Revista FEUC em Foco - Edição 21 (junho/2015)

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Revista

Ano 6 • Nº 21

• junho de 2015 • www.feuc.br/revista

em foco

! e t s e O a n o Z Somos

FINCADA EM BOM SOLO

Em ações e projetos, instituição reforça compromisso com seu território 1


Artigo Jayme Ribeiro Doutor em História pela UFF e professor das FIC

Educar é fazer pensar! Durante boa parte do século XX, os livros didáticos assumiram lugar de destaque na relação ensino-aprendizagem. Em muitos momentos, em diversas realidades educacionais do país, ainda é o único instrumento de pesquisa e ensino para alunos e professores. Objeto padronizado e condicionado por formatos e linguagens, o livro didático não é neutro. Segundo Gimeno Sacristán, por trás do “texto”, há toda uma seleção cultural que apresenta o conhecimento oficial, colaborando de forma decisiva na criação do saber que se considera legítimo e verdadeiro, consolidando os cânones do que é verdade e do que é moralmente aceitável. Desse modo, os livros didáticos tornam-se veículos portadores de um sistema de valores, de ideologias e de uma cultura, visando servir de mediador entre a proposta oficial do poder, por intermédio dos programas curriculares, e o conhecimento escolar ensinado pelo professor. Por outro lado, é possível pensar no livro didático como lugar de memória, na medida em que contribui para perpetuar uma determinada memória sobre agentes ou fatos históricos. Podese verificar também, através de sua análise, uma memória historiográfica, na qual a produção e o discurso historiográfico de uma época podem ser encontrados. Os estudos acadêmicos produzidos atualmente têm contribuído bastante para relativizar o seu papel de “vilão da História”. Desde o século XIX,

ele tem sido utilizado de diversas formas e sob diferentes realidades. Contudo, possui uma função básica que atravessa os tempos: a transposição didática, isto é, a passagem do saber acadêmico ao saber ensinado. No entanto, não se pode pensar o livro didático apenas como mero reprodutor do saber produzido nas universidades. Ele atua na ressignificação do saber acadêmico criando um novo saber: o saber escolar. Além disso, pode auxiliar o domínio da leitura e da escrita em todos os níveis de escolarização, serve para ampliar informações, possui uma linguagem mais acessível, articula outras linguagens que não a da escrita, fornecendo ao estudante maior autonomia frente ao conhecimento e auxilia a aquisição de conceitos básicos do saber acumulado historicamente. Assim, é possível perceber que o livro didático, mesmo possuindo uma série de limitações técnicas, econômicas e ideológicas, quando utilizado de maneira crítica pelo professor, torna-se um instrumento importante na relação ensino-aprendizagem. Não se pode esquecer jamais que o foco da educação é o educando. Nesse sentido, educar é fazer pensar, pois o professor deve ter uma postura crítica frente aos materiais escolares e estimular a reflexão e o questionamento em suas aulas. Desse modo, não tornará o livro didático o único guia e mestre de suas práticas, principalmente por saber que quem atua no processo transformador da educação, incentivando, auxiliando e mediando os conhecimentos é o professor, e não o livro didático. ■

“O professor deve ter uma postura crítica frente aos materiais escolares e estimular o questionamento em suas aulas”

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Índice

Editorial Foto: Gian Cornachini

Foto: Gian Cornachini

18 Capa

29 Entrevista

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Bem-vindos!

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Vai um livro aí?

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Maio Quente

Juntos e misturados com a Zona Oeste

Fazemos de tudo para ‘ser bom’ para você

Grupo da UNATIL cria biblioteca informal

Mês teve quatro grandes eventos acadêmicos

Rogério Haesbaert fala a colegas das FIC

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Além-mar Os estudantes africanos que escolheram a FEUC

Pós-Graduação Educação continuada é a palavra de ordem

Maioridade e educação A estreia de um olhar discente nos artigos

CAPA: Professores e alunos de Ciências Sociais e Geografia posam junto com moradores do Rio da Prata durante trabalho de campo na região. Foto: Gian Cornachini FEUC em Foco é uma publicação impressa e online da Fundação Educacional Unificada Campograndense. Presidente: Durval Neves da Silva; Diretor Administrativo: Hélio Rosa de Araujo; Diretora de Ensino: Arlene da Fonseca Figueira; Diretora Superintendente: Mônica Cristina de Araújo Torres; Equipe: Tania Neves (Edição e texto), Gian Cornachini (Texto, foto e diagramação), Pollyana Lopes (estagiária); Periodicidade: trimestral; Tiragem: 5.000 exemplares; Site: www.feuc.br/revista; E-mail para contato: emfoco@feuc.br

Considerações e opiniões emitidas nos artigos assinados são de inteira responsabilidade de seus autores, não refletindo, necessariamente, a posição da FEUC.

Sempre que entrevistei personalidades ligadas à história da FEUC — o saudoso professor Wilson Choeri, as professoras Carmen Navarro e Leda Noronha — ouvi delas uma frase quase idêntica, dando conta que a instituição sobreviveu em tempos difíceis e resiste ainda hoje graças a nunca ter abandonado seus ideais de origem: servir à comunidade em que está inserida. De fato, essa é uma marca que a distingue. E que está presente, por exemplo, nos trabalhos de campo de alguns cursos feitos prioritariamente na região, para estimular nos alunos a reflexão sobre seu território; na abertura de espaço para eventos de utilidade pública; na concessão de um valor significativo de bolsas; nos projetos do PIBID, entre outras ações que você confere em nossa matéria de capa, na qual declaramos com orgulho que Somos Zona Oeste! E esse orgulho não é somente por nossas ações, mas principalmente pelos frutos que vemos brotar, como a participação firme e desenvolta de nossos discentes nas semanas acadêmicas de seus cursos, apresentando trabalhos de alto nível e participando de discussões enriquecedoras, como se vê a partir da página 24. Numa dessas discussões, a estudante Meire Lucy, de Letras, sentiuse desafiada a refletir sobre a réplica de um palestrante, questionado por ela acerca do modo como a mídia conduz o noticiário sobre maioridade penal. E Meire marca, assim, com um contundente texto na página 34, a estreia de alunos como articulistas aqui na revista. Que venham outros, o espaço está aberto! ■ Tania Neves Editora 3


MUNDO

Explosarte faz convite geral aos talentosos Foto: Tania Neves

Já começaram as audições para o Explosarte 2015 — o concurso de canto do projeto “Luz... Câmera... Educação”. Com direção musical do maestro David de Souza, da Orquestra Sinfônica da FEUC e Coro Ecos Sonoros, e direção artística de Adriano Marcelo, coordenador de Teatro, a primeira audição aconteceu no dia 19 de maio. Foram classificados em 1º, 2º e 3º lugares, respectivamente, Davi Ramos, funcionário da portaria; a dupla Nathy Santos e Duda Barcellos, alunas no CAEL; e Wesley Coelho, aluno das FIC. A próxima audição será no dia 27 de agosto, não perca! Os ingressos, a R$ 8, já estão disponíveis na Tesouraria. A Explosarte acontecerá em setembro. ■

Khóra: revista já recebe artigos para o número 3 A Khóra, Revista Transdisciplinar dos cursos de Ciências Sociais, Geografia, História e Pedagogia já está com seu segundo número disponível no endereço www.feuc.br/khora, e convocando os interessados a enviar propostas de artigos para a terceira edição, a ser lançada ainda este ano. As normas para submissão de trabalhos — que devem ser feitas somente online — podem ser consultadas no próprio site da revista. São aceitos artigos, resenhas, capítulos de teses, dissertações e monografias, entre outras modalidades de textos acadêmicos. Leia a atual edição e participe das próximas! ■

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O grupo de candidatos que participou da primeira audição

‘Excluídos da História’ será tema do XVII Encontro do curso Vai acontecer entre os dias 14 e 17 de setembro o XVII Encontro de História das FIC. O evento terá como tema os “Excluídos da História”, e seu objetivo será o de fomentar o debate sobre sujeitos históricos à margem da sociedade e dos livros didáticos. O evento, como de costume, ocupará os turnos da manhã e

da noite. Também está confirmada na programação a apresentação do musical “Doces Lembranças”. O espetáculo sobre a década de 40 mostra um pouco da participação do Brasil na Segunda Guerra Mundial. A peça é dirigida por Ciro Gallo, estudante da pós-graduação em História Social e Cultural do Brasil. ■

Pedagogia oferecerá curso para atuação em prisões Os professores do Núcleo Docente Estruturante de Pedagogia estão preparando, para o próximo semestre, um curso de Pedagogia Carcerária Socioeducativa. Com aulas uma vez por semana, provavelmente aos sábados,

o curso é voltado para a pedagogia empresarial e tem como objetivo preparar os estudantes para a atuação em prisões e desconstruir preconceitos. Quem participar, vai receber 30 horas de atividade complementar. ■


Tonhão e Francisco Barbosa: um verdadeiro duelo de celebridades Bastou circular a notícia de que o radialista Francisco Barbosa já estava na instituição para a palestra que faria durante a Semana de Letras, na noite do dia 27 de maio, e um fã prontamente o abordou com uma folha de papel às mãos. Não, ele não queria autógrafo, mas sim entregar uma mensagem que correu a escrever para dar conta ao ídolo de toda a sua admiração. Tonhão, sem dúvida o sujeito mais popular da FEUC, viveu assim o seu dia de tiete, com direito a foto para coluna social e tudo! E deixou Barbosa visivelmente emocionado, depois que leu a mensagem. Confira:

Francisco Barbosa, Te acompanho há muito tempo, te admiro e sinto uma emoção quando ouço sua voz no ar. Transmites paz, energia, amor, notícias e entretenimento. O rádio é nosso companheiro ao deitar, ao levantar e no dia inteiro faz a gente se alegrar, refletir e pensar. Você tem o dom de se comunicar, sua voz foi ungida por Deus para exercer esse ofício. Francisco Barbosa, por onde

passar, marcas irá deixar no coração e na alma de todos seus admiradores. Continue a embalar nossas manhãs, para que nosso dia flua da melhor forma possível. Você não pode parar de se comunicar, pois você nasceu para isso e nós temos o privilégio de crescer e aprender contigo. Do seu ouvinte, Antonio Damasceno de Freitas (Tonhão) Foto: Tania Neves

Os populares Barbosa e Tonhão: cenas de tietagem explícita

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Graduação

Novos alunos: bem-vind Primeiro período de todos os cursos oferece duas disciplinas em comum para formar estudantes com escrita madura e mais capazes de ler o mundo Por Gian Cornachini

