Ano X I - nº 43 | Setembro / Outubro / Novembro 2013
www.artestudiorevista.com.br
arquitetura & estilo de vida
ESpAÇO lIVRE
Design de interiores aposta em espaços integrados
pRIVAcIDADE
como garantir isso em casas geminadas?
MUITAS cORES O colorido marca a reforma de um apartamento
O HOTEl QUE VIROU
SHOppING A história do Paraíba Palace e sua tentativa de volta por cima
ESPAÇO DE SOBRA
Apartamento de 360m² ganha ares de casa e aproveita a iluminação natural
+ Arquitetura modernista em ‘Intriga Internacional’ , azulejos em alta e uma visita a Singapura
SUMÁRIO
Setembro / Outubro / Novembro 2013
DICAS & IDEIAS 28 A HISTORIA DE...
O fogão começou como um buraco no chão para se tornar fundamental na alimentação
32 AMBIENTAÇÃO
Salas de jantar precisam combinar estética e a boa acomodação das pessoas
24 ARTIGOS
72 ACÚSTICA
A questão da privacidade nas moradias geminadas
84 ARQUITETURA E MODA
O romantismo e o frescor da azulejaria azul nas passarelas e na ambientação
VÃO LIVRE 12
CONHEÇA
As crianças e a importância do patrimônio histórico
VISÃO PANORÂMICA 20
Amelia Panet dá um tempo na arquitetura para falar do prazer da mesa
URBANISMO 14
As bicicletas começam a tomar as ruas de João Pessoa
Vida Profissional 24
O uso da internet para compor o marketing de arquitetos e designers de interiores
ponto final 96
A casa e seus significados psicológicos e históricos
26 LIVRO
Administração de Escritórios de Arquitetura e de Engenharia é resultado de nove anos de pesquisas
68 Grandes arquitetos
O japonês Kenzo Tange e sua importância na reconstrução japonesa após a II Guerra
74 ACERVO
Os novos dias do Paraíba Palace, o histórico hotel que está virando um shopping
80 VIAGEM DE ARQUITETO
Beleza e prosperidade em Singapura, conhecida como a ‘capital do milênio’
ENTREVISTAS ENTREVISTA
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Wellington Tardivo fala sobre a iluminação nos estádios da Copa de Mundo
CONVERSA FRANCA 89
Fábio Queiroz fala sobre a proposta de valores de referência para serviços de arquitetura
SOCIEDADE REPORTAGEM 89
Os moradores que ainda escolheram morar no centro de João Pessoa
especial 94
Resolução da CAU/BR define atribuições de arquitetos e urbanistas
OUTRAS ÁREAS 92
Em seus primeiros segundos no The Voice, Lucy Alves já mostrou talento e carisma
84 ARQUITETURA E ARTE
A casa modernista no topo do Monte Rushmore, de Intriga Internacional, de Hitchcock
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rereading O TAPETE COM MUTAÇÃO DE IMAGEM. MISSONI CHEVRON STARK
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PROJETOS SEM BARREIRAS
36
ABERTO pARA O ENTORNO
44
REFORMA cOlORIDA
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NOSSA cApA
58
Ambientes integrados são a marca de projeto de design de interiores
Casa em condomínio ganha projeto que a integra com o ambiente
Projeto de apartamento em São Paulo aposta na cor e os objetos de arte
O espaço bem aproveitado no projeto de um apartamento de 360m²
Nossa capa: Foto: Vilmar Costa Projeto: Geórgia Suassuna
EDITORIAL
NEM TuDO é COMéRCIO As cidades são mutáveis, todos sabemos disso. Elas surgem de uma forma, mais ou menos ou nada planejadas, mas seus cidadãos vão moldandoas com o passar das décadas e certas áreas mudam completamente de cara. Os centros, por exemplo, costumam deixar de serem residenciais e passar a ser quase totalmente ocupados pelo comércio e escritórios. É o caso em João Pessoa, mas uma reportagem desta edição aborda exatamente o “quase”: algumas histórias que pessoas que ainda moram no centro da cidade, suas rotinas, conveniências e inconveniências. O urbanismo é um dos pontos principais da nossa pauta nesta edição, mas não só. Também abordamos a definição das funções do arquiteto, damos uma olhada na arquitetura como arte quase pura em um shopping no Rio, viajamos ao passado que tenta se manter presente com o Paraíba Palace, desvendamos uma arquitetura “de mentirinha” em um filme de Hitchcock. E também mostramos nosso costumeiro e variado cardápio de projetos de arquitetura e ambientação que dão uma ideia a você, leitor, do que anda sendo feito no setor no que ele tem de mais belo e prático para os moradores. O nosso compromisso é estar atento aos ventos que sopram na seara profissional e também abrir janelas para outros interesses – é por essas e outras que também abordamos a carreira de Lucy Alves, um talento paraibano que desponta nacionalmente.
MÁRCIA BARREIROS
editora geral e diretora executiva Colaboradores desta edição:
Boa leitura!
ARTESTUDIO
WELLINGTON COSTA prod. e diagramador
RENATO FÉLIX editor de jornalismo
AMÉLIA PANET arquiteta
ROSSANA HONORATO arquiteta
DIEGO CARNEIRO fotógrafo
JEAN FECHINE arquiteto
GERMANA GONÇALVES designer interiores
DÉBORA CRISTINA jornalista
EDU COP profiss. marketing
LIDIANE GONÇALVES jornalista
THAMARA DUARTE jornalista
ALEX LACERDA jornalista
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arquitetura & estilo de vida ANO XI - Set. /Out./Nov. 2013
EXPEDIENTE Diretora/ Editora geral - Márcia Barreiros Editor responsável - Renato Félix, DRT/PB 1317 Redatores - Alex Lacerda, Débora Cristina,
Lidiane Gonçalves, Renato Félix e Thamara Duarte
Diretor de criação - George Diniz Diretora comercial - Márcia Barreiros Arte e diagramação - George Diniz / Welington Costa Fotógrafos desta edição - Diego Carneiro / MB / Vilmar Costa Impressão - Gráfica JB
QuEM SOMOS ARTESTUDIO é uma publicação trimestral, com foco em arquitetura, decoração, design, arte e estilo de vida, com tiragem de 8 mil exemplares de distribuição gratuita e dirigida. A reprodução de seus artigos, fotografias e ilustrações requer autorização prévia e só poderá ser feita citando a sua fonte de origem. As colaborações e artigos publicados e fotos de divulgação são de responsabilidade exclusiva de seus autores, não comprometendo a revista, nem seus editores.
ONDE NOS ENCONTRAR Contato: +55 (83) 3021.8308
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c o n t a t o @ a r t e s t u d i o r ev i s t a . c o m . b r d i r e t o r i a @ a r t e s t u d i o r ev i s t a . c o m . b r R. Tertuliano de Brito, 348 - Bairro dos Estados, João Pessoa / PB , CEP 58.030-044 revistaae @revARTESTuDIO Artestudio Márcia Barreiros
www. artestudiorevista. com. br As matérias da versão impressa podem ser lidas, também, no nosso site: www.artestudiorevista.com.br com acesso a mais textos, mais fotos e alguns desenhos de projetos 14
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ENTREVISTA
Wellington Responsável comercial da GE fala das exigências da Fifa para a iluminação nos estádios da Copa Texto: Lidiane Gonçalves | Fotos: Divulgação
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Tardivo
uando você liga a televisão e começa a assistir a um evento esportivo, pode não ter ideia da tecnologia envolvida para mostrar os melhores lances, seja em um campeonato local ou para grandes eventos, como a Copa do Mundo de Futebol e as Olimpíadas. Para a Copa, os estádios já estão se aprontado e arquitetos e engenheiros já elaboraram os projetos, para que tudo saia bem. Para as Olimpíadas, apesar de projetos montados, muita coisa ainda pode mudar. Fundamental para o desempenho do atleta e estrela maior para o televisionamento, a iluminação não é uma coadjuvante nestes espetáculos. Mais moderna, mais sustentável, com mais tecnologia, a iluminação tem que seguir rigorosas normas internacionais, que só podem ser colocadas em prática graças aos projetos de iluminação realizados por profissionais capacitados. A exigência para a iluminação esportiva para a Copa do Mundo é da Fifa, mas os aparelhos modernos de televisão, que mostram imagens em 3D e HDTV, estão em poder de telespectadores que querem cada vez mais qualidade e nitidez nos lances. A iluminação adequada também ajuda os jogadores, os árbitros e o público que está nas arquibancadas, em um estádio lotado, vendo seu time ou seleção do coração. Com a iluminação adequada, ganha o telespectador, o espectador das arquibancadas, atletas, árbitros, patrocinadores... Mas quem sai ganhando mesmo é o espetáculo. Para falar um pouco sobre este assunto, a ARTESTÚDIO entrevistou o engenheiro eletricista Welington Tardivo, professor de pós graduação do IPOG, que é o responsável comercial da GE pelas arenas esportivas do Brasil para a Copa do Mundo e as Olimpíadas e responsável comercial da empresa para a região Sul do Brasil para iluminação geral, pública e para shoppings. Arena da Amazônia
ARTESTUDIO – Qual a importância de uma iluminação adequada para a atividade esportiva? Welington Tardivo – Primeiro, é importante para a prática do esporte, para que se tenha o mínimo de iluminação para o atleta. Mas o mais importante, hoje em dia, quando se fala em Copa do Mundo e Olimpíadas, é que
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a iluminação é essencial para televisionamento, porque a gente sabe que existem 60 mil pessoas dentro de uma arena esportiva, porém tem muito mais gente fora da arena assistindo, pessoas que não tiveram a oportunidade de ir até a arena. No caso da Copa do Mundo, estamos falando em 4 bilhões de pessoas que assistem a esses
grandes eventos. A iluminação não é só para quem esta dentro das arenas, mas para quem está fora, por causa do televisionamento. E é o televisionamento que paga a conta dos investimentos realizados para a construção de novas arenas. Os patrocinadores, as pessoas que assistem a Fifa, precisam que o televisionamento seja o melhor. AE – Em que medida a iluminação adequada é tão importante para a transmissão dos jogos? WT – As câmeras precisam de um nível mínimo de iluminação. Para quem trabalha com iluminação esportiva televisionada, as câmeras precisam ter luz frontal, para a captura perfeita das imagens dos atletas, das arquibancadas, espectadores, de todo o estádio... Precisamos ter um nível mínimo que é determinado pelas organizações internacionais de televisionamento para grandes eventos. Eles monitoram, também, o nível de iluminação necessária para o perfeito televisionamento. No passado, quando falávamos em iluminação esportiva, o nível era mais baixo. Antes eram 1200 lux, hoje são 4 mil lux de iluminação para a Copa do Mundo. Tudo isso porque hoje temos TV em alta definição, HDTV, TV em 3D, então a exigência do nível de iluminação aumentou muito mais, é muito maior do que há três ou quatro Copas do Mundo. AE – Qual a diferença entre as arenas que têm e as que não têm o processo adequado de iluminação esportiva? WT – A diferença é a questão do nível. Se pegarmos hoje os grandes estádios do Brasil, eles não chegam nem próximos do nível exigido pela Fifa. A grande diferença é o nível de iluminação melhor, as lâmpadas não têm boa reprodução de cor. Normalmente o que é utilizado aqui é muito baixo em relação ao que é pedido na Copa do Mundo e nas Olimpíadas.
AE – A temperatura de cor influencia nos projetos de iluminação esportiva? WT – O que vemos no Brasil em relação à temperatura de cor, que é extremamente importante, é uma temperatura de 4 mil kelvin, quando os grandes eventos pedem lâmpadas com maior temperatura de cor, para que se aproxime mais da temperatura de cor vista durante o dia, que tem mais ou menos 6 mil kelvin. Então o ideal é que, para a prática em equipamentos esportivos, tenham maior temperatura de cor, para deixar o ambiente mais estimulante para o atleta. Para as câmeras também é melhor. AE – Qual a ligação entre eficiência tecnológica e sustentabilidade? WT – Todas as empresas que fazem projeto de iluminação sabem que quanto menor a quantidade de refletores, mais eficiente é o projeto. Tanto a empresa onde trabalho quanto outras empresas têm que fazer projetos com foco em consciência energética, preocupados em reduzir o máximo a quantidade de pontos luminários. No nosso caso, temos uma luminária chamada EF 2000, que é bastante eficiente. Com ela conseguimos reduzir a quantidade de luminárias de versões anteriores. Com as luminárias mais antigas eram necessárias 550 pontos de lâmpadas de 2 mil w. No caso do Maracanã foram 400. Diminuímos a quantidade de projetores, minimizamos os gastos com energia elétrica e gastos com equipamentos: muito menos lâmpadas no sistema elétrico, muito menos projetores. AE – Essa nova e sustentável tecnologia está apenas nas arenas esportivas oficiais ou ela já começa a chegar em arenas menores, como as de condomínios residenciais e escolas?
Maracanã iluminado
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delas. Sempre seguimos muito à risca as questões das normas, todos os nossos projetos seguem as normas internacionais, para que atendam à risca o que está escrito.
WT – Não. Na verdade existem projetores menos eficientes que poderiam ser utilizados nesses outros locais onde não se exige um nível de iluminação não tão profissional, são mais para recreação. Hoje o mercado está aberto. Muitos fabricantes têm projetores para quadra e você pode utilizar nessas áreas mais residenciais e comerciais.
AE – As exigências para a Copa do Mundo são as mesmas que foram feitas para as Olimpíadas? Ou algum dos organizadores é mais exigente que o outro? WT – Cada federação tem o seu requerimento, então depende. Entre as duas competições só poderíamos comparar o futebol. E no futebol não é o mesmo padrão para a iluminação na Copa do Mundo e nas Olimpíadas. A Fifa tem um requerimento, o Comitê Olímpico tem outro. Hoje já estamos fazendo projeto para as Olimpíadas, mas pode ser que para 2015 eles lancem outro caderno técnico, com outros requerimentos. Por exemplo, para a Copa não foi exigido um reator eletrônico, com o qual você consegue fazer a captura das câmeras em slow motion. É um equipamento eletrônico que você consegue capturar mais imagens por segundo. Na Copa não foi exigido, mas pode ser que nas Olimpíadas seja e todos os fabricantes tenham que se adequar aos novos requerimentos. Nas Olimpíadas eles vão exigir alguma coisa a mais e aí todo fabricante vai ter que correr para atender aquele requerimento.
