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Energia Solar – Aquecedores solares; – Baterias; – Bombas; – Células solares; – Coletores solares; – Inversores; – Painéis fotovoltaicos e suportes; – Placas termosolares.

Ano 11 Número 55 2016

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– Arquitetos; – Autoridades / Formuladores de Políticas Públicas; – Compradores; – Distribuidores; – Empreendedores; – Engenheiros; – Fabricantes e Fornecedores; – Instaladores e Integradores.

Dados da última edição

Ano 11 Nº 55 Março/Abril 2016

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Brasil inaugura projeto inédito de energia solar nas hidrelétricas de Balbina e de Sobradinho

FOTOGRAFIAS Agencia Pará, Aline Lopes/INPA, Ascom Sedeme, Banco Mundial/ Curt Carnemark, Divulgação, Christian Nicolai Bjørke, Dag Terje, Filip Endresen/Nordgen, Divulgação GIFE/Guilherme Tamburus, EPA/ Andrew, Gombert/Agência Lusa, FAO, Gary Kolditz, Lutfi Braihi, Ichiro Guerra/PR, J.T. Reager, ONU Água,Laiana Rios, NASA / JPL, NASA GRACE Satellites, Peder Engstrom; Roberto Stuckert Filho/ PR, Thalappi Pradeep, Tom Gleeson et al, UC, UNPhotos/Manuel Elias, Irvine/NASA/JPL-Caltech, Karyn Ho; Kate Brauman, Kiko Silva FAVOR POR

EDITORAÇÃO ELETRÔNICA Editora Círios SS LTDA DESKTOP Mequias Pinheiro

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Uma nova lei promete facilitar a vida dos profissionais que vivem da pesquisa e dos empresários que comercializam produtos oriundos das plantas e animais da região Amazônica. A aposta é o chamado marco da biodiversidade, como é conhecida a lei 13.123, de 20/05/2015...

ARTICULISTAS/COLABORADORES Ana Gerschenfeld, Celso Freire, Elias Oliveira, Leila Macedo, Mário A. Derses, Flávio Finardi, Gero Rueter, Ronaldo Hühn, Vanderlan da S. Bolzani, Walter Colli

I LE ESTA REV

NOSSA CAPA Escassez de água na Terra. Cerca de 1,1 bilhões de pessoas no mundo não têm acesso à água potável, 2,7 bilhões encontram água escassa para menos de um mês ao ano. Saneamento inadequado também é um problema para 2,4 bilhões de pessoas que estão expostos a doenças, como a cólera e a febre tifoide e outras doenças transmitidas pela água. Dois milhões de pessoas, a maioria crianças, morrem anualmente de doenças diarreicas. Ilustração de Alexander P. Medina

O experimento foi breve, não chegou nem a dois minutos, mas os 102 segundos que durou foram suficientes para transformar uma equipe de cientistas chineses nos autores do “Sol artificial” mais longo que já existiu na Terra...

MAIS CONTEÚDO [14] Poluição ambiental mata quase 7 milhões de pessoas por ano, alerta Pnuma [16] ONG’s alertam para ameaças a rios da Amazônia [18] Marinha lança navio para mapear leitos de rios da Amazônia [20] Terra absorve água e retarda aumento do nível do mar [22] Filtro barato limpa micróbios perigosos e produtos químicos da água potável [25] Mar ajuda a absorver “grande parte do CO2” [28] XX Fórum de Ministros do Meio Ambiente da América Latina e do Caribe [30] Uma década de avanços em biotecnologia [32] Biodiversidade, bioprospecção e inovação no Brasil [34] Centro de Biotecnologia da Amazônia será uma Organização Social [42] Nikolai Vavilov: o primeiro guardião da biodiversidade vegetal [44] O ritmo sazonal da fotossíntese na floresta amazônica

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Cientistas reproduzem a energia do Sol em busca de energia ilimitada via fusão nuclear

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Na Usina Hidrelétrica de Balbina, localizada no município de Presidente Figueiredo, a 107 km de Manaus, no Amazonas, foi lançado o primeiro projeto de exploração de energia solar em lagos de usinas hidrelétricas com uso de flutuadores no mundo...

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ÁGUAS S BIODIV UBTERRÂNEA E S ASSINA RSIDADE DA A DA TERRA TURA D M O ACOR AZÔNIA DO DE P ARIS revistaama

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Biodiversidade da Amazônia: cura e beleza que vêm da floresta

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Ao longo dos anos de seu desenvolvimento passaram muitas empresas que se destacaram no cenário empresarial local e nacional, como a Pronatus do Amazonas, que foi a primeira empresa a realizar o processo de incubação...

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PRODUTOR E EDITOR Ronaldo Gilberto Hühn

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A primeira e maior incubadora do Norte completa 16 anos

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DIRETOR Rodrigo Barbosa Hühn

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O volume total de água armazenada no subsolo do planeta é estimado em 23 milhões de km³. Seria o suficiente para cobrir toda a superfície da Terra com uma camada de 180 metros de profundidade. Essa foi a conclusão de um estudo conduzido por pesquisadores canadenses...

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Estimativa de abastecimento de Águas Subterrâneas da Terra

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Ao abrir a sessão de assinatura do Acordo de Paris, em Nova York, o secretário-geral da ONU, Ban Ki-moon, pediu aos países-membros que acelerem a adoção das novas regras sobre mudanças climáticas a fim de evitar que o mundo entre em um processo perigoso de aquecimento...

EDITORA CÍRIOS

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Assinatura do Acordo de Paris sob a Convenção-Quadro das Nações Unidas sobre Mudança do Clima

PUBLICAÇÃO Período (março/abril) Editora Círios SS LTDA ISSN 1677-7158 CNPJ 03.890.275/0001-36 Rua Timbiras, 1572-A Fone: (91) 3083-0973 Fone/Fax: (91) 3223-0799 Cel: (91) 9985-7000 www.revistaamazonia.com.br E-mail: amazonia@revistaamazonia.com.br CEP: 66033-800 Belém-Pará-Brasil

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Apenas 20% da água residual é tratada, provocando riscos para saúde e biodiversidade O acesso escasso à água e a contaminação desse bem natural geram doenças graves, principalmente na África onde mais de 547 milhões de pessoas carecem de acesso a saneamento básico

Fotos: ONU Água

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m tempos de crise hídrica, uma solução para minimizar a falta de água pode ser sua reciclagem. Mas, apenas 20% da água residual do mundo é atualmente tratada, prejudicando, principalmente, os países de baixa renda. A informação faz parte de um relatório elaborado por várias agências da ONU e divulgado recentemente: http://www.unwater.org/ fileadmin/user_upload/unwater_new/docs/ UN-Water_Analytical_Brief_Wastewater_ Management.pdf O documento, produzido pela Organização Mundial da Saúde (OMS), o Programa da ONU para o Meio Ambiente (PNUMA) e o Programa da ONU para os Assentamentos Humanos (ONU-Habitat), em nome da ONU Água, intitulado Wastewater Management- A UN-Water Analytical Brief (Gestão de Águas Residuais – Uma breve análise da ONU sobre a água), descreve os danos provocados no ecossistema e biodiversidade pela contaminação da água e a falta de tratamento, que prejudicam a saúde, as atividades econômicas e a segurança desse recurso natural. Nos países de baixa renda, esse problema

A gestão da água residual deve ser parte integral do planejamento urbano e da legislação de um país

se agrava, com apenas 8% dos países capazes de tratar as águas residuais. O acesso escasso à água e a contaminação desse bem natural geram doenças graves, que poderiam ser facilmente evitadas, principalmente na África, onde mais de 547 milhões de pessoas carecem de acesso a saneamento básico. Para o diretor executivo do ONU-Habitat, Joan Clos, a gestão da água residual Apenas 8% dos países de baixa renda são capazes de tratar as águas residuais

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deve ser parte integral do planejamento urbano e da legislação de um país e a Conferência sobre Moradia e Desenvolvimento Urbano Sustentável (Habitat III), que acontece em 2016, oferecerá uma oportunidade para tratar esse tema de forma global. Já o chefe do PNUMA, Achim Steiner, ressaltou que cerca de 70% dos resíduos industriais em países em desenvolvimento não são tratados. Uma cifra que se bem administrada pode converter-se em uma oportunidade de conservação e acesso para diferentes setores. “A agricultura consome 70% da extração global de água, mas a irrigação da agricultura com água residual reaproveitada está em alta e é usada para irrigar entre 20 e 45 milhões de hectares em todo o mundo. Isso é apenas uma fração do que é possível, se políticas e tecnologias disponíveis convergirem para assegurar que a água residual e água de qualidade sejam integradas em uma agenda de água mais holística dentro do processo pós-2015”, adicionou. REVISTA AMAZÔNIA

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Assinatura do Acordo de Paris sob a Convenção-Quadro das Nações Unidas sobre Mudança do Clima (UNFCCC) Ban Ki-moon pede agilidade para que novas regras climáticas entrem em vigor Fotos: EPA/Andrew Gombert/Agência Lusa, Ichiro Guerra/PR, Roberto Stuckert Filho/PR

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o abrir a sessão de assinatura do Acordo de Paris, em Nova York, o secretário-geral da ONU, Ban Ki-moon, pediu aos países-membros que acelerem a adoção das novas regras sobre mudanças climáticas a fim de evitar que o mundo entre em um processo perigoso de aquecimento. O evento foi marcado para celebrar o Dia Internacional da Mãe Terra. Em sua mensagem, Ban Ki-moon disse que o Acordo de Paris, em conjunto com Agenda para o Desenvolvimento Sustentável para 2030, tem o poder de transformar o mundo. O Acordo de Paris foi adotado por todos os 196 países que integram a Convenção das Nações Unidas sobre Mudança do Clima (UNFCCC), durante a Conferência de Mudança Climática da ONU, em Paris, em 12 de dezembro de 2015. No acordo, todos os países concordaram em trabalhar não só para limitar o aumento da temperatura global abaixo 2 graus Celsius, como também assumiram o compromisso de tentar reduzir a meta para 1,5 graus Celsius. Ao justificar por que considera importante que cada país aprove com rapidez, em nível doméstico, as novas regras, Ban Ki-moon observou que o mundo registra “recordes de temperaturas globais, de carbono na atmosfera. Estamos em uma corrida contra o tempo “. Depois de enfatizar que está havendo um prolongamento da “era do consumo sem consequências “, ele afirmou que chegou a hora de o mundo “descarbonizar as economias”. O secretário-geral disse que as nações ricas devem apoiar os países em desenvolvimento a fazer essa transição. “Os pobres e mais vulneráveis não devem sofrer ainda mais por um problema que não cria06

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Ban Ki-moon discursa na cerimônia de assinatura do acordo de Paris Discurso na cerimônia de assinatura do Acordo de Paris

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ram “, disse. Ban Ki-moon também falou sobre a necessidade de os países buscarem atingir os objetivos de desenvolvimento sustentável, a partir do Acordo de Paris. “Hoje estamos assinando uma nova aliança com o futuro “. Ele observou que essa aliança deve propiciar às nações “mais do que promessas”, porque implica novas esperanças para a geração atual e para as gerações futuras. “Hoje é um dia para os nossos filhos e netos e todas as gerações vindouras. Juntos, vamos transformar as aspirações de Paris em ação”, disse.

Para o secretário-geral da ONU, com Dilma Rousseff, o acordo pode ajudar a erradicar a pobreza, criar empregos verdes e derrotar a fome

Pobreza e desigualdade

O discurso da presidenta Dilma Rousseff Em seu discurso em Nova York, a presidenta Dilma Rousseff disse que firmar o documento que trata de mudanças climáticas é apenas o começo de um caminho desafiador para países desenvolvidos e em desenvolvimento. O acordo prevê o combate aos efeitos das mudanças climáticas e a redução das emissões de gases de efeito estufa. Dilma assumiu, diante dos chefes de estado e de governo presentes na cerimônia na sede da Organização das Nações Unidas (ONU), o compromisso de assegurar a pronta entrada em vigor do acordo no Brasil. “O caminho que teremos que percorrer Dilma Rousseff discursando na sede da ONU, em Nova York

agora será ainda mais desafiador, transformar nossas ambiciosas aspirações em resultados concretos; realizarmos compromissos que assumimos irá exigir a ação convergente de todos nós, de todos os nossos países e sociedades rumo a uma vida e uma economia menos dependente de combustíveis fósseis, dedicadas e comprometidas com práticas sustentáveis na sua relação com o meio ambiente”, disse Dilma. A presidenta também disse que é fundamental ampliar o financiamento para o combate aos efeitos negativos das mudanças climáticas. “É indispensável criar meios de reorientar os fluxos financeiros internacionais de modo permanente para apoiar ações que representem soluções para o problema global”, disse Dilma. Ela destacou também que é necessário que o setor privado desen-

Acordo de Paris O presidente da França, François Hollande, foi o primeiro chefe de Estado a discursar na sessão, que ocorreu na sede da ONU, no Dia Mundial da Terra. Para entrar em vigor em 2020, o acordo, no entanto, só se concretizará quando for ratificado por 55 nações responsáveis por, pelo menos, 55% das emissões de gases de efeito de estufa. Depois da adoção do texto em Paris, ainda é necessária a assinatura do acordo, até fim de abril de 2017, seguida da ratificação nacional, conforme as regras de cada país, podendo ser por meio de votação no parlamento ou de decreto-lei, por exemplo. revistaamazonia.com.br

volva um esforço robusto na redução das emissões de gases. A presidenta Dilma lembrou que o Brasil traçou metas ousadas sobre o meio ambiente e disse ter orgulho do trabalho desenvolvido por seu governo e pelo país para a construção de Acordo de Paris. Afirmou, ainda, que os efeitos negativos das mudanças ambientais recaem principalmente sobre as populações mais pobres.

“Meu governo traçou metas ambiciosas e ousadas porque sabe que os riscos associados aos efeitos negativos recaem fortemente sobre as populações vulneráveis do nosso país e do mundo quando nós não tomamos medidas corretas para contenção da mudança do clima. Essa preocupação deve ser compartilhada agora e por todos nós. Sem a redução da pobreza e da desigualdade não será possível vencer o combate à mudança do clima”, afirmou. Ao longo do discurso, Dilma citou metas brasileiras já anunciadas por ela em evento da ONU, em setembro do ano passado, de contribuir com a redução de 37% na emissão de gases de efeito estufa até 2025 e de 43% até 2030, tendo 2005 como ano-base. A presidenta Dilma Rousseff, ao final, mencionou a crise política que vive o Brasil e disse que a sociedade brasileira soube vencer o autoritarismo, construir a democracia e saberá impedir retrocessos.

Número recorde de países assinou o acordo contra mudanças climáticas Um número recorde de países, incluindo os Estados Unidos e a China, os maiores poluidores do mundo, assinou na sede das Nações Unidas (ONU) em Nova York, o Acordo de Paris. De forma simbólica, o presidente francês, François Hollande, foi o primeiro a assinar o documento, entre mais de 171 países representados. “Nunca antes tantos países tinham assinado um acordo internacional num único dia”, disse o secretário-geral da Organização das Nações Unidas (ONU), Ban Ki-moon, saudando um “momento histórico”. A China e os Estados Unidos foram representados, respectivamente, pelo vice-primeiro-ministro Zhang Gaoli e o secretário de Estado John Kerry. Os países signatários representam mais de 93% das emissões de gases de efeito de estufa, responsáveis pelo aquecimento global e as mudanças climáticas, segundo a organização não governamental World ResREVISTA AMAZÔNIA

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O Acordo, concluído em dezembro de 2015 na Conferência do Clima de Paris (COP-21), oferece resposta global ao desafio da mudança do clima, com o propósito de evitar o aumento da temperatura média global a níveis perigosos. O Acordo estabelece marco justo, ambicioso, equilibrado e duradouro, no âmbito das Nações Unidas, para a cooperação e o apoio internacional às ações de combate à mudança do clima, no contexto de promoção do desenvolvimento sustentável, de proteção ambiental e de erradicação da pobreza e da fome. Pela primeira vez os poluidores mais prolíficos do mundo, incluindo os EUA, Europa, China e Índia, todos, concordaram em definir metas específicas e verificáveis para reduzir as emissões de carbono e da dependência dos combustíveis fósseis. O acordo também pede aos países como o Brasil para impor políticas estritas sobre o desmatamento. O acordo ainda tem de ser ratificado por cada nação signatária. O prazo para a ratificação é 21 de abril de 2017. sources Institute. A assinatura é apenas uma primeira etapa. O acordo só entra em vigor quando 55 países responsáveis por pelo menos 55% das emissões daqueles gases o ratificarem. O número de pelo menos 171 países signatários em um único dia é um recorde. O precedente datava de 1982, quando 119 países assinaram a convenção da ONU sobre o direito do mar. Os cientistas defendem uma ação imediata. O último mês foi o março mais quente já registrado, segundo os meteorologistas dos Estados Unidos. Há 11 meses, cada mês bate um recorde de calor, uma série inédita em 137 anos de registros. O Acordo de Paris estipula a limitação do aumento da temperatura “bem abaixo dos 2ºC” em relação ao período pré-industrial e a “prosseguir os seus esforços” para restringir esta subida a 1,5ºC.

devemos preocupar-nos com o nosso planeta e com todos os seres vivos que o habitam”, disse Ban Ki-moon. A data, segundo o secretário-geral, é “uma oportunidade para sublinhar a interdependência entre as pessoas e a imensa variedade de espécies com as quais partilhamos este planeta”.

Acordo sobre o clima Na mensagem, Ban Ki-moon destacou: “Este pacto marcante, em conjunto com a Agenda 2030 para o Desenvolvimento Sustentável, tem o poder de transformar o nosso mundo. O impulso alcançado pela concretização de tantas assinaturas num único dia envia um claro sinal de solidariedade e reso-

lução. Agora, temos de libertar toda a força do engenho humano e garantir o crescimento com baixas emissões de gases e melhorar a resiliência ao clima”, destacou. O secretário-geral da ONU disse que, apesar de a preocupação dos líderes mundiais ser “crucial” para a proteção do planeta, todos os cidadãos têm um papel a desempenhar. “Podemos optar por sistemas de eficiência energética, parar de desperdiçar comida, reduzir a pegada de carbono e aumentar os investimentos sustentáveis. Pequenas ações, multiplicadas por mil milhões, incentivam uma mudança dramática, reforçando o Acordo de Paris e colocando-nos numa trajetória para alcançar os Objetivos de Desenvolvimento Sustentável”, disse.

No Dia da Terra, Ban Kimoon diz que preservação do planeta depende da população O secretário-geral da Organização das Nações Unidas, Ban Ki-moon, disse quando a entidade celebra o Dia da Terra, que é preciso conscientizar a população mundial sobre a preservação do planeta. O Dia Internacional da Mãe Terra foi criado em 2009 pela ONU. Este ano, o tema é Árvores para a Terra e parte das celebrações inclui o plantio de 7,8 mil milhões de árvores no mundo nos próximos cinco anos. “Tal como cada árvore desempenha o seu papel na biosfera, também nós, indivíduos, 08

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John Kerry, secretário de Estado dos EUA, com a neta assinando o acordo de Paris. Foto simbólica concebida para lembrar o dever de proteger a saúde das gerações futuras revistaamazonia.com.br


O presidente da França, François Hollande, assinando o acordo Presidenta Dilma Rousseff, assinando o Acordo de Paris durante encontro na sede da ONU em Nova York. Com a assinatura, o Governo brasileiro reafirma seu compromisso com o Acordo e iniciará imediatamente o processo doméstico para sua pronta ratificação, de modo a contribuir para sua entrada em vigor internacional

175 países assinam histórico tratado climático Paris no Dia da Terra

Brasil vai liderar luta contra o aquecimento global Para o presidente do Conselho da Amata, Roberto Waack, o Brasil é um dos países mais bem preparados para cumprir os objetivos do Acordo de Paris, que prevê medidas para controlar o aquecimento global, disse hoje o integrante da Coalizão Brasil, após participar da reunião de líderes mundiais para a assinatura do acordo na sede da ONU, em Nova York. Waack citou, entre as vantagens comparativas do Brasil, a disponibilidade de terra, de energia e de ambiente institucional, representado pela existência de um código florestal. Esses fatores, somados, propiciam uma combinação muito favorável de “conservação e de produção”. Os líderes mundiais, que representam mais de 170 países, assinaram documento em que proclamam princípios de defesa do meio ambiente e insistem para que os parlamentos de cada país adotem uma regulamentação que permita limitar o aumento da temperatura global abaixo de 2º Celsius (C) e, ao mesmo tempo, tentar um objetivo mais ambicioso: reduzir o aumento de temperatura para 1,5º C. O discurso de Leonardo DiCaprio na assinatura do Clima da ONU

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Segundo o membro da Coalizão Brasil, que é um movimento multissetorial comprometido com a adoção da agenda das mudanças climáticas, o quadro brasileiro é vantajoso perante o mundo. Roberto Waack observou que a existência de uma combinação brasileira de conservação e de produção, em contraste com o antagonismo de outros países, que precisam escolher entre conservação ou produção. Segundo ele, as condições do país colocam o Brasil como uma liderança mundial, no que se refere à oferta de produtos com baixa utilização de carbono. Por isso, “o Brasil precisa cuidar para que o processo decorrente do Acordo de Paris receba endosso do Legislativo rapidamente”, afirma Waack.

A mensagem de Obama Em mensagem enviada aos líderes mundiais que participavam do Acordo de Paris, o presidente Barack Obama disse que “os Estados Unidos vão se juntar aos cerca de 170 países” que assinaram o documento, que prevê que cada nação adote medidas visando prevenir o aquecimento global. “Hoje é o Dia da Terra, data que vou comemorar pela última vez como presidente. Olhando para trás, ao longo dos últimos sete anos, estou esperançoso de que o trabalho que fizemos vai permitir que minhas filhas –

e todos os nossos filhos – vão herdar planeta mais limpo e seguro”, afirmou Obama. Segundo o presidente dos Estados Unidos, há ainda muito trabalho a ser feito para manter o aquecimento global sob controle. “Por isso, quando eu assumi esse cargo, prometi trabalhar para combater essa ameaça”, disse ele. Depois de enumerar uma série de medidas adotadas, Obama ressaltou que hoje “a América está liderando a luta contra as alterações climáticas”. Obama não participou da assinatura do Acordo de Paris, porque estava em viagem ao Reino Unido. Ele foi representado no evento pelo secretário de Estado, John Kerry. De acordo com Kerry, a assinatura do acordo sobre o clima por um número recorde de países é um momento para os líderes mundiais ganharem a “guerra” contra as emissões de carbono, que estão fazendo o planeta mais quente a cada ano. “É por isso que o nosso encontro de hoje é, de fato, histórico”, afirmou o secretário. Ao participar da cerimônia, o presidente da França, François Hollande, disse que vai pedir ao Parlamento de seu país para ratificar as novas regras o mais rápido possível. Segundo Hollande, o prazo é “até o verão deste ano”. O presidente francês acrescentou que, diante do avanço das medidas para deter o aquecimento global, “não há como voltar atrás agora”. REVISTA AMAZÔNIA

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Estimativa de abastecimento de Águas Subterrâneas da Terra A água escondida debaixo da terra no mundo Fotos/Mapas: Peder Engstrom; Tom Gleeson et al; Karyn Ho; Kate Brauman

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volume total de água armazenada no subsolo do planeta é estimado em 23 milhões de km³. Seria o suficiente para cobrir toda a superfície da Terra com uma camada de 180 metros de profundidade. Essa foi a conclusão de um estudo conduzido por pesquisadores canadenses. A equipe usou vários conjuntos de dados para estimar o mundo detém 22,6 milhões de quilômetros cúbicos de água subterrânea. Cerca de 96 por cento é “velha” águas subterrâneas. Apenas 6% dessa água é própria para consumo humano. Isso porque a chamada água “moderna” presente no subsolo está próxima da superfície e pode ser extraída ou usada para complementar recursos localizados acima do solo, em rios e lagos. “Esta é a água que é renovada mais rapidamente na escala de vida humana”, explicou Tom Gleeson, da Universidade de Victoria, no Canadá. “Ao mesmo tempo, é a mais sensível a mudanças climáticas e contaminação humana. Trata-se, portanto, de um recurso vital que precisa ser mais bem gerenciado.” O trabalho foi conduzido pelo Dr. Tom Gleeson, em colaboração com pesquisadores da Universidade do Texas em Austin, da Universidade de Calgary e da Universidade de Göttingen. A boa notícia é que somente os 6 por cento, da quantidade de águas subterrâneas dis-

poníveis renovável é bastante significativo. Nos 0,35 quilômetros cúbicos (com menos de 50 anos de idade), há três vezes mais água subterrânea moderna do que todos os outros de água doce contida em lagos e rios da Terra. A má notícia é que não está bem distribuída e há menos água subterrânea moderno em regiões áridas.