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ais do que levantar uma faixa no pátio da FEUC com os dizeres “Seja bem-vindo”, as FIC têm se empenhado para ir além do papel de anfitriã. O primeiro período de cada curso é uma transição do Ensino Médio para o Ensino Superior, ou ainda a volta aos estudos depois de um tempo longe das salas de aula. A leitura dos textos acadêmicos já não é tão palatável quanto a dos livros didáticos escolares, e uma boa escrita para a entrega de trabalhos monográficos é ainda mais necessária. Conhecimento sobre culturas diversas também é fundamental, tudo para se tornar um profissional preparado para trabalhar com pessoas, sejam elas alunos, clientes ou companheiros de trabalho. “O estudante de graduação das FIC começa um curso com 14 créditos, depois passa para 16, depois 18 e, no 4º período, passa a ter 20 créditos (com exceção de Pedagogia e Sistemas de Informação). O objetivo disso é que ele vá, aos poucos, tendo condições de acompanhar o ritmo”, explica Valdemar Silva, coordenador Acadêmico das FIC. E, para preparar esse novo campo de estudos, há duas disciplinas que são comuns para estudantes de todos os cursos: Oficina de Produção de Textos e Cultura e Sociedade — uma voltada para a prática da escrita e outra para a atualização de temas e discussões sociais. De acordo com Erivelto Reis, atual professor responsável por ministrar a disciplina de Oficina de Produção de Textos, muitos alunos chegam ao Ensino Superior com práticas e conceitos equivocados que trazem de sua formação anterior: “Há a ideia de que ‘a Língua Portuguesa é difícil’, e que ‘produzir texto é só para quem tem dom’. Essas são as respostas mais comuns quando começo a interagir com os estudantes”, conta Erivelto. “E, aos poucos, eles vão percebendo que a prática mediada de leitura e escrita permite a todos os acadêmicos a produção de um texto coerente, coeso e compatível com suas pretensões de formação profissional”, destaca o professor. Ele ainda lembra a importância de a disciplina ser oferecida a todos os cursos: “Qualquer que seja a sua área (licenciatura ou bacharelado) ou curso, a produção do texto acadêmico, a capacidade de diferenciar e produzir diferentes gêneros de texto e de identificar as situações em

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que estes ocorrem é fundamental para o aluno ingressante. A disciplina aprofunda e dinamiza a experiência de leitura, estimula o senso crítico do discente, propõe que ele leia o mundo de forma mais amadurecida”, ressalta Erivelto. A leitura de mundo também é completada com a disciplina Cultura e Sociedade, atualmente sob a responsabilidade da professora Rosilaine Silva, coordenadora do curso de Geografia. Criada com o objetivo de possibilitar aos alunos a discussão sobre os novos processos tecnológicos, formação cultural e entendimento de nossa cultura, a disciplina foi pensada, principalmente, na perspectiva de educação em Direitos Humanos, como explica Rosilaine: “Temos alunos jovens, mas outros que saíram há muito tempo da escola e que não participaram dos debates sobre as mudanças culturais. Juntos, a gente aprofunda discussões e tenta desconstruir olhares conservadores e cerceados por preconceitos, pensa questões de gênero, orientação sexual e diversidade cultural”, aponta a professora. Para completar a disciplina, uma das avaliações consiste em apresentar, de maneira lúdica, peças teatrais abordando os conceitos aprendidos em sala de aula, a fim de se empenhar e aprofundar nas discussões. “Para o aluno de licenciatura, esse movimento é fundamental no sentido de romper com pré-conceitos. Na sala, a gente vai trabalhar com o diverso, e o diverso tem que ser afirmado”, aponta Rosilaine. “Já no âmbito do bacharelado, promove uma discussão dentro do que são os direitos humanos e direitos políticos, que independem da área que o aluno vai seguir, mas que vai se construir numa percepção de um mundo melhor”, completa. De volta às boas-vindas, há um ponto que não passa despercebido por aqui, como bem lembrou a professora Maria Licia Torres, coordenadora do curso de Pedagogia — a graduação com maior número de alunos, hoje passando de 600. Diante de tantos estudantes, ela destaca a singularidade das FIC em relação a outras instituições de ensino: “As coordenações de curso aqui são bem presentes, acessíveis, e têm contato direto com os alunos. Eles comparam com outros lugares, principalmente os transferidos. E é importante que eles se sintam assim, porque queremos estar sempre próximos, acompanhando-os, amenizando problemas, estar ali sempre juntos e tirando dúvidas. Esse é o nosso papel”, ressalta a professora. ■


dos na prática e na teoria Fotos: Raquel Martins e André Siqueira

Com bastante orgulho, a professora Rosilaine conta sobre as apresentações de trabalhos da disciplina Cultura e Sociedade. Sem fotos para mostrar, ela recorre rapidamente a alunos que compartilharam no Facebook dezenas de imagens das atividades desenvolvidas em sala de aula. Vestidos com roupas típicas e bastante animados, os estudantes mostram a empolgação com o trabalho sobre “Movimentos de resistência cultural”, o qual Rosilaine não mede esforços em elogiar: “As apresentações sempre dão frutos muito importantes na produção de conhecimentos. Elas contribuem com a perspectiva multicultural, de respeito e promoção do diálogo entre as diferentes culturas e movimentos de resistência, entendendo os processos de formação da nossa matriz cultural”

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Intercâmbios

Enio, Orquideo, Ivandra e Ndoy em foto tirada durante evento em comemoração ao Dia da África Foto: Pollyana Lopes

Da Guiné-Bissau para cá em busca de estudos Vindos do pequeno país africano, estudantes escolhem a FEUC para se formar Por Pollyana Lopes

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m 2006, alguns estrangeiros começaram a vir estudar nas Faculdades Integradas Campo-Grandenses (FIC). Naturais da Guiné-Bissau, país que passou a contar com uma universidade pública apenas a partir dos anos 2000 (antes havia algumas escolas superiores em nível de graduação), eles vieram em busca de formação acadêmica. Até hoje, já passaram pela instituição pelo menos 15 estudantes guineenses, que optaram principalmente pelos cursos de Ciências Sociais, Letras e Bacharelado em Sistema de Informação. 8

“É igual aos brasileiros, alguns foram para outros países estudar, adquirir cultura e conhecimento para voltar e aplicar o melhor que eles aprenderam lá. A mesma coisa está acontecendo conosco. A gente vai pegar o melhor daqui, levar e aplicar. Isso é o desenvolvimento”, comparou Ndoy Luís Ie da Silva, que concluiu o curso de Bacharelado em Sistema de Informação nas FIC no segundo semestre de 2012. A vinda dos guineenses é possível graças ao acordo de Cooperação Cultural, Educacional e de Ciência e Tecnologia entre os governos do Brasil e uma série de países africanos, que permite e incentiva a vinda de moradores do continente


para estudar aqui. A maior parte deles vem por meio do Programa de Estudantes Convênio de Graduação (PEC-G), que oferece uma bolsa de R$ 622 por mês durante seis meses. No entanto, alguns escolhem as universidades particulares, e mantêm-se no país por conta própria. A Guiné-Bissau é um dos países da África que mais enviaram estudantes para o Brasil, apesar desse fluxo ter sido interrompido em 2012, quando um golpe de estado no país africano fez com que o Brasil rompesse relações diplomáticas com a Guiné-Bissau. O pacto já foi reestabelecido e, em abril de 2014, o país passou pelas primeiras eleições após o ocorrido. Ivandra Nunes da Silva veio para o Brasil para estudar Computação na Universidade Federal de São Carlos, mas não se identificou com aquela área e resolveu cursar Ciências Sociais nas FIC. Ela, que concluiu a graduação em 2011, quer fazer mestrado em Relações Internacionais. Sobre os obstáculos encontrados nessa trajetória, ela cita a comida. “Tive dificuldade de adaptação com a comida, eu não consigo comer feijão todos os dias, e na universidade a gente almoçava no restaurante universitário. E também de relação pessoal mesmo. Aqui no Rio eu não tive essa dificuldade que tive em São Paulo. Aqui na FEUC, menos ainda, a gente se adaptou direitinho, teve bom relacionamento com todo mundo, com os colegas e professores”, contou Ivandra. Apesar de sermos ambos países de língua oficial portuguesa, o idioma foi um dos obstáculos enfrentados pelos guineenses no Brasil, principalmente na academia. “Existem regionalismos, modos de pronúncia e vocabulários que são muito diferentes.

Lá é mais voltado para o português de Portugal. O que é pronunciado aqui, não é pronunciado lá. Lá tem um significado e aqui vale outra coisa. Mas a gente vai aprimorando, conhecendo o vocabulário brasileiro. A ciência é universal, então o que pega é a língua, é o mecanismo de informação. Essa é a principal barreira que a gente encontra na faculdade”, explicou Delcio Barbosa, que é graduado em arquitetura pela UFRRJ. Delcio não estudou nas FIC, mas se juntou ao grupo para fazer parte da Associação dos Estudantes Guineenses do Rio de Janeiro, criada para apoiar os guineenses. “O objetivo da Associação é unir todos os guineenses do estado do Rio de Janeiro, não só estudantes, mas também os imigrantes que moram aqui. Para poder ter uma união e também tentar incentivar todo mundo nessa área acadêmica”, defendeu Ndoy. “Para criar uma unidade mais coesa, para a gente saber das dificuldades, das necessidades de cada um, para saber onde e como ajudar nessas dificuldades”, complementou Delcio. Tratando-se do incentivo à formação acadêmica, apesar de virem para cursar a graduação, é comum a busca por especializações e mestrados. Ivandra planeja o mestrado, Ndoy já está terminando o MBA em Gestão de Sistema de Informação pelas FIC e Delcio vai começar, no segundo semestre de 2015, a pós-graduação em Gestão de Projeto na Fundação Getúlio Vargas. Em comum, todos têm a satisfação de conhecer uma cultura diferente, agregar conhecimento e... a saudade! “Está sendo muito bom, e o que eu posso dizer que é ruim é a saudade da família. Isso sempre vai estar com a gente”, evidenciou Ndoy. ■

“Está sendo muito bom, e o que eu posso dizer que é ruim é a saudade da família”

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Zona Oeste

Profissionais de destaque ganham perfis

Foto: Gian Cornachini

Na série de livros

Personalidades do Rio de Janeiro, Nancilia Pereira seleciona cariocas com atuação relevante Por Pollyana Lopes

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ocê conhece algum carioca que se destaca no que faz? Uma pessoa que superou as dificuldades e manteve o foco no trabalho? Ou quem sabe alguém que, com uma reviravolta na vida, modificou sua área de atuação, mas, ainda assim, mantém a notoriedade de seu desempenho profissional? Eles não merecem ser personagens de livros? Essa é a proposta de Nancilia Pereira, pedagoga e escritora moradora da Zona Oeste, com sua série de livros “Personalidades do Rio de Janeiro”. Ela seleciona moradores da cidade com notoriedade pública e escreve um perfil deles. Sobre juntar as histórias para transformá-las em livro, a autora conta de onde surgiu a ideia: “Foi da vontade de resgatar a história do Rio de Janeiro, principalmente da Zona Oeste, que é onde eu moro, e mostrar às pessoas quantos talentos nós temos”, ressalta ela. Nancilia também destaca que os livros contam com figuras de diferentes áreas: “Quando eu falo em talento, é talento na arte, na música, na religião, na política. Tudo isso, para mim, são personalidades, o que não quer dizer celebridade”, pondera a autora. “É aquela pessoa que faz, que produz e que ajuda no desenvolvimento do Rio de Janeiro. Pessoas que passam por anônimas, mas que a gente sabe que têm um bom trabalho”, explica.

