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Memória Interiorização
Foto: periodicos.ufpa.br
MEMÓRIA INTERIORIZAÇÃO A revolução da educação – parte II
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Continuamos nossa jornada pela ousada história da interiorização da Educação Superior, que possibilitou a inclusão de milhares de pessoas, alterando completamente os cursos de suas vidas.
Na edição #4 da Revista FADESP (novembro/dezembro 21 e janeiro/22), iniciamos um resgate da narrativa da interiorização da Educação Superior em nosso estado – “ato de coragem, ousadia, mas também, de extrema teimosia”, como definiu a professora Leila Mourão que, nome essencial ao projeto empreendido pela Universidade Federal do Pará. Mais de 40 anos se passaram, desde que o Anuário Estatístico Brasileiro escancarou um cenário, posteriormente confirmado por um amplo estudo realizado pelo MEC: de que dos 25.000 professores atuantes nas escolas públicas estaduais e municipais, apenas 150 possuíam formação superior.
Narrando, com enorme precisão, Leila Mourão relembrou todas as dificuldades do processo. “Chegávamos aos locais, de rabeta, barquinho e até de avião da FAB. Tivemos uma preocupação bem grande com os parâmetros fundamentais que nos orientavam: legitimidade da oferta e sua legalidade, além da participação da comunidade universitária nesse grande projeto!”, ela narrou à Revista FADESP, em setembro do ano passado.
Do chão da fábrica à vice-reitoria da UFPA
Tamanho esforço vicejou, frutificou e tem um sabor todo especial ao professor e atual vice-reitor da UFPA Gilmar Pereira. O maranhense de nascimento (e paraense apaixonadíssimo pelo chão que chama de lar) foi aluno da interiorização. Pergunto a ele como é olhar, em perspectiva, toda sua trajetória. “Não imaginei nem que concluiria o curso, porque àquela altura, não havia professores para suprir a demanda”, conta. Pereira era operário, quando decidiu “tentar” a Universidade, revela. Com passagens pela hidrelétrica de Tucuruí e por uma empresa de mineração em Barcarena, ele acreditava realmente que seu destino seria no “chão de fábrica”, como refere-se a este período. “Minha realidade era de trabalhar. Talvez se eu tivesse nascido em uma família de classe média, a história fosse diferente e, talvez, tivesse cursado Engenharia, até porque era com isso que eu trabalhava, mas, naquele momento, eu tinha de ganhar meu sustento. A Universidade, pra mim, foi um ‘acidente’, porque se ela não estivesse presente em Abaetetuba, eu não teria tentado”, diz. O vestibular, portanto, foi uma aposta não muito segura, conforme ele nos conta. “Eu não achava que passaria”, afirma. “Você não imagina como foi difícil, porque os cursos eram intervalares e as aulas, duravam dias inteiros! Imagine que as empresas não liberam [para assistir aulas] e foi graças a professores muito, muito queridos e sensíveis, que decidiram dar aulas à tarde e à noite, que o curso era possível para mim e para tantos outros que viviam a mesma situação”, revela. E assim foi feito: aulas noturnas. Ele fica reflexivo por um momento e prossegue falando que, quando olha, em retrospectiva, imagina tantos filhos de famílias sem tantas condições ou trabalhadores com orçamentos apertados que não podem contar com bolsas de estudo, auxílios para transporte alimentação. “A Universidade não proporcionou só estudo. A Universidade, por meio da interiorização, tornou-se sinônimo de dignidade. Avalie você que, até então, a Universidade era branca. Ser negro e cursar o ensino superior era exceção! Hoje, por conta das cotas, o cenário é mais colorido, diverso, inclusivo. A cada ano, receber os meninos e meninas no [Centro] Benedito Nunes, é algo simplesmente formidável!”, comemora.
O papel da FADESP
Gilmar Pereira relembra que o atual diretor executivo da Fundação, Professor Roberto Ferraz Barreto, foi um dos professores, do campus de Belém, que abraçaram a honrada missão de levar o Ensino Superior aos 4 cantos do Pará. “Quando as primeiras turmas da interiorização se formaram, em 1992, a UFPA celebrou um convênio com o Estado para absorver esses primeiros/novos/recém-formados 1.500 professores e a FADESP tem um papel importantíssimo porque foi a Fundação quem recebeu os recursos, tornando possível contratar os novos docentes. E esse primeiro contrato teve a validade de 4 anos. Até que, em 1996, começaram a surgir as primeiras vagas pela União, para professores universitários e uma parte destes, tornou-se docente substituto. Uma quantidade menor tornou-se efetivo”. Quando peço que ele avalie sua própria trajetória, Pereira não pensa duas vezes. “Me sinto honrado, feliz, mas a conquista maior é da interiorização. Muita coisa ainda precisa ser feita. Nosso projeto se reúne a duas coisas: excelência acadêmica e inclusão social, parafraseando o reitor Emmanuel Tourinho. O fato de ir para a reitoria é uma homenagem à interiorização”, finaliza.
Professor Gilmar Pereira da Silva, vice-reitor da UFPA.
Na próxima edição da Revista FADESP, que circulará a partir de Abril de 2022, acompanhe a terceira parte dessa viagem que levou educação superior pública e de qualidade aos quatro cantos do Estado.