Tribo #243: Projetonave

Page 1

áudio // mixtape

mixtape

O

Projetonave é um dos rebentos musicais mais instigantes vindos do underground paulista. Suas músicas nascem da ideia de fluxo livre, tomando forma a partir de vibes ocasionais, improvisadas, coladas, texturizadas e poetizadas em sessões interativas. A exploração dos timbres e beats também se faz presente, para garantir a cadência que fisga os ouvintes. É uma tempestade de ritmos que inclui rock, jazz, rap, dub, funk, punk, MPB e eletrônica. Akilez (voz, escaleta e MPC), Marco Pablo (guiarra), Alex Dias (baixo), DJ B8 (toca-discos e samples), Flavio Lazzarin (bateria) e Willian Aleixo (teclas) conheceram-se andando de skate e jogando fliperama. Eram caras que se encontravam no fliper de Santa Terezinha, em Santo André, faziam uma session e tiravam um som. O Projetonave é, portanto, fruto desse movimento de rua dos anos 1990 no ABC. O som da banda amadureceu, mas preserva em seu substrato aquele espírito de skate, pixo, punk, rap e o grito do garoto suburbano da cidade industrial, filho de metalúrgicos. Daí a sua graça. Enquanto respira e se concentra na produção de um álbum de inéditas em comemoração às duas décadas na ativa, o grupo promove a mixtape Projetonave Remix, que chega em dois volumes, em k7 e em digital, que podem ser baixados gratuitamente no site da banda (projetonave.com). São 48 faixas, repaginadas por 45 convidados. Entre eles Emicida, Seixlack, Cybass, SPVic, Grassmass, Elo da Corrente, Síntese, Sants e Cesrv. Troquei uma ideia com o vocalista Akilez sobre a fita mixada, o que vem pela frente e o que se tira de lição em 20 anos de vivência no meio alternativo. Sente a brisa: Vinte anos de Projetonave. Qual a vibe, referências ou proposta que norteavam as construções musicais nas antigas e no que isso se difere da sonoridade de agora? O conceito sempre foi o mesmo desde o início, em 1997. Montamos a banda já com a proposta de misturar linguagens, sem uma ideia fechada na questão de sonoridade. Até por isso trabalhamos muito em cima dos singles nos últimos tempos, pois eles permitem experimentar composições e estéticas diferentes. O que eu sinto que evoluiu foi a nossa aproximação com o que idealizávamos lá atrás, e as condições de poder gravar em estúdios melhores com mais experiência. Agora em 2017, ao completar 20 anos, vamos focar no nosso disco solo e estamos muito na febre de pôr em prática todas essas parcerias vividas. Dessa vez, dentro do nosso trabalho, que é mais abrangente do que o que fazemos com os MC’s. O Asunzion, de 2012, foi a introdução do que seria o nosso som se não tivéssemos essa pausa de seis anos para viver as experiências e parcerias no rap, que sempre foi um elemento presente na banda.

Projetonave: Tempestade de Ritmos

ABRINDO OS TRABALHOS COMEMORATIVOS AOS SEUS 20 ANOS, A BANDA EXPERIMENTAL LANÇA, EM UMA MIXTAPE DE DOIS VOLUMES, 48 VERSÕES DE SUAS MÚSICAS DESCONSTRUÍDAS POR 45 CONVIDADOS. POR EDUARDO RIBEIRO // FOTO ÊNIO CÉSAR

80 |

junho/2016

Explit acculpa conet estis andit intur? Optatis nones volestet accabor moluptur aspicatia cusdaec aborum

