ISSN 1809-466X
Ano I Nテコmero 01 2006
AMAZテ年IA Amada, Bela, Cobiテァada e Desconhecida...
Marcos Terena
Terra é Vida! Proteger a terra é um dever sagrado!
Brasil, um país que nasceu sobre os corpos de mais de mil povos indígenas está situado entre os maiores do mundo e sua economia entre as dez melhores, no entanto, ao caminharmos pelas avenidas dos grandes centros é comum deparar-nos com crianças, mulheres e velhos carentes de um ato de misericórdia diante da fome e da miséria em que vivem. Como povos originários, não aceitamos esse tipo de sociedade que a civilização moderna vem impondo e que se aproxima cada vez mais de nossas aldeias como solução para nossa sobrevivência. Antes da chegada do colonizador, vivíamos uma forma de compartilhar, repartir e sobreviver
O
coletivamente com equilíbrio socioeconômico, cultural e espiritual. Fomos enganados, traídos e perseguidos, perdendo nossos territórios naquele tempo pela imposição da expansão territorial, depois pela soberania nacional, e agora, pela necessidade da expansão agrícola, crescimento populacional e até resolução de conflitos. Nesse novo século, por algum motivo, ainda somos parte das metas do milênio e inclusive, parte essencial, afinal, soubemos sobreviver baseado num relacionamento profundo com a terra, como nosso habitat e habitat do grande Criador. Um dos valores mais importantes numa sociedade indígena é a compreensão da natureza quando oferece o que há de melhor em termos de medicina sem efeitos colaterais ou alimentares para o fortalecimento físico e espiritual, que mais uma vez, a modernidade 04
não consegue entender ou respeitar, mas exige com a chantagem do bem comum e da repartição de benefícios, o acesso livre como novos donos desses saberes. As Nações Unidas dentro da Década Internacional dos Povos Indígenas, vem destacando em suas várias agências como a UNESCO, o PNUD, a OMC, a OMPI e o PNUMA, a necessidade de dar visibilidade para a inserção indígena nesses foros. São conquistas de novas lideranças indígenas que se articulam bom base na cultura tradicional e compromissos coletivos, já que ao se abordar interesses indígenas, não se devem excluir os interessados principais e detentores dessa ciência verbalizado ao longo do tempo como fonte do bem comum.
amanhã. Por isso quando afirmamos que não aceitamos uma sociedade que empobrece, significa que o futuro está ao nosso lado, basta recordar nossos antepassados e observar nossas crianças. Assegurar os direitos indígenas torna-se a curto prazo, assegurar uma forma de proteção a terra sem custos maiores, no cultivo e na celebração tradicional indígena que a ciência moderna não tem o direito de modificar ou piratear, mas de respeitá-la como parte estratégica do bem comum, onde a repartição de benefícios não seja apenas monetária e o tratamento desses valores indígenas como fonte de dados. O compromisso de proteção aos conhecimentos tradicionais deve estar acima dos mecanismos políticos ou jurídicos. O compromisso do ser humano deve ser ético com a própria vida, como aliás, fizemos ao longo do tempo como cidadãos da selva e povos soberanos, apesar do uso da tutela como força de coerção e de exclusão. Uma conquista vai sendo consolidada: os povos indígenas vivem porque detém um saber, uma ciência que não está em universidades ou nos laboratórios das grandes multinacionais, mas nas terras tradicionais cujo cotidiano de sobrevivência está na troca, no respeito e no uso sustentável dos recursos para uso e usufruto da comunidade, afinal Terra é Vida!
Na Rio/92, quando os Povos Indígenas decidiram se reunir num espaço próprio que teve o nome de KariOca, foi escrita a Carta da Terra e a Declaração da Kari-Oca, para que nesse ano de 2006, de volta ao Brasil sob a marca RIO>>>PARANÁ 2006, grupos indígenas mais especializados em coordenação com chefes tradicionais, pudessem junto a Convenção da Diversidade Biológica (CDB), se organizar com qualidade técnica e política, apontar suas demandas e objetivos na 8ª Conferência das Partes, ou COP.8. Serão duas semanas de conversas, negociações e encaminhamentos dentro de novas formas lingüísticas como “sistema sui generis”, “acesso e repartição de benefícios”, “regime internacional”, etc. Ou seja, uma mostra de que não basta apenas reclamar, mas interferir no processo com responsabilidade ancestral e compromisso com as futuras gerações. O Brasil como País megadiverso, é um anfitrião privilegiado se considerar as 230 sociedades com mais de 170 línguas como aliados do futuro. Trata-se de um universo de formas de vida distintas que buscam a proteção dos conhecimentos tradicionais e da sua biodiversidade através do manejo de biomas na Amazônia, Pantanal, Cerrado, Semi-árido, Mata Atlântica ou Aqüífero Guarani, preocupado com a velocidade que exigem os novos colonizadores em acessar, patentear e vender, bem diferente da forma indígena de respeitar o bem comum, onde está incluída também a sociedade envolvente. Por isso, uma nova consciência torna-se necessária para um pacto pela vida com qualidade e uma vez mais, nós povos indígenas estamos demonstrando compromissos com a Terra como habitat natural e a necessidade de cuidar e de celebrar o futuro. O futuro nem sempre está no 05
(*) O autor é Escritor Indígena, Coordenador da participação Indígena na COP.8 e representante da ONU para assuntos indigenas
S umário 08 10
Expediente
Rosália Serrano:
Por uma urgente integração da Amazônia
Sylvia Steiner:
A evolução do direito internacional e a proteção do meio ambiente
O case da preservação de 98% da diversidade biológia do Amazonas (FLÁVIA GROSSO)
30 33
21
Camillo Vianna:
Gabriel Guerreiro:
Macrozoneamento Ecológico Econômico
PESQUISA E BIODIVERSIDADE:
42
DIRETOR Rodrigo Barbosa Hühn
Amazônia meu amor
A Experiência do Museu Goeldi na Amazônia
36
José Augusto Cabral:
O papel do CBA no desenvolvivimento da Amazônia
48
PUBLICAÇÃO Editora Círios S/S LTDA ISSN 1677-7158 CNPJ 03.890.275/0001-36 Rua Timbiras, 1572-A Fone: (91) 3083-0973 Fone/Fax: (91) 3223-0799 Cel: (91) 9985-7000 www.revistaamazonia.com.br E-mail: amazonia@revistaamazonia.com.br CEP: 66033-800 Belém-Pará-Brasil
PRODUTOR E EDITOR Ronaldo Gilberto Hühn COMERCIAL Alberto Rocha João Modesto Vianna Rodrigo B. Hühn ARTICULISTAS Claudio Barbosa Figueiredo, Samuel Pinheiro Guimarães Sylvia H. F. Steiner, Eliana Calmon Alves, Simão Jatene Eduardo Braga, Flávia Grosso, Rosalia Orteaga Serrano Marcus Barros, Ima C.G. Vieira, Leandro V. Ferreira Samuel S. Almeida, Alexandre Aleixo, Marlucia B. Martins Orlando T. Silveira, Ana Y. Harada, José S.S Júnior Marcos Ximenes, José Seixas Lourenço, Luis Aragon Willamy Moreira, Marcos Terena, Camillo Martins Vianna André Baniwa, Prof. Virgílio Maurício Viana FOTOGRAFIAS Ascom Sivam, Ascom Inpa, Anselmo d’Affonseca, Ascom SDS-AM Ascom ZFV-AM, André Baniwa, Arquivo Conama/MMA, Bernardo Brito/IBAMA, Claudio Suster, Everaldo Nascimento, Farol Brasil,Herbert Marcus, INPE/Intersat, Jefferson Rody/MMA, Jorge Saldanha, LBA, Luis Eduardo Perez, Landsat 5, Mário Travassos, Paulo Artaxo, Ray Nonato Simyr Artuzo,Vania Domingues CAPA Arquipélago de Anavilhanas. Foto de Euzivaldo Queiroz/SUFRAMA EDITORAÇÃO ELETRÔNICA Editora Círios S.S LTDA DESKTOPING Mequias Pinheiro
anos
Marcus Barros:
A hora e a vez da Amazônia
O DESAFIO DE PRODUZIR PETRÓLEO EM PLENA FLORESTA AMAZÔNICA
52
ANATEC ASSOCIAÇÃO DE PUBLICAÇÕES
55
Tatiana Deane:
Pequisa agropecuária na Convenção da Diversidade Biológica
62
José Alves:
A inserção do INPA no atual cenário de C,T&I na Amazônia
JÚLIO VERNE E A AMAZÔNIA (RONALDO MOURÃO)
76
E Mais -Terra é Vida (p. 04) -Programa Amazônia: Ações para a proteção e o desenvolvimento sustentável da região (p. 15) -Desenvolvimento e Segurança na Amazônia Brasileira (p. 18) -Conservação da biodiversidade e desenvolvimento sustentável no Amazonas (p. 24) -A Água, a Amazônia e seu potencial (p. 26) -A estratégia de conservação da Biodiversidade no Amazonas (p. 46) -Reforma Agrária e Sustentabilidade Ambiental (p. 58) -Experiência da OIBI: Desenvolvimento local sustentado das comunidades indíginas Baniwa no Alto Rio Negro (p. 68) -Problemática do uso da água na Amazônia. Uma questão de acesso (p. 74)
FITA. FEIRA INTERNACIONAL DE TURISMO DA AMAZÔNIA.
Belém sediará terceira versão da Feira Internacional de Turismo - Fita 2006
N
o período de 15 a 18 de junho acontece em Belém a terceira versão da Feira Internacional de Turismo da Amazônia, a Fita 2006, que tem como objetivo consolidar a presença da Região Amazônica no cenário das grandes feiras e eventos da América Latina, e divulgar os roteiros da região. A feira reúne operadores e profissionais do trade turístico de todos os estados brasileiros amazônicos e também dos países pan-amazônicos como Bolívia, Colômbia, Equador, Guiana, Guiana Francesa, Peru, Suriname e Venezuela. A expectativa é de que o número de participantes supere o da última versão do evento que reuniu 380 operadores e um público visitante de 12 mil pessoas. Parte da programação da Fita 2006 será restrita aos operadores, como a bolsa de negócios, que este ano terá o formato da BNTM (Brazil National Tourism Mart) do nordeste, considerada uma das mais importantes do setor, e dois seminários temáticos que vão
abordar o reordenamento da aviação nacional, a partir da criação da Agência Nacional de Aviação Civil (ANAC), que para o presidente da Paratur, Adenauer Góes, “tem a finalidade de proporcionar abertura de novos mercados em função do relativo isolamento da região tanto em relação ao Brasil como aos demais países que compõem a Amazônia” e os roteiros integrados entre países amazônicos, um setor que, segundo Adenauer Góes, “está diretamente articulado a questão da Aviação tendo também como meta a integração da região pan-amazônica através do turismo”. Já a feira propriamente dita, como espaço de exposição será aberta ao público em geral, oferecendo uma mostra das opções turísticas, gastronômicas e culturais da região amazônica. Serviço: Data: 15 a 18 de junho Informações: 055 91 3212-0669 e-mail: paratur@prodepa.gov.br Site: www.fitamazonia.com.br
Rosalía Arteaga Serrano
Por uma urgente
integração da
Amazônia O futuro da Amazônia, o maior conjunto contínuo de florestas tropicais do mundo, interessa a nós, habitantes dos países que têm a sorte de compartilhá-la, mas também a toda a humanidade. Em seu seio, ela concentra 25% de todas as espécies vivas, constituindo o espaço máximo de diversidade biológica do planeta. Quase 20% das reservas mundiais de água doce pertencem à região. Quatrocentos grupos indígenas portadores de um extraordinário tesouro cultural habitam a floresta. Tanta riqueza, no entanto, nos confronta com desafios proporcionais. Ela ainda não favoreceu aqueles que deveriam ser os primeiros beneficiários: os povos da bacia. Sob o predomínio de uma idéia de progresso "para" a Amazônia, foi relegada a necessidade de um progresso "da" Amazônia, com o paradigma de desenvolvimento sustentável como eixo. Um exame da realidade mostra que, embora tenham
Amazônia Continental sido registrados avanços nacionais em alguns aspectos, uma visão fragmentada da bacia tem poucas oportunidades reais de atingir o desenvolvimento que pretendemos. Lembremos que a Amazônia é compartilhada por oito países e um território. Ocupa mais de 40% da superfície da América do Sul, com 7,5 milhões de quilômetros quadrados, habitados por 30 milhões de pessoas. Sabemos que, no imaginário mundial, é recorrente pensar na Amazônia como sinônimo de Brasil. Essa associação tem origem, entre outros, no fato de que 68% da bacia amazônica e das florestas tropicais se encontram no território brasileiro. Mas no Peru, dono de 13% da bacia, 74% do território é amazônico. Na Bolívia, conhecida mundo afora pelas belezas andinas, 75% das terras são amazônicas, representando 11,2% da bacia. Metade do território equatoriano é amazônico. Diante dessa realidade, a integração vai deixando de ser discurso abstrato de boas intenções e vai se transformando em um eixo de fortalecimento de nossas nações. Hoje, os governos de Bolívia, Brasil, Colômbia, Equador, Guiana, Peru, Suriname e Venezuela, países que integram a Organização do Tratado de Cooperação 08
Amazônica (OTCA), trabalham com o objetivo de responder de forma conjunta a desafios comuns. O fortalecimento dessa união é requisito fundamental para alcançar condições de vida mais igualitárias para nossos povos e para evitar a destruição de nossas florestas. O Tratado de Cooperação Amazônica (TCA), firmado pelos oito países em 1978 com o objetivo de promover ações conjuntas para o desenvolvimento harmônico da região, continua atual. Os preceitos do TCA de preservar o meio ambiente e assegurar o uso racional dos recursos naturais nos guiam, hoje, unidos à certeza de que há muito trabalho pela frente, pois foi dessa consciência que a OTCA nasceu e se estabeleceu em Brasília, em 2003. Para implementar esses compromissos, a Secretaria Permanente tem se empenhado em construir, junto aos Países Membros, uma agenda comum, avançando com firmeza no desafio histórico da integração sul-americana. Pretendemos, como diriam os amazônicos brasileiros, "amazonizar" o mundo. A atuação conjunta é imperiosa. Eventos como a recente seca que atingiu o Brasil, a Bolívia e o Peru e deixou milhares de pessoas isoladas, sem
de liderança em que já começa a se firmar, não consigo deixar de faze-lo apaixonadamente: sinto que a região amazônica deve transformar-se, com a vontade política dos oito governos, no melhor e mais idôneo espaço para a integração de nossos países e para a integração da América, baseada nos ideais e sonhos de visionários da unidade sulamericana. Para a Secretaria Permanente da OTCA, é chegada a hora de negociações conjuntas. É chegado o momento de não enfrentar os desafios de maneira isolada, mas de trabalhar como um conjunto de países Amazônicos, empenhados em afirmar suas fortalezas e atingir seus objetivos comuns. comida nem medicamentos, ratificam a necessidade de uma reflexão coletiva urgente e da adoção de medidas concretas conjuntas. A mesma apreensão temos diante da advertência dos pesquisadores sobre a possibilidade de savanização ou desertificação da floresta pelos
acordo com as especificidades da Amazônia. Duas reuniões de alto nível foram organizadas sobre temas vitais como propriedade intelectual e industrial e ciência & tecnologia. Em outubro, iniciamos o Programa de Gestão Integrada e Sustentável dos Recursos Hídricos Transfronteiriços do Rio O pulmão do planeta em perigo Amazonas. Com a assinatura da Declaração O rio Amazonas alcançou seu nível mais baixo nos últimos 36 anos de Iquitos, durante a 9º Reserva de água Dados da Bacia Amazônica Reunião de Ministros das Resto do População: 30 milhões habitantes mundo Relações Exteriores dos Desmatamento: 50 milhões hectares Países Membros, em Fauna e flora Extensão do rio: 6,788 Km novembro de 2005, Espécies classificadas Resto do reafirmamos nosso mundo compromisso com essa Aves Borboletas tarefa comum e demos 1.700 4.000 VENEZUELA mais um passo para Peixes Mamíferos proteger a Amazônia COLÔMBIA como fonte estratégica 150 2.000 *Últimos 30 anos da vida. Manaus Iquitos Belém Quando escrevo sobre a Rio Amazonas organização que me OCEANO cabe dirigir, quando falo ATLÂNTICO PERU sobre ela ou trabalho BRASIL intensamente para 0 600 km BOLÍVIA posicioná-la no espaço
(*) A autora é jornalista e advogada, com mestrado em educação básica e resgate de valores culturais na América Latina, é Secretária-Geral da OTCA (Organização do Tratado de Cooperação Amazônica). Foi presidente constitucional do Equador (1997) e ministra da Educação e Cultura daquele país (1994).
20% 30%
efeitos do desmatamento. Por isso, trabalhamos para que a Secretaria Permanente se torne um guarda-chuva que envolva e harmonize as iniciativas regionais e obtenha recursos para desenvolver programas de amplo alcance. Na cúpula de Manaus, em setembro de 2004, os chanceleres dos países amazônicos aprovaram o plano estratégico da OTCA e tomaram uma série de decisões inéditas, entre elas, a de convocar reuniões ministeriais para discutir e tomar medidas de 09
A Secretária-Geral ao lado dos representantes da Comunidade Andina (CAN), da Corporação Andina de Fomento (CAF), da Associação Latino-americana de Integração Regional (ALADI) e do Mercosul, na cúpula de Presidentes da América do Sul, em Brasília.
Sylvia Helena F. Steiner
A evolução do direito internacional e a proteção do meio ambiente
O
A preservação das espécies e dos ecossistemas deve ser assegurada em benefício da presente e das futuras gerações
primeira, incorpora o conceito de “humanidade” como sujeito de proteção das instâncias internacionais. As Convenções de Genebra, por seu lado, firmam a existência de crimes contra a humanidade, e reconhecem a jurisdição universal para processo e julgamento dos responsáveis pelas violações do direito humanitário.
Barber and Berger
s primeiros tratados de regulação do direito de guerra do século XIX, sementes do que hoje se denomina Direito Humanitário, aportaram pela primeira vez ao clássico direito internacional a idéia de limitação ao poder absoluto dos Estados. Já em princípios do século XX, foram ainda os tratados internacionais de direito humanitário que estabeleceram as noções de responsabilidade internacional dos Estados pelos desmandos praticados por seus exércitos, e da legitimidade da comunidade internacional para processar e julgar os acusados de violar as leis e os usos e costumes de guerra. Paralelamente ao direito humanitário, a evolução da doutrina dos direitos humanos seguiu seu gradual processo de internacionalização, cujo ápice pode ser situado na edição da Declaração Universal de Direitos do Homem, de 1948, seguida do tratado contra o genocídio e das novas Convenções de Genebra, dentre outros. A
10
A edição de um crescente número de instrumentos de proteção aos direitos fundamentais das pessoas, e de proteção de bens e interesses comuns a toda a sociedade, levou à revisão de diversos conceitos de direito internacional, dentre estes o da existência de um novo sujeito de direito internacional: a humanidade. Como afirma o grande jurista Fabio Comparato, “após três lustros de massacres e atrocidades de toda sorte, iniciados com o fortalecimento do totalitarismo estatal nos anos 30, a humanidade compreendeu, mais do que em qualquer outra época da história, o valor supremo da dignidade humana. (...) Não apenas os direitos individuais, de natureza civil e política, ou os direitos de conteúdo econômico e social foram assentados no plano internacional. Afirmou-se também a existência de novas espécies de direitos humanos: direitos dos povos e direitos da humanidade. (...) Chegou-se, enfim, ao reconhecimento de que à própria humanidade, como um todo solidário, devem ser reconhecidos vários direitos: à preservação dos sítios e monumentos considerados parte integrante do patrimônio mundial, à comunhão das riquezas minerais do subsolo marinho, à preservação do equilíbrio ecológico do planeta, e à punição de crimes contra a humanidade.1 Assim, ao lado do direito humanitário e dos direitos humanos, a proteção ao patrimônio comum da humanidade e ao meio ambiente passaram a ser temas obrigatórios da agenda do direito internacional. Já em 1972, a Convenção relativa à Proteção do Patrimônio Mundial, Cultural e Natural, firmada
em Paris, apontava a “humanidade” como destinatária de suas normas de proteção. A afirmação dos novos conceitos de direito internacional nas áreas de proteção aos direitos humanos em geral, e aos direitos da humanidade em especial, levou igualmente a outras consequências, bem descritas por Cançado Trindade, dentre as quais “a erosão da autodenominada jurisdição doméstica. O tratamento dado pelo Estado aos seus próprios nacionais passa a ser assunto de interesse internacional. A conservação do meio ambiente e o controle da poluição transformam-se em assunto de interesse internacional. Ocorre assim um processo de internacionalização de ambos, proteção aos direitos humanos e proteção ao meio ambiente (...).”2 Assim, podemos dizer que nos campos do direito humanitário, dos direitos humanos, da proteção ao patrimônio comum da humanidade e da proteção do meio ambiente atesta-se o crescimento das chamadas obrigações erga omnes, ou seja, que obrigam a todas as pessoas e aos Estados, e que passam a ser entendidas como garantias de ordem pública. Em consequência, “aumenta a regulação internacional de matérias de interesse supranacional, vinculando os Estados, e leis domésticas passam a ser aplicadas a atividades que têm impacto ou são de propriedade supranacional, levando a uma gradual erosão da distinção dos âmbitos interno e internacionais de jurisdição.”3 A Declaração de Estocolmo sobre o Meio Ambiente Humano, tirada da Conferência realizada em junho de 1972, proclama os princípios de proteção ao meio ambiente como essenciais para o bem estar dos homens e para o gozo dos demais direitos fundamentais. No Princípio I, fica clara a adesão ao fundamento antropocêntrico, na medida em que se afirma que é direito fundamental das pessoas a liberdade, a igualdade e o desfrute de condições de vida adequada num meio ambiente de qualidade que lhe permita levar uma vida digna e com bemestar. Pela Resolução 2997 (XXVII) da ONU, foi instituído o Programa das Nações Unidas para o
Meio Ambiente, em dezembro daquele ano. Em 1974, a Carta das Nações Unidas sobre Direitos e Deveres Econômicos dos Estados, em seu Artigo 30, afirma ser dever e responsabilidade de todos os Estados a proteção e preservação do meio ambiente para as gerações atuais e futuras. Na exposição sobre a evolução dos documentos normativos de proclamam princípios e regras sobre o meio ambiente enquanto direito fundamental da humanidade, sucinto e explicativo é o relato de Cançado Trindade, o qual, em tradução livre, transcrevemos: “Em 1980 a Assembléia Geral das Nações Unidas proclamou a histórica responsabilidade dos estados pela preservação da natureza em nome da presente e das futuras gerações. Enquanto no passado os Estados tendiam a ver a regulamentação sobre poluição sob diversos aspectos como assunto de interesse nacional ou local, mais recentemente deram-se conta de que alguns problemas de meio ambiente eram essencialmente globais em seu âmbito. Na Resolução 44/228, de 22 de dezembro de 1989, enquanto se decidia pela realização de uma
11
Conferência sobre Meio Ambiente e Desenvolvimento em 1992, a Assembléia Geral reconhecia que o caráter global dos problemas ambientais exigia ações em todos os níveis ( global, regional e national), envolvendo o compromisso e participação de todas as nações; a Resolução adiante afirmou que a proteção e a melhoria do meio ambiente são os maiores temas que afetam o bem estar dos povos, e assinalou, como um dos temas de maior preocupação, a proteção das condições de saúde das pessoas e a melhoria da qualidade de vida (Parágrafo 12 (i)).”4 Lembra ainda o Autor que, dez anos depois, a Assembléia Geral das Nações Unidas aprova a Carta Mundial da Natureza, na qual se declara que a raça humana é parte da natureza, e a vida depende do funcionamento ininterrupto dos sistemas naturais. Assim, a preservação das espécies e dos ecossistemas deve ser assegurada em benefício da presente e das futuras gerações. Como resultado das reuniões do grupo de expertos do Programa das Nações Unidas para o Meio Ambiente (UNEP), já referida, além de
A proteção de áreas de especial interesse ecológico, a proibição de certas armas de efeito de destruição massiva do meio ambiente são alguns dos interesse comuns da humanidade
firmaram-se como conceitos inerentes ao tema do meio ambiente os referentes ao “interesse comum da humanidade” (common concern of mankind), também apontou-se para novas áreas a merecer imediata consideração, dentre elas a proteção de áreas de especial interesse ecológico, a proibição de certas armas de efeito de destruição massiva do meio ambiente, e o crescimento de uma nova categoria de refugiados os refugiados ecológicos ou ecologically displaced persons. Em 1992, por fim, realizou-se a Conferência das Nações Unidas sobre Meio Ambiente e Desenvolvimento, no Rio de Janeiro, na qual foram aprovados diversos importantes documentos, dentre os quais a Declaração do Rio, a Agenda 21 e a Convenção sobre a Diversidade Biológica. Em conclusão, vemos que a proteção do meio ambiente está compreendida no universo dos reconhecidos e consagrados direitos de interesse comum da humanidade. Nesse amplo e
complexo universo, o direito ao meio ambiente saudável, e a necessária sanção de condutas lesivas ao direito, ressalta por sua modernidade e abrangência. A premissa básica é a de que “no que se refere ao meio ambiente, na verdade, no caso de ação ou omissão cometidas por um indivíduo ou atribuíveis a um Estado, e virem a causar ou a ameaçar criar um desequilíbrio nas relações humanas, há a necessidade de regulamentar, mediante um sistema de sanções, não a ecologia (regida pelas leis da causalidade), mas a conduta humana que a ela diga respeito.(...) Assim, quando se diz 'proteção ao meio ambiente', a referência é à conduta livre do homem e, portanto, ao mundo da Ética e do A Carta Mundial da Natureza declara que a raça humana é parte da natureza, e a vida depende do funcionamento ininterrupto dos sistemas naturais.