AE – Então qual a recomendação para a iluminação de arenas que são usadas para eventos menores que copas e olimpíadas? WT – Para arenas que não seguem o padrão para televisionamento, a nossa recomendação é sempre buscar o requerimento da federação internacional da categoria. Um ambiente para basquete, quem vai projetar tem que pegar o que diz o requerimento da Federação de Basquete e verificar o que diz sobre iluminação. No futebol, buscar o que diz a Fifa. A Fifa tem um requerimento só voltado para iluminação. Cabe aos projetistas, às empresas de arquitetura e engenharia buscar esses requerimentos junto às federações, que existem nos sites de cada uma
AE – O que podemos falar da iluminação esportiva existente hoje no Brasil? WT – Acho que cabe muito aos órgãos falar da iluminação para o televisionamento: à Fifa, às federações internacionais, fazer esse monitoramento da iluminação, fazer esse check list, acompanhar mais de perto quais são os níveis de iluminação existentes no Brasil. A gente percebe que hoje, no caso do futebol, o nível de iluminação é completamente fora do que é recomendado pela Fifa. Não estou falando de Copa do Mundo, estou falando de estádios da Série A do Campeonato Brasileiro. As federações têm que estar mais próximas e fiscalizar os níveis de iluminação.
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VÃO LIVRE Foto: Divulgação
Igreja das Mercês, João Pessoa-PB
A memória
da cidade e as
crianças Texto: Dr. Manoel Jaime Xavier Filho
S
e aos pessoenses fosse solicitado fazer uma relação dos prédios mais representativos da cidade, certamente nela estariam incluídos aqueles que servem ou serviam de sede para as igrejas e conventos dos franciscanos, carmelitas, beneditinos e jesuítas. Compareceriam também o Hotel Tambaú, o Hotel Globo, o Espaço Cultural, o Liceu Paraibano, a Igreja da Misericórdia, a Casa da Pólvora, o Casarão dos Azulejos, o prédio da Academia de Comércio, o da Associação Comercial, o da Secretaria de Finanças, o da Biblioteca Pública e os do Comando Geral da Polícia Militar, Quartel do Primeiro Batalhão, antigo Correios e Telégrafos e o Teatro Santa Roza, os quatro últimos situados em volta da Praça Pedro Américo. Outros seriam lembrados, com pontuação variável. Foto: Jonas Lourenço
Esse tipo de lista ou cânone é sempre incompleto e não contempla o universo de preferências e gosto das pessoas. Seu valor reside no fato de se reconhecer a importância que certas edificações têm para a imagem, a memória e identidade de uma cidade. Quantos edifícios antigos, de valor histórico ou artístico, foram aqui demolidos em nome do suposto progresso e dessa maneira deixaram a cidade mais pobre e menos particular? Foram-se a Igreja de Nossa Senhora do Rosário (rua Duque de Caxias), a Igreja da Conceição (entre o Palácio da Redenção e a Faculdade de Direito), a primitiva Igreja de Nossa Senhora da Mãe dos Homens (Praça Antônio Pessoa), a primeira versão da Igreja das Mercês, o prédio do jornal A União, os dois da Rádio Tabajara e tantos outros. O novo nem sempre é certeza de avanço e evolução. Como exemplo, é só lembrar o edifício Régis, no Ponto dos Cem Réis, um espigão perdido, inestético e destoante a desfigurar o outrora belo centro da cidade. Por outro lado, compatibilizar construções novas e antigas é perfeitamente viável, sem nenhum tipo de agressão ou prejuízo, quando se associam inteligência, competência e bom gosto. Talvez o ensinamento mais representativo dessa combinação seja o Terminal Rodoviário Estadual, uma construção contemporânea, erguida no bairro histórico do Varadouro e, assim mesmo, em harmonia e sintonia com os casarões próximos, o rio e o manguezal. Portanto, modernizar uma cidade não implica em aniquilar o velho, principalmente se este, por si mesmo ou pelo seu passado, tem alguma coisa a oferecer e a dizer às gerações que lhe sucedem. Nunca é demais relembrar que as crianças nascem sem saber essas coisas e crescem desconhecendo-as, se não tiverem a chance de aprender. E dessa maneira chegam a ser legisladores, políticos, construtores, empresário, arquitetos, engenheiros, dirigentes e assim por diante. Aí já é tarde ... 21
VISÃO PANORÂMICA
COMIDA, DIVERSÃO E ARTE
N
esta edição eu não vou escrever sobre arquitetura. Depois de acabar uma tese de quase 500 páginas, preciso retomar o prazer de escrever por meio de outros temas. Assim, escolhi a culinária e o cinema, dois prazeres que cultivo. Eu adoro assistir a filmes com temas gastronômicos. Principalmente, aqueles onde os atores preparam delicadamente suas iguarias, desde a escolha dos ingredientes, seu preparo, cozimento, ornamentação do prato e degustação. Mesmo que um desses atores seja um rato, como em Ratatouille, um nordestino arretado como em Estômago ou, uma pequena garota vietnamita em O Cheiro do Papaia Verde. Esse último, com uma fotografia delicada, que consegue apreender detalhes como as sementes do papaia, as formigas e as gotículas de suor que brotam de Mùi. Sinto um prazer imenso em ver as cebolas sendo fatiadas, os alhos triturados, os pimentões coloridos picados, a salsinha virando um punhado de purpurina verde com a precisão de uma boa faca amolada. Os
temperos dão um toque especial, derramados em pitadas generosas inundam toda a tela e panelas, de cores e sabores. Neruda sabia bem do que falava. Em Odes Elementares ele fez uma poesia dedicada à cebola “redonda rosa de água...cresceu a tua formosura escamas de cristal... e ao cortar-te a faca na cozinha sobe a única lágrima sem pena.” Esses filmes me remetem à nostalgia de um ambiente familiar e ao aconchego de um lar amoroso. Não o filme em si, mas o ritual desse preparo e o seu significado. O estômago parece ser para mim, um órgão emocional e a comida mais que um alimento para o corpo, um sustento para a alma. Alimentar alguém é um ato de amor. Não é a toa que o tema da comida acaba por ser, também, uma das fontes para os meus poemas como em ‘Sopa de letrinhas’, um pequeno poema que escrevi em homenagem às minhas irmãs Rose e Miriam, ou ainda, em ‘Almoço de domingo’.
O Cheiro Papaya Verde - 1993
Estômago - 2007
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Ratatouille, 2007
Sopa de Letrinhas Nas noites pueris elas surgiam, vinham em tigelas fumegantes. Ocupavam o lugar de honra da mesa, ao centro. A cerimônia era quebrada pela exclamação alegre das crianças. Oba...oba! sopa de letrinhas, sopa de letrinhas. De sabores diversos: batata, frango, carne, não importava. Elas eram as estrelas: as letras. Todas embaralhadas, ensopadas. E entre o A, o M, o O e o R, mais uma colherada. Hoje elas brotam, a qualquer hora, em palavras, em sopa de letras arranjadas...
Almoço de Domingo Eram sempre mais festivos, vivos. Todos reunidos à mesa e, solenemente, chegavam os mais saborosos pratos. Tão simples aos sabores de hoje, tão especiais, às lembranças de outrora. A mais dourada galinha, o mais verde dos feijões, o mais branco arroz... tudo, carinhosamente temperado e cozido. Para beber, neste dia, tínhamos direito a dois dedos do mais doce moscatel, coisas de um pai francês. Quisera eu que todos pudessem ter a mesa farta, servida por alguém que sabe o valor de uma comida temperada com amor. Bom apetite.
Amélia Panet
Arquiteta e urbanista Mestre em arquitetura e urbanismo Doutora em arquitetura e urbanismo pela UFRN Professora do curso de arquitetura e urbanismo pela UFPB
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URBANISMO
P
ossivelmente a sociedade observa o empenho que a gestão municipal vem demonstrando em aderir a uma política pública de transporte por meio da adequação de seu sistema viário às necessidades de deslocamentos cotidianos que cruzam a cidade de João Pessoa, da periferia ao centro, ou que conectam novas centralidades a seus destinos, com o intuito de atender à expansão e à fluidez da mobilidade urbana ascendente. Um reordenamento gradativo de vias a portes e rotas adequadas ao fluxo de distintos meios de transportes urbanos chega – ora agradando, ora incomodando – à população de diversos bairros da capital do estado da Paraíba. A elaboração e, sobretudo, a implantação de um plano diretor de transportes é desafio dos grandes para a dinâmica urbana de cidades de médio porte em expansão, como é o caso. É ainda maior quando o país parece estar mergulhado em uma política de crescimento econômico sem planejamento, cuja ideologia hegemônica parece estar direcionada a tanto quanto menos transparente para a sociedade a possibilidade de acompanhar e monitorar as decisões governamentais, melhor. A busca da garantia do pleno direito à cidade e da construção de uma ativa cidadania brasileira, conceitos solidamente firmados pela Constituição Cidadã, de 1988, exige uma reforma radical na gestão pública em prol da reincorporação de uma cultura planejamento que se aproprie inclusive da exígua experiência brasileira em planejamento das políticas socioeconômicas. À parte essa expectativa incessante, vê-se o tecido urbano de João Pessoa gradativamente ser cortado de intervenções esparsas que configuram novas rotas, novos fluxos, novas pistas ou faixas viárias sinalizadas para a inclusão de novos meios de transporte, como é o caso da circulação de bicicletas. A iniciativa é animadora. Uma mentalidade cultural está em formação na cidade: estimular a população a trocar o carro particular pela bicicleta como meio de transporte e, sobretudo, acolher e passar a proteger as centenas ou milhares de trabalhadores que se deslocam casa-trabalho-casa, diariamente e da maneira mais perigosa, nos principais corredores urbanos de João Pessoa desprovidos de pistas exclusivas para bicicletas. 24
Aos observadores, já é óbvio, e a urbanistas, tardio, que um imperativo global demanda às cidades respostas rápidas e efetivas para, ao menos, atenuar o impacto negativo do, cada vez mais denso, volume do tráfego de veículos particulares que a dinâmica das metrópoles contemporâneas carreia. O que, convém lembrar, converge ainda para posicionar os países em melhor condição de corresponder aos compromissos assumidos internacionalmente, a cada ano, perante a Agenda 21, para reduzir a emissão de gases poluentes na atmosfera, provenientes de derivados dos combustíveis fósseis que predominam na geração da força-motriz de automóveis. Superar a carência de uma política de transporte público de qualidade implica aplicar medidas de desestímulo ao uso do automóvel particular, e dar voz e vez à exigência social por qualidade da oferta. O que já começa, ainda que lentamente, a constituir-se socialmente um senso comum. Com o recurso à bicicleta como meio de transporte urbano, a economia persegue um equilíbrio entre o recurso à natureza e à diminuição da exaustão de seu suporte. Ainda que o clima tropical seja úmido e quente, ensolarado na maior parte do calendário anual, se colocando como mais um empecilho à mudança de hábito para a sociedade pessoense. E que impere uma aparente resistência de agentes e profissionais atuantes em organismos públicos ao recurso da arborização urbana – lembrando que as árvores são as melhores coberturas a projetar em espaços urbanos abertos e de livre circulação. Mas o desenho fácil porque imediatista, a carência de uma formação técnica compreensiva da valia da firmação da identidade paisagística local, da cidade como expressão de cultura, de organogramas executivos que não acolhem o que deseja para a cidade seus cidadãos, terminam constituindo as principais diretrizes de projetos urbanísticos na gestão municipal. A adoção do circuito domingueiro da prática do ciclismo que se assiste na cidade de João Pessoa, da praia à Lagoa do Parque Solon de Lucena, através do principal corredor expresso da cidade: a Avenida Epitácio Pessoa, no período das 06 horas matinais às 04
Av. Epitácio Pessoa
vespertinas, é política que merece atenção e aplauso. Crê-se aqui também um estratégico recurso midiático para iniciar ou fomentar a construção de uma nova mentalidade social. Nota-se uma adesão gradativa da sociedade, inclusive eufórica. Pessoas se integram gradativamente às inovações em curso, de todas as classes sociais, idades, protegidas ou não contra quedas e queimaduras solares, mais ou menos educadas, que se vê aglomerar cada vez mais aos domingos para participar do programa municipal do circuito agendado de rotas de ciclo-faixas urbanas. Urge refletir acerca da oportunidade, se não é o programa domingueiro um importante recurso para incorporar novos valores culturais, como a ampliação do sistema de rotas de transporte para bicicletas, ainda que por agendamento e escala, por toda a cidade. A vivência de uma dessas ocasiões estimulou esta articulista à experimentação de um ousado método de observação participante ao percorrer de bicicleta um curto deslocamento entre os bairros de Miramar e Cabo Branco, à noite, ao instante em que diminuía a hora de pico do translado trabalho-casa em um desses dias. Um “tô nem aí” de motoristas e seus veículos acima da velocidade permitida, valas perigosas criadas entre as camadas de recapeamento do asfalto e o alinhamento do meio-fio (que fazem as vezes de sarjetas que drenam águas das chuvas) e o medo de uma abordagem violenta colocaram-na no lugar de centenas ou milhares de trabalhadores que circulam, diariamente, de bicicleta de casa para o trabalho e do trabalho para casa. À boa iniciativa da Secretária de Mobilidade Urbana da Prefeitura de João Pessoa pode ser agregada
Fotos: Rossana Honorato e Divulgação
a uma campanha midiática educativa, imediata e massiva, dirigida aos condutores de veículos públicos ou particulares (de quatro a duas rodas). E aos pedestres, inclusive, para disseminar gradativamente uma compreensão social da noção de hierarquia na circulação urbana, que pontifique culturalmente em uma escala de respeito à prioridade dos pedestres aos veículos particulares. A campanha, se bem projetada, poderá repercutir sobre o uso das vias ainda não providas de pistas exclusivas e/ou sinalizadas para cada modal de transporte. Mudar hábitos não é política para curto prazo, mas, se priorizada nos investimentos públicos, torna-se culturalmente progressista. Com vagar, a sociedade vem acolhendo essa mudança de mentalidade. A política do respeito à faixa de pedestres, já incutida entre parte de motoristas e pedestres, flui inclusive em vias sem faixas sinalizadas e tem sido gradualmente valorizada na cultura da circulação urbana em João Pessoa. Obviamente, entre os bairros dotados de alguma infraestrutura viária. Um plus midiático na política adotada ainda pode evitar acidentes graves e fatais na circulação dos transportes urbanos e repercutir em um rito de passagem cultural para uma nova mentalidade social enquanto ciclofaixas e ciclovias não chegam aos principais corredores de circulação da cidade, e ainda agrega o que nem é objetivo essencial para a mobilidade urbana: atenuar significativamente a imensa demanda municipal pela política básica de remediação do “adoecimento social”, já que parte da população estará bem mais saudável.
