PB #474

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problemas brasileiros # 474

Energia do futuro

hidrogênio verde desponta como alternativa aos combustíveis fósseis, mas o alto custo de produção retarda a expansão em escala

GARANTIAS DA REFORMA TRABALHISTA

ENTREVISTA

Natascha Trennepohl

Especialista aponta oportunidades no mercado de carbono

BIOECONOMIA

Negócios sustentáveis

Biodiversidade da Amazônia tem potencial ocioso

R$27,90

PARA
ALERTA
A SITUAÇÃO CLIMÁTICA
ANO 60 FEV/MAR 2023 9 770101 426016 00474

PRESIDENTE Abram Szajman

SUPERINTENDENTE Antonio Carlos Borges

agenciatutu.com.br

REDAÇÃO

Rua Santa Cruz, 722, 5º andar

CEP 04122‑000

São Paulo/SP (11) 3170‑1571

PUBLICAÇÕES DIRETOR DE COMUNICAÇÃO INTEGRADA Demian Russo

DIRETORES CRIATIVOS Clara Voegeli e Demian Russo

DIRETORA DE CONTEÚDO Elisa Klabunde

EDITOR Lucas Mota MTB 46.597/SP

EDITOR‑ASSISTENTE Eduardo Ribeiro

REPÓRTER Filipe Lopes

REVISÃO Flávia Marques

DIRETORA DE ARTE Carolina Lusser

EDITORES DE ARTE Paula Seco, Alberto Lins, Joélson Buggilla e Yana Parente

DESIGNERS Estêvão Vieira, Igor Marques e Jônia Caon

PROJETO GRÁFICO Paula Seco

CAPA Joélson Buggilla

COLABORAM NESTA EDIÇÃO Agência BORI, Aline Carvalho, Gilmara Santos, José Goldemberg, Herbert Carvalho, Luciana Alvarez, Moura Leite Netto e Pâmela Brito

RELAÇÕES PÚBLICAS

Maria Izabel Collor de Mello

CONSULTORIA DE CONTEÚDO André Rocha

Os artigos publicados são de inteira responsabilidade de seus autores e não refletem a opinião da PB Sua publicação tem como objetivo privilegiar a pluralidade de ideias acerca de assuntos relevantes da atualidade. revistapb.com.br

#474

Viver e produzir riqueza no século 21 não é como 30 ou 40 anos atrás. A transição energética se impõe para os setores produtivos. Elemento crucial para o desenvolvimento de uma economia sustentável, o hidrogênio verde (H2V) abre oportunidades ao Brasil no desenvolvimento de uma agenda ambiental de longo prazo.

PROBLEMAS BRASILEIROS: 60 ANOS

Em 1963, quando a Revista PB foi fundada, os cenários político, econômico, social e cultural do Brasil eram, em uma palavra, complexo... E continuam sendo.

Desde então, em mais de 450 edições publicadas, analisamos este País, ao mesmo tempo, muito rico e muito pobre, culturalmente diverso e único. Somos muitos. Uma nação com problemas e soluções inventadas pelo próprio brasileiro.

Em seis décadas, nossas páginas se tornaram espaço para um debate democrático com foco em um país mais justo. Neste período, ao crescermos e nos transformarmos, percebemos que enquanto problemas seculares marcarem o Brasil, nada será mais importante do que discuti-los e enfrentá-los com o vigor dos brasileiros e das brasileiras protagonistas da nossa história de todos os dias.

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MERCADO DE CARBONO: REGULAR SEM INIBIR

entrevista

Imprescindível para o equilíbrio entre desenvolvimento e preservação ambiental, a regulação do mercado de carbono segue em suspenso no Congresso por falta de acordo sobre o texto. O crédito de carbono comprova quando uma empresa ou um país conseguiu reduzir as emissões de gases de efeito estufa. O sistema regula a compra e a venda desses créditos. Referência em compliance ambiental e mercado de carbono, Natascha Trennepohl afirma que, em paralelo, estamos passando por um boom no mercado voluntário, do qual as empresas podem participar sem obrigações legais. Em seu recente livro, Mercado de carbono e sustentabilidade: desafios regulatórios e oportunidades (Editora Saraiva), ela apresenta possibilidades regulatórias a partir do comércio de emissões europeu (EU ETS). Segundo a advogada, as complexidades de um marco que crie oportunidades, ao invés de entraves, precisam ser consideradas para garantir segurança jurídica e eficácia do sistema.