Direito. Proteger significa, em outras palavras: determinar as condutas que preservam o equilíbrio do meio ambiente, em detrimento de outras, consideradas ilícitas ou proibidas, e portanto, acompanhadas de uma sanção, caso sejam praticadas.”5 Abre-se assim, ao lado dos direitos humanos e do direito humanitário, um novo modelo de obrigações internacionais, decorrente da necessidade de efetiva implementação das normas de proteção ao meio ambiente, e cujo inadimplemento pode conduzir à configuração de um ilícito internacional. (*) A autora é Juíza do Tribunal Penal Internacional Desembargadora Federal aposentada Mestre em Direito Internacional pela USP
1. COMPARATO, Fabio K., A Afirmação Histórica dos Direitos Humanos S.Paulo: Saraiva, 2005, pp.55/57 2. CANÇADO TRINDADE, Antonio A., The contribution of international human rights law to environmental protection, with special reference to global environmental change, in Environmental Change and International Law. WEISS, Edith Brown (ed). United Nations University Press: Tokio, p.245 3. ORTEGA VICUÑA, Francisco, Changing perspectives of International Law in Areas of Global Concern, in O Direito Internacional no Terceiro Milênio. BAPTISTA, Luiz Olavo, e FONSECA, Roberto Franco ( coord) . São Paulo: LTr, 1998, p.903 4. The contribution ..., cit., p.248/9 5. SOARES, Guido Fernando Silva, Direito Internacional do Meio Ambiente. São Paulo: Editora Atlas, 2001, pp.19/20
12
por
Pitanga
AmaZônia
Billy Blanco
Amazônia Verde que te quero, meu Brasil, Verde da floresta que te resta, Verde dasta pátria linda e nesta Quem vier em paz recebo em festa Verde sem fuzil As armas que eu quero, o arado, O peixe pulando no rio, O chão que for pleno, plantado De Jambo, Pitanga e Abiu, De Cupuaçú e Mangaba, Ingá, Beribá, Sapoti, De manga que nunca se acaba Encher meu paneiro vazio
Biribá
Quero o cobertor para o frio Do meu curumim indefeso E a verba que nunca ele viu Porque ninguém lhe mostrou, Nem o remédio pra cura Dos males que o branco levou Pra dentro da taba, tão pura, A cura que nunca curou
Mangaba
Eu quero esse índio que resta Voltando à floresta que é sua, De dia vivendo o que presta De noite falando com a lua, Aritana mandando em seu povo
Saputi
Sem branco nenhum se meter, - Ensinem ao cacique o que é novo Que ele faz a tribo entender
Abiu (*) O autor é Arquiteto e Compositor
14
Ingá
Jambo
Cupuacú Manga
Programa Amazônia
AÇÕES PARA A PROTEÇÃO E O DESENVOLVIMENTO SUSTENTÁVEL DA REGIÃO
N
os últimos quatro anos o governo federal decretou a criação de 15,2 milhões de hectares de áreas protegidas na Amazônia, por meio da implantação de unidades de conservação, sendo 73% destinadas ao uso sustentável e 27% à proteção integral. Esses números foram apresentados pela ministra do Meio Ambiente, Marina Silva, no seminário realizado em fevereiro, em Brasília, para discutir um novo programa de proteção para a região, o Programa Amazônia. A criação de unidades de conservação bem como outras iniciativas desenvolvidas pelo Ministério do Meio Ambiente para proteger as florestas brasileiras fazem parte de uma
estratégia definida como política ambiental integrada que tem como objetivo a implementação do desenvolvimento sustentável tendo como diretrizes a inserção da dimensão ambiental nas políticas públicas (transversalidade), a participação e controle social e o fortalecimento do Sistema Nacional de Meio Ambiente (Sisnama). Coordenado pela Secretaria da Amazônia, o Programa Amazônia é, portanto, mais uma iniciativa que busca contribuir para esse objetivo, por meio da promoção de ações orientadas à proteção e ao uso sustentável dos recursos naturais, bem como à valorização da diversidade biológica e sócio-cultural da região. O programa tem como base as experiências exitosas
Da esquerda para a direita: Secretária de Coordenaçãoda Amazônia Muriel Saragoussi, Ministro do Desenvolvimento Agrário Miguel Rosseto, ministra do Meio Ambiente Marina Silva, Secretário Executivo do MMA Claudio Langone, Secretario de Biodiversidade e Florestas João Paulo Capobiando e Diretor do Fundo Nacional do Meio Ambiente Elias Araújo
15
poiadas pelo Programa Piloto para a Proteção das Florestas Tropicais do Brasil (conhecido como PPG-7), que há mais de uma década financia projetos na região, também sob a coordenação do Ministério do Meio Ambiente. Segundo Muriel Saragoussi, Secretária de Coordenação da Amazônia, os recursos destinados pelo Programa Piloto para investimento em projetos, nesse período, somam cerca de 380 milhões de dólares. A Secretária informou também que a proposta de um novo programa para a região é resultado de um rico e participativo processo de discussão, envolvendo organizações da sociedade civil e dos movimentos sociais, representantes de órgãos federais, estaduais e municipais, setor privado e cooperação técnica e financeira internacional. O Programa Amazônia será estruturado com base em quatro grandes linhas temáticas: Conservação e Gestão Ambiental, Fomento à Produção Sustentável, Participação Social e Cidadania, e Instrumentos Ambientais para a Infra-Estrutura e o Desenvolvimento. Suas prioridades compreendem o fortalecimento das políticas de ordenamento e gestão democrática do território, visando contribuir para a superação de conflitos fundiários; apoio aos processos de produção, comercialização, uso e transformação dos recursos naturais, bem como a remuneração dos serviços ambientais, incluindo o desenvolvimento de processos de disseminação de conhecimentos
técnico-científicos aplicados às práticas produtivas sustentáveis; promoção da inclusão social, visando maior eqüidade no acesso e uso dos recursos naturais, com enfoque na sustentabilidade e na busca de maior participação de minorias de gênero e etnias; e, por fim, o apoio à utilização de instrumentos ambientais no planejamento de obras de infra-estrutura e a projetos demonstrativos de gestão de resíduos sólidos e disseminação de tecnologias de geração de energias alternativas. O programa prevê ainda a implementação de projetos transversais orientados para a coordenação operacional e gestão institucional; monitoramento, participação da sociedade civil 16
organizada e avaliação; e o apoio à rede de pensamento estratégico sobre o desenvolvimento sustentável da Amazônia. Durante o seminário ocorreu também o lançamento do edital nº 01/2006 do Fundo Nacional do Meio Ambiente (FNMA/MMA) em parceria com o Ministério do Desenvolvimento Agrário (MDA), que prevê investimentos da ordem de 16 milhões de reais em assistência técnica e capacitação de produtores em técnicas de manejo florestal madeireiro e não-madeireiro, de forma a torná-los multiplicadores desses conhecimentos na região. Para a ministra Marina Silva, a promoção de uma política ambiental integrada para a região reflete
uma estratégia de governo que busca conciliar as ações de infra-estrutura com critérios de sustentabilidade e de inclusão social, opinião reforçada pelo ministro do Desenvolvimento Agrário, Miguel Rosseto: “A presença integrada dos órgãos do governo federal na região tem colaborado para animar e estimular os lutadores sociais que muitas vezes resistiram com a sua própria vida ao processo de exploração predatória, excludente e criminoso, historicamente em curso na Amazônia”. Segundo o ministro, um novo tipo de relação vem se consolidando entre o poder público e as populações locais, criando um ambiente de confiança e de integração de diversas ações em direção a uma estratégia de desenvolvimento sustentável. O ministro informou também que o MDA juntamente com o Instituto Nacional de Colonização e Reforma Agrária (Incra) - está trabalhando para dotar as áreas de reforma agrária de um padrão de ocupação ambiental sustentável e correto. No entanto, esse esforço tem sido um grande desafio para o governo na medida em que a Amazônia é 17
herdeira de um padrão de ocupação semelhante às culturas de outras regiões. “Se queremos mudar esse padrão temos que repensar a relação com o meio ambiente e com a atividade rural”, disse o ministro, ao ressaltar que “estamos diante de uma questão cultural profunda que precisa ser repensada”.
Para a ministra Marina Silva, o processo hoje em curso na Amazônia busca compatibilizar fortes ações de comando e controle e de ordenamento territorial com uma agenda de desenvolvimento sustentável. Em sua opinião, vários setores, inclusive o empresarial, já começam a ter essa compreensão. No caso do Programa Amazônia, a ministra enfatizou que o seu grande desafio é consolidar as conquistas acumuladas no Programa Piloto à luz dos novos processos em curso na região, um cenário que tem colocado o governo frente ao desafio de trabalhar incessantemente para dotar a região de assistência técnica e para capacitar suas populações para que sejam, elas mesmas, executoras das políticas públicas.
C laudio Barbosa de Figueiredo
O
Desenvolvimento e Segurança na
Amazônia Brasileira
europeu chegou à América do Sul por ocasião das grandes navegações, hoje consideradas um dos ciclos da globalização. Com a gente do Velho Mundo veio o desejo de explorar e se valer economicamente da nova terra. Assim, como sempre, expedições militares começaram a visitar o novo mundo, com o objetivo de tomar posse da terra e garantir a exploração econômica que enriquecia as metrópoles. A região Amazônica sempre foi um desafio à exploração econômica e, já naquela época, em 1541, o espanhol Francisco de Orellana desceu o rio Amazonas e alcançou o Oceano Atlântico na primeira tentativa de se colonizar a região. No período conhecido como da “União Ibérica”, de 1580 a 1640, quando as coroas de Espanha e Portugal se uniram, sob a égide de um rei comum, o Rei Felipe IV da Espanha e de Portugal, a partir de 1621, atribuiu à Portugal a missão de conquistar e povoar a costa do Pará e as
TRATADO DE MADRID
FORTE DO PRESÉPIO - BELÉM
áreas adjacentes do que hoje é considerada a Amazônia brasileira, tudo para fazer face às grandes pressões exercidas ali por holandeses, franceses e ingleses. Assim, de 1616 a 1631, com apoio no Forte do Presépio, fundado em 1616, e origem da atual cidade de Belém, o Capitão Pedro Teixeira, com o concurso de outros bravos soldados, firmou a soberania lusa no estuário e baixo 18
Amazonas depois de realizar operações militares, destruir feitorias e fortificações estabelecidas por estrangeiros no atual Amapá, na ilha de Gurupá e ainda na foz e vale do Xingu. Portugal tomava posse das suas terras amazônicas. A conquista da Amazônia por Portugal foi reconhecida pelo Tratado de Madrid de 1750 e pelo Santo Ildefonso, de 1777, e herdada pelo
São brasileiros... são índios... São soldados...
A Amazônia possui 1/5 da reserva de água doce do planeta
Brasil em 1822, com a sua independência. Posicionada no centro da América do Sul, a Amazônia é a plataforma de integração hemisférica, que interliga o Brasil aos diversos países sul-americanos, com base em dois grandes eixos: o fluvial, pelos rios Solimões e Amazonas e o rodoviário, pelas BR 174 e BR 317. Hoje, a ligação Brasil - Peru já permite o
intercâmbio de 30 milhões de pessoas do Brasil, Peru e Bolívia. Com 1/5 da reserva de água doce do planeta, a Amazônia ganha importância estratégica cada vez maior, mormente diante dos estudos recentes que afirmam que a escassez de água atingirá, nos próximos anos, 52 paises, onde vivem 3 bilhões de pessoas (50% da população do mundo).
19
Essa crise já está sendo vivida hoje, obrigando Espanha, Egito, Índia, Ilhas Cayman, Califórnia, Bonaire e algumas cidades do Golfo Pérsico, a construírem grandes usinas que estão dessalinizando cerca de 5,5 bilhões de m3 de água do mar por ano. A reutilização do produto já é feita na França. Em Israel, toda a água utilizada na agricultura é reciclada. Interessante notar que dois terços dos recursos hídricos-energéticos do Brasil estão na Amazônia e que o Rio Amazonas despeja 220 mil m3 de águas por segundo no Oceano Atlântico, adentrando quase 500 Km com sedimentos e nutrientes ricos em sais minerais, enriquecendo a cadeia produtiva. Além disso, o potencial mineral da Amazônia está estimado em dois trilhões de dólares e há quem fale em vinte trilhões de dólares, como se pudessem ser estimados números tão imprevisíveis. O nióbio da região dos Seis Lagos, próximo ao Pico da Neblina (2994 m) é empregado na indústria aeroespacial e ótica, o diamante da Reserva Roosevelt que está aflorando a cerca de 1 m da superfície da área dos índios CintasLargas, o Manganês, a cassiterita, o ferro, a bauxita, o titânio, a cassiterita, o GLP e o ouro, são algumas das riquezas encontradas sob a imensa floresta. Além disso, a imensa biodiversidade, o potencial energético, a exuberante fauna e flora tornaram essa região uma prioridade em todas as rodas de discussão. Para o Brasil, chegou a vez da Amazônia, com a formulação de inúmeros projetos desenvolvimentistas que recebem novo fôlego a cada ano. Exemplo marcante disso é o Pólo Industrial de Manaus que bate recordes anuais de produção. Assim como no passado, hoje também a presença militar acompanha os grandes ciclos. No entanto, não se trata de invasores ou exploradores de uma terra nova, mas da
A presença militar na Amazônia em números
1950 - 1.000 Homens 1986 - 6.000 Homens 2004 - 22.000 Homens 2007 - 25.000 Homens mobilização dos seus legítimos donos para a preservação, desenvolvimento e, acima de tudo, a garantia da soberania. Essa evolução da presença militar brasileira na Amazônia se deve à prioridade que a nação dá a essa região e teve início em 1948, com a criação do Grupamento de Elementos de fronteira, em Manaus, capital do Estado do Amazonas, que hoje abriga o Comando Militar da Amazônia, responsável pelos mais de 25 mil homens e mulheres que compõe o Exército na região e que se somam aos militares da Marinha e da Força Aérea desdobrados em toda essa área. Diferente do que se fez em outras regiões do planeta, onde em nome da posse da terra e da exploração econômica exterminaram os seus índios de forma insólita, no Brasil, esses índios, brasileiros da floresta, unem-se aos irmãos do Centro e do Sul para a defesa da sua própria terra, seguindo ainda o pensamento das tropas lusas que conquistaram e mantiveram a soberania sobre essas terras: “Julgada a causa justa, pedir proteção de Deus e atuar ofensivamente mesmo em inferioridade de meios”. O Brasil, esse jovem país de 500 anos, amadurece e está cada vez mais consciente da sua importância econômica, política e geoestratégica, firmando seus pés sobre instituições democráticas sólidas e impulsionado por um imenso e rico território, por um povo ordeiro, alegre e trabalhador e por uma história de lutas e vitórias que enobrece a sua gente. É nesse contexto que, a despeito das pressões internacionais e do trabalho nocivo e interesseiro de algumas ONGs, a Amazônia Brasileira vai seguindo o seu destino de grandeza e de prosperidade.
Exemplo de desenvolvimento o Pólo Industrial de Manaus que bate recordes anuais de produção
(*) O autor é General-de-Exército Comandante do CMA
20
Diferente do que se fez em outras regiões do planeta, que exterminaram seus índios, no Brasil nossos índios fazem a defesa da sua própria terra
F lávia Skrobot Barbosa Grosso
"O case da preservação de 98% da diversidade biológica do Amazonas"
O
Estado do Amazonas possui mais de 1,5 milhão de quilômetros quadrados, dos quais 92% são cobertos pela floresta amazônica, com a maior biodiversidade do planeta. Os desafios para manter essa riqueza preservada são tão grandes quanto a sua imensidão e requerem um despertar de consciências, que envolve todos os atores sociais. Desde o primeiro grande ciclo econômico de desenvolvimento do Amazonas - o período da borracha (1870-1912) - até a década de 1960, as políticas públicas adotadas no Estado não foram capazes de varrer o marasmo econômico que empobrecia seu povo e tornava primitiva a sua infra-estrutura produtiva. Mas este cenário mudou.
21
A partir de 1967, o governo brasileiro adotou para o Amazonas um modelo de desenvolvimento - a Zona Franca de Manaus - que tem se mostrado exitoso no desafio de despertar consciências. Os indicadores ambientais comprovam os efeitos positivos que esse modelo imprimiu a este pedaço da floresta amazônica. O Amazonas mantém 98% da sua cobertura florestal intacta e vem, ao longo dos últimos anos, reduzindo significativamente seus índices de desmatamento. Em 2004, a taxa de deflorestamento no Estado caiu 39,22% em relação a 2003. Em 2005, a redução foi de 67,58% na comparação com o ano anterior. Assentado no incentivo à produção empresarial, através de um Pólo Industrial de alta tecnologia e baixo impacto ambiental, o modelo tem
avançado na missão de estabelecer um novo paradigma de desenvolvimento na Amazônia. Os efeitos do Pólo Industrial de Manaus, que hoje reúne mais de 450 empresas e emprega cerca de 100 mil trabalhadores diretamente, têm conferido ao Amazonas um crescimento econômico espetacular. De 1990-2001, enquanto a taxa média anual de crescimento do Brasil foi de 2,73%, a do Amazonas foi de 8,81%. A indústria de transformação teve desempenho ainda melhor. De 1985 a 2002, cresceu 502,4%, de longe o melhor desempenho do país, pois o segundo que mais cresceu foi Goiás, com 91,3%. Em 2005, o crescimento da produção industrial do Amazonas, de 12,1% superou pelo segundo ano consecutivo a média nacional, de 3,1%. Esse dinamismo irradiou-se. A pujança econômica deste parque industrial reforçou os orçamentos dos governos estadual e federal, que têm realizado grandes investimentos em infraestrutura, a exemplo da melhoria de áreas de armazenamento, portos, aeroportos, estradas e do fornecimento de energia. O ensino superior e o sistema de ciência e tecnologia do Estado foram acrescidos, na última década, de dezenas de novas instituições que se dedicam aos mais 22
diversos ramos de ensino e pesquisa. As possibilidades de negócios, em novas frentes econômicas, são inúmeras: a agroindústria envolvendo o palmito, os óleos essenciais, a farinha e outros; a bioindústria envolvendo fitoterápicos, fitocosméticos, perfumaria e outros; a fruticultura envolvendo frutas exóticas como cupuaçu, açaí, guaraná, acerola e outros; a aqüicultura envolvendo criação de peixes e de quelônios. A lista é extensa e neste momento há um esforço coordenado entre institutos de pesquisas tradicionais e o Centro de Biotecnologia Amazônia visando transformar todas essas potencialidades em produtos de qualidade que possam demandar mercados internacionais. O esforço para ampliar a inserção dos produtos fabricados no Amazonas no mercado externo tem resultado em aumento significativo das exportações. Em 2005, o Estado totalizou US$ 2,1 bilhões em vendas externas, um crescimento de 85,22% em relação a 2004. Esse dinamismo
todo deu origem a um faturamento de US$ 18,9 bilhões e a uma arrecadação tributária total (federal, estadual e municipal) de R$ 9,8 bilhões. O índice de nacionalização da produção alcançou 51,56% em 2005, sendo que 32,57% corresponderam a insumos adquiridos regionalmente. O modelo Zona Franca de Manaus encontra-se, assim, maduro e capaz de desenhar cenários prósperos para as próximas décadas, seja para quem quiser investir em seu Pólo Industrial, formado por empresas que adotam sistemas de produção ecologicamente limpos, seja para quem deseja explorar, de forma sustentável e com um rico arsenal biotecnológico, as potencialidades regionais da Amazônia. (*) A autora é economista e superintendente da Superintendência da Zona Franca De Manaus (Suframa)
Eduardo Braga
CONSERVAÇÃO DA BIODIVERSIDADE E DESENVOLVIMENTO SUSTENTÁVEL NO
C
onservar a biodiversidade no Amazonas é um grande desafio. Como conservar e ao mesmo tempo promover o desenvolvimento econômico e a melhoria dos indicadores sociais? Para enfrentar este desafio criamos um programa de governo que chamamos de Zona Franca Verde. O Programa Zona Franca Verde (ZFV) envolve todas as áreas de governo, numa ação
AMAZONAS
efetivamente transversal. Para coordenar a implantação do ZFV criamos uma Secretaria de Meio Ambiente e Desenvolvimento Sustentável, a quem cabe a coordenação do Programa, em conjunto com a Secretaria de Produção Rural. Estabelecemos uma visão bem objetiva para o ZFV: promover a conservação da natureza e melhorar a qualidade de vida de nossa população do interior. Nosso desafio era levar o dinamismo econômico
24
da Zona Franca de Manaus para a imensidão do interior do Amazonas. Como dinamizar as cadeias produtivas ligadas ao uso sustentável de nossa biodiversidade que estavam deprimidas economicamente e abandonadas pelas políticas públicas dos governos anteriores? Elegemos algumas cadeias produtivas como prioritárias, em função de sua importância socioambiental e econômica: guaraná, madeira, pescado, produtos florestais não madeireiros,
1]
3]
Tucunaré
entre outras. Identificamos os gargalos para estas cadeias produtivas e formulamos instrumentos de políticas públicas apropriados para superar estes gargalos: assistência técnica florestal, extensão rural, desenvolvimento científico e tecnológico, geração de energia elétrica, infra-estrutura de transporte, regularização fundiária, crédito, política tributária, parcerias entre produtores e redes de supermercados, compras
governamentais etc. O resultado da implantação destas políticas é animador. Na área florestal implantamos o Tambaqui maior programa de manejo florestal em pequena escala da Amazônia, com mais de 400 planos de manejo de pequena escala elaborados pela Agência de Florestas e Negócios Sustentáveis do Amazonas (AFLORAM), permitindo ao nosso caboclo produzir madeira de forma legal e ecologicamente apropriada. Apoiamos a certificação florestal pelo FSC. Demos isenção total de ICMS aos principais produtos florestais não madeireiros. Conseguimos aumentar o preço da castanha e de óleos naturais como o da andiroba e copaíba em mais de 100%. Implantamos um programa de manejo de
2]
4]
1] Extração do Latex 2] Árvore de Copaiba 3] Castanha de Andiroba 4] Castanha
pirarucu, que hoje já chega a 241 lagos, beneficiando cerca de 480 famílias, distribuídas em 78 comunidades, com um aumento da renda em mais de 50% para o produtor, que hoje já abastece redes de supermercado como o Pão de Açúcar. Ao conseguirmos dar valor ao uso sustentável da biodiversidade, desestimulamos a economia da extração predatória e do desmatamento. Com isso reduzimos o desmatamento em 39% em 2004 e 31% em 2005. No Amazonas, dizemos que a floresta vale mais em pé do que derrubada. Isso só é possível com uma firme decisão política capaz de contaminar todas as esferas de governo com o ideário da sustentabilidade. O sucesso que alcançamos só está sendo possível graças a uma ampla rede de parcerias e, sobretudo, ao saber e apoio de nossos ribeirinhos, indígenas, colonos e extrativistas. Estes são os guerreiros de nossa luta pela sustentabilidade.