Avaliando o volume global e distribuição de água subterrânea “moderno”

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A quantificação da água subterrânea moderna a partir de dados de trítio e modelos numéricos de águas subterrâneas de idade águas subterrâneas

Recurso finito Para quantificar a água armazenada nos dois primeiros quilômetros da superfície da Terra, Gleeson e sua equipe combinaram extensas bases de dados e modelos computacionais. Foram analisados, entre outros fatores, a permeabilidade de rochas e do solo, sua porosidade e características dos lençóis freáticos. A chave para determinar a idade de toda a água armazenada foram medições feitas com trítio, uma forma radioativa de hidrogênio que surgiu na atmosfera há 50 anos como resultado de testes de bombas termonucleares. A partir desse elemento químico, os cientistas puderam identificar toda a chuva que chegou ao subsolo desde então. revistaamazonia.com.br


Se todas as águas subterrâneas modernas da Terra forem reunidas acima do solo, o quão profundo seriam? Menos de 1 m entre 1 m e 50 m Mais do que 50 m

Mapa do volume total de água armazenada/escondida no subsolo do planeta, estimado em 23 milhões de km³

Reservas O mapa acima mostra a distribuição da água moderna presente no subsolo ao redor do mundo. As manchas em azul escuro mostram onde ela é renovada rapidamente. Em tom mais claro, a água mais antiga, que em sua maioria está estagnada e não pode ser renovada. “As características dessa água antiga variam muito”, disse Gleeson. “Em alguns lugares, é muito profunda. Em outros, não. Em muitos lugares, ela é de má qualidade e pode ser mais salina que a água do mar, além de ter metais e outros componentes químicos dissolvidos nela e que teriam de ser tratada antes de se tornar potável ou usada na agricultura.” Isso torna ainda mais importante as reservas modernas e a necessidade de administrá-las de forma sustentável, alertam os cientistas. O estudo destaca ainda como elas estão distribuídas de forma desigual no planeta. O próximo passo, afirmou Gleeson, é determinar o ritmo com que algumas reservas estão sendo consumidas. “Essa visão global da água no subsolo irá conscientizar de que nossas reservas mais recentes no subsolo, aquelas que são mais sensíveis a mudanças ambientais e provocadas pelo homem, são finitas”, disse Ying Fan, da Rutgers University, nos Estados Unidos. “Nós já sabemos que os níveis de água nos lotes dos aquíferos estão caindo. Estamos usando nossos recursos hídricos subterrâneos muito rápido – ... Mais rápido do que eles estão sendo renovados”. revistaamazonia.com.br

O volume e distribuição de água subterrânea global moderno em uma profundidade se ele foi extraído e agrupados na superfície da terra como uma inundação. a-c, para as análises é calculada usando os dados geomática como parâmetros de entrada do modelo (a), utilizando recarga de águas subterrâneas e gradiente de lençol freático (b), e utilizando recarga de águas subterrâneas e porosidade (c). REVISTA AMAZÔNIA

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Assim como a distribuição de lagos e rios variam ao redor do mundo, assim também faz-se a distribuição dos aquíferos. Bacias grandes (roxo) mantem abundante água subterrânea, extraída de forma relativamente fácil. Mais bacias complexas (verde) pode conter vários aquíferos separados por rocha impermeável ou ter camadas de água salgada, bem como frescos. Aquíferos locais e rasos fornecem apenas quantidades limitadas de água. Dados fornecidos por BGR & UNESCO (2008): Recursos Hídricos Subterrâneos do Mundo 1: 25 000 000 de Hannover, Paris.

Aquíferos Estrutura Água retida no locais e hidrogeológica subsolo ou nos superficiais complexa poros e fendas de rochas

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No mundo, mais de dois bilhões de indivíduos vivem regiões onde falta água

Poluição ambiental mata quase 7 milhões de pessoas por ano, alerta Pnuma Programa das Nações Unidas para o Meio Ambiente alerta para o número crescente de problemas de saúde associados à degradação ambiental Fotos: Banco Mundial / Curt Carnemark, Gary Kolditz, Lutfi Braihi

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Programa das Nações Unidas para o Meio Ambiente (Pnuma) chamou a atenção recentemente, para a longa e crescente lista de problemas de saúde associados à degradação ambiental. Segundo dados da Organização Mundial da Saúde (OMS), 23% das mortes prematuras em todo o mundo poderiam ser atribuídas a fatores ambientais. Entre as crianças, a porcentagem sobre para 36%. Todos os anos, quase sete milhões de pessoas morrem porque são expostas à poluição em ambientes internos e externos, (envolvendo) desde a produção de energia, a utilização de fornos, o transporte, fornalhas industriais até queimadas e outras causas, afirmou o diretor executivo do Pnuma,

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Achim Steiner, diretor executivo do Pnuma

Achim Steiner. O chefe da agência da ONU destacou que cerca de mil crianças morrem por dia devido a doenças transmitidas por água contaminada e imprópria para o consumo. No mundo, mais de dois bilhões de indivíduos vivem regiões onde falta água. O Pnuma mencionou a zika, a malária e o ebola entre as infecções cujos riscos são agravados conforme a degradação da natureza aumenta. Diferentes tipos de câncer e formas de intoxicação também foram citados. Há uma consciência crescente de que os humanos, pela sua intervenção no meio ambiente, desempenham um papel fundamental no recrudescimento ou na mitigação dos revistaamazonia.com.br

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riscos à saúde, disse Steiner. Um exemplo consistente é o Protocolo de Montreal, acordo que foi implementado em 1989 e que retirou de circulação quase 100 substâncias nocivas à camada de ozônio. Segundo o Pnuma, estimativas indicam que, graças à iniciativa, cerca de 2 milhões de casos de câncer de pele serão prevenidos até 2030. Até 2060, a proibição dessas substâncias deve gerar ganhos de até 1,8 trilhão de dólares para os setores de saúde. Outra medida lembrada pela agência foi a remoção de chumbo dos combustíveis, o que estaria contribuindo para evitar 1 milhão de mortes prematuras por ano. A eliminação do metal da composição da gasolina poderá aumentar o Produto Interno Bruto (PIB) global em até 4%. Além de combaterem a disseminação de doenças infecciosas, investimentos em saneamento e água potável também podem ser lucrativos. O Pnuma calcula que, para cada dólar investido no setor, lucra-se entre cinco e 28 dólares. A relação entre saúde e meio ambiente será amplamente debatida na Assembleia Ambiental das Nações Unidas, que acontecerá ao final de maio. Durante a ocasião, o Pnuma lançará um relatório sobre o tema a fim de promover a discussão sobre os vínculos entre desenvolvimento, meio ambiente, saúde e economia.

Cerca de mil crianças morrem por dia devido a doenças transmitidas por água contaminada e imprópria para o consumo Da asma para o Zika, a ONU aborda relações entre ambiente e saúde. Poluição e degradação ambiental podem estar ligado a uma lista crescente de problemas de saúde como câncer de pele, câncer de pulmão, asma, envenenamento por chumbo, intoxicação por mercúrio, malária, Ebola e Zika

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© Photo: Pete Ryan/Getty Images

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ONG’s alertam para ameaças a rios da Amazônia

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m meio às atividades do 7º Fórum Mundial das Águas, que aconteceu recentemente na Coreia do Sul, a organização WWF alertou para as ameaças aos ciclos hidrológicos da região, uma questão que, segundo a ONG, tem sido menosprezada pelos agentes públicos e privados. O principal perigo é a previsão de construção de pelo menos 250 hidrelétricas nos próximos anos. As instalações alterariam a conectividade dos rios e dos ecossistemas da bacia amazônica, com impacto na biodiversidade. Em evento paralelo um painel de especialistas moderado por Yolanda Kakabadse, presidente do Conselho da Rede WWF, Leandro Castello apresentou os principais destaques do relatório State of the Amazon: Freshwater Connectivity and Ecosystem Health (O Estado da Amazônia: Conectividade e Saúde dos Ecossistemas de Água Doce) aponta que a pecuária e a mineração também suscitam preocupação, ao gerarem poluição dos rios e prejudicarem a pesca, uma atividade econômica essencial para a região e de subsistência para milhares de famílias. A degradação dos rios teria efeitos não apenas na natureza e na vida local, como afetaria o abastecimento de água e energia elétrica muito além da região amazônica, uma vez que as hidrelétricas e barragens alimentam lugares bem mais distantes. “Ao construirmos centenas de hidrelétricas na Amazônia, nós vamos gerar um processo de maior desmatamento e comprometimento dos sistemas aquáticos, prejudicando o ciclo hidrológico que leva às chuvas para o resto do continente, ou seja, afetando a fonte que move as hidrelétricas, a água”, alerta.

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Desmatamento chama mais a atenção Maretti destaca que o mundo e, principalmente o Brasil, aprendeu a se mobilizar contra

o desmatamento daquela que é considerada o “pulmão do planeta”. Os avanços dos últimos anos são inegáveis – porém os riscos sobre os rios têm sido desconsiderados. “No caso das florestas, nós degradamos revistaamazonia.com.br


Leandro Castello apresentou os principais destaques do relatório State of the Amazon: Freshwater Connectivity and Ecosystem Health

muito a Amazônia, mas hoje essa consciência já existe. Provavelmente vai dar tempo de manter a Amazônia funcionando com um ecossistema vivo, se a gente continuar reduzindo o desmatamento”, afirma. “Mas com relação aos ecossistemas aquáticos, essa é a pergunta que se coloca.”

Fronteiras Cláudio Maretti, líder da Iniciativa Amazônia Viva, observou que a questão do gerenciamento transfronteiriço dos recursos hídricos é um dos principais desafios a serem encarados pelos países – uma questão que é negligenciada pelo Brasil, na opinião do ambientalista.

“A Amazônia está em nove países, não só no Brasil. A bacia amazônica está em seis deles. Ou seja, não é uma questão de um país só, e isso tem se falado muito aqui [no fórum]. O enfoque transfronteiriço é fundamental – e no caso da Amazônia, os países ainda não estão trabalhando de forma articulada”, relata. “O Brasil tem muito a fazer em termos de proteção dos seus rios, e ainda muito mais a fazer em termos de ação transfronteiriça, de trabalhar a bacia amazônica ou a do Pantanal em conjunto com os seus vizinhos.” Para o Brasil, o Fórum Mundial da Água é também uma oportunidade de se preparar a próxima edição da conferência, que será realizada no país. Será a primei-

ra vez que a América Latina vai receber o evento internacional. A bacia do rio Amazonas, pelo MODIS no ano de 2010. O estado de Mato Grosso é mostrado com a linha tracejada-pontilhada, o Alto Xingu em azul. As florestas estão em verde escuro, cerrado em tons de bege e culturas que existiam antes de 2000, em amarelo. Mudanças de uso da terra (LUC) que ocorreram 2.000-2.010 são mostrados como: pastagens/cerrado para cortar em laranja e floresta para cortar em vermelho. As áreas protegidas são em verde médio. O Alto Xingu é delimitado com a linha azul, ao passo que a linha verde brilhante é o limite do Parque Indígena do Xingu, a maior reserva.

O relatório State of the Amazon: Freshwater Connectivity and Ecosystem Health (O Estado da Amazônia: Conectividade e Saúde dos Ecossistemas de Água Doce) aponta que a pecuária e a mineração também suscitam preocupação, ao gerarem poluição dos rios e prejudicarem a pesca, uma atividade econômica essencial para a região e de subsistência para milhares de famílias. A degradação dos rios teria efeitos não apenas na natureza e na vida local, como afetaria o abastecimento de água e energia elétrica muito além da região amazônica, uma vez que as hidrelétricas e barragens alimentam lugares bem mais distantes. revistaamazonia.com.br

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Navio será utilizado para pesquisas na Amazônia e deve ajudar em melhorias na navegação

Marinha lança navio para mapear leitos de rios da Amazônia Objetivo é evitar acidentes náuticos e aumentar trafegabilidade

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Marinha do Brasil apresentou o Navio Hidroceanográfico Fluvial “Rio Branco”. A embarcação vai ter a missão de mapear, cartografar e aumentar a trafegabilidade dos rios amazônicos. O ministro da Defesa, Jaques Wagner ressalta que o navio realizará levantamentos cartográficos e vai mapear os leitos dos rios da Amazônia para não só detectar bancos de areia, bem como melhorar a sinalização os rios, evitando acidentes náuticos. “Temos que apostar nas hidrovias e aumentar a segurança das embarcações realizando a dragagem dos rios”, afirmou Wagner. O NHoFlu “Rio Branco”, como está sendo chamado o navio, recebe o nome em homenagem ao rio homônimo, que nasce no estado de Roraima, e tem sua foz no Rio Negro, e ao Barão do Rio Branco, que foi um diplomata, que solucionou alguns dos conflitos de fronteiras, sendo considerado o patrono da Diplomacia Brasileira. De acordo com o tenente Victor Alves, encarregado pela Divisão de Hidrografia do NhoFLU Rio Branco, 36 marinheiros ficam a bordo durante 200 dias por ano para atualizar as cartas náuticas e assim, possibilitar uma navegação mais rápida e segura nos rios da Amazônia. Navios mercantes e de cargas serão os principais beneficiados pelos estudos. 18

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O comandante da Marinha, almirante-de-esquadra Bacellar Leal Ferreira, também explicou que Navio Hidroceanográfico

vai ajudar na atualização das cartas náuticas, ou seja, as informações de navegabilidade principalmente de rios como o Solimões e

O NhoFlu Rio Branco H 10 vai ajudar na atualização das cartas náuticas, ou seja, as informações de navegabilidade principalmente de rios como o Solimões e Madeira que mudam suas características frequentemente revistaamazonia.com.br


Madeira que mudam suas características frequentemente. “O rio está cada vez mais adquirindo importância no transporte marítimo, no movimento das embarcações, e nós precisamos garantir que esse movimento esteja sendo feito com segurança e da forma mais econômica possível. A médio e longo prazo, a ideia é disponibilizar, a cada ano, cartas náuticas com o maior número de informações atualizadas possíveis e trechos dos rios sinalizados, para permitir que quem esteja sem cima, navegue com maior segurança”, destacou.

Economia x tecnologia Para o vice-governador do Amazonas, Henrique Oliveira, o trabalho desenvolvido pelo Rio Branco vai contribuir ainda para o barateamento de mercadorias que chegam à região por vias fluviais, uma vez que os caminhos percorridos pelas embarcações de grande porte podem ser encurtados, com novos trechos sinalizados. “Agora vamos ter um ano mais utilizável, do ponto de vista de navegação. Há anos que a seca é muito grande e o transporte fluvial começa a ser muito mais arriscado. Assim, com novos caminhos sinalizados, o transporte de mercadorias vai se tornar mais breve e barato”, disse Henrique Oliveira. A construção do NHoFlu “Rio Branco”,

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que tem cerca de 70% de conteúdo nacional, demandou um incremento em sua capacidade tecnológica na construção de navios militares e de pesquisa, gerando empregos e contribuindo para o fortalecimento da indústria naval. Destacam-se os aprimoramentos introduzidos nas linhas de casco, que possibilitaram a redução do custo de posse do navio, moderno Sistema de Controle e Monitoramento (SCM) e a incorporação tecnológica do sistema de sanitários a vácuo e de uma Unidade de Tratamento de Águas Servidas (UTAS), que incorporam importantes conceitos de sustentabilidade, em atendimento aos Diplomas Ambientais vigentes. A obtenção do navio está inserida no Projeto de Cartografia da Amazônia, realizado em parceria com o Exército Brasileiro, a Força Aérea Brasileira e o Serviço Geológico do Brasil, sob coordenação do Centro Gestor e Operacional do Sistema de Proteção da Amazônia (Censipam), órgão subordinado ao Ministério da Defesa e responsável pelo repasse dos recursos financeiros. Coube à Marinha do Brasil (MB), por meio da Diretoria de Hidrografia e Navegação (DHN), coordenar o Subprojeto de Cartografia Náutica, de modo a apresentar, como produto final dos trabalhos, cartas náuticas da Bacia Amazônica atualizadas na escala de 1:100.000.

Construção O navio hidroceanográfico fluvial “Rio Branco” teve construção iniciada no dia 6 de dezembro de 2012, com a supervisão da Diretoria de Engenharia Naval. Seu batimento de quilha foi realizado no dia 23 de abril de 2013. Cerca de R$ 55 milhões foram investidos no projeto que tem parceria também com Centro Gestor e Operacional do Sistema de Proteção da Amazônia (Censipam). A embarcação, que mede 47,43m de comprimento, foi desenvolvida pela Indústria Naval do Ceará (Inace).

Equipamentos Científicos Material: Polietileno de Alta Densidade (PEAD) Comprimento: 7,5m Boca: 2,4m Deslocamento: 3t Velocidade Máxima: 36nós Tripulação: 6 Propulsão: 2 motores 150HP (controle eletrônico) Geração de Energia: 2 geradores de 2 KVA

Características Principais Ecobatímetro Monofeixe Sinrad EA400 SP Ecobatímetro Multifeixe Edgetech 272 TD.

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Estudo da NASA mostra elevação dos mares retardado por aumento de água na Terra

Terra absorve água e retarda aumento do nível do mar Fotos: J.T. Reager, NASA / JPL, NASA GRACE Satellites, UC Irvine/NASA/JPL-Caltech

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omo as geleiras derretem devido à mudança climática, a Terra cada vez mais quente e ressecada está absorvendo um pouco dessa água interior, retardando o aumento do nível do mar, dizem os especialistas da NASA. Medições de satélite durante a última década mostraram pela primeira vez que os continentes da Terra têm absorvido e armazenado um extra de 3,2 trilhões de toneladas de água nos solos, lagos e aquíferos subterrâneos, disseram os especialistas em um estudo recentemente publicado. Este armazenamento abrandou temporariamente a taxa de aumento do nível do mar em cerca de 20 por cento, disse o estudo. “Nós sempre achamos que a dependência crescente de água subterrânea para irrigação e consumo estava resultando em uma transferência líquida de água da terra para 20

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o oceano”, afirmou J.T. Reager do Jet Propulsion Laboratory da Nasa, principal autor do trabalho. “O que nós não havíamos percebido até agora é que ao longo da última década as mudanças no ciclo global da água mais do que compensaram as perdas que ocorreram a partir de bombeamento de águas subterrâneas, levando a Terra a agir como uma esponja – pelo menos temporariamente”. O ciclo global da água envolve o fluxo de

Grandes massas de terra, da Terra, tem armazenado quantidades crescentes de água na última década, desacelerando o ritmo de aumento do nível do mar

umidade, da evaporação sobre os oceanos à queda da chuva, à enxurrada e rios que voltam para o oceano. A quantidade do efeito que este armazenamento teria no aumento do nível do mar permanece desconhecida até agora, já que não existem instrumentos terrestres que podem medir tais mudanças em todo o planeta. revistaamazonia.com.br

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Os dados mais recentes vieram de um par de satélites da Nasa, lançados em 2002 - conhecidos como Gravity Recovery and Climate Experiment (GRACE). Os pesquisadores descobriram que os “ganhos de água sobre a terra foram espalhados globalmente, mas se considerados conjuntamente equivalem ao volume do Lago Huron, sétimo maior lago do mundo”, disse um comunicado da Nasa. Os pesquisadores disseram que os resultados irão ajudar os cientistas a calcular melhor as mudanças do nível do mar nos próximos anos. “Estes resultados vão levar a um refinamento dos orçamentos nível global do mar, tais como os relatórios apresentados no Painel Intergovernamental sobre Mudanças Climáticas (IPCC), que reconhecem a importância das mudanças provo-

Mapa de tendências em armazenamento de água nos continentes medida pelos satélites GRACE

cadas pelo clima na hidrologia, mas foram incapazes de incluir qualquer estimativa confiável da sua contribuição para as alterações do nível do mar”, disse o autor sênior Jay Famiglietti, professor da Uni-

versidade da Califórnia, em Irvine. “Mas vamos precisar de um registro de dados por muito mais tempo para compreender plenamente a causa subjacente dos padrões e se eles vão persistir”.

Armazenamento de água subterrânea nos 37 maiores aquíferos da Terra

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Para gerações saudáveis REVISTA AMAZÔNIA

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Filtro barato limpa micróbios perigosos e produtos químicos da água potável Tecnologia de apenas US$16 capaz de purificar água para uma família inteira por um ano

Fotos: Thalappil Pradeep

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falta de água potável é um problema sério em todo o mundo. Apesar de estimativa oficial da ONU garantir que 750 milhões de pessoas vivem sem acesso à água, cientistas holandeses refizeram a conta e chegaram a conclusão de que pelo menos quatro bilhões de pessoas sofrem com a falta do recurso – pelo menos uma vez por ano. O professor de química Thalappil Pradeep, do Instituto Indiano de Tecnologia, passou 14 anos de sua vida trabalhando em um mecanismo que pudesse ajudar a combater o problema. Trata-se de um sistema de purificação de água baseado em tecnologia de nano partículas. A ideia é tornar acessível e potável a água dos lençóis freáticos indianos, que são contaminados com arsênio, substância cancerígena também ligada a diabetes e doenças cardiovasculares. “A água é um direito humano. Mas, em países em desenvolvimento, o acesso à O filtro de membrana no topo mata as bactérias e vírus, e o bloco axial na parte inferior pode ser personalizado e equipado com um segundo filtro para o chumbo ou arsénio

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O purificador de água AMRIT, do professor de química Thalappil Pradeep, é o primeiro filtro de seu tipo na Índia. Este filtro de água de $ 16, poderá salvar uma família de cinco pessoas com água limpa durante um ano inteiro

água limpa e saudável está longe da igualdade”, diz Thalappil, que completa: “A tecnologia para tratar água deve ser algo acessível e com baixa pegada ecológica. Não pode demandar nenhuma eletricidade ou contaminar outros recursos no processo”. Por enquanto, 330 filtros de médio porte serão instalados, beneficiando 500 mil indianos residentes do estado de West Bengal O primeiro modelo do sistema desenvolvido pelo indiano ficou pronto em 2012 e foi chamado de AMRIT — foi o dispositivo pioneiro deste tipo criado no país, que revistaamazonia.com.br


O purificador de água AMRIT para pequenas comunidades

tivo. O mais barato custa US$ 16, já com taxa de instalação inclusa, e é suficiente para filtrar água para uma família inteira durante um ano. O médio, ideal para escolas e hospitais, custa US$ 500. Para dar conta de uma vila inteira, porém, o preço sobre para US$ 1.200, sendo que esse equipamento é capaz de produzir 300 litros de água potável por hora. Por enquanto, 330 filtros de médio porte serão instalados, beneficiando 500 mil indianos residentes do estado de West Bengal. Segundo o The Water Project, atualmente 21% das doenças na Índia são causadas pelo consumo de água contaminada e cem mil mortes anuais estão relacionadas ao mesmo problema. A equipe de pesquisadores do IIT Madras desenvolveu mais duas variantes do purificador de água – uma unidade maior que pode fornecer 18.000 litros por hora e atender a 50.000 pessoas, e uma variedade a nível familiar menor

recentemente passou a implantar vários modelos da tecnologia em todo seu território. Diante da demanda, Thalappil e seus estudantes pesquisadores abriram a empresa InnoNano Research Private Ltd para manter a produção e instalação dos equipamentos.

