como se ela fosse um hotel bacana, daqui a pouco elas vão embora, seguem sua carreira, e essa Curi ba funcionou para elas como um momento de sua carreira profissional. Então, eu não vejo Curi ba como uma cidade conservadora neste período todo, ao contrário, eu vejo como uma cidade cosmopolita, capaz de absorver a vanguarda da informação. Uma cidade conservadora não teria poetas como o Paulo Leminski, um sujeito de vanguarda total, andando anos luz à frente, desbravando caminhos de linguagem. Enfim, eu não vejo Curi ba como uma cidade parada no tempo.
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“A quanƟdade de informação necessária para fazer um bom profissional hoje é impressionante, é uma coisa inimaginável tempos atrás. O que nós temos hoje de conteúdo a assimilar para desempenhar bem as aƟvidades dentro de uma agência de publicidade é muita coisa, é um conteúdo imenso.” Você acha que a publicidade pode ser exercida por profissionais de qualquer área, e o que isso pode trazer de bom ou de ruim para os publicitários? Pois eu sou um exemplo de profissional que veio de uma área que não é de formação específica. No tempo que eu entrei para essa profissão não havia curso de comunicação, pessoas provenientes de várias áreas do conhecimento iam para as áreas da comunicação.Você entrava num jornal, e havia muito mais advogados, médicos, pessoas com formação de professores do que pessoas com formação específica para comunicação, não exis am esses cursos. Eu acho posi vo isso, de ter contribuição de diferentes áreas do conhecimento dentro do mundo da comunicação. Não vejo como um problema é co você ter a contribuição de uma pessoa de psicologia dentro do setor de pesquisa da agência de publicidade. Talvez elas sejam mais adequadas que um profissional que lida diretamente com a questão da comunicação, das linguagens da comunicação ou com o conhecimento específico da área da comunicação. Não vejo problema algum em uma pessoa formada em administração, finanças, se dedicar, por exemplo, à área de mídia. Não vejo problema quanto a isso, um economista se interessar pela área de mídia, porque ele pode, por exemplo, lidar com aplicação de dinheiro de um determinado cliente para obter um resultado determinado, e isso é um cálculo, na verdade, uma maneira de aplicar, de inves r uma parte do capital do cliente num negócio. Eu vejo sim é necessidade de se aprimorar cada vez mais os cursos de formação de pessoas para as áreas específicas da comunicação. Por exemplo, hoje a gente tem um arsenal enorme de ferramentas para u lizar na comunicação e o papel das universidades deve ser, principalmente, de formar pessoas para u lizar esse ferramental todo de modo a transformar a publicidade numa a vidade cada vez mais consistente, do ponto de vista do conteúdo profissional empregado ali. Enfim, vejo as diversas áreas da publicidade hoje como importan ssimas para o pessoal que sai dos cursos de comunicação. Não vejo, na verdade, problema é co na convivência entre diferentes espécies nesse mundo que pode ser perfeitamente compar lhado. Você acredita que o Conselho de Auto-Regulamentação Publicitária,
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o CONAR, funciona? E você é a favor da proibição total de algum po de publicidade? Ele funciona, na medida do possível, funciona. E ainda é a melhor maneira que nós temos de regulamentar a profissão. Representantes da própria profissão fazendo esses regulamentos entrarem em vigor. Você pergunta se eu tenho alguma restrição a algum po de publicidade? Tenho sim, eu acho que algumas coisas não devem ser anunciadas em hipótese alguma. Uma delas já é proibida por lei e vale repe r: arma de fogo, por exemplo. Armas, de um modo geral, não devem ser anunciadas por nenhum po de comunicação. É uma proibição correta. Há uma polêmica grande em torno da questão do cigarro. Como é que essa indústria que gera tantos empregos, gera tantos impostos, reverte de algum modo em bene cio da população, fica excluída do mundo publicitário? Mas está certo, tem que excluir mesmo, faz mal pra saúde, está induzindo pessoas a ficarem doentes, então, não pode, de fato, se dar espaço nos meios de comunicação pra vender, indiscriminadamente, esse po de produto pra qualquer pessoa, então eu sou contra. Acho que o mesmo tratamento devia ser dado ao álcool. Acho que o álcool é uma droga igualzinha a qualquer outra droga que se encontra fora do mercado tradicional. Por mais que as pessoas tenham discernimento ou capacidade de escolha, a gente conhece o poder da comunicação, a gente sabe o que a comunicação pode fazer. Você já produziu algum anúncio de que tenha se arrependido? Não, me arrependido propriamente, não. Por exemplo, eu nunca fiz anúncio de cigarro, bebida ou qualquer coisa que possa fazer mal pra quem quer que seja. Nenhuma campanha que eu tenha feito foi para vender algo que não vesse nenhuma u lidade para as pessoas. É muito forte hoje em dia a tese de que o consumismo desenfreado cria muitos problemas, desde as sociedades desiguais até a destruição do planeta. Uma vez que procura, quase sempre, es mular o consumo, como fica a publicidade nesse cenário? A sociedade toda está organizada num modelo de produção e consumo. A publicidade funciona como uma espécie de óleo capaz de azeitar essa engrenagem e fazer com que ela funcione. Ela não cria o sistema, ela apenas funciona como um elemento de ligação entre o mundo da produção e o mundo do consumo. Eles têm que se aproximar de algum modo, e o elo de ligação entre esses dois mundos é feito pela comunicação, não existe outro modo de você aproximar esses dois mundos. Acho que sim, ela es mula o consumo, mas ela Coleção Memória da Publicidade - Pioneiros |Curi ba | p. 95-116 | 2014 | 105
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pode ensinar. Por exemplo, separar o lixo. Então, a comunicação pode tanto promover a venda de determinados produtos, idéias, serviços, como pode funcionar como uma ferramenta didá ca. Ela pode, perfeitamente, ensinar pessoas como se comportar, adquirir comportamentos corretos em relação à natureza, em relação à sociedade de um modo geral. Pode ensinar responsabilidade social, responsabilidade ambiental, da mesma forma como vende produtos. Qual é a função da publicidade, a função social, já que ela é mais comercial? Todos os meios de comunicação disponíveis no mercado são sustentados pela força da propaganda. A publicidade de um modo geral coloca à disposição de uma cole vidade inteira bene cios como televisão no ar. Os programas de televisão só são possíveis porque têm patrocínios publicitários, pessoas, marcas que sustentam aqueles horários de entretenimento, de diversão. Os jornais que circulam com as informações, todos eles só fazem isso porque têm anúncios, senão não circulariam. Então, a publicidade viabiliza o acesso à informação, ao entretenimento, à cultura de um modo geral, por todos os meios de comunicação disponíveis. Durante um período você assumiu a coordenação da propaganda polí ca de um governador, em seguida você revelou que não foi muito boa essa experiência. Queria saber o que está faltando na propaganda polí ca para ela ser olhada de uma forma mais posi va? Eu trabalhava em agência de publicidade e fui convidado para par cipar do governo do Álvaro Dias, como coordenador de publicidade e propaganda. Só que já havia decorrido um certo tempo entre o início desse governo e o convite que me foi feito. Eu aceitei o convite e fui integrar uma equipe de comunicação e marke ng de uma recémcriada secretaria, que era a secretaria de comunicação. Foi a primeira vez que ela se organizou como secretaria, e comecei a desempenhar a minha função de coordenador de publicidade e propaganda já com todas as agências licitadas, elas já nham todas sido escolhidas, eu já não nha nenhuma liberdade de escolher os profissionais com quem eu gostaria de estar trabalhando. E a própria a vidade, que deixou de ser cria va, eu trabalhava muito mais numa área de coordenação que procurava fazer, tornar viáveis as campanhas, esse po de coisa, do que criar, e isso começou a me aborrecer profundamente e eu acabei saindo da estrutura por essa razão. Talvez o problema não tenha sido tanto do governo em si, da propaganda oficial em si, mas era um 106 | Coleção Memória da Publicidade - Pioneiros |Curi ba | p. 95-116 | 2014
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“Eu sou um redator, conƟnuo sendo um redator, até hoje trabalho como redator. Minha principal paixão sempre foi escrever.” problema meu, pessoal, quer dizer, eu não consegui transformar essa oportunidade em uma boa experiência. O jornalismo de Curi ba, historicamente, serviu de porta-voz dos governos locais e nacional. A publicidade também seguiu pelo mesmo caminho? Acho que as contas de governo, as contas oficiais, são contas importantes para manter o setor funcionando. Elas ainda significam um valor expressivo de inves mento na área. Elas não podem ser simplesmente desprezadas. Ao contrário, têm que ser bem cuidadas para que cumpram melhor a sua função. Eu acho que o grande inves mento da comunicação oficial, da comunicação do serviço público de um modo geral, é educar as pessoas, é ensinar as pessoas a adquirirem prá cas saudáveis, aproveitarem os diversos serviços que o próprio Estado oferece. Enfim, buscar contribuir da melhor forma possível para que a cole vidade usufrua dos bene cios que o Estado proporciona. Se isso for conseguido, para mim a propaganda oficial, a propaganda dos governos de um modo geral, é saudável. Quanto à questão da consciência, a gente está discu ndo aqui o fato do dinheiro oficial estar financiando, pagando, grande parte das despesas dos veículos de comunicação, e se isso influencia ou não a opinião do veículo. É uma questão delicada e de consciência do próprio veículo. O próprio veículo é que tem que dar conta de resolver bem essa equação. Eu vendo espaços de comunicação, mas não vendo a minha opinião por causa disso. Essa é a a tude é ca, a a tude correta. Se o governo quiser anunciar no meu jornal, é bem-vindo, porém eu não vou vender a minha opinião por causa disso. E a agilidade da comunicação atual, te assusta? Coleção Memória da Publicidade - Pioneiros |Curi ba | p. 95-116 | 2014 | 107
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Não. Eu acho que a agilidade do mundo atual é acompanhada também pelo mundo da publicidade. Não que me assuste, eu fico preocupado porque as pessoas têm cada vez menos tempo pra si mesmas, vivem numa roda viva sem fim, sem descanso, e isso é preocupante. Eu vejo hoje, mesmo o mundo das agências de publicidade em relação ao passado, estruturas quase industriais, onde as pessoas não param, têm poucos momentos para respirar, tomar um fôlego, se informar um pouco melhor, ocupar seu tempo livre porque muitas vezes ele nem existe, de uma forma cria va. Realmente isso me preocupa, sim. Ver que as pessoas estão cada vez mais presas a uma engrenagem que parece não ter sossego, não ter descanso, não ter parada, e isso é ininterrupto, não deve fazer bem. E isso pode afetar de alguma forma a questão é ca? Essa agilidade, essa rapidez, essa necessidade de estar sempre correndo? Então, a pressa nunca dá certo em coisa nenhuma, a gente sempre acaba deixando alguma coisa esquecida, poderia ter ficado melhor e não ficou porque já foi. Quando já foi, já foi, você não tem mais o que fazer, e às vezes os erros acontecem muito por causa dessa neurose cole va de tudo ser pra ontem e você nunca ter tempo suficiente para pensar. Eu acho que as pessoas têm um limite natural, que é diferente do limite de uma máquina. Uma máquina, você aumenta a capacidade do HD, você faz uma série de coisas que você não pode exigir de um ser humano, é cada vez mais rápido, e isso não pode dar um bom resultado. E as novas tecnologias, principalmente a área de telefonia celular? Como você acha que estão interferindo na a vidade dos publicitários? É um meio de comunicação a mais. Hoje você pode u lizar o celular para várias ações de comunicação publicitária. Por exemplo, você está dentro do shopping e recebe uma mensagem de determinada loja e você acessa e sabe que tem uma oferta especial, uma coisa interessante acontecendo. Quer dizer, isso é um avanço interessante. Acho às vezes meio invasivo, meio chato, não gosto de telemarke ng de um modo geral, porque ele incomoda as pessoas, muitas vezes em horas impróprias. Cheguei a receber telefonemas de call center cedo, em casa, é uma coisa que eu acho deplorável, não devia ser u lizado dessa forma. Mas eu não sou contra a u lização do meio em si. É um meio poderoso, ele concentra uma série de meios de comunicação, vários deles estão convergindo pra ele, você tem oportunidade de colocar filme, música, mensagem gráfica, quer dizer, muito mais do 108 | Coleção Memória da Publicidade - Pioneiros |Curi ba | p. 95-116 | 2014
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“É uma gincana permanente. Você não tem um dia igual ao outro e as tarefas são muito diferentes umas das outras. Então é muito variado o cardápio diário. Eu acho que é um mundo para quem gosta de movimento e variedade.” que o velho telemarke ng do call center. Isso exige um pouco mais do publicitário? Exige, porque ninguém quer receber uma mensagem chata, nem mal feita. Tem que ser uma coisa diver da, muito interessante para não ficar uma invasão chata. Como você avalia o profissional que sai hoje em dia de uma universidade? A quan dade de informação necessária para fazer um bom profissional, hoje, é impressionante, é uma coisa inimaginável tempos atrás. O que nós temos hoje de conteúdo a assimilar para desempenhar bem as a vidades dentro de uma agência de publicidade é muita coisa, é um conteúdo imenso. Ninguém vai conseguir ser profundo em todos esses conteúdos. Então, a grande tarefa da agência e do profissional que se candidata a ingressar no mercado é iden ficar o mais rápido que ele puder o seu espaço de preferência para que ele possa se aprofundar, pelo menos numa determinada área com bastante ênfase, com bastante profundidade mesmo, porque vai precisar disso. Eu acho que as faculdades, as universidades de um modo geral, conseguem dar a informação básica necessária para o profissional iniciar na profissão, mas grande parte do aprendizado vai ser concluído no exercício da profissão, dentro da agência, no dia-a-dia, trabalhando, vendo as coisas acontecerem de verdade. Porque uma coisa é você aprender teoricamente, você ter teorias extraordinárias, você ter histórias de grandes marcas, e outra coisa é você, na prá ca, pegar um determinado po de marca, que você nunca viu, e fazer com que ela fale, com que ela se comunique com o consumidor de verdade, e que essa comunicação traga resultados para essa marca. Eu acho que o estudante que sai para ingressar na vida prá ca da comunicação dentro de uma agência tem que ser ligeiro, rápido na escolha de sua especialidade. Em quais áreas você já atuou nestes teus 40 anos de profissão? Dentro da publicidade propriamente, eu sempre fui redator. Trabalhei como redator na P.A.Z., depois na Múl pla, na Exclam, na Opus Múl pla, e ve também duas empresas minhas, que foram a Casulo Coleção Memória da Publicidade - Pioneiros |Curi ba | p. 95-116 | 2014 | 109