(*) Carlos Eduardo de Souza Braga, 45, é Governador do Estado do Amazonas
25
D jalma Mello
Resgatando o desenvolvimento da Amazônia
D
esde que foi criada em 2001, a Agência de Desenvolvimento da Amazônia (ADA), vinculada ao Ministério da Integração Nacional, vem pautando sua atuação naquilo que historicamente sempre se apresentou na forma de desafio para pesquisadores, gestores públicos e habitantes da região: o desenvolvimento sustentável da Amazônia, contemplando os diversos setores, desde a população tradicional até a classe empresarial. Quando assumimos a ADA, em
junho de 2003, entendemos que esse desafio só poderia ser superado com a adoção de uma gestão diferente baseada na participação de todos os atores endógenos e exógenos e reunindo em um único programa institucional os três pilares básicos do planejamento estratégico regional: crescimento econômico com equidade social e sustentabilidade ambiental. Nosso esforço inicial foi de reunir esses atores (movimentos sociais, instituições públicas de pesquisa, gestores públicos e empresários) em um único espaço físico e em todos os nove estados, nos quais a ADA tem jurisdição, e com eles definir as metas, prioridades e diretrizes desse planejamento. Desse debate, a ADA elaborou o Portifólio de Arranjos Produtivos Locais (APL), hoje adotado pela maioria dos órgãos do Governo Federal. Os APL apresentam as atividades produtivas por pólo de produção e por estados amazônicos que agregam valor e que apresentam potencial de crescimento econômico-social sustentável. Mais do que isso identificamos as complexidades desses Arranjos, seus entraves e viabilidade. Em 2005, juntamente com o Banco da Amazônia, a ADA promoveu a segunda rodada de identificação de APL, dessa vez com a garantia de organização do setor e de financiamento através do Fundo Constitucional do Norte (FNO). Os APL selecionados foram de mandiocultura, turismo e artesanato, aqüicultura e pesca, psicultura, fruticultura, movelaria, grãos, apicultura, dentre outros.
Convênios liberam mais de R$ 23 milhões em 2005
Mapeados os APL por grau de prioridades econômica e sub-espaços de desenvolvimento, a ADA, através do Programa Promover (Promoção e Inserção Econômica de Sub-Regiões), firmou diversos convênios com entidades governamentais e não governamentais para reforçar o fortalecimento dos APL. Somente em 2005, a Agência liberou R$23 milhões (mais de R$5 milhões para apoio a APL e R$ 17 milhões de emendas parlamentares) aos estados do Amapá, Amazonas, Pará, Rondônia e Roraima). No Amapá, os recursos serão investidos no 28
fortalecimento do Laboratório de Análise FísicoQuímico do IEPA para desenvolvimento dos Arranjos de fruticultura e pesca, beneficiando as comunidades produtoras, dentre outras. No Pará, a ADA inaugurou o Laboratório semelhante para a análise fitosanitária de polpas de frutas, e ainda investe na indústria da construção naval em madeira, viabilidade econômica da cultura do
FAO. Em 2005, a Agência liberou recursos no valor de R$494 mil às prefeituras de Rio Branco, Manaus e Macapá para fortalecimento de empreendimentos de móveis, madeira e artefatos; cultivo do cupuaçu; e açaí, respectivamente. As ações vão desde a capacitação dos empreendedores, assistência técnica até a realização de programações para divulgação dos trabalhos. O total de beneficiários é de 148 pessoas.
Amazônia preparada para receber investimentos Garantindo a viabilidade da política de investimento ao setor privado, a ADA aperfeiçoou os critérios para a concessão de incentivo fiscal (Redução do Imposto de Renda Pessoa Jurídica) às empresas instaladas ou que desejam instalar-se na Amazônia. Desde 2004, a ADA vem intensificando a concessão desse benefício atraindo a atenção do setor empresaria e gerando centenas de empregos na região. Em 2005, a ADA aprovou 211 projetos e 23 atos declaratórios concedendo a redução fiscal. O benefício garante
curauá para a agricultura familiar, desenvolvimento de projeto de apicultura, implantação de viveiros de mudas, etc. No Amazonas, a mesorregião do Alto Solimões está sendo fortalecida com o desenvolvimento da cadeia produtiva do pescado. Em Roraima o investimento é para o APL de grão, psicultura e movelaria. Em Rondônia 31 municípios são beneficiados com emendas parlamentares, cujos recursos são para obras de infra-estrutura urbana.
Resgatando o desenvolvimento social
A política de fortalecimento de Arranjos Produtivos Locais também vem redirecionando os investimentos do Programa Nacional de geração de Emprego e Renda em Áreas de Pobreza na Amazônia (Pronager), coordenado pela ADA-
um investimento total de R$ 8.499.187.216,60 e a geração de 34.866 mãos-de-obra. Outro passo importante na implementação de projetos privados que garantam mais infra-estrura à região, foi a mudança do Decreto que criou o Fundo de Desenvolvimento da Amazônia e a assinatura das primeiras cartas-consulta de projetos interessados nos recursos que em 2005 acumulavam R$ 1 bilhão para investimentos financeiros. Baseados nas prioridades de investimentos determinadas pelo Ministério da Integração Nacional, coincidentemente, os cinco primeiros projetos são para investimentos em infra-estrutura, sendo quatro no setor elétrico e um para a infra-estrutura portuária. No total, são investimentos na ordem de R$647.281.463,00 em cartas-consulta aprovadas e assinadas em 2005. Desse montante R$387.821.800,00 são de participação da ADA/FDA e os demais de investimentos fixos das empresas. 29
Dos cinco empreendimentos, dois encontram-se no Estado do Pará, dois no Mato Grosso e um no Amazonas. No total, a expectativa é de geração de 1.552 empregos diretos e de 6258 indiretos. Entre os benefícios sociais a que se propõem os investidores, encontram-se o aproveitamento de mão-de-obra local, o treinamento e a capacitação dos funcionários, o incremento da capacidade instalada de energia, a contribuição a programas sociais ligados à saúde e à educação e a contribuição com o Programa “Luz para Todos”, do governo federal. No Pará, as empresas são a Usina Siderúrgica do Pará USIPAR, localizado no pólo industrial de Barcarena, e a Usina Siderúrgica de Marabá USIMAR, em Marabá. No Estado do Mato Grosso, encontram-se os projetos das empresas Usina Elétrica de Nhandu, em Guarantã do Norte, e Porto Franco Energética S/A, município de Juscimeira. No Amazonas, o projeto é da empresa Geradora de Energia do Amazonas GERA, de Manaus. A operacionalização do Fundo reflete os esforços feitos pela ADA desde a elaboração e avaliação de roteiros de cartaconsulta e de projetos, através de um amplo debate com a área empresarial e técnica no assunto até o convênio com o Banco da Amazônia, que passou a ser o agente financeiro do Fundo.
(*) O autor é Diretor Geral da ADA
Camillo Martins Vianna
Amazônia meu amor REN
SOP LU
AZ Ô N IA
DE 1968 ES D
M
TA A ND O P EL A
Tens a estampa de Senhora de Senhor de engenho. De Anjinho de Procissão, na festa da padroeira. Dos 3 Pretinhos na crista da Onda Grande, na força da Pororoca. Do papouco dos foguetes na romaria, na curva do Estirão.
Do Assoalhamento das tartarugas gigantes, nas praias de desova. Do pequeno guerreiro sugando o peito da Cunhantã. Da copa da samaumeira, cobrindo as Grimpas das árvores companheiras na beira do alagado. Do pescador solitário lançando a Azagaia certeira, no rumo do peixe encarnado. Dos cãns embranquiçados do Patriarca Quilombola, recordando a saudosa Pátria Negra distante. Do impulso da vida na Piracema do peixe saltador na subida da cachoeira.
Dos velhos Cascos, utilizados para hortas em frente as casas na subida das águas. Do barulho do chuvueiro levantando o cheiro da mata, escorrendo pelos campos, fazendo reverdecer as queimadas de verão. De vaqueiro Dobrando o gado, na Apartação da malhada, nos campos marajoaras. Da zoada do vento que vem de longe, na biqueira da Casa Grande. De toque de funeral nos cemitérios caiados em homenagem aos amigos e
parentes no dia da Iluminação. Das festas de época, promessa ou louvação em pequenos povoados. Dos folguedos de Laçação ou Amansação de Rês Orelhuda de Marca e Sinal. Do Marulho das ondas batendo na areia da praia ou no pedral do barranco. Do rastro duplo riscado no céu, pelos grandes pássaros metálicos, no rumo de outras distâncias. Da Mexição da farinha em mutirão de família. Da floração das árvores que parecem competir entre si, com o nascer do sol e com a luz das estrelas. De periquitos, que em verdadeiros Cardumes Alados, buscam alimento, repouso e ajuntação. Das lavadeiras batendo roupa nas beiras do Grande Rio. Das noites escuras onde parece haver confrontação entre guerreiros mitológicos, tal a quantidade de raios e coriscos riscando o céu, entre uma nuvem e outra. 30
ao vermelho dos guarás. Do vôo das marrecas Ananaí desenhando figuras geométricas no rumo da dormição. Das pequenas ilhas de Capim Muri e Canarana, na correnteza das Estradas que Andam em direção à boca do rio, espalhando sementes, na preservação do verde. Do Promesseiro de pés descalços, carregando a Cruz, na procura de absolvição. Da Furiosa, em coretos, animando as festas de devoção. Do Gavião Tesoura no vôo solteiro, na busca de companheira. Do Farol tombado na boca do Rio Arari. Do leite escorrendo do risco da Bandeira, no tronco da Árvore da Esperança. Das crianças brincando com sementes de Lolota, nos seringais à beira d'água. Da queda do camaleão desabando da Siriubeira na força da maré. Do Garçal do Lago Grande de Monte Alegre, sarapintado de branco junto Da Curuminzada correndo atrás da Bandinha da Corporação. Do Jacumaúba manobrando a Montaria no caminho da Obrigação. Do penitente Subidor de Mastro na festa de Derrubação. De mulheres na Pilação do café para o quebra-jejum. Do rastro da Estrela Cadente que concede três pedidos para melhora da situação. Da alegria da molecada na malhação do Judas depois da Sexta Feira Grande. Da Atracação de Luta na festa de São Sebastião, no Marajó. Da Despesca da Camboa dos Padres, em praias de Ponta de Pedras, na Baia de Marajó. Das reverências dos fiéis à Igreja Octogonal de São Joãozinho, do Mestre Antonio Landi.
Da saracura Três Potes caçando comida, pulando de Vitória Régia para outra. Do Real Forte Príncipe da Beira, no rio Guaporé, na fronteira da Bolívia. Do tronco de velha árvore levada de Bubuia no lixo do Rio Grande. Da velha senhora sentada na cabeceira do trapiche, ao pôr-do-sol, parecendo imaginar a vida. Do Marco Perdido do Marechal Rondon, no limite extremo norte do País, no Monte Caburaí, em Roraima. Do vaqueiro jogando a Brasileira na Caiçara do Jutuba, no embarque do gado branco. No campo Santo dos Nati-mortos, em plantios de seringueiras do Americano. Da professora e seus alunos marchando cadenciados ao som de um tambor, no alto do barranco, em homenagem ao dia 7 Maior, no rio Tapajós. Do Sauatá dos caranguejos no mangal da Contra Costa. Da Cidade Encantada no fundo do Lago Verde de Alter-do-Chão, na beira do Tapajós. Da Procissão Submersa no lago dos Aruans, na Ilha Mabarajó.. Da Fantasma Voadora nos céus de Tracuateua. Dos volteios do Gavião Caracaraí pegando cobra e largando-a no ar para apará-la novamente. Do ataque da gaivota ao predador de seu ninho em Furado do Couro, no rio Guaporé. Das Cobras Grandes na defesa de suas Locas. Do morcego Meuã de rato velho. Do Mingau Quente de Açaí, tomado à beira do Maiuíra, ao alvorecer. Da Maromba salvadora, na Tufação da maré. Do lugar Santa Terezinha, no Furo do Boto, em Abaetetuba. Do Matapi, na pesca do camarão, na Ilharga da casa Ribeirinha. Da ilha nova das Malvinas, na Contra-Costa da Amazônia atlântica. Da Peconha, adjutório na subida e na descida da Apanha do Açaí, rainha das palmeiras.
Do Peixe Morador, no Poção do igarapé da Tomásia. Dos carros-de-boi rangedores em Fernandes Belo, próximo ao rio Gurupi. Das redes de passageiros, armadas no convés dos navios da linha. Da zoada que vem da Ilha dos Papagaios ao amanhecer e anoitecer, Deconfronte à Belém. Do despertar dos galos na madrugada de Concórdia do Pará. Da cantoria dos esmoleres, na Tiração de Ajuda para a Festa de São Benedito, nos Campos do Meio, de Baixo e de Cima, de Bragança. Das latas com plantas, enfeitando a frente das casas em Xapuri. Do som da clarineta tocada pelo Raimundo Sapateiro ao encerramento de suas atividades. Do garimpo Blefado na tirada de ouro de aluvião, nos barrancos do Tapajós. Da figura do pai levando seu filho de Macaquinho, Salvando a mãe, na despedida. Do mestre sabedor tocando Bandorra na festa do Sairé, em Alter-do-Chão. Do tilintar da argola Matinada, na Dobração do gado na fazenda Livramento. De mulheres e crianças na cata do mexilhão, no lameiro das praias. Amazônia, estas imagens que te representam parcialmente, são resultado das andanças, avoanças, e, naveganças e conversanças do autor, por ermos, cantos e recantos de um Paraíso Perdido que mestre Euclídes não chegou a escrever, resultante de sua vivência no também chamado Inferno Verde, por sua morte prematura. Tóia Simim, Tóia Simim, alevanta a Bandeira de Tóia Simim (do Cordão do Papagaio, de autoria de Raymundo Martins Vianna, Bruno de Menezes e Justiniano Fonseca, nos anos 60). (*) Da Sociedade Brasileira de Médicos Escritores SOBRAMES e Sociedade de Preservação aos Recursos Naturais e Culturais da Amazônia-SOPREN
32
Gabriel Guerreiro
Macrozoneamento Ecológico-Econômico
Mudar a Lógica Histórica do Pará
T
ratar a Amazônia a partir das suas especificidades, desde os aspectos fisiográficos até os antropológicos. Esta foi uma das preocupações que nortearam a discussão e sistematização do projeto de Macrozoneamento Ecológico-Econômico do Pará, MZEE, que desde 2005 é lei estadual, aprovado por unanimidade dos deputados da Assembléia Legislativa do Estado. O zoneamento do Pará tornou-se referência até mesmo para a equipe do Ministério do Meio Ambiente que traçou o Macrozoneamento para aos estados da Amazônia brasileira. Faço referência ao competente trabalho da equipe técnica da Secretaria de Ciência Tecnologia e Meio Ambiente-SECTAM, que demonstrou dedicação e preparo, em todas as fases do estudo, o que
certamente muito contribuiu para o êxito da empreitada. Entre as realidades locais levadas em conta na concepção do MZEE, algumas nos remetem a importantes reflexões e eu destacaria, principalmente, os conceitos de fronteira aberta, os eixos de desenvolvimento do Estado, que influenciaram a alteração da floresta. O primeiro deles, marco civilizatório da Amazônia, é o da Calha do rio Amazonas, que inclui o Marajó, área de Belém, parte do Baixo Tocantins e vai até Faro, no Oeste do estado, com o centro em Santarém no Baixo Amazonas; o eixo da BR-010 (Belém-Brasília) e PA-150, a Leste; o eixo da Transamazônica, que trouxe uma nova ordem de antropização, penetrou o hinterland, no interflúvio dos rios, e fez um grande perfil de 33
impacto; o da BR- 163 (Santarém-Cuiabá) posterior à Transamazônica, na qual antropização não chegou ao nível desta última rodovia, porque os investimentos foram menores, e as dificuldades maiores. Esses quatro grandes eixos de antropização foram mapeados de tal sorte que ficou bem claro a fronteira aberta. Quando analisamos os percentuais desses impactos constatamos que isso representa algo em torno de 35 por cento do território paraense; 65 por cento do território ainda está sem grandes ataques, ou praticamente nenhum. As grandes áreas, por exemplo, a Calha Norte, estão inteiras; a Terra do Meio, que foi agredida até agora, e desde o final do século passado e início deste; a área do Tapajós, apesar dos garimpos terem cinqüenta anos de exploração, está bem
preservada, ainda não tem cinco por cento desmatada. Nós ainda temos condições de preservar aquelas grandes áreas de reprodução do biosistema, da biodiversidade da região. Isto está preservado nessas grandes áreas e foi o grande mote do zoneamento ao compor um conjunto de mapas que tem a fronteira aberta e o espaço que está preservado para ser destinado à sustentação do ecossistema no estado. Então chegamos ao desenho de dois grandes conjuntos, a fronteira aberta, que o projeto caracterizou como área de consolidação; e as áreas de uso restrito e uso restritíssimo. Dez por cento do território paraense estão destinados às áreas de proteção integral, onde não se pode fazer nada, não se pode mexer, e isto representa cerca de 130 mil/km2, portanto uma área considerável. E temos uma área de 410 mil/km2 já alterada. Mas é bom frisar que às áreas de preservação integral estão acoplados os grandes “Cinturões de Uso Sustentável”, formados por terras indígenas, quilombolas, Florestas Nacionais, Reservas Extrativistas e Reservas de Desenvolvimento Sustentáveis. Atualmente o projeto do zoneamento avança nessas áreas detalhando, dependendo da necessidade, em escala um para duzentos e cinqüenta mil; um para cem mil e um para cinqüenta mil, como é o caso da borda atlântica paraense. Sublinho que esse processo de detalhamento do projeto vai ser feito com a participação efetiva da sociedade e o exemplo foi testado no Município do Mojú, que já foi mapeado em detalhe, com todas as comunidades, que foram estudadas, contribuíram com os seus saberes culturais, experiências, e, portanto conhecem o zoneamento. O que nos pretendemos é estender essa metodologia para o estado e com isso nos 35 por
Estimular a formação de cadeias produtivas através da verticalização da produção mineral, agropecuária e florestal
cento de território alterado vamos fazer o detalhamento de tal forma que se possa recuperar, dentro da fronteira aberta, as Áreas de Proteção Permanentes (APP's), proteção à nossa drenagem, a criação de parques municipais e estaduais em áreas que ainda estão preservadas. Não queremos destruir mais floresta nessas áreas, mas precisamos desenvolvê-las porque a população tem que sair da pobreza. Neste aspecto, e tenho insistido nas palestras que venho fazendo em universidades, um número preocupante e injusto: cinqüenta por cento da nossa gente ainda está na linha da pobreza para baixo e isso eu não posso aceitar. Daí que temos que desenvolver um grande projeto produtivo, e diversificado, dentro do Estado do Pará, que considere agricultura, pecuária, mineração, reflorestamento, turismo, cadeias produtivas, que possam gerar emprego, renda e tirar essa população da pobreza. Uma outra preocupação do governo estadual é monitorar as áreas que fazem parte do zoneamento para impedir a destruição da floresta. A SECTAM tem uma base tecnológica de sensoriamento remoto que opera em detalhamento e as pessoas desconhecem isso. Nós podemos ter imagens do Pará, diariamente, em escalas extremamente adequadas. Antigamente se precisaria de um exército chinês para tomar conta de todas essas fronteiras, hoje se mapeia tudo daqui do Laboratório de Sensoriamento Remoto da SECTAM. Então, podemos ter o poder de polícia, de fiscalização de monitoramento a partidas dos dados tecnológicos. Os satélites estão aí são os grandes olhos que estão vigilantes. Mas, numa emergência, no momento em que algum fato é detectado, a SECTAM vai até lá. Foi o que aconteceu no final de fevereiro deste ano na área da Calha Norte do rio Amazonas. Juntos, governos federal, estadual, municipal e seus órgãos afins, realizaram, pela segunda vez, a operação Força Tarefa para retirar pessoas que estão ilegalmente dilacerando os ecossistemas assegurados pela lei do macrozoneamento. Assim, pelos olhos dos satélites e pela ação 34
Consolidar a fronteira produtiva já aberta, de modo aumentar o índice de aproveitamento do solo e do subsolo
policial o sujeito é retirado da área e responderá por esse ato atentatório à natureza. Não temos nenhum interesse em abrir mais fronteiras, porque algo em torno de 20 a 25 milhões de hectares de terras já estão alteradas no estado e nós só temos 7,5 milhões de habitantes, e não damos conta de desenvolver tudo isso. Essas áreas representam mais do que o
Desenvolver e difundir tecnologias alternativas para exploração sustentável dos recursos naturais
Estado de São Paulo. Será que não dá para todos nós vivermos num espaço desse tamanho? Deixemos para as gerações futuras o futuro, mas vamos deixar preservado, até porque não conhecemos bem ainda a Amazônia e não temos esse direito de destruir o que não foi estudado. O projeto do macrozoneamento é importante e tem a concepção do Novo Pará, e o governador
Simão Jatene foi o homem que começou a fazer o macrozoneamento, porque ele definiu a questão das fronteiras abertas, e participou diretamente das discussões técnicas do projeto. Aliás, fomos apenas os condutores desse processo. A equipe da SECTAM fez os estudos prévios, levantou informações técnicas disponíveis em instituições locais, que pesquisaram conosco, é o caso do Museu Emílio Goeldi, Embrapa e encontro de um projeto adequado, porque a universidades. De modo que o esforço do Pará é dar história nos mostra que 400 anos de extrativismo um novo rumo, sair do extrativismo simplório, ir ao nos legou um resultado que não é o desejável pela nossa população. Não podemos aceitar o analfabetismo, a pobreza, as crianças com dentes cariados, os adultos sem saúde, educação, falta de segurança e ainda continuar a plantar mandioca no toco. Queremos definir claramente onde nós podemos usar o território para o nosso desenvolvimento sustentado, e onde vamos preservar os ecossistemas. E muito mais: modernizar o nosso sistema produtivo, incorporar tecnologias adequadas à Amazônia; preservação das áreas dispersas nessas regiões, é importante, até para a regulação e manutenção da climatologia; cuidar de fazer um projeto de recursos hídricos, com a gestão de recursos hídricos para o estado, porque nós somos detentores de uma colossal massa de água doce nesse 35
planeta e precisamos conhecer e gerenciar com responsabilidade essa riqueza. O Estado deve passar a ser um contribuidor, um ordenador, do território, e das suas questões críticas, das nossas vocações, inclusive para ter competitividade é preciso que agente não agrida esse potencial natural. O Macrozoneamento Ecológico-Econômico é isso, e eu darei todas as minhas energias no sentido de ver esse projeto mudar a história do Pará, preservando a nossa natureza, melhorando a qualidade de vida da nossa gente interiorana e também da capital. Afinal, somos todos passageiros de uma nave chamada Terra e que precisamos saber tratá-la bem e o Pará está fazendo esse exercício inteligente, democrático com o projeto do Macrozonemento Ecológico-Econômico. (*) O autor é geólogo e secretário executivo de Ciência, Tecnologia e Meio Ambiente do Estado do Pará
PESQUISA E BIODIVERSIDADE: A Experiência do Museu Goeldi na Amazônia O espetáculo da vida na várzea, mostrando sua rica biodiversidade e traduzido na multiplicidade de organismos vivos em intensa interação: 'munguba' (Pseudobombax munguba) abrigando exemplares de 'biguá' (Phalacrocorax brasilians), 'garça branca' (Casmerodius albus), 'garça branca mirim' (Egretta thula) e 'garça boiadeira' (Bubuleus ibis) no lago Mamirauá, Reserva de Desenvolvimento Sustentável Mamirauá no estado do Amazonas
mamíferos, insetos, microorganismos, homens...), incluindo, ainda, a variabilidade de genes e a diversidade de ecossistemas e suas complexas interações ecológicas. A biodiversidade é fundamental à saúde e à economia humana. Contudo, para conservá-la é preciso conhecê-la, fazer um inventário de tudo o que seja possível identificar, avaliar o que existe e o que ainda pode ser guardado como patrimônio natural para garantir o futuro da humanidade. Sabe-se que as florestais tropicais apresentam uma rica biodiversidade e a Floresta Amazônica é um dos locais com as maiores taxas de biodiversidade do planeta. Trata-se de uma região natural que se estende por nove países da América do Sul, mas é Diversas espécies de anfíbios da Amazônia podem estar correndo risco de extinção, semelhante ao que ocorre em outros locais, como na Costa Rica, onde diversas espécies tem sido mortas por ataques de fungos patogênicos. Este fenômeno tem sido descrito pelos especialistas, como um dos resultados do aquecimento global da Terra, que tem causado sérios problemas à biodiversidade do planeta. Outra forma de agressão aos anfíbios é a perda de ambientes naturais, já que muitas espécies ocorrem em regiões da Amazônia com alto grau de antropização
M
ilhares de anos de criação e aperfeiçoamento de formas de vida estão se perdendo com o desaparecimento das florestas tropicais, onde está concentrada uma riqueza essencial para o homem e sua cultura. Riqueza essa conhecida pelo termo Diversidade Biológica ou Biodiversidade. Edward O. Wilson, pai do termo “Biodiversidade” comenta que a “perda da biodiversidade pela destruição dos ambientes naturais é a estupidez pela quais nossos descendentes estarão menos dispostos a nos perdoar”. A palavra “Biodiversidade” é derivada de "Bio" que significa "vida" e “diversidade” significa "variedade". Desta forma, a biodiversidade ou diversidade biológica compreende a totalidade de variedade de formas de vida que podemos encontrar em nosso planeta (plantas, aves, 36
o Brasil que concentra 64% deste território espalhado pelo Norte do Brasil e cujas fronteiras adentra o Maranhão e os estados do Tocantins e Mato Grosso. No estado do Pará, cuja identidade é marcada pela exuberante natureza amazônica, se localiza o Museu Paraense Emílio Goeldi, uma instituição de pesquisa vinculada ao Ministério da Ciência e Tecnologia. Fundado em 1866, o Museu Goeldi tem como atividades principais, a produção e difusão de conhecimentos e acervos sobre sistemas naturais e socioculturais relacionados à Amazônia, dessa forma contribuindo para a formação e o aprimoramento da memória cultural e o desenvolvimento regional. Na Amazônia existem mais de 40 mil espécies de planta descritas, das quais 30 mil são endêmicas (ocorrem somente nesta região). Já foram registradas mais de 1200 espécies de aves (260 endêmicas), 427 de mamíferos (173 endêmicas), 378 de répteis (216 endêmicas) e 427 de anfíbios (364 endêmicas) e mais de 3.000 espécies de peixes (da Silva et al. 2005). A biodiversidade atinge números extraordinários na Amazônia. Em um hectare de floresta amazônica podem ser encontradas entre 200 a 350 espécies (Nelson e Oliveira 1999). Dentre os mamíferos, os primatas formam um dos grupos mais diversos. Estudos feitos em várias regiões na Amazônia mostram que ocorrem 14 gêneros de primatas, dos quais cinco ocorrem exclusivos desta região. Em um quilômetro quadrado de floresta amazônica, pode-se registrar até 14 espécies de primatas (www.conservation.org.br).
