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Alberto Arecchi
Alberto Arecchi Pavia, Itália
O Anjo Da Morte
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Rosana e Estevão chegaram à aldeia abandonada, na encosta rochosa árida. Ao longo dos séculos, os terremotos arruinaram os edifícios. O último habitante havia emigrado em busca de fortuna. As pessoas evitavam a aldeia fantasma e faziam o sinal da cruz apenas para citá-la.
Subiram em rochas friáveis, entre vassouras e peras espinhosas, sob o sol velado por raras nuvens de calma. No pôr do sol flamejante, um arrepio sacudiu os ombros de Rosana. Fantasmas pareciam espreitar naquele lugar, a partir do nome misterioso, uma lembrança da época em que os piratas sarracenos se enfureciam ao longo das costas. Estudiosos argumentaram que significava "A alma dos mortos", enquanto outros interpretavam o nome: "O anjo da morte".
A noite chegou. Os dois jovens tinham mochilas, comida e lanternas com eles. Do campanário ainda em pé ressoavam sinos, ecos quase distantes. Talvez tivesse sido o movimento de um pássaro, ou a brisa da noite, produzindo os poucos pedágios lúgubres, lembranças de tempos antigos. O prédio em frente à igreja parecia intacto. A fachada era de pedra, com manchas de gesso. Uma sacada abaulada acima da entrada. As portas desdobradas das janelas, sem vidro, revelavam uma negligência secular. A porta cedeu facilmente quando Estevão tentou empurrá-la. O corredor escuro e empoeirado parecia ser a antecâmara do covil do mistério, mas a curiosidade os impelia a ousar.
No andar térreo, descobriram um quarto mobiliado, com a cama em ordem, que parecia ter acabado de ser preparada. Nem uma partícula de poeira, mas um aroma quente de cera e flores. Escolheram passar a noite no quarto, mas não se
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atreveram a entrar na cama que ficava orgulhosamente no meio da sala. Como precaução, trancaram a maçaneta da porta com uma cadeira. Logo a escuridão da noite foi iluminada pelo disco luminoso da lua cheia. Frondes agitadas pela brisa. Os ratos rangiam, chamamentos noturnos de pássaros. Ao menor sussurro, Rosana saltava. Não conseguia dormir. Ela sonhava com desembarques e ataques de piratas mouros, armados com cimitarras, contra os pescadores e camponeses pobres. Cabeças e mãos cortadas, pingando sangue... mulheres, velhos e crianças massacrados. Fugitivos seguidos, até os montes. Escondidos nos desfiladeiros, eles se defenderam com foices e anzóis, montados em longos mastros, como alabardas. No sonho, um jovem guerreiro loiro apareceu, com a cabeça descoberta, a espada reta erguida contra o céu azul. Um reflexo de dardo e a lâmina girou, para colher membros, cabeças, vidas de infiéis. Era um jovem ousado com o rosto de Estevão. Eles o pegaram. Dois tiros de cimitarra. As mãos caíram, enquanto correntes de sangue jorravam dos tocos.
O grito de Rosana perfurou o silêncio e acordou Estevão, que se levantou de um pulo, agarrou uma cadeira, a primeira coisa que veio à mão, e se jogou contra a janela entreaberta. Em vão: não havia ameaça, nem presença estrangeira. O eco do grito da menina ecoou repetidamente sobre as rochas ao redor. Então a noite ficou silenciosa, quente e pacífica, como se esperasse por um evento. A lua brilhava contra o mar iluminado, atraindo olhares prateados, delineando sombras profundas, nas quais mil fantasmas podiam aninhar-se. Aos dois jovens pareceu ver uma sombra furtiva, que corria para se esconder no abrigo da torre do sino, na escuridão mais espessa.
Eles não conseguiam mais dormir, mas continuaram contando os vôos dos morcegos, até as primeiras luzes clarearem as sombras da noite. Um amanhecer frio, ligeiramente tingido de rosa. Os raios do sol se esforçaram para encontrar o caminho para iluminar a praça. Os dois saíram na varanda e descobriram que a porta da igreja estava aberta... No entanto, lembravam-se que estava bem fechada na noite anterior. Desceram para a praça. Os edifícios que se
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acendiam, no calor do sol, davam a sensação de que o país estivesse prestes a se recuperar de um longo sono. No chão, gotas de sangue fresco e pegadas pesadas levavam à igreja.
As altas abóbadas de pedra haviam caído há muito tempo, derrubadas por um terremoto. O chão estava coberto de montes de ruínas. Escombros e arbustos secos desarrumavam o passo. Bem no meio da nave, traços de sangue e pegadas iam perder-se em um afundamento. Percebiam a boca de um túnel. Qual melhor convite para a aventura? Os dois jovens não tiveram incerteza nenhuma. Estevão ligou a tocha elétrica, desceu e entrou no buraco, seguido por Rosana. Uma fileira de degraus íngremes, desgastada pelo tempo, descia escorregadia e estreita na densa escuridão. A passagem subterrânea levou-os a um mosteiro nas proximidades, agora quase completamente desmoronado. Os dois venceram a vontade de se virar e desistir da exploração. Chegaram a uma grande sala subterrânea, parcialmente sobrecarregada com terra. No final do corredor, o cofre desmoronara. Os olhos estavam se acostumando com a escuridão. Eles conseguiram distinguir sete nichos, cobertos por estranhos símbolos: uma coruja, uma sereia bicaudada, uma figura barbada com duas faces, nem homem nem mulher, outros personagens, instrumentos misteriosos. Sete múmias em pé, nos nichos. Deviam ter sido personalidades importantes, talvez os sete reis míticos ou os sábios das origens, mencionados em antigas lendas.
Um farfalhar atrás deles. Um rato, talvez um morcego? Tinha que ser algo - ou alguém - de tamanho muito maior, porque no túnel da entrada se ouviu um barulho de pedras, acompanhado de ruídos sombrios. O túnel ficou desmoronado. Toda possibilidade de retorno estava barrada.
Foi só nessa altura que os dois notaram a existência de um oitavo nicho, ligeiramente maior do que os outros, ainda vazio, que trazia no alto as figuras esculpidas de dois jovens amantes abraçados, em baixo-relevo.