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Comunicação e a Bitz, mas sempre a minha principal função dentro dessas agências foi a função de redator, embora tenha exercido também a função de diretor de criação em determinados momentos. Eu fui diretor de criação tanto da P.A.Z., como da Múl pla e da Exclam, mais tarde da Opus Múl pla, onde me desloquei para uma a vidade de projetos especiais, e foi exatamente quando começaram a surgir essas novas ferramentas que precisavam compar lhar com a propaganda o espaço dos meios de comunicação e esse conceito de integração entre as ferramentas foi ali gerenciado por essa diretoria de projetos especiais. Eu fiz uma boa parte dessa transição da Opus Múl pla Propaganda para a Opus Múl pla Comunicação Integrada, que envolve essas novas especialidades da comunicação. E, finalmente, fui diretor de planejamento da Opus Múl pla. Foram essas as áreas principais de a vidade. Tem preferência por alguma delas? Eu sou um redator, con nuo sendo um redator, até hoje trabalho como redator. Minha principal paixão sempre foi escrever. A publicidade e a música caminharam paralelamente na sua história de vida. De que forma a carreira ar s ca ajudou na carreira de comunicador? Ajudou muito, muito mesmo. Na verdade, se não fosse a música, é provável que não vesse ingressado na profissão. Era o momento dos fes vais de música, em meados dos anos 1960, quando eu comecei a trabalhar com música popular brasileira. Acabei par cipando vários dos grandes fes vais. Eu comecei a me interessar por aquele mundo do estúdio, das câmeras, das luzes, da criação para comunicação de massa. Logo em seguida, fui convidado pra escrever um programa de auditório. Esse programa era feito aqui, era feito no auditório da Sociedade Thalia, no ginásio da Sociedade Thalia, e era transmi do direto ao Rio. Eu escrevia os textos, os apresentadores eram Mário Bi encourt e uma cantora famosa na época, a Dóris Monteiro. Era um programa como o Faustão, só que com os recursos daquela época, naturalmente. E esse foi o meu primeiro trabalho: escrever para um programa de auditório. A inclinação para escrever já exis a, eu já estava escrevendo músicas, e o mundo da televisão me fascinou. Na
“Gostar do que se está fazendo é o fundamental, o ingrediente principal do sucesso em qualquer ramo de aƟvidade. Na minha opinião, o segredo é ter paixão, é gostar de verdade daquilo que faz.” 110 | Coleção Memória da Publicidade - Pioneiros |Curi ba | p. 95-116 | 2014
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publicidade, muitas vezes eu criei jingles publicitários para todo po de produto. E a campanha dos bichos no trânsito, que teve uma boa aceitação com o povo curi bano, como foi o processo cria vo? A gente nha sabia que os esforços feitos anteriormente não nham dado certo. Então, procuramos, pela primeira vez, atuar na consciência do cidadão, criando uma espécie de coerção moral, ele se sen r constrangido de pra car determinado po de infração diante dos outros. E aí escolhemos, para simbolizar isso, para tornar isso expressivo e ter eficiência, representar na publicidade uma cena que é comum ao trânsito, que é as pessoas se xingarem. Quando um atravessa na frente do outro, quando um atrapalha o outro no trânsito de algum modo, o motorista, de um modo geral, xinga. Então, resolvemos criar três xingamentos diferentes para serem u lizados educa vamente pelas pessoas. Denominamos a mãe que atrapalha, que apanhava as crianças na saída escola e parava em fila dupla, de perua. O cidadão que atravancava o trânsito, bloqueando o cruzamento, foi denominado como anta, e o furador de sinal, o rato. Demos forma para esses três personagens fazendo com que as pessoas se transformassem no bicho toda vez que come am aquele po de infração, e isso foi realmente uma tarefa complicada, com os recursos que a gente nha naquela época. A gente nha que fazer, e fez, um efeito de transformação duma pessoa em bicho tridimensional, em bicho cartunizado ainda por cima, que era mais complicado ainda. Foi um trabalho insano, muito tempo de produção, mas o resultado foi fantás co. Para ter uma idéia, os índices caíram em torno de 80%, 90% para esse po de infração na cidade, o que foi um feito memorável. Eu acho que foi o grande momento em que consegui sinte zar um monte de experiências em três filmes. Foram trinta e tantos anos de profissão ali. Está tudo ali, eu fiz a música, criei os personagens, imaginei as situações todas. Todo esse processo de coerção social que foi colocado ali. Acompanhei cada passo da produção. Como você definiria a vida no mercado publicitário? É uma gincana permanente. Você não tem um dia igual ao outro e as tarefas são muito diferentes umas das outras. Então é muito variado o cardápio diário. Eu acho que é um mundo para quem gosta de movimento e variedade. Uma a vidade que não tem repe ção. Por mais que você acumule experiência, o job que cai na mesa é novo, você nunca fez antes e ele tem que ser feito do zero. É claro que a experiência conta porque você pode ter feito coisas parecidas com Coleção Memória da Publicidade - Pioneiros |Curi ba | p. 95-116 | 2014 | 111
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aquela, mas aquela ali é nova. A novidade é permanente, a variedade de repertório que você tem que u lizar é muito grande. Pode ser considerado um co diano inusitado? Totalmente inusitado. Não tem como programar o que vai acontecer no dia, por mais organizado que você seja. Não só pessoas da área de criação, estou falando em geral, pessoas que trabalham nesse mundo da comunicação, em agências de publicidade, não têm um co diano normal, é totalmente variado, cada dia uma coisa diferente, uma batalha nova. E, tendo em vista, as mudanças rápidas da profissão, o que pode e deve ser mudado no ensino da publicidade? O mais importante é ter essa consciência da variedade de mídias. Hoje tem uma grande variedade de meios de comunicação que precisam ser bem u lizados, portanto, é essencial aprender a u lizar bem esses meios com a linguagem apropriada. Isso, me parece, é uma missão das escolas. Mas o essencial é saber pensar no conceito que organiza essas ferramentas todas, essas linguagens todas, de modo a tornar a comunicação integrada. Você lida com um conjunto grande de ferramentas, mas, como você tem um conceito capaz de se espraiar por todas elas, você consegue manter uma unidade de comunicação que acaba, por fim, construindo a marca que está assinando aquele esforço todo. Qual seria o segredo, uma caracterís ca de uma pessoa, de um publicitário que tem uma carreira longa? A carreira longa se deve muito à persistência. Gostar do que se está fazendo é o fundamental, o ingrediente principal do sucesso em qualquer ramo de a vidade. Na minha opinião o segredo é ter paixão, é gostar de verdade daquilo que faz. É claro que tem que ter persistência para não desis r quando tem algum insucesso, o que é normal, as pessoas erram, e o nosso universo de trabalho, às vezes, é arriscado. Essa campanha dos bichos no trânsito, por exemplo, nha tudo para dar errado, tudo. Imagine, pela primeira vez alguém nha feito uma proposta para uma prefeitura de uma cidade assinar uma campanha que ensina os motoristas a se xingarem no trânsito, era uma apologia do insulto. Era arriscado nesse sen do, muito arriscado. Outra coisa que era arriscadíssima era aquele efeito de transformação das pessoas em bichos cartunizados: podia ficar um horror aquilo, a gente não nha o menor controle, não sabia o que ia dar, então
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vemos que correr um risco enorme. Aquilo foi feito da maneira mais primi va possível, do ponto de vista da animação em 3D. A gente teve que construir as cabeças daqueles bichos em cerâmica, pegar uma caneta ó ca e transferir para o computador, linha por linha, aquela cabeça, para fazer o aramado das três dimensões, recobrir aquilo, marcar todos os pontos de animação. Marcar cada movimento que essa cabeça ia fazer, cada coisa, piscada de olho, tudo nha que ser marcado naquele arame todo. Aí nha que se cobrir aquilo com uma textura que representasse o bicho de uma maneira ní da. Tinha tudo para dar errado. No entanto, a gente arriscou, teve apoio do cliente para acreditar que aquilo poderia trazer um resultado posi vo e acabou acontecendo. E o que pode acabar com a carreira de um publicitário? É o desencanto, na verdade. É a pessoa não ter mais nenhum po de entusiasmo por aquele mundo, o que não é uma coisa tão rara de acontecer. Acontece muito, muita gente eu vi sair da a vidade, par r para outro po de trabalho, por ter se desencantado com a profissão. Acho que o excesso de pudor, o excesso de qualquer po de conservadorismo é fatal, quer dizer, as pessoas não conseguem suportar. Esse mundo da comunicação publicitária é um mundo muito obje vo, você tem que estar ali para vender uma coisa para uma porção de gente e esse é o resumo da história. Se você se sente bem fazendo isso, faça porque é uma coisa legal, bacana de fazer. Agora, se você vai discu r esse aspecto o dia inteiro, todas as vezes que você for se defrontar com um job, aí você não faz, é melhor não fazer. Vai ser um profissional medíocre e triste porque vai fazer algo contra sua própria natureza. Não foi o meu caso, para mim foi amor à primeira vista. Eu cur fazer aquilo, sempre gostei de fazer porque acho que tem coisas bacanas para vender, principalmente idéias, como essa do trânsito. Idéias legais que você consegue passar para as pessoas. Como funciona o processo cria vo na publicidade? De onde surgem tantas idéias? As idéias estão na sociedade, estão no mundo de um modo geral. Você tem que buscar essas idéias onde acontece a vida. A vida gera as idéias, não são as idéias que geram a vida. É ter atenção nas coisas que acontecem. Toda criação tem como fundamento uma grande quan dade de informação. Você primeiro assimila muitas coisas, muitas linguagens e muita informação a respeito de um determinado tema, para daí rar a síntese, uma combinação diferente e inusitada de idéias. São momentos diferentes, você tem um tempo de assimilação, Coleção Memória da Publicidade - Pioneiros |Curi ba | p. 95-116 | 2014 | 113
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“Nenhuma pessoa é puramente racional ou emocional. A gente tem que se comunicar como gente, com razão e com emoção, com a dose certa para cada Ɵpo de coisa.” de processamento dessas informações todas e do gesto cria vo mesmo, de interferência com algum meio de comunicação. As idéias estão no mundo, estão na vida, mas é preciso fazer um trabalho consciente, atento, atencioso, para conseguir extrair as idéias certas. E como um publicitário deve equilibrar a emoção e a razão? É possível basear uma campanha em apenas uma ou outra coisa? Todas as linguagens, todos os pos de apelo passam pelo mesmo canal, que são os sen dos. Você recebe toda informação por meio de algum sen do, ou a visão, ou audição, os sen dos levam isso para dentro do cérebro e você processa isso lá dentro e acaba trazendo uma resposta qualquer. O conteúdo racional ou emocional, gênero de argumentação racional ou emocional, depende muito do produto que você está procurando vender, ou da idéia, ou do serviço, enfim, da coisa que você quer vender. Tem produtos que têm mais afinidade com o mundo emocional e outros, mais afinidade com o mundo racional. E alguns produtos podem perfeitamente combinar essas duas áreas, a emoção e a razão. Posso dar como exemplo a compra de um apartamento. A compra de um apartamento tem um lado racional, descrever o produto, dizer quantos quartos tem, quantos metros quadrados, são coisas racionais. E tem a realização do sonho de ter aquela casa própria, uma argumentação totalmente emocional. Se você juntar essas duas coisas de uma maneira feliz, então provavelmente você vai conseguir uma comunicação eficiente. Nenhuma pessoa é puramente racional ou emocional. A gente tem que se comunicar como gente, com razão e com emoção, com a dose certa para cada po de coisa. Para encerrar nossa conversa, queríamos saber se, depois de tantos anos de profissão, você se considera realizado ou se ainda pretende fazer alguma coisa em relação à publicidade e propaganda? Eu me sinto realizado e privilegiado por ter do um percurso tão rico, tão cheio de realização – tanto do ponto de vista cria vo, como de relacionamento pessoal no mundo da publicidade. Trabalhei com grandes profissionais, ve parceiros fantás cos durante todo esse tempo. Eu tenho vontade de con nuar trabalhando na profissão e só vou parar no dia em que realmente já não ver mais esse entusiasmo que eu tenho pela a vidade cria va. Se for para responder de uma 114 | Coleção Memória da Publicidade - Pioneiros |Curi ba | p. 95-116 | 2014
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forma absolutamente obje va, posso dizer: eu sou um profissional muito realizado.