Por que a biodiversidade é importante? A biodiversidade é fonte de imenso potencial econômico sendo à base da atividade agrícola, pecuária, pesqueira, florestal e também a base da indústria da biotecnologia, ou seja, da fabricação de remédios, cosméticos, enzimas industriais, hormônios, sementes agrícolas. Portanto, a A exploração madeireira na Amazônia é um dos fatores que comprometem a conservação de sua rica biodiversidade. Apenas um terço da madeira é exportada. Só o estado de São Paulo consome 1 milhão de árvores por ano. A matéria-prima é nobre, seu destino não é
biodiversidade possui, além de valor intrínseco, valores ecológicos, genéticos, sociais, econômicos, científicos, educacionais, culturais e recreativos (www.museu-goeldi.br/ biodiversidade). O conhecimento atual sobre a biodiversidade na Amazônia ainda é muito fragmentado. Estamos longe de conhecer todas as espécies que habitam a região e das poucas que conhecemos ainda precisamos saber com mais exatidão os ambientes onde ocorrem. A fim de tentar preencher esta lacuna de conhecimento, o Museu Goeldi implantou em 1993, a Estação Científica Ferreira Penna, localizada na mais antiga Floresta Nacional da Amazônia, a Floresta de Caxiuanã a cerca de 400 km a oeste de Belém no estado do Pará. Esta Estação tem como Vista parcial das instalações da base física da Estação Científica Ferreira Penna, onde o Museu Goeldi desenvolve diversas pesquisas com o objetivo de aumentar o conhecimento da biodiversidade da Amazônia
37
missão produzir e difundir conhecimentos científicos sobre a diversidade ambiental e sóciocultural da Amazônia. A Estação dispõe de uma infra-estrutura física de referência em termos de base de pesquisa, dotada de laboratórios, torres de observação, salas de aula, refeitório, enfermaria, alojamentos e transportes fluviais. Durante 13 anos, foram produzidos mais de 200 trabalhos técnico-científicos, divulgados na forma de livros, artigos em periódicos científicos, teses
Mapa mostrando a Floresta Nacional de Caixuana, localizada na Amazônia Oriental, no estado do Pará, entre os rios Xingu e Tocantins, onde se localiza a Estação Científica Ferreira Penna (ECFP) do Museu Goeldi
de doutorado, dissertações de mestrado além de relatórios de projetos de pesquisa. Atualmente estão em desenvolvimento projetos de extrema relevância científica, como o LBA (Experimento de Grande Escala da Biosfera-Atmosfera na Amazônia/MCT), o TEAM (Tropical Ecology Assessment and Monitoring/CI-Brasil) e PPBio (Programa de Pesquisa em Biodiversidade/MCT), além dos programas de Apoio à Pesquisa e Residência em Estudos Amazônicos (MCT/MPEG), voltados à formação e fixação de recursos humanos na Amazônia, programas estes estratégicos para a região. Uma das principais missões institucionais do Museu Goeldi é a qualificação de recursos humanos para a realização de pesquisa em biodiversidade, envolvendo profissionais de nível superior, técnicos e comunitários. Neste sentido o Museu Goeldi é responsável por dois importantes cursos de formação de recursos humanos em nível de Mestrado e Doutorado de Pós-graduação para o estudo da biodiversidade na Amazônia, tendo dois importantes cursos em parceria com a Universidade Federal do Pará (Zoologia) e com a Universidade Federal Rural da Amazônia (Botânica) onde a cada ano são formados diversos pesquisadores nas mais diversas áreas ligadas ao conhecimento da biodiversidade da Amazônia. O Museu Goeldi desenvolve diversos programas ligados à geração de conhecimento científico
Antropismo Campos Floresta Aluvial Floresta de Terra Firme
sobre a biodiversidade da Amazônia. Entre eles podemos citar o Programa de Biodiversidade da Amazônia que busca responder à necessidade urgente de se melhorar o conhecimento sobre a biodiversidade da mais extensa floresta tropical do mundo, de forma a embasar cientificamente as políticas públicas brasileiras voltadas às questões ambientais. Este programa coordena as ações institucionais do Museu Goeldi relacionadas às coleções, pesquisa e difusão científicas, de forma que possam contribuir eficazmente no preenchimento das lacunas existentes sobre o assunto. O objetivo maior do programa é inventariar, mapear e caracterizar a biodiversidade da Amazônia, disponibilizando publicamente esse conhecimento para embasar e estimular ações voltadas à preservação ambiental da região. O Museu Goeldi desenvolve os Projetos de Pesquisa de longa duração em inventário e conservação. Este projeto representa um dos mais ousados trabalhos de colaboração em longo prazo entre taxonomistas e ecólogos envolvendo pesquisadores, estudantes de graduação e pósgraduação e técnicos especializados com o objetivo de inventariar e estimar a biodiversidade de grupos selecionados de plantas e animais na Floresta Nacional de Caxiuanã. O principal objetivo do Projeto é definir claramente unidade de esforço de amostragem, de modo a prestar-se a estudos comparativos, a fim de produzir resultados rápidos e que contribuam diretamente para ciência e conservação. Outra forma de capacitação de recursos humanos para a geração de conhecimento da biodiversidade da Amazônia é feita, através de treinamentos especiais sobre coleta e identificação de plantas e animais, usando parcelas permanentes de inventário e o monitoramento da biodiversidade em longo prazo. Outro projeto importante executado no Museu Goeldi é o Projeto TEAM (Tropical Ecology Assessment Monitoring/ CI Brasil) que visa criar protocolos padronizados de pesquisa científica para o estudo de florestas tropicais ao longo do Em um hectare da floresta de terra firme da Amazônia podem ser encontradas de 200 a 450 espécies de árvores
38
A Amazônia é uma das regiões mais ricas em biodiversidade de anfíbios. Nesta foto vemos um exemplar de Phyllomedusa vaillantii, uma espécie que tem como característica interessante colocar seus ovos em folhas de árvores do sub-bosque da floresta Amazônica
tempo, em vários locais do mundo considerados “hotspots” ou em áreas prioritárias para a biodiversidade. Este projeto é executado na Estação Científica Ferreira Penna, onde variáveis de biodiversidade (clima, solo, topografia, vegetação, invertebrados e vertebrados) estão sendo monitoradas em 6 sítios de amostragem. Outro projeto institucional do Museu Goeldi ligado à geração de conhecimento da biodiversidade da Amazônia é o Programa de Estudos Costeiros (PEC) voltado para o litoral amazônico, cuja principal missão é gerar e disseminar o conhecimento sobre os sistemas naturais e a diversidade sociocultural da
Valorizar o conhecimento tradicional da biodiversidade é importante para sua conservação. Esta foto mostra um exemplar de Salva-do-Marajó (Hyptis crenata), uma erva cujo chá é largamente utilizado pelas populações locais para combater a diarréia, doença comum na Ilha do Marajó-Pará, durante o inverno
A Amazônia é uma das regiões com maior biodiversidade de plantas, com mais de 40 mil espécies descritas, como o exemplar de Eichornia azurea (Aguapé)
Amazônia costeira e marinha. Um dos principais objetivos do Programa é aumentar a capacitação do Museu Goeldi para responder questões relevantes sobre os recursos naturais, seu uso social e o desenvolvimento sustentável da costa amazônica e capacitar recursos humanos qualificados para o estudo da biodiversidade do litoral amazônico. Um produto importante deste programa é o Banco de Imagens do Programa de Estudos Costeiros (BIPEC), um portfólio virtual voltado para a organização, otimização, informatização e gerenciamento eletrônico do acervo fotográfico e cartográfico de pesquisadores do PEC. Neste banco de dados, pesquisadores do As florestas alagáveis da Amazônia são um dos ecossistemas mais interessantes do mundo. A flutuação no nível dos rios pode variar em até 14 metros e diversas espécies de plantas, animais e mesmo o homem são adaptados a esta variação de flutuação no nível dos rios
Museu Goeldi, e de outras organizações podem fazer pesquisas sobre a região costeira da Amazônia. A seleção de áreas prioritárias para conservação, seja para indicação de áreas que irão abrigar unidades de proteção integral como reservas biológicas e parques, ou unidades que permitam o uso sustentável dos recursos naturais, têm pautado as ações de parte do corpo de pesquisadores do Museu Goeldi nos últimos cinco anos. Para isso o Museu Goeldi conta com o apoio direto do Projeto de Conservação e Utilização Sustentável da Diversidade Biológica Brasileira (PROBIO), executado pelo Ministério do Meio Ambiente, através da Secretaria de Biodiversidade e Florestas. Esse projeto foi concebido no âmbito do Programa Piloto para a Conservação das Florestas Tropicais, com apoio financeiro do PPG-7, cujos recursos são geridos pelo Fundo Mundial para o Meio Ambiente (GEF).
O Parque Nacional da Serra da Cutia em Rondônia, exibi uma rica biodiversidade, resultante do grande mosaico de tipos de vegetação, resultando em grande heterogeneidade ambiental, que abriga uma alta diversidade filogenética, em comunidades que misturam elementos amazônicos e elementos do cerrado, como mostrado nesta foto
Um desses projetos desenvolvido pelo Museu Goeldi priorizou áreas de campos naturais e cerrados amazônicos no arquipélago da Ilha do Marajó e trabalhou com diversos grupos biológicos entre plantas com flores, mamíferos voadores e não voadores, aves, répteis e anfíbios. Outro projeto trabalhou em áreas de cerrados na transição do Brasil Central com a Amazônia, na Serra do Cachimbo, no sul do Pará, na divisa com o Mato Grosso. Esta região contém um mosaico interessante de tipos diferentes e peculiares de vegetação, resultando em grande heterogeneidade ambiental, que abriga uma alta diversidade filogenética e um nível significativo
de endemismos, em comunidades que mesclam elementos amazônicos e elementos do cerrado. Entre os produtos e resultados destes projetos se destacam: banco de dados biológicos e ambientais dos sítios estudados; cartas temáticas sobre a distribuição da biodiversidade da região estudada; mapas de priorização por grupo biológico e por categoria de importância para conservação; análises ecológicas e espaciais; relatórios técnicos para divulgação e disseminação. Estudos recentes indicam que se a maior parte da vasta extensão de floresta Amazônica existente hoje fosse removida, além do desaparecimento de um número alto de espécies, a atmosfera da Terra passaria a ter muito mais gás carbônico, agravando o efeito estufa e o conseqüente aquecimento global. Desta forma, a biodiversidade é uma das propriedades fundamentais da natureza por ser responsável pelo equilíbrio e pela estabilidade dos ecossistemas.
Biodiversidade: quantas espécies há? E onde estão?
Essas duas questões ou perguntas são fundamentais quando se tenta entender os padrões taxonômicos e biogeográficos dos diversos grupos de plantas, animais, fungos e bactérias, especialmente numa região de grande biodiversidade como a Amazônia. O esforço do Museu Goeldi para inventariar a
cidade de Belém, pela disponibilidade de recursos do tesouro estadual, que financiou a pesquisa e a gerência do órgão nos seus primeiros 40 anos. A partir da década de 20 do século passado até a passagem do Museu Goeldi para a administração federal, a instituição passou por forte período de estagnação e decadência que se refletiu no baixo ou nulo crescimento das coleções científicas. Hoje, com a retomada do interesse do governo pela biodiversidade como estratégia de geração de conhecimento, os inventários biológicos e as coleções passam por novo impulso, especialmente com a implementação do Programa de Pesquisa em Biodiversidade (PPBIO) do Ministério da Ciência e Tecnologia. Nestas coleções é possível encontrar uma classificação que descreve o status de cada espécie, indicando, por exemplo, se está ameaçada de extinção ou se desperta interesse comercial. As coleções do Museu Goeldi encontram-se em um processo de informatização que deverá ser concluído em breve, permitindo uma consulta deste imenso e
Apesar de nunca mencionado, os insetos são um dos grupos com maior biodiversidade na Amazônia. Neste foto vemos um ninho de vespas
biota ao longo de seus 140 anos de existência tem variado de acordo com a própria história institucional. Nos primeiros anos, no boom da borracha foram implantadas diversas coleções zoológicas e botânica cuja dinâmica inicial foi elevada, com incremento exponencial das coleções. Isso se deveu em parte, pela disponibilidade de áreas primitivas no entorno da
Apesar de sua rica biodiversidade a Amazônia tem sido sistematicamente destruída para a retirada de madeira de lei
40
Mapa mostrando o desflorestamento na Amazônia até 2004, onde já foram desflorestados mais de 680 mil km2, representando mais de 18% da área total da Amazônia Legal brasileira
rico banco de dados por pesquisadores no Brasil e no exterior. A resposta para a segunda pergunta será derivada dos esforços que se fizer para responder a primeira, pois uma vez se intensificando as coletas e inventários será possível saber onde estão as espécies, especialmente aquelas de interesse para a conservação e para o bem estar da humanidade e a partição dos benefícios econômicos oriundos de seu uso sustentável de sua imensa e rica biodiversidade, abrigada nos rincões ainda desconhecidos desta região que é superlativa em tudo.
Fatores que ameaçam a conservação da biodiversidade
A perda da biodiversidade envolve aspectos sociais, econômicos, culturais e científicos. A situação é particularmente grave na região tropical, onde as populações humanas crescentes e pressões econômicas estão levando a ampla conversão das florestas tropicais em um mosaico de ambientes alterados pela ação antrópica. Em nenhum lugar do mundo são derrubadas tantas árvores quanto na Amazônia. Os dados oficiais, elaborados pelo Instituto Nacional de Pesquisas Espaciais (INPE), evidenciam um panorama de elevado e crescente para o desmatamento na região. Já foram eliminados cerca de 680 mil quilômetros de florestas na região que corresponde à superfície da França, e a média anual dos últimos sete anos é da ordem de mais de 20 mil quilômetros quadrados. A perda de biodiversidade é a principal conseqüência do desflorestamento na Amazônia e é, também, totalmente irreversível. É possível evitar a erosão dos solos e recuperar corpos d'água e a ciclagem de nutrientes utilizando
A cada ano dezenas de espécies novas são encontradas na Amazônia e outras registradas em novos locais, por exemplo, este jovem de Ozotoceros bezoarticus, (veado campeiro) foi registrado a primeira vez na Ilha do Marajó no Pará. Isto mostra o quanto à biodiversidade da Amazônia ainda é pouco conhecida
A pressão humana pelos recursos da Amazônia tem levado a ameaça da sua rica biodiversidade. Nesta foto vemos um exemplar de Tamanduá mambira (Tamandua tetradactyla), uma espécie, ameaçada pelo fogo anual nos campos de cerrado da Ilha do Marajó, Pará.
sistemas ecológicos simplificados, contudo é impossível trazer de volta espécies extintas (Vieira et al. 2005). O Museu Goeldi em parceria com a Conservação Internacional (CI - Brasil) no Projeto Biota Pará, tem desenvolvido um banco de dados de espécies da flora e da fauna consideradas sob ameaça de extinção no estado do Pará e conta com a participação da Secretaria de Ciência, Tecnologia e Meio Ambiente do Estado do Pará (SECTAM) (http://www.sectam.pa.gov.br/especiesameacad as/). A Lista de Espécies Ameaçadas é um instrumento de definição das prioridades estaduais de conservação da fauna e flora, bem como dos diferentes tipos de ambientes e regiões do estado. O grande desafio para a conservação da biodiversidade é buscar o máximo de conhecimento sobre seus ecossistemas, objetivando a elaboração de propostas que visem à conservação da biodiversidade da Amazônia e o Museu Goeldi está empenhado em executar este desafio a 140 anos.
Bibliografia citada e consultada CI do Brasil (Conservação International do Brasil) 2005. Disponível em http://www.conservation.org.br/programas/ (acessado em Janeiro de de 2006).
“Quando eu era pequeno, tinha muita mata, tinha muita caça, tinha muita fruta. O rio lá de casa, era grande muito fundo, hoje não dá nem pra nadar, a água chega em baixo do joelho. Lá em casa tem pouca fruta, pouco peixe e pouca caça. O clima mudou muito, já estou velho e não sei como vai ser pros meus netos daqui pra frente” Seu José, Seringueiro do Amazonas no Seringal Porongaba no estado do Acre Leandro V. Ferreira*, Ima C. G. Vieira, Nilson G. Junior, Samuel S. de Almeida, Marlúcia M. Martins, Alexandre Aleixo, Dário D. Amaral, Amílcar Mendes, Joice B. Santos e Magalli Henriques. A região Amazônica é rica em espécies endêmicas, caracterizadas por ocorrem em locais restritos. Nesta foto um pesquisador do Museu Goeldi mostra ao Repórter da Rede Globo, uma nova espécie de bromélia (da família do abacaxi) encontrada no Parque Nacional da Serra da Cutia em Rondônia
Da Silva, J.M.C.; Rylands A.B. & Da Fonseca, G.A.B. 2005. Megadiversidade. Volume 1, N o 1: 124-131pp INPE (Instituto Nacional de Pesquisas Espaciais). 2004. Monitoramento da floresta Amazônica brasileira por satélite: Projeto Prodes. INPE, São José dos Campos, São Paulo. Disponível em http://www.obt.inpe.br/prodes/index.html (acessado em Janeiro de 2006). MPEG (Museu Paraense Emílio Goeldi) 2005. Programa de Biodiversidade da Amazônia. Disponível em http://www.museugoeldi.br/biodiversidade/index.asp (acessado em Janeiro de 2006). Nelson, B.W. & Oliveira, A. A. 1999. Avaliação e Ações prioritárias para a Conservação do bioma Floresta Amazônia. Área Botânica. Ações Prioritárias para a Conservação da Biodiversidade da Amazônia. PROGRAMA NACIONAL DA DIVERSIDADE BIOLÓGICA, PROBIO, MMA. Viera, I.C.G.; Da Silva, J.M.C & Toledo, P.M. 2005. Estratégias para evitar a perda de biodiversidade na Amazônia. ESTUDOS AVANÇADOS 19 (54): 153-162pp. SECTAM (Secretaria de Ciência, Tecnologia e Meio Ambiente do Estado do Pará) 2005. Programa Biota Pará Disponível em http://www.sectam.pa.gov.br/especiesameacadas/ (acessado em Janeiro de 2006).
Agradecimentos A aluna Lívia Rodrigues do Curso de pós-graduação em Botânica da UFPA/UFRA por seus inestimáveis comentários neste manuscrito e os pesquisadores e instituições que gentilmente cederam suas fotos para ilustrar este manuscrito. *Maiores contatos: Museu Paraense Emílio Goeldi Av. Perimetral 1901 Bairro Terra Firme, Belém, Pará, CEP: 66077-530 Tel/fax: 91-3217.6146; celular: 91-8834.6343 e-mail: lvferreira@museu-goeldi.br
41
José Augusto da Silva Cabral, Ph.D.