// áudio

Vocês vão lançar essa parada só em digital e k7? Não vai rolar CD e vinil? O k7 entra no quesito da nossa geração. Quando penso em mixtape, demo tape, a fitinha já vem na cabeça automaticamente. Quantas fitinhas de amor já não foram feitas! [risos]. Não consigo pensar numa mixtape no CD [risos]. É natural. E é um dos itens comemorativos de 20 anos que iniciaremos agora até o lançamento oficial do nosso disco, no ano que vem. É um trabalho que não pode ser veiculado comercialmente também. Acho mais democrático deixar digitalmente acessível pra todos, e a k7, pra quem tem apreço por esse item. Rolou uma parada muito inusitada, acima das expectativas, pela qual vocês não esperavam, e que os surpreendeu positivamente? Tiveram várias. É muito legal ver algo feito pela banda ganhando nova vida ou se tornado completamente outra coisa. Eu gosto mais das desconstruções completas. Teve casos da música se diluir completamente, sendo impossível reconhecê-las. Vou deixar para os ouvintes escolherem as preferidas. Todas as faixas estarão nomeadas com o título da original, aí dá pra tirar as próprias conclusões. A galera em geral levou a releitura para o lado do rap? Ou os beats assumiram outros andamentos, mais próximos de outros gêneros, também? Chamei pessoas de referências e plataformas diferentes. Gente do rap, do techno, beatmakers, DJs, MCs, produtores, enfim. Sem muita preocupação com o resultado final. A divisão em duas tapes se deu depois das mixagens. Ficou nítido que tínhamos dois tipos de flow rolando, um mais boom bap, com rimas, e outro mais trip, com faixas mais experimentais… Devido à quantidade de faixas, rolou de dividir, assim as pessoas podem escolher o clima da viagem.

Vocês aprovaram e acompanharam a produção de cada uma dessas 48 faixas remixadas? Ou largaram tudo na mão dos convidados? Não. Foi totalmente livre para que o convidado imprimisse sua visão em cima do nosso soundbank. Houve um critério na escolha justamente para não ficarmos dando pitaco no trampo dos caras. Na real em quase todos os nossos trabalhos funcionou dessa forma. Esse é um tipo de disco que possibilita muito mais essa experiência, pois a característica é totalmente assinada por quem produz. Acho que faz mais sentido a liberdade.

A ideia agora é ficar uma cara promovendo essas tapes, ou vocês estão produzindo, planejando outras coisas para este ano? Temos muitos lançamentos prontos na gaveta, além do remix. Temos um EP de instrumentais (out takes), um disco de dub com o Victor Rice e alguns singles do Nasbase. Vamos soltando esse material enquanto nos enfurnamos na caverna para criar o nosso disco para 2017. A nave voa rápido, bate algumas vezes, mas não para!

Foi muito embaçado coordenar 45 convidados nessa jornada, desde o convite até o recebimento e finalização de cada trampo? Qual foi o crivo de vocês para a seleção? Eu fiquei surpreso com a facilidade com que tudo aconteceu. É um trabalho colaborativo, sem financiamento ou patrocínio, punk mesmo. Ele ficou até grande para o que imaginava, pois 99% dos envolvidos entregou a faixa no prazo. Tivemos que estabelecer uma data limite e é lógico que ficou muita gente de fora, das quais gostamos ou admiramos, mas, diante da dimensão do projeto, estamos mais que satisfeitos. É um trabalho comemorativo, feito por amigos e guerreiros que nos auxiliam. Quero deixar aqui registrada a nossa grande admiração pelo Cesinha (Cesrv), que sempre compra nossas viagens. O mano ficou trancado por mais de oito horas por dia no Red Bull Station mixando as faixas com sorriso no rosto. Mais de 25 faixas em três dias, coisa de guerreiro mesmo, que compra nossa relação com a música. Isso não tem preço. Sem toda essa rapaziada, não seria possível fazer um trampo desse tamanho. É um trabalho de todos nós.

Quais foram as melhores coisas que a vida te trouxe por meio do Projetonave? Grande parte da minha experiência de vida. São 20 anos dividindo sonhos com meus companheiros, dividindo tristezas, frustrações , tudo! A banda forçou todos a crescerem. Nos conhecemos adolescentes, crescemos, viramos pais, criamos famílias. É muito profundo para conseguir expressar aqui. Arriscaria dizer que a banda trouxe 90% do que sou hoje, e até hoje questões profundas vêm à tona partindo da nossa relação e o que temos que melhorar como pessoas. Creio que esse é um sentimento comum entre nós, temos os mesmos valores olhando para pontos diferentes. Respeito é um dos maiores bens que essa banda me trouxe.

junho/2016 janeiro/2016

| 81


Turn static files into dynamic content formats.

Create a flipbook
Issuu converts static files into: digital portfolios, online yearbooks, online catalogs, digital photo albums and more. Sign up and create your flipbook.