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Amazônicos

Antônio Jucá

Emissões de Gases de Efeito Estufa, Aumento do Nível do Mar e Inundações - Temos verificado os desastres anunciados das emissões dos gases de efeito estufa, que, elevando a temperatura média do planeta ao nível da superfície dos continentes e oceanos, têm promovido a formação de nuvens e a maior frequência e intensidade das precipitações pluviais. As inundações passaram a ser um fato corrente no planeta, como pode ser observado em sítios da Internet sobre desastres naturais, que trazem vídeos com notícias de chuvas torrenciais, ou contínuas, quando não resultantes de tufões ou tempestades. Nesta estação, tais eventos extremos parecem se localizar mais próximos ao Equador; contudo, observam-se chuvas de granizo grosso também ao norte e até em deserto africano.

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As emissões de metano no Círculo Polar Ártico também preocupam os cientistas do clima. Esse gás é, muitas vezes, mais capaz do que o CO2 de incrementar o efeito estufa. Essas emissões resultam não apenas no derretimento do gelo que cobre a tundra siberiana, que se sobrepõe e retém a emissão de uma quantidade extraordinária de metano, mas também da plataforma costeira submarina que circunda todo o Círculo Polar Ártico e envolve, sobretudo, a Rússia, o Canadá, o Alaska e a Groelândia. Além disso, o próprio gelo guarda metano, portanto seu derretimento gera um duplo efeito de emissões desse gás em um processo incremental cíclico e global.

Os cientistas informam, ainda, que há certa liberação natural de metano nas áreas submarinas referidas, e tais quantidades liberadas têm crescido muito e são potencialmente catastróficas. Essas liberações podem ter comportamento descontínuo, explosivo e imprevisível de emissões, como já ocorre em solo siberiano, quando grandes quantidades de metano são liberadas em curtíssimo período de tempo.

Além disso, há o consequente aumento do nível do mar, que, segundo bases de dados que remontam há mais de um século, não está ocorrendo de modo linear. Por exemplo, segundo dados coletados desde 1870 no Estado da Carolina do Norte, nos EUA, a taxa de elevação do nível do mar tem crescido aos poucos, mas exponencialmente. Essas observações indicam que há uma duplicação da taxa de elevação do nível do mar em períodos menores em anos.

Dito de outro modo, a elevação (levemente acelerada) do nível dos oceanos como efeito da elevação da temperatura média dos mesmos resulta, por recursividade incremental, em maior formação de nuvens, o que explica e confirma, indiretamente, a maior frequência de chuvas torrenciais, tempestades e tufões, inclusive, por terem se tornado maiores as diferenças de pressão atmosférica entre oceanos e continentes.

O Desmatamento da Floresta Amazônica e seus Efeitos - É de notório saber, hoje, que as queimadas na floresta amazônica brasileira representam a maior parte de nossas emissões de CO2 na atmosfera. Possivelmente, já revertemos, artificialmente, o papel dessa floresta como emissor de O2 para emissor de CO2 e estamos reduzindo, drasticamente, sua capacidade de fixação do CO2 no solo, com a derrubada das árvores e a formação de rios aéreos que alimentam as chuvas no Centro-Oeste e no Sudeste do país.

Buscamos, então, informações sobre a importância relativa da Amazônia na captura de CO2 e emissão de O2 na atmosfera, e sobre sua importância para a estabilidade do clima global, mas apenas verificamos sua maior importância direta, relativa a nós mesmos, ou seja, na rarefação dos rios aéreos e na perda de biodiversidade (que é uma riqueza enorme e incalculável). Contudo, observa-se, ainda, mudanças nas correntes aéreas oceânicas, provavelmente por menor entrada de ventos ao norte do continente e a leste da Cordilheira dos Andes, o que deve resultar no incremento de correntes em direção ao Caribe. Os Conflitos Socioambientais Atuais na Exploração da Amazônia - Como já tive oportunidade de colocar noutro artigo, o processo de invasão e ocupação europeia do Brasil se deu, segundo o notável geógrafo pernambucano Manuel Correia de Andrade,

através das seguintes fases: guerra contra os indígenas, desmatamento, busca de metais e pedras preciosas, pecuária bovina e monocultura da cana de açúcar associada ao trabalho escravo — primeiro de indígenas, que não deu os resultados esperados; depois de alguns povos africanos.

O sistema colonial funcionava como uma economia circular expansiva, pois o desmatamento proporcionava insumos para a construção civil e naval, exportações e outras atividades. Além disso, o desmatamento abria espaço à pecuária bovina, que era alimento e força de tração no plantio, transporte e moagem da cana nos engenhos antigos.