O papel do CBA no desenvolvimento da Amazônia
O
prédio do Centro de Biotecnologia da Amazônia - CBA foi inaugurado em 2002 e teve a sua instalação iniciada no ano seguinte, sob os auspícios da SUFRAMA, responsável por cerca de 80% dos recursos investidos em sua construção. Através de um projeto estruturante com duração de três anos, a SUFRAMA - Superintendência da Zona Franca de Manaus, com recursos próprios e do MCT - Ministério da Ciência e Tecnologia, estabeleceu um programa de compra de equipamentos e mobiliário por um lado, e da composição do seu corpo técnico pelo outro, ação executada com a interveniência da FAPEAM - Fundação de Amparo a Pesquisa do Estado do Amazonas, órgão vinculado à SECT - Secretaria Estadual de Ciência e Tecnologia. Esse esforço visou estabelecer as condições mínimas de funcionamento do CBA. O CBA foi criado com o objetivo de contribuir para o desenvolvimento regional, gerando emprego e renda a partir da inovação em produtos e processos de espécies vegetais, animais e de microorganismos da biodiversidade amazônica. A fim de tornar isto uma realidade, o CBA se propõe a interagir com a iniciativa privada, assim como com as 42
estrutura química de compostos orgânicos derivados do metabolismo de plantas e de animais. Esse serviço suprirá tanto a demanda interna quanto a externa, eliminando a necessidade do envio de amostras para análise no sul do país. A coordenação de Farmacologia e Biotério é um outro pilar importante, já que a utilização de espécies da biodiversidade para uso em fitoterápicos ou fitocosméticos, necessita de comprovação prévia de sua eficácia e segurança, conforme os preceitos da ANVISA Agência Nacional de Vigilância Sanitária. A coordenação de Química de Produtos Naturais e Cultura de Tecidos Vegetais fará o instituições de pesquisa e ensino regionais e do país e, eventualmente do exterior. Busca estabelecer na região parques tecnológicos que privilegiem os produtos da biodiversidade amazônica, fortalecendo, dessa maneira, suas cadeias produtivas com uma maior agregação de valores, remuneração justa pelos serviços e melhoria das condições de vida dos produtores primários. Hoje o CBA conta com cerca de oitenta pesquisadores e técnicos, distribuídos em oito coordenações, as quais se encontram em estágios variados de implementação. Cerca de
50% dos equipamentos já foram adquiridos e o restante está em processo de licitação. A Central Analítica, um dos mais importantes núcleos de análises, já está em pleno funcionamento. Através dessa coordenação o CBA oferece serviços espectroscópicos de ultravioleta, infravermelho, massas, ressonância magnética nuclear de próton e de carbono13, entre outros núcleos, os quais favorecem a determinação da
43
isolamento e a purificação dos ativos vegetais ou animais e se encarregará da propagação através de cultura de tecidos das espécies vegetais cuja propagação natural seja problemática. Do ponto de vista tecnológico,
os derivados de plantas, animais e microorganismos, para serem utilizados pelas indústrias farmacêuticas e de cosméticos, precisam estar na forma de extratos, isto é, serem manipulados de tal forma que permita a análise e a caracterização de seus vários constituintes. Para suprir as coordenações acima descritas com os extratos de interesse, conta-se com uma
44
Central de Produção de Extratos e que tem a seu cargo a Planta de Processos Industriais para, ainda que em escala piloto, permita fazer um “scale-up” do processamento que traduza a transferência de tecnologia do “laboratório para a indústria”. O CBA já é detentor de autorização, por parte do CGEN - Conselho do Patrimônio Genético do Ministério do Meio Ambiente, para coleta de material genético em toda a Amazônia Legal. Estão sendo organizadas ainda a coordenação de Microbiologia e Fermentação e a coordenação de Bioquímica e Biologia C e l u l a r, u m a p a r a trabalhar com microorganismos e a outra com engenharia genética. Fazem parte do arcabouço técnico do CBA a Área de Negócios que está estruturada com a Incubadora de Empresas de Base Tecnológica, o Núcleo de Projetos e o Núcleo de Informações em Biotecnologia. Neste momento o CBA está funcionando como um Projeto da SUFRAMA, mas espera-se que até o final deste ano de 2006, alcance a sua autonomia para poder cumprir sua missão de “promover o desenvolvimento e a comercialização de tecnologias e o incentivo
às atividades industriais, baseadas na exploração sustentável da biodiversidade, em particular da Amazônia”. Assim, atendendo a demanda das empresas farmacêuticas e de cosméticos que se utilizam de elementos da biodiversidade amazônica, seja prestando serviços ou dividindo despesas e royalties, o CBA vai ajudar a desenvolver a Amazônia de uma forma mais racional, sem agressões ao meio ambiente e procurando, com a maior agregação de valor na região, permitindo a remuneração mais justa do produtor e fornecedor desses materiais. Nesse sentido, dois projetos foram aprovados pela FINEP - Financiadora de Estudos e Projetos, para serem desenvolvidos ainda este ano, envolvendo uma empresa regional e uma empresa nacional. O CBA tem sido consultado por várias outras empresas quanto à possibilidade de desenvolvimento de projetos biotecnológicos. Também, dois paises amazônicos, isto é, países que também possuem uma parte da Amazônia 45
Continental, demonstraram interesse em firmar tratados de cooperação com o CBA, indicação promissora de seu futuro como líder internacional no aproveitamento sustentável dos recursos genéticos da Amazônia. Por fim o CBA veio para participar ativamente no desenvolvimento da Amazônia transformando em negócios os produtos isolados de sua mega biodiversidade. (*) O autor é Líder da Coordenação de Química de Produtos Naturais e Cultura de Tecidos Vegetais do Centro de Biotecnologia da Amazônia - CBA
Virgílio M. Viana
A Estratégia de Conservação da Biodiversidade no Amazonas Galo da Serra
A
conservação da biodiversidade é um componente estratégico do Programa Zona Franca Verde (ZFV) do Governo do Estado do Amazonas. O ZFV representa a decodificação do ideário da sustentabilidade consagrado na Rio-92, ao contexto socioambiental da Amazônia Brasileira. Nossa missão é promover a conservação da natureza e a melhoria da qualidade de vida de nossa população do interior. Para formular nossa estratégia de conservação da biodiversidade utilizamos processos participativos, que incluíram reuniões, audiências públicas, oficinas e conferências estaduais de meio ambiente, das populações tradicionais e dos povos indígenas. Nestes eventos discutimos tanto as ações relacionadas com a proteção ambiental quanto ao uso sustentável da biodiversidade. No que diz respeito ao uso da biodiversidade, em
dezenas de eventos, fizemos duas perguntas essenciais: quais eram os gargalos das cadeias produtivas florestais e pesqueiras e quais eram as soluções para a sua superação. No que diz respeito à proteção da biodiversidade fizemos duas perguntas fundamentais: quais eram as áreas que deveriam ser transformadas em unidades de conservação ou terras indígenas, e quais eram as ações prioritárias para promover a sustentabilidade destas áreas. Ao combinarmos a participação de lideranças de movimentos sociais com técnicos e pesquisadores promovemos a complementação do saber tradicional pelo conhecimento científico. Ao incluirmos empresários de pequeno, médio e grande porte no processo, conseguimos delinear estratégias para o fomento aos negócios sustentáveis. O resultado desses processos participativos é a Estratégia Estadual de Conservação da 46
Tucumã
Redução do desmatamento é essencial para conter mudanças climáticas e lógicamente preservar a biodiversidade
Biodiversidade (www.sds.am.gov.br). A implementação desta estratégia produziu resultados importantes. Aumentamos as unidades de conservação estaduais em mais de 100%, com a criação de mais de 8,4 milhões de hectares de
Buruti (Miriti)
novas áreas protegidas. Estamos tirando as nossas unidades de conservação do papel e investindo, apenas em 2006, mais de R$ 20 milhões de reais para atividades de gestão, fiscalização e apoio ao uso sustentável da biodiversidade nestas áreas. Conseguimos reduzir o desmatamento em 39% em 2004 e 31% em 2005. Fizemos uma verdadeira revolução no manejo florestal de pequena escala, viabilizando a produção de madeira por nossas comunidades ribeirinhas, com um choque de desburocratização e bom senso. Outro tanto poderia ser dito quanto à produção de óleo de andiroba, buriti, copaíba, manejo de pirarucu, mel de abelha sem ferrão etc. O Governo do Amazonas tem assumido uma posição pró ativa no debate de políticas internacionais Pirarucu ao sol
relacionadas com mudanças climáticas, conservação da biodiversidade e sustentabilidade. Estamos certos de que o crescente papel dos estados na gestão ambiental brasileira é um fato novo e que contribui de forma decisiva para o alcance de metas globais e a formulação de políticas nacionais eficazes. Só com o fortalecimento do papel dos estados e a regionalização dos instrumentos de políticas públicas conseguiremos continuar vencendo a batalha a favor da conservação da biodiversidade na Amazônia.
(*)Virgílio M. Viana, 45, Ph.D. Pela Universidade de Havard é Secretário de Meio Ambiente e Desenvolvimento Sustentável do Estado do Amazonas
Marcus Barros
A hora e a vez da
A
queda de 31% na taxa do desmatamento na Amazônia, de agosto de 2004 a julho de 2005, em comparação com igual período anterior, anunciada pela ministra Marina Silva, mereceu registro discreto da mídia. Ok. Como se diz, se o pessimista é um decadente, o otimista não passa de um superficial. Seria caso de estourar champanhe, isto sim, se o manejo sustentável no Brasil fosse um traço cultural. Contudo, é justo reconhecer o êxito até aqui do Plano de Prevenção e Combate ao Desmatamento, posto em curso pelo Governo Federal em 2004, e que até o momento priorizou o monitoramento e fiscalização, além do reordenamento fundiário e territorial.
Amazônia Os resultados falam por si Por meio de satélite, cujo método de aferição foi aprimorado para oferecer maior precisão, o Inpe registrou a redução da atividade predatória (de 27.200 km2 para 18.900 Km2). Se esta taxa ainda supera a média dos anos 90, se não tivéssemos agido, seria hoje de 35 mil km2 desmatados. Felizmente, este pesadelo não se confirmou. A realidade mostrou uma queda significativa que não ocorria a mais de nove anos. Vale dizer que conseguimos reverter outro processo histórico, que foi reduzir em 31% a taxa do desmatamento anual num momento em que a economia cresceu nos últimos três anos em média 3,5%, ao contrário do que entre 2001 e 2002, em que o desmatamento cresceu 27%, com a
48
economia em franco declínio. A taxa atual mostra que, além de conter o avanço da extração ilegal, pela primeira vez em nove anos o abate retrocedeu. Foram 8.300 km2 a menos, uma área equivalente a mais de um terço de Sergipe. Poupamos das motosserras 207.050 mil metros cúbicos de madeira em tora, apreendemos outros 271 mil m3, economizamos R$ 463 milhões. Desde 2003, foram apreendidos 582 mil m3 de madeira; o Ibama lavrou R$ 1,8 bilhão em multas e 271 pessoas foram detidas (63 servidores públicos e 178 empresários madeireiros, despachantes e contadores). Cortamos na própria carne, prendendo servidores do Ibama envolvidos. O governo confiscou 26 tratores, 54 caminhões e 459 motosserras. Ao mesmo tempo, o recadastramento de imóveis rurais inibiu 30.500 certificados de propriedades irregulares “doadas” pela União. Criamos novas Áreas de Limitação Administrativa Provisória, inclusive em torno da BR-163
(Rodovia Cuiabá-Santarém), onde está suspensa, em 8,2 milhões de hectares, qualquer nova ocupação e atividade que implique em desmatamentos. Criamos 8 milhões de hectares em Unidades de Conservação, homologamos mais de 9 milhões de hectares de terras indígenas (não em plácidas zonas tranqüilas, como em governos passados), mas sim em áreas de conflito social e agrário, enfrentando grileiros e arcando com os todos os
desdobramentos dessa postura. O governo deu resposta firme aos conflitos, restabelecendo a ordem no campo e reduzindo significativamente a grilagem de terras públicas na Amazônia, sempre com apoio vigilante da imprensa. Em 64 operações de baixo custo e longa duração, como Caipora, Uiraçu e Picapau, contamos com 580 homens do Ibama, além de efetivos humanos e logísticos importantes da Polícia Federal, do Exército, da Polícia Rodoviária Federal e da participação sempre pronta das Polícias Militares Estaduais. Entramos na mata em março e só saímos em novembro. Outros fatores contribuíram, como a decisão de quintuplicar o valor das multas por corte de madeira em reservas legais, hoje de R$ 5 mil por hectare ou fração, e investimentos na infra-
VIAGENS E TURISMO
Brasil
Transportes Aéreos
AIR C AR A ÏBES L E S
Í L E S
E N T R E
A I L E S
estrutura das Bases Operativas - postos avançados na floresta amazônica, totalizando 15 Bases em funcionamento. Nesse rumo, foram decisivos os aperfeiçoamentos na captação de imagens por satélites. Até 2004 a metodologia incluía imagens de março a agosto (período com muita interferência de nuvens). Agora, não. Ao concentrarmos a medição nos meses de julho e agosto (com céu limpo), as imagens refletem o quadro com fidelidade, sem necessidade de “compensações" como margem de segurança estimativa. As imagens passaram a ser captadas e fornecidas em prazo menor, a cada 15 ou 10 dias. Ou seja, ilude-se quem pensa escapar a este bigbrother da floresta. O trabalho, claro, ainda exige muitas outras ações. Além de canalizar recursos suficientes para a fiscalização (inclusive para formação de fiscais ambientais), o orçamento na área ambiental deve ser proporcional àqueles destinados às obras de infra-estrutura e produção, de modo que estas sejam sustentáveis. Para manter de pé cada quilômetro quadrado de floresta, gasta-se hoje R$ 485. Os dividendos dependem ainda da mobilização do parlamento para tornar mais rigorosas as sanções judiciais.
Ao contrário do que alguns pensam, a jovem legislação brasileira na área (Lei de Crimes Ambientais, nº 9.605, de 1998) é até branda. Ao considerar “dano ambiental” como crime e não só contravenção, a Lei avançou. Contudo, ainda impera o sentimento de impunidade. O que merece quem derruba 10 mil campos de futebol de floresta que demorou 500 anos para crescer? O País precisa aprimorar a legislação, pois sua eficácia perde fôlego. Um dos pontos é a demora da cobrança de multas. Entre a autuação e o pagamento da multa transcorrem em média três anos e meio, o que “incentiva” o delito. Hoje, infratores embutem nos custos de produção o valor da multa, amortizando-o ao longo de uma década. Pior: mesmo se fosse pago integralmente (a lei permite que se pague 10%), o valor das
multas é insignificante diante dos lucros do comércio ilegal de madeira. A multa, por exemplo, poderia passar a ser paga em 30% no momento do flagrante, e ser questionada pelo infrator posteriormente na Justiça. Enquanto a lei continuar considerando crime ambiental como de “baixo poder ofensivo” (poupando o infrator inclusive da cadeia), permanecerá a insistência na devastação, frustrando fiscais e policiais, que passam a descrer de seu trabalho. É preciso, por extensão, unificar procedimentos legais regionais, para evitar
interpretações absurdas, como multar um habitante da floresta que usufrua da natureza para subsistência. É o bom senso. No entanto, isto precisa ficar claro na lei. Vale dizer que o Ibama não deseja fomentar uma indústria da multa. Tanto que a Instrução Normativa 9 dá direito ao infrator de solicitar a conversão do pagamento em espécie por ações de reparação. Não se quer transformar a Amazônia num viveiro global. Por outro lado, não podemos substituir o potencial econômico da floresta, sobretudo o patrimônio genético, por pés de alface, assim como não podemos preencher o manancial de água potável com lágrimas. O único caminho é um modelo de exploração sustentável da região, sob pena de danos econômicos e sociais irreparáveis e conseqüências geopolíticas
50
imprevisíveis. Num país do tamanho do Brasil, por ora, o preço da liberdade (leia-se desenvolvimento sustentável) é a eterna vigilância. (*) Marcus Barros é médico e é Presidente do Ibama
O desafio de produzir petróleo em plena floresta amazônica A
Petrobras vem atuando na floresta amazônica desde sua criação, há 51 anos. Sua trajetória vitoriosa resultou na descoberta de gás na província do Juruá em 1978, no município de Carauari, e de óleo e gás na província do Urucu em 1986, no município de Coari. Foi nesse cenário, considerado um santuário ecológico, que a Companhia construiu a Base de Operações Geólogo Pedro de Moura - BOGPM, batizada com esse nome em homenagem a um dos pioneiros na busca de petróleo na Amazônia, onde desenvolve atividades de exploração e produção de petróleo e gás natural, com avançada tecnologia em conformidade com padrões internacionais de gestão, propiciando produtos de qualidade, a preservação ambiental, a segurança e a saúde da força de trabalho e Vista área de Urucu o bem-estar das comunidades. Localizada a 650 quilômetros de Manaus, a de alta qualidade, sendo o mais leve dentre os BOGPM é parte integrante da Unidade de óleos produzidos no Brasil. Essas características Negócio de Exploração e Produção da Bacia do resultam em seu aproveitamento especialmente Solimões - UN-BSOL. Engloba mais de 60 poços para a produção de combustíveis mais nobres, produtores, distribuídos em três campos, tais como a gasolina, o gás liquefeito de petróleo denominados de Rio Urucu (RUC), Leste do GLP (gás de cozinha), a nafta petroquímica e o Urucu (LUC) e Sudoeste do Urucu (SUC). A óleo diesel. produção média de petróleo em Urucu é de 55 Em Urucu, existem 740 quilômetros de dutos mil barris por dia, enquanto a de gás natural é de (600 terrestres e 140 submersos) que ligam os 10 milhões de metros cúbicos por dia. Esses poços até o Pólo Arara, onde é efetuado o volumes fazem do Amazonas o terceiro maior processamento do petróleo - para colocá-lo produtor nacional e do município de Coari o dentro das especificações requeridas pelos maior produtor terrestre. O petróleo de Urucu é clientes - e do gás natural - para a produção de
52
GLP (gás de cozinha). Acompanhados de um rigoroso controle de qualidade, o petróleo e o GLP seguem por dutos por 285 quilômetros até o Terminal Solimões, próximo da cidade de Coari, de onde são embarcados em navios petroleiros (para óleo) e butaneiros ou propaneiros (para gás). O óleo é processado principalmente na Refinaria Isaac Sabbá, a maior cliente da Província de Urucu, instalada em Manaus. O GLP abastece os estados do Amazonas, Acre, Rondônia, Amapá, Pará, Maranhão, Tocantins, Piauí e parte do Ceará. A BOGPM contempla ainda uma infra-estrutura formada por aeroporto, portos, estradas, alojamentos, refeitórios, escolas, áreas de lazer e esporte e telecomunicações, fornecendo qualidade de vida adequada para seus quase dois mil trabalhadores. Urucu é auto-suficiente em energia, utilizando como principal fonte energética o gás natural, um combustível que não deixa resíduos e não se acumula no ambiente. O gás natural é retirado juntamente com o petróleo dos poços, sendo usado para abastecer as usinas
Produção de gás no coração do Amazonas
53
termelétricas locais que movimentam a área industrial do Pólo Arara, os alojamentos e iluminação das vias. Os carros utilizados em Urucu são abastecidos com gás natural veicular e diesel produzido no próprio local, num prelúdio do que poderá acontecer em toda a Amazônia, quando essa fonte
de energia barata e limpa chegar aos centros consumidores. O controle dos riscos inerentes às atividades desempenhadas é garantido pelo conhecimento dos mesmos por meio de análises técnicas periódicas, que contemplam todos os processos, sejam administrativos, sejam operacionais. Ações mitigadoras são então elaboradas e implementadas para manter os riscos sob controle. Para maior garantia de segurança e controle das operações, dentre outras medidas preventivas, os dutos são protegidos contra corrosão e as instalações são automatizadas e monitoradas continuamente. Dessa forma, as condições de vazão, pressão e temperatura são controladas automaticamente e mantidas dentro de parâmetros ideais. Mas os operadores também podem intervir, atuando à distância com rapidez e segurança. Há planos de contingência para
promover respostas rápidas e eficazes no tratamento de emergências. Um dos principais compromissos ambientais da Companhia é a regeneração das áreas de atuação. Para tanto são mantidos convênios com universidades e entidades de pesquisa para o desenvolvimento de métodos de regeneração induzida e/ou de instalação e incremento de regeneração natural. Um viveiro, com aproximadamente 86 mil mudas de 60 espécies nativas da região, abastece os projetos de regeneração. É composto pela coleta e tratamento de sementes obtidas em sítios previamente delimitados, conforme programação definida de forma a não exauri-los. Também é mantido um orquidário que constitui um banco de espécies vivas, as quais são descritas e catalogadas, gerando um importante acervo de informações para pesquisas e estudos. Atualmente, é composto por mais de mil mudas de 80 espécies, algumas das quais descobertas e encontradas somente em Urucu. São parceiras da Petrobras neste empreendimento: o Instituto Nacional de Pesquisas da Amazônia - INPA, a Universidade do Estado do Amazonas - UEA, a Universidade Federal do Amazonas - UFAM, o Museu Paraense Emilio Goeldi - MPEG, a Universidade Federal do Pará - UFPA, a Universidade Federal Rural da Amazônia - UFRA e a Empresa Brasileira de Pesquisa Agropecuária EMBRAPA. Na BOGPM, o controle de endemias permitiu a
Alunos do Projeto Escola Esperança
erradicação da malária, por meio de ações integradas - controle de larvas, termonebulização, etc. - afastando riscos de doenças comuns na região. A atuação da Petrobras em Urucu significa a geração de 2.400 empregos diretos, além de movimentar a economia dos municípios vizinhos e do Estado, incentivando o comércio, os transportes e os serviços. Há uma forte atuação no desenvolvimento dos fornecedores de produtos e serviços, propiciando-lhes o aumento da competitividade. A força de trabalho dispõe da Escola Esperança, que funciona lá mesmo em Urucu, oferecendo
formação educacional que vai desde a alfabetização até o ensino fundamental. O objetivo é melhorar a capacitação da força de trabalho e promover o crescimento pessoal e a inserção social por meio da educação, erradicando o analfabetismo. Além disso, são oferecidos programas de ambientação, educação ambiental, cursos técnicos, campanhas educativas, ginástica laboral, reeducação alimentar, assistência social, entre outros benefícios. O trabalho da Petrobras na Amazônia é reconhecido como um exemplo de que é possível produzir no meio da floresta amazônica respeitando os ecossistemas e preservando a segurança e a saúde da força de trabalho e das comunidades. Prova disso são as certificações mantidas desde 1998 nas normas ISO 9001 (gestão da qualidade de produtos), ISO 14001 (gestão ambiental), OHSAS 18001 (gestão de segurança industrial e da saúde ocupacional) e a certificação do Serviço Próprio de Inspeção de Equipamentos - SPIE. Em setembro de 2003, a Unidade tornou a Petrobras a primeira empresa de petróleo do mundo a ser certificada com o seu sistema de Responsabilidade Social baseados na norma SA 8000, que trata da responsabilidade social. Com esforço, dedicação e responsabilidade, a Petrobras mostra que é possível realizar sonhos e superar desafios, como o de produzir petróleo e gás em plena Floresta Amazônica, atuando de forma ambientalmente correta, socialmente justa e economicamente viável. Projeto Peixe-boi
Material orgânico separado para adubo Estufa de Orquidário
54
Tatiana Deane de Abreu Sá
Pesquisa agropecuária na Convenção da Diversidade Biológica
A
participação da Empresa B r a s i l e i r a d e Pe s q u i s a Agropecuária- Embrapa na 8a Conferencia das Partes (conhecida como COP-8)1 da Convenção da Diversidade Biológica (CDB) e na a Reunião das Partes do Protocolo de Cartagena (MOP-3) vai refletir a sua atuação como uma empresa pública de pesquisa agropecuária que nas três últimas décadas vem liderando o processo de construção da agricultura tropical, em um país diverso em várias dimensões, em especial biológica, ecológica e cultural. Para tal, contará com a presença de um contingente de cerca de quarenta pesquisadores e técnicos representando centros de produto, temáticos e ecorregionais que atuam nos temas a serem tratados, e que participarão de várias formas da agenda das duas reuniões e de eventos paralelos, com ênfase no segmento da Embrapa no estande
55
do Ministério da Agricultura, Pecuária e Abastecimento-MAPA. Na MOP - 3, que trata de formas de assegurar um nível adequado de proteção na transferência, manipulação e uso de organismos vivos modificados (OVMs) resultantes da aplicação de técnicas modernas de biotecnologia que possam ter efeitos adversos na conservação e no uso sustentável da diversidade biológica, a participação da Embrapa se dará particularmente na temática de biossegurança, atentando para a realidade do Brasil, que precisa equilibrar a sua posição na condição de exportador de OVM (segundo maior produtor mundial de soja, com exportações para vários países) à sua presença como país possuidor de uma megabiodiversidade, pela qual deve se responsabilizar perante o mundo.