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Nancilia exibe, com orgulho, o quarto volume do livro

Dentre os personagens da edição mais recente (volume IV) estão a Vovó DJ - a aposentada Ana Lúcia do Espírito Santo, que comanda a discotecagem de festas na cidade - o cantor nascido em Santa Cruz Weber Werneck, a advogada Viviane Tomazini e o cenografista Cléssio Regis. “Já tive livro com pessoas tanto de centro espírita como padre. Então eu acho que o que importa é o trabalho que se desenvolve através do seu talento próprio, independentemente de credo, de religião, filosofia, doutrina espírita ou política”, declara a autora. Com “Personalidades IV” publicado, Nancilia hesita em parar: “Eu fiz o primeiro, realmente foi um sucesso muito grande porque as pessoas compreenderam o objetivo do trabalho. Eu não pretendia ir tão longe, mas aí começaram ‘você não vai fazer o segundo?’. Então eu fiz o segundo, fiz o volume três, agora o quarto... estou cansada realmente, porque além disso eu tenho as minhas obras infantis”, diz Nancilia. Eu falei ‘esse ano vai ser o último que vou fazer’, mas já tem muita gente pedindo para não parar porque ainda tem muita coisa pra ser resgatada. E realmente tem”, revela. O livro foi lançado na FEUC, no dia 11 de abril, em uma cerimônia com 200 pessoas. Além da presença de biografados, o evento contou com apresentações de música, dança e exposição de artes. A obra pode ser adquirida em Campo Grande, na Livraria Edital, na Yan Livros e na Casa Cruz. ■


Educação Infantil

Capoeira como ferramenta pedagógica e transformadora Ao som do berimbau e regada com histórias da cultura afro-brasileira, mestre Anisio aposta na capoeira para exercitar e integrar seus alunos Foto: Gian Cornachini

Mestre Anisio: “Eles sabem o básico e ninguém se machuca”

Por Gian Cornachini

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atrimônio Cultural Imaterial da Humanidade pela Unesco desde 2014, a roda de capoeira também integra as atividades semanais do maior patrimônio da Educação Infantil do CAEL: as crianças que, num gingado aqui e num movimento ali, respondem disciplinarmente às instruções do mestre Anisio do Nascimento Neto — chamado carinhosamente entre os pequeninos de “Tio Capoeira”. “A capoeira, no tempo da escravidão, era considerada uma luta. Mas, para ela se manter viva durante todos esses anos, ela foi se tornando uma dança, que já não é lutada, mas jogada”, explica o mestre Anisio, que já dedicou 40 de seus 54 anos de idade à capoeira. Formado em Pedagogia e, atualmente, pós-graduando em Educação Especial nas FIC, mestre Anisio vem cada vez mais se apropriando de seu hobby e tornando-o um trabalho cultural, pedagógico e transformador para as crianças: “A gente desenvolve aqui no CAEL uma capoeira pedagógica, uma ferramenta para socializar e integrar os alunos, e para contar uma história que não foi contada”, diz ele. “Nosso objetivo aqui é fazer exercícios, despertar a lateralidade, a coordenação motora, a flexibilidade. E, também, que as crianças vejam o berimbau e associem à cultura afro-brasileira, floresçam o conhecimento da nossa música e conheçam a história de nossos antepassados”, completa o mestre, revelando a finalidade educadora das rodas de capoeira no Colégio: “Queremos que eles sejam adultos diferentes, sem preconceito, mais solidários e conhecedores de sua própria cultura”. Quem ainda não viu uma aula de capoeira no CAEL ficará encantado ao notar a disciplina dos pequenos alunos e o respeito que eles têm aos comandos do mestre Anisio. Parados cada um em um ponto pré-determinado do pátio, basta o professor ditar os golpes que todos os colocam em prática simultaneamente. “Eles sabem o básico da capoeira: a ginga, cocorinha, negativa, queda de quatro e roleta. E ninguém se machuca, porque a finalidade não é acertar o adversário, mas de se alongar e ter disciplina”, lembra o mestre, que em seguida forma duplas para jogarem a capoeira ao som de um berimbau tocado ao vivo por Anisio, enquanto cada um espera ansiosamente a sua vez. ■ 11


UNATIL

Leitura para Maria José, a Zezita, é amante da leitura desde criança

Por Pollyana Lopes

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a Universidade Aberta à Terceira Idade Leda Noronha (UNATIL), os idosos têm a oportunidade de manter o corpo dinâmico em aulas de yoga, dança, canto etc. Para manter “mente sã em corpo são”, porém, é preciso trabalhar também o cérebro, o raciocínio, o espírito. Nesse quesito, a leitura pode ser um grande aliado. Para quem já passou dos sessenta e está sujeito a uma série de agravos que podem levar embora até mesmo as lembranças, não há melhor remédio. Por isso a leitura é incentivada entre os integrantes do grupo da terceira idade, por meio de uma biblioteca própria. Entre uma atividade e outra, nas tardes de terça, quarta e quinta-feira, quem passa em frente à sala da coordenação da UNATIL, na FEUC, encontra uma banca cheia de livros. A iniciativa de montar a biblioteca partiu de Maria José da Silva, que teve a intuição depois de uma das atividades culturais organizadas pela universidade. Em uma visita ao Castelo Mourisco, o prédio principal da Fundação Oswaldo Cruz, ela e os colegas conheceram o projeto de troca de li-

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Biblioteca montada pelos próprios integra vros daquela instituição. Zezita, como carinhosamente é conhecida, acreditou que algo parecido poderia ser implementado na UNATIL. Então ela e as colegas, com apoio da FEUC, saíram em busca de doações de livros — e prontamente foram atendidas. Hoje, a pequena biblioteca conta com mais de 150 publicações. “Eu trouxe a ideia porque vi na Fiocruz uma coisa de troca de livros, nem era uma biblioteca. Lá eles levam um livro, pegam outro e levam pra casa. Eu gostei da ideia e trouxe pra cá, mas aqui nós modificamos. Eu falei com os outros componentes para trazerem livros e doarem para a gente formar uma pequena biblioteca. Assim, nós emprestamos: uns doam e outros levam emprestados, ficam sete dias com o livro e, se não conseguirem ler, é só renovar”, explica Zezita. Entre as mais empolgadas com a leitura e cativadas pelo projeto está Waldea Bernardo. Apesar de ter a possibilidade de adquirir livros por outros meios, seu nome aparece frequentemente na lista de empréstimos. Ela, que prefere os romances clássicos de Eça de Queiroz, Machado de Assis, José de Alencar e Luis Fernando Veríssimo, destaca a importância da leitura e alerta que o hábito


a agitar o cérebro

antes disponibiliza diversos livros a quem participa da UNATIL deveria ter mais adeptos: “Ler é importantíssimo, leitura acrescenta tudo na nossa vida. De tudo o que a gente lê, a gente aprende um pouco. Eu acho que as pessoas deveriam ter mais interesse. Quinze, vinte minutinhos que você tira para ler um capítulo, dois, três, não vão ocupar tanto o seu tempo, e só tem a acrescentar, ainda mais na nossa idade”, incentiva Waldea. “A gente tem que ler, procurar sempre atividades pra mente não parar, porque senão ela para e a gente fica só pensando em coisas que não deve. A leitura é o melhor caminho, qualquer tipo de leitura, até gibi eu leio. Eu gosto mesmo!”, enfatiza. A professora Leda Noronha, fundadora e diretora da UNATIL, ressalta o protagonismo do grupo que teve a iniciativa: “A ideia da biblioteca da UNATIL surgiu dos próprios integrantes. As doações foram feitas por diversas pessoas e não há nenhuma restrição”, esclarece a diretora. “A pessoa doa o que quiser, e o outro lê o que quiser. Livros religiosos, científicos, literatura, tem um pouquinho de tudo porque é um esforço coletivo, um esforço deles. Isso é incentivado por nós porque a gente sempre dá muita importância às atividades que brotam do próprio aluno”, diz.

Fotos: Pollyana Lopes

A banca impressiona pela variedade de livros em oferta

Tímida, é preciso um pouco mais de conversa para que Zezita conte suas motivações mais íntimas em propor a biblioteca. “Eu adoro ler, por isso eu tive essa ideia. Já li muito na minha vida”, revela. Pensando nos colegas, ela se solidariza: “Às vezes você gosta de ler, mas não tem como, até comprar, porque livro é caro”, pondera Zezita. O projeto cumpre seu papel, como diz a própria Zezita: “Foi um sucesso. Sempre tem alguém pegando livro”, alegra-se. ■ 13


Ensino de Línguas Fotos: Pollyana Lopes

Por Pollyana Lopes

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Ronalt da Silva se encantou pela leitura enquanto trabalhava na biblioteca da escola