Três tamanhos Existem três tamanhos do mesmo disposirevistaamazonia.com.br

Fibras de quitosano combinam com nano partículas de hidróxido de alumínio (AlOOH Np) para formar um argiloso “gaiola” que pode proteger as nano partículas de prata incorporado a partir de depósitos que reduziriam o seu poder de matar micróbios REVISTA AMAZÔNIA

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A Água e a questão do saneamento básico por Elias Oliveira*

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ara refletir sobre a importância do Dia Mundial da Água, celebrado em 22 de março, é importante lembrar que, mesmo em pleno século XXI, o Brasil está longe de contar com saneamento básico em todos os municípios. De acordo com um estudo divulgado em janeiro deste ano pela Confederação Nacional da Indústria (CNI), que tomou como base dados de 2013, apenas em 2054 a água encanada e o tratamento da rede de esgoto estarão disponíveis para todos os brasileiros. Os dados se tornam ainda mais alarmantes quando falamos em números absolutos: segundo o levantamento, 41 milhões de brasileiros ainda não têm acesso à rede geral de abastecimento de água e 107 milhões não dispõem de coleta de esgoto. Na região Norte, por exemplo, apenas 52,4% dos habitantes contam com água encanada, 6,5% com coleta de esgoto e menos de 15% com algum tipo de tratamento sanitário. Os danos que esse cenário pode trazer à população são inúmeros, basta olhar para um dos grandes problemas da saúde pública no momento: a proliferação do mosquito Aedes Aegypti e o consequente aumento desenfreado dos casos de dengue, chikungunya e vírus zika. Isso ocorre porque o esgoto a céu aberto se acumula em poças, que se misturam às águas da chuva e se transfor-

O esgoto a céu aberto se acumula em poças, que se misturam às águas da chuva e se transformam em novos criadouros para o mosquito. Diariamente, m oradores convivem com a falta de saneamento básico...

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mam em novos criadouros para o mosquito. Além das muitas vítimas, o combate a essas doenças também afeta diretamente os cofres públicos, afinal investir em saneamento e prevenir os danos custa bem menos que cuidar de um paciente internado – segundo a Organização Mundial da Saúde (OMS), cada dólar gasto com o saneamento básico representa uma economia de US$ 4,3

Apenas em 2054 a água encanada e o tratamento da rede de esgoto estarão disponíveis para todos os brasileiros

com a saúde. Embora seja uma realidade distante de boa parte da população, algumas soluções químicas são extremamente eficazes para minimizar os níveis de contaminação da água e capazes de contribuir diretamente com a qualidade de rios, lagos, represas e lençóis freáticos. Para auxiliar no tratamento feito tanto por administrações públicas quanto por privadas, empresas nacionais trabalham constantemente no desenvolvimento de sistemas altamente eficazes e seguros, como o Cloro Gás e Dióxido de Cloro, o DIOX®, ideais para desinfecção de águas e esgoto. Essas soluções já são aplicadas, por exemplo, em estações de tratamento e também em indústrias de alimentos e bebidas. Ter água limpa e saneamento básico é um direito humano, é sinônimo de qualidade de vida e saúde. Por isso, o Dia da Água deve ser visto como uma oportunidade perfeita para chamarmos a atenção da sociedade civil e iniciativa privada para um dos grandes problemas do país. [*] Gestor Institucional da Sabará Químicos e Ingredientes

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Zona húmida do Tejo: Era bom conseguir avançar na contabilização” das “centenas de milhares de milhões de CO2 [dióxido de carbono] depositadas nos lodos dessa enorme região”

Mar ajuda a absorver “grande parte do CO2”

Especialista em oceanos Tiago Pita e Cunha defendeu que Portugal devia contabilizar serviço prestado pelo mar na captação de CO2

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especialista em oceanos Tiago Pita e Cunha defendeu que Portugal devia avaliar o serviço prestado pelo mar na captação de dióxido de carbono, que nalgumas áreas tem “uma relevância gigantesca” pelo seu papel no combate às alterações climáticas. O carbono que é retido em algumas áreas marítimas, como os estuários ou as rias (canais fluviais de água doce), “tem uma relevância gigantesca” e representa um serviço semelhante àquele prestado pelas florestas e “era interessantíssimo para Portugal compreender o serviço ecossistêmico que uma área tão relevante como a zona húmida do Tejo produz para toda a Europa”, disse Tiago Pitta e Cunha. Tiago Pitta e Cunha falava a propósito da conferência sobre oceanos, integrada na iniciativa ‘Riviera Talks’, que se realizou em Cascais e contou com a participação do príncipe Alberto II do Mónaco, além do coordenador do grupo de especialistas das Nações Unidas responsável pelo Relatório Global de Avaliação dos Oceanos, recentemente publicado, Alan Simcock, e da ambientalista Patricia Ricard. O mar também “é o principal regulador das temperaturas do planeta e tem consegui-

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do absorver uma boa parte do aumento da temperatura atmosférica” e, portanto, tem dado um “contributo decisivo” para o objetivo de limitar a dois graus a subida até final do século apontado pelos cientistas, mas sem grande adesão concreta dos responsáveis políticos, que não conseguiram chegar a um consenso acerca de medidas. Depois de várias tentativas nos últimos anos, está agendada para dezembro, em Paris, a conferência das Nações Unidas para tentar que os países cheguem a um acordo com vista à redução das emissões dos gases com efeito de estufa e à definição de medidas, nomeadamente o financiamento da adaptação às alterações climáticas. O especialista em políticas dos oceanos questiona por que razão, “sendo o mar tão relevante para as alterações climáticas, quer porque é o principal mitigador do fenômeno através da absorção de carbono pela geração de oxigênio e pela regulação da temperatura, quer pelos impactos que sofre, como não há uma maior ligação entre o mar e as alterações climáticas”. E recorda que o painel das Nações Unidas para as Alterações Climáticas apenas no último relatório, o quinto, se pronunciou sobre esta questão reconhecendo a ligação e

apontando que, para o futuro estes dois aspectos têm de ser trabalhados e investigados “de uma forma muito mais séria, o que “é fundamental para um país como Portugal”. Para Tiago Pitta e Cunha, era importante o país compreender que devia investir “na adaptação aos impactos das alterações climáticas”, mas deveria também “ser o país mais interessado em investigar a fundo” a relação do mar com as mudanças do clima. “A biodiversidade [principalmente marinha] vai ser também o nosso ativo do futuro”, realçou.

“Grande parte do carbono emitido para a atmosfera que causa o aquecimento global e as alterações do clima é absorvido pelo mar”, explicou Tiago Pitta e Cunha, especificando que ou fica na água do oceano e é absorvido pelo fitoplâncton, base da cadeia alimentar marinha que o consome, ou se REVISTA AMAZÔNIA 25 deposita no fundo do mar.


A primeira e maior incubadora do Norte completa 16 anos No dia 19 de maio o Centro de Incubação e Desenvolvimento Empresarial (CIDE), a primeira incubadora de empresas do Amazonas, completou 16 anos de existência

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o longo dos anos de seu desenvolvimento passaram muitas empresas que se destacaram no cenário empresarial local e nacional, como a Pronatus do Amazonas, que foi a primeira empresa a realizar o processo de incubação. Hoje, 24 empresas do setor de Cosméticos e Perfumaria, Temperos, Panificação, Alimentos Congelados, Saúde e Higiene, Biotecnologia e Tecnologia da Informação, estão instaladas na incubadora, levando seus produtos a feiras nacionais e internacionais, participando de parcerias com instituições que fomentam o empreendedorismo e gerando negócios de R$ 300 mil a R$ 1 milhão de reais por ano, em um espaço de 12.000 metros quadrados. As atividades da incubadora são dirigidas pelo presidente do conselho de Administração, Antonio Carlos da Silva, e pelo diretor executivo, José Barbosa Grosso, com o apoio de instituições parceiras. Além das empresas incubadas, o CIDE conta com as empresas associadas que somam um total de 8 e estão instaladas fora do ambiente da incubadora, fazendo jus ao slogan “o sucesso da sua empresa passa por aqui”.

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ANOS PROMOVENDO O EMPREENDEDORISMO COM INOVAÇÃO A origem do CIDE

O idealizador do Centro de Incubação e Desenvolvimento Empresarial (CIDE), foi o amazonense Moyses Benarros Israel, que começou a trabalhar aos 11 anos de idade, foi limpador de escritório, entregador de bombons, sonhou em ser químico industrial, foi Vice-Presidente do Banco do Estado do Amazonas e é o atual Vice-Presidente da Federação das Indústrias do Estado do

Entrada principal da incubadora CIDE

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Amazonas (FIEAM). “Em uma ocasião, tomando café com meu amigo Raimar Aguiar comentei o assunto de dar oportunidades aos pequenos empresários que têm ideias, mas pouco capital para colocá-las em prática. E falei também que precisávamos de um local adequado, no qual esses empreendedores pudessem desenvolver seus projetos e, depois, caminhar sozinhos”, diz Moyses Israel. O espaço físico escolhido foi um local usado pelo Projeto Rondon, um projeto criado em 11 de julho de 1967, que promovia atividades de extensão universitária levando estudantes voluntários às comunidades carentes e isoladas do interior do país, onde participavam de atividades de caráter notadamente assistencial, organizadas pelo governo. Com o apoio da Superintendência da Zona Franca de Manaus (Suframa), Moyses Israel levou o seu sonho à realidade. “Uma vez que tivemos o apoio da superintendência, começamos a colocar em prática a ideia. Pensávamos grande, lá na frente. A incubadora de empresas deveria ter um espaço para as empresas de Tecnologia e de Software. E, o que um dia serviu de espaço de dormitório para estudantes, iria se transformar em um espaço cibernético. Iniciamos também, a construção de pavilhões revistaamazonia.com.br


maiores para acolher empresas de outros segmentos. E, com a ajuda da Universidade Federal do Amazonas (UFAM), instalamos um laboratório de química na incubadora, o qual era usado por professores e estudantes universitários que realizavam análises químicas para colégios e empresas locais. Foi a primeira atividade realizada na incubadora”, conta o idealizador. O primeiro diretor executivo escolhido foi o senhor Fernando Loureiro, que deu continuidade ao projeto. “Eu não inventei nada porque incubadoras de empresas já existiam em outros lugares. O que eu fiz foi aplicar conhecimentos adquiridos em minhas viagens ao Chile, a centros acadêmicos, em leituras pessoais sobre esse assunto e oferecer oportunidades à demanda local”, diz Moyses Israel, acrescentando que é importante fomentar e desenvolver novas ideias, e contribuir com o desenvolvimento da sociedade.

Acompanhando as mudanças Atualmente, o terreno onde funciona o CIDE e o imóvel já fazem parte do patrimônio da incubadora, desde 21 de novembro de 2012, quando foi adquirido de forma definitiva. A primeira incubadora de empresas do Amazonas continua acompanhando as revoluções na sociedade e no meio empresarial, atualizando suas parcerias e a forma de trabalhar para fomentar ainda mais o empreendedorismo. “Com o apoio da Associação Nacional de Entidades Promotoras de Empreendimentos Inovadores - Anprotec, e da Fundação de Amparo à Pesquisa do Estado do Amazonas - Fapeam, o Cide vai criando novos mecanismos de incubação e espaços de geração de empreendimentos inovadores”, destaca José Grosso, lembrando que muitos empresários instalados alcançaram prêmios importantes durante a sua caminhada empreendedora no CIDE. Ainda conforme o diretor executivo, a incubadora implantou este ano, o Projeto Fênix, projeto contemplado pelo edital 019/2014-Pró-Incubadoras-Fapeam, com o objetivo de promover melhorias e resultados no CIDE e, consequentemente, aos Estudantes conhecem empresa incubada no CIDE

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Histórico Lançamento da pedra fundamental: 20 de maio de 1999; Aprovação do estatuto: 20 de outubro de 1999; Criação do CIDE: 10 de novembro de 1999; Constituição do Conselho Administrativo: 27 de janeiro de 2000; Inauguração do CIDE: 19 de maio de 2000.

O idealizador do CIDE, Moyses Israel

empresários instalados, conhecidos como incubados, usando a metodologia do Centro de Referência para Apoio a Novos Empreendimentos (CERNE), tendo à frente Rosália Padilha Coordenadora do Projeto no CIDE. “O projeto Fênix vai proporcionar ao empreendedor capacitação, formação, além de parcerias locais, nacionais e internacionais. Para isso, o próprio projeto prevê que o nosso centro de incubação crie um comitê de gestão, formado por colaboradores, técnicos, que vão realizar ações para que as metas sejam alcançadas. Dessa forma, você conhece o potencial do empreendedor, dificuldades e riscos”, diz José Grosso. Ao longo dos 16 anos, a incubadora de empresas se transformou também em um espaço de formação, ao qual muitos professores e estudantes recorreram para complementar sua formação acadêmica e estimular novas ideias de empreendedorismo. “Os acadêmicos não visitam o CIDE para dar um passeio, mas para conhecer casos de sucesso e as dificuldades na hora de empreender. Tivemos a visita de grupos de estudantes do Estado do Amazonas e até da Universidade do Texas, nos Estados Unidos, finaliza Grosso.

Alguns produtos feitos no CIDE

O termo “incubadora” O modelo precursor do processo de incubação de empresas, como conhecemos hoje, surgiu em 1959 no estado de Nova Iorque (EUA), quando uma das fábricas da Massey Ferguson fechou, deixando um significativo número de residentes novaiorquinos desempregados. Joseph Mancuso, comprador das instalações da fábrica, resolveu sublocar o espaço para pequenas empresas iniciantes, que compartilhavam equipamentos e serviços. Além da infraestrutura física das instalações, Mancuso adicionou ao modelo um conjunto de serviços que poderiam ser compartilhados pelas empresas ali instaladas, como secretaria, contabilidade, vendas, marketing e outros, o que reduzia os custos operacionais das empresas e aumentava a competitividade. Uma das primeiras empresas instaladas na área foi um aviário, o que conferiu ao prédio a designação de “incubadora”. No Brasil, as primeiras incubadoras surgiram a partir da década de 80. Segundo números de 2011 da Associação Nacional de Entidades Promotoras de Empreendimentos Inovadores (Anprotec), no Brasil, existem 384 incubadoras de empresas. Algumas delas, por estarem ligadas a instituições renomadas, sejam universidades ou empresas privadas, são referências em suas áreas de atuação. No Amazonas, conforme dados da Rede Amazônia em Prol do Empreendedorismo e da Inovação (Rami), existem 14 incubadoras de empresas. O diretor executivo do CIDE, José Grosso, recebe os estudantes da Universidade do Texas (EUA), no auditório

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XX Fórum de Ministros do Meio Ambiente da América Latina e do Caribe

Durante a vigésima reunião do Fórum de Ministros, concluida recentemente em Cartagena, decidiu-se criar uma plataforma regional para a cooperação em matéria de alterações climáticas

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s Ministros do Meio Ambiente da América Latina e do Caribe se comprometeram a acelerar a ação coletiva de uma série de prioridades que vão de mudanças climáticas e qualidade do ar para a biodiversidade e produtos químicos, menos de dois meses da segunda Assembleia do Programa das Nações Unidas para o Ambiente, UNEA2, que se reunirá em Nairobi, Quénia, em maio. Os representantes de alto nível de 33 países apresentaram a Declaração de Cartagena, que concordou em fornecer liderança e contribuições para a implementação da dimensão ambiental da Agenda 2030 de Desenvolvimento Sustentável, bem como para UNEA, o fórum global para a tomada de decisões em torno do ambiente. O UNEA coloca o meio ambiente como uma questão global, como o primeiro colocado questões ambientais, ao mesmo nível que aqueles sobre paz, segurança, finanças, saúde e comércio. A primeira reunião do UNEA foi realizada em Nairobi, em Junho de 2014. A segunda reunião será presidida pela América Latina e do Caribe. O Fórum de Ministros decidiu nomear

Durante a reunião do Fórum de Ministros, em Cartagena

como Presidente da Costa Rica UNEA-2 e Barbados como um dos Vice-Presidentes. Na sessão de encerramento da vigésima reunião do Fórum de Ministros do Meio Ambiente da América Latina e do Caribe, organizada pelo Governo da Colômbia, os Ministros aprovaram a atualização da Iniciativa Caribenha para o Desenvolvimento Sustentável da América Latina e, ILAC, que sublinha a precisão de promover a ação coOs ministros comprometeram-se a promover o “funcionamento saudável dos ecossistemas como global, transversal e fundamental condição essencial para um futuro melhor e mais justo para todos, essencial para o desenvolvimento sustentável e a erradicação da pobreza”.

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letiva rápida, ambiciosa e integrada. Os ministros comprometeram-se a promover o “funcionamento saudável dos ecossistemas como global, transversal e fundamental condição essencial para um futuro melhor e mais justo para todos, essencial para o desenvolvimento sustentável e a erradicação da pobreza”. Durante o Fórum a urgência de cumprir a promessa do Acordo de Paris de limitar o aquecimento global a 2 ° C neste século e assegurar a provisão de recursos financeiros novos e adicionais e transferência de tecnologia dos países desenvolvidos também foi enfatizada ajudar a região a reduzir suas emissões de gases de efeito estufa. Os ministros concordaram em estabelecer uma plataforma de cooperação regional sobre mudanças climática para a América Latina, que será composto de três áreas prioritárias: (1) o diálogo e a troca de experiências sobre as políticas públicas do clima, (2) a ação climática na adaptação, mitigação e perdas e danos e (3) financiamento e meios de implementação, incluindo a transferência do clima e da revistaamazonia.com.br

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Autoridades ambientais dos 33 países da América Latina e do Caribe no XX Fórum de Ministros do Meio Ambiente

Os ministros concordaram em estabelecer uma plataforma de cooperação regional sobre mudanças climática para a América Latina

capacidade de promover a cooperação regional em tecnologia de mudança climática. Eles também concordaram em estabelecer uma rede intergovernamental para fortalecer a gestão ambientalmente racional de produtos químicos e resíduos, reforçar a cooperação sub-regional e regional e facilitar o intercâmbio de experiências. Os ministros decidiram promover o aumento dos esforços em informação de qualidade do ar, no âmbito do Plano de Ação Regional sobre a poluição atmosférica aprovada pelo Fórum de Ministros em seu número de reunião XIX. Isto inclui recomendações para reduzir as emissões dos principais poluentes, incluindo poluentes

climáticos de curta duração, SLCPs, tais como metano e hidrofluorocarbonetos. América Latina e do Caribe continuam a apoiar a implementação do Programa-Quadro para o Consumo e Produção Sustentáveis (10YFP) e promover a educação ambiental e atividades de formação, incluindo questões de estilos de vida sustentáveis e liderança. Os ministros também reiteraram o seu compromisso de trabalhar no sentido de alcançar a plena aplicação do Princípio 10 da Declaração do Rio sobre Meio Ambiente e Desenvolvimento na América Latina e no Caribe. Eles também expressaram seu apoio ao Governo do México como o próximo presidente e anfitrião da COP13 da Convenção sobre a Diversidade Biológica, e chamou a promover ações destinadas a integrar o uso sustentável da biodiversidade nas políticas sectoriais em áreas-chave como a agricultura, silvicultura, pesca e turismo. Finalmente, o Fórum de Ministros insistiu em promover o fortalecimento do PNUMA em nível regional e recomendou que este programa vai expandir a sua cooperação com os países e estimular parcerias que podem incluir o setor privado e outras partes interessadas a contribuir para a mobilização de recursos. Argentina e Paraguai será o anfitrião da Reunião XXI do Fórum em 2018.

Achim Steiner, diretor do Programa das Nações Unidas para o Meio Ambiente (PNUMA)

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Uma década de avanços em biotecnologia Lei de Biossegurança completa 10 anos dialogando com as mais recentes descobertas da ciência por Walter Colli*

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o longo de 2015, uma silenciosa revolução biotecnológica aconteceu no Brasil. Neste ano a Comissão Técnica Nacional de Biossegurança (CTNBio) analisou e aprovou um número recorde de tecnologias aplicáveis à agricultura, medicina e produção de energia. O trabalho criterioso dos membros da CTNBio avaliou como seguros para a saúde humana e animal e para o ambiente 19 novos transgênicos, dentre os quais 13 plantas, três vacinas e três microrganismos ou derivados. A CTNBio, priorizando o rigor nas análises de biossegurança e atenta às necessidades de produzir alimentos de maneira mais sustentável aprovou, no ano passado, variedades de soja, milho e algodão tolerantes a herbicidas com diferentes métodos de ação. Isso permitirá que as sementes desenvolvam todo seu potencial e que os produtores brasileiros tenham mais uma opção para a rotação de tecnologias no manejo de plantas daninhas. Sem essa ferramenta tecnológica, os agricultores ficariam reféns das limitações impostas pelas plantas invasoras. As tecnologias de resistência a insetos proporcionam benefícios semelhantes. Na área da saúde, a revolução diz respeito aos métodos de combate a doenças que são endêmicas das regiões tropicais. Mais uma vez, mostrando-se parceira da sociedade, a CTNBio avaliou a biossegurança de duas vacinas recombinantes contra a Dengue em regime de urgência e deu parecer favorável

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10 anos são apenas o início de uma longa história de desenvolvimento e inovação no Brasil

a elas. Soma-se a estes esforços a aprovação do Aedes aegypti transgênico. O mosquito geneticamente modificado aprovado em 2014 tem se mostrado um aliado no combate ao inseto que, além de ser vetor da dengue, também está associado a casos de transmissão dos vírus Zika, Chikungunya e da febre amarela. Nos últimos 10 anos, até o momento, o advento da nova CTNBio pela Lei 11.105 de 2005 – a Lei de Biossegurança - proporcionou a aprovação comercial de 82 Organismos Geneticamente Modificados (OGM): 52 eventos em plantas; 20 vacinas veterinárias; 7 microrganismos; 1 mosquito Aedes aegypti; e 2 vacinas para uso humano contra a Dengue. Essas liberações comerciais são a maior prova de que o Brasil lança mão da inovação para encontrar soluções para os desafios da contemporaneidade. Entretanto, é necessário enfatizar que assuntos não relacionados com Ciência também se colocaram, como em anos anteriores, no caminho do desenvolvimento da biotecnologia em 2015. Manifestantes anti-ciência invadiram laboratórios e destruíram sete anos de pesquisas com plantas transgênicas de eucalipto e grupos anti-OGM chegaram a interromper reuniões da CTNBio, pondo abaixo portas com ações truculentas. Diversas inverdades foram

publicadas na tentativa de colocar em dúvida a segurança e as contribuições que a transgenia vem dando para a sociedade. A ação desses grupos preocupa, pois, se sua ideologia for vitoriosa, tanto o progresso científico quanto o PIB brasileiros ficarão irreversivelmente prejudicados. Hoje, a nossa Lei de Biossegurança é tida internacionalmente como um modelo de equilíbrio entre o rigor nas análises técnicas e a previsibilidade institucional necessária para haver o investimento. O reconhecimento global, o diálogo com a sociedade e a legitimidade dos critérios técnicos mostram que esses 10 anos são apenas o início de uma longa história de desenvolvimento e inovação no Brasil.