Já na COP - 8, onde se destacam entre os temas a serem discutidos o acesso e repartição dos benefícios do uso da biodiversidade, os direitos das populações tradicionais e as medidas de mitigação para a proteção da biodiversidade nos ambientes naturais e agrícolas, terrestres e aquáticos, é amplo o potencial de participação da Embrapa, atentando para os avanços alcançados pela CDB, que reconheceu a soberania dos países sobre os recursos genéticos, sendo o único tratado internacional que reconhece a importância do conhecimento tradicional dos povos indígenas e comunidades locais na preservação do ambiente e do uso sustentável. Assim, o conjunto de tecnologias, produtos e serviços a serem expostos pela Embrapa no estande do MAPA estará centrado nos temas: Boas Práticas Agrícolas; Gestão Territorial; Uso Sustentável; e Conservação (de recursos naturais e de tradições culturais). A participação de pesquisadores em eventos constantes da programação se dará principalmente em reuniões tratando de: Conhecimento Tradicional; Repartição de Benefícios; Alcance das Metas de 2010; Diversidade Biológica e 56
Floresta; Biodiversidade Agrícola; Biodiversidade de Alimentos e Nutrição; e Espécies Exóticas que Ameaçam Ecossistemas. A participação da Embrapa com o MAPA nestes relevantes eventos será uma boa oportunidade para mostrar o que vem sendo feito na agropecuária brasileira, bastante diversificada em função da complexidade ecológica do país, com crescente consideração na capacidade de suporte dos recursos disponíveis para produção de alimentos, fibras e energia, buscando estabelecer
um novo paradigma para a abordagem do complexo agricultura e conservação, valorização e uso sustentável dos imensos recursos da biodiversidade do país, focando também em questões de natureza econômica, social e cultural relativas aos diversos grupos de interesse. Um exemplo promissor na linha de boas práticas agrícolas a ser exibido, e que vem sendo fomentado pelo MAPA é o da integração lavoura-pecuária (ILP), que tem potencial de adoção em várias regiões do Brasil, que consiste na exploração, na mesma área, de atividades agrícolas e pecuárias, aproveitando as sinergias existentes entre elas, aumentando a eficiência do uso dos recursos naturais de forma sustentável, contribuindo para a melhoria na oferta de serviços ambientais associados a nutrientes, carbono, água e biodiversidade. Em termos regionais, por exemplo, há um conjunto expressivo de boas práticas agrícolas e de opções de uso sustentável de recursos naturais, voltadas à realidade amazônica, onde a Empresa vem atuando com foco em três vertentes: ordenamento, monitoramento e gestão territorial; manejo, valoração e valorização da floresta; e práticas agrícolas sustentáveis para áreas já desmatadas. A participação de um grupo diversificado e representantes da Embrapa em especial na COP-8 também será oportuna para ampliar a troca de
57
experiências e o potencial de parceria com outras instituições em questões na linha de acesso e partição de benefícios, incluindo a repartição dos benefícios entre aqueles que conservam e os que exploram a biodiversidade comercialmente, assuntos que vêm merecendo crescente atenção na Empresa e do MAPA. 1-A COP- 8 acontece de 20 a 31 de março próximo reunindo as delegações representantes das Partes signatárias da Convenção, aprovada em 1992, por ocasião da conhecida RIO-92 e na semana anterior, realiza-se a MOP - 3, que está vinculado à CDB e trata dos movimentos transfronteiriços de organismos vivos geneticamente modificados (OVM).
(*) A autora é Diretora Executiva da Embrapa (com a colaboração dos pesquisadores Maria José Sampaio e José Felipe Ribeiro, na elaboração do artigo)
Rolf Hackbart
Reforma Agrária
e Sustentabilidade Ambiental
A
proteção do meio ambiente, dos recursos naturais e a reforma agrária são ações governamentais interligadas, amparadas na Constituição Federal de 1988, nas leis ordinárias, protocolos, convenções e tratados internacionais. A Agenda 21 (1992), um dos principais documentos assinados na Eco 92, propõe um amplo plano para a implementação do conceito de desenvolvimento sustentável. O capítulo 14 trata mais especificamente do desenvolvimento rural e agrícola sustentável, onde se verifica o propósito de aumentar a produção de alimentos de forma sustentável e incrementar a segurança alimentar, sendo a reforma agrária um dos instrumentos a serem utilizados. A Declaração de Roma sobre a Segurança Alimentar no Plano de Ação da Cúpula Mundial
da Alimentação de 1996 propôs que os Governos, em colaboração com todos os atores da sociedade civil, deverão estabelecer mecanismos jurídicos e de outra índole, quando conveniente, que auxiliem a reforma agrária, que reconheçam e protejam os direitos de propriedade, água e direitos de uso, bem como melhorar o acesso das pessoas pobres e das mulheres aos recursos naturais. Tais mecanismos devem também promover a conservação e a utilização sustentável dos recursos naturais, reduzir os riscos e estimular o investimento. A reforma agrária é instrumento de progresso social da agricultura, é fator determinante do desenvolvimento agrário e, por conseguinte, do desenvolvimento econômico. Assim, a reforma agrária não pode ser considerada como simples distribuição de terras, mas deve estar integrada à educação rural, assistência técnica, crédito rural, pesquisa agropecuária, uso racional e sustentável dos recursos, política de preços, agroindústria e mecanismos de comercialização.
Ações Ambientais na Reforma Agrária O Incra sempre foi visto como órgão fomentador da destruição da floresta primária, visto que não 58
havia um planejamento prévio para seus projetos, implantados a partir de parâmetros abstratos, que não consideravam o potencial e a vulnerabilidade ambiental das áreas obtidas. Sendo taxado, nos últimos anos, pela mídia nacional e pelas
entidades ambientalistas, como um programa de grande impacto ambiental, que promove grandes desmatamentos. O I Plano Nacional de Reforma Agrária, lançado em 1985, previu a necessidade de atender aos anseios dos extrativistas pela legitimação de suas antigas posses e do reconhecimento de seu direito à terra. Em 1987, através da Portaria N° 627, o Incra incorporou a manutenção e o fortalecimento do extrativismo como atividade produtiva, criando o Projeto de Assentamento Extrativista, posteriormente denominado Agro-Extrativista PAE, destinado às populações tradicionais. Em 1997, o Governo Federal criou novas restrições ao desmatamento de florestas nativas na região, por meio da Medida Provisória (MP) 1511-11/1997 e posteriormente a MP-216667/2001, que altera o Código Florestal, elevando a área de Reserva Legal de 50% para 80%, em
propriedades particulares localizadas na Amazônia Legal, onde a cobertura arbórea se constitua de fitofisionomias florestais. Na mesma direção, através da pactuação das Agendas Positivas para a Amazônia Legal com o Ministério do Meio Ambiente MMA, o Ministério do Desenvolvimento Agrário MDA, por meio da Portaria nº 088/1999, proibiu a obtenção de terras e implantação de assentamentos rurais em áreas de cobertura florestal primária, exceto nos casos em que as terras se destinem à criação de Projetos de Assentamentos Extrativistas. Essa mesma regra foi incorporada ao Código Florestal, através Art.37 § 6o da Medida Provisória nº 2.166-67/2001. Ainda com o propósito de inserir a variável ambiental nas suas ações, o Incra, por meio da Portaria 477/2000, cria a modalidade de Projeto de Desenvolvimento Sustentável (PDS), voltado para atender a demanda de terras por populações tradicionais ou não tradicionais, desde que estas assumissem o compromisso de trabalhar a terra utilizando técnicas ecologicamente adequadas. Em 2002, o Ministério do Meio Ambiente - MMA e o Ministério do Desenvolvimento Agrário MDA, através da a Portaria Nº 13, reconheceram as populações tradicionais das Reservas Extrativistas - RESEX, com direito pleno a concessão dos créditos de Instalação e dos recursos do Programa Nacional de Fortalecimento da Agricultura Familiar - PRONAF. Ocorre que apenas a criação de modalidades alternativas de assentamentos não é suficiente. É preciso torná-los viáveis. A viabilidade desses assentamentos depende da otimização dos recursos e potencialidades da floresta, adotandose a melhoria das práticas extrativistas, do manejo florestal de uso múltiplo, do fortalecimento das organizações comunitárias, aperfeiçoamento do sistema de comercialização, assessoria técnica, crédito e implantação de uma infra-estrutura de vias de acesso, além do sistema de saúde e educação locais.
Iniciativas para incorporar o uso sustentável dos recursos naturais à Reforma Agrária No Programa Nacional de Florestas - PNF (MMA, 2003), a região amazônica é responsável por 75% da produção para a indústria de processamento mecânico de madeira, ofertando 90% da produção de madeira nativa do País, onde apenas 5% se originam do que se denomina “bom manejo”. Assim, para incorporar terras ao Programa de Reforma Agrária sem que isto se traduzisse em pressão sobre a floresta, atendendo à demanda de terras existente na região, a qual nem sempre vêm de populações tradicionais, o Incra, através da PORTARIA/INCRA/Nº 1.141/2003, criou o Projeto de Assentamento Florestal (PAF). Os PAF representam a adoção do Manejo Florestal Comunitário como atividade produtiva básica de assentamentos rurais, destinados à áreas com aptidão para o manejo florestal de uso múltiplo e à recomposição de áreas significativas já convertidas para outras atividades produtivas, pelo enriquecimento e adensamento florestal e
Soluções Abrangentes em Informática
reflorestamento. !As iniciativas atuais para incorporar com maior intensidade a concepção de uso sustentável dos recursos naturais no processo de Reforma Agrária são: !Recuperação e qualificação dos assentamentos existentes nos aspectos econômicos, sociais e ambientais. !Incentivo ao manejo da vegetação nativa existente e da reserva legal, que a partir de 2001 passou a ser de no mínimo 80% da área do assentamento. !Incentivo à implantação de projetos de assentamentos com reserva legal em bloco, de modo a facilitar e empoderar as atividades de manejo florestal. !Capacitação de técnicos do Incra, das prestadoras de Assessoria Técnica e Social e dos assentados do reforma agrária, nas atividades de Manejo Florestal de Uso Múltiplo e Agroecologia. !Regularização do licenciamento, recuperação e conservação de áreas degradadas e das áreas de preservação permanente e reserva legal nos projetos de assentamento implantados. !Combate à grilagem e reversão de terras públicas irregularmente ocupadas para projetos de assentamento sustentáveis.
essa renda era de cerca de R$ 1.900,00. Projeto de Assentamento Dirigido Pedro PeixotoAcre - manejo florestal em área de reserva legal individual desenvolvido pela Embrapa/CPAF-AC, onde apesar de já terem sido desmatados 50% dos lotes envolvidos, o rendimento anual familiar na reserva legal de cerca de 40 ha, tem sido superior às demais atividades na formação da renda bruta familiar. O modelo é uma alternativa de manejo florestal em pequena escala para colonos e seringueiros, visando ao aumento da qualidade de vida nestas comunidades e a conservação das áreas de reserva legal. Projeto Reca - Rondônia - Implantação de Sistemas Agroflorestais com espécies nativas o que proporcionou a recomposição das áreas desflorestadas e renda média anual de R$ 12.000,00 por assentado.
PAE Chico Mendes-Acre - manejo florestal sustentável de madeira certificada, onde se obteve R$ 10.000,00 de renda anual em uma área de 300 hectares (colocação), quando no extrativismo tradicional de castanha e borracha
MODALIDADE Nº de Projeto Área (ha) Nº de Famílias PAE
54
4.997.470,00
12.675
PDS
33
1.132.624,00
6.235
PAF
4
101.353,00
318
RESEX
29
7.246.867,00
26.052
TOTAL
120
13.478.314,00 45.280
Nota: Incluído Mato grosso e Maranhão na sua integralidade
Os dados apresentados demonstram a determinação do governo brasileiro em implantar um programa de reforma agrária que atenda as populações tradicionais e explore de forma sustentável os recursos naturais disponíveis. Enfim, um modelo de desenvolvimento que seja socialmente justo, economicamente viável e ambientalmente correto. *Economista, Presidente do INCRA
ASSENTAMENTOS NA AMAZÔNIA PROJETOS DE ASSENTAMENTOS CRIADOS ATÉ 2006 INDICADOR
BRASIL AMAZÔNIA LEGAL
Área (ha)
53.708,624 46.242,102
Número de Pas
6.887
Famílias Assentadas 608.806
EXPERIÊNCIAS POSITIVAS
PROJETOS ALTERNATIVOS - AMAZÔNIA ATÉ 2006
2.490 37.347,8
Nota: Incluído Mato grosso e Maranhão na sua integralidade
60
Plano Nacional de Recursos Hídricos (PNRH) Para nortear o uso racional da água no Brasil até 2020 e ajudar o país a tornar-se uma grande potência energética
S
egundo o presidente Luiz Inácio Lula da Silva, o cuidados com os recursos hídricos, ao lado de investimentos em energias limpas como o etanol e o biodiesel, transformarão o Brasil no maior fornecedor de energia renovável do Planeta. “É com este horizonte que temos que olhar o papel do novo Plano”. O documento é resultado de dois anos e meio de discussões, com cerca de sete mil pessoas de diversos segmentos da sociedade. A metodologia participativa de criação do Plano foi um dos principais destaques dos discursos na solenidade de lançamento, prestigiada por diversos segmentos de usuários dos recursos hídricos. “Temos aqui representantes da indústria, sociedade civil, comunidades quilombolas e comunidades tradicionais. Pessoas que lidam com a água como fonte de vida, de desenvolvimento e de inclusão social”, destacou a ministra do Meio Ambiente, Marina Silva. Lula também acrescentou que a participação popular é um das principais razões do sucesso do PNRH e um exemplo de como é possível a busca
PNRH
do consenso para crescer e preservar a natureza. O documento foi aprovado em janeiro deste ano pelo Conselho Nacional de Recursos Hídricos (CNRH) e Em quatro volumes: se baseia na divisão 1) Panorama dos Recursos Hídricos do Brasil: 2) Águas para o Futuro # Cenários hidrográfica brasileira para a para 2020; 3) Diretrizes; 4) Programas Nacionais e Metas, o PNRH apresenta as elaboração de diagnósticos e ações e relações interinstitucionais que pactuam diretrizes e políticas públicas definição de metas e para a melhoria das disponibilidades hídricas, superficiais e subterrâneas, em programas de investimentos. qualidade e quantidade; a redução dos conflitos reais e potenciais de uso da água e a mitigação de efeitos de eventos hidrológicos críticos. “O plano estabelece ações nas Com a percepção de se preservar a água como valor sócio-ambiental bacias, definindo as prioridades, relevante, o Plano Nacional de Recursos Hídricos entende os como o programa de capacitação recursos hídricos como elemento fundamental e estratégico no uso da terra e no manejo da água, para a implementação de políticas setoriais, sempre a para que não haja desperdício, de partir do olhar do desenvolvimento forma que a água traga benefícios, e não sustentável e da inclusão social. problemas de erosão, assoreamento e degradação”, explicou o secretário nacional de não fizerem, é porque se trata de algo muito Recursos Hídricos, João Bosco Serra. complexo, e nós deveríamos estar celebrando”, O Brasil, que detém em torno de 12% da reserva disse a ministra, ao ressaltar que o Brasil foi o de água doce do Planeta, é o primeiro da América primeiro país a cumprir uma das Metas do Latina a estabelecer diretrizes e políticas públicas Milênio. O Plano atende a proposta da Agenda da para o uso racional da água. “Se os outros países Cúpula de Joanesburgo (Rio + 10), quando a Organização das Nações Unidas (ONU) determinou que os países construíssem seus planos de gestão até 2005 com o objetivo de, até 2015, reduzir à metade a proporção de pessoas sem acesso à água potável e ao saneamento básico. A falta de saneamento básico, aliás, junto com o uso inadequado da água na agricultura, em especial a irrigada, aparecem no Plano como os principais vetores da degradação dos recursos hídricos segundo afirmou a ministra Marina Silva. 61
José Antônio Alves Gomes
INPA A inserção do
(Instituto Nacional de Pesquisas da Amazônia)
no atual cenário de C,T&I na Amazônia
O
início deste século traz à pauta uma grande expectativa global sobre os caminhos do planeta, incluindo-se aí as perspectivas e ansiedades relacionadas com o meio ambiente e as ações dos diferentes países, dentro das suas respectivas capacidades, para conciliar produção de riquezas e preservação ambiental. O Instituto Nacional de Pesquisas da Amazônia (INPA) é uma unidade de pesquisa do Governo Brasileiro, vinculada ao Ministério da Ciência e Tecnologia (MCT), que se insere contundentemente nesta questão. Recentemente tendo alcançado o marco dos 50 anos de existência (fundado no Governo Vargas, em 1954), o INPA, ao longo dos últimos anos, tem passado por um processo de reavaliação interna e de reorganização, visando estar mais bem preparado para os grandes desafios que se apresentam em relação à Amazônia Brasileira, especialmente no que se refere a atender as demandas da sociedade e produzir subsídios científicos para ações governamentais na região. O INPA possui hoje cerca de 780 funcionários, sendo cerca de 230 pesquisadores ou tecnologistas e, destes, cerca de 140 possuem doutorado e outros
85 são mestres. O programa de pós-graduação da instituição possui aproximadamente 350 alunos inscritos em oito cursos de mestrado e sete de doutorado e, a estes, juntam-se mais cerca de 600 estudantes e bolsistas nos diversos programas de capacitação da instituição, desde o PIBIC júnior até o pós-doutorado. A infra-estrutura física da instituição é considerável, com 42.000 m² de área construída distribuída em três campi (totalizando 38 ha) em Manaus e mais 5 reservas experimentais (31.000 ha).