Pesquisadores Acadêmicos: Leonardo Schultz | Soraya Souza Renfro | Gabriela Silva Almeida Âncora: Marion da Rocha Ceschini
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MEMÓRIA DA PUBLICIDADE PARANAENSE MEMÓRIA DA PUBLICIDADE PARANAENSE MEMÓRIA DA PUBLICIDADE PARANAENSE MEMÓRIA DA PUBLICIDADE PARANAENSE MEMÓRIA DA PUBLICIDADE PARANAENSE MEMÓRIA DA PUBLICIDADE PARANAENSE MEMÓRIA DA PUBLICIDADE PARANAENSE MEMÓRIA DA PUBLICIDADE PARANAENSE MEMÓRIA DA PUBLICIDADE PARANAENSE MEMÓRIA DA PUBLICIDADE PARANAENSE MEMÓRIA DA PUBLICIDADE PARANAENSE MEMÓRIA DA PUBLICIDADE PARANAENSE
Eloi Zanetti
MEMÓRIA DA PUBLICIDADE PARANAENSE MEMÓRIA DA PUBLICIDADE PARANAENSE MEMÓRIA DA PUBLICIDADE PARANAENSE MEMÓRIA DA PUBLICIDADE PARANAENSE MEMÓRIA DA PUBLICIDADE PARANAENSE MEMÓRIA DA PUBLICIDADE PARANAENSE MEMÓRIA DA PUBLICIDADE PARANAENSE MEMÓRIA DA PUBLICIDADE PARANAENSE
Bicho do Paraná
O tempo passa, o tempo voa – e as campanhas criadas por Elói Zane con nuam na memória da população brasileira. A receita para isso? A publicidade não vende produtos, cria conceitos, explica o publicitário. Com um currículo recheado de novos conceitos e sucessos, Zane gosta de refle r sobre a comunicação em suas mais diversas facetas. Como colunista, publicou aproximadamente duzentos ar gos sobre o assunto em revistas e jornais do Brasil, além de vários livros, entre os quais O encantador de clientes, Administração, futebol & cia. e A importância da pausa na contação de histórias. Nos anos 1980, Zane foi diretor de comunicação do Banco Bamerindus, para o qual criou algumas de suas campanhas mais memoráveis, como “Gente que faz” e “Bicho do Paraná”. Anos depois, à frente da direção de marke ng do Bo cário, foi o criador do conceito da Fundação O Bo cário de Proteção à Natureza. É um pioneiro como ambientalista e atualmente preside o Conselho da SPVS – Sociedade para a Preservação da Vida Selvagem. Na entrevista a seguir, o publicitário fala da propaganda como estratégia de negócio e da importância da eficácia na venda do produto. “Não estamos aí para fazer coisas engraçadinhas, nós temos que fazer coisas para vender. Um bom publicitário é aquele que sabe elaborar bons conceitos de campanha, bons conceitos de produtos, bons conceitos de venda. Essa é a parte mais di cil, e a parte que menos se faz.” A coleção de prêmios mostra o reconhecimento a sua trajetória. Entre os destaques, valem menção o Profissional do Ano da Rede Globo (1982), Top de Marke ng Nacional (1996) e Super Top de Marke ng Ecologia (1997). Mesmo com tanto sucesso na bagagem, Elói Zane não dá chance à arrogância e ainda cutuca os colegas publicitários que acham que sabem tudo: “O publicitário se acha dono da verdade. E não é”. Ricardo Vieira
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Eloi Zane
- Bicho do Paraná
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Avaliando o mercado de publicidade de ontem e hoje, quais os avanços? Há avanços e retrocessos. As décadas de 1960, 1970, 1980 e até meados de 1990 foram períodos que favoreceram muito a propaganda. Vendia-se muito via propaganda e comunicação de massa. Mas hoje a venda exclusivamente por propaganda acabou, porque a realidade é outra. No mercado paranaense, nós nhamos, nas décadas de 1960, 1970 e 1980, um varejo muito forte, o que trazia grandes anunciantes. Nós éramos muito bons nisso, muito refinados. Mas acabamos perdendo para Porto Alegre e parece até que desaprendemos a fazer varejo. Muito da comunicação de varejo que hoje se faz aqui já vem empacotada de fora. Essa situação é um exemplo das grandes mudanças sofridas pelo mercado publicitário paranaense. Então nós chegamos a regredir? De certa forma sim, mas são con ngências e circunstâncias do mercado. Há hoje muito menos acesso à mídia de televisão – que é a grande mídia – porque ela ficou muito cara para o varejo. Em termos gerais, o dinheiro das marcas de varejo que iriam para esse canal fica concentrado na mão do grande empresário (como as Casas Bahia, por exemplo, ou o Ponto Frio). É esse o po de anunciante que está tomando todo o espaço para si. E a comunicação dessas grandes empresas de varejo não é feita em Curi ba, é feita fora. O grande anunciante de varejo daqui é o supermercado Condor, por exemplo, ou o Angeloni. Esse po de coisa. Nas décadas de 1960 e 1970, esse era um mercado muito mais a vo. Naquela época, só para dar um exemplo, a Móveis Pedroso comprava quinze inserções por dia na Rede Globo, durante 365 dias por ano. Isso não existe mais e é impossível. O Hermes Macedo era outro grande anunciante. O que quero dizer é que o número de anunciantes era maior e havia grandes ações de varejo. O Frischmann’s, que foi um cliente que eu atendi durante muito tempo, nha uma musiquinha fantás ca: “O preço do amigão não tem compe ção, Frischmann’s está em liquidação”. Hoje não é mais assim.
“No mercado paranaense, nós ơnhamos, nas décadas de 1960, 1970 e 1980, um varejo muito forte, o que trazia grandes anunciantes. Nós éramos muito bons nisso, muito refinados. Mas acabamos perdendo para Porto Alegre e parece até que desaprendemos a fazer varejo.”
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“Era muita aventura, muita descoberta. Se era preciso fazer um filme em 16 mm preto e branco, por exemplo, a gente Ɵnha a idéia na sexta à noite, sábado de manhã já estava filmando, na hora do almoço montava e à noite estava no ar.” O senhor acha que houve uma época român ca na publicidade dos pioneiros e que hoje prevalece uma publicidade mais profissional? Sem dúvida. Hoje ela é muito mais técnica, mais profissional – até porque vocês estão num curso de propaganda. Quando eu comecei, não nha cursos de publicidade – o único que exis a era na Escola Superior de Propaganda e Marke ng em São Paulo (ESPM). E era um privilégio de poucos. E, também, a propaganda era vista como uma coisa maldita. Teve um anúncio famoso do Roberto Duailibi, que é da DPZ, na revista Propaganda, que mostrava os pais segurando uma cinta e o tulo era assim: “Se seu filho um dia lhe disser que vai ser publicitário, como você vai reagir?” No começo, não exis a a profissão, o que exis am eram os agenciadores de anúncios. Era mesmo uma época român ca em que todos precisavam fazer de tudo. A gente assinava a Adver sing Age – uma revista grande que vinha dos Estados Unidos – para ver os pos de letra, que a par r disso eram montados à mão. Refazia a pologia para depois montar o paste-up final. Era muita aventura, muita descoberta. Se era preciso fazer um filme em 16 mm preto e branco, por exemplo, a gente nha a idéia na sexta à noite, sábado de manhã já estava filmando, na hora do almoço montava e à noite estava no ar. Era uma correria. Tudo era muito mais empírico, porque você nha que descobrir as coisas na prá ca. A palavra marke ng estava ainda sendo incorporada ao linguajar, as pessoas não sabiam fazer isso. Mas o que faziam era com muito mais coração, porque um produtor de uma agência ia de fato na gráfica ver o produto saindo, estudar a cor com o produtor, estudar fotolito, montar fotolito junto. Hoje o sujeito chama alguém de fora, terceiriza, e acabou. A gente era obrigado a saber de tudo. Você sabia até a hora que entrava no ar, como fazer para que o teu comercial fosse o primeiro do break. Esses eram os muitos truques que a gente usava na época. Você já citou algumas das dificuldades nas agências do passado. Existem outras? Eu acho que uma coisa que se deve fazer sempre é ensinar o cliente a comprar a publicidade, porque o cliente, normalmente, não sabe fazer isso. Quando um cliente sabe mais que a agência, ele ajuda a agência e 120 | Coleção Memória da Publicidade - Pioneiros |Curi ba | p. 117-138 | 2014
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compra melhor que a agência. E ele não deixa a agência fazer besteira também. Então eu sempre acho que aquele que compra a publicidade deve ter o domínio da situação toda. Ele tem que entender de mídia, tem que entender de po de letra, tem que entender de texto, tem que entender de fotografia para poder comprar bem a publicidade e até para passar um bom briefing. Hoje, quando eu vejo campanhas ruins na rua, digo que aquilo é culpa de quem aprovou, não de quem fez. A publicidade exige muito tempo de maturação, de sedimentação, de erros e acertos. Nós vamos aprender muito mais errando do que acertando. Eu acho que ainda existe certa arrogância dos publicitários em acharem que sabem tudo. Um cliente que está ali vendendo um sapato há 30, 40 anos, sabe muito mais de sapato. E mesmo assim o publicitário se acha dono da verdade. E não é. E nas agências hoje em dia, ainda existem dificuldades? Dificuldades sempre vão exis r. A relação entre o cliente, aquele que paga a conta, e o publicitário sempre é delicada. O cliente da agência tem que saber como funciona o processo para não comprar errado. Uma das grandes dificuldades é o briefing, ou seja, a forma como o cliente explica o que quer do publicitário. Muitas vezes não é tão fácil fazer isso. Outras, os publicitários esquecem do cliente e acham que a idéia mais engraçadinha é a que vale. Só que nós não estamos aí para fazer coisas engraçadinhas, nós temos que fazer coisas para vender. Então, é preciso saber elaborar bons conceitos. Um bom publicitário é aquele que sabe elaborar bons conceitos de campanha, bons conceitos de produtos, bons conceitos de venda. Essa é a parte mais di cil, e a parte que menos se faz. Até porque hoje a demanda também é muito maior, de anúncios e peças, não é? Não sei se a demanda de anúncios é muito maior. O que sei é que hoje tudo é mais focado em resultados. Você tem que dar resultado em curto prazo. Isso é fruto de uma visão vendedora, que prioriza as tá cas de venda em curto prazo. É um pouco complicado. Porque, com o marke ng, muitas vezes é preciso pensar em longo prazo. E muitas vezes a comunicação, além de estar vendendo na hora, está vendendo
“Um produtor de uma agência ia de fato na gráfica ver o produto saindo, estudar a cor com o produtor, estudar fotolito, montar fotolito junto. Hoje o sujeito chama alguém de fora, terceiriza, e acabou.” Coleção Memória da Publicidade - Pioneiros |Curi ba | p. 117-138 | 2014 | 121
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em longo prazo também, criando uma marca. Hoje não se vê isso. A construção de marcas precisa de uma estratégia mais refinada e o vendedor, aquele que pensa só na venda, não tem isso na cabeça. Ele não consegue elaborar uma coisa de longo prazo. Vai sempre vender o mês, vender o trimestre. Hoje, você tem que dar resultado por trimestre e isso engessa as agências, atrapalha o processo de construção de marcas. Enfim, é mais di cil construir uma marca hoje, porque isso exige tempo – e a comunicação se processa na sedimentação. Nos anúncios que eu fiz para O Bo cário, durante onze anos, dá para ver isso. Se pegarmos um anúncio e voltarmos três anos para trás, ou formos mais três para a frente, dá para ver que há uma ligação entre eles, porque é para fazer essa amarração que a comunicação existe. A agência que atende o cliente deve deixar rastro na história. Tem que ficar um rastro. Por exemplo, sem citar nomes: uma determinada agência que ficou 20 anos com o cliente, quando deixou de atendê-lo não nha deixado rastro nenhum. E daí, o que ficou? Não ficou nada. Como dizia o Carlos Drummond de Andrade, “de tudo restou um pouco”. Precisa restar um pouco. Porque, se você pergunta o que ficou e não tem resposta, não construiu a marca. A Kra foi vendida por um bilhão de dólares, os a vos e as marcas da Kra foram vendidas por dez bilhões de dólares. O que vale mais? A marca da Bombril ou a fábrica da Bombril? A marca do Bo cário ou a fábrica do Bo cário? É isso que você tem que ver. Para construir marca você tem que andar por esse caminho. Você mencionou a campanha do Frischmann’s. E eu me lembro quando criança de ter ouvido essa música. Hoje em dia não se vê mais isso, esse negócio fixo na cabeça das pessoas lembrando uma marca. Ou então aquela abertura da campanha do Bamerindus, “o tempo passa, o tempo voa” – ficou até hoje. Inclusive pessoas que talvez nasceram depois ainda têm isso na cabeça. Porque foi criado um bom conceito. E isso sempre bate. Os publicitários devem pensar em conceitos. Por exemplo, qualquer filme do Bamerindus que es ver na gaveta pode ser colocado no ar, porque o filme vale e está legal. Ele foi trabalhado, elaborado dentro de um bom conceito, muito bem pensado. Então, como é que se fazia um filme do Bamerindus? A gente criava o filme. Aí se tentava chegar a um bom conceito. Chegando ao bom conceito, ficava-se um período tentando destruir a idéia. Depois de passado esse tempo, a gente tentava encontrar alguma coisa boa que vesse permanecido. É tudo um conceito. “O tempo passa, o tempo voa” é de um conceito que eu cheguei com o redator Sérgio Mercer, um grande redator, 122 | Coleção Memória da Publicidade - Pioneiros |Curi ba | p. 117-138 | 2014
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“Não estamos aí para fazer coisas engraçadinhas, nós temos que fazer coisas para vender. Um bom publicitário é aquele que sabe elaborar bons conceitos de campanha, bons conceitos de produtos, bons conceitos de venda. Essa é a parte mais diİcil, e a parte que menos se faz.” um dos melhores redatores que o Paraná já teve, e que infelizmente faleceu. Um dia, conversando com o Sérgio, perguntei a ele: “O que faz as pessoas ganharem dinheiro na poupança?”. E ele respondeu: “O tempo que o dinheiro fica parado no banco”. Completei: “Então vamos fazer uma campanha sobre o tempo”. E assim nasceu a campanha. As pessoas conhecem uma parte dela. Se a pessoa fosse para Santa Rosa, para Marechal Cândido Rondon, iria ouvir campanhas de rádio com música caipira, falando do tempo, da plantação. Tinha-se “n” coisas sobre o tempo, não apenas aquilo que aparecia na televisão. Era muito mais do que isso. É um conceito bem amarrado. Assim como, mais tarde, o conceito da Fundação O Bo cário. O segredo é buscar o conceito. Eu aprendi isso com o André Bukowinski, da ABA Filmes, que é o diretor de filmes mais premiado do Brasil. Aprendi com Washington Olive o e com o pessoal da W/Brasil, que elaborava grandes conceitos. Você acha que por meio desses conceitos bem elaborados as campanhas do Bamerindus, como a do Bicho do Paraná, ficaram na história da publicidade paranaense? Acho que ficaram porque eram boas idéias. Idéias muito simples. Teve uma repe ção também. Eu, quando fiz o conceito do Bicho do Paraná, recebi a música, que era uma música para turismo. Eu olhei aquilo e pensei: “Será que é isso?” Daí eu estava fazendo a barba em casa e pensei que o paranaense é um caipira. Se ele assumisse o caipira que ele é, seria um grande passo na busca da nossa iden dade. A gente nha essa briga para achar a iden dade do Paraná e, depois, eu desis disso, porque é pura bobagem. Eu levei a idéia e disse: “Vamos pegar Coleção Memória da Publicidade - Pioneiros |Curi ba | p. 117-138 | 2014 | 123
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“Hoje, você tem que dar resultado por trimestre e isso engessa as agências, atrapalha o processo de construção de marcas. Enfim, é mais diİcil construir uma marca hoje, porque isso exige tempo – e a comunicação se processa na sedimentação.” pessoas que fizeram boas coisas, paranaenses que fizeram boas coisas, fora do Paraná”. Esse é o conceito. Achei que ia dar quinze nomes, e deu mais de trezentos. Porque o paranaense não é que nem o baiano que sai dizendo o que faz, ele fica quieto. Apareceu um dos principais cirurgiões dos Estados Unidos, um que faz os cálculos balís cos da NASA, apareceu o maior especialista em petróleo da África. Começou a aparecer gente sem parar e a campanha foi embora. E também com uma parceria muito boa com um veículo de comunicação, na época. O veículo permi u com essa parceria baratear o custo. Senão seria inviável uma campanha que nha três, quatro, cinco, seis vídeos por mês, muitas vezes fora daqui. A campanha, com a parceria do veículo de comunicação, se tornou possível de ser realizada. Como hoje os veículos querem ganhar tudo, não dá para fazer uma campanha dessas. Você acha que hoje se tornou mais fácil ter seu próprio negócio na área? Eu acho que sim, porque tem mais de mil agências em Curi ba. Agora, se funcionam, não sei. A agência é uma questão de estar vendendo serviços, e é preciso ser muito bom naquilo que se vende. Há uma concorrência muito grande. Há uns quatro, cincos anos, eu escrevi um ar go chamado “Eu tenho um sobrinho que faz mais barato”, porque toda coisa que se vê de vídeo, de web, quando se apresenta um orçamento profissional para um empresário ele diz: “Ah, eu tenho um sobrinho que faz mais barato!” E aí faz aquelas lambanças. Nada contra os sobrinhos, mas deve-se saber com quem se está fazendo. O número de agências acaba sendo maior que a demanda do mercado? Muito maior, o mercado não suporta tanta gente assim. Nós não sabemos defender nosso negócio como na Idade Média, que se nha que pedir licença para a associação. Você seria um joalheiro se eles deixassem. Protegia-se muito mais o negócio. Mas isso é um fenômeno mundial, tem agências sobrando em tudo quanto é lugar. An gamente, os salários das agências eram muito maiores. Hoje não se tem nem um décimo do que era o salário naquela época. Um redator ganhava fortunas. Um bom redator, na DPZ, na W/Brasil, em 124 | Coleção Memória da Publicidade - Pioneiros |Curi ba | p. 117-138 | 2014
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qualquer lugar, ganhava fortunas incalculáveis. Hoje não existe isso, os salários baixaram muito. Qualquer agência, por menor que seja, te dá um bom rendimento. Gira-se um bom dinheiro. Mas esses grandes salários sumiram. Não tem mais há muito tempo. E como funciona a relação publicidade, promoção, assessoria de imprensa e relações públicas em relação a an gamente? Essas ferramentas do marke ng já eram usadas como são hoje em dia? A palavra marke ng, como ela é conhecida hoje, entrou no Brasil por volta de 1954. A grande época da propaganda foi em 1960, 1970 e 1980. Apenas na década de 1990 é que começou a aparecer o pessoal das promoções. A MPM foi a que lançou a primeira agência de promoção, acho. Hoje o leque se abriu. Pode-se fazer comunicação de várias maneiras. Caso se queira ser redator apenas da área médica, é possível. Só da área agrícola, também dá. E an gamente não havia isso. Não havia essa diversidade ou essa especialidade nesses assuntos. Hoje se pode viver muito bem sendo redator só da área agrícola, só da área médica, só da área odontológica, porque o mercado permite, o mercado se refinou. Eu via os anúncios da Adver sing Age, na década de 1960, pedindo redatores especializados, e pensava: “Quando isso vai chegar ao Brasil?” Já chegou há algum tempo. Você acredita que Curi ba é ou já foi uma cidade-teste para produtos e serviços, ou isso é apenas um mito? Tem uma parte de mito e uma de realidade. As empresas de pesquisa faziam pesquisa em Curi ba porque era mais barato. Os restaurantes eram mais baratos, os hotéis também. Era muito mais barato trabalhar em Curi ba do que em São Paulo ou no Rio de Janeiro. Isso do ponto de vista da economia. Mas Curi ba teve, durante muito tempo, uma classe média bastante estabilizada, muito consistente. Então se trabalhava muito com a classe média brasileira tendo Curi ba como amostra, porque ela era bem homogênea. Hoje em dia, com todas as mudanças que ocorrem – a classe C sendo a classe média brasileira, com essa mistura toda que houve – Curi ba não é mais um mercado teste.