Rossana Honorato
Professora do Dep. de Arquitetura da UFPB, pesquisadora do Laboratório do Ambiente Urbano e Edificado – LAURBE – DA – CT – UFPB. Arquiteta e urbanista e mestre em Ciências Sociais (sociologia Urbana), ambos pela UFPB, e doutoranda em Planejamento Urbano e Regional do Programa Interinstitucional UEPB – IPPUR-UFRJ.
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VIDA PROFISSIONAL
Marketing na internet
A
ntes de abordar a especificamente o tema, vamos estabelecer algumas premissas. A primeira é que a internet é somente umas das inúmeras formas de comunicação, não tem um fim em si mesma e não responde por toda a comunicação do profissional; a segunda é que precisa estar bem definido o que o profissional quer colocar na rede; a terceira é como quer se utilizar do meio internet; a quarta é ter clareza da falta de controle do alcance na informação e sua repercussão, pois o meio é interativo e cumulativo, o que pressupõe um cuidado ainda maior ao se expor na rede e que ainda há muito para ser explorado e criado na internet, inclusive suas normas e padrões para utilização. Vou apontar algumas formas de atuar na internet, mas sem encerrar o assunto. O ponto de partida pode ser um website que apresente sua atividade profissional. Requer um registro de domínio (o endereço em geral no formato www.
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arquitetooudesigner.com.br) e um local (servidor) onde o website estará guardado. Os dois itens tem pequenos custos anuais. Após ter o domínio e o servidor, está na hora de preparar seu conteúdo e apresentação visual. Não obstante a qualificação dos arquitetos e designers na questão estética, é recomendável que seja chamado um bom profissional para elaborar, pois eles conhecem os efeitos gerados pelo conteúdo e layout para conseguir os objetivos da comunicação. Para quem não conhece o profissional ou ainda não teve contato com ele ou não sabe seu nome, é importante que seu endereço na rede esteja aparecendo nos sites de busca. Os websites começam a aparecer nas buscas pela quantidade de acessos, mesmo assim perdido em meio a inúmeros outros websites, o que dificulta que você seja localizado. Mas os sites de busca são um negócio e a visualização de seu website em destaque pode ser paga e os valores
podem ser controlados dentro da disponibilidade de recursos do anunciante. Outro recurso disponível é aparecer em sites que já tem uma quantidade grande de visualizações, no formato chamado banner, que pode ser fixo ou dinâmico. É também uma ação que pode agregar valor ao seu nome, caso tenha uma identidade com o website no qual está aparecendo. Normalmente é cobrado, mas há as parcerias, onde um coloca o banner do parceiro em seu website. O banner pode conter ainda um link que direciona o usuário diretamente para sua página. Os sites de notícias são um importante canal para divulgação dos trabalhos profissionais, mas para ser notícia precisa contar com a relevância necessária para sua publicação. A participação em eventos, a conquista de um prêmio, a execução de um projeto de destaque, um novo título acadêmico conquistado, a colaboração em pautas com atividades afins sempre poderão ser o ponto de partida para uma matéria. Caso seja possível, é recomendável ser assessorado por um profissional da área, que detém o conhecimento sobre o assunto e o relacionamento no meio jornalístico. Os blogs e as mídias sociais são hoje importantes espaços na web para divulgação de trabalhos e ideias, com grande alcance. É uma das áreas de maior risco, pois permitem o contraponto dos participantes e não obrigatoriamente favoráveis à sua imagem ou à divulgação do trabalho profissional. Deve ser utilizado com responsabilidade, pois recuperar uma imagem desfavorável é muito trabalhoso e desgastante. As revistas eletrônicas e as páginas especializadas, ao contrário dos blogs e mídias sociais, têm alcance menor e mais controlado. Normalmente são vistas por um público mais qualificado e com perfil mais definido. É de uso preponderante para divulgar os trabalhos profissionais, pois os potenciais clientes estarão procurando informações para seus projetos. Lá poderão identificar um profissional de acordo com suas pretensões e que apresentem trabalhos que os agradem. Finalmente, como regra geral, não esqueçam que a internet é um ambiente dinâmico, que precisa ser atualizado e monitorado assiduamente. Sua rede de contatos pessoais e profissionais pode ajudar a alavancar sua divulgação e a procura por seus trabalhos. Defina quais públicos deseja alcançar pela rede e foque seu conteúdo e forma neles. Lembre-
Fotos e imagens: divulgação
se de alimentar seus relacionamentos no dia a dia, para deixar a porta aberta em eventual contato de natureza profissional. Cuide de sua identidade visual, para representar a mensagem que você quer divulgar. Busque sempre ajuda especializada: assim como o profissional de arquitetura ou o profissional de interiores é procurado por sua especialização, os profissionais da comunicação sempre poderão enriquecer sua imagem, seus trabalhos e sua divulgação. E não esqueça: seu nome é sua marca e sua marca é seu patrimônio profissional.
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LIVRO
NO CONTROLE DO ESCRITÓRIO Enio Padilha vai direto ao ponto em Administração de Escritórios de Arquitetura e de Engenharia Texto: Alex Lacerda | Fotos: Divulgação
Escritórios de engenharia e arquitetura interagem com diversos setores de produção até conseguirem seu objetivo final: atender satisfatoriamente seu cliente. No entanto, geralmente, as universidades formadoras destes profissionais não preparam para administrar toda esta estrutura. O professor e engenheiro Ênio Padilha apresenta informações valiosas no livro Administração de Escritórios de Arquitetura e de Engenharia sobre como ultrapassar esta dificuldade. De leitura prática e objetiva, o livro privilegia a formação gerencial e empreendedora no cotidiano de arquitetos e engenheiros. Ênio, que possui mestrado em administração, utiliza sua experiência para apresentar aos leitores os conhecimentos básicos de administração para, a partir do zero, fazer o planejamento, a organização, a instalação e a sistematização do seu escritório, de forma a alcançar eficiência na gestão e eficácia nas estratégias. Administração de Escritórios de Arquitetura e de Engenharia foi produzido com base nos resultados de pesquisas e estudos feitos pelo autor durante 9 anos entre 2004 e 2012, em escritórios de arquitetura e de engenharia em todo o Brasil, aliado à coleta de informações e troca de experiências com profissionais do curso “Como Organizar e Administrar Escritórios de Arquitetura e de Engenharia”, apresentado pelo autor em mais de 30 cidades de quase todos os estados brasileiros entre 2005 e 2011. O livro segue uma sequência de conteúdo que vai da discussão sobre o empreendedorismo, no primeiro capítulo, até as questões sobre os diferenciais competitivos que levam à vantagem competitiva, no último capítulo, sobre marketing.
Sobre o Autor – Ênio Padilha é engenheiro eletricista, formado pela Universidade Federal de Santa Catarina (em 1986) e possui mestrado em Administração pela Univali (em 2007). Atuou durante 12 anos no mercado de Engenharia, à frente da Trifase Engenharia Elétrica, prestando serviços de projetos e consultorias técnicas. É autor de 7 livros já publicados, todos tendo como objeto o exercício profissional de engenheiros, arquitetos e agrônomos. Apresenta palestras e cursos em todo o país, para engenheiros, arquitetos (e estudantes dessas áreas). Mantém um website na internet desde 1996.
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Do segundo ao penúltimo capítulo o leitor tem acesso a um panorama geral sobre as teorias da administração, instruções para planejar e executar a abertura do escritório e todas as tarefas, obrigações e responsabilidades do administrador do escritório nas quatro grandes áreas da administração, produção, recursos humanos, financeiro e mercado. O autor, em 4 dos 12 capítulos do livro, se dedica a temas relacionados à administração financeira. São apresentados todos os custos de abrir um escritório, mantê-lo em operação e produzir serviços. Nestes capítulos também é avaliada a remuneração do profissional e como separar as retiradas feitas a título de pro labore, remuneração por serviços técnicos e distribuição de lucros. Um dos quatro capítulos é dedicado a discutir as formas de precificação mais utilizadas pelos profissionais e apresentar um novo modelo, baseados nos custos do escritório, na produtividade, na expectativa de lucro e também no “Fator K”, determinado pelos diferenciais competitivos do escritório.
Enio Padilha Autor
Administração de Escritórios de Engenharia e Arquitetura, de Ênio Padilha, Editora 893, 2013
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A História de...
Fogão à lenha
Além do fogo Desde que era só um buraco no chão, o fogão surgiu para ajudar o homem a dominar o preparo do alimento Texto: Alex Lacerda | Fotos: Divulgação
Fogão Inglês
A descoberta do fogo tem influência direta em como a sociedade se organiza hoje. A forma como comemos, como nos protegemos e criamos nossos filhos está ligada diretamente ao nosso convívio com esse achado. O fogão é o derivado imediato deste avanço e tem acompanhado o homem em sua história desde que este começou a se organizar em sociedade. Em sua forma primitiva, o fogão era constituído de um buraco no solo onde se acendia o fogo e se colocava as panelas. Posteriormente, as pedras e a própria madeira combustível serviram de suporte para utensílios, enquanto auxiliavam a manter o fogo mais forte. A simplicidade e eficiência desse conjunto fazem com que, em muitas partes do mundo, principalmente entre as pessoas de menor capacidade aquisitiva, esta estrutura, conhecida mais comumente como fogão à lenha, ainda possa ser encontrada.
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Antiga cozinha peruana
Fogão rústico
Apenas na revolução industrial é que o fogão passou a ter uma conformidade próxima a que conhecemos hoje. O fogão se transformou, de uma estrutura de barro ou metálica fechada, em um móvel grande, com um compartimento semi-aberto para o fogo, com aberturas no topo para utilizar uma variedade de panelas ao mesmo tempo. No século passado, nos anos 1900, o fogão assumiu um tamanho mais reduzido e começou a utilizar combustíveis baseados em petróleo ou a gás. O fogão elétrico foi inventado e o forno passou a ser uma opção, o que era antes uma parte integrada obrigatória. O arquiteto Leo Maia ressaltou o simbolismo do fogão no contexto histórico. “O fogão nos acompanha desde a descoberta do fogo. Na idade antiga, quando passamos a controlar o fogo, já usávamos os fogões à lenha. Ele era apenas reduzido às cozinhas, mas hoje ele pode ser encontrado em outros espaços de uma habitação”, destaca.
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Casacor SP | Projeto: David Bastos | Foto: Katia Kuwabara
Maia enfatiza que, com o surgimento dos espaços gourmet, o fogão passou a ser mais visto como um elemento de sociabilidade. “As pessoas começaram a cozinhar mais e o fogão passou a fazer parte do convívio das pessoas. Passou a ser familiar, moderno, bonito e funcional”, destaca o arquiteto. Essa mudança funcional fez com que o fogão deixasse de ser exclusivamente uma parte básica da casa e passasse a ser um elemento estético na decoração. Embutidos, de piso, sejam de seis ou quatro bocas, sejam elétricos ou vitrocerâmicos, com versões de controle manual ou digital, de sistema de indução por placas magnéticas ou radiação, escolher o fogão passou a exigir, além da funcionalidade e economia, a integração com o ambiente no qual seria instalado e a beleza. Os modernos cooktops, práticos e funcionais para as pessoas que moram sozinhas, não têm forno e possuem apenas bocas superiores, sendo geralmente utilizados em conjugação cm os fornos elétricos. “Um fogão pode ter o forno desmembrado, possibilitando uma estética mais linear e charmosa”, complementa o arquiteto. Seja metálico ou de superfície de vidro, o fogão pode e tem sido utilizado como uma peça de decoração em qualquer ambiente que esteja instalado. Seja dentro de um ambiente fechado ou em um espaço gourmet externo, o fogão permanece sendo um elemento gregário entre as pessoas, dando continuidade ao fascínio promovido pelo domínio do fogo com o decorrer dos séculos.
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AMBIENTAÇÃO
Projeto: Bethania Tejo
beleza e praticidade vão à mesa Salas de jantar precisam tendências e estilos com a boa acomodação dos moradores e convidados
Texto: Débora Cristina | Fotos: Diego Carneiro 34
Projeto: Henrique Santiago
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uma casa ou apartamento, a sala de jantar é sempre um espaço delicioso, que serve para receber pessoas queridas e reunir a família todos os dias. Por isso, é preciso investir em móveis e acessórios de destaque, mas que também ofereçam bastante conforto. Mas para que ela tenha todo o conforto merecido é preciso investir não só em uma bela decoração, mas também numa circulação apropriada, que só será bem resolvida se os móveis e acessórios escolhidos forem proporcionais ao tamanho do ambiente – seja ele grande ou pequeno. Numa sala de jantar pequena, a cadeira deve ficar inteira debaixo da mesa. Isso quer dizer que ela não pode ter braços e de que a mesa deve ter pés menores para que as cadeiras possam ficar encaixadas, liberando a circulação. O espaço para cada cadeira deve ser de 60 cm. Só assim as pessoas ficarão confortáveis à mesa, sem precisar disputar espaço ou encostando cotovelos.Em volta da mesa, por exemplo, são necessários pelo menos 90 cm livres para movimentar a cadeira à vontade e também para liberar a passagem. Para a arquiteta Daniella Barretto, as novas tendências para a sala de jantar são muito relativas.