62
Peixe-boi fêmea (Trichechus inunguis) com o filhote, no tanque do Laboratório de Mamíferos Aquáticos do INPA
Ariranha (Pteronura brasiliensis) no Bosque da Ciência
Duas bases flutuantes e um barco de pesquisa de 33 metros também compõem a estrutura de apoio à pesquisa do instituto. O programa de coleções biológicas do INPA é um dos mais importantes sobre a flora e fauna da Amazônia, e compreende, além das curadorias tradicionais (botânicas e zoológicas), uma importante coleção de microorganismos de importância médica e agro-silvicultural. A união entre pessoal capacitado e estrutura de apoio dá ao INPA um lugar de destaque entre as instituições amazônicas, mas os custos de manutenção desta estrutura e o longo período sem investimentos específicos criaram um passivo de infra-estrutura que só agora começa a ser restaurado. Durante as mais de cinco décadas de existência, sempre houve uma defasagem significativa entre os recursos disponíveis e a grande missão institucional de “desvendar a Amazônia”, por meio da produção do conhecimento científico e pela formação de recursos humanos e, com isso, poder subsidiar políticas públicas. Esta defasagem teve períodos mais ou menos críticos e/ou alentadores, mas é possível perceber sinais que estamos entrando numa fase diferenciada, mais favorável às instituições
amazônicas de ensino e pesquisa. Há um momento conjuntural interessante e favorável, em que as ofertas de verbas e investimentos começam a se estabilizar e é possível que as instituições se planejem tanto no médio como no longo prazo. No entanto, para que possamos dar este salto qualitativo e alcançar um patamar diferenciado, é preciso que o Estado Brasileiro e os Governos invistam, continua e decididamente, no fortalecimento das instituições existentes, ao mesmo tempo em que as tornam mais eficientes. Para mudarmos muitos dos atuais paradigmas, que prejudicam o desempenho das nossas instituições, é fundamental que se faça, literalmente, uma revolução administrativa, capacitando os administradores e profissionalizando a gestão. Também é preciso continuar estimulando a excelência acadêmica, por duas vias
63
principais: pela melhoria da infra-estrutura geral e, especialmente, estruturação de laboratórios adequados, com equipamentos compatíveis com os avanços tecnológicos e, acima de tudo, pela máxima valorização da competência dos cientistas. O Brasil está formando cerca de 8000 doutores a cada ano e a maioria das instituições federais de pesquisa, pelo menos na Amazônia, precisam urgentemente de uma renovação e expansão do seu quadro técnico. Para que instituições como o INPA possam se reoxigenar e ter sua sustentabilidade garantida mais
Boto Vermelho (Inia geoffrensis) em pesquisa do INPA no município de Novo Airão/AM
rapidamente, é necessário um programa emergencial de contratações e de criação de empregos em C&T na Amazônia. A situação atual apresenta um cenário onde um alto percentual do quadro funcional está próximo à aposentadoria e não há um sistema de avaliação de desempenho
eficaz. Isto provoca dois problemas imediatos: sequer e que publicam, em média, 1 trabalho a dificulta enormemente a introdução de novas cada 3 anos ou mais? Talvez uma reavaliação práticas gerenciais e, segundo, inviabiliza um sobre a atual estabilidade funcional e um novo sistema mais correto de premiação da sistema de contratos seja a solução, mas isto é competência. Como lidar com pesquisadores e assunto para outro artigo. tecnologistas que, com mais de 15 anos de Fora estas questões internas, o INPA e outras emprego público, não instituições de ensino e Equipamento para medir radiação orientam um aluno pesquisa da Amazônia solar na Reserva do Cuieiras também precisam lidar com um sistema sóciopolítico e econômico complexo, no nível regional, nacional e mundial. Recursos hídricos, mercado de carbono, propriedade intelectual e patentes, biodiversidade / bioprospecção / biopirataria, conhecimento tradicional, coleções científicas e livre acesso à informação são alguns dos temas que permeiam o nosso dia-adia. Mistura-se nesta análise fatos como o número de pesquisadores presentes na Amazônia (< 4% dos grupos de pesquisas registrados no CNPq), distribuídos numa área que chega a cerca de 64
Projeto Pequenos Guias no Bosque da Ciência
60% to território Nacional. Após três anos à frente da direção do INPA, estou convicto que, seja qual for o caminho ou a fórmula para se avançar contra estas disparidades nacionais, ela precisa, necessariamente, passar pelo fortalecimento do sistema de C&T local existente. Logicamente também é preciso que se criem novas Universidades, novos institutos de pesquisas na Amazônia, que se multipliquem os mestres e doutores formados, mas isto deve ser feito resgatando-se e valorizando-se o conhecimento já adquirido e disponível. Agregando-se valor às informações coletadas por centenas de pesquisadores, ao longo de décadas de trabalho árduo na região. Na minha opinião, não se pode pensar nem mesmo em duplicar (quem dirá multiplicar por 10) a formação de mestres e doutores (ver o programa “Acelera Amazônia”) sem que se pense e se definam claramente alguns pontos aparentemente banais, mas cruciais como: aonde os novos alunos vão sentar, quem vai dar aulas (os nossos já super ocupados pesquisadores/professores? - note que esta jornada dupla de pesquisa e ensino não é reconhecida em termos salariais), quais laboratórios estes alunos vão usar, quem paga o Alunos de escolas públicas visitando exemplares da coleção de mamíferos na biblioteca do INPA
transporte para as coletas, ou quem financia a pesquisa. Ou seja, é preciso uma iniciativa articulada para a Amazônia, uma iniciativa que intensifique a interlocução entre os diversos ministérios, e que interrompa a situação esdrúxula de, por exemplo, o Ministério dos Transportes abrir estradas sem discutir com o ministério da Saúde, que por sua vez pouco se articula com o de Integração Nacional que, por sua vez, não interage com o de Ciência e Tecnologia. Outro exemplo: a questão da soja no cerrado e na Amazônia. Ministério do Meio Ambiente e Ministério da Agricultura não falam a mesma língua e resta a dúvida se o MCT poderia auxiliar nesta questão. Outros exemplos desta natureza são inúmeros e revelam, infelizmente, a histórica falta de uma política de Estado para a Amazônia. Mas também é preciso reconhecer que, se a situação está longe da ideal, nós avançamos muito nos últimos anos. Hoje há, de fato, mais verbas para C&T na Amazônia, já se identifica algumas tentativas concretas de articulações inter-ministeriais, o MCT começa a 65
Pesquisa com peixe no Laboratório de Tecnologia de Alimentos
Jorge Rebelo, pesquisador do INPA, fazendo o curtimento da pele do pescado
Pesquisas Renato Archer), que, entre outras coisas, permitirá um acompanhamento completo, por qualquer funcionário, dos processos de compra e de contratações, permitindo uma transparência completa nos processos internos e, conseqüentemente uma eficiência muito maior. Já conseguimos controlar quase em tempo real os gastos com telefone, correio, cópias e transporte, gerando economias de dezenas de milhares de reais por mês, que podem ser direcionadas para a pesquisa. Na busca de melhores condições de trabalhos, entre 2002 e 2006 compramos mais de 400 computadores, e consolidamos o compartilhamento de impressoras em rede, também diminuindo custos. Graças a ações como estas, neste ano estamos aumentando em 20% as verbas para os pesquisadores e para as Coordenações de Pesquisa. Para 2006, fora as verbas extra-orçamentárias para a pesquisa, o INPA já conta com cerca de R$ 18 milhões para serem investidos somente em infra-estrutura, captados junto à FINEP e FAPEAM. Estes recursos permitirão a criação de novos centros acadêmicos para a pós-graduação, uma melhoria geral nas reservas experimentais e no barco de pesquisas do INPA, no tratamento de efluentes dos nossos laboratórios, na rede de saneamento do instituto, um novo biotério de padrão internacional, novas instalações para o setor de informática e para gerenciamento de projetos, investimento nas coleções científicas e em vários laboratórios de diversos grupos de pesquisas. Na pós-graduação consolidamos 02 novos cursos, iniciamos um programa institucional de pós-doutorado, nenhum de nossos alunos carece de bolsa de estudos e a cada ano o número de inscrições para o programa de pós-graduação do INPA bate novo recorde. Na impossibilidade de mencionar todos os avanços no espaço desta, acho que vale a metáfora de comparar o INPA a um “jato 747” pronto para “decolar”. Chegar neste ponto foi resultado de um trabalho árduo e de muito esforço por parte de uma equipe altamente competente e dedicada. Cabe-nos torcer para que este jato realmente decole e mantenha esta trajetória de consolidar o INPA como um dos maiores, senão o maior, instituto de Biologia Tropical do planeta. (*) O autor é Doutor em Biologia Marinha Pelo Scripps Intitution of Oceanography, Diretor do INPA
67
A ndré Fernando Baniwa
Experiência da OIBI:
Desenvolvimento Local Sustentado das Comunidades Indígenas Baniwa no Alto Rio Negro
O
IBI é uma Organização Indígena da Bacia do Içana, representa 16 comunidades do povo Baniwa pertencente a família lingüística Arawak no noroeste Amazônico, um dos complexo cultural de 22 povos indígenas do Rio Negro. A OIBI foi fundada em 1992 com sede na comunidade Tucumã Rupitá (Komalhipani) para somar a força da luta pelo direito da terra, saúde, educação escolar indígena e desenvolver alternativas econômicas. O Povo Baniwa vive espalhado no Brasil, na Colômbia e Venezuela. No total são mais de 12 mil pessoas e 4 mil moram no Brasil na linha de fronteira com esses paises vizinhos Colômbia e Venezuela. Na década de 80 as comunidades indígenas, povos indígenas do Rio Negro foram invadidos por empresas mineradoras e garimpeiros. O governo Federal demarcou as terras indígenas em formas de ilha deixando as comunidades indígenas em áreas improdutivas e fora das terras originais deixados e demarcados pelo criador e conquistador
(midzakanai) do direito para futura geração (walimanai). As comunidades indígenas e povos desta região reagiram contra essa ação arrancando marcos e devolvendo todas à FUNAI de São Gabriel d Cachoeira. A FOIRN - Federação das Organizações Indígenas do Rio Negro nasceu para lutar pela demarcação de terra contígua em 1887, um ano antes da nova constituição do país que inclui um capitulo específico dos direitos indígenas, uma conquista, e somente dez anos depois em 1997/8, conseguiu demarcação e homologação das 5 terras indígenas no Rio Negro junto com uma rede de associações de base (60) filiadas a ela. Durante vários anos de trabalho a OIBI têm prestado atenção nos discursos, informações que chegam que justificam a não demarcação mais rápida da terra reivindicada, por exemplo: é muita terra para pouco índio, (bem atual no governo de 68
hoje); para que muita terra se os índios não trabalham e não desenvolvem um trabalho que ajude o Brasil progredir? A reação que tivemos contra todas isso é com projetos Baniwa desenvolvidos junto com seus parceiros mostrando ao Brasil o contrário disso, vejam as experiências:
Medicina Tradicional Baniwa
Em 1996 a OIBI iniciou um trabalho junto com suas comunidades um trabalho chamado medicina tradicional para mostrar ao Brasil que nós temos esse conhecimento. Tomamos essa iniciativa porque na época não tinha presença nenhuma de governos nas comunidades, há não
retalhar suas terras. Esse projeto não teve mais continuidade no ano de 2001 por falta de financiamento. Foi premiado na Gestão Pública e Cidadania em 1998 programa da Fundação Getúlio Vargas, Fundação Ford com apoio do BNDES. Mas a questão é: porque precisa de um projeto, se já não é do Povo? Porque com a chegada dos colonizadores desvalorizaram nossa medicina dizendo que era do diabo (religiosos). Porque nesta época estava se começando organizar serviço de saúde através de agentes indígenas de saúde nas comunidades que passaram valorizar demais medicamentos alopáticos. Isso ameaçava desaparecimento 69
definitivo do conhecimento da medicina própria do povo Baniwa. Por isso precisávamos de um projeto para valorizar e organizar este conhecimento que estava adormecido. Além de que nós temos natureza que nos fornece plantas e junto com a nossa ciência milenar usá-los para nos proteger da doença, nos curar e nos recuperar assim como a sociedade envolvente. Com esse projeto conseguimos recuperar histórias, fazer levantamento de doenças, quantas plantas cultivadas medicinal nas roças e nas matas. Além de procedimentos que foram repassadas pelos mais idosos para agente indígena de saúde porque estes passariam cuidar da saúde da comunidade. Ao mesmo tempo estudar para entender sistema único de saúde e saúde indígena no Brasil. O projeto também mostrou que nós temos dois grandes blocos de doença depois da colonização: doenças tradicionais que tratamos com medicina
tradicional; doenças dos colonizadores que não conhecemos por isso nos matam sem pena por que não sabemos nos proteger contra isso, cura é diferente e recuperação. Nós temos plantas cultivadas, da mata que curam doenças de vários tipos e grau de intensidade da doença. Mostrou também que há doenças dos brancos conhecidas pela história de nossa origem que é o caso de tuberculose e tem tratamento com “keeripa” dzodali na mata e outra planta pequena (erva) da mata e outros como tratamento de veneno dos insetos e cobras venenosas, por exemplo, de jararaca. Isto é prevenção, cura e recuperação com dietas são possíveis não sofrer amputação de perna ou outra parte qualquer do corpo como faz medicina ocidental. E outros como para controle de reprodução que os brancos chamam de planejamento familiar. Com plantas não 70
precisa fazer cirurgia para nascimento de crianças e nem para parar de ter filhos.
Cosmética Baniwa
São plantas diversas como perfumes, shampoo, sabão que os Baniwa também possuem. São plantas que serve para embelezamento do homem e da mulher, para não envelhecer rápido, para não ficar com cabelo branco muito jovem, que culturalmente se diz em Baniwa “maitakadalimiwa” que se pode traduzir “pessoa que não cumpriu ou seguiu orientações de regras Baniwa”. São plantas ornamentais para durante a festa de “Podali” e perfumes também. Para lavar roupa e fortificar cabelos de mulheres e outros grupos de plantas de atrair sexo oposto “moonotsi”. No trabalho autônomo se levantou mais 30 plantas diferentes com essas funções que tem histórias, procedimentos e uso tradicional.
Arte Baniwa Arte Baniwa é um projeto implementado desde 1999. Foi lançado a nível nacional, Abril de 2000 na cidade de São Paulo. A OIBI vende produtos
Arte Baniwa nos centros de grandes cidades do Sudeste, São Paulo através da rede de Loja Tok&Stok. Arte Baniwa hoje é uma marca e já ganhou vários prêmios importantes como: Banco Mundial da Cidadania, Brasília, 2002; Gestão Pública e Cidadania da Fundação Getúlio Vargas, Fundação Ford com apoio do BNDES, Rio de Janeiro, 2001; Prêmio Chico Mendes, MMA, 2001; Mensão Honrosa de Mobilização de Recurso, Ashoka/mackinsey, 2001. Arte em Baniwa significa conhecimentos da vida para sobreviver transmitido na forma oral e na prática de geração para geração, pelos pais em casa, no trabalho e em treinamento exclusivo para homens e mulheres em jejum conhecido como formação e transformação indispensável da adolescência (menino e menina para homem e mulher) pronto para formar a família e enfrentar a vida no mundo. Arte Baniwa entre outras coisas podemos dizer que é Biotecnologia Baniwa que compreende vários ramos de atividades hoje, a Cestaria de Arumã, Produção Sustentável de Pimenta e outros em planejamento. A marca de produtos é a Arte Baniwa que está em processo de registro no Instituto de Propriedade de Intelectual com objetivo de proteger sua marca e garantia da qualidade de seus produtos. Os produtos Arte Baniwa carregam consigo conhecimento milenar com princípio de desenvolvimento com sistema de manejo socioambiental, proteção de conhecimentos tradicionais coletivos e conservação da Biodiversidade. O projeto trás benefícios tanto cultural, ambiental e econômico para Povo Baniwa. Ou seja, além de gerar renda para comunidades: A) Recicla uma tradição milenar; Fruto de manejo agroflorestal sustentável; B) Contribui para proteger a biodiversidade; C) Interface com a escola indígena Pamáali; D) Gera renda para os produtores e suas comunidades; E) Fortalece a associação indígena que gerencia o processo, e; D) Bom negócio. Atualmente beneficia 229 artesãos diretamente, e mais de 2000 pessoas. 160 mil de reais de dinheiro já entrou nas comunidades.
estação de laboratório de reprodução alevinos, viveiros berçários, viveiro de engorda, além fazer manejo e monitoramento das produtividades baseadas na alimentação dos peixes em toda fase de cria, acompanhamento no crescimento dos alevinos através da biometria e observação gerais sobre o comportamento dos peixes. Mais de 300 mil alevinos na primeira experiência. Os alunos se manifestaram satisfeitos com resultado e comunidades também. Além disso, se desenvolve atividades do Sistema Agroflorestal, Meliponicultura e Gestão Ambiental.
Escola Baniwa
É uma estratégia onde todos os projetos das comunidades são incluídos fortalecendo conhecimento tradicional. O objetivo desta escola é formar pessoa Baniwa um verdadeiro cidadão intercultural capaz de criar atividades que beneficie sua comunidade e ao mesmo tempo defendendo-a. Um exemplo de atividade é a Piscicultura que responde duas perguntas. É possível criar peixe nativo? É possível evitar escassez de peixe na região? Foi instalada uma 71
Segurança Alimentar Projeto Manejo de Recurso Pesqueiro na Bacia do Içana, pesquisa para retomada das histórias da pesca e manejo tradicional da prática da pesca Baniwa mostra que os conhecimentos e métodos tradicionais são adequados para manejo de pesca nos lagos e rios. Pois para cada grupo de peixe temos plantas cultivadas para pega-lo com facilidade, sem espantar peixes e pegar somente peixes grandes e assim também com caça. Esse sistema nosso que foi quebrado com a
Conclusões
colonização. Mas hoje estamos resgatando isso e garantindo proteção da floresta, conservação e uso sustentável de seus recursos como é de costume dos índios historicamente.
Parcerias
As histórias que contamos aqui, são frutos de várias parcerias com a FOIRN (Federação das Organizações Indígenas do Rio Negro), ISA (Instituto Socioambiental), UFAM (Universidade Federal do Amazonas), INPA (Instituto Nacional de Pesquisa da Amazônia), SEMEC (Secretaria Municipal de Educação do Município de São Gabriel da cachoeira), ASHOKA/ Empreendedorismo Social e outros que apóiam nossos projetos pontualmente. Isso mostra nossa capacidade de articular, mobilizar, negociar, renegociar, planejar, executar, desenvolver e direcionar um trabalho que beneficie diretamente nossas comunidades que moram nas margens de rios.
A vida na terra é sempre um sistema. Assim vida indígena é um sistema diferente e adequado para com a floresta. Ela é uma ciência e diferente. Conhecimento indígena não pode ser considerado como de conhecimento público, não se pode dizer que não precisa de regras para ser acessada. Pois nenhum cientista vai publicar resultado da sua pesquisa sem antes ser protegida. Esse conhecimento precisa ter uma proteção especial e deve ser muito valorizada. Assim como o processo de consentimento prévio e informado deve continuar e repartição de benefício garantida que deve ser entendida como para conservação da Diversidade Biológica nas terras indígenas ou da Amazônia. Deve ter regras para punir ladrões deste conhecimento e para aqueles que já roubaram que precisam restituir em valor monetário para beneficiar o povo conhecedor de uma prática que foi transformada pela tecnologia para o mercado. Seria bom também obrigar estados restituir aos povos indígenas através de um mecanismo ideal pelo desprezo, aniquilamento secular dos conhecimentos, ciência, suicídios culturais e outros. Pois estados nacionais são responsáveis
72
A diretoria da FOIRN (E-D) Erivaldo Pira-Tapuya, André Fernando Baniwa, Domingos Tukano, Élio Pira-Tapuya e Renato Tukano
por todo de conseqüência negativa que os povos indígenas passam hoje. As leis devem incluir participação indígena significativa nos espaços de discussão e decisão sobre recursos genéticos e conhecimento tradicional. Por exemplo, 40% dos povos indígenas diferentes do Brasil devem estar como conselheiros no Conselho Nacional de Patrimônio Genético. Os representantes dos estados de 186 países reunidas neste COP-8, aqui em Curitiba, março de 2006, devem escutar, ouvir e colocar em prática o que os representantes próprios indígenas falam sobre conhecimentos ancestrais de seus povos. Nosso amigo André Fernando Baniwa, Vice-presidente da FOIRN
Luis E. Aragón PROBLEMÁTICA DO USO DA ÁGUA NA AMAZÔNIA
UMA QUESTÃO DE ACESSO do rio Orinoco na Venezuela. Essas características poderiam levar à conclusão apressada de que problemas relacionados à água não deveriam existir na Amazônia. Este é precisamente o problema: associar a problemática da água somente à escassez, à seca, negligenciando o relacionado com o acesso ao recurso. Com o aumento do desmatamento ou substituição da vegetação, o incremento da população e urbanização, a construção de estradas, barragens e infra-estrutura, a expansão da agricultura mecanizada e agropecuária, a exploração de petróleo e a mineração e o fracasso de inúmeros planos de desenvolvimento, as perturbações dos ecossistemas amazônicos têm se intensificado em nível local afetando a biodiversidade, os micro climas e a qualidade dos recursos hídricos3. A demanda por água tende a aumentar no planeta, tornando-a ainda mais valorizada economicamente. Nesse cenário aquelas regiões e países com grandes reservas de água doce apresentam vantagens extraordinárias e deverão
A
água é um dos mais escassos e mal distribuídos recursos naturais: 97,5% da água existente na Terra é salgada e somente 1% é água doce facilmente utilizável, e desta, a Amazônia concentra pelo menos 15%; enquanto que existem extensas áreas no mundo com severas limitações de água. Se medidas urgentes não forem tomadas, 2/3 da humanidade terão escassez de água até o ano de 2025. A escassez relativa e a distribuição desigual no globo têm transformado a água num lucrativo bem econômico. Associadas a esse fenômeno, as enormes disparidades sociais, econômicas e regionais na maioria dos países em desenvolvimento têm restringido o direito universal de acesso a água para todos, proclamado pelas Nações Unidas1. Mas é a água realmente o “ouro azul” de nossos tempos com valor estratégico similar ao do petróleo no século XX, e pode ser mercantilizada em termos semelhantes? O frágil ecossistema amazônico é regulado pela abundância de água e seu ciclo hidrológico; alterações deste ciclo afetarão toda a vida da região com sérias implicações em outras partes da América do Sul e outros continentes. A extensão da Amazônia é de aproximadamente 8 milhões de km2 e se estima uma população de 28 milhões de pessoas vivendo na Região, incluindo cerca de 1 milhão de indígenas. Oito países e um departamento francês compartilham a Região: Bolívia, Brasil, Colômbia, Equador, Guiana,
Guiana Francesa, Peru, Suriname e Venezuela. A maioria da população vive hoje em áreas urbanas2. O sistema fluvial Amazonas-SolimõesUcayalli representa o rio mais extenso do mundo, com 6.671 quilômetros e a bacia contém mais de 1.000 rios. A descarga de água no oceano Atlântico é estimada em cerca de 300 mil metros cúbicos por segundo e a de sedimentos em 1 bilhão de toneladas por ano, os quais se dispersam ao longo da costa alcançando o delta 74
jogar um importante papel na geopolítica da água4. Por outro lado, o debate continua no sentido de ver se esse recurso tão raro e vital como é a água doce pode ser tratado como um bem público que pertence à humanidade, ou se deve ser sujeita às regras do mercado. Qual é o limite entre ética e economia? Conforme o Índice de Desenvolvimento Humano 5 , os países amazônicos estão posicionados entre o número 67 (Suriname) e 114
(Bolívia); o acesso à água potável varia de 80% da população no Peru a 94% na Guiana e o acesso à serviços sanitários de 93% no Suriname a 70% na Bolívia. Essas cifras referem-se principalmente às áreas urbanas, mas elas escondem importantes diferenças regionais. No Brasil, por exemplo, segundo o censo de 2000, somente 63,5% dos domicílios localizados nas áreas urbanas da região Norte tinham água encanada e somente 46,7% tinham instalações sanitárias de qualquer tipo; nas áreas rurais esses serviços eram ainda mais escassos ou mesmo inexistentes. Na realidade, os países amazônicos estão entre aqueles com maior disponibilidade de água no mundo. Numa escala de 180 países e territórios elaborada pelas Nações Unidas, que vai de uma disponibilidade de 10.767.857 m3 de água doce por pessoa por ano na Groenlândia (primeira posição) e de 1.563.168 m3 no Alaska (segunda posição) até uma disponibilidade de 10 m3 no Kuwait (última posição), os países amazônicos estão entre os primeiros 33, variando de 316.689 m3 na Guiana e 34.161 m3 no Equador (sem 3 contar a Guiana Francesa com 812.121 m )6. Essas cifras permitem reforçar a questão do acesso a água doce em relação a sua disponibilidade. Alguns países com severa escassez (menos de
1.000 m3/pessoa/ano) apresentam percentagens maiores ou similares de acesso à água e serviços sanitários que os países amazônicos, entre os quais se destacam a Arábia Saudita com uma disponibilidade de 118 m3 e acesso de 100% da população à fonte melhorada de água e 95% a serviço sanitário melhorado; a Jordânia com uma disponibilidade de 179 m3 e acesso de 96% da população à água e 99% a serviço sanitário; o Egito com uma disponibilidade de 859 m3 e um acesso de 97% da população à água e 98% a serviço sanitário; para mencionar somente alguns. Fica evidente, portanto, como Becker7 aponta, que a problemática do uso da água na Amazônia é diferente da problemática do uso desse recurso em nível global ou inclusive nacional. Enquanto os problemas globais são basicamente caracterizados pela escassez ou pouca disponibilidade e grande aumento do consumo, na Amazônia os problemas relacionam-se ao paradoxo da abundância da água com reduzido acesso da população, devido principalmente à frágil rede de distribuição e má
qualidade dos serviços. Nesse sentido, são urgentes medidas para atender problemas específicos nessa Região como a dispersão de doenças de origem hídrica; as enchentes; o transporte; o saneamento; as secas ocasionais extremamente prolongadas; e o melhoramento da qualidade da água para consumo humano. E finalmente, como lidar com o processo de privatização da água para consumo doméstico numa Região com enorme quantidade de água como a Amazônia? (*) O autor é Ph.D em Geografia. Professor/Pesquisador do Núcleo de Altos Estudos Amazônicos da Universidade Federal do Pará (NAEA). 1. Costa, Wanderley Messias. Valorizar a água da Amazônia: Uma estratégia de inserção nacional e internacional. In Aragón, Luis E. e Clüsener-Godt, Miguel (Orgs.) Problemática do uso local e global da água da Amazônia. Belém: UNESCO/NAEA, 2003, p. 299-320. 2. Aragón, Luis E. Até onde vai a Amazônia e qual é a sua população? In Aragón, Luis E. (Org.) Populações da PanAmazônia. Belém: NAEA, 2005, p. 13-23. 3. Souza, José Ricardo Santos; Rocha, Edson José Paulion; Cohen, Júlia Clarinda Paiva. Avaliação dos impactos antropogênicos no ciclo da água na Amazônia. In Aragón, Luis E. e Clüsener-Godt, Miguel (Orgs.), op. cit., p. 69-94. 4. Becker, Bertha. Inserção da Amazônia na geopolítica da água: In Aragón, Luis E. e Clüsener-Godt, Miguel (Orgs.), op.cit., p. 273-298. 5. United Nations Development Programme. Human Development Report-2004. New York: UNDP, 2004. 6. United Nations. Water for people, water for life: World water development report. Paris: UNESCO, 2003.
Ronaldo Rogério de Freitas Mourão
Júlio Verne e a Amazônia
O
que poderia justificar que sete anos depois da publicação do Chancellor1 (1874) Jules Verne tenha retornado as águas amazonenses? Neste primeiro romance, numa jangada construída com partes do navio Chancellor, onze homens e mulheres visitaram as águas do rio Amazonas, em total miséria. No completo desespero de náufragos, sem água para beber, preparavam-se para sacrificar um dos sobreviventes a fim de servir de alimento para os demais, quando um dos náufragos caiu no mar. Ao mergulhar bebeu alguns goles de água, descobrindo que se tratava de água doce. Os náufragos são recolhidos ao alcançarem a Ilha de Marajó. O romance La jangada - huit cents lieues sur l'Amazone (A jangada, oitocentas léguas pelo Amazonas, 1881)2, é o primeiro de três romances de Júlio Verne consagrados exclusivamente ao curso de rios3. Ao contrário do que ocorreu no Chancellor, a trajetória da jangada se dá no sentido oposto: a embarcação construída numa pequena aldeia desce o Amazonas.
A jangada é o relato de uma viagem realizada pela família de um próspero fazendeiro que habitava Iquito até Belém. O romance tem um duplo objetivo. O primeiro - anunciado para todos os membros da família -, era o casamento de Minha, a filha de João Garral, com um colega de estudos do irmão dela; o segundo era a solução de um problema jurídico de natureza criminal. Na realidade, o pai João tinha as suas razões secretas: mesmo correndo o risco de uma execução, desejava obter a revisão de uma sentença que o tinha condenado injustamente à morte pelo roubo de diamantes, 26 anos antes. Na época em que foi acusado, Garral trabalhava nas minas imperiais do Brasil em Vila Rica (hoje Ouro Preto), sob o nome verdadeiro João da Costa. Depois de haver conseguido escapar à perseguição das autoridades brasileiras, atravessou as fronteiras peruanas. Foi morar em Iquito, onde fez fortuna graças à sua capacidade empreendedora. De onde partiu para recuperar a sua inocência, depois de mais de um quarto de século. Uma vez que o objetivo anunciado era um projeto familiar, Garral imaginou um meio de transporte que o permitisse deslocar-se com toda a família. Com esta finalidade decidiu pela construção de uma enorme jangada, na verdade, uma gigantesca aldeia flutuante, capaz de conduzir todos os membros de sua fazenda pelo rio abaixo até Belém.