EDUARDO RIBEIRO
9 8 FEV–MAR 2023 PROBLEMAS BRASILEIROS #474 ENTREVISTA
Foto: Bernardo Coelho

Como funciona, atualmente, o comércio de emissões europeu (EU ETs)? Os demais continentes estão mais ou menos avançados?

O mercado de carbono europeu é um dos maiores e mais antigos. A fase do projeto-piloto começou em 2005, antes mesmo dos compromissos do Protocolo de Kioto. O sistema já passou por diversos momentos e reestruturações, e, por isso, considerei um passo importante estudá-lo para entender, por exemplo, quais foram os principais desafios, os erros e os acertos durante a sua implementação e operacionalização. Claro que é indispensável considerar as diferenças entre os países e que não é possível transpor 100% de um sistema para outra realidade, sendo necessário fazer ajustes e avaliar se aquela realmente é a melhor alternativa. Ao longo dos anos, muitos países partiram do modelo europeu e fizeram adaptações para desenvolver os próprios mercados regulados. Atualmente, em termos de emissões, a China dispõe do maior mercado, porém em termos de valor negociado, o europeu continua sendo o maior.

Em que medida os elementos do sistema europeu podem servir como referência para o mercado de carbono no Brasil?

O primeiro passo é ter um inventário de emissões bem elaborado e confiável. A partir daí, podem ser definidos o escopo, a cobertura e o limite de emissões. Outro ponto importante na estruturação e que reflete na aceitação inicial do sistema é a definição das regras de alocação das permissões, ou seja, se estas serão distribuídas de forma gratuita ou leiloadas. Outros elementos de design estão ligados aos desenvolvimentos de um sistema robusto de monitoramento, reporte e verificação e de regras de compliance e penalidades claras para os casos de descumprimento, bem como de

regras de flexibilidade, como o porcentual e os tipos de créditos que poderão ser usados para a compensação de emissões.

Entidades como a Federação do Comércio de Bens, Serviços e Turismo do Estado de São Paulo (FecomercioSP) defendem a regulação do Mercado Brasileiro de Redução de Emissões (MBRE) dos gases que provocam o efeito estufa. Você tem expectativas positivas sobre as propostas em andamento?

Desde a Lei 12.187, em 2009, pouco foi feito de forma concreta para operacionalizar o MBRE ou instituir os elementos necessários para o estabelecimento de um mercado regulado. No passado, muito se discutiu a natureza jurídica do crédito de carbono, destacando-se que este não teria as características de valores mobiliários e as operações não estariam submetidas à regulamentação da Comissão de Valores Mobiliários (CVM). Posteriormente, o Código Florestal (Lei 12.651 de 2012) trouxe a classificação do crédito de carbono nas operações florestais como um direito sobre um bem intangível e incorpóreo transacionável. Mais recentemente, o Decreto 11.075, de 2022, conceituou o crédito de carbono como um ativo financeiro. Percebe-se que ainda não há uma harmonização quanto ao tratamento deste ativo, e a definição da natureza jurídica do crédito repercute, por exemplo, na forma como será tributado e negociado. Um marco jurídico claro e bem definido é essencial para trazer segurança jurídica e clareza aos investimentos, principalmente quando estamos falando de projetos que são desenvolvidos por 10, 20 ou 30 anos. O substitutivo do atual PL 412/2022, dentre outros aspectos, tenta estruturar um sistema geral de gestão em que algumas atividades teriam metas de redução, estipuladas no Plano Nacional de Alocação de Direitos de Emissão de Gases de Efeito Estufa (GEE) – e outras estariam de fora, como a agropecuária, a exploração florestal e o uso alternativo do solo, as quais poderiam ter o papel de geradoras de créditos para a compensação de emissões. Assim, teríamos demanda e oferta internas. No entanto, a previsão de tributação em 15% das operações e o fato de que o PL prevê um prazo de até dois anos para que haja a regulamentação da forma como o relato de emissões das instalações deve acontecer são alguns dos pontos preocupantes.

INSTALAÇÕES DEVE ACONTECER [NO BRASIL] SÃO PONTOS PREOCUPANTES.

Mesmo sem uma regulação definida, já é possível para as empresas, de qualquer porte, obterem benefícios concretos no âmbito dos negócios?