[*] Graduado em Medicina pela Universidade de São Paulo (USP), doutor em Bioquímica pela Faculdade de Medicina e Livre-Docente pelo Instituto de Química da USP. Possui pós-doutorado pela The Public Health Research Institute of the City of New York. Foi presidente da Academia de Ciências do Estado de São Paulo e da Comissão Técnica Nacional de Biossegurança (CTNBio). É colaborador sênior do Instituto de Química da USP

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Biotecnologia: ciências em colaboração por Flávio Finardi¹, Leila Macedo², Walter Colli³

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iversos especialistas concordam que as biociências estarão entre as áreas que mais vão atrair investimentos e profissionais ao longo deste século. Nesse cenário, a biotecnologia se destaca pelo seu caráter inovador e pela elevada potencialidade de gerar novos produtos para o progresso da agricultura, da geração de energia e da saúde humana e animal. Entretanto, exatamente por ser um campo relativamente recente, o desenvolvimento de novas tecnologias neste segmento depende da colaboração entre diversos setores. Ao longo da formação do profissional de biotecnologia, há um constante estímulo ao desenvolvimento de produtos. Apesar disso, a maior parte dos currículos não é focada nos mecanismos necessários para a obtenção de patentes, para atender ao processo regulatório brasileiro e em questões mercadológicas. Embora os pesquisadores possuam o conhecimento técnico, nesse modelo, para chegarem a uma aplicação comercialmente viável, devem recorrer a parcerias com outras instituições e empresas que, tradicionalmente, possuem essa experiência. Além disso, a biotecnologia é uma aplicação da ciência que exige tempo e recursos. De acordo com levantamento realizado por Phillips McDougall, para que uma nova planta transgênica esteja disponível ao consumidor são necessários, em média, 13 anos. Nesse período, aproximadamente US$ 136 milhões são investidos. Essa é mais uma razão pela qual é necessário estabelecer cooperações para que os cientistas consigam desenvolver produtos que alcancem o mercado. Não faltam exemplos bem-sucedidos dessa interação. Nos Estados Unidos, por exemplo, a parceria entre Universidade do Havaí e uma empresa de sementes transgênicas levou ao mercado uma variedade de mamão resistente a um vírus endêmico no arquipélago. A Universidade de Nottingham, no Reino Unido, em conjunto com a iniciativa privada, também estuda variedades transgênicas de frutas. Na América Latina, a Universidade Nacional do Litoral da Argentina é a responsável pela identificação dos genes que expressam a tolerância revistaamazonia.com.br

ao estresse hídrico em uma soja transgênica recentemente aprovada. Uma empresa local introduziu o gene no vegetal. No Brasil, é também com base na colaboração que a Embrapa, uma instituição pública de pesquisa, está desenvolvendo e lançando produtos biotecnológicos. Em parceria com a Agência de Cooperação Internacional do Japão e da Universidade de Nagoya, a empresa brasileira está em fase avançada na obtenção de cultivares de soja tolerantes à seca. Resultado de um modelo semelhante, após 20 anos de trabalho da Embrapa e da BASF, foi lançada, em 2015, uma soja geneticamente modificada (GM) tolerante a herbicidas da classe das imidazolinonas. A relação entre a iniciativa privada e o setor público é cada vez mais atual e relevante para a sociedade. Não cabe mais a simplificação que restringe o público à hipotética vocação para pesquisa de base e o privado à aplicação desse conhecimento no desenvolvimento de produtos. Parcerias entre esses setores, realizadas de maneira transparente e regulamentada, já resultaram no lançamento de diversas inovações inovadores em todo o mundo. De fato, no cenário atual, em que há um grande fluxo de informações, a interação entre a acade-

mia e a indústria tem se tornado cada vez mais intensa, levando a uma saudável troca de experiências. Quando estamos tratando de ciências que estão na fronteira do conhecimento como aquelas que subsidiam a biotecnologia, a independência dos cientistas deve ser avaliada à luz dessa realidade. O fato de um pesquisador ter colaborado com uma empresa em algum momento de sua carreira não prejudica, necessariamente, a natureza autônoma de sua atividade, tampouco o torna vinculado à empresa. Ao contrário, revela sua capacidade de estabelecer interações multidisciplinares, de potencializar o número de oportunidades e possiblidades de resultados efetivos para a sociedade. [*] [1] Flávio Finardi, Ph.D. em Ciência dos Alimentos, professor associado da Faculdade de Ciências Farmacêuticas da Universidade de São Paulo (USP) e presidente da CTNBio entre fevereiro de 2012 e fevereiro de 2014. [2] Leila Macedo, Ph.D. em Microbiologia e Imunologia, presidente da Associação Nacional de Biossegurança (ANBIO) e presidente da CTNBio entre setembro de 1999 e março de 2001. [3] Walter Colli, Ph.D. em Bioquímica, professor Emérito do Instituto de Química da Universidade de São Paulo (USP) e presidente da CTNBio entre março de 2006 e janeiro de 2010.

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Biodiversidade, bioprospecção e inovação no Brasil por Vanderlan da S. Bolzani*

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química de produtos naturais sempre teve papel relevante para o desenvolvimento de fármacos, cosméticos, fragrâncias, e outros bioprodutos, dado a diversidade estrutural e grupos funcionais presentes em milhares de substâncias que compõem a biodiversidade terrestre. Este imenso laboratório químico altamente sofisticado também desempenha um papel importante na conservação e no uso sustentável da diversidade biológica, especialmente por que são essas substâncias essenciais aos processos biológicos de regulação celular, comunicação química e defesa. Sob este aspecto, a biodiversidade brasileira, incluída entre as maiores do planeta é ainda pouco explorada, sendo que bioprodutos de grande impacto, capazes de gerar riqueza e contribuir para a balança econômica nacional ainda estão no plano dos desejos. Os países desenvolvidos, mesmo não sendo grandes detentores da biodiversidade terrestre, nunca tiveram duvidas sobre a riqueza molecular escondida na natureza, exemplo disto é a quantidade de medicamentos no mercado mundial, inspirados nos produtos naturais, como antitumorais, ou fármacos para o tratamento de doenças cardíacas ou do sistema nervoso central (SNC) ou da diabetes, antinflamátorios, antivirais etc. A industria de cosméticos e fragrâncias comercializa uma quantidade significativa de produtos baseados em inovações a partir de substâncias naturais, exemplo recente é um derivado semissintético produzido a partir de ácido jasmônico, extraído do óleo de jasmim e utilizado em creme antiidade e muitos outros produtos imprescindíveis para a melhora da qualidade de vida humana. Isso tem contri-

Vanderlan da S. Bolzani, Professora titular do Instituto de Química da Universidade Estadual Paulista (Unesp), vice-presidente da SBPC e membro da Academia Brasileira de Ciências (ABC)

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As primeiras descobertas de bioprodutos da biodiversidade brasileira datam de 1533

buido para a economia de países detentores das inovações oriundas da biodiversidade que, em muitos casos, está geograficamente situada além de suas fronteiras. O Brasil, detentor de uma das maiores riquezas naturais do planeta, não pode se orgulhar de uma bioeconomia vigorosa e baseada em inovações a partir da sua rica biodiversidade - uma fábrica natural sofisticada de substâncias de classes diversas e estruturas químicas inusitadas que teria, se bem aproveitada, um potencial enorme para inovações radicais e incrementais para os setores de fármacos, cosméticos, fragrâncias, agroquímicos e suplementos alimentares. Nos últimos 15 anos, muitas discussões, tanto do lado acadêmico quanto empresarial, foram levantadas, convergindo a um mesmo consenso: o atraso em inovações a partir de produtos naturais e derivados oriundos da nossa rica biodiversidade deveu-se, em parte, aos entraves burocráticos causados pela edição, em 2000, da Medida Provisória (MP) 2050, reeditada como MP2186 - 16/2001, pelo governo federal, referente ao acesso ao patrimônio genético, aos

saberes tradicionais, proteção e à repartição de benefícios. Naquela época, a MP foi a resposta do governo ao apelo de setores significativos da sociedade frente às denúncias levantadas na época, devido ao contrato firmado entre uma multinacional e o Centro de Pesquisa da Amazônia, julgado inapropriado na equidade das partes envolvidas, em prejuízo do lado brasileiro! Como pesquisadora, atuando na área da química de produtos naturais há 40 anos, vivenciei os problemas que a MP causou aos pesquisadores que atuam na química de produtos naturais, farmácia, farmacologia e áreas correlatas durante esse tempo. Sempre fui defensora de uma lei que fosse capaz de proteger nossas riquezas naturais - um legado que, além de ser motivo de orgulho para o país, deve ser defendido. No entanto, uma lei que dificultava as pesquisas sobre nossa diversidade biológica e química, atrasando a geração de conhecimento sobre os nossos biomas e organismos, me levou a participar ativamente de várias discussões em Brasília e escrever vários textos, especialmente quando o programa Biota, de mapeamento da biodiversidade paulista, foi lançado pela revistaamazonia.com.br


Fundação de Amparo à Pesquisa do Estado de São Paulo (Fapesp) em 1998. Nesta ocasião juntamente com colegas das três universidades públicas paulistas (Unesp, USP e Unicamp), do Instituto de Botânica (IBt) e da Universidade Federal do Ceará (UFC) iniciamos o projeto temático Bioprospecção de plantas do Cerrado e da Mata Atlântica do estado de São Paulo. Diante das limitações da pesquisa de bioprospecção, ou dos entraves decorrentes da MP, após a sanção da Lei nº 13.123, em 20 de maio de 2015, pela presidente Dilma Rousseff, não me via capaz de emitir comentários que, mesmo com pontos ainda controversos, beneficia os cientistas e principalmente setores industriais que exploram produtos a partir da biodiversidade. Mas, diante de fatos históricos e da situação atual, é possível perceber que a Lei de Acesso à Biodiversidade não é o maior entrave para que o setor industrial desenvolva inovação com ativos da biodiversidade. É preciso que as inúmeras discussões e seminários acadêmicos e empresariais sobre bioeconomia possam incentivar os setores acadêmicos, governamentais e empresariais a montarem uma agenda para inovação industrial baseada em produtos naturais e derivados a partir da nossa biodiversidade. As primeiras descobertas de bioprodutos da biodiversidade brasileira datam de 1533, quando os portugueses aqui chegaram. Os novos conquistadores, na busca por espécies de plantas para exploração econômica, descobriram a Caesalpinia echinata, o pau-Brasil, uma fonte de corante vermelho (brasilina, brasilidina) valiosa, o primeiro exemplo de produtos naturais de valor agregado mas que não trouxe qualquer impacto econômico ao país, restando-nos apenas herdar o nome Brasil para a terra recém-descoberta. Inúmeros outros exemplos dariam algumas páginas escritas, mas destaco a Chondro-dendron tomentosa, MenisperA biodiversidade brasileira, incluída entre as maiores do planeta é ainda pouco explorada, sendo que bioprodutos de grande impacto, capazes de gerar riqueza e contribuir para a balança econômica nacional ainda estão no plano dos desejos

Diante das limitações da pesquisa de bioprospecção...

maceae. Uma das espécies de curares conhecidas da Amazônia. A tubocurarina, um dos alcaloides isolados desta espécie usada pelos indígenas, inspirou o desenvolvimento de uma classe de coadjuvantes anestésicos: o derivado sintético Atracurium (®Tracurium) é outro exemplo que mostra que o país não logrou divisa econômica. Nos anos 1960, pesquisas realizadas pelo professor Sergio Ferreira sobre venenos da cobra Bothrops jararaca, resultou no peptídeo bradiquinina, um inibidor da enzima conversora da angiotensina. O Captopril, um medicamento mundialmente consagrado, foi planejado por um sofisticado estudo de química medicinal a partir da bradiquinina. Voltando aos dias atuais, especialmente depois da sansão da Lei de Acesso ao Patrimônio Genético, pela presidente Dilma, tenho participado de vários seminários, onde a discussão gira em torno da bioeconomia e, portanto, do potencial econômico que a nossa rica biodiversidade pode render ao país e

do entusiasmo mostrado por pesquisadores e gestores sobre a inovação com base na biodiversidade brasileira. Tendo me dedicado à pesquisa sobre os produtos naturais, não tenho qualquer duvida sobre o valor científico desta área para promover inovação tecnológica e riqueza econômica e social. No entanto, a industrialização de bioprodutos a partir de moléculas extraídas da biodiversidade é, como toda inovação, um processo complexo e de risco. Na explosão de biodiversidade, como bem comentou em várias matérias o jornalista Marcelo Coelho, há uma tarefa árdua de pesquisa e garimpo visando a viabilização de produtos. A natureza é uma fonte de inspiração, mas como reproduzir, em escala comercial, moléculas de alta complexidade? Como domesticar plantas nativas pouco investigadas, como as dos ambientes tropicais e equatoriais? São questões importantes e, muito embora o setor industrial brasileiro venha se modernizando, incorporando pesquisa em seus portfólios, estas pesquisas ainda são muito tímidas e o setor não é afeito ao risco. Com isso, temos contabilizadas, nos últimos 30 anos, ainda poucas inovações oriundas da rica diversidade biológica brasileira, mesmo com o avanço científico alcançado pelo país - na química, farmacologia, química farmacêutica e biologia molecular - e com todos os esforços do lado empresarial. Nossa biodiversidade segue sendo um desafio instigante para os que acreditam na bioeconomia como força propulsora da indústria nacional. [*] Professora titular do Instituto de Química da Universidade Estadual Paulista (Unesp), vice-presidente da SBPC e membro da Academia Brasileira de Ciências (ABC)

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Centro de Biotecnologia da Amazônia será uma Organização Social Fotos: Layana Rios

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Centro de Biotecnologia da Amazônia (CBA) será uma Organização Social (OS) gerida, de forma conjunta, pelos ministérios do Desenvolvimento, Indústria e Comércio Exterior (MDIC) e de Ciência, Tecnologia e Inovação (MCTI). A informação foi dada pelo secretário de Inovação e Novos Negócios do MDIC, Marcos Vinícius de Souza, durante a abertura do seminário “Discutindo o futuro do CBA”, realizado recentemente no auditório do Centro. A definição da identidade jurídica do CBA levou em consideração o foco de atuação desejado para o Centro e a escolha dos ministérios gestores se deu de acordo com seus expertises e com o que se pretende para o CBA, inserindo-o cada vez mais no cenário empresarial e tratando sua atividade como um negócio. “Em menos de um ano de gestão compartilhada do CBA entre MDIC, SUFRAMA e Inmetro, con-

Centro de Biotecnologia da Amazônia-CBA

seguimos encaminhar sua reestruturação, atendendo a uma solicitação expressa do

ministro do Desenvolvimento, Armando Monteiro, que vem tratando este assunto

Durante o seminário conduzido por especialistas que buscaram apresentar propostas para o aprimoramento das atividades do CBA

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com a máxima importância. Agora, com a união de competências dos dois ministérios (MDIC e MCTI), vamos utilizar todo o conhecimento e ‘poder de fogo’ das duas instituições para que possamos desenvolvê-lo plenamente e definir seu plano de trabalho”, afirmou o dirigente. O secretário de Políticas e Programas de Pesquisa e Desenvolvimento do MCTI, Bruno César, disse que essa definição de atuação conjunta com o MDIC na região “demonstra a importância da Amazônia para o Ministério de Ciência e Tecnologia, que tem total interesse na questão CBA. Temos toda essa capacidade instalada (do Centro) e queremos melhor aproveitá-la”. O superintendente adjunto de Planejamento e Desenvolvimento Regional da SUFRAMA, Marcelo Pereira, ressaltou que a criação da OS permitirá “dar mais liberdade de investimento ao Centro, contribuindo positivamente com sua maior inserção no mercado”. Pereira ainda afirmou que as discussões propostas pelo seminário realizado nesta quarta-feira são de grande relevância para nortear as atividades do CBA. “Todo plano de negócios será definido a partir das contribuições dos especialistas que estão aqui presentes neste seminário para debater sobre o Centro”, pontuou.

O diretor de Metrologia Aplicada às Ciências da Vida do Inmetro, José Mauro Granjeiro, comentou sobre a oportunidade que o instituto tem – ao lado do MDIC e da SUFRAMA – de estar presente no desenvolvimento das atividades do CBA, utilizando toda experiência do Inmetro em favor da execução de ações voltadas a inovações biotecnológicas. “Temos o compromisso formal de contribuir com este processo”, frisou Granjero. Na participação inicial dos representantes do MDIC, MCTI, SUFRAMA e Inmetro

MANAUS JÁ PODE CONTAR COM AS VANTAGENS DE UM ESCRITÓRIO COMPARTILHADO.

O secretário de Inovação e Novos Negócios do MDIC, Marcos Vinícius de Souza, disse que o CBA será uma Organização Social (OS) gerida, de forma conjunta, pelos ministérios do Desenvolvimento, Indústria e Comércio Exterior (MDIC) e de Ciência, Tecnologia e Inovação (MCTI)

O seminário Após a participação inicial dos representantes do MDIC, MCTI, SUFRAMA e Inmetro, o seminário foi conduzido por especialistas que buscaram apresentar propostas para o aprimoramento das atividades do CBA. Depois de uma breve apresentação do status atual do Centro de Biotecnologia da Amazônia, especialistas do Laboratório Nacional de Biociências, do Serviço Nacional de Aprendizagem Industrial (Senai), do grupo Cristália e do Centro de Tecnologia Canavieira colocaram em pauta sugestões sobre o CBA aos cerca de 100 presentes ao evento – entre pesquisadores, representantes de entidades de classe e órgãos governamentais e demais interessados no tema –, baseando-os com informações para fomentar os grupos de discussão que compuseram a segunda etapa do seminário, ocorrida no período da tarde.

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Tem muitas coisas a serem exploradas

Biodiversidade da Amazônia: cura e beleza que vêm da floresta Nova lei promete regularizar coleta de sementes e facilitar trabalho dos pesquisadores por Celso Freire

Fotos: Agência Pará, Ascom Sedeme, Divulgação, Sebrae

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ma nova lei promete facilitar a vida dos profissionais que vivem da pesquisa e dos empresários que comercializam produtos oriundos das plantas e animais da região Amazônica. A aposta é o chamado marco da biodiversidade, como é conhecida a lei 13.123, de 20/05/2015. Ela está em vigor desde novembro do ano passado e ainda gera dúvidas. A lei define as regras para o acesso aos recursos da biodiversidade por pesquisadores e indústria e regulamenta o direito dos povos tradicionais à repartição de benefícios pelo uso de seus conhecimentos da natureza. Cerca de 300 povos devem ser beneficiados. O engenheiro florestal e doutor em Desenvolvimento Sustentável, Rogério Marcos Magalhães, participou do processo que culminou com a aprovação desta lei da biodiversidade no congresso nacional. Segundo ele, o objetivo é melhorar a relação entre a indústria, a comunidade e a natureza: “Esse material, essa matéria prima que a 36

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indústria de cosmético, isso é que a lei vem tentando regulamentar para que use bem, sem trazer prejuízo para a natureza. Rogério Magalhães, que também é analista ambiental do Ministério do Meio Ambiente, esteve em Belém, no final do mês de fevereiro, para participar de um debate que trata jus-

tamente do Marco legal da biodiversidade, promovido pelo Sebrae/ Pará. Segundo Rogério, a região norte tem um vasto material que serve de matéria prima para a indústria brasileira. “É um potencial muito grande que pode oferecer para a indústria”. Pela nova lei, empresas internacionais revistaamazonia.com.br


Analista de Projetos do Sebrae Nacional Maria Regina Diniz aprovou a lei da biodiversidade

duzidos no norte, ainda são iguais aos produzidos no sul do país. Falta o diferencial. “Os estados estão sem fazer uma referência forte. Na hora de fazer, a reação é mais lenta”, disse Regina. Além do benefício para as indústrias, a nova lei da biodiversidade tende a diminuir a burocracia na área acadêmica ao substituir o pedido de autorização por um cadastro de pesquisa, o que evita que cientistas sejam acusados de biopirataria. A pesquisadora do curso de Farmácia da Universidade Federal do Pará, Marciene de Andrade afirma que ainda há muitos pontos que precisam ser esclarecidos, mas houve um grande avanço com a lei da biodiversidade.

Arranjo produtivo local de biocosméticos vai impulsionar produção

Indústria de olho no mercado paraense

O Projeto Sebrae Nacional estrutura a cadeia de “Cosméticos de Base Florestal da Amazônia”, envolvendo uma rede de conhecimento, pesquisa e inovação

sem vínculos com instituições nacionais ficam proibidas de enviar patrimônio genético para o exterior. A Analista de Projetos do Sebrae Nacional, Maria Regina Diniz, ressalta que o estado do Pará tem todas as condições de alavancar o setor da biodiversidade e ser referência para o Brasil. Os

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paraenses, segundo ela, tem todas as condições de trabalhar a biodiversidade e vai ser uma referência para o país. Mas, apesar desse potencial enorme, os sete estados da região amazônica ainda não perceberam a riqueza em suas terras. Regina Diniz explica que os produtos pro-

Que a Região Amazônica é rica em matéria prima no ramo da biodiversidade, todo mundo já sabe. Mas, parece que os próprios nativos ainda não se atentaram para esse fato. A indústria do cosmético de outras regiões do país já está de olho nesse filão, assim como a indústria farmacêutica. Mas, o mercado local de biocosméticos ainda não alavancou na Amazônia. A tendência é melhorar com o advento da nova lei da biodiversidade. Pelo menos é o caso do empresário acreano Renato Souza Santos, que resolveu incrementar os produtos de higiene que vende para o setor hoteleiro dos estados do Acre e Rondônia. Ele está confiante. “O meu desafio é aplicar essa produção regional à rede hoteleira. Preciso ter um diferencial e ele é exatamente o uso de base vegetal

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A Chamma da Amazônia, que integra o APL de Biocosméticos paraense, comercializa um mix de artigos, como xampus, perfumes e condicionadores

Presidente do Sinqfarma, Fátima Chamma, diz que o momento é propício para a retomada do crescimento

e óleo da Amazônia”, disse o empresário. Assim como Renato Santos, outros empresários do ramo da beleza estão respaldados em dados divulgados pela Associação Brasileira da Indústria de Higiene Pessoal, perfumaria e cos-

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méticos. O setor tem apresentado um crescimento médio de 10% nos últimos 17 anos consecutivos, tendo passado de um faturamento de R$ 4,9 bilhões, em 1996 para R$ 34 bilhões em 2012. A empresária Fátima Chama, que preside o sindicato do setor de cosméticos no Pará, ressalta que a lei da biodiversidade deveria ter sido ela-

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borada com maior participação de representantes da região norte, o que não aconteceu, segundo Fátima. Mas, apesar das dúvidas sobre a nova lei da biodiversidade, Fátima está confiante. Ela, que é sócia-fundadora da empresa Chamma da Amazônia, com sede em Belém do Pará, diz que este é o momento propício para a retomada do crescimento, por isso, todos devem se atentar produtos da Amazônia. “Tem muitas coisas a serem exploradas”, disse. Segundo dados da Embrapa, a região amazônica detém 21% da biodiversidade mundial. Para as grandes empresas do mundo que estão entre U$ 180 bilhões de negócios de consumo, a Amazônia é o negócio do presente e do futuro. Mas, o Ibama está de olho nesse interesse. Apesar da lei da biodiversidade ter entrado em vigor há apenas quatro meses, o órgão garante que está pron9 to para defender o meio ambiente, como afirmou

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Sementes e frutos secos: 1. seringa barriguda 2. seringa verdadeira 3. paxiúba 4. olho de boi 5. jarina 6. olho de cabra 7. lágrima de Nossa Senhora 8. inajá 9. buiuçu 10. andiroba 11. buriti 12. jatobá 13. açaí 14. tucumã 15. arapari 16. jutaí 17. paricá revistaamazonia.com.br


o superintendente substituto do Ibama, Luiz Paulo Castro. “Mas o objetivo principal é a regularização ambiental da atividade”. O Ibama é o órgão executor da política nacional do meio ambiente e tem poder de polícia ambiental. Ele poderá fazer notificação e autuação, mas segundo o superintendente Luiz Castro, o objetivo primeiro é orientar as empresas.

Cooperativas vivem do comércio de sementes Além de impulsionar a indústria, o mercado da matéria prima retirada da floresta gera renda extra e emprego para agricultores da região amazônica. A nova lei da biodiversidade promete beneficiar as diversas comunidades que sobrevivem do extrativismo. Dessas comunidades surgiram várias

com a Associação Movimento de Mulheres de Belém, da ilha de Cotijuba, Cooperativa Agrícola Resistência e a Cooperativa Campo Limpo, da cidade de Santo Antônio do Tauá. O Sebrae, que atende os microempresários através da Unidade de Indústria, Projeto Estruturante de Cosméticos de Base Florestal da Amazônia, já sabe que a nova lei da biodiversidade vai afetar toda uma cadeia produtiva na região. Por isso, segundo o gerente da unidade de indústria do Sebrae/ Pará, Marcelo Araújo, o órgão está pronto a ajudar os empresários com projetos específicos. “Nós temos um projeto que trabalha com grupos de empresas e agora vamos trabalhar com as comunidades. É uma informação nova (Lei da biodiversidade) que afeta o mercado de trabalho. Nosso papel é a divulgação”. O governo do Estado também se prontificou em ajudar os empresários e as comunidades a se adequarem ao marco legal da biodi-

Presidente Dilma Rousseff assinou a nova lei da biodiversidade

versidade, por meio da secretaria de ciência e tecnologia. A ideia é incentivar a produção de cosméticos, por exemplo. O representante da secretaria, Edvanildo Camarão ressaltou que as ações devem beneficiar também a sociedade civil e as instituições de ensino e pesquisa. “Aqui a gente tem uma infinidade de produtos para fazer cosméticos na região. Temos que trabalhar trazendo as comunidades para junto das empresas e tentar organizar tudo isso”, finalizou o representante do governo estadual.