“Caso o ambiente seja mais contemporâneo, as tendências são sempre móveis lançados por designers consagrados, criando um ambiente leve com mesas com tampos de vidro e bases exóticas, podendo ser até mais que uma, dependendo do espaço que se tem para trabalhar, assim como são como ocorre com as cadeiras, também escolhidas no mesmo estilo para que o ambiente da sala de jantar se torne harmonioso e elegante”, afirmou. Também é importante pensar na composição com lustres pendentes, belas cortinas ou persianas, passadeiras que fazem às vezes dos tapetes e quadros. Enfim, existe toda uma gama de acessórios que enriquecem qualquer espaço moderno ou contemporâneo e isso também é indicado na hora de pensar na decoração de uma sala de jantar. “Da mesma forma acontece se o ambiente for clássico ou porque não dizer, neoclássico, pois muitas vezes mesclamos acessórios modernos com a base principal, no caso a mesa e a cadeira mais antigas; o importante é que se tenha liberdade de se construir um belo e confortável ambiente”, explicou a arquiteta Giana Barretto. Para que nada fique fora do lugar, deve ser levado em consideração todo o entorno do
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Projeto: Alain Moszkowicz
ambiente, ou seja, o estilo de ambientação que já está sendo utilizado no espaço, assim como as necessidades e aspirações do cliente, que com nossa técnica e experiência com certeza se sentirá mais seguro. Já para o decorador Alain Moszkowicz, a tendência hoje está muito em cima da laca. “Recentemente usei algumas mesas em laca que gosto muito, principalmente na cor fendi (cor neutra), com os apartamentos de maior porte. Também estamos usando duplicidades para conseguir
Confira outras dicas: • Objetos de vidro, esculturas, garrafas de licor e outras bebidas, velas e um lindo vaso de flores no centro da mesa, são ótimas ideias de decoração para sua sala de jantar. Espelhos próximos de aparadores também ficam muito bem. Um bar, só se estiver sobrando espaço no cantinho. • Para famílias menores ou que não recebem tantas visitas, conjuntos de mesas quadradas de quatro lugares são as mais vendidas e realmente atendem muito bem. Os modelos ovais também fazem sucesso e podem ser encontradas com mais lugares para sentar. • Os quadros dão vida às paredes, mas na sala de jantar tome cuidado para não poluir o ambiente ou misturar vários tipos de molduras. • A ordem é essencial em espaços pequenos. Ter tudo no seu lugar e guardado é a melhor maneira de fazer com que a sua divisão não se pareça mais pequena do que aquilo que já é. Se pretender ter uma peça de mobiliário para guardar e expor os seus pratos preferidos ou outros objetos, coloque um pequeno armário de exposição num canto da sala e tente que encaixe perfeitamente com o estilo de decoração da sala. 36
grandes dimensões que tem contraindicação pela acessibilidade fazendo mesas de jantar até para 16 pessoas”, disse ele. Alain informou ainda que a sala de jantar fica ainda mais completa se receber uma bonita cristaleira e um bom aparador. “O vidro também é bastante usado muito como tampo e é um elemento eterno na ambientação, que faz com que agrade a maioria de gostos e estilos. Além disso, o uso de tapetes altos em sala de jantar não é indicado por conta da manutenção”, lembrou o decorador. Entre os principais erros apontados pelos arquitetos e decoradores, na hora de planejar a montagem de uma sala de jantar, estão a falta de proporção entre os móveis a serem colocados e o espaço que existe para este fim. Segundo Daniella, outro erro seria se a sala de jantar não tiver iluminação e ventilação naturais adequadas, com certeza não será confortável, e teremos que apelar para os artificiais. A mistura excessiva de materiais e cores também vai causar uma confusão visual, deixando o ambiente mal resolvido. Ainda quanto à iluminação, Giana reforça que o melhor é que ela seja natural, mas que mesmo assim, é importante a complementação de uma iluminação artificial. “Isso pode ser feito com o uso de pendentes ou de focos direcionados para as mesmas, com lâmpadas corretas para não esquentarem demais e trazerem desconforto. Essas opções são fortes aliadas na decoração, pois trazem charme e beleza ao ambiente”, disse. Para a escolha das cores a serem usadas nas paredes, os arquitetos afirmam que é preciso ter muito cuidado. Isso vai dependes do resultado final que se quer obter no ambiente. Se você quer ampliar ou clarear, utilizam-se cores em tons suaves; caso se queira dar um toque de maior sofisticação ao ambiente, cores mais escuras e ousadas são muito apropriadas; o importante é que aja sempre harmonia entre o entorno do espaço que está sendo utilizado e sua mobília.
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AMBIENTAÇÃO
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Integração total Ambientes sem barreiras marcam a área social, neste projeto de design de interiores
Texto: Débora Cristina | Fotos: Diego Carneiro
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tradicional mistura entre os conceitos clássico e contemporâneo foi a escolha feita pela designer de interiores Valdete Duarte para decorar um apartamento num edifício recém-inaugurado no Altiplano Cabo Branco, bairro nobre da capital paraibana. O imóvel possui aproximadamente 300 m² e pertence a um jovem casal com filhos. “O grande diferencial é a área social, composta por salas e varanda completamente integradas e planejada para potencializar o convívio entre as pessoas. Este espaço viabilizou a existência de ambientes distintos, mas que ficam interligados e sem barreiras visuais”, afirmou Valdete. Também merece destaque nesse projeto o jardim vertical na varanda, que ameniza o ambiente fazendo um interessante contraponto com a visão do mar ao fundo.
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O programa é composto de salas, cozinha, lavabo, escritório (open office) e quatro suítes, todas com vista para o mar. Destaque para a suíte do casal, que ganhou opções criativas de design interno, como as janelas ocultadas por trás de painéis de madeira escamoteáveis que, quando ocultas, proporcionam total privacidade e harmonia ao ambiente. Na sala, o posicionamento planejado da TV com painel em LED permite sua visualização, tanto da varanda como da sala – o que, aliado ao sistema de som embutido no forro, completa o total aproveitamento desta central de entretenimento. “Decorei a sala com peças em murano, cristais e abajures, para o qual usei tomadas de piso. Usei também na varanda um jardim vertical todo com samambaias, que deixou o ambiente mais aconchegante”, conta a designer de interiores. “No hall, usei papel de parede e espelho com molduras. No lavabo, segui a mesma leitura da sala, optei por tons claros, usando marmoglass, destaque para as paredes todas revestidas em madrepérola”. Na parte de iluminação, Valdete optou por usar o máximo possível de luz indireta. “A posição leste do imóvel privilegia a luz natural que é captada, até o final das tardes, pelas amplas janelas envidraçadas. Usamos a tecnologia de iluminação LED, que são frias, e duradouras”, explicou ela. Para a escolha dos móveis, tapetes e objetos, atenção redobrada. Assim, todos foram cuidadosamente selecionados para atender as necessidades da família com muito estilo, priorizando as cores em harmonia com o cinza. Os móveis foram projetados com altíssima qualidade. “Quando fui contatada pelo casal, apresentei a proposta que foi aceita de pronto. O planejamento do trabalho foi seguido à risca, com
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pouquíssimas alterações. O resultado... Bem, sou suspeita para falar, mas gostei bastante e eles também pareceram muito satisfeitos!”, disse. E acrescenta como é a rotina de trabalho para fazer cada projeto: “Não sou muito adepta a conceitos e definições. Apenas interajo com o mundo e procuro referências. Costumo dizer que minha carreira nasceu
comigo, sempre tive aptidão para buscar a harmonia dos ambientes, para os detalhes. Resumindo: comercialmente, minha carreira é recente, mas a paixão é antiga”. Com relação aos projetos futuros ela foi enfática: “Só posso dizer que tem bastante coisas interessantes por vir”, concluiu.
Design de interiores: Valdete Duarte Projeto: Ambientação de apartamento Modulados: Florense • Móveis: Saccaro • Objetos decoração: Poliana Presentes / Kaza decoração Revestimentos: Oca Revestimentos • Louças e metais: Ibraildo • Tapetes: Adroaldo Tapetes do Mundo + imagens do projeto no site: www.artestudiorevista.com.br 46
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ARQUITETURA & INTERIORES
Integração natural Projeto de casa em condomínio fechado abre ambientes para o entorno Texto: Débora Cristina | Fotos: Diego Carneiro
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uem não gosta de receber bem os amigos para conversar e aproveitar bem a vida? E pra que esses momentos aconteçam, nada melhor do que um ambiente agradável, com um espaço generoso, boa iluminação e móveis confortáveis. Foi pensando nisso que a arquiteta Débora Julinda criou o projeto desta casa para um jovem casal, que adora exercitar a arte de recepcionar convidados para um bom bate-papo.
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A casa fica em um condomínio no bairro do Altiplano, em João Pessoa, Paraíba, e foi concluída no início desse ano. O projeto tira partido do clima do Nordeste, quente no verão e chuvoso no inverno. Por isso, terraços e varandas têm telha canal, com grandes beiras: protegem de sol e chuva, e tiram proveito da luz e ventilação naturais. Para Débora Julinda, esse projeto tem um grande diferencial. “O projeto alia a precisão das linhas
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de estruturas em concreto com a leveza de terraços e varandas que adotam a madeira e a cerâmica como elementos construtivos mais notáveis. Seus ambientes, nos vários planos em que a casa se situa, se abrem para o entorno, permitindo integração natural”, explicou. O programa contempla, no piso térreo, sala para três ambientes, e cozinha – esta voltada para área de lazer – com acesso ao terraço privativo da casa. No pavimento superior, home theater íntimo, e quartos com varandas. Generosos beirais, em telha vitrificada e madeiramento, circulam a casa.
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Iluminação natural Grandes janelas envidraçadas permitem à casa deixar-se iluminar pela luz natural. A arquiteta também explicou que foi possível aproveitar a plasticidade que uma iluminação artificial pode proporcionar, construindo pela luz – por sua qualidade, intensidade e eficiência – ambientes aconchegantes, acolhedores, confortáveis, ou propícios às atividades de trabalho, criando assim múltiplos cenários noturnos.
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Para Débora, um projeto de arquitetura, e seu complemento, a ambientação, é um processo de identificação de como os clientes se vêem e querem ser vistos, quanto à maneira de expressar seu modo de ser e viver. Como arquiteta, diz ela, é preciso descobrir com quais movimentos arquitetônicos os clientes se identificam, completando com a escolha do mobiliário e peças de decoração. Nesse caso, como ela conhece o jovem casal de muito tempo, o diálogo foi muito construtivo, o que permitiu orientações e escolhas que foram sendo concretizadas naturalmente no projeto da casa.
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“Ser arquiteta é dialogar com o tempo e o espaço. Aprendemos a nos servir das lições recebidas dos que vieram antes de nós, e aprendemos que outros
se servirão das escolhas que fizemos e dos projetos que ousamos conceber. A linguagem da arquitetura é a continuidade e a mudança”, concluiu a arquiteta.
Arquiteta: Débora Julinda Projeto: Arquitetura e ambientação de residência Modulados: Todeschini • Móveis: Saccaro / Art Casa Madeira: Fecimal Arte & Madeira • Revestimentos: Portobello / Obra Prima • Decoração: Tok de Casa • Louças e metais: Oca Bagno + imagens do projeto no site: www.artestudiorevista.com.br 56
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INTERIORES
Cor e arte combinadas Reforma de um apartamento em São Paulo exibe predominância de itens coloridos e elementos de arte como principais peças de decoração Texto: Débora Cristina | Fotos: Divulgação
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uso de cores vibrantes e de peças de linhas intensas para elaboração dos espaços foi o ponto principal do projeto do arquiteto paulista Haron Cohen para a reforma de um apartamento no 15º andar de um prédio em Higienópolis, bairro na região central da cidade de São Paulo, onde mora um casal moderno e que é apaixonado por arte. Além disso, proporcionou um aspecto clean e contemporâneo aos ambientes. Para evidenciar essas características, Haron optou por esquadrias de alumínio.
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O maior desafio foi adaptar seus caixilhos personalizados à fachada do edifício, erguido em 1978, e por conta de sua padronização estética, não poderia ser alterada. Assim, a empresa alterou somente a face interna das janelas, seguindo a mesma tipologia das já existentes no local. As esquadrias pintadas na cor branca tiveram papel fundamental na proposta ousada do arquiteto de transformar um local antigo em um projeto contemporâneo e cheio de estilo. Além disso, para proporcionar um excelente aproveitamento da luz natural, Haron Cohen optou por janelas de grandes dimensões na residência, em sua maioria, compostas por painéis deslizantes. “Para que isso fosse possível, tivemos que botar tudo abaixo e fizemos praticamente outro. Transformamos o apartamento em algo bem mais moderno e organizado, com todos os caixilhos, por exemplo, padronizados, iguais em todos os cômodos. Ficou muito mais bonito”, explicou Haron. A premissa que norteou a elaboração de todo o projeto foi a utilização de elementos de arte, já que os proprietários são apaixonados por este segmento. Dessa maneira, logo ao adentrar no imóvel de 300 m², somos recebidos por um painel metálico da artista Maria Bonomi, que compõe todo o átrio. Além disso, todos os cômodos do apartamento contam com obras de artistas como Aguilar, Nelson Leirner, Paulo von Poser, Claudio Tozzi, Marcelo Niestsche, entre outros. 59
Espaços delineados O aproveitamento dos espaços foi outra solicitação dos clientes. Por conta disso, o projeto do arquiteto preza pela interligação dos ambientes – porém, claro, sem deixar de lado o conforto e a harmonia do local. Um exemplo é o espaço gourmet do apartamento, que é totalmente integrado ao estar. Dinâmico e funcional, este ambiente é ideal para reunir amigos e familiares em encontros descontraídos. Além disso, o armário localizado atrás da bancada apresenta grande destaque. O móvel agrega funcionalidade ao apartamento, já que possibilita o armazenamento de todos os utensílios do bar e, além disso, os oculta, colaborando com o visual do espaço. Mas tudo gira em torno de um bar. “Com 4 metros de extensão, ele é o cerne de todos os ambientes, por isso recebeu iluminação e decorações especiais, como um armário de portas na cor berinjela, que serve para guardar todas as peças de cristais usadas no bar”, afirma o arquiteto, explicando que o que faz a divisão entre os ambientes é justamente o mobiliário. Como os proprietários também são amantes de vinhos, o espaço ainda conta com uma adega totalmente climatizada, que comporta aproximadamente 450 garrafas. O corredor, que dá acesso aos ambientes íntimos, também chama a atenção no apartamento, já que assume dupla função, servindo como uma galeria na residência. Composto por diversas obras de arte em sua extensão, é marcado pela utilização de tons de preto, cinza e branco. “No apartamento original havia três quartos. Resolvemos transformá-los em dois, dando mais espaço para o quarto do casal, que ganhou um grande closet, de acabamento refinado, e ainda um banheiro luxuoso, com aproximadamente 4m². Nele, cada detalhe chama a atenção, como por exemplo, a cuba, que de tão bonita é quase uma obra de arte”, explica ele.
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A escolha dos materiais utilizados no projeto também apresenta influência na proposta moderna do arquiteto. O uso de laminados e pastilhas de vidro, por exemplo, elementos predominantes nas residências elaboradas pelo profissional, evidencia essa característica, de tentar que as obras de arte não estejam só nas paredes.