Sonho de professora transformado em um curso Nas aulas, estudantes de diferentes idades aprendem Português e Libras e ganham autonomia na comunicação interpessoal e social 14

esde o mês de março, acontece na FEUC, gratuitamente, o curso de português para surdos, que é oferecido pela professora Maria José Brum. As aulas são direcionadas a surdos e deficientes auditivos de qualquer idade e têm como objetivo levar o grupo a aprimorar seu domínio da língua portuguesa. Maria José é docente da graduação de pedagogia das FIC e trouxe a iniciativa para instituição este ano. Antes disso, as aulas aconteciam em outros espaços, mas como a atividade não tem arrecadação, pagar por uma locação não era adequado. A professora então refletiu: “Eu tenho que encontrar outro espaço. E por que não a FEUC? Já que sou professora aqui há dois anos no ensino superior, há mais dez anos nos cursos livres, fui aluna, e isso contribuiu tanto para a minha trajetória... Eu vou tentar”. A relação de Maria José com o tema vem do fato de ela ter uma irmã surda, e que se socializou pouco porque a família não sabia Libras. Após se graduar em Pedagogia nas FIC, ela se especializou na língua de sinais. “Já que eu não pude fazer com a minha irmã, por que não fazer com outros? Eu vou transformar esse meu sonho em ações: vou ensinar aos surdos que têm famílias que não sabem Libras, que não sabem se comunicar com eles”, disse. Nas aulas do curso, uma professora de português apresenta o conteúdo enquanto Maria José interpreta o assunto em Língua Brasileira de Sinais. Ela também traduz para o português as falas de interação dos alunos direcionadas à professora. Dessa maneira, o grupo estuda substantivos, adjetivos, verbos, sujeitos, predicados etc. Encontrar professores é difícil, pois, como declarou Maria José, “o tempo do trabalho voluntário é diferente”. Já passaram quatro professoras, e a atual, Danielle Gomes Pedro, conheceu a língua ainda na graduação em Letras, cursada nas FIC. Hoje ela faz também aqui sua especialização em Libras e conta como encara o trabalho: “A minha ideia de ajudar a Maria José é por saber que isso é muito importante para os surdos se comunicarem, se socializarem. E também porque eu queria fazer algo que fosse útil. É um curso de português para surdos, mas é também um trabalho social. Eles aprendem a se comunicar, a lidar com outras pessoas”, contou Danielle. Exemplo disso é Ronalt da Silva, deficiente auditivo que se destaca dos demais alunos por ter maior domínio tanto do português, que veio do hábito da leitura, quanto da língua de sinais, aprendida apenas aos 17 anos. Nas aulas, ele é um importante elo para a sociabilidade dos demais. O curso de português para surdos é inteiramente gratuito e não precisa de inscrição. Para participar é só aparecer nas aulas, que acontecem às quintas-feiras, de 16h às 18h. Na recepção da FEUC você se informa sobre a sala em que o curso está sendo dado. ■


Pós-Graduação

Pedra que não rola... cria limo! O ditado popular cai como uma luva para ilustrar o poder de renovação que a educação continuada tem sobre os profissionais Por Tania Neves

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e houve um tempo em que as pessoas diziam, com um misto de orgulho e alívio, “Já terminei os estudos”, referindo-se à conclusão de ensino médio ou faculdade, hoje em dia uma frase assim soaria no mínimo como admissão de estagnação. Com um mercado de trabalho que exige cada vez mais preparo e especialização por parte dos candidatos, passou a valer a ideia de Educação Continuada: o bom profissional segue estudando e se aperfeiçoando, pois o mundo muda o tempo todo, e quem não acompanha perde relevância. Cursar uma pós-graduação, portanto, tornou-se o caminho natural de quem sai da faculdade. Coordenadora de Extensão, Pós-Graduação e Pesquisa das FIC, a professora Gabriela Barbosa ressalta que, para os recém-graduados, a pós lato sensu é um primeiro degrau nessa escalada. Especialmente aos que seguirão no Magistério, há bons atrativos: confere mais pontos ao candidato em concursos para o ensino público, garante salário maior em face do não especializado, enriquece o currículo dos que fazem processos seletivos na rede privada e dá a todos mais desenvoltura e segurança para assumir a sala de aula ou outro posto na escola. Também os formados em outras áreas que não as licenciaturas se diferenciam no mercado de trabalho quando incluem um MBA no currículo, já que isso demonstra que seguem comprometidos com seu aperfeiçoamento científico: “A pós atualiza seus participantes sobre as reflexões científicas mais recentes em sua área de atuação,

contribuindo também para a elaboração de projetos de mestrado e propiciando novas colocações no mercado de trabalho”, sustenta Gabriela. Pensando em quem se graduou há mais tempo e ainda não conseguiu entrar no mercado de trabalho, ou está estacionado numa função sem perspectivas de crescimento, “criando limo”, aí mesmo é que a pós-graduação tem o poder de renovar o horizonte, pois propicia ao profissional uma nova (e mais profunda) imersão nos temas e problemáticas atualizadas de seu ramo. Foto: Gian Cornachini

Gabriela Barbosa, coordenadora da Pós das FIC: só vantagens 15


Pós-Graduação

Como 2+2=4, eles comprovaram matematicamente o valor da pós Rodrigo Abreu e Bruna Mayara Ribeiro, ambos graduados e pós-graduados em Matemática pelas FIC, chegaram a figurar nas campanhas de divulgação da Pós-Graduação, convidados devido ao rápido sucesso que obtiveram em suas carreiras. Rodrigo conta que ao longo da graduação e da pós ele se submeteu a vários concursos públicos, passando em mais de um para o Estado e também para o Município do Rio. Por fim, optou por ficar com duas matrículas neste último, onde passou a atuar como Assessor Adjunto na 10ª CRE. Paralelamente, voltou às FIC como professor do próprio curso de pós-graduação que ajudou na abertura desses caminhos. “O conhecimento que adquiri aqui, tanto na graduação quanto na pós, foi de altíssimo nível, porque os professores são realmente muito capacitados. Esses conteúdos matemáticos e pedagógicos me deram base para tudo”, revela Rodrigo, explicando por que, no ensino público, optou por um trabalho fora das salas de aula: “Percebi que nessa parte tenho condições de ajudar mais escolas ao

mesmo tempo, tentando facilitar o lado pedagógico para que os colegas em sala atuem melhor”. Bruna Mayara também emendou a graduação na pós, em 2010, o que lhe garantiu não somente uma preparação melhor para a sala de aula como também pontos extras no concurso para o Município do Rio, onde começou a lecionar em 2011. “Sempre amei matemática, desde os tempos do Ensino Fundamental, porque tive um professor fantástico. Sabia que meu caminho profissional seria nas exatas, mas não tinha ideia de lecionar. Foi depois de ver a atuação do professor Alzir e da professora Gabriela que a ficha caiu. Quis seguir o exemplo deles como pessoas que são capazes de mudar a vida do outro”, elogia Bruna, completando que as reflexões feitas na pós lhe deram mais segurança para encarar a sala de aula. E também o desejo de seguir em frente: em 2013, Bruna passou para o mestrado profissional na PUC e conquistou o grau de mestre com louvor, o que não é para todo mundo. “Quando estava escrevendo minha monografia, vi que a se-

Foto: Gian Cornachini

CONFIRA A LISTA DE ESPECIALIZAÇÕES Atualmente são 17 os cursos oferecidos, com 20 turmas abertas, algumas nas terças e quintas e outras nas segundas e quartas à noite, além das que funcionam em horário integral no sábado.

Rodrigo se graduou e pósgraduou nas FIC e hoje leciona na Pós, além de atuar na 10ª CRE 16

2ª e 4ª, de 19h às 21h50m: Língua Portuguesa; Teoria e Prática do Ensino de Matemática; Matemática para Magistério Público; 3ª e 5ª, de 19h às 21h50m: Coordenação Pedagógica e Supervisão Educacional; Educação Ambiental; Estudos Literários; Educação Especial/Fundamentos e Práticas; Educação Infantil/ Gestão em Prática Pedagógica em Creche e Pré-Escola; História Social e Cultural do Brasil; Língua Inglesa; Língua Portuguesa; MBA em Gestão Educacional; MBA em Gestão de Negócios; MBA em Gestão de Sistemas de Informação; MBA em Gestão Estratégica de Pessoas; Pedagogia Empresarial; Psicopedagogia Institucional; Psicopedagogia Clínica; Sábado, de 8h às 17h: Coordenação Pedagógica e Supervisão Educacional; Teoria e Prática do Ensino de Matemática.


Bruna Mayara: seguindo o exemplo dos professores Alzir e Gabriela, que fazem a diferença na vida dos alunos Foto: Gian Cornachini

gurança e a disciplina para fazê-lo tinham vindo principalmente da pós. Realmente é esse degrauzinho que faz a gente querer seguir em frente”, atesta a jovem, hoje professora das FIC e colega de trabalho de seus professores-ídolos: “Posso dizer que tive bons professores antes e também na PUC, mas o estilo dos professores na FEUC é fantástico. Isso de cuidar dos alunos, a questão afetiva, do incentivo... É uma alegria estar aqui e ter agora a chance de retribuir o que recebi”. Outro professor da pós entusiasta da educação continuada é Victor Ramos, que lecionou no curso de Libras e agora ministra disciplinas no de Língua

Inglesa, além de atuar também na graduação. Ele se formou em Letras nas FIC e fez mestrado em Estudos de Linguagem na UFF. Nas salas da pós, incentiva seus alunos a buscarem a excelência, como em um recente workshop que organizou em Linguística Aplicada e Língua Inglesa, orientando cinco alunos a desenvolverem pesquisas que culminaram na elaboração de artigos a serem publicados em revistas científicas de linguística e educação. “O curso amplia consideravelmente os conhecimentos, tanto de professores atuantes quanto de recém-formados, levando ao aprofundamento e à criticidade em relação às teorias da língua”, afirma.

Educação Especial, um dos cursos mais procurados Foto: Gian Cornachini

Kátia: só o conhecimento quebra a barreira atitudinal

Diretora do Instituto Helena Antipoff — centro de referência em educação Especial da rede municipal do Rio — e docente da pós-graduação em Educação Especial das FIC, Kátia Nunes explica por que é fundamental hoje que os professores se especializem: “Na área da Educação Especial, a maior dificuldade da inclusão de todos os alunos está na qualidade da formação do professor. Por estes desconhecerem os estudos e reflexões da área, as escolas acabam não derrubando a principal barreira para a inclusão, que é a atitudinal”, diz ela, lembrando que os quatro preceitos da inclusão — acesso, permanência, participação e aprendizagem — só se confirmam quando o docente tem formação que lhe permita contemplar todas as diferenças que encontrará entre seus alunos. Kátia afirma que, após tomar contato com os conhecimentos produzidos nesta área — e que são o principal conteúdo do currículo da especialização — os professores passam a refletir mais sobre suas práticas e se preocupar com a pesquisa e a aplicação em sala de aula das metodologias inclusivas. E é assim, segundo ela, que a educação será melhorada. Para todos os alunos, e não somente para aqueles com alguma deficiência. ■ 17


Capa

Da raiz à alma, somos Zona Oeste!