A escolha da
Amazônia
A razão pela qual o escritor Jules Verne - o criador do romance geográfico - retornou à Amazônia está, sem dúvida, associada a seu interesse de estudar, sob o ponto de vista geográfico, todas as regiões do globo terrestre, em especial aquelas que, por serem pouco exploradas, possuíam um belo aspecto misterioso capaz de atrair não só a sua admiração, mas principalmente a dos seus leitores. Aliás, seu interesse pelas viagens exploratórias estava associado a sua devoção pela natureza, em particular características exóticas que envolviam a floresta amazônica, assim como a liberdade que dominava a vida nessas regiões longe da civilização. O longo período de sete anos, que decorreu entre 76
os romances Le Chancellor (1874) e La jangada - huit cents lieues sur l'Amazone (1881), deve estar associado ao seu grande interesse em concluir a sua pesquisa sobre Amazônia, o grande personagem do romance La jangada, onde o
drama e a desaventura do brasileiro João da Costa que, com 22 anos na cidade de Vila Rica, hoje Ouro Preto, em Minas Gerais, foi acusado de furto, foi o motivo ou recurso pedagógico usado por Verne para tornar mais atraente o seu romance, cujo objetivo principal era descrever e questionar alguns problemas geográficos relativos à Floresta Amazônica. Com efeito, as referências ao rio Amazonas e a floresta são sempre de admiração.
Os viajantes, as fontes bibliográficas de Júlio Verne Aliás, toda essa visão sobre esse imenso território que despertou o interesse dos viajantes estrangeiros que desde o século XVI estiveram explorado e relacionado à riqueza da região: O próprio Júlio Verne relacionou os nomes destes exploradores e cientistas que estiveram na Amazônia; através das suas obras, Verne construiu a base científica do seu romance. Na realidade “dezenas e dezenas de aventureiros que exploraram e reviraram a região do ponta a ponta” como muito bem definiu Michel Riaudel, que concluiu, enquanto esperava ser 'beneficiado nessas viagens, O Brasil ambicionava controlar melhor um território sub-povoado enquanto as potências financiadoras esperavam tirar vantagens políticas, econômicas ou comerciais”4. É fácil verificar em Verne5 a visão do mundo dominante na época em que foi escrito o livro. Hoje a riqueza da Amazônia é ambicionada pelos
norte-americanos internacionalizar.
que
a
desejam
Racismo científico As afirmações de racismo são hoje totalmente inaceitáveis, mas no século XIX o mundo intelectual foi influenciado por um escritor e aristocrata francês Joseph Arthur, Conde de Gobineau (1816-1882), um dos fundadores das teorias racistas. Sua obra mais (tristemente) célebre é o ensaio Essai sur l'inégalité des races humaines (1853-1855), no qual, além de descrever as diferentes raças humanas, anunciava o perigo da miscigenação. Aliás, esse ensaio imaginava a existência de “raças puras” no futuro. Mesmo atribuindo a cada uma das raças uma característica própria, Gobineau colocou a “raça” germânica, em particular a Escandinávia, acima das outras. As teorias gobineaunianas, ao mesmo tempo racistas e profundamente antidemocráticas, foram adotadas e defendidas pelos nazistas, que desenvolveram um ódio particular aos judeus. A maior parte das doutrinas racistas que surgiram no fim do século XIX e início do século XX tiveram como base a obra de Gobineau. Na realidade, Jules Verne ao defender a expansão
Júlio Verne
colonizadora que levaria a ciência e tecnologia ao mundo, adotou uma posição moderadamente racista embora fosse um antiescravagista sistemático em toda sua obra. Talvez na sua crença nas promessas trazidas pelo conhecimento científico fizesse acreditar na importância do expansionismo ocidental como uma continuidade do processo surgido no período das luzes, durante o qual se acumularam enormes informações biográficas, botânicas, geológicas e culturais. Esse é o motivo pelo qual o romance prima pela consolidação e expansão da fase imperialista eurocentrista, segundo a qual cabia o homem branco em geral a expansão e o domínio do mundo, em virtude da sua superioridade sobre os não brancos ou selvagens. Na realidade, caberia ao europeu levar e difundir a sua civilização pelo planeta na maior parte habitado por selvagens. Nesta época, os índios e os negros eram apresentados em geral como seres subservientes que aceitavam docilmente o domínio dos brancos. Nesta época na Inglaterra, o escritor inglês W. P. 77
Andrew, em sua obra Our scientific frontier (1880), defendia a idéia de “uma cruzada tecnológica britânica”, cuja meta seria expandir entre os selvagens o grande poder e/ou processo civilizatório inglês. O branco europeu constituiria o agente civilizador globalizador. Como quase todos os intelectuais, dessa visão compartilhava indiretamente também Júlio Verne quando afirmava: A guerra, como se sabe, foi durante muito tempo o mais seguro e rápido veículo de civilização. Com efeito, essa visão ideológica - a inferioridade do negro e do índio - foi adotada como uma verdade científica e permaneceu aceita pela maioria dos homens de ciência, haja vista a própria defesa do escravagismo temperado pelo astrônomo francês Emmanuel Liais, na época diretor do Imperial Observatório do Rio de Janeiro (hoje Observatório Nacional): Embora acreditasse na inferioridade do negro, ao contrário dos seus contemporâneos, Liais observou que não existia diferença intelectual os mulatos e os brancos:
aceitando as idéias da época, Verne adotou uma visão darwiniana, através da qual justificava o desaparecimento de todos os povos nãoeuropeus, como sugeriu no texto. É a lei do progresso. Os índios hão de desaparecer. Diante da raça anglo-saxã, australianos e tasmanianos desapareceram. Diante dos conquistadores do Extremo Oeste extinguiram-se os índios da América do Norte. Algum dia, provavelmente, os árabes serão dizimados diante da colonização francesa6. Verne viu o progresso de uma maneira positivista, segundo a qual a questão racial era vista em termo de pureza. Era uma visão eurocêntrica, que aceitava como sendo um processo normal a aniquilação dos índios da Amazônia, assim como não aceitava a idéia de que os mestiços conseguissem sobreviver.
L'enchantement des yeux! -
Megabiodiversidade
Ao lado desta visão preconceituosa encontramos as mais belas e porque não dizer poéticas descrições sobre a natureza amazônica: Esta profunda admiração pela extraordinária megabiodiversidade é talvez um dos pontos mais objetivos da obra de Verne.
“Il faudrait tout respecter !"-
Uma lição de ecologia
Diante do entusiasmo de Minha com referência à beleza e à riqueza da floresta amazônica, ela proíbe o irmão de usar o fuzil como caçador. Neste trecho do romance, encontramos uma das mais belas conceituações relativas aos princípios do que seria a ecologia, disciplina científica que teve somente o grande desenvolvimento na segunda metade do século XX. Era a extraordinária perspicácia de Verne em antever os princípios do equilíbrio ecológico, justificando, sem dúvida, a admiração que cerca o trabalho antecipação do escritor francês: 78
A globalização A intensificação da miscigenação, ao longo do tempo, inicialmente circunscrita às regiões bem delimitadas, como no caso das povoações amazônicas, mostrou que as previsões dos seguidores das doutrinas racistas estavam totalmente equivocadas. Com a globalização, a miscigenação não se limita a determinadas regiões: ela hoje, além de mais ampla, é também cultural. A própria obra de Júlio Verne, em virtude da sua preocupação com a geografia - não se deve esquecer que Verne foi membro da Société de Géographie de Paris -, defendeu uma integração, ou melhor, uma globalização cultural e racial (talvez se vivesse atualmente seria contra a globalização econômica). No romance A volta ao mundo em oitenta dias (1872), Júlio Verne ao fazer Fogg7, em sua viagem ao redor do mundo partir de Londres e
retornar à mesma cidade, além de chamar atenção para a questão do paradoxo dos circunavegadores, assumiu indiretamente uma posição a favor de Greenwich como o futuro meridiano zero, como seria adotado, em 1884, em Washington, EUA. Com relação ao paradoxo, Verne sempre reconheceu ter sido influenciando pela leitura do conto Três domingos numa semana de Edgar Allan Poe; no entanto, esta idéia teve origem no século XVI, durante as grandes descobertas marítimas. Todavia, os romances relativos a viagem da Terra a Lua: De la Terra à la Lune (1864) e Autour de la Lune (1869) constituem a grande tomada de posição em relação ao futuro. Apesar das suas considerações de natureza ecológica, em La jangada (1881), refletirem a idéia predominante da época, este romance constitui um valioso retrato do que iria ocorrer no século XX na Amazônia. Nestes quatro romances, como em toda sua obra, Júlio Verne, além de assumir uma visão globalizante, deu uma dimensão humanística e favorável à ciência e às suas aplicações tecnológicas jamais conseguidas por outro divulgador até os dias de hoje. Num estudo comparativo dos textos, de Júlio Verne, sobre sua preocupação com a exatidão científica a respeito das construções pelo viés do estudo dos conhecimentos de sua época, mostrar que Verne os ultrapassou pelo aspecto visionário, o que é comprovado pela evolução dos conhecimentos que validam várias de suas antecipações quanto ao futuro, em terrenos tão diferentes como a Terra em suas profundidades, sua vasta extensão ou seu espaço imediato. Mas, Júlio Verne fazia só ficção científica, pois a dimensão humana está sempre associada às suas preocupações científicas. (*) Ronaldo Rogério de Freitas Mourão é Astrônomo e Escritor 1-Publicado sob a forma de folhetim no Le Temps, 17 dez. 1874; editado por Hetzel em 24 jan. 1875 e reeditado pela
79
LGF, “Le Livre de Poche” nº 2058, 1968. 2-Publicado sob a forma de folhetim no Magasin d'Education et de Récreation, 1er janv. 1er déc. 1881; editado por Hetzel,1881 e reeditado pela LGF, “Le Livre de Poche” nº 2058, 1968. 3-Os outros dois romances são: Le Superbe Orénoque (1898) e Le Pilote du Danube (1908). 4-Riaudel, Michel. Posfácio in A Jangada, Planeta, 2003, São Paulo, p. 354-370. 5-Verne,Jules. A Jangada, edição Planeta, 2003, São Paulo, p.58-59 6-Verne,Jules. A Jangada, edição Planeta, 2003, São Paulo, p.60. 7-Phileas Fogg foi inspirado nas primeiras voltas ao mundo de um certo William Percy Fogg em 1869-1871, ou George Francis Train em 1870.
Bibliographie critique Dekiss, Jean-Paul. Jules Verne, un humain planétaire, Textuel, Paris. Verne, Jules. De la Terre à la Lune Hetzel, 1865, Paris. Verne, Jules. Autour de la Lune. Hetzel, 1870, Paris. Verne. Jules. Le Tour du monde et quatre-vingts jours, Hetzel, 1872, Paris. Verne, Jules. La Jangada, Hetzel, 1881, Paris. Riaudel, Michel. Posfácio in A Jangada, edição Planeta, 2003, São Paulo, p. 354-370. Serres, Michel. Jouvences sur Jules Verne, éditions de Minuit, 1974, Paris. Jules Verne la science et l'homme contemporain, Ed. Le Pommier, 2003, Paris. Serres, Michel et Dekiss, Jean-Paul. Entretiens, 2002, Paris. Soriano, Marc., Julliard, 1978, Paris.
SAPO VERDE
A vacina do sapo kambô A
sabedoria dos povos indígenas do Acre tem sido usada por falsos terapeutas para atrair interessados em curas milagrosas e terem lucros financeiros. O alerta é dos próprios índios. Os líderes da comunidade Yawanawa, recentemente denunciaram o uso indevido das substâncias retirada da barriga da rã Phyllomedusa bicolor, conhecida popularmente como vacina do sapo kambô. A secreção é para os povos indígenas do Acre - Yawanawa, Katukina, Ashaninka e Kaxinawa, uma espécie de vacina que lhes protege contra as doenças, as energias negativas, além de rejuvenescer de um modo geral, as suas energias. No entanto, o material é utilizado com cuidados próprios de uma cerimônia milenar. Notícias recentes, principalmente do Sul do país, afirmam que os “terapeutas” estão usando a secreção do sapo kambô, como vacinas, em pessoas, sem o mínimo respeito à tradição dos costumes indígenas, visando o lucro com a venda pela internet e aplicando a mesma, sem nenhum tipo de preparo e nenhuma permissão dos povos indígenas. Há risco até de morte, advertem nossos amigos indígenas.
Kaxinawa Yawanawá Katukina Ashaninka 80
O phyllomedusa bicolor é a maior espécie do gênero da família Hylidae, que ocorre na Amazônia. Podendo ser encontrado em quase todos países amazônicos, como as Guianas, Venezuela, Colômbia, Peru, Bolívia e Brasil. Principalmente no período das chuvas, sob árvores próximas aos igarapés, onde coaxam por toda noite, anunciando chuva no dia seguinte. Mas, é na madrugada, que são "colhidos" a fim de retirarem sua secreção cutânea, para fazer a “ vacina do sapo”. Tomar a vacina do sapo é uma prática antiga com fins medicinais, muito difundida entre os povos indígenas do Brasil e do Peru. A finalidade mais procurada é “tirar a panema”, ou seja, afastar a má sorte na caça e com as mulheres. Existem variações nos rituais e nomes dados ao sapo verde. Na história antiga dos Kaxinawá, o sapo kampu,era o chefe do “nixi pëi”. Já os Katukina, nunca o matam, pois dizem que poderão ser picados por cobra, pois seu veneno é retirado do sapo kambô. Para os Ashaninka, quando o sapo wapapatsi canta perto da casa, o dono tem que apanhálo, queimar os pulsos e dormir. Bem cedo, tem de preparar um mingau bem forte e bater nas costas do sapo, para ele soltar o veneno que será passado sobre a pele. Entretanto, o remédio somente terá resultado, se o caçador seguir as regras.
O N O B R A C O T I D É CR
O
Protocolo de Kyoto entrou em vigor em fevereiro de 2005. Com ele, passou a funcionar o mecanismo de desenvolvimento limpo (MDL), que possibilita a troca de "permissões para poluir" entre países desenvolvidos e em desenvolvimento, com o objetivo de atingir a meta de redução das emissões de gases de efeito estufa. Esse artifício traz ao debate ambiental a idéia de compensação: em vez de uma empresa na Holanda, por exemplo, gastar grandes somas na reformulação de seu processo produtivo, ela pode investir, no Brasil, em projetos de redução de emissões ou captura de carbono da atmosfera, utilizando o que se convencionou chamar de crédito-carbono. As conseqüências, aqui como no resto do mundo, já se fazem sentir. A principal delas é o aquecimento global: em um século, a temperatura média do planeta sofreu aumento de aproximadamente 1ºC. As projeções do Painel Intergovernamental sobre Mudança Climática
(IPCC), órgão criado pela Organização das Nações Unidas (ONU) para pesquisar as mudanças no clima, indicam que essa média poderá subir ainda mais até o fim deste século, de 1ºC a 4ºC. Pode parecer exagero, mas a elevação de cada grau centígrado tem influência sobre padrões de vento, chuva e comportamento dos oceanos. O grande responsável por esse futuro incerto é a liberação na atmosfera de gás carbônico e de outros causadores de efeito estufa. O Brasil, apesar de não figurar entre os países que devam reduzir suas emissões, pelo Protocolo de Kyoto, está entre os dez maiores emissores de gás carbônico. Do volume total de lançamentos desse gás, 74% advêm do desmatamento por queimadas, outros 23% têm origem no uso de combustíveis fósseis e 3% são contribuições industriais. A expansão da fronteira agrícola rumo ao norte do país, sobretudo devido ao crescimento das plantações de soja e ao avanço da pecuária, já faz
Cidades poderão lucrar com 'gases do lixo’
com que a floresta Amazônica esteja degradada em 14% de sua cobertura original. Segundo dados do Instituto Nacional de Pesquisas Espaciais (Inpe), entre agosto de 2001 e julho de 2002, o Brasil perdeu 23.266 km² de floresta; no período de um ano subseqüente, foram 24.597 km² e, no seguinte (em 2003/04), o instituto registrou 26.130 km² a menos de mata. O próprio governo, impressionado com os últimos números divulgados, tomou providências e, no primeiro semestre deste ano, houve uma contenção significativa das queimadas. O consumo excessivo, presente em nosso modo de vida, exige que se produza cada vez mais. No mundo, as emissões de gases de efeito estufa aumentam ano a ano, acompanhando o incessante crescimento industrial e tecnológico:
Definido pelo Protocolo de Kyoto como uma das ferramentas que possibilitam a redução da emissão dos gases de Efeito Estufa, como o CO², ou seu seqüestro na atmosfera, o MDLMecanismo de Desenvolvimento Limpo se tornou um dos principais focos de atenção dos empresários interessados na economia ambiental brasileira. Segundo dados do Banco Mundial (BIRD), esse mercado está estimado hoje em cerca de US$ 3 bilhões por ano, com potencial de US$ 10 bilhões anuais para os países emergentes nos próximos oito anos.
durante a década de 1990, elas se ampliaram 6% e, apenas nos Estados Unidos, 13%.
Mecanismo de Desenvolvimento Limpo, a moeda do futuro O Brasil abriga um terço dos projetos de MDL do mundo. Já há dois deles funcionando, ambos de aproveitamento do gás metano em aterros sanitários para produção de energia: o Vega Bahia, em Salvador, e o NovaGerar, em Nova Iguaçu (RJ). Se forem aprovados, os 74 projetos existentes irão gerar cerca de 130 milhões de toneladas de carbono equivalente em seu primeiro período de operação - que pode ser de sete ou dez 81
anos. Esse total significa 31% das emissões brasileiras em 1990 (ano-base que definiu os compromissos de Kyoto), dado que está sendo comemorado. Mas, se comparado aos 745 milhões de toneladas de carbono equivalente lançados pelo Brasil apenas em 1994 devido ao avanço da agropecuária sobre as florestas, de acordo com inventário feito pelo governo e divulgado no final de 2004, a massa de gás "economizada" pelo MDL torna-se insignificante. A maioria dos projetos brasileiros está ligada à área energética, pois o país tem tradição no setor, e a técnica de implementação está bem difundida. Outros 21 projetos propõem tratamento de resíduos e aproveitamento do gás metano e apenas um vem da indústria química - sozinho, ele vai gerar 40 milhões de toneladas de carbono equivalente em seu primeiro período. Embora a agricultura esteja fora do Protocolo de Kyoto pelo menos até 2012, as reduções obtidas por empreendimentos dessa área - muitos iniciados inclusive antes da ratificação do acordo - podem ser negociadas, por exemplo, com empresas norte-americanas que cumprem leis
estaduais de contenção das emissões (apesar de os Estados Unidos não terem aderido ao protocolo). Grande parte das propostas se relaciona à aplicação de práticas tradicionais, como o plantio direto, que reduz emissões por não revolver a terra (ver Problemas Brasileiros nº 369). "A contribuição é de aproximadamente 0,5 tonelada de carbono por hectare ao ano", afirma Carlos Eduardo Pelegrino, engenheiro agrônomo e pesquisador do Centro de Energia Nuclear na Agricultura (Cena) da Escola Superior de Agricultura Luiz de Queiroz (Esalq) da USP. Outra iniciativa é, no cultivo do arroz, substituir a espécie tradicional por variações do "arroz de sequeiro", que reduz a necessidade de inundar a plantação (áreas alagadas emitem gás metano, pela decomposição de matéria orgânica). Na atividade pecuária, também já existem propostas, uma vez que o Brasil possui aproximadamente 180 milhões de cabeças de gado. Os estudos visam melhorar a alimentação e capacidade de fiscalização do Instituto Brasileiro mesmo modificar geneticamente o animal, para do Meio Ambiente e dos Recursos Naturais reduzir as emissões de metano (21 vezes mais Renováveis (Ibama) e estruturar órgãos ambientais prejudicial à atmosfera que o gás carbônico). estaduais, vinculando os créditos-carbono a uma "Mesmo que esse ganho seja ação permanente nessa área. pequeno, em grande escala Na essência do processo de fixação de carbono pelas plantas, existe Onde tudo começou a contribuição é impora necessidade de elementos minerais não extraídos do ar. Nas tante", afirma Pelegrino. Idealizado em 1997, o Protocolo de Kyoto só foi florestas tropicais úmidas de terra-firme, as raízes finas superficiais Iniciativas de refloresratificado no final de 2004. Nesse acordo, países têm a função de "caçar" os nutrientes minerais que se disponibilizam tamento também pleiteiam desenvolvidos se comprometeram a reduzir em na liteira pela decomposição da matéria orgânica morta. Alguns créditos-carbono nos pelo menos 5% suas emissões de gases nutrientes têm fase gasosa, como é o caso do N, e seu estudo é bem mercados paralelos. Embora causadores de efeito estufa até 2012, em relação previstas no MDL, elas mais difícil. A compreensão dos mecanismos de transferência, aos níveis de 1990. Em Kyoto criou-se também o ainda não foram regulamecanismo de desenvolvimento limpo (MDL) disponibilidade e consumo dos nutrientes que afetam a capacidade mentadas, pois não têm proposto pela delegação brasileira -, o que de crescimento das plantas é essencial para se explicar um metodologia aprovada. Isso incluiu na pauta de redução de gases os países em crescimento continuado de biomassa. Neste estudo, um cuidadoso se deve à dificuldade de desenvolvimento. desenho experimental para amostrar e medir sistematicamente os medir o carbono absorvido Um projeto de MDL deve obedecer ao critério de ciclos de nutrientes nas fases sólidas, líquidas, biológicas e gasosas pelas árvores em cresacrescentar algo significativo ao que já é feito. vai permitir uma associação com outras informações relativas à cimento, em especial se Assim, se uma usina de açúcar há 15 anos dinâmica do C e da água, com grande potencial para esclarecer o forem de espécies reaproveita o bagaço de cana para gerar energia, funcionamento de uma variedade de processos ecológicos e diferentes. Além disso, se não poderá pleitear créditos por essa prática. O discute a viabilidade do critério é rígido, para evitar que haja má-fé. As fisiológicos. A decomposição da matéria orgânica emite CO2, controle desses empreeniniciativas também têm de se sustentar no longo processos anaeróbicos no solo produzem CH4 e N2O, as plantas e o dimentos, uma vez que o prazo, por dez ou 21 anos (com três períodos de solo emitem VOCs. Qualquer estudo que procure fechar um balanço, governo já enfrenta sete anos). Ao fim de cada período há uma mesmo que aproximado, para o carbono de uma floresta, tem que obstáculos para fiscalizar as espécie de auditoria, feita por um órgão contabilizar os componentes gasosos. Este estudo também prevê o florestas protegidas. Carlos independente autorizado pela ONU, que decide monitoramento da respiração do Rittl propõe que uma parte se o empreendimento realmente está reduzindo solo, e das emissões de outros do dinheiro recebido pelas emissões (ou absorvendo gás) e se pode continuar gases-traço importantes na conta empresas com o MDL seja comercializando os créditos. aplicada na do carbono e de nutrientes. A contenção da pesquisa ainda inclui um estudo específico de árvores leguminosas p r i n c i p a l O MDL e a Floresta Amazônica fonte de fixadoras do N2 atmosférico, a A maior rede hidrográfica, a maior floresta equatorial, a emissões do desconhecida entrada de N B r a s i l , a s maior reserva de plantas medicinais, o abrigo de mineral no sistema e a modelagem queimadas. A aproximadamente 50% da biodiversidade do planeta, são hidrológica e micrometeorológica v e r b a algumas das características desse incrível e único associada ao seqüestro de poderia, por ecossistema. Pronto para faturar com o MDL. carbono. exemplo, reforçar a O que está faltando? 82