Com a descoberta do ouro (diz-se por africanos) e com as entradas e bandeiras, não apenas a partir de São Paulo, mas também advindas de Salvador e do Recife, ocupou-se o restante do Nordeste e, depois, o Norte. A ocupação dessa última região ocorreu por ondas de emigrações predatórias de colonização, sobretudo a partir do Nordeste. Esse processo motor de ocupação atravessou os séculos desde 1500. Mais recentemente, desde a segunda metade do século passado, o Ceará expediu levas de migrantes para o Norte, registradas como uma ameaça ambiental em artigos do Correio Brasiliense por volta do ano de 1979. Tivemos, à época, a descoberta de Serra Pelada, outro evento que relevou a permanência das motivações originárias de ocupação que ainda perduram. Nos últimos anos, o conflito latente e esporádico entre parte da sociedade brasileira e os indígenas se agravou com a criminalidade organizada e predatória do ambiente, sob múltiplas formas, que já é política e institucionalmente aparelhada para burlar, em larga escala, os controles de estado que buscam preservar ou conservar a vida da floresta amazônica brasileira e os indígenas. A Criminalidade Global e a Ausência dos Estados Nacionais - Primeiro, é preciso colocar que não se sustentam os argumentos ou temores daqueles que veem a ação de ONGs conservacionistas e a existência de nações indígenas dentro do território brasileiro como uma ameaça à soberania nacional, ou mesmo a preservação da floresta como impedimento ao desenvolvimento. Isso porque o modelo de desenvolvimento subjacente a tais temores, hoje, como se constata, é a reedição do velho modelo colonial predador, que deverá vir a prejudicar a própria agricultura brasileira e, possivelmente, a de todo o sul do continente e o clima global já em níveis preocupantes de emissões de CO2. A tese conspiratória de tomada estrangeira da Amazônia brasileira também não tem bases relevantes. A questão é que o anarcocapitalismo atuante hoje tem exatamente gerado, por ausência do Estado brasileiro, a destruição de nossos ativos futuros, no lugar de utilizá-los por um modelo de desenvolvimento a partir da preservação da floresta, que, infelizmente, ainda não ganhou o apoio político necessário. Por isso, tal negligência deverá se voltar contra aqueles que cultivam tais temores em nome de interesses mais gerais. Além disso, é preciso colocar que a Amazônia não é apenas brasileira e que há, desde muito tempo, a exportação de madeira, ouro e outros bens para países ricos e outros que, com certificação forjada ou não, recepcionam tais bens com a vista grossa de suas autoridades.

Como se diz na Teoria do Caos, o erro ou a falta não é algo externo aos sistemas, o erro faz parte e é parte, o sistema global como um todo é subdesenvolvido e corrupto. O que varia é a dimensão que isso toma e o lugar onde se realiza; portanto, temos que fazer nossa parte, assim como nossos vizinhos e clientes, de forma coordenada. Perspectivas - O nó górdio do conflito socioambiental tem, de um lado, parte da sociedade brasileira, e amazonense em particular, que vive da predação da natureza e a vê como oportunidade de enriquecimento ou de poder; do outro lado, temos outra parte da sociedade em questão, o ambiente e os indígenas. A prevalência dos que estão do lado da natureza depende também de políticas públicas de inclusão que respondam as perguntas: Quais são as oportunidades alternativas ao crime ambiental, ao contrabando de ouro e madeira etc. como fonte de renda? Como lograr controle da situação sem medidas de contenção das demandas desses produtos no nível internacional?

Ademais, o problema não é apenas uma questão de comando e controle, ou um problema de polícia na Amazônia. Isso vai, inclusive, para além da adoção de outro modelo de desenvolvimento regional, pois também se demanda o estabelecimento de

novos padrões de relações de trocas sobre cadeias produtivas, com maior agregação de valor a montante do fluxo dessas cadeias para uma maior qualificação das sociedades amazônicas na relação com a natureza que as envolve. A redução do tabagismo não se deu também por campanhas dirigidas aos consumidores?

Referências

IPCC, 2021: Summary for Policymakers. In: Climate Change 2021: The Physical Science Basis. Contribution of Working Group I to the Sixth Assessment Report of the Intergovernmental Panel on Climate Change [Masson-Delmotte, V., P. Zhai, A. Pirani, S. L. Connors, C. Péan, S. Berger, N. Caud, Y. Chen, L. Goldfarb, M. I. Gomis, M. Huang, K. Leitzell, E. Lonnoy, J.B.R. Matthews, T. K. Maycock, T. Waterfield, O. Yelekçi, R. Yu and B. Zhou (eds.)]. Cambridge University Press. In Press. GLEICK, James. Chaos: making a new science. E-book: Open Road, Integrated Media, NY.

Antônio Jucá é pesquisador da Fundação Joaquim Nabuco de Pesquisas Sociais.

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