Certamente. Ainda que o mercado regulado não esteja implementado no Brasil, o mercado voluntário está se desenvolvendo e crescendo cada vez mais. O primeiro passo para cada empresa é identificar as emissões de cada escopo – por exemplo, do desenvolvimento da atividade em si, do uso de energia e da cadeia de fornecimento. A partir daí, existem diferentes oportunidades de participação, mediante a redução das emissões diretas da atividade, do financiamento de projetos de compensação e compra de créditos, da adaptação da matriz energética das lojas físicas com mais eficiência energética e utilização de iluminação LED, da instalação de equipamentos de energia solar etc.

Existem iniciativas no varejo digital que possibilitem ao consumidor fazer a compensação da pegada de carbono de determinado produto no momento da compra? A inclusão do consumidor no processo compensatório é um desafio?

Sim, várias iniciativas do varejo digital já permitem que os consumidores compensem a pegada de carbono de um determinado produto ou serviço. Algoritmos calculam as emissões de carbono relacionadas à produção e ao transporte de um determinado produto. Além disso, os preços de compensação podem variar de acordo com a natureza do produto, a distância e o tipo de frete escolhido. A empresa tanto pode arcar com a compensação e comunicar isso ao consumidor, como disponibilizar a ele a opção de contribuir para a compensação. Esta segunda situação traz o desafio de engajar os clientes a partir da consciência ambiental e do seu papel no mercado.

No mercado voluntário, como funciona o controle de qualidade do trabalho feito pelas agências reguladoras?

As próprias certificadoras estabelecem as regras e as metodologias que serão aceitas nos processos de certificação. Os selos e os cobenefícios sociais dos projetos também podem variar. Algumas certificadoras se destacam por contarem com processos e critérios mais rigorosos – e, com isso, mais credibilidade no mer-

cado internacional, influenciando, inclusive, o valor do crédito que vai ser gerado e negociado.

Além de focar o potencial de redução interna, é importante também para as empresas investirem, ao mesmo tempo, na compra de créditos, seja individualmente, seja por meio do apoio e da participação no desenvolvimento de um projeto de redução de carbono?

As duas formas são complementares e vão depender da estratégia. Para muitas empresas, o custo da adoção de medidas internas para reduzir as emissões de GEE acaba sendo muito alto, e faz mais sentido compensar emissões pela compra de créditos de carbono.

Não existe uma fórmula mágica, ou uma estratégia que possa ser usada por todas as empresas ou os países, para lidar com os desafios ocasionados pelas mudanças climáticas. É essencial a combinação de ações, políticas e instrumentos para mover empresários, governos e sociedade em direção a uma economia de baixo carbono e sustentável.

Independentemente de regulação, as novas exigências relacionadas à pegada de carbono já funcionam como barreiras para produtos exportados?

A pegada de carbono será cada vez mais importante para os mercados nacionais e internacionais. A União Europeia discute um método, chamado Carbon Border Adjustment Mechanism, que, como o próprio nome indica, deve servir como um ajuste de fronteira que considere a pegada de carbono um produto. Assim, os importadores na União Europeia terão de declarar as emissões dos bens importados e comprar certificados para cobrir essas emissões. Os exportadores, por sua vez, vão precisar fornecer as informações sobre a pegada de carbono dos seus produtos. Inicialmente, o impacto se dará nas importações de aço, ferro, alumínio, eletricidade, fertilizantes e cimento, mas é possível que outros setores e produtos sejam incluídos nos próximos anos, com a revisão do procedimento.

A utilização das fontes de energia que produzem baixos níveis de emissão de GEE é o tema do e-book Economia de baixo carbono para empresas de comércio e serviços, elaborado pela FecomercioSP. acesse o conteúdo na área exclusiva para associados por meio deste código qr:

MERCADO DE CARBONO

E SUSTENTABILIDADE:

DESAFIOS REGULATÓRIOS

E OPORTUNIDADES

(Saraiva, 230 págs.), de Natascha Trennepohl

ENTREVISTA
A PREVISÃO DE TRIBUTAÇÃO EM 15% DAS OPERAÇÕES E O PRAZO DE ATÉ DOIS ANOS PARA A REGULAMENTAÇÃO DE COMO O RELATO DE EMISSÕES DAS
11 10 FEV–MAR 2023 PROBLEMAS BRASILEIROS #474