Quando elege o espaço da região e suas questões para pesquisas de campo, ou abre portas para eventos de grupos da sociedade civil, ou apoia manifestações culturais, a FEUC está nada mais do que confirmando seus compromissos de origem 18

Foto: Gian Cornachini


Por Tania Neves

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á no final dos anos 50, quando foi sonhada como uma faculdade para formar os professores de que a região tanto precisava — pois a maioria dos que lecionavam nas escolas daqui vinha de longe, e devido ao sacrifício do deslocamento acabava não ficando por muito tempo — esta instituição já dizia a que vinha: ajudar a desenvolver com qualidade humana um território que rapidamente perdia características rurais e transitava para o urbano. O tempo passou e as transformações foram muitas, com a expansão do ensino da creche à pós-graduação e a ampliação da lista de cursos para além do Magistério. Só uma coisa não mudou: a vocação da FEUC de se voltar sempre para o seu entorno e sua comunidade. Quando dizemos que Somos Zona Oeste, estamos falando não apenas dos professores que continuamos formando para as escolas dos bairros que nos cercam, mas também da preferência que nossos cursos dão por realizar na região suas pesquisas, trabalhos de campo e atividades educacionais várias, a atuação cultural com o Prêmio FEUC de Literatura, a Orquestra e o coro Ecos Sonoros, entre tantas outras ações. E também o compromisso de facilitar à nossa comunidade mais pobre o acesso ao ensino: em 2014, a FEUC concedeu um pouco mais de R$ 3 milhões em bolsas de estudos nas FIC e no CAEL, proporcionando a muitos estudantes comprovadamente sem condições financeiras a chance de realizar seus cursos. Na foto da página ao lado, por exemplo, podemos ver Rita de Cássia Caseiro, presidente da Associação dos Agricultores Orgânicos da Pedra Branca (Agroprata), falando sobre a importância da produ-

ção de alimentos sem agrotóxicos no Rio da Prata, em Campo Grande, bem como a luta pela manutenção de comunidades tradicionais no local. Isso aconteceu no domingo 31 de maio, quando um grupo de Ciências Sociais e Geografia visitou a Feira Orgânica do Rio de Prata e a Associação, no contexto de uma atividade acadêmica. O objetivo era conhecer de perto o trabalho especial que a população de agricultores orgânicos desenvolve em meio às dúvidas sobre a permanência futura em uma área que se tornou protegida por leis ambientais após a demarcação do Parque Estadual da Pedra Branca — isso em 1974, quando a população tradicional já vinha de longas gerações. Os cursos também fizeram trabalhos de campo em Santa Cruz, Ilha da Madeira e outras localidades da Zona Oeste e adjacências. Outro marco do compromisso da FEUC com o seu lugar é o projeto “Fontes para o estudo da História de Campo Grande”, orientado pela coordenadora do curso de História, Vivian Zampa, e a professora Márcia Vasconcellos. Trata-se da identificação, transcrição e análise dos manuscritos encontrados no Arquivo Nacional e no Arquivo do Conselho Ultramarino sobre a história de Campo Grande no período colonial. O trabalho foi iniciado em 2012, com o então aluno José Américo, e hoje conta com as bolsistas de iniciação científica Elba Gaya e Sonia Maria Romano. Elas fazem o trabalho de identificação, limpeza dos documentos em editor de imagens e transcrição. Segundo Vivian, a etapa seguinte consistirá em montar um banco de dados com este material e disponibilizá-lo no site da FEUC: “A intenção é facilitar o acesso a dados sobre Campo Grande no período colonial e estimular que sejam feitos estudos a partir dessas fontes primárias”, diz.

Um dos projetos disponibilizará banco de dados com fontes sobre a história da região

Foto: Pollyana Lopes

Sistematização de dados auxiliará estudos sobre a região 19


Capa Foto: Gian Cornachini

Fabrício e Rodrigo discutem com Danielle as próximas ações a serem desenvolvidas no projeto com a turma

PIBID: incentivo ao professor As FIC iniciaram no ano passado uma série de projetos em escolas públicas de nossa região, no âmbito do Programa Institucional de Bolsa de Iniciação à Docência (PIBID), após concorrer e vencer um edital da CAPES, agência de fomento à pesquisa ligada ao Ministério da Educação. A ideia do programa federal é que os estudantes de licenciaturas desenvolvam, como bolsistas, projetos em escolas públicas do ensino básico, para irem treinando suas habilidades como futuros professores. Além da PUC, as FIC são a única outra instituição privada do Rio a ter o PIBID, o que significa uma conquista importante para a Zona Oeste. Com 170 alunos bolsistas, supervisão de professores das FIC e das escolas envolvidas, os projetos estão sendo realizados nas escolas municipais Baltazar Lisboa (Matemática), Euclides da Cunha (Letras), Collechio e Eusébio de Queiroz (Pedagogia), e nas estaduais Sarah Kubitschek (Interdisciplinar e Inglês), Raja Gabaglia (História), Miécimo da Silva (Geografia) e Irineu José Ferreira (Ciências Sociais). No Raja Gabaglia, uma das professoras super20

visoras é Danielle Rocha, que se formou em História nas FIC em 2002 e está eufórica com o projeto: “É um gás para todos nós, tanto os professores que já estamos atuando em sala há muitos anos quanto os jovens que estudam para ingressar no magistério. E os alunos da escola ganham muito também, pois todos juntos estamos construindo novas linguagens e métodos para tornar o processo de ensino e aprendizagem cada vez mais interessante. Quem dera no meu tempo de faculdade existisse isso”, disse Danielle. Os graduandos de História Rodrigo Gonçalves e Fabrício Ferreira de Medeiros, que atuam no Raja com Danielle, já conquistaram o respeito da turma e, aos poucos, vão ganhando confiança e perdendo o medo de falar em público. No projeto, eles propõem o uso de quadrinhos, vídeos e jogos eletrônicos, entre outros dispositivos, para aproximar mais o estudo da História do universo dos alunos. “É importante esse laço com escolas da região, pois é onde depois eles vão atuar”, diz Vivian Zampa, que coordena o subprojeto de História com o professor Jayme Ribeiro.


Foto: Acervo Pessoal do Grupo

Levando o que temos de melhor para fora dos muros Além de seus próprios projetos, a FEUC colabora com diversas ações realizadas por outras entidades, como o Dia da Responsabilidade Social, promovido anualmente pela Associação Brasileira de Mantenedoras do Ensino Superior (Abmes). Nesta programação, já há vários anos a instituição leva um grupo de profissionais para se integrar ao Dia da Ação Social da Capela São José Retirante, organizado pela comunidade de Nova Cidade, em Inhoaíba. Estudantes de Enfermagem do CAEL comparecem para fazer aferição de pressão arterial e glicose dos moradores, e professores do colégio igualmente colaboram fazendo palestras sobre temas de saúde. Nas últimas edições, nossa Orquestra Sinfônica e Coro também marcaram presença, fazendo apresentações musicais ao ar livre para os moradores. “É sempre uma alegria estar com nossos amigos de Nova Cidade e reforçar o compromisso da instituição de levar para fora de seus muros algumas das iniciativas que desenvolve ao longo do ano”, disse a professora Célia Neves, que coordena as ações do Dia da Responsabilidade Social. Eventos como o Projeto Servir, do Rotary Club de Campo Grande, também costumam contar com o apoio de docentes e discentes das FIC. No último dia 24 de maio, a professora Janice Souza e um grupo de alunos de Pedagogia se juntaram às atividades dos voluntários, montando um cantinho para contação de histórias e recreação com jogos pedagógicos, a maior parte deles confeccio-

nada pelos próprios estudantes da graduação em suas pesquisas acadêmicas. “Este ano, com alunos da disciplina Corpo e Movimento, realizamos um trabalho educativo lúdico, por meio de jogos e brincadeiras”, diz Janice, revelando ainda que a Brinquedoteca da FEUC — espaço voltado para as pesquisas de materiais pedagógicos e para atender pais e mães que querem estudar e não têm onde deixar os filhos — está sendo reformada e em breve retomará as atividades. Ainda no campo da contação de histórias, temos o belo projeto dos alunos do 7º período de Letras Ramayana, Isadora, Raquel, Isabelle, Felipe, Gledison, Carlos e Michelle, que levam um pouco de arte e aconchego ao Abrigo Doce Morada, em Sepetiba, onde leem, cantam e recitam poesias para os idosos. “A maioria não recebe visitas, então quando chegamos é uma alegria. Numa das últimas vezes, cantamos músicas da época deles e foi uma emoção só”, revela Ramayana, lembrando que o grupo também arrecada donativos para o abrigo: “Em julho levaremos roupas de inverno. Quem quiser colaborar, haverá uma caixa no pátio para recolher as doações”.

Foto: Acervo Pessoal do Grupo

Foto: Tania Neves

Professora Janice e alunos de Pedagogia em evento do Rotary

Contação de histórias para crianças e também para idosos estão entre as atividades

Gledison lê para duas idosas do Abrigo Doce Morada

Alunos do CAEL atuam no Dia da Responsabilidade Social 21


Capa Foto: Gian Cornachini

A Orquestra e o Coro Ecos Sonoros se apresentam no pátio da FEUC na programação de abertura do ano letivo

Orquestra, Coro e Universidade Aberta à Terceira Idade – FEUC tem! Outros projetos que a FEUC desenvolve especialmente pensando em sua comunidade são a Orquestra Sinfônica, o Coro Ecos Sonoros e a Universidade Aberta à Terceira Idade Leda Noronha (UNATIL). E tem ainda o Prêmio FEUC de Literatura, concurso aberto à comunidade interna e participantes de todo o Brasil, e que anualmente chega a receber mais de 500 inscrições. Organizado pelos poetas Américo Mano e Rita Gemino, o concurso e premia com os valores de R$ 500, R$ 350 e R$ 250 respectivamente os três primeiros colocados das categorias Aluno da FEUC e Âmbito Nacional. A Orquestra completou 20 anos, enquanto o Coro chegou aos 15. Ambos com a mesma filosofia, de integrar em suas fileiras professores, alunos, ex -alunos e pessoas da comunidade. Nesse percurso, Orquestra e Coro já fizeram incontáveis apresentações na própria instituição e fora dela, inclusive tendo registrado participações importantes em concursos no Brasil e no exterior — como Bariloche e Córdoba, na Argentina, onde o Ecos Sono-

ros foi intensamente elogiado. No ano passado a Orquestra ficou entre as 10 melhores bandas civis do estado do Rio de Janeiro no concurso realizado pela Associação de Bandas de Música do RJ. A UNATIL também está em sua segunda década de existência, tendo ao longo desse tempo se firmado como uma importante contribuição para a sociabilidade e o desenvolvimento pessoal da população idosa de nosso bairro. Fundadora e ainda hoje sua diretora, a professora Leda Noronha explica que a UNATIL é uma modalidade de educação permanente, não formal, sem frequência obrigatória e voltada para pessoas de ambos os sexos, preferencialmente com mais de 60 anos. O grupo conta hoje com cerca de 100 integrantes. A participação é gratuita, e são oferecidas atividades como yoga, ginástica oriental, dança, informática e coral. Volta e meia os grupos de dança e coral mostram suas coreografias e criações musicais nos próprios eventos acadêmicos da FEUC, assim como fazem apresentações externas