Sementes da floresta amazônica dispersadas pelos rios

cooperativas que buscam organizar a coleta dessas matérias que são repassadas para as indústrias. Um exemplo é a Cooperativa dos Produtores Extrativistas Florestais e Marinho do Arquipélago do Marajó, com sede em Salvaterra, no interior do Pará. Os agricultores começaram apenas coletando semente de andiroba. Hoje em dia, os produtos estão diversificados. Tudo começou com as mulheres para ajudar seus maridos na renda familiar. Segundo a gerente da cooperativa Tamires Cruz, hoje em dia o trabalho evoluiu: “já conseguimos fazer outras atividades, como por exemplo, trabalhamos com mudas de plantas”, exemplifica. Atualmente 40 famílias fazem parte da Cooperativa dos Produtores Extrativistas Florestais e Marinho da Ilha de Marajó, fundada em 2006. Mas, hoje em dia, o benefício chega a 75 famílias cadastradas e mais de dez comunidades. Os coletadores ainda sofrem com o baixo valor dos insumos vendidos. Uma família com dez pessoas, por exemplo, consegue no final do mês apenas um salário mínimo. Tamires Cruz, o trabalho é árduo. Todo esse trabalho não tem valor que se pague, mas melhorou muito, ou seja, mais de 50% em questão de valores. Temos que trabalhar de acordo com o mercado”, ressalta. A cooperativa do arquipélago do Marajó não está sozinha. O Pará ainda conta ainda revistaamazonia.com.br

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Assembleia Geral da ONU lança Década de Ação pela Nutrição Resolução teve apoio do Brasil, define para os próximos anos diversas iniciativas para a promoção da alimentação saudável Fotos: FAO, UN Photo/Manuel Elias

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Assembleia Geral da Organização das Nações Unidas (ONU) aprovou recentemente em Nova Iorque, EUA, resolução que define que o período de 2016 a 2025 é a Década de Ação pela Nutrição. O Brasil foi um dos 31 países que apresentaram a proposta. “Consideramos ser uma grande oportunidade para unir iniciativas e esforços para erradicar a fome e prevenir todas as formas de má nutrição”, afirmou o embaixador Antonio Patriota, representante permanente do país na ONU, ao defender a resolução no colegiado do organismo internacional. A Organização das Nações Unidas para Alimentação e Agricultura (FAO) reconhece que o Brasil é um dos países que mais reduziu a subalimentação nos últimos anos, saindo do Mapa Mundial da Fome em 2014. “Estamos ansiosos para se envolver neste processo, compartilhando informações sobre nossas políticas públicas e aprender com outras experiências”, destacou Patriota. A experiência brasileira em políticas pú-

blicas pode contribuir para a superação da fome no mundo. “O Brasil se tornou uma referência internacional em questão de políticas de segurança alimentar e nutricional”, afirmou o representante da Organização das Nações Unidas para Alimentação e Agricultura (FAO) no Brasil, Alan Bojanic, durante o lançamento do livro Superação da Fome e da Pobreza Rural: Iniciativas Brasileiras.

Assembleia Geral da ONU em Nova Iorque, que aprovou resolução que define o período de 2016 a 2025 como a Década de Ação pela Nutrição

Somente em 2015, o Ministério do Desenvolvimento Social e Combate à Fome (MDS) recebeu 61 delegações de 40 países para conhecer as políticas públicas brasileiras, tanto com seminários como em visitas de campo, para que eles pudessem ver as ações em funcionamento. As missões vieram predominantemente de países da América Latina (40%) e da África (35%). E representantes de Armênia, Camboja, Grécia, Holanda e Suíça foram pela primeira vez recebidos pelas equipes do ministério.

Novo ciclo A resolução da ONU também alerta os países para a alimentação saudável. “As crianças não conseguem colher plenamente os benefícios da escolaridade se não acessarem os nutrientes necessários; e as economias emergentes não atingirão seu pleno potencial se os trabalhadores estiverem croEm um cenário preocupante relacionado ao aumento das doenças crônicas e, para reverter a situação, devemos melhorar a qualidade da alimentação

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nicamente cansados por causa de uma dieta desbalanceada”, explicou José Graziano da Silva, diretor-geral da FAO. “É por isso que celebramos a Década de Ação pela Nutrição e estamos ansiosos para fazer dela um sucesso”. No debate que está sendo realizado entre o governo federal e a sociedade para elaborar as novas diretrizes que vão compor o Plano Nacional de Segurança Alimentar e Nutricional (PlanSAN) até 2019, o Brasil enfrenta novos desafios. “Agora temos um novo ciclo, com novos problemas relacionados à má-alimentação, ao sobrepeso e à obesidade que se espalha pelo país. Temos que atualizar a nossa estratégia a partir do diálogo e da construção conjunta”, afirma o secretário nacional de Segurança Alimentar e Nutricional do MDS, Arnoldo de Campos. Dados da Pesquisa Nacional de Saúde de 2015 demonstram que atualmente, um terço das crianças brasileiras está com sobrepeso, 56,9% da população adulta está com excesso de peso e destes, 21,3% estão obesos. Isto tem contribuído com a expansão de doenças crônicas, como diabetes, hipertensão, muitas delas decorrentes da má alimentação, e que são responsáveis 72% das mortes no Brasil. Preocupado com este quadro, um conjunto de políticas públicas e outras iniciativas de garantia de acesso a alimentos vem

sendo reforçado. Dentre elas, o governo federal, em parceira com organizações da sociedade e o setor privado, lançou neste mês de março a campanha Brasil Saudável e Sustentável. O calendário da campanha passa pelas Olimpíadas Rio 2016 e se estende até maio de 2017, com a realização de ações que estimulem as pessoas a refletir sobre os hábitos de consumo e a optar por escolhas alimentares cada vez mais saudáveis, demonstrando as vantagens do consumo de produtos locais, frescos, vindos da agricultura familiar, da produção orgânica ou agroecológica. E, desde novembro do ano passado, a

Antonio de Aguiar Patriota, representante permanente do Brasil junto à ONU, apresentando o projeto de resolução sobre a Década de Ação para a Nutrição

partir de decreto assinado pela presidenta Dilma Rousseff, a União, estados e municípios estão sendo sensibiliza dos para aderir ao Pacto Nacional para Alimentação Saudável, segundo a diretora de Estruturação e Integração de Sistemas Públicos Agroalimentares do MDS, Patrícia Gentil. “Não queremos entrar no Mapa do sobrepeso e da obesidade. Temos um cenário preocupante relacionado ao aumento das doenças crônicas e, para reverter a situação, devemos melhorar a qualidade da alimentação”.

As crianças não conseguem colher plenamente os benefícios da escolaridade se não acessarem os nutrientes necessários

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Nikolai Vavilov:

o primeiro guardião da biodiversidade vegetal

É pouco conhecido do grande público. Mas foi o primeiro cientista a perceber que, para salvar a humanidade da fome, era imperativo conservar a biodiversidade genética das plantas cultiváveis do mundo inteiro em “bancos de sementes”. Ironicamente, morreu de fome na prisão durante o estalinismo. por Ana Gerschenfeld *

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odos (ou quase) terão ouvido falar, nos media, do grande Cofre-Forte de Sementes Global de Svalbard, uma espécie de congelador gigante, de aspecto futurista, construído numa zona montanhosa do Ártico. Inaugurado em 2008, tem como objetivo proteger o maior número de espécies cultiváveis úteis do mundo – como feijões, arroz ou trigo –, contra as piores calamidades que possam acontecer, de forma a preservar o sustento alimentar da humanidade. Mas o que quase ninguém sabe é que essa ideia de preservação da biodiversidade agrícola nasceu há um século na cabeça de um cientista russo. Foi precisamente em 1916 que Nikolai Vavilov, biólogo, geneticista, geógrafo, agrônomo e especialista do melhoramento

Fotos: Dag Terje Filip Endresen/Nordgen; Christian Nicolai Bjørke

das espécies vegetais partiu para a Pérsia (atual Irã) na sua primeira expedição, para recolher sementes cultivadas em regiões mais e menos “exóticas”. Essa sua atividade intensa de exploração dos quatro cantos do globo continuaria ao longo da sua vida e conduziria à criação, já em 1924 em São Petersburgo (então Leningrado), do primeiro banco de sementes do mundo. “O sonho de Vavilov era acabar com a fome no mundo e o plano que tinha para o conseguir consistia em utilizar a ciência emergente da genética para gerar “super-plantas”, capazes de crescer em todos os locais e em todos climas – dos desertos de areia às gélidas tundras, durante secas ou inundações”. E para o poder fazer, o cientista precisava de trazer para o seu laboratório a diversidade genética global.

O sonho de Nikolai Vavilov, era acabar com a fome no mundo

A construção abriga amostras de sementes de mais de 20.000 plantas de 100 nações em de todo o mundo

Colecionador de plantas Nikolai Vavilov nasceu em Moscou, a 25 de novembro de 1887. O seu pai era um “próspero homem de negócios tornado milionário”, lê-se numa recensão de 1994, na revista Nature, da primeira da tradução em inglês (publicada em 1992) dos mais importantes trabalhos de Vavilov, coligidos sob o título de Origin and Geography of Cultivated Plants. Depois de acabar o curso no Instituto de Agricultura de Moscou, Vavilov passou quase um ano, entre 1913 e 1914, no Reino Unido, no laboratório de William Bateson, pioneiro da genética moderna – e que 42

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Biodiversidade Global - número de espécies de plantas vasculares

cunhara aliás a palavra “genética” em 1901. Quando estalou a Primeira Guerra Mundial, Vavilov regressou a Moscou e, na Universidade de Saratov, (cidade situada a uns 700 quilômetros a sudeste de Moscou, nas margens do rio Volga) começou a fazer investigações sobre a resistência das plantas às doenças, lê-se ainda na Nature, “virando-se depois para o estudo dos parentes selvagens das plantas cultivadas e formulando a ideia de que todas as plantas domesticadas tinham surgido em áreas de atividade humana na pré-história”. E foi para demonstrar esta hipótese que Vavilov organizou expedições “para sítios onde supostamente tinham assentado as povoações humanas mais antigas”. Identificou assim, primeiro cinco “centros de origem” das plantas cultiváveis. Mais tarde, esse número aumentou para sete ou oito (segundo as fontes). A paixão de Vavilov pelas plantas vinha de longe. “Vavilov começou a colecionar plantas durante a infância: tinha um pequeno herbário em casa”, escrevia em 1991 Barry Mendel Cohen (que fizera a sua tese de doutoramento sobre o cientista) num texto publicado na revista Economic Botany. “Contudo”, prossegue Cohen, “a primeira verdadeira expedição destinada à recolha de plantas foi a sua viagem à Pérsia em 1916” – em plena Primeira Guerra Mundial. Vavilov não fora recrutado pelo exército por razões de saúde e o Ministério da Agricultura decidira então enviá-lo em missão à Pérsia. Aquela expedição, que durou de maio a agosto, foi certamente uma aventura, salienta Cohen. “Primeiro, Vavilov ficou detido na fronteira durante três dias pelas autoridades russas, porque transportava com ele alguns manuais em alemão e mantinha um diário escrito em inglês” – um hábito que tinha adquirido durante a sua estadia no Reino Unido. Vavilov “foi acusado de ser um espião alemão e só foi libertado quando chegou a confirmação oficial da autenticidade dos seus documentos”, acrescenta Cohen.

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O ritmo sazonal da fotossíntese na floresta amazônica Fotos: Acervo pesquisador, Aline Lopes/INPA

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ma pesquisa recente explica a sazonalidade na fotossíntese da floresta na Amazônia Central. Liderado por Jin Wu durante seu doutorado na Universidade do Arizona, o estudo usou uma combinação de câmeras e dados de fluxo de gás carbônico entre a atmosfera e a floresta, registrados pelas torres do Programa de Grande Escala da Biosfera-Atmosfera na Amazônia (LBA), coordenado pelo Instituto Nacional de Pesquisas da Amazônia (Inpa/MCTI). “Já era conhecido que o gás carbônico da atmosfera é fixado pela floresta com maiores taxas no fim da estação seca e no início da chuvosa, e fixado com taxas menores no final da estação chuvosa e no início da seca”, diz o pesquisador do Inpa e coautor do artigo, Dr. Bruce Nelson. Segundo o pesquisador, a novidade está em demonstrar que esta sazonalidade da fotossíntese não ocorre apenas em função da variação da luz, da temperatura ou da umidade ao longo do ano. “Nos meses mais secos (entre junho e novembro) a floresta exibe uma troca acelerada das folhas. A quantidade de folhas nas copas das árvores não muda muito durante o ano, mas sua idade, sim”, explica o pesquisador. “Até o final da estação chuvosa, as folhas lançadas nos meses secos têm menos vigor, reduzindo a fotossíntese”, acrescenta Bruce Nelson. Para decifrar esta dinâmica das folhas, em 2010, os pesquisadores montaram câmeras automáticas em duas torres do LBA, Nos meses mais secos (entre junho e novembro) a floresta exibe uma troca acelerada das folhas. Imagens como esta, registraram as mudanças em centenas de coroas de árvores individuais sobre as estações do ano

Uma das torres do LBA, a 60 km de Manaus – AM, na Reserva Biológica do Cuieiras, uma área de floresta primária e de propriedade do INPA

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uma a 60 km de Manaus (AM), e outra na Floresta Nacional do Tapajós, a 67 km ao sul de Santarém, no Pará. Em 2013, foi equipada uma das torres do Observatório da Torre Alta da Amazônia (Atto), na Reserva de Desenvolvimento Sustentável (RDS) do Uatumã, a 150 quilômetros de Manaus. Os dados para as duas torres perto de Manaus foram analisados pelas mestrandas Suelen Marostica, Julia Tavares e Aline Lopes. “Gravamos um grande número de fotos em revistaamazonia.com.br


A novidade está em demonstrar que esta sazonalidade da fotossíntese não ocorre apenas em função da variação da luz, da temperatura ou da umidade ao longo do ano

Registros das torres do Programa de Grande Escala da BiosferaAtmosfera na Amazônia (LBA), coordenado pelo Instituto Nacional de Pesquisas da Amazônia (Inpa/MCTI)

O estudo usou uma combinação de câmeras e dados de fluxo de gás carbônico entre a atmosfera e a floresta, registrados pelas torres do LBA

Câmeras automáticas foram instaladas nas duas torres do LBA para decifrarem o ritmo sazonal da fotossíntese na floresta amazônica

“Estes modelos não incorporam os efeitos da fenologia foliar e, portanto, não conseguem reproduzir corretamente a variação sazonal da fotossíntese”, diz. A pesquisa foi financiada pela Parceria para Pesquisa e Educação Internacional (Pire) da Fundação Nacional de Ciências Norte-Amercana (US NSF); pela Fundação Agnese Nelms Haury da Universidade do Arizona; pelo projeto GoAmazon, financiado conjuntamente pelo Departamento de Energia Norte-Americano e pelas agências brasileiras de apoio à pesquisa dos Estados de São Paulo (Fapesp) e do Amazonas (Fapeam); pelo Ministério da Educação e Pesquisa da Alemanha (BMBF) e Ministério da Ciência, Tecnologia e Inovação (MCTI) do Brasil. A coleta de dados teve suporte do LBA/ Inpa e da Sociedade Max Planck, além da Universidade do Estado do Amazonas (UEA) e da RDS Uatumã. [*] Ascom Inpa

Jin Wu liderou a pesquisa sobre a sazonalidade na fotossíntese da floresta na Amazônia Central

cada dia do ano para facilitar a filtragem e a correção de artefatos de iluminação”, explica o pesquisador. Ele ressalta, ainda, que o ciclo das idades das folhas coincide muito bem com a sazonalidade do “verdor” da floresta captada anteriormente por satélites. Segundo Bruce Nelson, estes dados dos satélites provocaram polêmica entre os cientistas, pois são influenciados pelo ângulo do sol e pela nebulosidade, ambas com tendências sazonais. “Agora, as câmeras nos três sítios são concordantes entre si e concordantes com os dados dos satélites. A floresta se torna mais verde ao longo da estação seca, devido ao lançamento de forevistaamazonia.com.br

lhas novas”, diz. O pesquisador revela que em breve se terá um entendimento melhor das mudanças fisiológicas das folhas com a idade, já que as informações ainda estão sendo aprimoradas por um grupo de pesquisadores e mestrandos do Inpa, liderados pelo professor doutor da Universidade Federal do Amazonas (Ufam), Marciel Ferreira, dentro do projeto GoAmazon. Para o pesquisador doutor Scott Saleska, orientador de Jin Wu, a importância maior do estudo reside em demonstrar uma deficiência nos modelos que preveem a resposta da floresta às futuras mudanças climáticas. REVISTA AMAZÔNIA

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Durante as pesquisas

Alterações climáticas ameaçam organismos marinhos do Antártico Fotos: UC

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ma equipe de 11 cientistas de nove países (Alemanha, Argentina, Canadá, Espanha, Estados Unidos da América, França, Nova Zelândia, Portugal e Reino Unido) afirma que as alterações climáticas podem afetar grande parte do Antártico, tornando-se a sua acidificação num dos maiores problemas para os organismos marinhos que ali vivem. “No futuro, devido às alterações climáticas, a acidificação do Oceano Antártico poderá tornar-se num dos maiores problemas para os organismos marinhos que lá vivem”, alerta um estudo internacional, desenvolvido por especialistas de diversos países, afirma a Universidade de Coimbra (UC). A investigação visou “avaliar e quanti-

ficar” as alterações na Antártida, “uma das regiões do planeta que tem mostrado sinais de mudanças ambientais bastante rápidas e profundas”. Grande parte do Oceano Antártico “vai ser afetada por processos associados às alterações climáticas” e as áreas atingidas “vão ser maiores do que as observadas no passado”, sustentam os especialistas. A pesquisa revela também que “os fatores ambientais que causam stress ao ecossistema marinho do Oceano Antártico poderão chegar a 86%” de todo o oceano, acrescenta a UC. “Este foi o primeiro estudo a quantificar os múltiplos fatores ambientais que afetam o Oceano Antártico como um todo e a indicar quais as áreas que poderão ser mais atingidas no futuro”, salienta José Xavier,

do Centro de Ciências do Mar e do Ambiente da UC, cientista português envolvido na investigação. “As regiões costeiras junto ao continente, e particularmente a Península Antártica, vão ser as regiões mais afetadas por múltiplos stresses ambientais (como, por exemplo, degelo, aumento da temperatura e diminuição do gelo marinho)”, salienta José Xavier. O “maior desafio futuro será avaliar os efeitos destes fatores ambientais na vida dos animais, e em toda a cadeia alimentar, que vivem no Oceano Antártico e qual a severidade desses fatores nas diferentes regiões deste oceano”, alerta o cientista marinho, adiantando que os especialistas estão agora a trabalhar nesse sentido.

A pesquisa revela também que “os fatores ambientais que causam stress ao ecossistema marinho do Oceano Antártico poderão chegar a 86%

José Xavier, do Centro de Ciências do Mar e do Ambiente da UC

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Água limpa e energia através do sol

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m muitas partes do mundo, as pessoas ainda não têm acesso a água limpa. Isso faz com que o técnico Michael Fath, juntamente com sua equipe na KSB, realize pesquisas sobre o tema da extração de água através de energia solar. A luz solar é um presente diário para nós, diz Fath, que dirige o projeto inícial da bomba Solar da KSB, conduzindo pesquisas sobre o tema da extração de água através da energia solar, que é uma questão extremamente importante para os países que são estruturalmente fracos e menos prósperos. Em sua pesquisa, ele se concentra principalmente em regiões como a África, Índia e América do Sul. Devido a seus altos níveis de luz do sol, estes países oferecem condições ideais para extração de água por meio de energia solar – e se beneficiarão enormemente com o resultado.

Primeira luz solar, água potável, em seguida A irrigação utilizando o sol, que inicialmente soa como contradição, é muito fácil de implementar, graças à tecnologia solar. Esta é a forma como funciona na prática: um módulo solar capta a luz solar e produz eletricidade, que aciona uma bomba solar. Dependendo do débito de potência do motor da bomba, a bomba solar transporta para cima a água de uma profundidade de vários metros, como a de um poço. A água extraída deste modo pode ser usada de muitas maneiras diferentes, tais como para irrigar terrenos agrícolas e preparação de água potável. O desafio está em conseguir a bomba, que é conduzido diretamente pela energia solar, para o transporte de água, tanto quanto possível da superfície usando uma fonte de energia que flutua porque o sol não brilhar sempre com o máximo de intensidade.

Desinfecção solar de água

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Índia: rega de campos de arroz com energia solar A Índia, por exemplo, é um país com mais de 300 dias de sol por ano. Lá, eles podem contar com a luz solar, ao passo que o fornecimento de algumas zonas rurais da Índia com eletricidade ou combustível é muito mais difícil, explica Michael Fath. A energia solar dá aos agricultores um maior grau de independência, podendo eles usarem seus sistemas de bombas de forma completamente autónoma.

Usando a luz solar para recarregar smartphones

bém usa módulos solares para recarregar a bateria em sua moto. Os filhos de Michael Fath recarregam seus smartphones usando baterias especiais cujos módulos solares eles colocam suas janelas de sol por dia. Procurando uma alternativa eco-sustentáveis de carregar o seu telefone celular, câmera ou laptop? Tudo que você precisa é de um pouco de sol, e você pode facilmente carregar laptops, telefones celulares, câmeras e até mesmo baterias de carro! É tão fácil. Todo mundo pode fazer a sua parte”. Também para carregar o seu telefone celular, câmera ou laptop

Michael Fath configurou alguns módulos solares em seu jardim, que produzem energia suficiente para abastecer o meu aparelho de televisão por algumas horas por dia”, explica o técnico. Além disso, ele tam-

Para usar a luz solar para purificar a água. Com pouca luz solar o dispositivo movido a energia solar poderia tornar o processo acessível para os milhões de pessoas ao redor do mundo que não têm água corrente REVISTA AMAZÔNIA

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9º Congresso Gife Fotos: Divulgação GIFE/Guilherme Tamburus

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ais de 800 pessoas – entre empresários, investidores sociais, consultores, especialistas, pesquisadores, representantes de organizações não-governamentais, gestores públicos e demais interessados – tiveram a oportunidade de participar de cerca de 100 atividades promovidas durante o Congresso, tanto na programação oficial, quanto na aberta, além das realizadas ao longo da Semana do Investimento Social, iniciativa que levou pela primeira vez as discussões tratadas no evento para diversas cidades do país por meio de ações realizadas por parceiros. O tema central do Congresso – “o sentido público do investimento social privado” – foi o norte de debates, painéis, oficinas, atividades em grupo e conferências – e trouxeram para o centro da discussão as oportunidades e os desafios nas relações entre ISP, governos e sociedade civil. “O congresso é um espaço de diálogo e construção de visões. E, neste ano, o tema central reafirma a necessidade de pensarmos o investimento social privado a partir da sua capacidade de contribuir para a construção do bem comum”, disse logo na abertura do evento Beatriz Gerdau Johannpeter, presidente do Conselho de Governança do GIFE. A escolha pelo tema não foi por acaso, como lembrou Andre, secretário-geral do GIFE, também no início do Congresso. “Debater sobre a relação público-privada é algo crítico e que precisava ser sucitado para que essas articulações possam ser reconstruídas de maneira ética, transparente

Auditório lotado para a plenária de abertura do 9º Congresso Gife

tura do Brasil. Afinal, os assuntos debatidos não tiveram a pretensão de se esgotar em três dias de evento, mas sim despertar novos pensamentos para reverberar e se transformar em práticas cotidianas.