Ação pela Amazônia

Formada por cerca de 500 lideranças, a rede colaborativa Uma Concertação pela Amazônia elaborou 14 propostas de ações concretas a serem lançadas por meio de decretos presidenciais, medidas provisórias e resoluções nos cem primeiros dias do governo Lula. O esforço parte do sentido de urgência (fundamental à rede) para o desenvolvimento sustentável amazônico. Em entrevista ao site da PB Vinícius Elias, um dos coordenadores do projeto, explica detalhes do documento originado com base nas discussões da COP26

Perspectivas econômicas

“É certo que, neste ano, haverá menor crescimento e inflação para a maioria dos países do mundo, assim como para o Brasil”, afirma Paulo Gala, economista-chefe do Banco Master e professor da Fundação Getulio Vargas (FGV), à página da PB, sobre os indicadores de 2023 Outros economistas ouvidos, como André Sacconato, consultor da FecomercioSP, mencionam aspectos positivos mesmo diante de um baixo incremento, como a atração do interesse de investidores estrangeiros, marcado pela sucessão presidencial, além das oportunidades de negócios que aderirem ao selo ESG.

Simulador tributário

Uma calculadora, disponível para empresários e contadores no portal do Programa Relaciona, da FecomercioSP, permite comparar o regime tributário mais benéfico às empresas – Simples Nacional, lucro presumido ou lucro real. Os interessados devem utilizar a ferramenta de acordo com o setor em que atuam: comércio, indústria, serviços e atividades cuja folha de pagamento seja igual ou superior a 28% da receita. É só preencher os campos e fazer o planejamento tributário.

Veiculada pela primeira vez em 1963 com o objetivo de discutir as reformas propostas pelo então presidente João Goulart, além das graves questões sociais e econômicas herdadas desde o tempo colonial, a Problemas Brasileiros completa 60 anos em 2023 Focada no desenvolvimento do País, a revista, editada pela FecomercioSP, conquistou espaço entre os leitores sob o propósito de abordar soluções de forma ampla e democrática, por vozes de toda a sociedade. Debates e uma publicação especial estão na agenda de comemorações.

SITE PB
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Ilustração: Maria Fernanda Gama

Reforma Trabalhista: relações mais seguras

Desde a aprovação da Reforma Trabalhista, empregadores e empregados contam com mais segurança jurídica e flexibilidade nas regras de contratação. Segundo Eduardo Pastore, assessor jurídico, e Fábio Pina, assessor econômico, ambos da FecomercioSP, as mudanças tornaram as relações mais estáveis para ambos os lados. Exemplos abrangem as horas extras, a terceirização e o modelo de home office, incorporado à rotina dos trabalhadores. A seguir, Pastore e Pina refletem sobre os avanços e garantias proporcionados pela legislação.

Com a Reforma Trabalhista, o que mudou nas horas extras?

eduardo pastore – Nas relações de trabalho, elas são, muitas vezes, desvirtuadas. Porque quando a hora extraordinária se torna frequente, deixa de ser extraordinária. Então, isso traz muita insegurança jurídica às relações laborais. A reforma não ataca especificamente este ponto pela via direta, mas ajuda pela via indireta, por meio de normas mais claras, principalmente em relação ao trabalho intermitente. O pior é quando as horas extras se tornam habituais na Justiça do Trabalho (JT). Aí a JT diz para incorporá-las no salário. E não pode tirá-las, tem que indenizar. Enfim, existem várias consequências jurídicas. Sinto que a reforma conseguiu acertar o alvo ao estabelecer o mecanismo, por exemplo, que permite pagar somente por aquela hora trabalhada.

Outra questão que aparece bastante nas ações trabalhistas é o intervalo intrajornada.

O que a reforma diz sobre este ponto?

pastore – A reforma reforça aquilo que já está na Constituição e na própria CLT – e traz o encaixe também, dizendo o se-

guinte: “Você, que é empregador, se quiser contratar nestas modalidades novas, inclusive, que a própria Reforma Trabalhista trouxe, tem que observar os intervalos de descanso entre outros pontos”. Isto é, não revogou nenhuma lei específica.