Para além do ensino, cultura e solidariedade também estão aqui

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a convite. A própria Leda planeja cuidadosamente muitas das atividades, principalmente os passeios na Zona Oeste e outros pontos do Rio. “Há integrantes da UNATIL que sequer conhecem pontos turísticos do bairro e da cidade, e quando vamos a passeios por Guaratiba ou outras partes eu antes faço o levantamento da história dos locais para compartilhar com eles”, explica a professora. Ainda dentro desse espírito de portas abertas, a instituição oferece espaço a diversos grupos da sociedade civil para a realização de eventos como seminários, feiras e encontros. As artesãs da Rede de Socioeconomia Solidária da Zona Oeste, por exemplo, mensalmente montam suas barraquinhas no pátio para expor e vender criações feitas a partir de materiais reciclados. São produtos como bolsas, carteiras, colares, pulseiras, porta-joias, todos fabricados com o reaproveitamento de retalhos de panos, copos de vidro, latas de extrato de tomate, rolos de papel toalha e papel higiênico, entre outros. A Rede foi fundada em 2003 e há mais de 10 anos tem uma parceria com o Núcleo de Estudos Urba-

nos Josué de Castro (NEURB). Sonia Miranda, uma das coordenadoras, explica que a maior parte das artesãs vive exclusivamente deste trabalho, e convoca quem ainda não conhece a feirinha para fazer uma visita: “Estamos aqui sempre em dois dias por mês. Percebemos um interesse grande por parte de quem vem conhecer nosso trabalho, mas muitos não compram porque dizem estar ‘desprevenidos’ no dia. Então vamos passar a divulgar nossas datas com antecedência nos murais”, brinca a artesã. Outro grupo que também passa a ter na FEUC seu ponto de encontro é a Associação dos Estudantes Guineenses do Rio de Janeiro, que ao longo de vários sábados de maio realizou aqui seu IV Encontro Sociocultural e Político a África em Questão, com minicursos, palestras e até mesmo um almoço típico. O grupo solicitou e a instituição cedeu gratuitamente uma sala para que eles passem a realizar aqui os encontros mensais da associação, que tem por objetivo congregar os estudantes de Guiné-Bissau que se espalham por várias universidades e faculdades do Rio. ■

Foto: Gian Cornachini

Foto: Pollyana Lopes

Feira de artesãs da Rede de Socioeconomia Solidária

Almoço típico em evento de estudantes guineenses em maio Foto: Gian Cornachini

Grupo da UNATIL faz visita guiada ao Castelo Mourisco, da Fiocruz, durante passeio turístico 23


Maio Quente

Mês intenso e agitado

Uma sequência de quatro grandes eventos acadêmicos ao longo de maio, adentrando Foto: Pollyana Lopes

Maria Ione cativou público com histórias da Biblioteca Nacional

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o longo do mês de maio e os primeiros dias de junho a FEUC esteve em ritmo de debates, palestras, oficinas, apresentações de pesquisas, trabalhos de campo… A efervescência acadêmica pôde ser observada no Ciclo de História, Encontro de Ciências Sociais e Semanas de Pedagogia, Letras e Geografia, eventos que ao todo contaram com algo em torno de 70 diferentes atividades, a maior parte delas prestigiada por grandes plateias de alunos da casa e visitantes. E o melhor: com participação ativa dos graduandos, seja apresentando trabalhos, fazendo monitoria ou questionando a fundo os palestrantes que trouxeram temas entre instigantes e polêmicos. Já na abertura do Ciclo de História dava para pressentir que o mês seria

bom: com auditório cheio, a primeira palestrante cativou o público com a devoção empreendida no seu trabalho de bibliotecária da Biblioteca Nacional. A comunicação de Maria Ione Caser iniciou o ciclo falando sobre o básico do trabalho de um historiador, a relação com as fontes. O evento, que teve como tema “Historiador em Perspectiva: dos Arquivos à Sala de Aula”, seguiu abordando os diversos olhares e formas de atuação do profissional. A formação docente e as práticas escolares — tão caras à instituição que é conhecida como a Casa do Professor — tiveram destaque na mesa que abordou a pesquisa sobre o Ensino de História e, também, no lançamento do livro “Ensino de História: usos do passado, memória e mídia”, organizado pelo professor Jayme Ribeiro.

Semana de Pedagogia buscou despertar criatividade e senso crítico Foto: Pollyana Lopes

A Semana de Pedagogia foi marcada pelas emoções. “O professor e as práticas pedagógicas” foi o tema do evento, que começou com uma homenagem à coordenadora e à vice-coordenadora do curso, professoras Maria Licia Torres e Luiza Alves de Oliveira. O professor Marco Antonio Chaves de Almeida também foi homenageado pelos alunos. Nas diversas palestras e oficinas, as condutas docentes foram problematizadas, sempre no sentido de instigar os futuros professores a estarem atentos aos alunos e à adequação de suas técnicas. As palestras trouxeram pesquisas sobre a realidade das escolas, sem perder de vista a responsabilidade 24

dos professores no processo de aprendizagem dos alunos. Os exemplos dos docentes que atuam nas salas de aula em diversos segmentos da educação levaram os estudantes a reflexões e análises críticas, o que pôde ser observado a partir das numerosas perguntas feitas ao final de cada palestra. Para fechar o evento, uma apresentação dramática encenada pelo professor de teatro da FEUC, Adriano Marcelo, trouxe como personagem principal o arquétipo de um pedagogo. No desenrolar da peça, o personagem vai amadurecendo sua criatividade e senso crítico. A arte expressou o objetivo do evento como um todo.

Maria Licia contou um pouco de sua trajetória na educação


o nas Faculdades

A cobertura completa das atividades realizadas em maio nas FIC pode ser encontrada no site da revista FEUC em FOCO. Confira em www.feuc.br/revista

do por junho, testemunha o vigor das licenciaturas e o entusiasmo dos graduandos

Língua e literatura no contexto da mídia e redes sociais Letras, como sempre, realizou a semana com o maior número de atividades: 33, fora as exposições de pôsteres, carrinho literário, apresentações culturais e feirinha de livros. Enlouquecida em meio aos preparativos para a abertura, a professora Arlene Figueira, coordenadora do curso, brincava: “No ano que vem vamos ter uma única atividade e em um único local. Vou juntar todo mundo na quadra e mandar ver!”. Exageros à parte, até que a programação estava enxuta este ano, uma vez que já houve edições com mais de 70 atividades. Mais do que quantidade, porém, o que marcou foi a qualidade das palestras e das apresentações, assim como a intensa participação dos estudantes nos debates sobre o tema “Língua e Literatura: comunicação, mídia e redes sociais”. Dos clássicos da literatura ao universo das histórias em quadrinhos, os atos de linguagem no Facebook ou o uso do WhatsApp em grupos de estudo, os temas abordados

Foto: Gian Cornachini

Francisco Barbosa receitou o uso de emoção e sinceridade instigaram o interesse das plateias, levando a um clima de muita interação. Especialmente a palestra do radialista Francisco Barbosa, na segunda noite do evento, lotou o auditório. Comunicador da Rádio Tupi, ele defendeu ao microfone a tese de que comunicar é emocionar, e convocou os professores a empregarem isso em sala de aula. “Por falta de técnica melhor, sou muito verdadeiro

quando estou no ar, sou sempre eu mesmo e não um ator representando. Nada dá mais liga do que sinceridade”, disse Barbosa, emendando numa mensagem para os licenciandos: “Vocês vão mudar a vida de quem cruzar com vocês, para melhor ou para pior. Serão um exemplo a ser seguido. Ou a ser evitado. Mas sempre uma referência. Então façam o melhor”, recomendou ele aos estudantes.

Ciências Sociais e Geografia discutem impactos socioambientais no RJ Maio estava acabando, mas sua efervescência ainda foi prolongada até o XVII Encontro de Ciências Sociais e a XVI Semana de Geografia e Meio Ambiente que, pelo segundo ano consecutivo, aconteceram concomitantemente, nesta edição sob o tema “Intervenções e violações socioambientais no estado do Rio de Janeiro”. O último sábado do mês (dia 30) tirou os estudantes da cama logo cedo para ativi-

dades de campo no bairro Duarte da Silveira, em Petrópolis; no Distrito Industrial de Santa Cruz; e na Ilha da Madeira, em Itaguaí. O objetivo era detectar e analisar impactos nesses lugares decorrentes da apropriação do capital, como a implantação da Companhia Siderúrgica do Atlântico (TKCSA) e da Gerdau (no Distrito Industrial de Santa Cruz) e da construção do Porto Sudeste e da base de submarinos da Ma-

rinha (na Ilha da Madeira). Segundo o professor Paulo Barata, do curso de Geografia e responsável pela atividade na Zona Oeste e em Itaguaí, a região próxima à FEUC tem uma grande potencialidade econômica, e é necessário que os estudantes consigam observar as contradições do capital: “Esse recorte espacial de Campo Grande a Itaguaí é muito importante para a economia e indústria do Estado do Rio de Janeiro. 25


Maio Quente Foto: Gian Cornachini

Estudantes observam construção do Porto Sudeste e seus impactos na Ilha da Madeira, em Itaguaí

Precisamos quebrar esse paradigma de que a Zona Oeste é uma área apenas de carência e analisar nosso espaço de uma maneira crítica. E isso é essencial para que os estudantes deem atenção às problemáticas locais”, explica Paulo. O percurso no Distrito Industrial incluiu paradas paralelas à margem direita do canal de São Francisco, em frente à Gerdau, à TKCSA e à Usina Termelétrica de Santa Cruz - todas com o objetivo de contar a história das empresas e lembrar das violações socioambientais praticadas com liberação do Estado, como a restrição do acesso ao canal de São Francisco pela TKCSA, que antes era naturalmente aberto aos pescadores locais, agora impedidos de continuar suas atividades tradicionais. Caso parecido acontece na Ilha da Madeira, em Itaguaí, onde empresas como a MMX, do empresário Eike Batista, instalaram-se para dar início à construção do Porto Sudeste, com a finalidade de melhorar o escoamento da produção mineral brasileira, mas inviabilizando a atividade pesqueira, esbarrando em comunidades tradicionais e impondo a desapropriação de diversas moradias. Sério Hiroshi, da Associação de Pescadores e Lavradores da Ilha da Madeira (Aplim), conversou com os estudantes e revelou suas frustrações: “Tentamos de tudo quanto é jeito resistir, mas o governo fala que esses empreendimentos vão gerar mais de 10 mil empregos. O que eu faço? Ajudo os pequenos pescadores e deixo o resto de Itaguaí sem trabalhar? Eles querem nos colocar como vilões”, lamentou ele. De volta às FIC, durante os dias 1, 2 26

e 3 de junho, os alunos relataram suas experiências nas atividades de campo durante cada palestra do evento, sempre fazendo conexão com o tema abordado e as cenas que viram. Emocionada, a estudante Rosangela Godinho, do 7º período de Ciências Sociais, externou sua esperança na educação como fator de transformação da sociedade: “O capital quer nos amedrontar e dizer que a nossa luta não vai dar em nada, mas temos que nos unir. A gente vai estar em sala de aula, e é lá que vão começar os primeiros passos de uma modificação, que é possível sim”. Para coroar este último evento e também fechar com chave de ouro a longa jornada de aprendizado e produção coletiva de conhecimento — como definiu com muita propriedade a professora Célia — foi lançado o segundo número da Khóra, revista transdisciplinar dos cursos de Ciências Sociais, Geografia, História e Pedagogia, que pode ser acessada no endereço www.feuc. br/khora. Está imperdível, com muitos artigos de professores da casa e convidados, e também repleta de contribuições de nossos graduandos. ■ Foto: Gian Cornachini

