Ogi na Tribo Skate

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áudio // rap FABIO BITÃO

rap

Bem de rua! Rodrigo Ogi

desde que isso seja criativo. Tipo no skate, se o cara vem sempre com a mesma manobra e fica satisfeito com isso, ele estagna. Eu sou um cara eternamente insatisfeito. E o Contra Fluxo? Tem alguma história curiosa dessa época pra contar? O Contra serviu de escola pra o que eu faço hoje. Aprendi muita coisa com os caras. Hoje demos uma pausa no grupo. Viajamos e fizemos vários shows por aí, então são muitas as histórias. Se eu fosse listar aqui daria muitas páginas. [risos] A produção desse álbum em estúdio foi muito demorada ou complexa? Rolaram uns enroscos ou preciosismos da sua parte para obter uma sonoridade tão amarrada e cristalina como podemos ouvir? Os dois. Eu sou muito perfeccionista com as rimas. Sou encanado mesmo. O Nave soube captar perfeitamente o que eu queria. Ele tem o gosto de rap muito parecido com o meu. Além dele, o [André] Maleronka também foi me ajudando a modelar este álbum. Nós três nos falávamos praticamente todo dia. Foi um processo demorado, mas muito divertido. Sintonizamos mesmo. Fale um pouco das parcerias e participações especiais na gravação das faixas. Como rolou cada uma e o quanto cada parceiro ou convidado colaborou para o resultado final? Decidimos colocar poucas participações rimando nesse disco, mas queríamos deixar os beats mais incrementados. Eu conheci o Kiko Dinucci um tempo atrás e, como sou cara de pau, já o escalei pra futuras parti-

cipações. Nesse meio tempo o Kiko me convidou pra participar do disco do Thiago França em homenagem ao escritor João Antônio. Aí conheci o França e o chamei também. Os caras são foda, chegavam, ouviam e já iam fazendo o arranjo conforme a minha levada. O Ganjaman, o Doni Jr e o Carlos Café foram pontuais no que nós queríamos e abrilhantaram ainda mais o que já tínhamos feito. A Juçara Marçal e o Rael, cada um em uma música, agigantaram os refrões, e o Mao [ex-vocal do Garotos Podres] trouxe o clima punk rock pro refrão de outra faixa. Quais são os pensamentos, ideais, filmes, livros, que lhe influenciam diretamente nas letras? Como você se define politicamente, espiritualmente e filosoficamente? Eu gostaria que o poder não estivesse na mão de poucos, gostaria que a coisa fosse mais equilibrada, mais justa. Não acho justo um ter 10 enquanto o outro tem 0. Tem coisas que soam como afronta, tipo, um cara andando com um carro de meio milhão enquanto o outro puxa carroça. Acredito que quanto mais atos bons eu realizar, mais coisas boas eu receberei. A sua relação com a cultura do skate é uma parada próxima da sua vida, como o rolê do pixo? Já tentei andar de skate. Na época tive um shape do Fernandinho Batman, tive um shape do Thronn e um do Léo Kakinho. Nunca fui um bom skatista, então decidi abandonar o skate. Tenho vários amigos skatistas. O Gerdal é um grande parceiro e usou

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a arte do Crônicas da Cidade Cinza em um de seus shapes. Eu piro muito assistindo os vídeos, é uma coisa que me inspira bastante. Você se inspira muito no lance das histórias de personagens da cidade. O que há de tão especial que lhe atrai nessa parada de contação de histórias? Desde pivete eu já tinha facilidade pra contar historias. Nas redações que eu fazia já saiam várias. Eu ficava contando histórias de terror pros meus amigos na infância e juntava toda a molecada pra ouvir. Eles ficavam impressionados e uns tinham até pesadelos. Minha mãe me incentivou muito a ler. Acabei trazendo isso pro rap, não foi intencional. É uma coisa natural mesmo. Criar uma história é como fazer um filme. É bacana ver as pessoas ouvindo e se imaginando nas cenas. É lindo desenhar as cenas na imaginação das pessoas. Você acha que aqueles raps mais secões ou mais bate-cabeças que se fazia nos anos 1990 no Brasil foram superados como referência de som e de flow para a nova geração? A velha escola abriu caminho, pavimentou, deu a cara à tapa pra que nós pudéssemos fazer o que é feito hoje. O rap daquela época era diferente. Muita coisa antiga soa atual pra mim. A música “Política”, do Athaliba e a Firma, por exemplo, é super atual. Vários caras da velha escola se atualizaram. O Racionais é um exemplo disso. + info: http://smarturl.it/rodrigoogira