Terceirização é um tema importante porque é uma solução para muitas empresas. Como este tipo de contratação pode tornar a economia mais competitiva? fábio pina – De várias maneiras. Na realidade, devemos lembrar que o Brasil tem cerca de 110 milhões de pessoas trabalhando, das quais menos de 50% são CLT. Então, isso já dá uma dica de que a CLT não estava sendo suficiente. Uma relação de trabalho muito importante para a economia é a terceirização, que tem origem lá atrás, no começo do que chamamos de economia, quando Adam Smith (e Davi Ricardo também) falava em especialização: poder contratar empresas especializadas em certas atividades de fim (e de meio), para que a minha desempenhe o melhor papel possível. Com isso, aumenta-se substancialmente a capacidade de fornecer um serviço de qualidade e produtividade, a um custo adequado para a nossa economia. Isso é o melhor da terceirização, com

TRABALHISTA
edição de texto EDUARDO RIBEIRO | entrevista GUILHERME BAROLI
41 40 FEV–MAR 2023 PROBLEMAS BRASILEIROS #474

um detalhe: eventualmente, se já desempenho uma atividade regular, e minha empresa começa a se orientar para uma outra vertente em que eu ainda não tenha expertise, terei que contar com uma série de consultores trabalhando como terceirizados, empresas que vão intermediar os serviços, porque é um novo ambiente. Isso facilita a decisão de avançar em novas fronteiras.

pastore – Antes da reforma, a empresa terceirizava a atividade-fim, aí o juiz falava: “Você terceirizou a atividade-fim, e aqui tem uma súmula do Tribunal do Trabalho dizendo que não pode”. Daí, na audiência trabalhista, tentava-se identificar o que representava a atividade-fim de uma empresa, e o juiz precisava ser especializado para poder determinar isso. Não é a essência da formação do juiz do Trabalho. Ele tinha de entrar em questões econômicas para poder identificar o que que a empresa fazia, causando uma tremenda insegurança jurídica, que foi resolvida pela Reforma Trabalhista. A partir disso, terceirizar atividade-fim não é mais uma discussão do que se terceiriza, mas como vai se terceirizar. A reforma define que se terceirize respeitando todos os direitos laborais,

inclusive podendo até usufruir de alguns benefícios da própria convenção coletiva dos trabalhadores da empresa contratante.

Como a reforma solucionou a questão dos acordos extrajudiciais?

pastore – Na prática, a nova lei diz que se o trabalhador quiser fazer um acerto com o empregador, em vez de entrar com uma ação trabalhista, é possível combinar. Cada parte contrata um advogado, eles se conversam, acerta-se o valor e o submete à Justiça do Trabalho. A Justiça vai olhar tudo e, estando tudo certo, vai homologar. Este foi um grande avanço, porque um acordo extrajudicial é muito mais barato do que uma ação trabalhista, e é muito melhor para o empregado, pois, não fosse o acordo, ele teria qual opção? Uma ação demora, em média, cinco anos para ser resolvida.

pina – Isso demonstra uma maturidade na relação entre capital e trabalho, porque passa pela Justiça, mas de forma terminativa, já com os dois lados em acordo, e o juiz terá condições de preservar os direitos de todos. Retira não só risco do empresário, mas também a temeridade do trabalhador.

Como entender o equilíbrio entre o negociado e o legislado? Qual é a força das Convenções Coletivas de Trabalho (CCTs)?

pastore – A Reforma Trabalhista trouxe regras claras sobre o que pode prevalecer, portanto, garante muita segurança jurídica e tranquilidade, tanto para empregado como para empregador. Isso permite uma flexibilidade responsável, sem violar qualquer direito do empregado e sem, principalmente, fazer com que ele se sinta lesado numa possibilidade de negociação equivocada. Quem não quiser negociar, avisará o sindicato que não quer e pronto, prevalecerá o que está na CLT; e para quem quiser, o artigo 611 apresenta os direitos que podem ser negociados, e o 611b, os que não podem ser negociados. Segurança jurídica total e absoluta.

pina – Algumas coisas, como saúde e segurança, são inegociáveis. A lei não retirou os direitos inegociáveis, estes continuam valendo. O que está para ser negociado é o desejo do próprio empregado – uma redução de jornada, por exemplo, para poder sair mais cedo. O conceito de negociação é ser bom para ambas as partes.

O home office, que já era praticado por algumas empresas, agora, virou uma realidade.

