8 minute read

BACKSTAGE

Next Article
AUTARCAS

AUTARCAS

Trabalhadores invisíveis

A VIDA ATRÁS DAS COMPOSIÇÕES

Advertisement

Desde a voz que dá vida às estações da rede à limpeza dos veículos, passando pela fiscalização e manutenção, são centenas as pessoas que contribuem, diariamente, para o bom funcionamento do metro do Porto. Fomos conhecer seis destes trabalhadores. Muitos já com 20 anos de casa.

Ondina Silva

INFORMAÇÃO AO CLIENTE 49 ANOS MATOSINHOS

A vermelhidão tomou-lhe conta do corpo quando ouviu a sua voz, pela primeira vez, a ecoar nas colunas da estação de metro da Senhora da Hora, em Matosinhos, a informar os passageiros de que um veículo ia “dar entrada no cais”. Mas só os amigos lhe reconhecem a voz. Ondina Silva, 49 anos, está há 20 na Metro do Porto - é a voz que os passageiros ouvem nas estações, quando estão à espera do metro. Nos veículos, a voz é de outra senhora. No início, confessa que ouvir-se “era estranho”. Sentia-se “muito envergonhada”. Hoje já não é assim. Tanto que será também a voz de Ondina a anunciar os destinos dos veículos nas novas estações de metro da linha Rosa, no Porto, e do prolongamento da linha Amarela até Vila d’Este, em Gaia. O primeiro convite surgiu, precisamente, em 2002. O primeiro dia de gravações, confessa Ondina, foi “o máximo”. “Fui eu e uma colega. Fomos dizendo uma frases para tentar perceber qual das nossas vozes seria a mais adequada. Estivemos até às tantas. Dizíamos as coisas com muito ênfase, porque achávamos que era assim que devia ser. Mas não é”, recorda. Ondina e mais quatro colegas estão todos os dias no Posto de Comando e Circulação (PCC) do metro, em Guifões, Matosinhos, na área de informação ao cliente. É essa equipa que controla tanto as mensagens de áudio (caso haja algum imprevisto, como, por exemplo, uma avaria de um veículo na linha), como as mensagens que passam nos ecrãs das estações. ADRIANA CASTRO

Rosa Teixeira

RESPONSÁVEL DE LIMPEZA 48 ANOS SÉ

Até a máquina de limpeza do chão já lhe quiseram roubar. Facilmente resolveu a situação: “Não dei as chaves e foram embora”. “Aqui há de tudo”, confessa Rosa Teixeira, 48 anos, responsável pela limpeza das estações subterrâneas do metro do Porto. Já está conformada com a falta de civismo que lhe dificulta o trabalho todos os dias, sendo que é a remoção de grafitis que mais trabalho exige. “Pintam o chão, as paredes, os validadores e as máquinas todos os dias. É o pão nosso de cada dia. Fazerem asneiras é o normal”, revela, encolhendo os ombros. Mas o cenário piora se falarmos dos elevadores. “Cospem para os botões, tiram os visores e queimam os tetos”, lamenta. Entre as histórias mais insólitas que lhe surgem na memória, uma destaca-se: “Atiraram seis sacos do lixo para a linha do metro, entre a Trindade e a Lapa. Eu e uma colega tivemos de ir vestir um colete e avisar que íamos à linha recolher o lixo”. Está há cerca de 20 anos na limpeza do metro e é hoje responsável por todas as estações subterrâneas. Aliás, Rosa foi das primeiras pessoas a conhecer a estação de S. Bento e os anos de casa trazem-lhe um particular privilégio. Dá cinco passos em direção ao cais da Trindade e já há um passageiro que a cumprimenta. “Então, está tudo bem consigo?”, pergunta Rosa, somando um aperto de mão. Já faz parte da rotina. “Toda a gente me conhece”, sorri. Até porque, confessa, o seu posto “é em todo o lado”. A.C.