Arquiteto: Haron Cohen Projeto: Reforma de apartamento Esquadrias: Tecnofeal Esquadrias de Alumínio • Móveis: Casa Matriz Móveis Tapetes / Intertek Eletrodomésticos: Elvi Cozinhas Industriais • Cozinha: Securit • Piso: Eco Assoalho • Tapetes: Tecer Tapetes Metais: Vola (Dinamarca) • Iluminação: Mingrone Comércio e Iluminação • Luminárias: Onlight Automação: Nestor e Gustavo Automação • Espelhos: Virtual Vidros + imagens do projeto no site: www.artestudiorevista.com.br
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Espaço bem usado Em tempo de imóveis menores, o projeto de um apartamento de 360m² dá ao lugar ares de casa Texto: Débora Cristina | Fotos: Vilmar Costa
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um tempo em que a procura por apartamentos aumenta, mas os tamanhos estão cada vez menores, quem pode e escolhe investir num imóvel grande consegue unir os benefícios de uma casa com a segurança de um edifício. E foi justamente isso que a arquiteta Georgia Suassuna pensou ao criar o projeto deste apartamento, localizado no bairro de Miramar, uma área nobre da capital paraibana. Com 360m² e um apartamento por andar, o imóvel ganhou ares de casa, com espaços generosos, ventilação e iluminação naturais que deixou o local ainda mais agradável. Feito para uma família composta por casal e duas filhas, o apartamento seguiu o perfil dos moradores, que são modernos e antenados com o que a há de melhor na área da decoração. Como a dimensão dele favorece a divisão dos espaços, o layout proporcionou uma circulação generosa e muito agradável na área social. Os móveis planejados receberam desenhos especiais, ajudando a deixar o local mais funcional. “Escolhi móveis de excelente acabamento e com cores mais sofisticadas”, disse Geórgia. Por falar em cores, a arquiteta usou como base as neutras e claras, começando pelo off white, beges, fendi, até chegar ao aconchego do tom chocolate. Os acabamentos hora são foscos, hora brolga hates, fazendo um jogo de texturas.
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Por ser um prédio, a iluminação natural foi bastante valorizada, mas nem por isso mereceu menos atenção da arquiteta, nos ambientes que precisavam estar bem iluminados também em outros horários. “Na iluminação, lancei mão de artifícios com LEDs e iluminação geral e diffuse, criando várias cenas”, explicou a arquiteta.
Mistura moderna e conceitual Apesar de ter a base neutra, em cada ambiente Georgia Suassuna escolheu uma cor para dar personalidade ao espaço. No living, aparece a cor berinjela, uma das apostas mais modernas da temporada. Tanto que ela também está presente na laca alto brilho do bar e ainda nas cadeiras da cabeceira do jantar. “Em alguns objetos também usamos outras cores fortes, como o vermelho e o dourado, dando um ar mais ousado e sofisticado aos ambientes”, disse ela. A sala é espaçosa, apropriada para receber os visitantes, já que o casal gosta de receber bem e promover encontros com os amigos e parentes. E para deixar esta parte do ambiente ainda mais acolhedora, foi usado um grande tapete. “Os tapetes têm um importante papel nas minhas ambientações, trazendo conforto e sofisticação, além de delimitar o espaço de forma bastante funcional”. Já na sala de jantar, o
destaque é o lustre que faz o arremate final, deixando o espaço completamente atemporal. No quarto do casal, a arquiteta optou pelo bege com tom de bronze, deixando bem confortável. Lá também está localizado um closet para o casal e ainda um banheiro onde o branco é cor principal, presente nas bancadas em nanoglass e pastilha Furtacor branca, juntamente com espelhos estrategicamente posicionados para deixar o ambiente mais amplo. “Também gosto muito de arrematar a produção utilizando um bonito papel de parede”, explicou Georgia. Para as duas filhas, a opção da arquiteta foram detalhes em cores fortes e modernas. No quarto da jovem, cheia de vida e com uma personalidade mais forte, o tom vermelho foi o escolhido por ela. “Para compor o espaço, lançamos mão de detalhes em acrílico e também de papel de parede para deixar o espaço ainda mais com a cara dela: bem moderna!”, afirmou a arquiteta, dizendo ainda que a mesma cor se estendeu também para o banheiro, presente nos revestimentos em pastilha de vidro. A filha mais nova do casal também fez questão de ter um quarto bem ao estilo dela e por isso a opção foram os tons de lilás, encontrados nos móveis e cortinas. O lavabo seguiu as tonalidades do living, associado ao espelho bronze, fazendo assim uma boa transição. A cozinha também mereceu atenção especial
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da arquiteta. “A elaboração do layout foi feita seguindo as exigências do dono da casa, que é um verdadeiro gourmet e adora reunir os amigos para degustar suas receitas. Usamos a cor marrom nas bancadas, associada a pastilhas de inox e espelhos fumês deixando a cozinha com ar moderninho e elegante. Por todo lado usamos e abusamos de diversos tipos de acabamentos, cores e texturas, mas que conversam entre si. Isto é um exercício cuidadosamente pensado para deixar o espaço aconchegante e sofisticado, mas fugindo do tom pesado e exagerado”, contou Geogia. O projeto foi amadurecendo sempre levando em consideração o gosto e a necessidade dos clientes. Isto se reflete em todas as etapas do projeto até os acabamentos finais. “Dessa forma, conseguimos atender a todas as solicitações deles, criando um projeto ousado, mas também favorecendo todo o conforto necessário para uma família que investiu no sonho de morar bem, nessa cidade linda que é João Pessoa”, afirmou a arquiteta. “O universo da arquitetura e do design me fascina e é objeto de eterna pesquisa e estudo. Adoro meu cotidiano e agradeço aos clientes por me confiarem seus sonhos”, concluiu.
Arquiteta: Geórgia Suassuna Projeto: Arquitetura de residência unifamiliar Mármores e granitos: Casa de Pedra • Móveis: Bontempo Objetos decorativos: Kasa Arte e Decorações • Iluminação: Stiluz Tapetes: Adroaldo Tapetes e Carpetes do Mundo Revestimentos: Portobello e Oca revestimentos Metais e acessórios: Oca Bagno • Móveis: Sierra + imagens do projeto no site: www.artestudiorevista.com.br
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GRANDES ARQUITETOS
O mestre
nipônico da arquitetura Kenzo Tange marcou a reconstrução do Japão no pós-guerra e suas obras ultrapassaram as fronteiras do arquipélago Texto: Renato Félix | Fotos: Divulgação
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Japão possui uma arquitetura toda própria e milenar, mas o século XX rendeu nomes que ultrapassaram as fronteiras da ilha e foram reconhecidos como mestres internacionais da profissão. Um caso destes é Kenzo Tange, que conquistou em 1987, aos 74 anos, o Prêmio Pritzker, o mais importante da área. Desde o começo de sua carreira, sua obra foi marcada por uma combinação entre essa tradição da arquitetura milenar japonesa com o modernismo internacional segundo Le Corbusier, crescente nos anos 1940 e 1950 (sua própria casa nos anos 1950 era uma combinação entre esses estilos). A partir dos anos 1960, ele se tornou o patrono de um movimento chamado Metabolismo (em linhas bem gerais, a combinação de ideias de megaestruturas arquitetônicas com o crescimento orgânico biológico) e se interessou pelo estruturalismo e o dramatismo.
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Tange se formou em 1938, às vésperas da II Guerra Mundial. Sua carreira, então, veio a florescer mesmo depois da guerra. Em 1949, ele criou o design do Hiroshima Peace Memorial Park, dedicado, claro, à primeira cidade da história a sofrer a tragédia de um ataque nuclear. Ao ganhar a competição para essa obra, Tange ganhou destaque internacional. Ele havia morado em Hiroshima, durante o equivalente japonês ao nosso Ensino Médio.
Na verdade, o interesse de Kenzo Tange em planejamento urbano o colocou em destaque na reconstrução japonesa do pós-guerra. Ele fez parte de uma comissão oficial sobre o assunto e apresentou outros planos para Hiroshima e outras cidades atingidas duramente pela guerra. Nos anos 1960, Tange desenhou estádios para os Jogos Olímpicos de 1964, sediados em Tóquio – os primeiros na Ásia. É dele o Ginásio Nacional de Yoyogi, inspirado no Coliseu de Roma, em Le Corbusier, e é considerado um dos mais belos edifícios do século XX. Em 1970, ele foi um dos planejadores da Exposição Internacional de Osaka. A partir dessa década, seu trabalho expandiu pelo mundo: construiu edifícios em cerca de 20 países, nos cinco continentes. Em 1991, veio o edifício da prefeitura de Tóquio, um centro cívico que é acompanhado de uma praça e dois edifícios menores, de sete andares. A alta tecnologia foi uma aliada do ambientalismo: os edifícios monitoram a qualidade do ar e os níveis de luz. Kenzo Tange continuou em plena atividade até três anos antes de sua morte, em 2005. Seu funeral foi em um de seus trabalhos memoráveis, a Catedral de Santa Maria, em Tóquio.
Arquiteto: Kenzo Tange
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ACÚSTICA
PRIVACIDADE EM EDIFICAÇÕES GEMINADAS Texto: Jean Fechine | Fotos: Divulgação
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uando a questão envolve a privacidade e a moradia, uma das principais reclamações dos moradores aponta para a transferência de sons entre cômodos, que pode ocorrer de maneira aérea ou através de impactos na estrutura da edificação. Tais transferências tornamse mais graves quando ocorrem entre unidades habitacionais autônomas, ou seja, entre vizinhos. Estes, em tipologias multifamiliares podem estar ao lado, em caso de edificações geminadas, e também acima e abaixo em edificações verticalizadas. Os arquitetos e urbanistas, no exercício profissional, consideram inúmeras variáveis em seus projetos, todas com vistas ao atendimento das exigências humanas. Sendo elas relativas à forma, à função e aos sistema construtivo. Dentre tais exigências, encontra-se, ligada às questões funcionais, à privacidade acústica, muitas vezes infelizmente negligenciada por alguns projetistas. Os problemas relativos à propagação do som no ambiente construído, quando não tratados adequadamente, geram inúmeros desconfortos aos seus usuários. Ao se trabalhar com tais problemas, o arquiteto e urbanista deverá atingir duas metas: defesa contra ruído, técnica também denominada isolamento acústico; e controle de som no recinto, que em outras
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palavras significa tratamento acústico. A primeira meta garantirá a estanqueidade sonora entre ambientes e a segunda garantirá, a partir da equalização do tempo de reverberação sonora, a qualidade do som no interior.
Entendendo o ruído como qualquer som indesejado, a defesa contra este é alcançada através da especificação técnica de materiais que garantam uma redução sonora, entre ambientes, em níveis aceitáveis. Um bom isolamento acústico pode ser conseguido através da utilização da lei dos pesos e das massas, ou seja, quanto mais pesada e densa for a composição de uma vedação melhor isolante ela será. No entanto, não é mais a Idade da Pedra: a tecnologia nos permite boas performances acústicas de determinados materiais, sem a necessidade de grandes espessuras. É o conhecido sistema massa mola massa. Esta possibilidade contribui para o ganho nas áreas internas de cada cômodo, adequando-se portanto as condições mercadológicas atuais, onde o metro quadrado construído, cada vez mais caro, resulta em espaços internos cada vez mais apertados. Dentro desta caminhada pela redução dos espaços, temos as tipologias geminadas, que demandam ainda mais cuidados em relação a transmissão sonora entre as unidades edificadas. Independentes do padrão construtivo, as edificações geminadas têm sido presentes na busca pela otimização do uso do solo. Frente a esta realidade, os projetistas devem considerar a importância das vedações de modo a minimizar a transferência sonora, tanto entre cômodos quanto entre as unidades. Este problema torna-se mais complexo quando o padrão construtivo enquadra-se nos programas de baixo custo, largamente presentes no Brasil, geralmente incentivados pelas instituições governamentais em parcerias com empresas privadas buscando minimizar o déficit habitacional em nosso pais. Para garantir um bom desempenho acústico em edificações desta natureza é necessário recorrer ao prescrito na NBR - 15575 (Desempenho de Edificações Habitacionais) nos anexos 03 e 04, cujos critérios a serem aplicados nas vedações, conforme a tabela 1, garantem uma performance mínima das vedações quanto ao isolamento acústico, sejam elas verticais (paredes) ou horizontais (lajes e coberturas). QUADRO 01 - Valores de referência para ruídos em áreas habitadas. Tabela 1 - Índice de redução sonora ponderado de componentes construtivos a serem utilizados nas vedações (Rw)
Sistema de Isolamento do tipo Massa Mola Massa
TIPO DE VEDAÇÃO
Desempenho Mínimo Rw (dBA)
Parede entre unidades habitacionais autônomas (parede de geminação) nas situações onde não haja ambiente dormitório
45 A 49
Parede entre unidades habitacionais autônomas (parede de geminação) caso pelo menos um dos ambientes seja dormitório
50 A 54
Sistema de piso separando unidades habitacionais autônomas de áreas em que um dos recintos seja dormitório
> 45
Fonte: NBR-15575 - Desempenho em Edificações Educacionais
Ao se observar um dos sistemas construtivos mais utilizados nestas habitações temos a presença marcante, como componente das vedações, dos blocos vazados de cerâmica. Estes apresentam os seguintes desempenhos: Tabela 2 - Índice de redução sonora ponderado de componentes construtivos (Rw)
TIPO DE VEDAÇÃO
Desempenho Mínimo Rw (dBA)
Bloco vazado de cerâmica com 09 cm de espessura com 1,5cm de argamassa em cada face com 120 kg/m2
38
Bloco vazado de cerâmica com 11,5 cm de espessura com 1,5cm de argamassa em cada face com 150 kg/m2
40
Bloco vazado de cerâmica com 14 cm de espessura com 1,5cm de argamassa em cada face com 180 kg/m2
42
Fonte: NBR-15575 - Desempenho em Edificações Educacionais
Comparando os valores das tabelas 1 e 2, é possível concluir que para atender ao critério mínimo indicado pela norma para edificações geminadas autônomas, a vedação vertical entre as mesmas deve proporcionar uma redução sonora de 45 a 49 dB(A). Ou seja, o que se tem hoje, na maioria dos caos, são paredes de bloco cerâmico vazado, que mesmo com 14 cm de espessura, não atenderá a exigência, o que demonstra a necessidade de uma nova especificação técnica para tais divisórias. Quanto as lajes, será necessária a colocação de mantas especiais de modo a minimizar o ruído de impacto, algo também pouco visto nas edificações atuais. É importante ressaltar ainda que tais recomendações são para edificações residenciais, com até cinco pavimentos, frisa a Norma, Porem, é necessário que se adote postura similar para as demais edificações, com outros usos, tipologias e padrões construtivos, pois a privacidade é um direito de todos.