O que podemos falar sobre isso?

pastore – O teletrabalho foi regulamentado em 2017, na reforma. Pouco depois, veio a pandemia, então, foi graças à regulamentação que conseguimos passar por este momento, que foi extremamente difícil.

pina – Foi um excelente teste da Reforma Trabalhista, porque o arcabouço legal estava lá para fazermos o que era preciso. Do contrário, teríamos de consultar muitas outras instâncias e instituições para encontrar alguma solução, e talvez demorasse muito mais. O trabalho remoto também faz parte disso, pois permite uma flexibilização maior na vida das pessoas.

Não há razão de se estar obrigatoriamente em um escritório, uma vez que é possível fazer exatamente o mesmo trabalho a partir de qualquer lugar. A entrega é que tem de ser avaliada. Esta possibilidade não existia há alguns anos, mas, hoje, graças à tecnologia, existe um arcabouço legal para que as empresas possam, com tranquilidade, permitir isso.

Pastore, gostaria que você falasse um pouco sobre como evitar problemas trabalhistas. A solução está na gestão?

pastore – Sim, este é o meu mantra há alguns anos, pois 80% dos problemas jurídicos trabalhistas são oriundos da gestão,

mais especificamente de pessoas. O DNA destes problemas está muito relacionado à forma como o empresariado atua. Se você é empresário e quer ter segurança jurídica trabalhista, deve prestar atenção nisso. A dica é olhar para a gestão, para aquilo que você está fazendo ou deixando de fazer com os trabalhadores. Olhar para aquilo que deveria falar para o seu trabalhador e não fala, como um estímulo, um reconhecimento, um acolhimento; e para o que não deve falar, e acaba falando, como uma diretriz equivocada. Neste caso, o empregado vai introjetando, mantendo-se quieto e, com o tempo, ficando chateado; ao sair da empresa, falará tudo na frente do juiz do Trabalho. Então, veja como esse mantra funciona. Quem quiser evitar problemas trabalhistas não deve pensar somente em contratar, mas olhar para a gestão.

Assista à entrevista na íntegra por meio deste código QR

Preservar os avanços da reforma é fundamental. E continuar a modernização, essencial. Acesse para saber mais.

“Poder contratar empresas especializadas, para que a minha desempenhe o melhor papel possível, aumenta substancialmente a capacidade de fornecer um serviço de qualidade a um custo adequado.”
“Um acordo extrajudicial é muito mais barato do que uma ação trabalhista, e é muito melhor para o empregado, pois, caso contrário, ele teria qual opção?
Uma ação demora, em média, cinco anos.”
FÁBIO PINA assessor econômico da FecomercioSP
EDUARDO PASTORE, assessor jurídico da FecomercioSP
TRABALHISTA 43 42 FEV–MAR 2023 PROBLEMAS BRASILEIROS #474

FAZEDORES DE FLORESTA

O Instituto Socioambiental (ISA) e a Associação Rede de Sementes do Xingu (ARSX) comemoraram, em setembro do ano passado, 15 anos de um projeto que tem agregado uma diversidade de pessoas, conhecimentos e sementes nativas para recuperar áreas degradadas nas bacias dos rios Xingu e Araguaia, no Mato Grosso (MT). Até aqui, já foram plantadas mais de 20 milhões de árvores e repassados R$ 5 3 milhões diretamente aos coletores de sementes. Esforço entre ambientalistas, comunidades locais e produtores rurais, a proposta já regenerou mais de 6 mil hectares da Floresta Amazônica. A ideia surgiu com o objetivo de movimentar uma economia capaz de fortalecer culturas e impulsionar o equilíbrio socioambiental e o bem-estar dos moradores. “Os povos do Xingu fizeram o primeiro chamado, ao observar a mudança no território indígena diante do avanço do agronegócio. Eles pediram ajuda para restaurar, e a rede nasceu a partir disso”, relembra Bruna Ferreira, diretora-executiva da ARSX. As relações são horizontais: coletores e facilitadores de diferentes grupos e etnias trocam experiências que garantam, segundo a diretora, o protagonismo de cada um e fortaleçam os laços de saberes em benefício das terras que ocupam.

Para saber mais, participar ou apoiar, acesse: sementesdoxingu.org.br

BRASILEIROS
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Fotos: divulgação
texto EDUARDO RIBEIRO
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