“Como é que se fazia um filme do Bamerindus? A gente criava o filme. Chegando a um bom conceito, ficava-se um período tentando destruir a idéia. Depois de passado esse tempo, a gente tentava encontrar alguma coisa boa que Ɵvesse permanecido.” Coleção Memória da Publicidade - Pioneiros |Curi ba | p. 117-138 | 2014 | 125
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“Quando se apresenta um orçamento profissional para um empresário, ele diz: “Ah, eu tenho um sobrinho que faz mais barato!” E aí faz aquelas lambanças. Nada contra os sobrinhos, mas deve-se saber com quem se está fazendo.” Havia aquele mito de que a peça de teatro que deu certo aqui ia ser aceita no resto do Brasil, e isso tudo porque o governo ajudava a fazer teatro aqui. Os grandes lançamentos de teatro no Brasil eram pagos pelo Paulo Pimentel, pelo Ney Braga, que foi o grande incen vador por parte do governo. Então era mais barato fazer aqui, o governo ajudava. Por isso que se têm grandes atores de Curi ba daquela época. Graças ao Ney Braga, que começou a ajudar o teatro. Faziam-se peças e, se passavam em Curi ba, passariam em qualquer lugar, porque aqui o governo pagava. Só isso. Não significa que o curi bano é muito crí co, porque eu acho que ele nem é. Ele bate palma para qualquer um. Você é a favor da proibição total de algum po de publicidade? Proibição total, não. Nós não estamos em um regime nazista, não é? Mas a gente deve proibir alguns abusos. Já houve abusos no passado, de publicidade realmente enganosa, mas o CONAR deu uma arrumada nisso. Porém, se deixar, a turma vai fazer lambança na publicidade, com coisas muito enganosas. Não sou a favor da proibição total, mas alguma coisa a gente tem que segurar. É o que aconteceu com as restrições à publicidade de cigarro na década de 1990, não é? Exato. E aí derrapou, porque, se você proíbe mais alguma coisa, não se pode falar nada. A publicidade tem que se defender. Os publicitários fizeram uma coisa muito inteligente, há uns 30 anos, que foi o CONAR, Conselho de Auto-Regulamentação Publicitária. Foi uma coisa inteligente para se proteger. O [estadista alemão] Bismarck disse uma vez para a classe dos dominantes na Alemanha: “Eu estou protegendo vocês de vocês mesmos”. O CONAR veio para fazer isso, e eu acho que ele fez um bom trabalho. Porque, se deixar, vão vender até coisa que não existe. Já foi assim e ainda escapam coisas desse po. É verdadeira a idéia de que qualquer coisa – até mesmo um regime nazista, fascista – pode ser vendida por uma boa campanha? Eu acho que um dos grandes mestres da comunicação foi o Goebbels, secretário de comunicação do Hitler. Não tem como dizer que ele não foi um bom publicitário, um bom comunicador. Ele foi um excelente comunicador. Então, é claro que se pode vender qualquer coisa. 126 | Coleção Memória da Publicidade - Pioneiros |Curi ba | p. 117-138 | 2014
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Quanto mais su l a propaganda, mais força ela tem. O pessoal do Goebbels, do nazismo, começou a trabalhar antes da guerra, com as brigadas juvenis, os acampamentos juvenis, o trabalho de campo, exercícios nas escolas. Eles foram criando e minando essa massa crí ca. Depois, quando assumiram o poder, foi muito fácil fazer isso. Então, é isso que temos que olhar nos governos. Eu estudei recentemente a comunicação no Império Romano. Nossa, você acha que a gente faz coisas sofis cadas hoje em dia? Os romanos eram verdadeiros experts na comunicação. Para se ter uma idéia, o [imperador romano] Otaviano contratava poetas para falarem dele – faziam teatro na rua falando do Otaviano, ligando-o a uma divindade. Moedas eram cunhadas com ele entrando com uma quadriga [biga conduzida por quatro cavalos], por exemplo. Entrar com uma biga com dois cavalos já era um grande feito. Do outro lado da moeda, nha a representação do Netuno, deus do mar. Tudo isso era comunicação para o povo achar que ele nha uma ligação com a divindade. Os romanos eram muito su s em comunicação. E a comunicação precisa de su lizas. Sabendo-se usar as su lezas você faz qualquer coisa. Esses regimes fizeram muito bem isso. Eles sabem montar a estrutura. Hoje se tem o merchandising. Esse exemplo é conhecido: foi provado recentemente, por meio de recibos, que profissionais de uma empresa de relações públicas em Washington foram pagos para criar uma boa vontade com o povo aqui do Sul. Antes da 2ª Guerra Mundial, o Vargas [presidente Getúlio Vargas] no Brasil e o Perón [General Juan Domingo Perón] na Argen na eram favoráveis ao Terceiro Reich e não aos Estados Unidos e aos aliados. Então, o que os americanos fizeram? Criaram o Zé Carioca, criaram o Bambi, que vem de uma história argen na. Também deram todo o poder para a Carmen Miranda e o Bando da Lua. Fizeram vários filmes de Hollywood que falavam do Brasil, como Voando Para o Rio, Meu Amor Carioca, e coisas desse po. Tudo puro merchandising para criar um estado de espírito favorável aos Estados Unidos, que precisavam da madeira e da borracha do Brasil, da lã e da carne da Argen na. E precisavam de uma passagem no Atlân co lá em cima, nas bases de Natal e Fernando de Noronha. Por causa disso, foi criada uma comunicação. Não é propaganda, é comunicação para atrair a boa vontade desses povos, e conseguiram. O Walt Disney foi pago por essa assessoria de imprensa de Washington
“Um bom redator, na DPZ, na W/Brasil, em qualquer lugar, ganhava fortunas incalculáveis. Hoje não existe isso. Qualquer agência, por menor que seja, te dá um bom rendimento. Gira-se um bom dinheiro. Mas esses grandes salários sumiram.” Coleção Memória da Publicidade - Pioneiros |Curi ba | p. 117-138 | 2014 | 127
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para trabalhar a questão do Brasil. A Aquarela do Brasil fazia enorme sucesso porque eles quiseram. Não porque a música era boa, mas porque eles deram impulso. O Walt Disney veio para cá, o Vinícius de Moraes trabalhou para ele. Várias pessoas trabalharam para esse esforço de guerra. A gente tem até o exemplo, no Brasil, do DIP [Departamento de Imprensa e Propaganda] na ditadura varguista. Sim. Eles pagavam compositores e radialistas para falarem bem do governo. Sempre foi assim. Havia certa censura, mas ao mesmo tempo essa censura era solta, porque ar stas, duplas caipiras, falavam do presidente de uma forma galhofeira. E isso tornava Vargas mais popular ainda. É preciso saber fazer isso. Não é o trabalho de um publicitário: é o trabalho de um comunicador. Um comunicador que pode até ser um publicitário, mas ele tem que saber como montar isso. A su leza, o recado invisível que está sendo dado, que não se percebe, mas que se compra. E como você acha que deve agir um publicitário ao receber o pedido para fazer uma campanha de um produto ruim, seja um eletrodomés co ou uma ideologia? Com produto ruim, quanto melhor for a propaganda, mais ele se destrói sozinho. Se pegarmos um produto ruim e fizermos uma boa propaganda, ele vai se acabar rapidamente. O publicitário que é é co ou não vai aceitar o trabalho, ou vai dizer: “Vamos arrumar isso aí”.
“Trabalhava-se muito com a classe média brasileira tendo CuriƟba como amostra, porque ela era bem homogênea. Hoje em dia, a classe C sendo a classe média brasileira, com essa mistura toda que houve, CuriƟba não é mais um mercado-teste.”