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ACERVO
O hotel virou um shopping Tentando aliar o valor histórico do passado a uma utilização moderna, o Paraíba Palace busca viver novos dias Texto: Thamara Duarte | Fotos: divulgação
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or fora, tudo parece igual... O amarelo da fachada ainda remete aos idos de outrora, quando o hotel vivia o glamour de uma época dourada. Os elementos arquitetônicos do art nouveau e os detalhes das paredes são marcas do passado e permanecem intactas. E ainda encantam os transeuntes que passam, diariamente, pela calçada do Ponto de Cem Réis. Contudo, já há alguns meses, quem passa em frente ao Paraíba Palace Hotel, no Centro Histórico de
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João Pessoa, percebe: há um clima de mudança no ar. Basta adentrar no interior do imóvel para constatar que os antigos quartos – que já hospedaram importantes artistas e políticos brasileiros que visitaram a Paraíba – estão sendo modificados. As velhas volumetrias foram derrubadas, dando lugar à construção de lojas, uma sorveteria, um café e uma sanduicheria. Relíquia arquitetônica do século XX, o Paraíba Palace Hotel já atende como Paraíba Palace Shopping.
O empreendimento comercial pretende reunir mais de uma centena de lojas de eletroeletrônicos, roupas e sapatos, além de serviços de consertos e, ainda, praças de alimentação. Uma espécie de shopping popular, aos moldes do “Terceirão”, mas totalmente adaptado à realidade dos tempos atuais: no lugar de boxes, os comerciantes terão as estruturas de lojas. Autor do projeto que requalificou o hotel, o arquiteto Amaro Muniz revela: os pavimentos já foram alterados, destacando-se os pisos e forros que foram trocados, e já houve a implantação de panos de vidro, além da substituição de madeiramento. “Nesse último caso, foram mantidos o material e a geometria da coberta. Por outro lado, será mantida a fachada, preservando o amarelo como cor original”. Segundo ele, o projeto foi aprovado pelo Conselho Deliberativo do Iphaep e vem sendo acompanhado pelos técnicos do Instituto do Patrimônio Estadual. A preocupação é manter a memória patrimonial e arquitetônica do Paraíba Palace Hotel. O imóvel, muito embora não seja tombado pelo Governo do Estado, está localizado no Centro Histórico de João Pessoa, numa APR (Área de Preservação Rigorosa). Também é classificado, quanto ao seu grau de preservação, como de Conservação Parcial (CP). A ideia do proprietário Ermano Targino é resgatar os velhos tempos, mas dando ao empreendimento um novo sentido, que atenda à demanda econômica e social da cidade de hoje. Dono do Palace há quase trinta anos, ele lembra que não é a primeira vez que tenta fazer com que o público volte a frequentar o local. Na década de 1980, a edificação foi recuperada, tendo sido criado um serviço ainda pouco usual na época – o happy hour – , no terraço do restaurante do Palace. Todos os finais de tardes, da varanda do terraço, o visitante curtia uma das mais deslumbrantes vistas panorâmicas da quatrocentenária capital paraibana. Diante de si, tinha o Ponto de Cem Reis, testemunha da história política e social do século XX. Mais à frente, estendendo o olhar, se encontrava com a Lagoa do Parque Solón de Lucena. A ideia, infelizmente, não prosperou. Foi assim que, durante muitos anos, o Palace esteve abandonado. As paredes rachadas, o sistema elétrico totalmente comprometido e o mato circundavam o local e revelavam: o antigo hotel já não recebia hóspedes ou visitantes. Mas, em 2005, uma nova tentativa de recuperação foi colocada em prática e serviços emergenciais foram realizados na edificação. Como lembra Ermano, mais uma vez, o poder público se omitiu. “Ninguém do governo – e nem mesmo do setor privado - quis nos ajudar a restaurar o antigo glamour do Paraíba Palace”, diz.
Quase centenário A casa era de azulejos e tinha três pavimentos. Até o final da década de 1920, o jornal Correio da Manhã funcionava no local onde hoje está edificado o Paraíba Palace Hotel. Tudo mudou em 1929: por ordem
do então presidente da Província da Parahyba, João Pessoa, o imóvel foi demolido, para que se construísse o Paraíba Palace Hotel. Como não se tem maiores informações históricas sobre a edificação, não se sabe, nem ao menos, quem foi o arquiteto que projetou a obra do Paraíba Palace. Desde o início, contudo, o imóvel se destacou no cenário urbano da capital. A influência da art nouveau e os detalhes arquitetônicos lhe deram singularidade. A fachada imponente, pintada de amarelo, e o relógio que badalava no alto de sua torre proporcionaram notariedade ao imóvel construído há quase cem anos. O Paraíba Palace Hotel teve sua época áurea nas décadas de 1940/ 1950. Era comum que recebesse hóspedes ilustres – entre políticos e artistas que visitavam a capital paraibana. Somente a partir da década de 1970, com a expansão da cidade em direção à orla e a construção dos primeiros hotéis à beira mar, os tempos de glória ficaram para trás. Fechado por quase 20 anos, foi comprado pelo empresário Ermano Targino. Quase um século depois de ter sido construído, o Hotel ainda mantém um quê de glamour do passado. No século XXI, o antigo se junta ao novo e requalifica o imóvel.
Ponto de Cem Reis
O Paraíba Palace Hotel está localizado na Praça Vidal de Negreiros, no Centro Histórico de João Pessoa. O local é pouco conhecido pelo seu nome original – uma homenagem ao militar que governou a antiga Parahyba, na época da colônia. Já o Ponto de Cem Réis é uma referência ao bonde, que até a década de 1960 passava no local. Exatamente ali os bancos eram virados para trás, com o intuito de que o veículo voltasse ao ponto de partida. Era também nesse momento que os cobradores gritavam o valor da passagem: 100 réis. Desde então, a nomenclatura pegou no inconsciente coletivo, atravessou gerações e passou a fazer parte do patrimônio afetivo da população paraibana. Em 12 de outubro de 1924, o prefeito Walfredo Guedes Pereira inaugurou a Praça Vidal de Negreiros. Desde então, o local passou à história por reunir as famílias e amigos em sua praça. E ainda por ter sediado as principais manifestações políticas, que ocorreram na capital paraibana, no século XX. Entre elas, o protesto contra a morte do líder camponês João Pedro Teixeira, em 1962, as concentrações contra o regime militar instaurado em 1964, em prol da Anistia Política e pela realização de eleições diretas, e as mobilizações estudantis dos caras pintadas pelo impeachment do presidente Collor. Em 2009, o Ponto de Cem Réis foi revitalizado pela Prefeitura de João Pessoa, passando a ser utilizado como palco por músicos paraibanos e brasileiros. Assim como o Paraíba Palace, o projeto teve a assinatura do arquiteto Amaro Muniz e transformou a Praça Vidal de Negreiros num imenso teatro a céu aberto.
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especial
No papel As atribuições do arquiteto e urbanista são definidas por uma resolução do CAU/ BR Texto: Lidiane Gonçalves | Imagens: Divulgação
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Imagem: Divulgação Projeto e desenho: Giovane Andrade
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esde meados de 2013 os arquitetos e urbanistas têm definidas as atividades que são feitas com exclusividade por esses profissionais. Através de resolução nº 51, do Conselho de Arquitetura e Urbanismo do Brasil (CAU/BR), as atribuições foram definidas e outros profissionais não podem mais realizar esses trabalhos. Esta resolução é baseada em duas fontes, sendo a Lei 12.378/2010 a principal delas, pois é a lei que regulamenta o exercício da profissão. Mas se baseia também nas diretrizes curriculares nacionais dos cursos de Arquitetura e Urbanismo. As atividades exclusivas dos arquitetos e urbanistas são nos setores de arquitetura e urbanismo; arquitetura de interiores; arquitetura paisagística; patrimônio histórico, cultural e artístico; planejamento urbano e regional; e conforto ambiental. Antonio Francisco de Oliveira, doutor em Arquitetura e Urbanismo pela Universidade Federal da Bahia e professor da Universidade Federal da Paraíba, conselheiro federal e 1º vice-presidente e coordenador da Comissão de Exercício Profissional do Conselho de
Arquitetura e Urbanismo do Brasil (CAU/BR), explica que desde 1933, quando foi editado o Decreto Federal 23.569, o exercício profissional da arquitetura era regulamentado juntamente com o da engenharia. “A prática destas duas profissões ficou sendo disciplinada por uma mesma lei e controlada por um mesmo órgão fiscalizador, no caso o Sistema Confea/ Crea. Porém, durante os quase oitenta anos em que perdurou tal situação, muitos conflitos se estabeleceram entre essas profissões, principalmente no que tange às competências profissionais de uma e de outra, inclusive com muitas áreas de atuação compartilhadas entre elas”, explicou. Ele esclareceu ainda que apenas em 2010, foi editada a Lei n°12.378, que veio regulamentar o exercício da arquitetura e, ao mesmo tempo, criar o CAU, o novo órgão fiscalizador da profissão. “A partir daí, tornou-se possível estabelecer uma delimitação mais clara entre o campo de atuação da arquitetura e o da engenharia, o que até então não havia sido feito. Aí reside a principal conquista advinda desta lei: ela permitiu que, enfim, ficasse precisamente delimitado o campo de atuação profissional específico da arquitetura, distinguindo este campo de atuação do campo das demais profissões. E este campo de atuação específico da arquitetura é formado precisamente pelas atribuições privativas dos arquitetos e urbanistas, conforme o que se encontra definido na Resolução n° 51 do CAU/BR. Esta é, portanto, a maior importância desta norma”, disse. O especialista afirma que muda muita coisa depois da resolução do CAU. “Ao delimitar claramente o campo de atuação pleno que compete ao arquiteto e urbanista, a Resolução 21, de 2012, permite a este profissional não apenas atuar em atividades bastante amplas e diversificadas, mas também traçar um planejamento de curto, médio ou longo prazo para a sua carreira, podendo, inclusive, identificar áreas nas quais deseje se especializar, se for o caso”, disse. Ele explica que, por outro lado, ao definir com clareza e precisão o campo de atuação privativo do arquiteto e urbanista, a Resolução 51 impede que outros profissionais tentem realizar atividades pertencentes a este campo. “Isto porque não se pode mais alegar desconhecimento ou dúvida acerca das atribuições privativas da arquitetura, pois agora há uma norma que deixa tudo muito claro. E, ainda mais, muda o cenário que antes existia de ter-se uma profissão que em muitas situações eram confundidas com a engenharia, e mesmo com outras profissões. Enfim, nesta situação, que em tudo é novo, passa-se a ter uma profissão que, pela primeira vez, encontra-se plenamente caracterizada e claramente distinta das demais”, comentou. Antônio crê que ainda é muito cedo para tentar captar as reações do mercado. “Visto que estas normas são recentíssimas e, na verdade, ainda estão sendo dadas a conhecer, ainda é muito cedo para tirar conclusões. Mas creio que, com o tempo e na medida em que forem caindo no domínio público, a reação dos diversos agentes econômicos do setor não pode ser outra senão a de acolher muito bem estas normas, inclusive por compreender que elas têm muito a contribuir tanto para o desenvolvimento da profissão
como do próprio mercado nacional”, afirmou. Logo depois de lançada, a resolução causou certa surpresa aos profissionais de áreas afins, como engenharia e design. “Houve até alguma perturbação em determinados setores. Creio que, com o tempo, todos perceberão que a nova situação beneficia a todos. Deixa-se um cenário que era conflituoso, impreciso, nebuloso, cheio de dúvidas, e se estabelece um ambiente muito mais claro, bem definido e com regras que são conhecidas por todos”, disse. O doutor em arquitetura disse ainda que acha que é natural, em um primeiro momento, que surjam algumas reações de incompreensão e, em certos casos, mesmo de contestação, de protesto. “É até possível que se verifiquem – quem sabe? – algumas reações traduzidas em ações judiciais, a meu ver, com pouquíssimas chances de êxito. Mas acredito que isto logo passará, que em pouco tempo se estabelecerá um clima de compreensão e, até mesmo, de certeza de que as novas normas, além de justas, gozam de plena legalidade”, afirmou. “Os profissionais da engenharia têm seu próprio campo de atuação que, por sinal, é bastante amplo, como todos sabem. Quanto aos designers, creio que muito em breve eles terão sua profissão devidamente regulamentada, uma vez que há um projeto de lei com este fim tramitando, já em estágio bastante avançado, no Congresso Nacional. Acredito firmemente que muito em breve, ao final deste novo processo, todos estarão convictos de que a nova regulamentação do exercício da arquitetura em tudo e para todos foi benéfica”, concluiu. Antônio afirma que a resolução foi criada respeitando integralmente os direitos legais das demais profissões. “Teve-se o cuidado de examinar atentamente a legislação afeta às demais profissões tecnológicas, bem como os currículos escolares das mesmas, de modo a evitar-se que qualquer das atribuições dessas profissões viesse a ser relacionada entre as privativas dos arquitetos e urbanistas. Em suma, estou convicto de que a Resolução 51 é plenamente legal, justa e legítima”, disse. A Resolução 51 e a lei que regulamenta a profissão de arquiteto e urbanista, podem ser vistas na íntegra no site do CAU (http://www.caubr.gov.br).
Principais atribuições exclusivas para arquitetos e urbanistas, definidas na norma 51: - Projeto arquitetônico de edificação ou de reforma
- Relatório técnico referente a memorial descritivo, caderno de especificações e de encargos e avaliação pós-ocupação - Projeto urbanístico e de parcelamento do solo mediante loteamento - Projeto de sistema viário urbano - Coordenação de equipes de planejamento urbano ou de regularização fundiária - Projeto de arquitetura de interiores - Projeto de arquitetura paisagística - Direção, supervisão e fiscalização de obras referentes à preservação do patrimônio histórico, cultural e artístico - Projetos de acessibilidade, iluminação e ergonomia em edificações e no espaço urbano. 87
Viagem de Arquiteto
a Cidade do Leão
Singapura, conhecida como a ‘Capital do Milênio’, apresenta-se ao mundo como símbolo de beleza e prosperidade.