É lindo desenhar as cenas na imaginação das pessoas. FOTOS AUTUMN SONNICHSEN

RAPPER PAULISTANO VERSA SOBRE OS DRAMAS E ANGÚSTIAS DO HABITANTE DA METRÓPOLE EM NOVO ÁLBUM. PRODUZIDO PELO NAVE, ‘RÁ!’ EVIDENCIA UM GIGANTE AMADURECIMENTO NA CARREIRA DO MC. // POR EDUARDO RIBEIRO

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ara sacar de verdade a poética do rapper e cria do pixo Rodrigo Hayashi, o Ogi, é preciso estar disposto a refletir sobre a alma confusa dos habitantes da grande São Paulo. Com seu primeiro álbum, Crônicas da Cidade Cinza (2011), ele trouxe para o rap nacional um sentido de contação de histórias que não ao acaso espelha-se na perspectiva literária da vida na metrópole. Ogi é isso mesmo que ele reivindica no título: um cronista da cidade cinza. O novo trabalho do artista, RÁ!, mantém a essência narrativa, que dessa vez toma como ponto de partida um paciente numa consulta com um psicólogo. Expansivas, as letras do Ogi podem nascer de uma experiência vivida ou um enredo inventado. De uma conversa de boteco ou das páginas de um livro. E, nelas, estão sempre presentes a crítica social, as angústias e os dramas dos personagens. Encadeados ao longo de 16 faixas, esses contos amplificam-se na vibe de uma pro-

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dução musical muito rica de elementos, variações de bases e batidas. A voz cresce nas melodias e surge, nas fissuras do instrumental, alguma cadência de samba antigo e grooves românticos. Embora venha chamando mais atenção nos últimos tempos, o rolê do Ogi data lá dos anos 1990, quando ele começou a esboçar as primeiras rimas. Foi só em 2002, porém, que decidiu levar a coisa a sério. Antes de investir na carreira solo, o MC fez parte do Contra Fluxo, que surgiu em 2003 com Dejavu, Mascote, DJ Edy e DJ Willian na formação. O primeiro disco saiu em 2005, todo produzido pelo Munhoz, que acabou entrando para o grupo. Com esse novo elenco os caras gravaram SuperAção, um disco duplo, em 2007. É impressionante notar o salto evolutivo do Ogi no conceito, na musicalidade e no modo de interpretar o cotidiano desde os tempos do começo do Contra para cá. O amadurecimento, além de sua dedicação à leitura e pesquisa sonora,

é latente. O Ogi envelheceu, está mais afinado e aperfeiçoou o flow. Qual é o discurso desse novo álbum? Nesse novo álbum os temas são outros, mas a essência é a mesma. O storytelling sempre estará em minhas letras. Isso já é uma coisa característica do meu trabalho. Nesse disco eu pus pra fora tudo que vinha acumulando desde o lançamento do Crônicas da Cidade Cinza. Eu não me prendo a regras. Você se considera parte de uma nova escola do rap nacional? O que você quer agregar à cultura hip hop? Não sou da nova escola, mas também não sou da velha. O rap hoje é muito diversificado, eu contribuo, assim como outros MCs também contribuem. Rap é arte e arte pra mim tem que ser livre. Posso escrever sobre o que eu quiser e tem uma rapaziada que tá vindo com este mesmo pensamento. Expansão, saca? Não deixar a coisa engessada. Posso falar sobre a água que tem em um copo, mas

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