Análise da conjuntura e eficaz. Precisamos construir um debate para encarar isso, a fim de que esse campo não se desconecte das grandes demandas e desafios que estamos enfrentando no país”, comentou. Tendo essa perspectiva em vista, todas as reflexões do Congresso tiveram como pano de fundo o atual momento vivido pelo país visando estabelecer uma sinergia e uma proposta de ação do ISP olhando para a conjunNa apresentação do Mitos & Fatos do investimento social privado

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Os debates promovidos ao longo do Congresso tiveram como ponte de partida a plenária de abertura “O Brasil que temos e o Brasil que queremos: visoes a partir da política, justiça e sociedade sobre a conjuntura atual”. À frente das discussões, Maria Alice Setubal, presidente do conselho consultivo da Fundação Tide Setubal; Átila Roque, diretor executivo da Anistia Internacional no Brasil; Ricardo Henriques, superintendente executivo do Instituto Unibanco, e Oscar Vilhena, diretor da FGV Direito SP. Para os especialistas, o cenário atual de polarização – que tem sido intensificado pela disseminação de informações via redes sociais – acirra as dispustas e dificulta a capacidade de construir caminhos transformadores, a partir da tolerância e da escuta atenta ao outro, a fim de que vínculos sejam de fato estabelecidos. Maria Alice Setubal lembrou que essa polarização é ainda mais fomentada pela baixa qualidade do debate, devido a pouca experiência e amadurecimento de participação dos brasileiros, que vivem uma democracia ainda muito jovem. “Isso tem a ver com o desconhecimento nosso funcionam as instituições, qual a nosrevistaamazonia.com.br


Andre Degenszajn, secretário-geral do GIFE, abriu oficialmente o 9º Congresso da entidade

sa história e como chegamos até aqui. Por isso, nós que atuamos no social temos um papel muito importante na qualificação do debate e no aumento do diálogo, trazendo mais reflexão e também dando voz para diferentes posições a fim de avançarmos. Se não, não vamos conseguir construir nada na direção de um país mais justo e necessário”, convocou os presentes. Na avaliação dos debatedores, antes de qualquer análise sobre o Brasil atual, é preciso ter em mente a estruturação do país, que fomentou uma desigualdade profunda de diversas naturezas – econômica, social, racial, de gênero etc – e que isso nos contituiu enquanto sociedade. “A nossa identiddade de sujeito se dá pela nossa posição na sociedade. Sei até onde eu posso ir ou não. É muito curto o nosso horizonte”, lembrou Oscar. Essas desigualdades se aprofundam, em dois temas centrais que não podem ser negados e precisam ser encarados de frente para que a transformação no país de fato aconteça: o racismo e a violência. “Nós somos um país profundamente preconceituoso e violento, mas não gostamos de nos ver assim. No entanto, qualquer agenda de mudança no Brasil hoje vai ter que lidar com isso e radicalizar, de ir fundo nas coisas, pois isso organiza e distribui o poder”, comentou o diretor da Anistia Internacional. Segundo Átila, a igualdade percebida enquanto valor é um fenomeno muito novo e encontra enorme resistência na sociedade, pois o processo de solicialização gerou uma naturalização dessa desigualdade. “Fomos educados a não nos vermos como sujeitos

detentores do direito a ter direitos. Por isso, os direitos humanos são fundamentais no Brasil que queremos”, ponderou. De acordo com Oscar, a Constituição de 1988 foi esse momento de repactuação num projeto utópico de uma sociedade mais equilibrada, porém, esse projeto de emancipação da sociedade brasileira ocorreu de forma desequilibrada e que é preciso novas posturas, inclusive, fortalecer o papel da sociedade civil que, teve uma atuação muito intensa até então, mas tem se deixado de alguma forma se capturar pela facinação do Estado. “Por isso, precisamos resgatar agora o lugar de autonomia e da independência em relação ao Estado e às empresas. Precisamos reconhecer os novos protagonistas e também ouvir os novos atores e forças que estão reivindicando o seu lugar de fala e que ainda não escutamos”, ressaltou Átila. Os especialistas lembraram que as manifestações públicas que têm ocorrido nos últimos anos demonstraram a multiplicidade de vozes que querem se colocar frente às questões centrais do país e que é preciso estabelecer uma escuta de fato ativa junto a estes. “Hoje temos a possibilidade de muitas outras vozes se apresentarem. Ficou claro nestas manifestações que as pessoas ressaltaram que os partidos não lhes representam, assim como as instituições. Estamos vivendo um momento em que as pessoas querem ter autoria. E a palavra tem poder. Muitos coletivos que não tinham a palavra porque não estavam sendo ouvidas pela midia oficial acabam que redes sociais se colocando. Não podemos ignorar isso. Mas é preciso qualificar o debate, como pontuei”, enfatizou Maria Alice Setubal. Diante desse cenário, a conselheira da Fundação destacou que o ISP tem um papel fundamental de garantir maior coesão social e, para isso, é preciso investir no fortalecimento da sociedade civil. “Não só nos momentos de crise, mas principalmente nestes, se torna vital ter uma sociedade civil forte, consolidada e ativa. É preciso que o investi-

Darren Walker, presidente da Fundação Ford: acredito que a maior ameaça às sociedades mundiais é o sentimento de desesperança que surge da desigualdade – seja ela entre pessoas, países, etnias ou gênero.

mento social privado se debruce sobre isso a fim de termos uma sociedade mais democrática”, ponderou Ricardo Henriques. Assim, lembraram os especialistas, é preciso estabelecer um equilíbrio entre a perspectiva de métricas e resultados – algo caro ao ISP – com a equidade, olhando a dimensão da mudança que se quer alcançar em médio e o longo prazo. “As soluções técnicas do ISP que não trazem uma lente atenta ao outro correm o risco de consolidar soluções que têm baixíssima aderência no mundo real e capacidade de transformação. Precisamos produzir essa plataforma de aproximação de mundos pelo reconhecimento e pela força e valorização das diferenças”, pontuou o superintendente do Instituto Unibanco. Para Maria Alice Setubal, o investimento social privado precisa perder a atitude arrogante de chegar às comunidades com respostas prontas, de quem sabe a solução para todos os problemas, e apostar na escuta verdadeira. “Como disse o Ricardo, o ISP tem que ir além da meritocracia e eficiência. Ela não é o nosso objetivo. O que queremos é o enfrentamento das enormes desigualdades que estamos vivendo”, ressaltou. Outro aspecto fundamental nesse contexto pela busca da transformação social, destacaram os debatedores, é pensar em processos mais longos, com investimentos contínuos e permanentes, a fim de que os impactos de fato possam acontecer. Os presentes questionaram também se o caminho

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deve ser realmente a aposta em projetos próprios – algo que tem marcado a atuação dos institutos e fundações nos últimos anos – ou se é preciso de fato atuar em outras frentes, justamente para fortalecer as instituições que estão na ponta. “A construção de um tecido social está cada vez mais frágil no Brasil, os recursos internacionais diminuíram e os investidores sociais, por conta de ter muito forte a questão dos resultados, acabam desenvolvendo suas próprias iniciativas com suas equipes, tem dificuldade de escuta e contribuem pouco para a sociedade civil que está na ponta. Porém, se mudarem essa atitude, terão resultados muito mais eficientes”, avaliou Na opinião de Oscar Vilhena, o papel das fundações e institutos não é ditar o que tem que ser feito na sociedade, “mas apoiar uma multiplicidade de alternativas para a solução dos problemas da sociedade”. Os presentes lembraram ainda a importância da transparência e da avaliação nos processos e também da ampliação da cultura de doação no país.

Destaques As discussões da plenária de abertura se refletiram nas diversas atividades que se seguiram nos três dias do evento e foram se aprofundando a cada novo debate estabelecido nas 18 sessões temáticas, que adensaram temas como transparência, direitos sociais, desigualdade, diálogo, alinhamento entre ISP e negócio, ambiente político-institucional, coinvestimento e negócios de 50

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impacto e políticas públicas. O Congresso contou com vários momentos marcantes, como a conferência especial de Darren Walker, presidente da Fundação Ford, nos painéis sobre governança colaborativa, a democracia no século XXI, a implementação dos Objetivos de Desenvolvimento Sustentável (ODS), entre tantos outros. Além dos debates, o evento contou também com o lançamento de ferramentas e produtos que visam fortalecer e qualificar a atuação do investimento social privado no país. Entre eles, o Painel GIFE de Transparência, os Indicadores GIFE de Governança, além da pesquisa “O alinhamento entre o investimento social privado e o negócio”. Na avaliação do secretário-geral do GIFE, a edição 2016 do evento conseguiu construir uma conversa significativa sobre temas relevantes ao ISP. “Esse foi um Congresso em que, muito mais do que apenas compartilhar boas práticas, pudemos falar de questões críticas, dos desafios estruturais que temos para o campo e do que de fato pode fazer a diferença nesta sociedade. Isso trouxe muita densidade às discussões e uma energia muito boa, que repercutiu num ótimo engajamento do público”, avaliou Andre.

Construção colaborativa Toda a riqueza dos conhecimentos e aprendizados compartilhados e adquiridos ao longo do Congresso GIFE 2016 ganharam ainda mais força e trouxeram concretude às ações do investimento social privado

No último dia do evento, o painel “O investimento social privado no Brasil que podemos” destacou importância da transparência e do diálogo entre os setores público e privado. A apresentação teve a participação de Denis Mizne (à esquerda), da Fundação Lemann, e Daniel Brandão (à direita), da MOVE

no Brasil, na última atividade do Congresso, no dia 1 de abril. A ideia foi convocar os presentes a colocarem seus pontos de vista, proposições e reflexões na mesa e, a partir daí, contribuírem para um posicionamento orientador para o campo. O público teve a oportunidade de participar de uma das três salas simultâneas, que analisaram aspectos da relação entre ISP e sociedade, ISP e empresas e ISP e governo. Cada sessão teve a coordenação de um conselheiro do GIFE, com apoio de um facilitador convidado. No debate sobre ISP e empresas, Beatriz Azeredo, diretora de Responsabilidade Social da Globo e membro do Conselho do GIFE, fez uma provocação inicial para esquentar a conversa. A proposta foi discutir, a partir desta perspectiva, qual pode ser o papel das empresas para que o sentido público do ISP possa ser cumprido, além dos desafios e possibilidades que estão colocados nessas relações. Para Beatriz Azeredo, a palavra-chave para as empresas deve ser “compromisso” com questões fundamentais, tendo em vista o atual contexto do Brasil e também o grau de amadurecimento do investimento social privado. Entre estes compromissos, segundo Beatriz, o primeiro deles é fazer a “lição de revistaamazonia.com.br


Beatriz Azeredo, diretora de Responsabilidade Social da Globo e conselheira do GIFE, realizou palestra no último dia do Congresso GIFE. Para a executiva, é preciso que o investimento social privado leve em conta o atual momento no qual o Brasil está inserido e assuma compromissos

casa”, garantindo a geração de lucro socialmente responsável, ou seja, pagar os impostos, minimizar o impacto ambiental, organizar a cadeia produtiva, estabelecer o relacionamento com os colaboradores etc. O segundo é, mesmo neste momento de crise, manter o investimento social privado que já vem sendo feito. “Num país com o grau de desigualdade abismal que temos, é justamente neste momento em que a grande parcela da população, para qual trabalhamos, é a primeira a ser atingida. Assim, não podemos paralisar. Precisamos manter o terreno que foi conquistado”, apontou. Na visão da conselheira do GIFE, as empresas também precisam construir o compromisso com a causa pública, garantindo mais equidade. Trata-se, portanto, de ao estabelecer a estratégia de ação do ISP, não definir apenas um tema ou território de atuação, mas analisar se a iniciativa está de fato pactuando com a causa pública maior daquele direito que está sendo violado. Outro ponto fundamental é o compromisso com o fortalecimento da sociedade civil, tendo em vista a importância de termos no Brasil movimentos sociais fortes, conectados e alinhados com as grandes questões sociais. Segundo Beatriz, neste ponto, é essencial que as empresas e o ISP avaliem qual o componente de doação que as instituições estão direcionando as organizações-chave da sociedade civil para além de seus projetos. “Isso nos coloca num terreno de diálogo que tem muito conflito e, portanto, nos assusta. Mas, é tempo de enfrentar essa diversidade. É, inclusive, um passo para aprofundar o diálogo e trazer o diferente para perto”, disse. Essa aproximação com as organizações da sociedade civil, inclusive, lembra Beatriz, traz um alerta para pensarmos no sen-

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tido verdadeiro da palavra “parceria”, a fim de que as organizações da sociedade civil não sejam apenas instituições operacionais para as iniciativas do ISP. Outros compromissos ainda necessários a serem assumidos, destacou a conselheira do GIFE, diz respeito a garantir a perspectiva de longo prazo às iniciativas que precisam de tempo para conquistar resultados, assim como a importância da transparência e de processos e instrumentos que permitam disseminar e consolidar não apenas visões de passado das instituições, mas apontar os caminhos para o futuro. “Por fim, uma questão que precisamos nos ater é a responsabilidade que temos no papel de financiadores. A entrada de um financiador numa agenda desiquilibra o segmento, ao entrar e ao sair. Isso nos exige um compromisso de pensar muito bem o terreno em que estamos pisando. É um desiquilíbrio que gera mudanças estruturais ou é uma desorganização?”, apontou. Já no debate a respeito da relação entre investimento social privado e governo, “transparência” apareceu como a palavra de ordem. Para Denis Mizne, diretor-executivo da Fundação Lemann e conselheiro do GIFE que esteve à frente dessa reflexão, é preciso haver transparência de objetivos entre empresas e governos, lembrando que o momento atual pede essa postura por parte dos diversos atores sociais. “As organizações não devem atuar na lógica de meras prestadoras de serviços, mas precisam buscar construir sua intervenção na lógica da política pública”, falou. Segundo o especialista, é preciso criarmos espaços de diálogo, debate e troca de para a concretização de projetos sociais de empresas privadas em parceria com os governos. “O papel da sociedade civil é juntar-se ao Estado e dialogar. Se o que

falta na esfera pública é inovação e novas ideias, dá para resolver essa lacuna juntos. O que não pode acontecer é os projetos privados substituírem as políticas públicas”, disse Mizne. Em relação à articulação entre ISP e sociedade civil, que contou com a colaboraçao de Antonio Luiz de Paula e Silva, do Instituto Fonte, e Marcelo Furtado, diretor-executivo do Instituto Arapyaú e conselheiro do GIFE, a discussão girou em torno da dicotomia do setor, no qual 70% dos membros do GIFE operam projetos próprios, mas a maioria acredita que esse tipo de trabalho deveria ser feito por ONGs. “Então, por que essa receita não está chegando até elas?”, questionaram os especialistas. Para Furtado, um só modelo de funcionamento – seja ele dominado por companhias ou entidades civis – não é o ideal, por isso o mais importante é equacionar a relação. Além disso, chamou atenção para o fato de que é preciso aumentar o número de doações no Brasil, e fazê-lo de forma correta. “Precisamos trabalhar para aumentar os recursos vindos de toda sociedade, pois é possível doar bem”, ressaltou no debate.

Indicações de futuro Com base nas análises sistematizadas nos três grupos de trabalho, os membros do conselho de governança do GIFE trouxeram proposições para o investimento social privado no país atual, na plenária final: “O Brasil que podemos”. O secretário-geral do GIFE ressaltou que não se tratava de um encerramento, mas uma abertura para o trabalho que o ISP tem pela frente, de novos caminhos e ações para aprimoramento do campo. Beatriz Azeredo aproveitou o momento para resgatar os pontos que haviam discuti-

Antonio Luiz de Paula e Silva (à esquerda), do Instituto Fonte, e Marcelo Furtado (á direita), diretorexecutivo do Instituto Arapyaú, apresentaram o tema “O investimento social privado no Brasil que podemos: ISP e sociedade civil”

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dos no grupo sobre o papel das empresas no sentido público. Lembrou os compromissos que estas devem assumir, como a responsabilidade social interna, a manutenção do ISP, a transparência, a perspectiva de longo prazo, o poder do financiador, o fortalecimento da sociedade civil, a aposta no risco e a atuação na causa pública. Na plenária, Denis Mizne ressaltou que, diante da complexidade dos desafios do país, existe uma demanda maior de articulação dentro do próprio ISP, de criar um ambiente de colaboração, a fim de colaborar no desenho de políticas públicas efetivas que realmente dêem conta da extensão do Brasil. “O ponto-chave é: quanto do nosso tempo passamos pensando efetivamente em políticas públicas, e não em implementação de etapas de projetos? Isso não dá para medir no final do ano, não fica tão bonito no relatório anual, mas é fundamental para uma lógica mais colaborativa entre Estado e sociedade civil organizada e ISP. Se a gente for capaz de pensar de maneira mais estratégica e pensar uma relação mais aberta com o Estado, não só tentar resolver aqueles problemas específicos, a gente tem uma chance muito maior de conseguir. Se a gente for capaz de criar mais desses espaços e construir novas respostas aos problemas do país, nosso investimento será muito mais efetivo”, ressaltou Denis. Para finalizar, Marcelo Furtado também trouxe suas contribuições, destacando algumas palavras-chave em todas as conversas: “controle” – é preciso ter certeza que o recurso é bem utilizado e que o resultado está sendo atingido; “clareza de papéis” – entendimento de qual o seu papel nessa jornada; “confiança” – a relação é mais estimulada quando os atores têm maior confiança uns nos outros; “poder” – o investidor deve oferecer espaço para que outras agendas e outras maneiras de trabalhar possam aparecer; “risco” – as empresas devem assumir mais riscos ao investir em agendas mais complexas; “rede” – fazer sozinho é mais fácil, mas fazer junto ajuda a fazer mais e chegar mais longe; “resultado”: o que se espera é fazer um país e um planeta melhor; “transparência” – essencial no momento atual brasileiro; e “liderança” – necessidade de liderança para conduzir o processo de transformação, não no sentido tradicional de um indivíduo que é líder, mas de estebelecer seguidores.

Balanço/Encerramento Degenszajn encerrou o congresso no início desta tarde ao lado de Denis Mizne, diretor-executivo da Fundação Lemann, Mar52

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Com a participação do Instituto Arapyaú, Fundação Lemann, TV Globo e do secretário-geral do GIFE, André Degenszajn, a plenária de encerramento do 9º Congresso GIFE apresentou o tema “Proposições para o presente”, reunindo diversos pontos que foram discutidos em encontros anteriores no último dia de congresso.

celo Furtado, diretor do Instituto Arapyaú e Beatriz Azeredo, diretora de responsabilidade social da TV Globo. Para Beatriz, a palavra-chave para o setor do investimento social privado no atual momento é compromisso. Ela ressaltou, em primeiro lugar, a importância básica de as empresas manterem o investimento em responsabilidade social interna. O segundo compromisso, de acordo com Beatriz, é conjuntural e de longo prazo. “Apesar de o investimento social privado ser o primeiro corte que as empresas fazem neste contexto, temos um compromisso a ser mantido com os avanços [sociais]”, disse Beatriz. Denis Mizne, representante da Fundação Lemann, afirmou que, nesta situação crítica, os empreendedores sociais têm que pensar fora da “caixinha” da própria organização. “É preciso construir uma relação mais aberta junto ao Estado, não de levar a solução pronta, mas, sim, de construir junto sem ser subserviente. O diálogo tem que acontecer”, disse Mizne. Durante o congresso, o Gife promoveu um painel sobre transparência para incentivar que seus associados e organizações beneficiadas deixem público as contas de trabalhos realizados. “A transparência que a situação do país exige vai para além dos governos. Os investidores sociais e as organizações da sociedade civil deixando clara sua atuação é uma maneira de estreitar relações com a sociedade para que ela perceba o que fazem.” Marcelo Furtado, do Instituto Arapyaú, é otimista com o momento para o setor do investimento social privado. As fundações, que geralmente realizam investimento so-

cial privado, estão em fase de mudanças estruturais. Entre as principais transformações, está a transferência do comando das instituições para a geração seguinte, de filhos ou netos. “Essa geração tem um novo chip e isso nos dá uma oportunidade para que as instituições trabalhem de uma maneira mais colaborativa”, disse Furtado. Para Degenszajn, é preciso fortalecer as organizações da sociedade civil que estão frágeis neste momento e o trabalho dos investidores sociais de apoio e autonomia é fundamental. Além disso, o setor deve trazer para o centro do investimento social o combate às desigualdades sociais no geral, como de gênero e racial, não somente a econômica. “Não é um desafio só de melhorar a gestão do recurso privado, mas do tipo de democracia que está se contribuindo para construir. Uma democracia forte, exige organizações fortes”, disse Degenszajn. Durante três dias de debates, o congresso bienal do Gife reuniu centenas de pessoas, entre investidores sociais, integrantes de organizações da sociedade civil, acadêmicos, consultores e representantes de governos, entre outros. Estiveram presentes no evento Átila Roque, da Anistia Internacional, Alice Setubal, da Fundação Tide Setubal, Ricardo Henriques, do Instituto Unibanco, Darren Walker, da Fundação Ford, Francisco Gaetani, do Ministério do Planejamento, Orçamento e Gestão, Lais Lopes, da Secretaria de Governo da Presidência da República, Marcelo Porteiro, do BNDES, Ricardo Abramovay, da FEA/USP e Sergio Andrade, da Agenda Pública, entre outros. revistaamazonia.com.br


Cidades brasileiras no combate às mudanças no clima: desdobramentos do Acordo de Paris

Na II Jornada sobre Cidades e Mudanças Climáticas, especialistas debateram o papel das cidades no contexto pós COP 21 Fotos: Mariana Gil/WRI Brasil Cidades Sustentáveis, Kiko Silva

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COP 21 foi um momento histórico para o clima. O documento construído em Paris, que substitui o Protocolo de Kyoto, uniu 196 nações em um objetivo: agir para que o aumento da temperatura média do planeta não ultrapasse 2°C até 2100. É o começo de uma nova era na luta contra as mudanças climáticas, marcada pela presença das cidades. Neste novo cenário, qual é o papel das cidades brasileiras? A II Jornada sobre Cidades e Mudanças Climáticas, promovida pelo ICLEI com o apoio do WRI Brasil Cidades Sustentáveis, começou com uma sessão dedicada a responder essa pergunta. No painel “Panorama Pós COP 21 no Brasil”, especialistas debateram os principais desdobramentos do Acordo de Paris nas políticas brasileiras em escala nacional, estadual e local. Jussara Carvalho, Secretária Executiva do ICLEI, foi a moderadora da sessão e deu início à discussão enfatizando a importância da atuação das cidades: “O Acordo de Paris uniu todos os atores nessa discussão tão importante e reconheceu o papel dos municípios. Agora, as cidades brasileiras precisam agir. Nosso objetivo aqui é apresentar essa nova conjuntura e debater os desdobramentos que o novo acordo terá nas políticas nacionais”. O Acordo de Paris instaurou um marco no combate às mudanças no clima ao reconhecer os governos locais como atores essenciais no processo. São mais de 140 pontos que versam sobre a atuação dos 196 países signatários, incluindo ambições, metas e prazos para reduzir emissões e amenizar os impactos das alterações pelas quais o clima vem passando em escala global. “O importante é dizer que os critérios de um bom acordo foram alcançados. Estabelecemos em Paris um acordo universal, tendo como revistaamazonia.com.br

A mesa oficial da abertura da II Jornada sobre Cidades e Mudanças Climáticas

pilares a ambição e o comprometimento das nações”, assinalou Laurent Bili, Embaixador da França no Brasil. “Ao longo desse ano, o Programa de Ação Lima-Paris vai implementar as medidas planejadas e garantir que a essência do Acordo de Paris seja mantida e concretizada”, assegurou. Das 196 nações que, em dezembro de 2015, assinaram o Acordo de Paris durante a COP 21, 187 já haviam apresentado seus INDCs. “Isso quer dizer”, apontou Adriano Santhiago de Oliveira, Secretário Interino de Mudanças Climáticas e Qualidade Ambiental do Ministério do Meio Ambiente, “que todos os países que assinaram o acordo em Paris na verdade já estavam e sempre estiveram nessa luta. É um acordo extremamente ambicioso, com o potencial de realmente mudar o paradigma climático. Quanto ao Brasil, temos metas fortes para redução de emissões e adaptação, além de

um componente de financiamento. Agora é o momento de agir para pôr em prática essas mudanças”. Mais do que um compilado de metas, o Acordo de Paris tornou-se, a partir do momento em que foi firmado, uma referência para as nações no período pós 2015. “Vivemos uma emergência climática. E esse não é um problema que temos que resolver pensando no futuro: precisamos agir agora. O acordo é uma referência para todos, a partir do qual as ações podem ser estruturadas”, destacou, Carlos Rittl, Secretário Executivo do Observatório do Clima.