Rosangela Godinho: “O capital quer nos amedrontar “


DCE

Amplo e aconchegante como coração de mãe Foto: Tania Neves

Recém-criado, Diretório Central de Estudantes das FIC empossa na diretoria os 28 integrantes da chapa eleita, com objetivo de pulverizar ações e estimular participação

Flávio, Juan, Marcella e Graciele: malas prontas para a UNE

Por Tania Neves

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lávio Santana é o presidente do recém-criado Diretório Central de Estudantes das FIC, e tem a auxiliá-lo na diretoria um grupo com nada menos que 27 pessoas — menor que o ministério Dilma Rousseff, é verdade, mas por ele poderia até ser maior: “Todos que se inscreveram na chapa estão na diretoria. Nosso objetivo é que todo mundo participe, e não aquela coisa de apenas alguns diretores decidindo. Então os cargos nas diretorias são múltiplos, com várias pessoas dividindo as atribuições”, esclarece o estudante. Conversamos com seis integrantes do grupo no dia 3 de junho, quando alguns deles estavam de malas prontas para o 54º Congresso da UNE, que aconteceria dias depois em Goiânia. Gracielle Vicente, de Pedagogia; Paulo Vítor Medeiros, de Geografia; Flávio, Juan Pablo,

de toda a galera Marcella Gouveia e Alano Vieira, todos de História, contaram um pouco sobre a criação da entidade e seus objetivos. A ideia surgiu a partir de uma visita de Thiago José, aluno da UFF e então diretor de Comunicação da UNE, que veio convidar os estudantes a eleger um representante para ir em março ao 63º Conselho Nacional de Entidades Gerais (Coneg), fórum que reúne DCEs, Federações e Executivas de Cursos de todo o Brasil. Eles se empolgaram com a participação e a pauta do movimento — luta contra a precarização do ensino e o contingenciamento das verbas da Educação — e depois decidiram organizar uma eleição para o DCE. Fizeram propaganda de sala em sala, convocaram a participação dos colegas e conseguiram atrair 247 eleitores para o pleito. A chapa única teve 246 votos, o outro foi nulo. “Somente uma cha-

pa se inscreveu, e consideramos que para uma primeira eleição era válido. Queremos primeiro nos unir, fazer o movimento, criar a cultura de DCE. As divergências, se surgirem depois, serão bem-vindas”, diz Flávio. A pauta do grupo é promover o diálogo coletivo entre os alunos e a instituição, e lutar em conjunto com outras entidades estudantis por melhorias na Educação, como explica o presidente: “Por exemplo, nossa faculdade tem Prouni e Fies, que estão ameaçados com o corte de verbas. Vamos brigar pela continuidade desses programas. Reconhecemos que houve avanços na Educação nesses últimos governos, e não podemos perder isso de uma hora para outra”. Os representantes que foram ao Congresso da UNE planejam realizar uma assembleia na FEUC para compartilhar com os colegas o que foi discutido e decidido por lá. ■ 27


Aula Passeio Foto: Acervo Pessoal do Grupo

Letras no Museu da Língua Portuguesa, em São Paulo

Professores e alunos realizam viagem de bate-e-volta à capital paulista para cumprir roteiro mesclando aspectos acadêmicos, culturais e turísticos

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á ouviu dizer que todo sacrifício pelo conhecimento vale a pena? Esta história aqui confirma: na noite de 22 de maio, cerca de 40 alunos de diversas disciplinas de Letras e os professores Victor Ramos, Lia Martins e Taciana Pereira (esta do CAEL) encararam uma longa viagem de ônibus, madrugada adentro, para amanhecer em São Paulo e fazer uma aula passeio no Museu da Língua Portuguesa, numa programação cultural que se estenderia pela Pinacoteca, a Estação da Luz e o Mercado Municipal. Um dos organizadores, o professor Victor conta que a atividade foi inicialmente pensada por ele e a professora Claudia Valentim como meio de integrar conteúdos das disciplinas Português Histórico e Tópicos em Literatura Portuguesa. Para executar a tarefa, Victor recorreu a César Falcão, guia turístico que já organizara passeios para ele em outra escola: “Como César é professor de História, capta bem a questão do ensino e do passeio de forma integrada”, elogia Victor, revelando que o guia enriqueceu a jornada com apresentações sobre arquitetura e con-

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textualização histórica da cidade. No museu, alunos de Português Histórico puderam verificar de forma interativa os conteúdos já estudados na disciplina, o que empolgou o professor: “Constatei o quanto nossa ementa está a contento em relação aos aspectos sociais e relevância”, disse. Na Pinacoteca, enquanto o funcionário apresentava as obras de arte e relacionava aos períodos literários, alunos de Literatura estabeleciam contrapontos, participando de forma ativa e crítica. Para Victor, tudo valeu: “A turma da disciplina Fonética e Fonologia estava de ouvidos atentos aos diversos falares, inclusive ao tão famoso sotaque paulista”. No fim da tarde, de volta ao busão, mais seis horas de estrada. E quem se queixa? “Apesar de a viagem ter sido cansativa, foi gratificante observar que as informações expostas no museu já haviam sido ensinadas pelos professores. Isso nos mostra que o nosso curso tem compromisso com a qualidade. Decerto, a palavra especial pode resumir o dia que tivemos”, avalia Gledison Moret, do 7º período de Letras. ■

Foto: Acervo Pessoal do Grupo

No alto, o grupo posa diante da Estação da Luz, onde fica o Museu da Língua Portuguesa; acima, exemplo do conteúdo a que tiveram acesso: idiomas que formaram a LP e as formas que a linguagem assume no cotidiano


Professor Entrevista

Território: espaço de luta e solidariedade Em 6 de abril, as FIC foram brindadas com uma belíssima conferência do pesquisador e professor da UFF Rogério Haesbaert, que valeu como aula inaugural do curso de Geografia. Um dos principais intelectuais na área de Geografia no Brasil, além de leitura obrigatória na academia, Haesbaert discutiu, na palestra “Desterritorialização em tempos de in-segurança e contenção territorial”, os conceitos de território e controle da sociedade ao longo da História. E a empolgação do público foi tanta que a FEUC em Foco convidou o professor Isaac Gayer e as professoras Gisele Miranda e Rosilaine Silva a formularem perguntas para uma entrevista exclusiva com o pesquisador. Aqui você lê uma parte da conversa, e pode acessar o texto completo na nossa página na internet, em www.feuc.br/revista.

Foto: Gian Cornachini

1) Ao longo da sua carreira de pesquisa o professor já explorou várias dimensões da discussão sobre o território. Qual a importância da reelaboração dessa categoria para a geografia? E para um professor de geografia na educação básica? Na verdade iniciei priorizando o conceito de região, que trabalhei durante os anos 1980 pela força da problemática da identidade regional (gaúcha) que eu vivenciava, e que foi objeto de minha dissertação de mestrado. A partir do final dos anos 1980, especialmente após a publicação de um pequeno artigo inti-

tulado “Territórios Alternativos”, no Jornal do Brasil, passei a enfatizar a análise geográfica numa perspectiva crítica a partir do conceito de território. Sua enorme relevância no âmbito brasileiro (e também latino-americano) tem a ver com a grande questão da relação entre espaço e poder — questão agrária, urbana, ambiental, dos povos tradicionais... todas envolvendo a luta não só por terra mas por território, que é uma concepção mais ampla, pelo menos no meu entendimento, pois defendo uma concepção ampla de poder que envolve tanto os poderes hegemônicos (que incluem, hoje, a força do poder simbólico) quanto os poderes subalternos ou de resistência. A educação 29


Professor Entrevista básica está cada vez mais comprometida com essas problemáticas, não há como o professor não tocar em temas territoriais com os alunos, pois nessa concepção política ampla de território ele está presente desde nossas relações cotidianas mais imediatas — como o próprio espaço da sala de aula ou do quarto em uma casa até as fronteiras de um Estado-nação. Mesmo se tomarmos o conceito mais simples — e operacional — de Robert Sack, do território como espaço cujo acesso é controlado, são inúmeros os exemplos vividos pelos próprios alunos em relação às diferentes formas de poder exercido através do controle do acesso e da mobilidade — tema cada vez mais evidente na nossa vida metropolitana frente à grande desigualdade entre as diferentes formas de circulação na teia da cidade. 2) O enclausuramento a partir do medo tem se tornado uma realidade espacial em toda a cidade, como a residência em condomínios fechados e a substituição do espaço público

pelos shopping centers. Como esse fenômeno influencia a experiência urbana? Embora eu não trabalhe diretamente com esses espaços, que são voltados sobretudo para as classes média e alta (vide os “rolezinhos” como uma forma dos grupos subalternos, jovens da periferia, tentarem se apropriar de espaços mais seletivos, ambíguos entre o público e o privado, como muitos shopping centers), sem dúvida nossas “sociedades de in-segurança” têm estimulado a segregação socioespacial e construído uma cidade desintegrada, parcelada, não propriamente “dividida”, porque algumas relações socioeconômicas continuam ocorrendo (via emprego doméstico, por exemplo), mas profundamente marcada pela seletividade espacial da mobilidade. Quando escutamos as falas de adolescentes como no recente documentário póstumo de Eduardo Coutinho, “Últimas Conversas”, percebemos a distância que separa nossos espaços-mundos. Mas, ao mesmo tempo, percebemos

Foto: Gian Cornachini

“A educação básica está cada vez mais comprometida com essas problemáticas, não há como o professor não tocar em temas territoriais com os alunos”