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Mas hoje se vê de tudo. Tem muita gente fazendo propaganda de produto ruim, mas nós não sabemos se o cara vai se estrepar lá na frente ou não. Eu acho que o publicitário deve alertar o cliente de que alguma coisa precisa ser arrumada. Tem uma coisa na propaganda que eu chamo de “morrer de sucesso”: o sujeito monta o esquema, tem um bom produto, um bom serviço, faz a propaganda, vai para o mercado e tem sucesso, mas não tem como atender aquilo e morre de sucesso, porque os clientes vão embora. Há vários casos assim, de empresas ou de serviços, que morreram de sucesso. Mas seria é co, por exemplo, [fazer] a campanha nazista? Depende do teu ponto de vista. Se você for nazista, você vai dizer que é é co. Se eles vessem ganhado a guerra, você iria dizer que é é co. Cada um tem o direito de dizer o que pensa. Na ó ca deles, ou de qualquer país que tenta conquistar outros, está correto. É ca é aquilo que a sociedade decide, a é ca não está escrita. A sociedade decide o que é bom e o que é ruim. Depende de que lado você está. Se você perguntar para um paraguaio sobre a Guerra do Paraguai, o ponto de vista dele será diferente do nosso. De um iraquiano em relação aos Estados Unidos, é um ponto de vista também diferente. O que é é co para um terrorista árabe não é para um americano. E vice-versa. Mas as agências, ou um bom publicitário, recusariam trabalhar em uma campanha sabendo que o produto é ruim? Eu acho que os bons publicitários recusam. Eles não pegam o serviço. Mas tem publicitários que estão trabalhando com cigarro. Alguns recusam campanhas desse po, alguns não trabalham para o governo. Não querem par cipar daquilo que está aí. Depende da tua cabeça. Há a tese de que o consumismo desenfreado cria problemas, como a desigualdade social e até a destruição do planeta. Como fica a publicidade, que procura quase sempre es mular o consumo? A publicidade não tem culpa disso. A publicidade dá às pessoas o que elas realmente querem. Ela descobre o que você quer e te dá. Se você quer uma blusa vermelha, o teu ín mo está dizendo que você quer uma blusa vermelha, você vai achar uma blusa vermelha e vai comprar. Então, não é da publicidade a culpa do sistema todo, ela apenas acelera o processo. Ela não é culpada por esse consumismo desenfreado. Nós somos consumistas, [mas] o ser humano ainda não está educado para o consumo. Desde a 2ª Guerra Mundial, um pouco antes, o que nha para vender a gente vendia. Foi um período de ouro das empresas. O que se fazia se vendia. As pessoas são ávidas Coleção Memória da Publicidade - Pioneiros |Curi ba | p. 117-138 | 2014 | 129
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“O sujeito monta o esquema, tem um bom produto, um bom serviço, faz a propaganda, vai para o mercado e tem sucesso, mas não tem como atender aquilo e morre de sucesso, porque os clientes vão embora. Há vários casos assim.” por consumo. Imagine agora com a entrada da China: o consumo irá triplicar. Há uma educação de consumismo. Imagine hoje, no Brasil, com as classes C e D entrando no mercado, querendo consumir. Você vai proibir de consumir? E eles são hoje os maiores consumidores de alimentos que não fazem bem à saúde. Deve-se educar esse povo para não comer aquilo que faz mal. A propaganda em si não é a culpada, é o jeito que a gente é. Você foi um dos fundadores da Fundação O Bo cário de Proteção à Natureza. Como é vista hoje, no Brasil e no mundo, uma empresa cidadã e com responsabilidade social? Eu sou muito crí co desse assunto, dessas empresas que se dizem cidadãs e desse excesso de bons moços. Há muito mais falsidade do que bons moços nesse assunto. Durante o meu período de Bamerindus, o banco fez muito trabalho social em todos os setores que se possa imaginar. Não nha lei social, não nha esse incen vo de fazer. O presidente do banco queria fazer e ele ajudava. Quando fui para O Bo cário, percebi que um movimento de meio ambiente, de ecologia, ia acontecer. E todos os produtos O Bo cário eram ligados à natureza. Cada vez que se fazia uma pesquisa perguntando o que se achava de O Bo cário, a resposta era alguma coisa ligada à natureza. O Bo cário nasceu de um creme de algas marinhas, [já fazia] produtos naturais na época. E isso ficou na cabeça das pessoas. É um posicionamento de mercado. Aí veio a idéia de fazer algo ligado à natureza, que começou de um jeito e terminou de outro. O presidente da empresa queria fazer uma campanha de distribuição de uma muda de árvore a cada compra de produto. E eu disse para ele: “Miguel [Krigsner], acho meio doido isso, já que são dois milhões de compras por mês e dois milhões de mudas por mês. Eu trabalhei no Bamerindus, que nha uma grande empresa de reflorestamento, e dois milhões de mudas é muita coisa. Precisa-se de muitos engenheiros, muitos tratores, muita terra, muito adubo. Eu acho isso meio maluco”. Liguei para o Flávio Zane , da Universidade Federal do Paraná, que me indicou o Miguel Milano, que veio conversar com a gente. O Milano deu risada daquela idéia. Disse que era bobagem, porque campanhas de mudas não funcionam: 99% das mudas iam morrer, porque as pessoas não sabem plantar, a formiga come e, se você planta em um lugar errado, depois tem que
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arrancar. O Milano disse: “Esqueça essa idéia”, e tudo o que eu já havia dito para o Miguel. Aí ficou aquele negócio de “mas o que a gente pode fazer?” Na saída, no elevador, eu con nuei conversando com o Miguel Milano e vi a idéia de fazer alguma coisa que ajudasse quem já estava fazendo. Aí veio a idéia da Fundação, uma idéia original na época. Não havia ninguém fazendo isso. Par ndo do seguinte princípio: eu não entendo nada de meio ambiente, eu não entendo nada de ecologia; então, quem vai fazer é quem já faz. Vamos pres giar os ambientalistas, os biólogos, pessoas que cuidam de primatas, de baleias. A gente foi atrás de montar esse sistema. Deu tão certo que todas as empresas vieram atrás, querendo fazer igual. Mas O Bo cário foi uma das primeiras, ou a primeira, a fazer isso. Essa coisa do socialmente correto, das a vidades sociais comunitárias, nasceu logo após o início da Fundação. Quando viram que O Bo cário vivia na mídia sem forçar a barra, todo mundo quis ser igual. E aí começou uma festa. E eu acho o seguinte: um bom profissional de marke ng vai olhar esse assunto com cuidado, com critério. Porém, se pegarmos um publicitário, um cara de produção, que diz assim: “Olha, esse negócio de meio ambiente é legal, vamos fazer alguma coisa por aí”, o cliente vai fazer, mas gasta dez na a vidade fim e um milhão para divulgar a coisa. Então, quem ganha dinheiro é a mídia, e não a natureza. E aí o assunto fica desgastado, porque se acha que alguma coisa está sendo feita, mas só tem o barulho. Muito trovão e pouca chuva. Eu sou um crí co feroz disso tudo e, quando posso chamar a atenção das pessoas que fazem isso, eu chamo mesmo. Mas, de qualquer forma, vai vender também a imagem da empresa. Sim, a imagem ins tucional da empresa. Faz-se querido pelas pessoas. Qual foi a tá ca do Bamerindus, há muitos anos atrás, quando começou? A gente incorporou, na época, 68 outros bancos em onze anos. Imagine o que era isso. E a tá ca do Sérgio Reis, que é um grande estrategista, foi a seguinte: nós não temos produtos, nós não temos bons serviços; precisamos fazer com que as pessoas perdoem os nossos erros, vamos nos tornar queridos para essas pessoas. Então começou uma campanha ins tucional do Bamerindus para se tornar querido pelas pessoas. E aí todo mundo gostava do Bamerindus. “Ah, errou, mas não tem importância, con nua aqui”. É uma tá ca. É uma
“Não é da publicidade a culpa do sistema todo, ela apenas acelera o processo. Ela não é culpada por esse consumismo desenfreado. Nós somos consumistas, [mas] o ser humano ainda não está educado para o consumo.” Coleção Memória da Publicidade - Pioneiros |Curi ba | p. 117-138 | 2014 | 131
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“Eu sou muito críƟco dessas empresas que se dizem cidadãs e desse excesso de bons moços. Há muito mais falsidade do que bons moços nesse assunto.” comunicação bem pensada. Faz dez anos que o Bamerindus acabou e até hoje ele aparece como marca. É uma estrela que saiu da constelação, mas que con nua brilhando. As a vidades sociais comunitárias servem para isso. Criar an corpos para a minha marca. É bom ou ruim que a profissão possa ser exercida por gente de qualquer área, ao contrário do jornalismo, por exemplo? O que vai fazer com que eu seja um publicitário mais brilhante ou menos brilhante é a minha habilidade de criar. Tenho que ser cria vo, isso sim. E ter habilidade de vender o meu trabalho. Por isso, eu acho que não é necessário ter curso. O curso vai ajudar muito, vai dar as ferramentas, vai ensinar um monte de coisa, mas se aprende mesmo é na rua. Aprende-se errando, batendo a cabeça, passando por vários setores. Quando me predispus a ser publicitário, eu comecei como redator, em 1968, e passei por todos os setores. Construí uma carreira assim: trabalhei em rádio, em jornal, em televisão, fui cliente, fui agência, trabalhei com produção de vídeo, produção de fotografia – em tudo, para entender o processo inteiro. Acho que publicitários que dizem “ah, eu só quero ser redator”, “só quero ser contato”, “ só quero ser isso”, tudo bem – mas passem por todos os setores antes para aprender. Hoje isso vem na escola, na minha época não nha escola. A agência é sempre uma panelinha. Se você é um estudante e quer entrar em uma agência, é di cil. O que eu vi – e já passaram na minha mão uns duzentos – é que há estagiários que aproveitam bem o estágio e que vão para frente e há os que não aproveitam a oportunidade. Já vi muitos estagiários chegarem lá e parecerem uma mosca tonta dentro da agência. Se pegou a boa chance de entrar em uma agência, tente se predispor a fazer isso. Agora, tem estagiário que já chega pensando que é diretor de arte, que já sabe tudo, que quer ser o Washington Olive o, o Nizan Guanaes, que tem uma visão român ca da propaganda. E a agência de propaganda nada mais é que um escritório. A relação entre as agências e o Estado geralmente é polêmica. Na sua avaliação, há hoje mais profissionalismo nessa relação? Já foi mais fácil trabalhar com o Estado, porque an gamente o sujeito que ajudava na campanha do governo pegava a conta depois. Isso mudou. Hoje você tem as licitações. Mas não é fácil trabalhar com 132 | Coleção Memória da Publicidade - Pioneiros |Curi ba | p. 117-138 | 2014
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o Estado, porque tem muito comitê do comitê do comitê para julgar alguma coisa. Isso acaba atrapalhando. Eu acho que a relação governo/ agência de propaganda é uma relação que melhorou bastante. Mas estar numa agência atendendo o governo é complicado, porque não há con nuidade. Hoje se faz uma coisa, daí outra secretaria faz outra, outra faz outra, e não há uma coerência na linguagem do governo. Isso prejudica muito. Há um aumento aparentemente significa vo no poder aquisi vo das classes que há bem pouco tempo eram excluídas do consumo. Nós falamos sobre a classe C virar classe média brasileira. O que isso muda na maneira de fazer publicidade? Eu acho que os publicitários, de uma forma geral, não estão sabendo se comunicar com essa classe. Esse é o grande erro, o grande problema. Comunicadores populares a gente sempre teve, como o Chacrinha, Sílvio Santos, Ra nho, Zé Bé o, em São Paulo. Eu fiz muita propaganda com Zé Bé o – ele tem o maior programa de rádio de São Paulo. E o que se fazia? Pegava um texto básico e dizia: “Zé Bé o, fale isso aqui”, e ele fazia do jeito dele. O publicitário hoje é formado, vem de uma classe A ou B, e tem muito mais tempo de estudo do que as classes C e D. Se o publicitário tem 16, 17, 18 anos de estudo, esse aqui tem três, quatro, cinco. Você está falando com uma classe diferente. Até o número de vocábulos é diferente. A linguagem é diferente. E eu, como publicitário, tenho que saber pensar com a cabeça da pessoas da classe C. Como elas agem? O que elas querem e como elas querem ouvir as coisas? Isso não está sendo feito corretamente. Você sai vendendo aí para uma senhora lá do Sí o Cercado, do Tatuquara, e mostra uma cozinha po americana, com uma loira po Xuxa, com os filhos alegres, po família Doriana. Isso não vai vender para ela. Ela vai dizer: “Não está falando comigo, não está me vendendo”. Porque existem determinadas coisas que esse pessoal precisa ouvir, e que passam despercebidas pelo publicitário. Por exemplo, para esse povo é preciso repe r muito aquilo que se está dizendo. Em 30 segundos que eu for falar para eles, vou repe r duas, três vezes a minha oferta. Qual é o segredo do Sílvio Santos? É ele repe r até tornar bem claro. Parece que ele está falando bobagem, mas ele não está falando com você, está falando com aquele povão lá. Eu preciso dessa repe ção:
“Tem estagiário que já chega pensando que é diretor de arte, que já sabe tudo, que quer ser o Washington OliveƩo, o Nizan Guanaes, que tem uma visão românƟca da propaganda. E a agência de propaganda nada mais é que um escritório.” Coleção Memória da Publicidade - Pioneiros |Curi ba | p. 117-138 | 2014 | 133
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esse povo é muito da trata va oral. Eu preciso falar. E ele gosta, por exemplo, de fartura, de ambiente com muita coisa, ele precisa disso. Então, se eu vou vender uma coisa, tem que ter muita oferta. Até uma loja para esse povo tem a vitrine cheia, estufada de coisas, com preço e tudo. Uma loja como a Fórum, mais sofis cada, é uma peça só e aquilo basta. Para eles, não. Então, nós ainda não equalizamos a nossa linguagem com esse povo. Os publicitários não estão sabendo falar com eles. Os comunicadores já resolveram isso há muito tempo. Boca de rádio do interior com certeza sabe falar super bem essa linguagem. O próprio David Ogilvy, que é o papa da publicidade, era um cara riquíssimo, morava em um castelo, e ia servir num posto de gasolina. Ele atendia a conta da Shell e, por isso, trabalhava em um posto de gasolina como fren sta. Ele foi mecânico da Rolls Royce, foi cozinheiro. Ele mandava os publicitários fazerem isso, porque você está olhando as pessoas e vendo o que está acontecendo. Se você ficar no seu computador, ligado na internet, com o ar-condicionado ligado, e achar que vai fazer publicidade, não vai. O publicitário precisa transitar por todos esses mundos. Ele tem que gostar de música clássica, de funk, de rock, de música sertaneja, de hip hop, samba. Não pode ficar em compar mento estanque, não pode ficar no grupinho dele. Tem que pegar ônibus, sim, tem que andar pela rua, tem que ir para a Praça Tiradentes, tem que ir onde as coisas es verem acontecendo. Se eu trabalho para um fazendeiro, um plantador de soja, eu tenho que ir lá na fazenda, conversar com o peão dele, conversar com ele, tomar sol junto, tomar pinga junto no bar, para poder saber qual linguagem vou usar. Não posso ficar dentro do meu gabinete achando que vou fazer publicidade. A campanha das Casas Bahia é um exemplo disso? Porque as Casas Bahia têm dois segmentos de comercial, não é? Um quando fala de LCD e outro quando fala de geladeira. Exato, eles se posicionaram bem, eles sabem fazer bem. E as classes A e B já estão descobrindo as Casas Bahia como um bom lugar para se comprar. É necessário saber transitar por esses mundos. Outra coisa: vender para o Rio Grande do Sul é diferente de vender para o Rio de Janeiro, assim como é diferente de vender para a Bahia, para o interior de São Paulo. Se a minha empresa tem expressão nacional, eu tenho que saber a par cularidade de cada região. Jingles que a gente fazia no Sul não valiam para a Bahia e vice-versa, não adiantava. Você põe um comercial para veicular no Recife com gente com blusa de lã, eles vão achar aquilo muito estranho. Você tem que saber o que está fazendo.