O Brasil e as mudanças no clima Por suas proporções e recursos, o Brasil tem potencial para contribuir de forma significativa no combate às mudanças climáticas. Cabe ao país, na visão de Rittl, estudar e aprender a fazer um uso inteligente das fontes de energia e redirecionar suas políticas de acordo com a lógica do baixo carbono. “Para o Brasil, assim como para REVISTA AMAZÔNIA

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todos os países, é fundamental olhar para o Acordo de Paris não como uma obrigação, mas como uma oportunidade”, ressaltou. Em setembro do ano passado, o Brasil anunciou suas metas: a principal delas, reduzir as emissões de gases do efeito estufa (GEE) em 37% até 2025 e em 43% até 2030. Três meses depois, a COP 21 deu origem ao Acordo de Paris que, agora, gera novas implicações ao país. A revisão da INDC até 2018 é uma delas. O “I”, em INDC, vem do inglês intended – pretendida. O primeiro passo para concretizar as metas, portanto, é torná-las não pretendidas, mas concretas. Na concepção de Rittl, o país tem um horizonte traçado para os próximos anos: definir metas anuais de emissões, aumentar sua participação no mercado global de carbono e a Política Nacional de Mudanças Climáticas precisa incorporar novos compromissos imediatos e futuros. Tudo isso, contudo, precisa ser feito em consonância com as cidades: “Estamos trabalhando para estimular os municípios a se preocuparem com a questão climática e a construírem planos de adaptação e mitigação. No Ceará, ainda há cidades que não possuem secretarias de meio ambiente. O diálogo com as cidades precisa ser constante e aberto para que o clima se torne prioridade”, enfatizou o Secretário de Meio Ambiente do Ceará, Artur Bruno. Marcio Lacerda, Presidente da FNP e Prefeito de Belo Horizonte, complementou: “Durante a COP 21, conversamos muito sobre a posição ocupada pelas cidades

na luta pelo clima. Com 83% da população brasileira vivendo em cidades, os efeitos das mudanças no clima atingem cada vez mais pessoas. As metas brasileiras são ousadas, e temos pela frente um belíssimo desafio. Mas precisamos enfrenta-lo, porque é uma questão de sobrevivência para todos”.

O poder do Compacto de Prefeitos. A articulação entre as cidades Exemplos bem-sucedidos de articulação entre as cidades mostram que o trabalho conjunto é a chave para implementar ações efetivas no combate às mudanças climáticas. O Compacto de Prefeitos é a maior iniciativa de articulação de cidades do mundo e reúne lideranças municipais que se comprometeram a reduzir suas emissões, mapear o progresso e se preparar com consistência para os efeitos das mudanças no clima. Na manhã de hoje, o compromisso assumido pelas cidades signatárias do Compacto foi um dos focos de debate na II Jornada sobre Cidades e Mudanças Climáticas, organizada pelo ICLEI, em Fortaleza. O WRI Brasil Cidades Sustentáveis é parceiro do encontro. Holger Dalkmann, Diretor de Estratégia e Política

Especialistas e representantes de cidades debatem o compromisso dos municípios com as mudanças climáticas por meio de iniciativas como o Compacto de Prefeitos

do WRI Ross Center for Sustainable Cities, foi o moderador da sessão “O Compromisso das Cidades”, que contou com a participação de Nelson Franco, Secretário Executivo do CB27; Rogério Menezes, Presidente da ANAMA; e Lie Shitara Schutzer, Coordenadora do Programa Município Verde Azul, do Governo do Estado de São Paulo. “As mudanças climáticas começam nas cidades, mas vão além delas. É um problema que precisa da união entre o setor público, o setor privado e a sociedade. Voltamos de Paris com um acordo forte; as lideranças municipais precisam ser, agora, igualmente fortes para que possamos implementar as mudanças necessárias”. Assim Holger abriu o painel que ajudou a transmitir uma mensagem em especial: a importância de que cada vez mais cidades se juntem ao Compacto de Prefeitos e, assim, contribuam para reduzir emissões e melhorar o clima em todo o mundo. No contexto latino-americano, as cidades podem ajudar a evitar que países ainda em desenvolvimento atinjam níveis de emissões excessivamente altos e coloquem em risco a vida de uma população já vulnerável em muitos aspectos. Por meio do Compacto de Prefeitos, as cidades assumem o compromisso de agir e reportar os resultados obtidos – como fizeram Buenos Aires e Quito na II Jornada. Javier Jose Vazquez, Chefe de Gabinete da Agência de Proteção Ambiental de Buenos Aires, e Diego Enríquez, Diretor de Mudanças Climáticas da Secretaria de Meio Ambiente de Quito, são responsáveis pelas políticas climáticas em suas cidades. Os dois apresentaram breves panoramas das ações que vem sendo em im-

Cerca de 250 pessoas acompanham a II Jornada sobre Cidade e Mudanças Climáticas, em Fortaleza Participantes do debate sobre o cenário pós COP 21 deu início às atividades da II Jornada

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Nelson Franco

plementadas na capital argentina, onde uma das metas é reduzir as emissões em 650 mil toneladas por ano – e na capital equatoriana – que começa a colocar em prática seu Plano de Ação Climático. Atualmente, 459 cidades – entre as quais 35 brasileiras – já se comprometeram com as diretrizes propostas pelo Compacto: fazer um inventário de emissões, definir metas de redução e um sistema para mensurar o progresso e, dentro de três anos a partir da assinatura, construir um plano de ação. “Embora próximos, nossos países latino-americanos não exercitam essa integração, mas é só com o trabalho conjunto que conseguiremos obter sucesso. Nós buscamos essa união com o CB27 e, na escala das cidades, isso é possível com iniciativas como o Compacto de Prefeitos”, apontou Nelson Franco. Além do CB27, Nelson é o Gerente de Mudanças Climáticas da Prefeitura do Rio Janeiro, cidade que também já assinou o Compacto e atualmente vive o processo de desenvolvimento de um plano de adaptação. “Esse é um desafio que precisamos enfrentar, como cidades e como cidadãos. E quanto mais demorarmos a começar, pior será”, completou. A articulação é um dos pilares do sucesso no que diz respeito às mudanças climáticas. Durante a COP 21, a afirmação foi dita e repetida: as mudanças precisam começar nas cidades e estas, por sua vez, precisam trabalhar juntas para que as ações sejam efetivas. A ANAMA - Associação Nacional dos Órgãos Gestores Municipais de Meio Ambiente é outro exemplo de entidade que surge para fortalecer esse diálogo, como reforçou Rogério Menezes, presidente da Associação: “A articulação entre as cidades é essencial. E, dentro das cidades, é preciso que os secretários entendam em profundidade as agendas setoriais, porque as ações precisam ser implementadas de forma integrada”.

Compacto de Prefeitos: o que é e por que assinar As mudanças climáticas precisam de uma resposta em nível global. No entanto, para revistaamazonia.com.br

que sejam efetivas, a mudança precisa começar na realidade local. O Compacto de Prefeitos torna isso possível na medida em que fornece às cidades as ferramentas de que necessitam para dar os primeiros passos. A inciativa foi lançada em 2014, durante a UN Climate Summit, pelo Secretário-Geral das Nações Unidas, Ban Ki-moon, junto a Michael Bloomberg, ICLEI, C40, UCLG e ONU-Habitat. O anúncio veio em um momento oportuno e previu o que seria confirmado ao longo do ano seguinte: a importância da participação ativa das cidades no combate às mudanças climáticas. Ao assinar o Compacto as cidades assumem posicionamento global na luta pelo clima: assumem o compromisso de estabelecer metas de redução de emissões e reportar ações e progressos, de forma que a população possa acompanhar os resultados obtidos. Por meio do Compacto, além de se juntarem a uma rede internacional, as cidaJussara Carvalho

Durante o evento aconteceu também o encerramento do projeto Urban LEDS, um programa de quatro anos financiado pela União Europeia e desenvolvido pelo ICLEI e ONU Habitat e em 37 cidades do Brasil, Índia, Indonésia e África do Sul para demonstrar estratégias de desenvolvimento urbano inclusivo de baixa emissão de carbono em condições de crescimento e transição acelerados. base para a construção dos planos de ação. Trata-se, em suma, de um esforço coletivo para reduzir as emissões em escala global, mas começando pelo contexto local – fator determinante para o sucesso na mitigação das mudanças climáticas.

Caminhos para combater as mudanças climáticas

des são beneficiadas em diversos aspectos: *reconhecimento como cidade que implementou ações inovadoras e positivas; *plataforma onde podem demonstrar o compromisso de fazer parte da solução global para as mudanças climáticas; *avaliação consistente e confiável dos resultados obtidos; *evidência do impacto das ações na emissão de gases de efeito estufa; *mecanismo para que os governos nacionais reconheçam e fortaleçam as ações locais. A iniciativa parte de uma metodologia padronizada para a coleta de dados, que são disponibilizados à população e servem de

Mudanças requerem ações. Quebrar os paradigmas e transformar a maneira como as cidades são construídas e como vivemos nossas vidas dentro delas também. No encerramento da II Jornada sobre Cidades e Mudanças Climáticas, especialistas divididos em seis áreas temáticas protagonizaram um amplo debate sobre a implementação de ações setoriais que podem ajudar a tornar as cidades mais sustentáveis e preparadas para lidar com a crise climática. O evento foi realizado pelo ICLEI, com o apoio do WRI Brasil Cidades Sustentáveis. Mobilidade, planejamento urbano, saneamento, saúde, energia e adaptação baseada em ecossistemas: os seis setores foram os eixos temáticos da sessão que apresentou ações atualmente em curso em diferentes cidades e que estão ajudando a torná-las mais sustentáveis. Luis Antonio Lindau, Diretor do REVISTA AMAZÔNIA

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Laurent Bili

Lacerda destacou a importância de dar continuidade às discussões da COP 21

Luis Antonio Lindau: cidades precisam qualificar a mobilidade sustentável

Segundo Rogério Menezes, o trabalho conjunto e diálogo entre as cidades são fatores-chave para o sucesso

WRI Brasil Cidades Sustentáveis, moderou o debate, que também contou com a participação de Holger Dalkmann, Diretor de Estratégia e Política Global do WRI Ross Center for Sustainable Cities. A discussão sobre mobilidade começou com Ramon Victor Cesar, Presidente da BHTRANS, que apresentou as principais ações de Belo Horizonte para qualificar o ambiente urbano e promover a sustentabilidade: “Nas últimas décadas, vimos o automóvel passar a ocupar uma posição de destaque na divisão modal das cidades. Em consequência, as emissões também aumentaram. Precisamos e queremos reverter essa situação”. A meta da capital mineira, como contou Ramon, é reduzir as emissões em 20% até 2030, trabalhando em três frentes: limitar ou reduzir a velocidade dos deslocamentos, modificar a divisão modal em prol dos modos mais sustentáveis e aumentar a eficiência energética no setor de transportes. Belo Horizonte trabalhou em parceria com a Future Cities Catapult para identificar tecnologias e soluções inovadoras para os principais desafios urbanos da cidade, entre os quais a segurança viária e a qualidade do transporte coletivo. “Na Future Cities Catapult, trabalhamos para transformar as cidades em lugares melhores para as pessoas viverem. Para isso, apostamos na inovação como instrumento de sustentabilidade: por meio de soluções inovadores, podemos tornar as cidades mais sustentáveis”, apontou Guilherme Johnston, Gerente de Projetos Internacionais e Parcerias da organização 56

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Para Holger Dalkmann, as mudanças climáticas são o principal desafio dos governos locais e nacionais

britânica. Na visão do especialista, os pontos de encontro entre inovação e sustentabilidade são as áreas onde mudanças concretas e significativas podem ser geradas. O investimento em mobilidade sustentável mostra-se particularmente necessário frente aos números apresentados por Françoise Méteyer-Zeldine, Conselheira para o Desenvolvimento Sustentável da Embaixada da França no Brasil: o custo da mobilidade não sustentável no país é de R$ 850 bilhões de por ano. Resolver o problema não é um processo simples, mas, segundo Françoise, um bom caminho é o planejamento integrado de transporte e uso do solo, pois essas são ferramentas que tornam o transporte e as próprias cidades mais inclusivos. “As cidades são diferentes umas das outras; logo, precisam de diretrizes próprias, conforme suas necessidades. Mas precisamos entender, acima de tudo, a diferença entre cidades sustentáveis e as que não o são: o investimento na própria sustentabilidade”, afirmou.

Planejamento urbano e integração O planejamento integrado é a chave do sucesso das cidades brasileiras que já começaram a trilhar o caminho do desenvolvimento sustentável. Florianópolis, no sul do Brasil, empreendeu um dos casos mais bem-sucedidos da articulação de regiões metropolitanas para resolver problemas ur-

Holger Dalkmann, destacou bases para a sustentabilidade

banos e qualificar a prestação de serviços. O PLAMUS – Plano de Mobilidade Sustentável da Grande Florianópolis mapeou as necessidades de mobilidade dos 13 municípios da RM por meio de oficinas e pesquisas. Guilherme Medeiros, Coordenador Técnico da Superintendência de Desenvolvimento da Região Metropolitana da Grande Florianópolis, participou do debate e falou sobre a diretriz fundamental seguida pelo PLAMUS: levar mais integração, sustentabilidade e qualidade de vida revistaamazonia.com.br


à população dessas cidades. “Por estar em uma ilha, é fundamental que Florianópolis estabeleça relações com os municípios vizinhos. Ações planejadas de forma integrada e postas em prática também de forma integrada são o eixo central do PLAMUS. Infelizmente, nenhuma região metropolitana no Brasil já atingiu o planejamento no estado da arte, mas nós estamos trabalhando para isso”, afirmou. O WRI Brasil Cidades Sustentáveis apoiou a capital catarinense no desenvolvimento do plano, trabalhando conceitos de participação popular, mobilidade sustentável e desenvolvimento urbano – ponto que Holger Dalkmann, destacou como base para a sustentabilidade urbana: “Cidades compactas, coordenadas e conectadas: esse deve ser o horizonte e o objetivo do trabalho. Mas construir cidades assim requer, em primeiro lugar, a densidade certa e a oferta exata de serviços, para que, assim, as cidades possam se desenvolver de forma sustentável”. O especialista ressaltou ainda o caráter fundamental do planejamento integrado: “Nesses dois dias, discutimos planejamento climático, planejamento urbano, planejamento financeiro – precisamos pensar esses processos juntos, de forma integrada”. Oportunidades para construir cidades melhores A sessão de encerramento de II Jornada sobre Cidades e Mudanças Climáticas abrangeu ainda os setores de saneamento, água, energia e adaptação baseada em ecossistemas. Palestrantes nacionais e internacionais apresentaram projetos e soluções aplicados em diferentes partes do mundo com resultados positivos para a vida nas áreas urbanas. Divididos em mesas de discussão temáticas, público e palestrantes debateram exemplos de soluções inovadoras e como ampliar essas iniciativas. Na área de mobilidade, Lindau apresentou o conceito avoid-shift-improve (evitar-mudar-melhorar), e a conversa girou em torno de como melhorar e garantir da manutenção dos sistemas de transporte coletivo. Na mesa de planejamento urbano, foram citados casos de sucesso de planos diretores e como podem levar à construção de cidades mais

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A II Jornada sobre Cidades e Mudanças Climáticas contou, entre palestrantes, debatedores e plateia, com a participação de prefeitos do Brasil além de representantes de Governos Estaduais, do Governo Federal e de cidades de outros países da América do Sul. Também estiveram presentes representantes de instituições ligadas ao tema, como ABEMA, AFD, ANAMMA, Avina, BID, CB27, CAF, Future Cities Catapult, CDP, CEBDS, FONARI, , FNP, Fundação Grupo Boticário, Fundação Konrad Adenauer, GIZ, ITDP, LEDS LAC, MercoCiudades, ONU Habitat, SASA, SOS Mata Atlântica, WRI, WWF, entre outras. O evento aconteceu no Centro de Eventos do Ceará. Participantes nas mesas de discussão que encerraram o evento

compactas. Em adaptação, o foco da discussão foram as ilhas de calor e medidas que as cidades podem tomar visando à resiliência. Conscientização da população e tratamento de áreas de risco foram os assuntos em saúde e saneamento. Por fim, o grupo de energia debateu sobre como o Brasil pode explorar fontes de energia renovável e investir na geração de energia eólica e solar através de contratos de desempenho. Depois de

dois dias de discussões, a II Jornada chega ao fim. Sob a luz das discussões da COP 21 e do Acordo de Paris, gestores municipais e profissionais de diversas áreas relacionadas ao setor climático analisaram experiências e apontaram caminhos pelos quais as cidades brasileiras podem seguir para avançar no combate às mudanças climáticas. O desafio é grande, mas as oportunidades para superá-lo existem – basta abraçá-las.

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Brasil inaugura projeto inédito de energia solar nas hidrelétricas de Balbina e de Sobradinho Protótipo vai analisar benefícios de geração por meio de placas solares instaladas sobre flutuadores em reservatórios de hidrelétricas

Fotos: Divulgação, Rafael Wergles/Portal Brasil, Severino Silva (Eletrobras Chesf) Os presidentes da Eletronorte, Tito Neto, da Eletrobras, José da Costa, e o ministro de Minas e Energia, Eduardo Braga, inauguram a primeira usina solar flutuante do mundo

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a Usina Hidrelétrica de Balbina, localizada no município de Presidente Figueiredo, a 107 km de Manaus, no Amazonas, foi lançado o primeiro projeto de exploração de energia solar em lagos de usinas hidrelétricas com uso de flutuadores no mundo. No momento em que o ministro de Minas e Energia, Eduardo Braga, acionou, diante de autoridades e convidados, o protótipo de usina solar fotovoltaica de 64 m² instalado sobre flutuadores no lago da hidrelétrica, reproduziu o que acontecerá quando o Sistema estiver em funcionamento pleno, com mais de 50 mil metros quadrados, equivalente a cinco campos de futebol: o painel de controle apontou imediatamente a energia que começava a ser gerada, com pequenas oscilações a cada nuvem mais pesada que passava. Braga explicou que a nova tecnologia pode trazer mais racionalidade econômica e reduzir custos das tarifas, ao permitir o uso de capacidade ociosa de sistemas do setor elétrico. “Nós estamos gerando hoje, aqui em Balbina, em função da seca que está 58

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no lago, um pouco mais, um pouco menos que 50 MW, ou seja, nós temos uma linha de transmissão de 230 Kv, nós temos uma subestação, e essa subestação e essa linha de transmissão estão subutilizadas. Tem espaço, é como se você tivesse uma avenida em que você poderia passar lá com 10 mil veículos e você tá passando com mil veículos por hora”, comparou. No caso específico de Balbina, a ampliação da geração com energia solar terá um significado ambiental adicional: “Este lago de Balbina é um dos maiores lagos do mundo. É um dos maiores crimes ambientais que a engenharia já cometeu neste país. Como mitigar o custo deste crime? Melhorando a relação custo benefício desta usina de Balbina”. Após a conclusão das pesquisas, que serão conduzidas pelas universidades federais do Amazonas e de Pernambuco, o sistema em Balbina poderá ser ampliado de 5MWp para até 300 MW, superando a própria capacidade hidrelétrica da usina e beneficiando cerca de 540 mil residências. “Se nós usarmos 1% da área do lago para

gerar energia fotovoltaica, nós podemos superar 2 mil megawatts, ou seja, quase 10 vezes a capacidade da usina hidrelétrica que existe aqui em Balbina”, ponderou José da Costa, presidente da Eletrobrás. Estiveram presentes ao lançamento os presidentes da Eletrobras, Jose da Costa Carvalho, da Eletronorte, Tito Cardoso de Oliveira, e de empresas do setor elétrico, de entidades de classe, pesquisadores e de participantes do projeto. Nas semanas seguintes serão aprofundados os estudos da área dos lagos para a ampliação dos sistemas, que na primeira fase terão capacidade de Os projetos serão realizados com recursos destinados a ações de Pesquisa & Desenvolvimento pelas empresas, com previsão de investimentos de quase R$ 100 milhões (R$ 49,964 milhões da Eletronorte e R$ 49,942 milhões da Chesf), em ações previstas até janeiro de 2019, para gerar 10 MWp de energia elétrica. A escolha das duas usinas deve-se ao fato de estarem em áreas de regimes climáticos diferentes, o que permitirá acompanhar o desempenho dos sistemas nas diversas condições de tempo. Este será o primeiro estudo sobre a instalação usina solar flutuante instalado no lago de usinas hidrelétricas no mundo, que permite aproveitar as subestações e as linhas de transmissão das hidrelétricas e a área sobre a lâmina d’água dos reservatórios, evitando desapropriação de terras. Projetos similares já foram iniciados em outros países, mas em reservatórios comuns de água, não em hidrelétricas. Durante o lançamento do projetopiloto de usina para captação de energia solar no lago da Hidrelétrica de Balbina

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Em Sobradinho

Inauguração do projeto piloto de geração de energia solar com placas fotovoltaicas flutuantes em Sobradinho, na Bahia, perto da divisa com o estado de Pernambuco

Cronograma de ações O cronograma de implantação e pesquisa marcou o início da execução dos projetos em 04 de março de 2016 (Balbina) e 11 de março de 2016 (Sobradinho). A entrega das Plantas Piloto em Balbina e Sobradinho está prevista para agosto de 2016, com geração de 1 MWp em cada unidade. Em outubro de 2017, serão entregues as Plantas Piloto nas duas usinas, com geração de outros 4 MWp em cada unidade (8 MW no total, que se somarão aos 2 MWp das plantas piloto). O encerramento do projeto e apresentação dos resultados está prevista para janeiro de 2019, com a geração de até 5 MWp (Megawatt-pico) em cada uma das usinas, o que poderia garantir o abastecimento energético de 9 mil residências.

A pesquisa e o projeto O projeto de pesquisa analisará o grau de eficiência da interação de uma usina solar em conjunto com a operação de usinas hidrelétricas. A pesquisa focará fatores como a radiação solar incidente no local; produção e transporte de energia; instalação e fixação no fundo dos reservatórios; a complementariedade da energia gerada; e o escoamento desta energia. Os resultados dos projetos permitirão avaliar a eficácia da produção média de energia solar nesses locais. As entidades que participarão do projeto são Sunlution, WEG, Fundação de Apoio ao Desenvolvimento da UFPE (FADE), Universidade Federal de Pernambuco (UFPE), Fundação de Apoio Rio Solimões (UNISOL) e Universidade Federal do Amazonas (UFAM).