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também a proximidade — pois a “humanidade” nos reúne, nos congrega. Para os que prezam pelo sentimento não só de “tolerância” ou “respeito” pelo outro, mas de efetiva identificação com seus anseios, com sua dimensão afetiva (no mais amplo sentido da palavra), para esses ainda resta claramente a possibilidade de reunir os “cacos” dessa cidade fragmentada. Talvez se mais estudantes de condomínios fechados fizessem “estágios” nas periferias e, ao contrário, mais estudantes das periferias frequentassem espaços comuns das classes mais altas (como museus e centros de arte), talvez esse fosse um caminho. A escola, mais uma vez, poderia ter um papel fundamental. 3) A atenção deferida pelos jornais é desigual no espaço da cidade, tornando algumas áreas mais visíveis que outras. Qual é o papel da mídia na percepção da violência e a sensação de medo na cidade do Rio de Janeiro? No debate promovido na Feuc apresentei um dos resultados de nossa pesquisa que foram dois mapas representando os conflitos violentos na cidade veiculados pelos dois principais diários da cidade pertencentes a grupos empresariais e dirigidos a públicos também distintos: O Globo e O Dia. Enquanto o primeiro mostra uma “cidade violenta” ligada muito mais às zonas de classe média e alta da cidade, o segundo retrata a violência nas periferias (a zona Oeste da cidade aparece representada muito mais no segundo). Depreende-se daí que há espaços cujas questões são praticamente invisibilizadas pela grande mídia — e bem sabemos o poder que determinadas mídias têm sobre o direcionamento das políticas públicas — incluindo aqui, sobretudo, as políticas de segurança. Esse é apenas um exemplo do enorme papel exercido pelo discurso midiático hegemônico, por diferentes mecanismos (imprensa escrita, televisionada, internet...), e que repercute naquilo que denominamos uma “contenção midiático-territorial” do espaço urbano, na medida em que oculta (ou, por outro lado, ressalta) determinadas questões em determinadas áreas da cidade. Tal como a população pobre que, mesmo numérica e espacialmente majoritária, tem muito menor “peso simbólico” na construção da

imagem urbana, aqui também o que é considerado notícia — e “insegurança” — tem claramente seus espaços privilegiados na teia da cidade. 4) O professor termina seu último livro “Viver no limite” de uma maneira esperançosa. Qual seria a importância da educação geográfica escolar na produção de possíveis transformações na sociedade? Como já comentei em alguns momentos, apesar de todo o quadro negativo que se apresenta, especialmente no que se refere às formas de encarar a questão da segurança no espaço urbano e a crescente fragmentação socioeconômica de nossas cidades, não podemos de modo algum perder a nossa esperança de que mudanças para melhor podem ser concretizadas. Mas elas nunca poderão ocorrer sem efetivo engajamento e participação popular. A internet pode ser uma grande aliada para essas mobilizações. Junho de 2013, totalmente imprevisto, demonstrou o potencial que temos de nos organizar e ocupar as ruas, “redesenhar a geografia” da participação política, cada vez mais restrita ao ambiente asséptico e enclausurado dos palácios governamentais. Retrocedemos, é verdade, e as próprias mobilizações parecem cada vez mais conservadoras. O próprio Estado, cujas iniciativas de redistribuição de renda ao longo da década de 2000 chegaram a nos incutir esperança, está sofrendo profundo retrocesso. Creio que, na condição de educadores, especialmente de nível básico, mesmo desvalorizados — especialmente em termos salariais — temse a enorme responsabilidade de esclarecer, de refletir e, quem sabe, também, de propor novos caminhos aos jovens. Incutir-lhes esperança, pelo menos, mostrando não só a dureza dessa nossa realidade geográfica, mas também as iniciativas que, mesmo pontuais, representam iniciativas de efetiva transformação socioespacial, de territórios de resistência — como, de alguma forma, vários movimentos sociais em nossas favelas têm representado. Falar desses espaços-rede de luta e solidariedade, estimulando a própria criatividade de nossos alunos pode, sem dúvida, “abrir nossos espaços” para que novas trajetórias geográficas, muitos mais justas e humanas, sejam redesenhadas no futuro. ■

“Na condição de educadores, tem-se a enorme responsabilidade de esclarecer, de refletir e, quem sabe, também, de propor novos caminhos aos jovens”

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Zona Oeste

De gari a escritor, uma trajetória feliz Foto: Tania Neves

Odir e seu livro, à venda em www.livrariacultura.com.br Por Tania Neves

S

abe aquelas pessoas sobre quem a gente diria “a vida de fulano rende um romance”? O campograndense por opção Odir Ramos da Costa é uma dessas pessoas. E o melhor de tudo: talentoso escritor, ele mesmo tascou no livro “Buquê para Faceira”, lançado há alguns meses, pinceladas do muito que viu e viveu ao longo de seus

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79 anos, embora não se trate explicitamente de uma história autobiográfica. “O narrador fala na primeira pessoa, mas não se identifica. É um garoto que descobre o mundo num ambiente pesado que era a limpeza urbana na época ainda da tração animal”, revela Odir. Esse garoto, fosse o autor, teria nascido em Rio Bonito e chegado em Campo Grande aos seis meses de idade, junto com a mãe, que se separa-

ra do pai. Odir foi criado pela mãe e o padrasto, que se tornou seu melhor amigo e exemplo de vida. E pelas mãos de quem foi parar na limpeza urbana (hoje Comlurb), aos 18 anos, depois de “sobrar” na seleção para o Exército e não ter como voltar para o trabalho que fazia desde os 14 numa agência de publicidade, de onde saíra para cumprir o dever cívico. “Sem emprego, me restou ir trabalhar com meu padrasto,


Campo-grandense por opção, Odir Ramos da Costa é autor de várias peças de teatro, dirigiu o Arthur Azevedo e teve importante atuação no jornalismo e na cultura em nossa região que então varria ruas no Méier. Encarei por um ano e pouco essa função, depois passei para a parte administrativa, em Bangu, onde fiquei por mais uma década”, conta. O padrasto de Odir, Atílio, fora por muitos anos um bem-sucedido gerente de um barracão de laranjas em Campo Grande, quando esta era praticamente a única atividade econômica da região. Com esse trabalho, deu uma vida confortável à família. Mas a Segunda Guerra Mundial e a fumagina, que dizimou os laranjais, quebraram a atividade, e Atílio mudou-se com a família para a Ilha do Governador, onde se tornou padeiro. Foi assim que Odir se iniciou na vida do trabalho, aos 7 anos, ajudando o padrasto nas entregas: enquanto o homem conduzia a carroça, o menino deixava o pão e o leite nas portas, numa jornada que ia das 5h às 6h40m da manhã, e dali ele emendava na escola. “Tempos depois voltamos para Campo Grande, e eu continuei meus estudos no Almirante Saldanha. Aos 14 anos comecei a trabalhar no Centro, numa agência de publicidade dos Diários Associados, de Assis Chateaubriand. Eu vi nascer a TV no Brasil”, relembra. A primeira função de Odir era praticamente de boy: ele levava os clichês com os anúncios publicitários para os jornais e depois levava as publicações para os anunciantes verem. Transferido para o setor de anúncios fúnebres, passou ele mesmo a redigir as notas, depois que descobriram que sabia da-

tilografar. “Eu adorava a palavra féretro. E fazia com a maior dedicação os comunicados fúnebres, que seriam lidos na Rádio JB. Pensava assim: ‘graças a mim esse cara não cairá no esquecimento’. Considerava importante”. Voltando à limpeza pública, foi ainda paralelamente ao trabalho como gari que Odir começou a colaborar em jornais da região — Tribuna Rural foi um deles — e a escrever suas peças de teatro, ramo em que conquistou reconhecimento público e acumulou prêmios, entre eles o 2º lugar no concurso do Serviço Nacional de Teatro, em 1975, com “Sonhos de uma noite de velório”. Ele então já era repórter do Jornal de Campo Grande, onde trabalhou por 17 anos. No vasto currículo de Odir, além de 7 peças escritas e uma em andamento, consta ainda a direção do Teatro Arthur Azevedo, nos anos 80, e uma passagem como editor pelo Jornal de Hoje, de Nova Iguaçu, nos anos 90. Uma vida dedicada ao jornalismo e ao teatro, e sempre envolvido com as questões culturais e sociais da Zona Oeste. Casado com Ana Maria, tem quatro filhos (dois do primeiro casamento), dois netos e um bisneto. Hoje aposentado, dedicase somente à literatura e à dramaturgia. Seu mais recente livro, “Buquê para Faceira”, foi lançado pela portuguesa Chiado Editora, e pode ser comprado no site da Livraria Cultura (www.livrariacultura.com.br). “Se passar de mil exemplares vendidos, será revertido para o espanhol e o inglês, e ganhará o resto do mundo”, avisa, orgulhoso. ■ 33


Artigo Meire Lucy Cunha Araujo Graduanda do 4º período de Letras/Literaturas e bolsista PIBID/FIC

A legitimação do desamparo Vivemos uma era de discursos inflamados em favor da redução da maioridade penal. Nesta era falamos em dar um basta na “educação marxista”, convocamos panelaço, lamentamos a queda de um avião em São Paulo por três ou quatro dias, mas nos esquecemos dos incidentes do Morro da Serrinha ou do Complexo do Alemão no dia seguinte. Não me parece absurdo afirmar que esta era revela uma obscuridade devastadora. Criamos estatísticas com a oferta crescente de vagas nas escolas públicas, agredimos os professores que atendem a essa demanda, nos empenhamos em manter baixíssimos os índices de reprovação escolar, transformamos nossas escolas em fábricas com engrenagens enferrujadas e ineficientes, convivemos tranquilamente com o número alarmante de óbitos de jovens e adolescentes (em sua maioria, negros e pobres), desde que no fim do intervalo comercial voltemos a assistir nossa novela ou episódio de reality show sem maiores incômodos. Falamos sobre quase tudo: corrupção, futebol, o reajuste da conta de energia elétrica, propaganda publicitária, olimpíadas, feriados prolongados, copa do mundo, menos no desamparo institucional de uma população que está à mercê da criminalidade ao mesmo tempo em que está sendo criminalizada. Enquanto futura professora, não consigo ter

uma perspectiva que normaliza esse cenário social. Vejo com pessimismo uma postura pública que opta por punir ao invés de educar e uma estrutura social com forte vínculo midiático que culpa as vítimas desse desamparo em suas vulnerabilidades. Refletindo sobre a proposta de lei da redução da maioridade penal, uma indagação me foi feita: quantos de nós ainda precisaremos morrer esfaqueados para que se tome uma atitude rumo à redução dessa estrutura social violenta? Não tenho essa reposta. Não sei se um dia terei essa resposta, e isso me incomoda. Mas é fato que muitos de nós já vêm morrendo nas periferias há muito tempo, e não é de facada. Os agressores de hoje foram as vítimas de ontem. Reduzir a maioridade penal no Brasil hoje é legitimar a negligência estatal, é punir o algoz que também é vítima. Sou mulher negra, pobre e favelada. Conheço a realidade cruel do desamparo. Minha redenção? Educação. Educação crítica, de qualidade, e não essa de carteiras escolares em esteiras industriais. Fui impactada por professores que, assim como eu, acreditam na essência humanizante da educação. Questionei minha realidade. Questionei meu desempenho ante a minha realidade e a transformei. Aprendi o caminho e estou convicta de que ele está aberto a todos nós. Daqui a pouco tempo, a guia serei eu. ■

“Sou mulher negra, pobre e favelada. Conheço a realidade cruel do desamparo. Minha redenção? Educação”

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