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“O publicitário hoje é formado, vem de uma classe A ou B, e tem muito mais tempo de estudo do que as classes C e D. Se o publicitário tem 16, 17, 18 anos de estudo, esse aqui tem três, quatro, cinco. Você está falando com uma classe diferente. A linguagem é diferente.” Na verdade, você tem que conhecer a fundo o seu público-alvo. E falar a linguagem dele. Aprender a pensar com a cabeça dele. Eu preciso facilitar a vida de quem vai ler. Tem gente que peca por excesso de cria vidade. Tenho que ser cria vo, mas tenho que simplificar. O outro lado tem que entender. Se ele não entender, a culpa é minha. Qual a campanha que você considera a mais impactante na sua carreira? Uma das campanhas que eu mais gostei de fazer, também para o Bamerindus, foi a do poeta Mário Quintana, que foi a par r de uma indignação. O Mário Quintana é um poeta bom, muito bom, que estava esquecido pelo Brasil e pelos gaúchos. E ele se candidatou à Academia Brasileira de Letras e foi rechaçado pelos cariocas. O Ziraldo chegou a dizer que ele era um poeta menor. Um absurdo. E eu fiquei muito indignado e liguei para a Tereza de Souza, que fazia as músicas do Bamerindus em São Paulo, e disse: “Tereza, você viu o que fizeram com o Mário Quintana? Estou muito indignado. O que a gente pode fazer para atenuar isso?” Ela respondeu: “Olha, nós temos um comercial feito sobre as ruas de Porto Alegre, na voz do Gianfrancesco Guarnieri. A gente podia fazer alguma coisa com isso”. Fui lá, achei o comercial e disse: “A gente podia fazer um pôster e anunciar na Rádio Guaíba, de Porto Alegre, sem gastar muito, e distribuir nas agências”. Liguei para o Correio do Povo, em Porto Alegre, para o Ênio Belvague, que era meu amigo, e disse: “Ênio, como eu faço para falar com o Mário Quintana?” As coincidências começaram a acontecer. O Ênio disse: “Ele está na minha frente”. Daí eu conversei com ele, que Coleção Memória da Publicidade - Pioneiros |Curi ba | p. 117-138 | 2014 | 135
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vendeu os direitos de um poema. Ele nem sabia dar preço. Eu disse: “O que o senhor precisa, então?”. Ele: “Ah, eu preciso ir para Buenos Aires ver minha sobrinha”. Eu disse que pagaria as passagens dele para Buenos Aires, hospedagem, tudo, e estava acertado o cachê assim. Nós fizemos 5 mil pôsteres que saíram em um dia. Quando acabaram os pôsteres, os gerentes me ligaram pedindo mais. Mais 5 mil, com a letra dele. Fizemos 15 mil pôsteres. Um dia, eu estava em Porto Alegre, conversando com o Ênio, quando entra o Mário Quintana na sala. Fomos apresentados. E ele me perguntou por que eu não nha feito um filme para a televisão. Eu disse que não queria incomodá-lo, porque recentemente um cineasta havia filmado seu quarto e ele não nha gostado, foi um escândalo. Mas ele quis fazer. Eu disse: “Quando a gente pode fazer?”. E ele respondeu: “Amanhã, às 6 da manhã, está bom?”. Eu disse que estava ó mo. Combinamos onde eu iria pegá-lo. Fizemos um comercial belíssimo. “Olho o mapa da cidade como quem examinasse a anatomia de um corpo, e nem que fosse o meu corpo sinto uma dor infinita nas ruas de Porto Alegre onde jamais passarei.” E aí vai falando das ruas, bem nostálgico, bem melancólico, uma coisa bonita. Esse comercial foi para o ar e foi uma comoção em Porto Alegre, no Rio Grande do Sul. Descobriram o Mário Quintana. Isso eu acho que deu uns dez anos de vida a mais para ele, porque ele já era bem velhinho. Ele acabou virando nome de rua, nome de praça. Essa habilidade que o Bamerindus nha de fazer essas coisas, com Mário Quintana, com Drummond, com Thiago de Mello, com Cora Coralina, de usar os poetas para dar o recado em seus lugares – é por isso que a marca é forte. Ficou forte, porque você nha valores subje vos sempre. Qual campanha você considera que não obteve tanto sucesso quanto esperado? Eu sempre cito nos meus exemplos de campanhas de não-sucesso a do Green Boys, que não foi uma campanha, e sim uma linha de produtos [de O Bor cário]. Nós fizemos uma linha de produtos para adolescentes, chamada Green Boys: era perfeita, se olhar a linguagem, o design, o produto. Essa campanha não vendeu o produto, o adolescente não comprou, e aí eu disse: “Pô, mas onde foi que eu errei?”, e fui atrás do
“O próprio David Ogilvy, que é o papa da publicidade, era um cara riquíssimo, morava em um castelo. Como atendia a conta da Shell, trabalhava em um posto de gasolina como frenƟsta. Se você ficar no seu computador, ligado na internet, com ar-condicionado, e achar que vai fazer publicidade, não vai.” 136 | Coleção Memória da Publicidade - Pioneiros |Curi ba | p. 117-138 | 2014
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“Às vezes essa emoção está em uma coisa muito simples, que você vai ter que achar para dar o recado. E não é fácil. Quem, em sã consciência, faria uma campanha com o Mário Quintana para vender banco?” erro. Levei uns dois anos para entender o processo todo. Fui conversar com gente de filme, gente de bebida, de revista, para ver onde nós nhamos errado. E aí apareceu que não se faz nada para adolescente: descubra e acompanhe a onda deles. A par r daí, dez empresas se reuniram com uma empresa de pesquisa. Começamos a monitorar o mercado dos adolescentes no Brasil. Nós recebemos uma parte da pesquisa inteira e a parte de perfume, a Sadia recebia inteira e a parte de alimentos e assim por diante. Você estava sempre sabendo o que eles estavam fazendo: qual era a onda, qual era o herói do dia, porque eles mudam muito. Se você monitorava, fazia o que eles queriam. Esse foi um erro com o qual acabamos aprendendo. Foi legal ir atrás do erro e descobrir. Mas tem muitas campanhas em que a gente aprende. A gente já falou bastante sobre o processo cria vo, mas como ele funciona na publicidade? De onde saem as idéias? A cria vidade na publicidade tem que ser prá ca. Essa boa idéia vai vir quando? Primeiro, eu preciso me incubar de idéias, preciso estar em uma incubação constante, de jogar na cabeça e deixar vir, deixar baixar o santo. Só vai haver esse “baixar o santo”, tuas musas só vão te falar, se você se preocupar com o pepino, com o produto do cliente. Essa preocupação vai fazer com que você seja cria vo. As técnicas da cria vidade são muitas, mas uma delas é anotar. As idéias vão acontecer quando você menos espera. Você está no carro, você está tomando banho, você está dormido, você está tomando um sorvete na rua – as idéias vão aparecer e você deve anotar. Eu vivo com um papelzinho no bolso e com caneta, anotando sempre. Então, não se preocupe se a boa idéia chegou ou não, porque se você for atrás ela vem, se você trabalhar bastante ela vem. Porém, não é a idéia mais engraçadinha: “Ah, que idéia legal!”, mas e daí, vendeu alguma coisa? Quer dizer alguma coisa? Aí sim a publicidade tem que provar a que veio, porque ela custa muito caro. A idéia tem que trazer um conceito bem elaborado. Tem que ter uma esté ca boa: você vê coisas em que o cara usou dez pos de letra, 50 pos de cor e acha que está sendo cria vo. Tem que ser limpo, bastante clean. Quanto mais simples, melhor. Para você fazer um tulo bom, tem que fazer uns 20 tulos – para ter um bonzinho. A par r daí você vai retrabalhar para ver se ele é bom [mesmo]. E aí tem diferentes pos de publicitários. Coleção Memória da Publicidade - Pioneiros |Curi ba | p. 117-138 | 2014 | 137
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Como na corrida, tem redatores que são iguais a corredores de maratona, que têm percorrer os 42 km, e tem redatores de texto curto, de 100 m. Você não pode passar o texto de um catálogo, de um folheto, que vai exigir pesquisa, concentração para desenvolver, para um cara que faz textos de 100 metros. E vice-versa. Isso vai atrapalhar muito o processo, é cas gar. Um diretor de arte tem que saber para quem passar um trabalho, porque cada um tem um es lo de escrever, cada um tem um es lo de ilustrar, cada fotógrafo tem um es lo de fotografia. Se eu tenho um fotógrafo que faz fotografia de gente, e passar para ele uma máquina, ele vai ficar muito triste. Tem cara que é ó mo para fotografar máquina e tem cara que é ó mo para fotografar gente. E como a publicidade ou o publicitário deve equilibrar os apelos da emoção e da razão? Você acredita que é possível basear uma campanha apenas no apelo da razão ou só na emoção? Você pode usar os dois. Posso fazer um varejão, que tem que pôr o preço na cara do cliente – posso usar a razão. Quando tem uma dose de emoção, é mais forte. Às vezes essa emoção está em uma coisa muito simples, que você vai ter que achar para dar o recado. E não é fácil. As campanhas do Bamerindus, quase todas, são baseadas na emoção. Quem, em sã consciência, faria uma campanha com o Mário Quintana para vender banco?
Pesquisadores Acadêmicos: Marilia Isabel Carneiro da Silva Dias | Bruno Mendes Gouvea | Kamila Ruyz Fernandes Âncora: Ricardo Augusto Nazaris Vieira
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MEMÓRIA DA PUBLICIDADE PARANAENSE MEMÓRIA DA PUBLICIDADE PARANAENSE MEMÓRIA DA PUBLICIDADE PARANAENSE MEMÓRIA DA PUBLICIDADE PARANAENSE MEMÓRIA DA PUBLICIDADE PARANAENSE MEMÓRIA DA PUBLICIDADE PARANAENSE MEMÓRIA DA PUBLICIDADE PARANAENSE MEMÓRIA DA PUBLICIDADE PARANAENSE MEMÓRIA DA PUBLICIDADE PARANAENSE MEMÓRIA DA PUBLICIDADE PARANAENSE MEMÓRIA DA PUBLICIDADE PARANAENSE MEMÓRIA DA PUBLICIDADE PARANAENSE
Rettamozo
MEMÓRIA DA PUBLICIDADE PARANAENSE MEMÓRIA DA PUBLICIDADE PARANAENSE MEMÓRIA DA PUBLICIDADE PARANAENSE MEMÓRIA DA PUBLICIDADE PARANAENSE MEMÓRIA DA PUBLICIDADE PARANAENSE MEMÓRIA DA PUBLICIDADE PARANAENSE MEMÓRIA DA PUBLICIDADE PARANAENSE MEMÓRIA DA PUBLICIDADE PARANAENSE
Reinventando o novo
A reta é o menor caminho entre dois pontos. Na contramão dessa verdade obje va e pragmá ca, Re a é o caminho incerto, espiral, elíp co, curvo e parabólico na complexidade dos pontos que formam uma linha. E, apesar de reto no nome, Re amozo optou por se equilibrar nas pontas de linhas tênues, sempre em busca da arte, da amizade e da gen leza. Gaúcho, foi no Paraná que ele encontrou o terreno fér l para sua expansão cria va, atraindo amigos, parceiros e cúmplices ao longo de uma carreira de mais de 35 anos. Este espaço seria pequeno para descrever-lhe o currículo variado – e, para isso, existem blogs e sites recheados com fotos, textos, depoimentos e vídeos que retratam e comprovam a especialidade do entrevistado: a ação. No seu caso, melhor adentrar o terreno perigoso de juntar palavras em neologismos – como Re amozo fazia com seu parceiro Paulo Leminski – para chamá-lo de brutalmân co. É que o início de sua carreira, para muitos a era român ca da propaganda, foi para ele um tempo “brutal”. Uma época em que tudo era feito à unha e na qual o sensível nascia da brutalidade. Re a é caleidoscópio volá l em movimento, é quebra de paradigmas, como se espera de um cria vo. Um dia ele escreveu: “Eu no retrato não sou um Sou três por quatro” Nesse vai-e-vem entre as artes, o ar sta, mul facetado, mul mídia, na simplicidade de quem tudo sabe, ensina que para fazer arte não se precisa de nada. “Onde o homem toca a mão tem arte, então, todo mundo é ar sta.” Em seus úl mos trabalhos, se coloca como o sol do meio-dia e observa o co diano. A cada movimento (ar s co ou não), Re a nos lembra que o novo tem que acontecer de novo, e assim sucessivamente, pra sempre. Amém. João Nei de Almeida Barbosa
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Re amozo - Reinventando o novo
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Re amozo - Reinventando o novo
Como foi o início da sua carreira, do seu envolvimento com a publicidade? Na realidade eu comecei no século passado, de uma maneira engraçada. Eu estava fazendo Belas Artes e dando aula de serigrafia no ateliê da prefeitura e precisava ganhar uns trocados a mais – a gente ganhava 150 reais dando aula e o aluguel era 200 reais. Aí eu encontrei um amigo, que encontrou um outro amigo e ofereceu meu trabalho. Ele disse que eu era um excelente diretor de arte e que eu começaria no dia seguinte na agência. Então, tudo começou com essa brincadeira e eu fui parar na agência do cara. Quando cheguei lá, ele nha acabado de fazer folhinhas de calendário das ntas Renner e não estava conseguindo vender a capa. Eu inventei uma coisa que não desse trabalho para mim e que eu conseguisse resolver: peguei um [quadro do pintor holandês, Piet] Mondrian que já exis a – ele já nha definido um caminho na pintura, dizia que a pintura já nha acabado e tal – que eu conhecia e era do meu terreno das artes e coloquei uma mãozinha pintando. E embaixo, as ntas Renner. O cara nem deu bola para mim. Empacotou aquilo, saiu correndo, levou no cliente, voltou duas horas depois e falou: “Vendi a tua capa por 2 mil; 500 é teu, 1 500 é meu”. Ele já nha feito oito tenta vas de capa. Eu imediatamente peguei o telefone e liguei para o interior do Rio Grande do Sul, para Santa Maria – onde eu fazia faculdade – e falei para a minha namorada: “Vamos casar, acabei de entrar num ramo que vai me render condições de desenvolver a cria vidade sem estar incomodando ninguém”. Entrei na propaganda e foi um susto atrás do outro. Eu fiquei trinta, quarenta anos aprendendo e nunca consegui aprender direito esse negócio de propaganda. Dentro dessa confusão toda pintou a marca do Posi vo. O professor Oriovisto [Guimarães, reitor da Universidade Posi vo] um dia falou: “Eu preciso de uma marquinha, preciso de um nome, e o nome talvez seja Posi vo”. O Benvenu me falou se eu não podia fazer a marquinha. Aí, peguei e fiz um desenho, no Café Cometa, que nha no centro, uma mãozinha assim, e a gente levou uma semana para fotografar e rar cópia e não sei o quê. Aí virou a marca do Posi vo. Você está no mercado desde o fim dos anos 1960. De lá para cá, quais os avanços na publicidade? A gente retrocedeu em algum ponto?
