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Jade Shehera

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Jade Shehera

Recife/PE

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Contramão

Viajava com a família de Rubens quando ele fez o pedido. Os pais de dele já lhe chamavam de filha, por isso, quando ele abriu a caixinha de veludo e lhe mostrou o anel dourado com a pedra solitária vermelha e ela lhe disse “não”, ninguém entendeu.

Todos os namorados de Melina haviam lhe pressionado com aquele assunto. A palavra “casamento” já era o suficiente para lhe deixar em pânico desde criança, ao ver a mãe entupida de antidepressivos por causa das traições do pai e da sua incapacidade de acabar com um voto sagrado como aquele. Sua vida com Rubens era um eterno namoro, até aquele anel dourado estragar a relação. Tudo se transformara numa grande ausência, então. De gestos, palavras e reações. Rubens se apagara da sua vida e por oito meses inteiros Melina também se apagara do mundo.

Procurava por uma palma de bananas sem manchas no mercado quando ouviu a voz dele. Os dois se entreolharam por muito tempo sem dizer nada. Ela aguentou até onde pôde e lhe ofereceu a palma de banana, a única sem manchas que havia encontrado. Ele aceitou e sorriu. Afinal, a mania de escolher as frutas impecáveis era dele, e não dela. Dali, saíram para tomar um café e conversar, porque mesmo depois de todo aquele tempo, ela ainda escolhia as frutas sem manchas. Rubens não podia ignorar aquilo.

No mês seguinte, Melina estava dormindo no apartamento dele de novo, sentindo-o entre as suas pernas ou agarrado na sua cintura. Estava tudo bem.

Barulho de moto na avenida. Alguém com o som ligado no prédio. Melina acordou com Rubens beijando a sua nuca. Ele fazia aquilo pela manhã para descobrir se ela estava com vontade de fazer sexo antes que ele fosse tomar banho. Antes que ele levantasse da cama, Melina virou-se o beijou. O movimento despiu-os do cobertor e Melina traçou uma linha de beijos pela barriga dele até se posicionar entre as suas pernas. Rubens não tirou os olhos do seu rosto enquanto ela alisava delicadamente com a ponta do dedo a cabeça do membro que endurecia. Não demorou para que com os beijos dela, Rubens crescesse completamente entre os seus lábios. Melina encheu-o de saliva e moveu a mão para cima e para baixo enquanto o chupava, encarando-o com os olhos

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semicerrados. Quando ele começou a gemer, Melina escorregou uma mão para dentro da calcinha e se masturbou até senti-lo gozar. Ele colocou a mão no lugar da sua e terminou o serviço, penetrando-a com o dedo médio. Era uma boa maneira de começar o dia.

Suados e despertos, os dois correram para o chuveiro. Era uma sexta-feira. Nas últimas semanas, os dois não se viam muito nos fins de semana. Rubens postava fotos com a família e Melina entendia a distância. Apesar de tudo, não se sentia pronta para voltar a ver aquelas pessoas cujo coração ela também derrubara num chão duro. — Mel, pega um sabonete pra gente? — Ele pediu enquanto lavava o cabelo. Melina se enrolou na toalha e voltou para o quarto.

Só o veria novamente na segundafeira agora. Já sentia saudades. — No armário? — gritou. — Não, acho que esses acabaram. Pega o da minha saboneteira de viagem mesmo, está na bolsinha que eu levo na mala.

Melina procurou pela nécessaire na mala que ficava embaixo da cama. — Toma, cuidado pra não esquecer. — Alertou ao entregá-lo a saboneteira. Ele agradeceu. Melina acabou o banho antes dele e voltou para colocar tudo de volta no lugar, mas se atrapalhou e derrubou a nécessaire no caminho. Junto dela, caiu também uma caixinha de veludo. Seu coração acelerou.

Ela abriu a caixinha. O anel dourado com o rubi continuava lá. Esperou pelo pânico e pela vontade de chorar, mas encontrou apenas surpresa. Era chocante que Rubens mantivesse aquele anel. Uma joia daquelas podia ser vendida por um ótimo valor e lhe ajudaria a trocar o estofamento antigo do carro e fazer uma nova pintura, coisa que ele queria já há alguns meses. Só havia um motivo para ele guardar aquilo. Melina respirou fundo. Dessa vez, não teria forças para lhe dizer não.

Ela sorriu. Dessa vez, ela não queria dizer não. Melina guardou o anel de volta na mala, onde Rubens o escondera tão bem. Diria sim. Não conseguia acreditar no tamanho da sua sorte.

Quando Rubens saiu do chuveiro, Melina já estava vestida. Não queria que ele soubesse que ela sabia. Assistiu enquanto ele se vestia. Era o homem mais bonito do mundo. Escolhera uma camisa branca que deixava a sua pele cintilando e lavara o cabelo, o que o deixava cheio e com os cachos balançando ao redor da cabeça. Rubens sentou na cama para calçar o sapato, observando-a. Depois de muito tempo, sorriu. O silêncio não a incomodava mais, mas ela perguntou do mesmo jeito. — O que foi? — Estava pensando que você é linda. Vai ter filhos lindos.

Melina escondeu o rosto. Filhos. Era tudo real, era tudo possível. Já

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podia ver as crianças com os cabelos cacheados dele e os seus olhos azuis.

Desceram as escadas fazendo piadas sobre o elevador quebrado. No meio do caminho, Rubens voltou e pegou a mala. Iria direto do trabalho para a casa de praia encontrar os pais.

Melina estava dez minutos atrasada quando Rubens parou na frente da agência de marketing e publicidade em que ela trabalhava. Deu-lhe um beijo rápido antes de sair, pensou melhor, voltou e lhe deu outro mais longo. Ele sorriu. Ainda estava na calçada quando ele lhe chamou da janela para lhe entregar alguma coisa. — Deixasse teu brinco cair. — Ele disse, jogando a bijuteria para ela. Melina o apanhou no ar e agradeceu. Correu pela portaria do prédio pedindo para que segurassem o elevador. Ainda cabia mais uma pessoa. Ela se esgueirou pelo meio dos colegas até chegar nos fundos, colada no espelho. Desceria no último andar.

Melina rolou o brinco entre os dedos. Alguma coisa perfurou a sua pele e ela abriu a mão para vê-lo. Era um brinco prateado, pequeno e simples, em formato de estrela.

Seus colegas desceram do elevador lhe dando bom dia. Melina não respondeu. Pensava nos filhos que teria um dia, sem cabelos cacheados. Pensava no anel exibido num dedo mais fino do que o esperado que o faria escorregar naquele fim de semana. Suas duas argolas douradas estavam na orelha. Nunca tivera um brinco prateado em formato de estrela.

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