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iajar pela Ásia foi uma das experiências mais espetaculares que tive na vida e, com uma arquitetura legitimamente grandiosa e um urbanismo audacioso, a cidade-Estado de Singapura (ou Cingapura) se destaca diante dos outros lugares que conheci. Foi um verdadeiro privilégio ter a oportunidade de vivenciar todas as maravilhas que se encontram ao sul da Península Malaia, no sudeste asiático. Em uma completa mistura entre três etnias predominantes – chineses, malaios e indianos – e alguns idiomas oficiais, sendo o inglês o principal deles, os habitantes deste lugar são receptivos, disciplinados, muito educados e, normalmente, ricos. O país é o lugar com maior número de milionários em dólares per capita do planeta – ou seja, não se trata de um país de contrastes, e a riqueza é evidente na cena urbana. A terra do Merlion é um lugar bonito, seguro, cosmopolita e absolutamente high tech. Praticamente tudo em Singapura é construído. Desta forma, o país se torna uma imensa e fascinante obra arquitetônica e urbanística. Tudo é pensado e projetado com finalidade de multiplicar a fortuna do país, não há espaço para aleatoriedade, este é o porquê da pobreza extinta em apenas poucas décadas.
O Merlion, em malaio Singa-Laut, é uma figura mítica com corpo de peixe e cabeça de leão, que representa de modo icônico o Tigre Asiático em questão. O nome é a combinação entre “mer” e “lion” (ou “mar” e “leão”). Outrora como vila de pescadores, a identidade histórica do lugar está simbolizada através do corpo de peixe, e a cabeça de leão é oriunda do próprio nome do país (Singapura significa “cidade do leão”). A estátua deste ícone, com 8,6m de altura e 70 toneladas, está situada em uma área de 2.500m², no Merlion Park. Caminhar por Singapura é uma experiência singular, especialmente para quem admira a arquitetura como arte. São construções magnificentes que em conjunto formam uma malha urbana fluida, organizada e de incontestável beleza. Entre as obras arquitetônicas e pontos turísticos que mais se destacam, estão: Marina Bay Sands Resort; Artscience Museum; Helix Bridge; Singapore Flyer Experience; Gardens By The Bay; Esplanade; 1-Altitude Tower; os diversos shoppings e edifícios comerciais da Orchard Road; e Sentosa Island. O Marina Bay Sands é um resort integrado com 3 hotéis de 55 andares, conectados por um terraço aéreo, o Skypark, com a piscina de borda infinita mais famosa e mais alta do mundo. Ainda no complexo do resort tem um luxuoso shopping, um cassino, 6 restaurantes, um teatro e mais alguns atrativos. A vista do Skypark é deslumbrante, é realmente incrível! A enorme flor de lótus localizada em Marina Bay é uma das mais importantes e esculturais construções de Singapura. Lá funciona o ecologicamente correto Artscience Museum projetado por Moshe Safdie, com mais de 4.800m² de galerias, abraça o universo de influências da arte e ciência, mídia e tecnologia, design e arquitetura. Tive a oportunidade de assistir o Wonder Full que é um show gratuito na área externa, proporcionado pelo museu, de luzes e água. São aproximadamente 15 minutos de espetáculo, com direito a efeitos especiais, bolhas de sabão e lágrimas de emoção ao som de “What a wonderful world”, especialmente para quem estava há quase um ano longe de casa, como eu. A Helix Bridge foi uma grata surpresa, pois eu não esperava que pessoalmente fosse tão linda.
O efeito luminotécnico da ponte de pedestres com formato de molécula de DNA, interligando lados opostos da cidade e com pequenos mirantes para apreciação, é surpreendente! Caminhando pela ponte, cheguei à maior roda gigante do mundo, Singapore Flyer Experience, que é lida como “roda da fortuna”, um símbolo de prosperidade do país, respeitando todos os preceitos do feng shui. A perspectiva da cidade lá de cima é inspiradora, pode-se ver uma variedade impressionante de edificações com formas ousadas e ter noção da dimensão megalomaníaca de Singapura. Se eu tivesse que escolher apenas um lugar para falar, entre todos os que conheci, sem dúvidas este seria o Gardens by the Bay. Lá é possível enxergar a olho nu o caráter grandioso da arquitetura da Capital do Milênio. A sensação é de estar em um mundo fantástico ou em alguma espécie de filme de ficção científica. São vários jardins distintos e temáticos em um único lugar, utilizando as mais altas tecnologias da construção civil do mundo e todos são invariavelmente adequados às premissas da sustentabilidade, como a captação de
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energia solar e reaproveitamento de águas pluviais, por exemplo. A Flower Dome é a eterna primavera de Singapura, se tratando de uma imensa estufa de flores subtropicais que se misturam de forma harmoniosa em um colorido intenso e encantador. A Cloud Forest imita fielmente o clima tropical montanhoso e apresenta ao longo de sua extensão as mais diversas espécies de plantas típicas deste tipo de clima, é incrível poder contemplar as vistas estonteantes da imensa montanha artificial cercada por vegetação e gemas florais ocultas que desaparecem nas nuvens. O que há de mais impressionante nestes jardins é a Supertree Groove, que são jardins verticais com design exclusivo de 25 a 50 metros de altura com grandes copas que fornecem sombra durante o dia e ganham vida com uma exibição de luz e som à noite. Em suma, entre os demais jardins, estão: World of Plants; Bay East Garden; Heritage Gardens; e Dragonfly & Kingfisher Lakes. No centro financeiro de Singapura existe o bar mais alto da região, que está localizado na cobertura da 1-Altitude Tower, o estiloso 1-Altitude Gallery & Bar, de onde se pode ter a perspectiva de 360 graus da cidade. De lá um complexo de teatros, restaurantes e shopping, se destaca pela excentricidade de sua arquitetura, o Esplanade. Não obstante, a característica audaz das construções de Singapura se faz presente nos incontáveis shoppings da Orchard Road, possuindo conceitos estéticos diferenciados entre si. Sentosa é uma ilha construída com 2 andares, aonde no térreo estão o cassino e o estacionamento,
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e o pavimento superior compreende à toda área que envolve o Universal Studios, as praias de curvas perfeitas, shoppings, restaurantes, hotéis, spas, clube de golfe e demais atrações do lugar. As dimensões são de uma pequena cidade, aonde a palavra de ordem é diversão! Falar resumidamente sobre Singapura é um desafio, visto que se trata de um lugar fascinante nos mais abrangentes aspectos, desde a dinâmica do seu povo à magnificência de sua arquitetura. A cada nova cena, um novo deslumbre. Indubitavelmente um excelente lugar para conhecer, morar ou trabalhar, afinal o país inspira prosperidade. Findada a minha viagem pela Ásia, volto à Austrália, onde estava morando, cheia de saudades e inspirações, com uma leitura enriquecida da vida e da arquitetura.
Texto e fotos: Débora Melo + fotos no site: www.artestudiorevista.com.br
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ARQUITETURA E ARTE
A casa no topo do monte Alfred Hitchcock se inspirou em Frank Lloyd Wright para um cenário emblemático de Intriga Internacional
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Texto: Renato Félix | Fotos: Divulgação
personagem de Cary Grant passa quase todo o tempo no filme correndo para lá e para cá. O clímax de tudo é no alto do Monte Rushmore – aquele que tem esculpidas a dinamite as esfígies de quatro presidentes norte-americanos. Intriga Internacional (1959) é um dos maiores clássicos e um dos maiores sucessos de público de Alfred Hitchcock. Mas como fazer para que a história levasse a ação ao topo do monte? A solução: fazer com que o vilão tivesse uma casa lá, a base antes da grande fuga. Que casa seria essa é uma outra história. O governo americano não permitiu construção nenhuma no local, para preservar o local. A saída foi a engenhosidade artesanal de Hollywood: uma casa falsa, falsamente localizada no topo do Monte Rushmore – criação do time de cenógrafos Robert Boyle, William A. Horning, Merrill Pye, Henry Grace, and Frank McKelvey. E que ostentasse o dinheiro, poder e até bom gosto do vilão Van Damm (James Mason). Optou-se, então, pela modernidade – e, assim, teria que ser um projeto de Frank Lloyd Wright, o papa modernista dos anos 1950. “Wright desenvolveu uma arquitetura que chamou de orgânica”, conta o arquiteto Cristiano Rolim, que também lembra o fator de integração entre exterior e interior. “Essa arquitetura acontece a partir da integração entre as partes que dão forma ao todo, uma unidade indivisível”, diz. “Isso se refere tanto à relação entre os elementos que constituem os edifícios quanto à relação entre a edificação e o entorno “. A técnica combinou cenário e pintura.
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A casa nunca existiu por inteiro: suas partes eram em estúdio. Então os cenógrafos trataram de fazer parecer convincente que ela estivesse no Rushmore. “A chegada de Cary Grant na casa, uma bela construção no meio da natureza, revela uma estrutura de aço apoiada na pedra, como se a casa estivesse apoiada sobre esse maciço de pedra”, aponta Rolim. A inspiração em Frank Lloyd Wright prossegue evidente no interior da casa. “A característica essencial da arquitetura orgânica, defendida por Wright, é a abolição de qualquer elemento decorativo aplicado posteriormente, ou que não faça parte da essência da construção”, explica o arquiteto. “Dessa premissa advém uma arquitetura onde a pedra, o vidro e a madeira assumem papel preponderante no contexto espacial”. As questões de arquitetura e urbanismo estão presentes, no entanto, desde o começo de Intriga Internacional. “A relação se estabelece a partir dos créditos iniciais: o esquema de barras se transformando nas esquadrias de um prédio de vidro que reflete uma cidade. A tomada abre para a vida urbana na maior
metrópole americana com pessoas em ritmo acelerado, disputando o espaço e as conveniências urbanas como um taxi, onde essa relação entre tempo e espaço são marcados por uma música eletrizante”. Outro marco arquitetônico é o prédio das Nações Unidas, inaugurado sete anos antes do filme, e onde Hitchcock quis filmar, mas não teve autorização. Então, mandou fotógrafos e reconstituiu os interiores do edifício em estúdio. “O mobiliário de linhas retas e sem adornos, as obras de arte com características modernistas, contrastam com os interiores apresentados anteriormente onde o mármore e a madeira apresentavam características clássicas, como no restaurante onde Grant é sequestrado”, aponta Rolim. A saída de Cary Grant do local é mostrada através de uma radical imagem de cima para baixo, do alto do prédio. “Podemos perceber aí parte do paisagismo com traçado modernista. O personagem principal sai em busca de sua verdade, em fuga para a cidade de Chicago e – talvez não por acaso – o trem se chama 20th Century”, especula o arquiteto. “Mas só encontra essa verdade sob os olhares dos presidentes americanos e abrigado em uma arquitetura representativa de um dos seus maiores ícones”.
Intriga Internacional, de Alfred Hitchcock. Distribuição: Warner
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ARQUITETURA E moda
A azulejaria azul nas passarelas e na ARQUITETURA Os elementos da arquitetura na contínua influência na moda
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opularizados no final do século XVI, os azulejos, oriundos dos árabes, até hoje são aplicados em igrejas e palácios portugueses. A partir do século XVII surgiram profundas mudanças na sua utilização e estética. A estampa da azulejaria azul é inspirada na faiança chinesa, estampa decorativa de peças de porcelana, descoberta pelos navegadores portugueses em expedição no Oriente. Em João Pessoa, podemos ter um belo exemplar no Casarão de Azulejos, no centro histórico, aberto para visitação. A tradicional estampa de azulejos portugueses é a queridinha da estação. A porcelain print (estampa de porcelana) surgiu nas passarelas de verão 2013 de Roberto Cavalli e Valentino, mas logo ganhou as ruas. Inspirada na arquitetura colonial portuguesa e nos antigos porcelanatos, é composta por flores e arabescos em tons de azul e branco. Como não poderia ser diferente, o romantismo e frescor da estampa vão além das
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Texto: Germana Gonçalves | Fotos: Divulgação
passarelas aparecendo também na arquitetura e decoração. É possível encontrar objetos decorativos como almofadas, vasos, miscelâneas, bancos, papéis de parede e tecidos com desenhos e cores fortemente inspirados nessa tendência. A azulejaria é um ponto de partida para outras formas de mistura de cores e estampas. É possível utilizar os tons de azul e branco sem necessariamente estar presente as estampas arabescas dos azulejos. De forma prática, podemos usar alguns elementos inspirados nesta tendência como pontos focais na decoração, como por exemplo, um composé de base neutra complementado com objetos em tons de azul e branco. A tendência pode ser explorada em quaisquer ambientes residenciais ou corporativos. É importante salientar que todas as tendências que surgem na moda e na arquitetura possuem caráter passageiro, e que lembrar-se do conceito de atemporalidade está sempre na moda.
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conversa franca
Fábio Queiroz Olho na
tabela O presidente do Sindicato dos Arquitetos da Paraíba conta que apenas 200 profissionais são sindicalizados e fala sobre a proposta de valores nacionais de referência para serviços da área Texto: Lidiane Gonçalves | Fotos: Cácio Murilo / Divulgação
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Paraíba tem mais de mil arquitetos registrados junto ao Conselho de Arquitetura e Urbanismo na Paraíba (CAUPB). Destes, apenas 200 são sindicalizados. No estado, a maior parte trabalha como autônomo. É o que revela o presidente do Sindicato dos Arquitetos da Paraíba, Fábio Queiroz. Ele revelou ainda que arquitetos que trabalham como
autônomos enfrentam dificuldades, não apenas na Paraíba, mas em todo o Brasil. Mas, não só de dificuldades vivem os arquitetos autônomos, as vantagens de trabalhar para si atraem muitos profissionais. Quem trabalha como autônomo tem maior flexibilidade de horário, pode seguir as regras de execução de tarefas que mais combinam com o seu perfil de trabalho.
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É importante para o autônomo saber quanto vale o seu trabalho, por isso há projeto para unificar nacionalmente os honorários dos arquitetos. No entanto, já existe uma espécie de calculadora, adotada pelo Sindicato dos Arquitetos, que pode orientar o profissional. ARTESTUDIO – É difícil ser um arquiteto autônomo na Paraíba? Por quê? Fábio Queiroz – A maior dificuldade que sinto como autônomo na Paraíba e – por que não dizer? – no Brasil, é ser um profissional que teve até 2010 sua profissão sombreada por outros profissionais que não tinham a sua qualificação, e assim, não a representavam, nem respeitavam a categoria dos arquitetos e urbanistas. Hoje temos nosso Conselho de Arquitetura e Urbanismo (CAU) e temos uma longa jornada de divulgação e valorização profissional à frente.