“A criação é uma provocação de acasos, de acidentes, de coisas que conƟnuam a mesma coisa. Antes você folhava uma revista, hoje você liga a internet e vai atrás de idéias.” Coleção Memória da Publicidade - Pioneiros |Curi ba |p. 139-156 | 2014 | 141
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“Está fantásƟco e maravilhoso esse mundo de agora, globalizado. Até se aprende o que a gente achava que nunca ia aprender.” É bom deixar claro que o que a gente chama de criação, em propaganda, não é só criação, é comunicação. Isso se pode ver no próprio exemplo que eu dei de como eu comecei, com uma criação [de Mondrian] usada na comunicação das ntas Renner. Hamlet ainda é Hamlet. Na novela, o personagem que era bom ficou ruim e o que era ruim ficou bom – isso está lá no Hamlet. Na arte, o [Marcel] Duchamp pegou um penico e mudou a história da arte com uma brincadeira também. Então, eu acho assim, que o que mudou na comunicação foram as mídias, os meios. A arte não evoluiu nunca, o desenho é sempre o mesmo. Você tem que pegar um pedaço de cartão e desenhar e desenvolver inabilidades ou habilidades para fazer aquilo. Numa peça de teatro, o ator vai ter que entrar em cena – é o velho teatro, a velha pintura, o velho desenho. A comunicação evoluiu tudo o que nha direito na quan dade e na qualidade. Então, quais as dificuldades que as agências enfrentavam no passado, e hoje quais são as dificuldades? Eu acho que a maior dificuldade é também a maior facilidade: é ter uma idéia. E quem trabalha nisso adora ter essa dificuldade. É muito engraçado! A criação é a solução de problemas que você não tem. De dez em dez anos me dava um chilique. No século passado, eu voltava para agência de propaganda, ia lá e entrava de novo, aí passava três ou quatro anos dentro da agência, depois escapava da agência, ia morar em Morretes, fazia umas coisas de arte lá e voltava para agência de propaganda. Nessa coisa de você querer resolver problemas que não são teus, você acaba desenvolvendo uma tecnologia para isso, então as dificuldades são as mesmas. Eu acho que hoje em dia é exatamente a mesma coisa. Eu tenho idéias que a Brahma ainda não usou, que 142 | Coleção Memória da Publicidade - Pioneiros |Curi ba | p. 139-156 | 2014
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estão lá na minha gaveta. Tenho nome para perfume que não usaram, nome de restaurante. A criação é uma provocação de acasos, de acidentes, de coisas que con nuam a mesma coisa. Antes você folhava revista, hoje você liga a internet e vai atrás de idéias. Antes você pegava uma idéia racional, linear, de texto por exemplo, de conceito, dava mais trabalho. Hoje você abre a internet na coisa, o cara faz um trocadilho em inglês, você não entende direito, faz um outro teu aqui, fechou a idéia, pimba, você vai embora. Não se está nem falando na língua portuguesa. Eu sou o mista e acho que agora está muito melhor que an gamente. Mas que an gamente também era bom pra caramba. Era trabalhar com a idéia. Depois virou uma especialização com uma equipe de 50 pessoas juntas para fazer um anúncio. E o pessoal das empresas agora enlouqueceu. Para vender uma idéia, eles levam quinze idéias. Isso é que mudou. Na nossa época, você levava uma idéia e dizia: “É esta idéia, quase morremos por ela e é ela que vai vender e tal”, e aí havia todo um trabalho em cima disso – quando a idéia valia pena, é claro. Hoje, se usa bastante a ferramenta de marke ng, assessoria de imprensa. Como funcionava antes, essas ferramentas eram integradas? Na realidade eu acompanhei mais ou menos uma inversão dessa coisa toda da propaganda. Na propaganda, o que exis a era a idéia. Então, por exemplo: quero vender uma embalagem, eu faço uma embalagem de cigarro, bem boni nha. Eu, quando nha 19 anos, copiava uma embalagem de cigarro, melhorava um monte, botava no bolso e ia no coquetel da empresa dos caras que iam lançar o produto; chegava do lado do dono da empresa e rava um cigarro e dizia: “Quer um cigarro novo aí?” Aí o dono olhava, pegava aquela coisa e botava no bolso e ia embora. Depois, você recebia um telefonema: “Vamos fazer aquela embalagem?” O cria vo era a antena. É que nem o poeta, a antena da raça. O cria vo era a antena, era o cara que nha esse sen mento de marke ng, que nha o sen mento de organização. Curiosamente o cria vo era também o que esculhambava, brincando na agência, e era o que determinava toda a organização ali. O diretor de criação era o cara, juntava a dupla de criação, ou “tripla”.
“Por exemplo, o jovem da minha época exisƟa e estava em ação para mudar o mundo. Agora ele está em ação para ganhar dinheiro.”
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Aí começou a necessidade de economizar esse grupo de trabalho. Enquanto um estava fazendo um trabalho, o outro estava fazendo outro; não perde tempo para ir ao coquetel, já que quem vai ao coquetel é o outro. E a gente brincou durante muito tempo, no passado. As minhas descobertas na comunicação, tanto a marca do Posi vo, como o “B” do Bamerindus em forma de bandeira ou o garoto propaganda do Bamerindus, essas coisas, eram tudo meio brincadeira no processo. O cria vo era mais brincalhão quanto ao novo. Hoje em dia a turma trabalha mais com as novidades. Até tem uma bobagem que eu falei uma vez: “Vamos parar com novidades e vamos fazer alguma coisa nova de novo”. As novidades entupiram o mercado de novidades. Só que, de cada 100, tem uma que você diz: ah! Con nua quase a mesma coisa. O que acontecia era que era mimeografado, xerografado, rabiscado em cadernos, e hoje em dia você escaneia, põe num site. Curi ba já foi chamada de cidade modelo para lançamento de alguns produtos, algumas peças de teatro. Você acha que ela já foi isso tudo ou é um mito? Ela ainda é esse modelo? Eu acho que foi um mito inventando aí no período do Jaime Lerner, o mito da cidade extraordinária que Curi ba é na cabeça da gente. Na verdade, foi o jeito que o Jaime Lerner administrou a cidade com a par cipação da inteligência local. Quando eu estava dentro de agência de propaganda, trabalhava como diretor de arte. Como parceiro do [Paulo] Leminski, ele nos obrigava também a mexer com texto, com poesia – o que acabou nesta geração [atual]. A gente brinca que o polaco roubava todas as idéias da gente e assinava. É uma geração que foi bem cria va em função desse núcleo de pensar junto. Foi um grupo de trabalho na cidade, quase um brainstorm da cidade. Até o Jaime Lerner, que era prefeito, estava envolvido. Foi um grupo de trabalho que trabalhava pela cidade. Colocava-se uma no cia no jornal assim: “Hoje à noite, no Bar Capelle, feira de idéias. Quem quiser par cipar, apareça lá”. O primeiro a estar sentado era o prefeito: o Lerner ficava lá esperando o que o Leminski e o Reta [apelido do entrevistado, Luiz Carlos Retamozzo] botaram no jornal. Virava um comitê no boteco da esquina e, no outro dia, saía um programa de governo. E o Jaime Lerner conseguiu administrar isso aí. Na realidade, o que acontece em Curi ba é que o público não sabe realmente o que é certo, o que é errado, o que é bom, o que é mau.
“Eu acho que qualquer controle sobre o ser humano é fascismo. Eu sou anƟgo pra caramba!” 144 | Coleção Memória da Publicidade - Pioneiros |Curi ba | p. 139-156 | 2014
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“Eu sou do tempo em que a publicidade e a propaganda eram coisas do diabo, agora elas ficaram do bem. Não é só personagem de novela que muda do bem para o mal. Vocês seriam do mal no passado, é isso que é engraçado.” Falando mais um pouquinho de Curi ba, você trabalhou em Porto Alegre também. Que diferenças você sen u? Eu peguei um período bacana aqui, no qual Curi ba nha essa necessidade de falar sem usar as palavras. Porque como é que eu vou falar para japonês, italiano, alemão com o mesmo linguajar? Então, Curi ba ficou conhecida muito como a cidade dos designers. Antes de exis r o designer, o Mirandinha editava [em] gráfica, nha os jornais daqui que eram muito bonitos, com a vinda do Reinaldo Jardim, que fez o Diário do Paraná, o Correio de No cias, que era o pólo cultural. Então teve uma história do grafismo em Curi ba que foi muito rica, até o momento em que entrou a indústria do grafismo, que demoliu isso aí. Na realidade, a internet diluiu essas pessoas. Hoje tem 200 caras que fazem o trabalho igual ao do Mirandinha. E essa industrialização do designer ocorreu em que época? Com as máquinas, com a computação, a coisa cresceu bastante. Na Umuarama, quando a gente fazia [as campanhas do ex nto banco] Bamerindus, a gente usava computador para brincar, porque não sabia usar direito. Tinha [computador] na W/Brasil, nha na DM9, nha na Umuarama – porque era agência rica e cuidava de um banco – mas a gente não sabia o que fazer no computador. Demorou um bom tempo, de 1980, 1990 para cá, para o pessoal meter a mão na massa. Na propaganda, a compe ção entre os profissionais é grande. Isso é posi vo? O que mais ou menos me fez sair da agência foi marcante para mim. Foi assim: eu pedi um assistente e apareceram 1280 candidatos lá na Opus, nesta úl ma vez que eu estava trabalhando. Desses 1280, dez eram sensacionais. Nós escolhemos os dez que entrariam e eram até melhores que os dez que estavam lá dentro – e o salário dos que estavam lá dentro era em torno de 5 mil, 3 mil, e dos dez que entraram era 300 reais. Aí, passaram o salário do estágio para 600, depois passaram para 1 000, e aquela turma que ganhava 5, 3, 4 mil foi sendo despedida e entrou uma leva de garotada muito boa por um precinho camarada no mercado. Isso aí deu buraco no mercado, porque aí não deu mais para fazer propaganda. Você fazia uma marquinha e ganhava 20 paus. Agora fazia uma marquinha e ganhava 600 reais, que é o Coleção Memória da Publicidade - Pioneiros |Curi ba |p. 139-156 | 2014 | 145
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“O compromisso éƟco da propaganda e da igreja é o mesmo: a convivência social, a delicadeza das pessoas.” que a turma cobra. Você criava uma campanha e dizia: “Eu quero um carro novo”, aí te davam um carro novo; “Eu quero ganhar o dobro”, e passavam o salário para o dobro. Agora, não: “Você quer ganhar o dobro? Então vai embora, tchau!”, e entram mais três ali naquele lugar. A profissão de publicitário pode ser exercida por pessoas de outras áreas, o que não acontece em jornalismo, por exemplo. Como você vê essa questão? Você acredita que isso é bom ou ruim? Numa agência de publicidade há essa possibilidade de não ter curso de propaganda e entrar como publicitário. Por outro lado, as agências estão querendo contratar 99% com curso – tem dois ou três lá que não tem. Porque o pessoal perturba. A agência de propaganda não está muito a fim de gente muito cria va, não. Então, se você não é muito cria vo, mas é organizado, está mais para você. Porque o cara cria vo vai dar problema uma hora ou outra, ele vai quebrar paradigma, ele vai correr risco. Por exemplo, eu falei da Marisol. Eu cheguei e falei: “Eu não faço propaganda para uma marca tão feia dessa. Vou mudar a marquinha, botar uma carinha ali, um solzinho e tal”. Aí a coisa vem e vai com o diretor de criação até que o dono da fábrica falou: “Obrigado, obrigado!” Resolveu, e eu estava já comprando figurinha do Walt Disney para botar no negócio. Mudou a marca da Marisol por teimosia do cria vo. Só que com Lei de Incen vo, argumentação, gente formada nisso e naquilo, o Espírito Santo foge disso tudo. Encontrar a guria [modelo] por acaso, bater na pessoa na rua – antes você ligava para tudo isso porque era o que dava tesão para você ter idéia. Agora você encontra na internet disponível: vai olhar umas carinhas de gurias boni nhas, vai lá na internet e estão todas elas lá, fazendo pose e tal – o book. Só de olhar as gurias já valeu o dia. [Mas] estou bem o mista com a virada do século: dá chance de ir pra Cabeçudas [Itajaí-SC], onde eu estou com o ateliê, e ligar uma internet lá num canto e passar o dia inteiro pintando quadros com terra do chão e cavoucando no meio dos matos e tomando banho de mar e par cipando do Orkut como se es vesse em Nova Iorque. Está fantás co e maravilhoso esse mundo de agora, globalizado. Até se aprende o que a gente achava que nunca ia aprender. Toda criação interessante é quando você corre um risco de vida, po vida espiritual. O risco de perder o tesão é o que todo cria vo morre de medo.
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Falando um pouco sobre a propaganda voltada para o público jovem. Você acha é co fazer publicidade para crianças e adolescentes, levando-as a pressionarem os pais para comprar algum objeto? Eu acho que essa conversa é do século passado. É co é não jogar o filho pela janela. Mudou muito essa pergunta inocente porque muita coisa já foi an é ca para caramba e agora virou tudo. Hoje em dia uma madrasta está de saco cheio e joga a filha pela janela e o marido ainda tem que ir lá ajudar a jogar. Olha, quanta coisa a gente viu acontecendo. O jovem da minha época exis a e estava em ação para mudar o mundo. Agora ele está em ação para ganhar dinheiro. Então, ficou maravilhoso para mim que sou velho. Antes não era para eu ganhar dinheiro, mas mudar o mundo. Agora, que eu deveria estar ganhando dinheiro, os jovens vão ganhar dinheiro, os meus filhos vão ganhar dinheiro para eu poder con nuar mudando o mundo. Então, para mim está sensacional. Você, como pai, já se sen u ví ma de alguma propaganda relacionada ao público infan l? Não. Eu já ve propaganda re rada do ar pelo CONAR lá em Porto Alegre. Mostrava umas crianças. Elas prendiam a respiração, ficavam roxas assim, e a criança falava: “Eu só vou respirar se eu ganhar um presente da Loja Incosul”, e aí foi rada do ar. Mas era fantasia. Você acha válido algum propaganda?
po de proibição total a algum
po de
Eu não! É interessante isso aí, eu acho que qualquer controle sobre o
“Sempre fui muito ligado à idéia de que a propaganda Ɵnha que prestar algum serviço. Mas o serviço que eu falo que a propaganda deveria prestar é um serviço até estéƟco. São serviços que ela presta sem estar prestando.”