As águas de Sobradinho também começaram a ser usadas para gerar energia solar. Participaram da cerimônia o ministro Eduardo Braga (Minas e Energia), o presidente da Eletrobras, José da Costa Carvalho Neto, o presidente da Chesf, José Carlos de Miranda Farias, o representante da empresa Sunlution, executora do projeto, Orestes Gonçalves, e o idealizador dos flutuadores, Bernard Prouvost, da empresa francesa Ciel et Terre, além de outras autoridades e profissionais do setor elétrico. A Companhia Hidro Elétrica do São Francisco ( Chesf) e a Eletronorte deram um passo importante para consolidar a energia produzida a partir do sol, em larga escala, no Brasil, com a inauguração do protótipo do projeto que colocou placas fotovoltaicas flutuantes no maior reservatório do Nordeste (o de Sobradinho). O sistema terá a capacidade de gerar 5 megawatts. “Dependendo dos estudos, Sobradinho poderá expandir em até 300 MW a geração solar e Balbina até 500 MW. Essa experiência poderá ser replicada em pelo menos mais seis hidrelétricas do São Francisco. Esse tipo de geração tem forte possibilidade de crescer nos próximos 10 anos”, disse o ministro de Minas e Energia, Eduardo Braga. O investimento na iniciativa foi de R$ 114 milhões, bancados pelas duas estatais via o programa de Pesquisa & Desenvolvimento aprovado pela Agência Nacional de Energia Elétrica (Aneel). No mundo, é a primeira vez que se coloca essas placas no lago de uma hidrelétrica. “A água em Sobradinho pode variar, mas o sol sempre brilha. A nossa expectativa é de que isso seja o marco inicial de um grande projeto de geração solar no Nordeste”, afirma o presidente da Chesf, José Carlos de Miranda Farias, acrescentando que a geração solar pode contribuir para poupar a água de Sobradinho. Isso ocorreria por dois motivos. Primeiro, poderia ser priorizado a geração solar num período seco. Segundo, há a expectativa de que a evaporação do lago diminua com a instalação das placas fotovoltaicas flutuantes. O reservatório ficou com 1,8% do seu volume útil em dezembro de 2015. O protótipo produzirá, inicialmente, 5 quilowatts. Em agosto próximo, devem

“Com inovação tecnológica, com planejamento estratégico, o Brasil se prepara para ter não apenas um setor elétrico robusto, mas seguro do ponto de vista energético, eficiente, limpo e sustentável do ponto de vista ambiental e social, e barato, para que nós possamos gerar emprego e ajudar o Brasil voltar a crescer economicamente”, disse o ministro de Minas e Energia, logo após a cerimônia de inauguração do projeto piloto. revistaamazonia.com.br

Braga explicou que a nova tecnologia pode trazer mais racionalidade econômica e reduzir custos das tarifas

estar instalados um MW. Mais quatro MW serão implantados até o primeiro trimestre de 2017, totalizando os cinco MW, energia suficiente para abastecer 9 mil residências. Quando estiver completo, os painéis fotovoltaicos ocuparão uma área equivalente a cinco estádios de futebol, correspondendo a 0,02% da área do lago. Isso mostra o grande potencial existente em Sobradinho. O monitoramento da experiência será realizada até 2019. As placas têm resistência aos ventos de até 200 quilômetros por hora e as ondas com até 1,5 metro. As placas fotovoltaicas flutuantes serão montadas em blocos e fabricadas em Camaçari, na Bahia. O projeto gerou uma joint-venture formada entre a empresa brasileira Sunlution e a francesa Ciele et Terre, detentora da patente e tecnologia das placas flutuantes. A primeira já implantou sistemas similares em lagos no Japão, China e Coréia do Sul. “É um projeto histórico do setor elétrico brasileiro e tem tudo para mostrar a viabilidade de um sistema híbrido com geração hidráulica e solar”, afirmou o diretor do Sunlution, Orestes Gonçalves. Ainda na coletiva, Eduardo Braga disse que há uma previsão do Ministério que os reajustes anuais das distribuidoras ficarem abaixo do Índice de Preços ao Consumidor Amplo (IPCA) que foi de 10,65% em 2015. Segundo ele, está ocorrendo uma queda no preço da geração, a qual representa 55% do preço da tarifa cobrada ao consumidor final. Essa queda acontece porque há mais água nos reservatórios das principais hidrelétricas e a entrada de energia nova das eólicas, das hidrelétricas de Teles Pires, Belo Monte e novas máquinas em Santo Antonio e Jirau.

Na coletiva, Eduardo Braga disse que há uma previsão do Ministério que os reajustes anuais das distribuidoras ficarem abaixo do Índice de Preços ao Consumidor Amplo (IPCA) que foi de 10,65% em 2015 REVISTA AMAZÔNIA

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Mais de 1 milhão de brasileiros devem gerar sua própria energia

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ocê já pensou em gerar a sua própria energia elétrica em casa? Pois essa possibilidade já existe e deve ser cada vez mais comum no país. Segundo estimativa da Agência Nacional de Energia Elétrica (Aneel), até 2024 cerca de 1,2 milhão de residências no Brasil vão contar com energia produzida pelo sistema de geração distribuída, que permite que o consumidor instale pequenos geradores de fontes renováveis, como painéis solares e microturbinas eólicas, e troque energia com a distribuidora local, com objetivo de reduzir o valor da conta de luz. O diretor da Aneel Tiago Correia já instalou oito placas de geração de energia solar em sua casa, o que vai atender ao consumo total da residência a partir do mês que vem. Para ele, além da vantagem de usar apenas fontes renováveis, um dos benefícios da geração distribuída é a redução de investimentos em redes de distribuição de energia. “Ela traz a geração para próximo do consumo”, afirma. Desde 1º de março, começaram a valer as novas regras aprovadas pela Aneel para a geração distribuída no país, que devem aumentar a procura pelo sistema. Uma das novidades é a possibilidade de geração compartilhada, ou seja, um grupo de pessoas pode se unir em um consórcio ou em cooperativa, instalar uma micro ou mini geração distribuída e utilizar a energia gerada para reduzir as faturas dos consorciados ou cooperados. Segundo Tiago Correia, essa mudança vai possibilitar que mais pessoas adotem a geração compartilhada. “Quanto maior o sistema, mais barata é a instalação total, porque alguns custos são diluídos. Isso faz com que o retorno do investimento seja muito mais rápido, além de facilitar o acesso ao crédito cooperativado”, acrescenta. Também foi autorizado pela Aneel que o consumidor gere energia em um local diferente do consumo. Por exemplo, a energia pode ser gerada em uma casa de campo e consumida em um apartamento na cidade, desde que as propriedades estejam na área de atendimento de uma mesma distribuidora. A norma também permite a instalação de geração distribuída em condomínios. Nesse caso, a energia gerada pode ser repartida entre os condôminos em porcentagens definidas pelos próprios consumidores. 60

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Quando a quantidade de energia gerada em determinado mês for superior à energia consumida, o cliente fica com créditos que podem ser utilizados para diminuir a fatura dos meses seguintes

Quando a quantidade de energia gerada em determinado mês for superior à energia consumida, o cliente fica com créditos que podem ser utilizados para diminuir a fatura dos meses seguintes. De acordo com as novas regras, o prazo de validade dos créditos passou de 36 para 60 meses.

Crescimento Entre 2014 e 2016, as adesões ao modelo de geração distribuída quadruplicaram no país, passando de 424 conexões para 1.930 conexões. Para este ano, o crescimento pode ser de até 800%, segundo a Aneel. “O potencial de crescimento é muito grande, e a taxa de crescimento tem sido exponencial, até porque a base ainda é baixa”, afirma Correia. Atualmente, cerca de 90% das ins-

talações de geração distribuída no país correspondem a painéis solares fotovoltaicos. Para o presidente executivo da Associação Brasileira de Energia Solar Fotovoltaica (Absolar), Rodrigo Sauaia, as novas regras aprovadas pela Aneel vão ajudar a fomentar o uso da geração distribuída no país. “A revisão das normas vai possibilitar ampliação expressiva da participação da população brasileira na geração distribuída. O Brasil acabou de se posicionar como uma referência internacional, na vanguarda na área de incentivo ao uso da energia de geração distribuída, em especial a geração solar”, lembra.

Custos O investimento em um sistema de geração de energia distribuída ainda é alto no revistaamazonia.com.br


Brasil, por causa do custo dos equipamentos, mas o retorno poderá ser sentido pelos consumidores entre cinco e sete anos, segundo o diretor da Aneel. “Se você pensar como um investidor, que tem um dinheiro disponível e gostaria de aplicar, traria um rendimento muito melhor do que qualquer aplicação financeira disponível hoje”, diz Tiago Correia. Já o responsável pela área de geração distribuída da empresa Prátil, Rafael Coelho, estima que uma residência consiga obter o retorno do investimento a partir de quatro anos, dependendo da radiação do local e do custo da tarifa. Para ele, o investimento vale a pena, especialmente porque o consumidor evita oscilações na tarifa de energia. “Quando você faz o investimento em um sistema desses, é o equivalente a você comprar um bloco de energia antecipado, um estoque de energia, que poderá usar por 25 anos sem se preocupar se o valor da energia vai subir ou vai descer”, diz Coelho. Segundo ele, o aumento da procura por equipamentos vai fazer com que o custo da instalação tenha uma redução nos próximos anos. “Como qualquer indústria, ela precisa de escala para poder reduzir o custo unitário. Então, com o crescimento do setor, essa escala deve vir e consequentemente o custo para o cliente deve abaixar também”. Para a Absolar, o principal gargalo para o avanço do setor de geração distribuída no

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O investimento vale a pena, especialmente porque o consumidor evita oscilações na tarifa de energia

país é a questão tributária, especialmente nos 12 estados que ainda não eliminaram o Imposto sobre Circulação de Mercadorias e Serviços, o ICMS sobre a energia da microgeração. Em nível federal, o governo já fez a desoneração do PIS-Pasep e da Cofins sobre o sistema. Em relação ao financiamento, a entidade espera que o governo mobilize os bancos públicos para a oferta de crédito com condições especiais para pessoas e empresas interessadas em investir em mini e microgeração distribuída.

Exemplo A sede própria da empresa Qualy Lab foi planejada para suprir 100% do seu

consumo de energia elétrica. “O valor que seria usado para pagar a conta de luz, está sendo usado para financiar nosso sistema de energia solar, e após o período de financiamento esse sistema está pago e gerando lucro. O sistema de energia solar, denominado fotovoltaico, é composto por painéis de silício, que captam a luz solar e transformam em energia elétrica. Através de um inversor, a energia passa a ter as características da rede elétrica. Essa energia irá abastecer todos os equipamentos elétricos do local e o que sobrar poderá ser lançado na rede elétrica, gerando um crédito de energia que será abatido nas próximas contas de luz.

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Chineses são autores do “Sol artificial” mais longo que já existiu na Terra

Cientistas reproduzem a energia do Sol em busca de energia ilimitada via fusão nuclear Chineses criam “sol artificial” na Terra. A crise energética pode estar com os dias contados. Super-reator será capaz de produzir eletricidade a partir do hidrogênio

Fotos: Academia Chinesa de Ciências, Instituto Hefei da Ciência Física, EPA

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experimento foi breve, não chegou nem a dois minutos, mas os 102 segundos que durou foram suficientes para transformar uma equipe de cientistas chineses nos autores do “Sol artificial” mais longo que já existiu na Terra. Apesar de o “astro” criado ter sido efêmero, representou um grande avanço na longa corrida para tornar realidade um dos maiores desafios científicos do século XXI: imitar as estrelas e conseguir que a fusão nuclear seja uma fonte de energia viável. O Instituto de Ciência Física da cidade chinesa de Hefei, no leste do país, realizou recentemente esse experimento, embora a Academia de Ciências da China tenha demorado para divulgar a façanha. 62

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O reator chinês nuclear, conhecido como Tokamak Superconductor Experimental Advanced (EAST), localizada no leste da China, possui uma câmara de metal oco na forma de um donut, onde átomos de hidrogênio se transformam em plasma. Os campos magnéticos intensos são usados para manter o plasma longe das paredes

Utilizando o reator de fusão termonuclear EAST (sigla em inglês de Tokamak Superconductor Experimental Advanced), os pes-

quisadores elevaram a temperatura do hidrogênio para 50 milhões de graus celsius, triplicando a do núcleo do Sol. Após esse aumento térmico, o hidrogênio passou de gás a plasma, o quarto estado da matéria (junto a sólido, líquido e gasoso), no qual as partículas se movimentam a tal velocidade e se chocam com tanta força que os elétrons se separam dos núcleos dos átomos formando um conjunto ionizado. A novidade do experimento chinês, no entanto, não está nessa alta temperatura, mas no tempo que conseguiram mantê-la, já que em dezembro uma equipe do Instituto Max Planck da Alemanha conseguir atingir 80 milhões de graus em um teste similar. Enquanto os cientistas alemães, e antes deles outros europeus, japoneses e amerirevistaamazonia.com.br


canos, consideraram um sucesso chegar ao pico térmico em uma fração de segundo, os chineses o fizeram durante por um minuto e 42 segundos. Ao controlá-lo por tanto tempo demonstra uma evolução técnica que os aproxima do que a maioria dos especialistas veem ainda muito longe: a chegada de reatores nucleares de fusão capazes de imitar o processo que acontece no Sol de forma natural. A fusão é uma reação química que consiste na união de dois átomos para formar um maior liberando uma enorme quantidade de energia no processo, mais inclusive que na fissão que se realiza nas usinas nucleares, onde se quebram átomos grandes em partículas menores. Conseguir uma fusão nuclear estável e controlada é, por seu potencial como fonte de energia limpa e obtida de um recurso quase inesgotável, uma das grandes ambições da comunidade científica internacional. Estados Unidos, União Europeia, China, Rússia, Japão, Índia e Coreia do Sul formaram uma aliança incomum para explorar a viabilidade da fusão de hidrogênio para a geração de energia no projeto ITER (Reator Internacional Termonuclear Experimental), que está sendo construído no sul da França. O EAST chinês é uma espécie de versão em pequena escala do ITER e os dados de seu último experimento serão disponibilizados aos parceiros internacionais que participam desse projeto, segundo anunciou a Academia de Ciências da China. O maior obstáculo da fusão para ser viável como fonte de energia, segundo os especialistas, consiste no confinamento do plasma durante um tempo suficientemente longo em um discreto volume e daí a importância da descoberta do Instituto de Ciência Física de Hefei, que chegou mais longe do que ninguém nesse aspecto. A Academia de Ciências da China definiu seu resultado como um “marco” e reconheceu que, para consegui-lo, foi preciso superar

Eles foram capazes de aquecer o plasma a três vezes a temperatura do núcleo do nosso sol por um recorde de 102 segundos à medida que avançava a pesquisa para obter energia a partir da fusão nuclear Cientistas chineses chegaram a um passo mais perto de criar um sol artificial aquecendo o gás de hidrogênio a 50 milhões de graus Kelvin com um tempo recorde

muitos problemas físicos e de engenharia. “Foi conseguido através de um aquecimento com um plasma confinado por uma supercondução magnética”, ou seja, o plasma foi retido dentro do reator graças a um A imagem do computador colorido mostra o momento em que o primeiro plasma super-quente foi criado em uma experiência separada em Wendelstein 7-X centro de investigação da fusão nuclear no Max-Planck-Institut de Física de Plasma (IPP) em Greifswald, Alemanha, em dezembro

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sistema de potentes ímãs, explicou à Efe Li Ge, pesquisador do Instituto de Ciência Física de Hefei. Mais que gerar energia, a ideia dos cientistas chineses era se concentrar no requisito prévio: prolongar o tempo durante o qual se pode trabalhar com o plasma a temperaturas extremas. Seu próximo objetivo é chegar aos 100 milhões de graus e preservá-los durante 1.000 segundos (16 minutos e 40 segundos). Antes de chegar a esse ponto, a Academia de Ciências da China adverte que “ainda há muitos desafios científicos e técnicos” e Li acredita que o reator termonuclear terá que ser “atualizado”. Essas afirmações mostram que a corrida para reproduzir um Sol na Terra pode ser que demore anos, seguramente décadas, mas mostram que para os esforços de controlar a fusão nuclear dentro dos reatores já faltam 102 segundos a menos. REVISTA AMAZÔNIA

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Abandonem a cidade!

“Abandonem a cidade!” Especialistas em clima alertam para o deslocamento e migração, se o nível do mar subir Mar subirá até 1,3 metro neste século, diz estudo por Gero Rueter*

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s cientistas estão trabalhando febrilmente para compreender os complexos mecanismos de condução aumento do nível do mar. Sem cortes drásticos nas emissões de CO2, dizem que 20 por cento da população mundial podem perder suas casas para elevação dos mares. Uma série de trabalhos científicos que examinaram o efeito das alterações climáticas sobre os oceanos do mundo estão derramando mais luz sobre o tema. Ainda recentemente, os principais especialistas do nível do mar alertaram que as emissões de combustíveis fósseis de hoje significam elevação dos mares durante os séculos vindouros. O relatório mais recente publicado pelo Painel Intergovernamental sobre Mudanças Climáticas (IPCC) em 2013 tentou projetar

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a subida do nível do mar no futuro. Os autores consideraram quatro cenários diferentes para a subida do nível do mar com base em diferentes taxas de aquecimento como resultado da queima de quantidades diferentes de combustíveis fósseis. Mas estes não incluem as contribuições dinâmicas de derretimento do gelo na Antártida e na Groenlândia. As duas regiões são cobertas por lençóis de gelo, que juntos armazenam mais de dois terços da água doce do mundo. Se a camada de gelo da Groenlândia derretesse, os cientistas estimam que o nível do mar subiria cerca de 6 metros (20 pés). Se a camada de gelo da Antártida estavam derretendo, o nível do mar subiria cerca de 60 metros (200 pés).

Oceanos mais quentes, mares mais elevados A mudança climática leva a elevação do nível do mar de várias maneiras. Em primeiro lugar, a água se expande quando é mais quente, ocupando mais volume. Um estudo publicado recentemente no “Proceedings of the National Academy of Sciences” indica que a quantidade de aumento do nível do mar que vem do aquecimento dos oceanos e em expansão tem sido subestimada no passado. Roelof Rietbroek da Universidade de Bonn, na Alemanha, um dos autores do estudo, disse que a parte de aquecimento do oceano na ascensão do nível do mar foi provavelmente o dobro do que se pensava anteriormente. revistaamazonia.com.br


No geral, a taxa de aumento do nível do mar é de cerca de 2,7 milímetros por ano. Isso inclui a expansão térmica e derretimento de camadas de gelo e geleiras. Rietbroek e seus colegas usaram dados de satélite de 20022014 para mostrar que a expansão só por si representa cerca de 1,4 milímetros por ano. Além de marégrafos e bóias flutuantes, tecnologia de satélite está ajudando a fazer medições mais precisas,disse o co-autor do estudo Jürgen Kusche da Universidade de Bonn. “O oceano é um grande espaço, e é muito difícil de medir o aquecimento dos oceanos”, disse Kusche. “Muito poucos [instrumentos] realmente ir até o fundo do oceano, que tem uma profundidade média de 3.500 metros.”

O desconhecido profundo A água do oceano absorveu mais de 90 por cento de excesso de calor na atmosfera e cerca de 30 por cento do dióxido de carbono gerado pelo consumo de combustíveis fósseis. Cientistas dos EUA descobriram recentemente que os oceanos do mundo estão se aquecendo a uma taxa acelerando, com os últimos 20 anos responsável por metade do aumento do teor de calor do oceano que tem ocorrido desde os tempos pré-industriais. No artigo publicado na revista “Nature Climate Change”, os cientistas do Laboratório Nacional Lawrence Livermore, trabalhando com a Administração Oceânica e Atmosférica Nacional, analisadas as alterações de conteúdo de calor em diferentes profundidades dos oceanos do mundo, utilizando dados e modelos que remontam a 1865. Eles descobriram que a maior parte do calor extra no oceano profundo é armazenada debaixo d’água, com 35 por cento do calor adicional encontrado em profundidades inferiores a 700 metros. Há duas décadas, tais profundezas do oceano continham ape-

A Antártida é a chave para o futuro aumento do nível do mar

nas 20 por cento do calor extra produzido a partir da liberação de gases de efeito estufa desde a revolução industrial.

Difícil de prever: Groenlândia e da Antártida A outra principal fonte de aumento do nível do mar é o derretimento do gelo da Groenlândia e da Antártida. Desde o último relatório do IPCC foi publicado, os dados por satélite e monitoramento no local mostraram que a Antártida foi perdendo gelo ao longo de décadas passadas – e que a perda de gelo está se acelerando. Comentando um estudo de 2013, o especialista Andrew Shepherd disse: “Juntos – a Antártida e a Groenlândia – estão agora contribuindo três vezes mais com o gelo para o nível do mar do que há 20 anos atrás.” A Antarctica, a região mais fria na terra, era para ser imune ao aquecimento global. Mas o aquecimento dos oceanos tem desestabilizado partes do gelo a partir de baixo, desencadeando processos de fusão no oeste da Antártida, que muitos cientistas acreditavam ser irreversível. Recentemente, comparativamente, na revista “Geophysical Research Letters”, modelos climáticos atuais, reviram os dados anteriores da Antártida, – derretimento no último período interglacial, mais de 100.000 anos atrás. Eles concluíram que, se a temperatura do oceano aumentar em mais de 2 graus Celsius em comparação com a de hoje, a camada de gelo da AntárRoelof Riebroek e tida Ocidental será Jürgen Kusche

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irreversivelmente perdida. Mesmo a Antártida Oriental, que é considerada mais estável, parece não imune ao clima de fusão induzida por mudança. Anders Levermann do Instituto Potsdam para a Pesquisa do Impacto Climático, o principal autor do capítulo do IPCC sobre mudança do nível do mar, disse que ainda há um enorme grau de incerteza em torno da quantidade exata de elevação do nível do mar, podemos esperar e em que ponto no futuro. Em geral, porém, Levermann, que dirige um modelo sobre o impacto das mudanças climáticas na Antártida, disse que a conclusão de um estudo que ele e colegas publicaram em 2013 ainda estão de pé. Para cada grau de aquecimento acima época pré-industrial, o nível do mar subirá cerca de 2,3 metros dentro de um período de 2000 anos. “Temos diferentes estudos que indicam que a contribuição da Antártida neste século pode ser um pouco maior do que o esperado – mais do que fomos capazes de colocar no IPCC”, disse Levermann. No conjunto, porém, ele disse que as projeções do IPCC para o século 21 eram provavelmente ainda válidas, como as mudanças vão acontecer ao longo de um período muito longo de tempo. A conclusão geral é que um processo de fusão foi posto em movimento que não pode ser parado, com enormes implicações para as gerações vindouras.

Implicações para as gerações futuras Mar e gelo são lentos para responder à mudança climática, de modo que o impacto total do aumento do nível do mar só serão sentidos nos séculos vindouros. Dados do passado da Terra mostram que o nível do mar continua a subir para muitas centenas de anos como um resultado do aquecimento global, mesmo depois de as temperaturas estabilizar. REVISTA AMAZÔNIA

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Regiões vulneráveis ao aumento do nível do mar

Altura acima do nível do mar (m) A análise “Nature Climate Change”, de autoria de especialistas líderes do nível do mar, diz que mesmo sob o cenário do IPCC menor para o aumento do nível do mar, – 20 por cento da população mundial – cerca de 1,3 bilhões de pessoas – vivem em áreas que podem ser diretamente afetados pela elevação do nível do mar. Thomas Stocker, da Universidade de Berna, na Suíça, co-autor e clima modelador, disse aos jornalistas sobre a era do combustível fóssil: “comprometer-nos com os esforços de adaptação maciças de modo que, para muitos, deslocamento e migração tornam-se a única opção”.

Paris: “Os planos de redução das emissões atuais de cidadãos em todo o mundo são claramente não suficientes para estabilizar os níveis do mar, a ciência mostra – as emissões têm de ser deixadas completamente se o aumento da temperatura e, eventualmente, do nível do mar não for interrompida”. Levermann disse em uma das declarações do IPCC: É com a maior certeza que o nível do mar vai continuar a subir durante

os séculos vindouros. “Nós realmente não podemos parar a subida do nível do mar – não para os próximos séculos – mas nós podemos torná-lo muito mais suave em velocidade e magnitude final, de modo que nós não perdermos muito”. [*] Em DW

Abandonando cidades O perito do Mar, Peter Clark, da Universidade Estadual de Oregon, que conduziu o estudo do deslocamento, disse que não havia limites para inundar medidas de proteção. “Não podemos continuar a construir diques de 25 metros de altura”, disse Clark. “Populações inteiras de cidades acabarão por ter de se mover”. O documento sublinha que, considerando as escalas de tempo, ao longo do ciclo do carbono e das alterações climáticas, reduzindo as emissões ligeiramente ou mesmo significativamente não é suficiente. “Para poupar as gerações futuras dos piores impactos da mudança climática, a meta deve ser zero – ou mesmo emissões de carbono negativos – o mais rápido possível”, disse Clark. O co-autor Levermann, apelou para a implementação urgente do acordo climático 66

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Cheias no centro de Veneza: nível do mar já subiu bastante O arquipélago de Tuvalu, no Pacífico, vai ser especialmente atingido pelo aumento do nível do mar

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Ano 11 Nº 55 Março/Abril 2016

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