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AE – O que o sindicato tem feito pelos arquitetos autônomos? FQ – Desde a sua reabertura, o sindicato tem participado de reuniões com os arquitetos, entidades de classe, entidades públicas, promovido eventos, oferecido planos de saúde e previdência privada, assistência jurídica, sempre no intuito de valorizar a profissão e os profissionais. AE – Existe uma tabela que fixe preço mínimo para determinados serviços? FQ – Recentemente o CAU/BR em uma de suas comissões, recomendou a aprovação de uma tabela de honorários de referência nacional. Até abril de 2014 esta tabela será abrangida de todos os serviços possíveis de serem desenvolvidos pelos arquitetos, que a terão como parâmetro de cobrança.
AE – Quais as atribuições de um arquiteto? FQ – As atribuições dos arquitetos estão definidas pelas resoluções do CAU/BR – em especial, a resolução 51 (Estão disponíveis no site: http://www. caubr.org.br/?page_id=637 AE – Como o profissional de arquitetura e urbanismo, hoje, calcula os valores cobrados pelos serviços prestados? FQ – Hoje temos uma tabela de referência on-line que já calcula automaticamente os valores destes serviços. O arquiteto pode usá-la através do endereço www.iab-es.org.br/modulos/portal/f_tblhnr.cfm AE – Como fazer para se filiar ao sindicato? FQ – No nosso sindicato, para se filiar, basta pagar a anuidade sindical, que é obrigatória por lei e já estará filiado. Todos os arquitetos com o registro profissional no CAU/PB em dia são obrigados por lei a ser sindicalizados.
AE – Quais as obrigações e as vantagens de ser filiado ao sindicato? FQ – A obrigação dos filiados basicamente é se manter em dia com o sindicato. As vantagens são: ter acesso a eventos, cursos, planos de saúde e previdência privada, plano de telefonia (em breve) com descontos, bem como poder direcionar demandas de valorização e proteção profissional com a nossa assessoria jurídica. A partir de 2014 estaremos realizando, uma vez por mês, discussões sobre a nossa profissão e produção arquitetônica no casarão nº 2, que fica no Largo São Frei Pedro Gonçalves, nº 2, Varadouro. Em nosso site, os arquitetos poderão se atualizar sobre os assuntos de arquitetura do nosso estado. O endereço do nosso site é www.sindarqpb.org.br. Nosso e-mail é sindarqpb@gmail.com e o telefone para qualquer dúvida ou esclarecimento é 3222.1975.
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OUTRAS ÁREAS
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Brejeirice e
talento
Texto: Renato Félix | Fotos: Divulgação
Lucy Alves se destacou na sua entrada em cena no The Voice Brasil: o país conheceu um brilho do qual a Paraíba já é íntima.
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al ela começou a tocar a sanfona, Lulu Santos fez uma cara de espanto. Mal ela cantou “Se a gente lembrar só por lembrar...”, Carlinhos Brown apertou o botão e sua cadeira de jurado no The Voice Brasil virou para contemplar Lucyane Alves, ou Lucy Alves. A paraibana causava uma brilhante primeira impressão no reality show musical e passava a ter uma repercussão nacional para o talento que a Paraíba já conhece bastante bem, como uma das integrantes do Clã Brasil. “É uma grata surpresa quando viramos e encontramos uma coisa linda assim”, se derreteu Lulu Santos. “Você cantou a música mais linda. Sua originalidade me encantou. Seu sotaque mostrando o regionalismo é demais. Você me ganhou no conjunto”. A pessoense Lucyane Pereira Alves faz sucesso pelo menos desde 2005, a bordo do Clã Brasil. O quarteto feminino de forró pé-deserra, pela graça e talento, conquistou lendas do gênero, como Sivuca e Dominguinhos – as meninas chegaram a tocar com os dois. O grupo – que na linha de frente tem Lucy e suas irmãs Laryssa e Lizete Alves, além de Fabiane Fernandes – lançou seis CDs e dois DVDs e, agora, Lucy se prepara para o primeiro álbum solo. Mas o talento musical de Lucy não se resume ao forró. Além da sanfona, ela toca bandolim, escaleta, fole de oito baixos, contrabaixo, cavaquinho, rabeca e começou tocando violino na Orquestra Infantil da Paraíba e na Camerata Izabel Burity. Já fez parte do grupo Lírios do Gueto (de reggae), também integra o Chorisso (grupo instrumental de chorinho) e faz parte (com destaque) da banda de Alceu Valença, com quem faz apresentações pelo Brasil e pelo mundo.
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Ela também concluiu o bacharelado em Canto pela Universidade Federal da Paraíba: seu show de conclusão de curso foi uma homenagem a Luiz Gonzaga, chamado Enluarada. E foi voltando mais uma vez ao Rei do Baião, com o clássico “Qui nem jiló”, que Lucy fez grande figura em sua primeira aparição no The Voice Brasil. Junta com a família no Clã Brasil ou na estrada solo, seja em que gênero musical for, Lucy alia a tradição com o vigor da juventude, sem esquecer uma alegria nordestina muito própria. A perícia nos intrumentos, claro, é uma ajuda importante. Mas qualquer que seja o resultado do The Voice Brasil, o destino de Lucy parece ser o sucesso. Sua página no Facebook já recebeu mais de 12 mil curtidas, e o vídeo de sua apresentação era, no final de outubro, o mais visto entre os competidores do time de seu técnico, Carlinhos Brown, com quase 900 mil visualizações e segue entre os mais vistos no geral. O melhor: esse sucesso anda lado a lado com um respeito muito grande pelo que essa muito jovem (mas muito experiente) cantora e musicista faz. Um grande talento temperado por uma brejeirice encantadora e a herança musical de lendas do forró.
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CARTA DO LEITOR
ENDEREÇOS
A Revista AE quer ouvir você.
DÉBORA JUlINDA
É com prazer que aceitamos a sua opinião, críticas, sugestões e elogios. Entre em contato conosco:
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Sou bibliotecária da Universidade do Estado de Minas Gerais – Unidade Ubá, uma instituição de ensino superior. A unidade de Ubá oferece o curso de bacharel em Design de Produto. Recebemos através de uma doação dois exemplares da ARTESTUDIO. Venho por meio deste solicitar a doação desse periódico com o objetivo de enriquecer o nosso acervo. Se possível, gostaríamos de receber também as edições anteriores, uma vez que a biblioteca tem apenas os seguintes números: 11 a 16, 22 a 25. Seria de extrema gentileza se nós recebêssemos alguma doação. Gabriela Xavier da Silva Bibliotecária | ubá, MG
Gabriela, obrigada pelo contato. Ficamos felizes com o seu interesse. Veremos quais exemplares poderemos enviar. Abraço.
Acabo de receber a AE. Belo trabalho dos arquitetos e editores. Já repassei para minha filha. Um abraço.
GEÓRGIA SUASSUNA Endereço Av. Rui Carneiro, 212 Miramar - João Pessoa/PB Fone: +55 (83) 3224.5250 / 9179.6038
HARON cOHEN Rua Bento Freitas, 306, 7º Andar Vila Buarque - São Paulo-SP Fone: +55 (11) 3257.4414
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ERRATA Na edição 42, a editora do livro Dimensionamento em Arquitetura . Na verdade, é a JRC Gráfica e Editora e o livro é de 2013.
Jorge Elias Neto Médico e Poeta | Vitória, ES
Olá, como faço para ter a revista? Sou apaixonada por arquitetura e amo a ARTESTUDIO, sempre a vejo em pontos comerciais. Ela vende nas bancas de revista?
Dimensionamento em Arquitetura, de Emile Pronk, Editora JRC, 2013
Paula Moura
Olá Paula, ficamos muito felizes que você ame arquitetura, o nosso foco de trabalho e a nossa revista também. Ela ainda é gratuita. Para você ter acesso aos exemplares, recomendo que você acesse a versão digital www.artestudiorevista.com.br e veja os nossos parceiros. Então é só passar em qualquer uma dessas lojas e pegar o seu exemplar.
revistaae revArtestudio Artestudio Márcia Barreiros co n t a t o @ a r te s t u d i o r e v i s t a . co m . b r
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ponto final
A casa e seu significado Do ponto de vista simbólico, a casa representa a nossa psique, ou seja, as várias instâncias da nossa mente consciente e inconsciente. Nesse sentido, a casa, assim como a mente, expressa o conteúdo cognitivo e emocional que nos constitui como indivíduos distintos do grupo. Psicologicamente falando, isso faz da casa um repositório das nossas vivências físicas, afetivas e intelectuais. A nossa memória, nossa história de vida, encontra no espaço doméstico um lugar favorável de expressão. Em função disso, a forma como organizamos nossa casa pode dizer muito sobre como nos sentimos, como pensamos e como atuamos no mundo. A casa seria quase um espelho da percepção que temos de nós e do mundo num determinado momento da nossa vida. Ao mesmo tempo, a casa oferece pistas valiosas dos valores e crenças que nos caracterizam num nível mais profundo, melhor dizendo, o espaço que habitamos espelha tanto nossos comportamentos atuais quanto traços mais permanentes da nossa personalidade. Por ser parte tão significativa daquilo que nos distingue dos demais – nossas crenças, atitudes e valores – a casa pode oferecer um espaço de reconhecimento da nossa identidade, em especial para nós mesmos. A rua, a escola, os ambientes de trabalho e de lazer, de forma geral, são pensados para acolher a diversidade de tipos humanos. Nos espaços públicos pode ser favorecida a distinção grupal – como os “territórios urbanos” que são frequentados por uma determinada tribo – mas, de forma alguma, é favorecida a distinção pessoal. Sendo assim, boa parte do nosso tempo, passamos em locais que não nos pertencem, que não são caracterizados pela marca da nossa identidade pessoal. Os ambientes públicos são, por definição, despersonalizados, quando os “habitamos” é necessário conter determinados aspectos da nossa personalidade que não se adequam a um espaço específico. O convívio social em espaços coletivos exige a supressão momentânea de boa parte do que somos, de como pensamos e sentimos. Para nos integrarmos, precisamos enfatizar as nossas características e comportamentos que são demandados naquele espaço, naquele dado momento. Essa constante exigência adaptativa gera estresse emocional e cognitivo, pois, muitas vezes somos obrigados a reprimir sentimentos, pensamentos, emoções e comportamentos que desejaríamos expressar. No espaço privado da casa, ao contrário do que ocorre no público, podemos ser nós mesmos. É no espaço doméstico que não nos intimidamos para mostrar tanto nossos aspectos desagradáveis quanto os agradáveis. A casa, portanto, é um refúgio no qual nos permitimos nos expressar integralmente. A noção de refúgio da casa remonta à própria história da nossa evolução como espécie. Para os nossos ancestrais, a primeira casa, a caverna, era o espaço no qual nos sentíamos protegidos das ameaças externas, no qual nos sentíamos confortáveis para relaxar, amar e cuidar uns dos outros sem temer o ataque iminente de um predador ou da fúria da mãe natureza. O sentimento primitivo de que o lugar para o qual retornamos quando deixamos o mundo externo é o nosso abrigo, nossa defesa contra as ameaças indesejadas, persiste ainda nos recônditos do nosso cérebro. A sensação de conforto que sentimos ao retornar à casa é desencadeada por essa herança emocional, herdada dos nossos ancestrais e preservada pelo nosso sistema límbico, a principal área do cérebro envolvida nas emoções e comportamentos necessários à sobrevivência. 104
Se o espaço doméstico nos oferecer essa sensação de conforto, proteção, relaxamento e reconhecimento, ele contribuirá muito para o bem-estar físico e emocional. Sentir-se seguro num espaço que se reconhece como sendo próprio – com a cara do dono – ajuda a combater o estresse cotidiano, nos recuperando do desgaste diário que é exigido nos espaços públicos, onde precisamos nos adequar. Por isso, talvez, pensar na casa como um espaço de “tendências” seja um dos principais problemas que impedem as pessoas de obterem satisfação genuína em seus lares. Atualmente, muitas pessoas lidam com a casa como se ela fosse uma vitrine de moda. Com isso, é comum que se esqueçam de priorizar o gosto pessoal e o conforto necessários para que o lar funcione como um refúgio. Na contramão da tendência “casa para visita ver”, tem ocorrido no campo do design um movimento de retorno à simplicidade, à busca por um espaço mais humano e menos objetal. A simplicidade pode, num certo sentido, contribuir para a solução de um problema comum nos espaços domésticos contemporâneos e que impede o devido aproveitamento das vantagens de se estar em casa: o excesso de informações. Casas lotadas de móveis, texturas, cores, objetos, com abundância de estímulos sensoriais, acabam por sufocar a nossa percepção do ambiente. Esse sufocamento inibe nossa capacidade de apreciar os detalhes, de absorver apropriadamente as informações visuais, táteis, olfativas e outras que constituem o ambiente, e que são necessárias ao nosso fruir com o espaço. A fruição sensorial é o que nos dá a sensação de estarmos integrados ao ambiente, e não submersos nele. A simplicidade, entendida como o ambiente pensado a partir do que é essencialmente necessário, bom e agradável aos sentidos de quem o habita, cria condições para que o foco da nossa atenção volte-se para nós mesmos. Quando a nossa mente consegue interpretar adequadamente as informações do ambiente processadas pelo cérebro, sem excessos desnecessários, fica mais fácil prestar atenção aos nossos sentimentos, pensamentos, sensações e emoções. Aprendendo a nos perceber melhor, aprendemos também a perceber o outro e ao ambiente, nos tornamos mais receptivos aos conteúdos subjetivos e objetivos do mundo à nossa volta, pois esses conteúdos já não mais nos agridem ou sobrecarrega. Como em nossa época ter tempo para si e para os outros é cada vez mais raro, a simplicidade – seja na decoração, na arquitetura, ou no estilo de vida como na forma de vestir-se, comer e divertir-se – surge como uma possibilidade de aliviar nosso corpo e mente, restituindo às nossas vidas um pouco do tempo roubado pelo excesso de tarefas profissionais, sociais e domésticas. Ou seja, restitui à casa o lugar de refúgio e abrigo, que é tão essencial ao nosso bem-estar físico e psicológico.
Projeto e desenho: Giovane Andrade
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