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ser humano é fascismo. Eu sou an go pra caramba! E como você acha que o publicitário deve agir diante da encomenda de uma peça ou de uma campanha de um produto ruim – seja um eletrodomés co, ou um polí co, ou até uma empresa qualquer? Eu ve a sorte de não ter uma baixaria dessas pela frente. E se vesse? Se vesse eu ia embora, pedia demissão e ia embora. Eu pedi várias vezes demissão por coisas parecidas. A gente era muito desaforado no século passado, porque a gente era demi do e aí o outro ficava sabendo e se auto-demi a na outra agência. No segundo dia, lá em Porto Alegre, era uma coisa assim: “Demi ram o Reta”, e eram mais oito demi dos – os que pensavam, na cidade, se auto-demi am. Iam para o bar dos arquitetos e ficavam tomando chope dois dias sem parar e as agências loucas: “Cadê o fulano?”. “Não, só voltamos se o Reta voltar a trabalhar”. E passava uma semana, o pessoal ia para a praia e as agências loucas. Esses desaforos. Eu cheguei a fazer xixi numa garrafa de cerveja, fazer um rótulo “Providência” e levar para o diretor da empresa e dizer: “Você falou que ia tomar providência: está aqui a providência, está aqui o copinho”. Você vê a publicidade como um reflexo dos comportamentos e valores da sociedade? Eu sou do tempo que a publicidade e a propaganda eram coisas do diabo, agora elas ficaram do bem. Não é só o personagem de novela que muda do bem para o mal. Vocês seriam do mal no passado, e isso que é engraçado. A relação entre a agência publicitária e o Estado, nos mercados menores, geralmente é muito polêmica. Hoje há mais profissionalismo nessa relação? Depois do escândalo lá dos mineiros, da agência do rapaz que fez a palhaçada toda com o governo, o “mensalão”, Marcos Valério, ficou di cil de administrar isso para as agências também. Agência virou a coisa mais vagabunda da sociedade de consumo. Na realidade, não é não, ela é tanto quanto a igreja. O compromisso é co da propaganda e da igreja é o mesmo: a convivência social, a delicadeza das pessoas. Eu gostaria que você comentasse um pouco sobre a campanha que você acha que foi a melhor na qual você trabalhou e também sobre a 148 | Coleção Memória da Publicidade - Pioneiros |Curi ba | p. 139-156 | 2014
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“O que era diverƟdo para nós, que é o que [hoje] se chama de românƟco, era a brutalidade com que as coisas eram feitas. A gente perdia um emprego por causa de uma idéia. Hoje em dia você muda de idéia rapidamente porque há muitas idéias disponíveis.” mais desastrosa, na sua visão. Ora, que bela pergunta, essa! Eu ve muitos momentos bem felizes com a parte de fazer propaganda, mas sempre fui ligado a idéias per nentes, uma idéia que tenha vendido. Os jingles que a gente fez para O Bo cário. Fiz uns 130 jingles, mais ou menos, com Tim Maia, Moraes Moreira, Jane Duboc e Camerata An qua – era um truque que eu usava para fazer mais dinheiro na minha produtora. Eu pegava e fazia uma letrinha assim, “para provar que me ama, ela me deu um pijama, minha filha, achei seu gesto belo, muito obrigado pelo chinelo, mas pra você, minha filha, não minto, não quero mais chinelos e cinto, quero Bo cário”. Aí Tim Maia cantava isso, eu botava na voz dele, e nha o preço do Tim Maia, e meu percentual em cima do preço do Tim Maia, e já me dava mais dinheirinho, e com isso fui indo. O Elói Zane era o diretor de marke ng – o Elói é da época do marke ng que vivia a par r de uma idéia. Agora o marke ng passou um período iludido de que ele poderia planejar essa idéia. E não é verdade. É que nem a arte: é uma relação de integridade que interessa ainda à propaganda. O que me deu mais prazer foi fazer jingle do Bo cário, em função dessa coisa de ter sempre uma idéia. Qual o po de propaganda que mais te agrada? Eu, na realidade, sempre fui muito ligado à idéia de que a propaganda nha que prestar algum serviço. Mas o serviço que eu falo que a propaganda deveria prestar é um serviço até esté co. São serviços que ela presta sem estar prestando. Você é considerado um ar sta mul mídia. Como você acha que isso pode alterar a visão no teu trabalho de propaganda? Eu sempre persegui uma palavra, me encantei com essa palavra: autodidata. Eu estava na faculdade de Belas Artes e via Picasso, que era autodidata, Mondrian, que era autodidata. Todo mundo era autodidata. Aí eu achei que essa palavra me dava condições de trabalhar com mais liberdade e abandonei a faculdade. Saí atrás da idéia da criação, da sacada, da brincadeira. E para nós era muito engraçado. O legal é ter gente de tudo que é po junta. Então, eu peguei uma geração na qual trabalhei de parceiro com Leminski, com Paulo Vítola, Coleção Memória da Publicidade - Pioneiros |Curi ba |p. 139-156 | 2014 | 149
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com o músico Quental. A gente criava com violão, tambor, lápis, caneta, valia tudo. Por exemplo, fazia uma letra de jingle e a gente não sentava, não escrevia o jingle dentro do escritório. Já nha estabelecido o texto da campanha, a gente ficava cantarolando. O que era diver do para nós, que é o que [hoje] se chama de “român co”, era a brutalidade com que as coisas eram feitas. A gente perdia um emprego por causa de uma idéia. Hoje em dia você muda de idéia rapidamente porque há muitas idéias disponíveis. Você acha que essa linha mais tecnicista, vamos chamar assim, empobreceu a propaganda? Não, eu acho que não. Se for ver bem, ela está mais rica em tudo. Eu vejo pelos meus filhos – eu tenho filho de 13, 14 anos que manda ver no flash, no photoshop, no blog. O blog do de 16 é fantás co, tem tudo que é coisa boa junto. Cada cria vo nha os seus caderninhos, hoje eles têm um blog. Na verdade, a mudança é de metodologia e de facilidades. O chato do mundo moderno é que todo mundo faz tudo muito rápido, rápido, rápido, e acaba não fazendo nada. Em primeiro lugar, todo mundo quer que você fale sobre o que vai fazer. A geração que está aí agora é muito verbal. Na minha geração era quase no tapa, no empurrão. Agora está tudo racional, não há mais emoção. E essa é a diferença do conhecimento de hoje, que quer se antecipar à vida. O que o homem moderno tem que entender é que ele tem que se abraçar, amar, se diver r, aconteça o que acontecer. Eu, como sou machista, já inventei que as mulheres entrando no mercado de trabalho fizeram essa correria toda para nos manter ocupados, enquanto elas estão fazendo
“Cada criaƟvo Ɵnha os seus caderninhos, hoje eles têm um blog. Na verdade, a mudança é de metodologia e de facilidades. O chato do mundo moderno é que todo mundo faz tudo muito rápido, rápido, rápido, e acaba não fazendo nada.”
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“Algumas coisas são criadas com a tecnologia e outras, com a idéia, com o pensamento, com a vida. As idéias sempre vêm da vida. Então, é diİcil você, sentando na frente do computador, ter a referência da vida de alguém. Essa intuição não pode ser adquirida pela tecnologia.” a maquiagem. Você mantém o homem ocupado para elas poderem ir ao banheiro fazer maquiagem. Desde que a mulherada entrou no mercado de trabalho, o homem rou o pé que ele botava em cima da mesa – o cria vo era assim, chegava na agência e botava o pé em cima da mesa. Com a mulherada, em primeiro lugar, já é um desrespeito botar o pé em cima da mesa: “Pô, esse vagabundo não trabalha”. Toda a agência trabalhando, só o diretor de criação com a perna em cima da mesa. A gente fazia anúncio dizendo isso: “Eu ainda con nuo com a perna em cima da mesa” – queria dizer que o cara era cria vo pra caramba. Mantendo o posto. O cara que me indicou para o meu primeiro trabalho falou: “Não chegue cedo. Em propaganda você não chega dando uma de otário às oito da manhã. Chegue às nove e meia, dez horas; chegue com bronca porque senão você não vai dar certo como diretor de arte”. E eu fiquei lá angus ado, querendo ir cedo pro trabalho, esperando atrasar e tal. Até hoje eu sempre chego atrasado para manter a fama de mau. Você falou em tecnologia: ela vai subs tuir o papel e a caneta na hora de criar? Não, não. Algumas coisas são criadas com a tecnologia e outras, com a idéia, com o pensamento, com a vida. As idéias sempre vêm da vida. Então, é di cil você, sentando na frente do computador, ter a referência da vida de alguém. Essa intuição não pode ser adquirida pela tecnologia. Vai ter que ter o amor, o carinho, a delicadeza – e tudo isso as máquinas não vão saber fazer. Sempre houve a tecnologia, só que era uma tecnologia mais bruta, mais violenta. Faziam-se as cópias em laboratório, em preto e branco. Agora, se você bater uma foto ruim, vai para o photoshop e transforma numa boa foto. No nosso tempo era assim: bate uma foto boa que você não precisa retocar. Era um horror fazer essas coisas an gamente. Fazer um anúncio, demorava uma semana, nha que fazer a letrinha. Você comprava a revista Squire, bem no começo, para recortar os tulos dela. Pegava as matérias da revista para ter um alfabeto: conseguia exemplos da futura, da helvé ca – ficava colecionando letra para usar nos anúncios. Era de um primi vismo absurdo.
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“Onde o homem toca a mão tem arte, então, todo mundo é arƟsta. A propaganda tem arte, trabalha com arte, mas é também da área de comunicação. Na realidade ela deve comunicar uma coisa que precisa ser dita, um serviço que alguém está necessitando.” Você acredita que a publicidade é uma forma de arte? Por exemplo, você a colocaria ao lado cinema, da literatura, da música? Acho que colocaria. Na realidade, eu não acho que toda propaganda seja arte, mas algumas peças a ngiram esse padrão de universalidade, dessa coisa cósmica, de ser necessária. Alguns pos de peça, algumas campanhas fundamentais, eu acho que têm esse papel. Eu acho que o cinema não tem nada a ver com isso – cinema é indústria. Para mim, arte mesmo, depois do começo do ano 2000, é o desenho, a poesia, o teatro, é tudo que um homem pode fazer sozinho, sem nada: botar um bonequinho aqui e pá, pá, escrever um poema. Porque senão é o seguinte, se apagar a luz no planeta Terra e não ver mais eletricidade, o pessoal que está ligado lá na tecnologia vai pro brejo. Aí os primi vos vão entrar em cena. Então, é legal ter um certo grau de primi vismo. Você par cipou de uma oficina chamada “não precisa nada para fazer arte”. Realmente concorda com isso? Sim, sim. Eu acho que a arte é o homem, seus sonhos, suas necessidades. Tirou o homem do planeta Terra, acabou com os cachorros – porque os cachorros só vão onde tem homem – e a arte também vai sobrar. Sem o homem não tem arte. Onde o homem toca a mão tem arte, então, todo mundo é ar sta. A propaganda tem arte, trabalha com arte, mas é também da área de comunicação. Na realidade ela deve comunicar uma coisa que precisa ser dita, um serviço que alguém está necessitando. Você prefere trabalhar sozinho ou em equipe? Duas cabeças pensam melhor do que uma? É fantás co. O grande lance da propaganda, que as outras áreas do pensamento deviam aproveitar – e o teatro aproveita bem – é o tal do brainstorm. O pensar em grupo te adianta semanas de raciocínio, porque quer queira você ou não muita coisa pode ir se somando a par r de uma primeira idéia. Se essa idéia for desenvolvida em cinco, a gente chega muito mais rápido. O tempo que o ser humano demora para pensar uma frase, um grupo pensa mais rápido. Porque funciona assim: dá uma idéia, dá outra, [dá] 31 e agora vamos ver qual é a boa. Tem uma lá que bate todas. 152 | Coleção Memória da Publicidade - Pioneiros |Curi ba | p. 139-156 | 2014
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Você cria dessa forma quando tem uma peça para desenvolver, sempre procura parceiros? Sempre. Mesmo que esse parceiro seja eu mesmo. Por exemplo, essa coisa de trabalhar mul mídia, para mim, são incorporações. O cara que escreve poeminhas não é o cara que faz direção de arte e que pinta – ele só incorpora várias pessoas. Na realidade, você tem que ter consciência da linguagem toda. Como funciona o processo cria vo em publicidade? De onde saem as idéias? Da quan dade de informações. Você, em qualquer tempo, vai ter que saber tudo o que está acontecendo. Então, por exemplo, se você vai fazer propaganda de água, precisa saber de tudo sobre a água, e depois que você sabe tudo sobre a água, você joga tudo fora e aí, distraidamente, uma idéia cai do céu e você dá risada da tua cara de bobo que ficou três dias lendo aquele monte de material que, naquela hora, você passa a achar que não era necessário. Só que era necessário. Isso que é o louco! As idéias vêm do convívio, de conversar com pessoas. Por exemplo: você está planejando o maior negócio do mundo. Pare e vá num bar. Você está criando uma coisa fantás ca, tenha a liberdade de romper barreiras, de quebrar paradigmas, de começar coisas que já ficaram velhas de uma maneira nova. É uma profissão maravilhosa, essa que o pessoal chama de criação. E eu rava sarro quando era publicitário, dizia que éramos nós e o Criador no céu. Na realidade os criadores são os pensadores. Se você vesse que dar um conselho para quem está começando na carreira publicitária, o que você falaria? Sem palavras. Acho que aquela coisa: vamos olhar mais o novo e menos as novidades. Isso pode ser uma coisa boa. Vamos parar de novidades e vamos fazer o novo. Há sempre um novo a ser feito. Também acho importante procurar um negócio que se chama per nência. Tudo tem que ser per nente. Você não pode men r para a garota que ela tem um olhar lindo se ela não tem. “Que olho lindo você tem!”, câmeras no olho dela e não é verdade.
“O pensar em grupo adianta semanas de raciocínio, porque quer queira você ou não muita coisa pode ir se somando a parƟr de uma primeira idéia. Se essa idéia for desenvolvida em cinco, a gente chega muito mais rápido.” Coleção Memória da Publicidade - Pioneiros |Curi ba |p. 139-156 | 2014 | 153
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Você faz uma relação da arte, da propaganda, sempre com uma garota, é alguma coisa assim? É. Por causa da sensualidade que a comunicação tem que ter.
Pesquisadores Acadêmicos: Simoni Rozendo da Silva | Daumyra Patrys da Silva | Marcel Talamini Costa dos Santos Âncora: João Nei de Almeida Barbosa
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