Innovation for a new generation of Vehicles

Trabalhadores invisíveis

Francisco Reis

MAQUINISTA 50 ANOS GAIA

“O primeiro veículo que conduzi oficialmente foi, precisamente, no dia da inauguração”. Francisco Reis foi um dos maquinistas que, no dia 7 de dezembro de 2002, transportou Durão Barroso, Valentim Loureiro e Oliveira Marques (à data, presidente do Conselho de Administração da Metro), na viagem de inauguração do sistema, entre as estações da Senhora da Hora e de Matosinhos. O frio que na altura sentiu na barriga perdura até hoje. “Enquanto essa chama arder dentro de nós, vamos ser sempre felizes onde estamos”, sorri. Francisco é de Gaia, mas quando lhe perguntamos se anda de metro, atira um “sim” incerto. “Ando quando é necessário. A verdade é uma: quando estamos fora do horário de trabalho, a tendência é para nos afastarmos um bocadinho”, justifica. Entre os desafios de desempenhar a função de maquinista, a maior dificuldade é “a gestão de horários”. “Hoje levantei-me às 3 da manhã. Isso e o combate à monotonia são o mais difícil”, confessa Francisco, apelando ao civismo dos passageiros. “Em 20 anos, tive um atropelamento de um jovem que atravessava com os auscultadores. Acionei a campainha, buzinei várias vezes, mas nem sequer olhou”, lamenta. Travou a tempo, garante. “Só que, no mundo ferroviário, quando travamos o veículo, ele não pára de imediato. Mesmo que eu trave imediatamente, o veículo anda uns metros”, explica o condutor. A.C.

Alípio Ferreira

SUPERVISOR DE MANUTENÇÃO 38 ANOS LOUSADA

O metro não esperou que Alípio Ferreira terminasse o curso profissional para dar início à operação, mas parece. “Acabei o curso de manutenção industrial no dia 28 de setembro e a 10 de outubro estava a assinar o contrato de trabalho. Tinha 18 anos. Nunca mais saí daqui”, recorda, admitindo que o gosto pelo setor está presente desde os 15 anos. O relato de Alípio sobre o primeiro dia de trabalho é semelhante ao de alguém que acabou de ser atingido com água fria saída de um balde: “Tens aqui a mala de ferramentas. Desenrasca-te”. Recorda o momento entre gargalhadas. Hoje, aos 38 anos, ocupa o cargo de supervisor da manutenção dos veículos do metro, tanto os Eurotram como os Tramtrain, no Parque de Manutenção e Oficinas do metro do Porto, em Guifões, Matosinhos. O “stress” toma-lhe conta dos dias: “Esta função faz a ligação entre a oficina, o posto de comando e a operação. Há sempre aquele stress diário de querer pôr todas as unidades lá fora a circular”, descreve. À semelhança do que acontece com os carros, também nos veículos do metro há um período estimado para ser feita a “manutenção preventiva”, ou a “revisão”. É realizada a cada 7.500 quilómetros para os Eurotram e a cada dez mil nos Tramtrain. “É uma revisão mais ligeira”, admite. “E depois há revisões que exigem outros trabalhos em que o veículo pode ficar aqui parado um mês, como é o caso de um que está cá com 1,2 milhões de quilómetros”, indica Alípio, que além de trabalhador, é passageiro diário do metro. A.C.

451

TRABALHADORES

estão distribuídos por todas as áreas e setores da Metro do Porto

Hugo Baptista

SEGURANÇA 45 ANOS ERMESINDE

“Aliciante” é a palavra de eleição de Hugo Baptista, 45 anos, para descrever o seu trabalho. É responsável pela equipa de segurança que faz a vigilância na rede do metro do Porto. “Adora” o que faz. Podia ter um horário fixo e os fins de semana sempre livres, mas “prefere trabalhar em conjunto com os colegas”. No entanto, agora que tem uma bebé em casa, “custa um bocadinho mais”. Tem liberdade para estar em qualquer estação da rede e já assistiu a episódios que lhe ficaram cravados na memória. Um deles, conta, está relacionado com “os miúdos que andam pendurados no metro. Presenciei situações que terminaram como não se deseja”, lamenta o responsável. É nesses casos que tem de deslocar-se para dar apoio aos colegas. Está, por isso, sempre em contacto com o Posto de Comando de Circulação (PCC), para saber “onde se justifica ter os meios”, apesar de estarem sempre designados dois vigilantes para cobrir determinados troços da rede. No caso da Trindade e da Casa da Música, a equipa que lá está é fixa, por estar habilitada a utilizar o desfribilhador em caso de emergência. Mas “histórias engraçadas há muitas”. Poucos minutos antes da nossa conversa, foi abordado por um senhor que lhe garantia ter viajado de metro até Vigo, Espanha. Hugo não contém a gargalhada. “Expliquei que não havia metro até Vigo, mas ele insista”, acrescenta. Pensamos que era turista. “Era de Famalicão”, ri. A.C.

Pedro Jerónimo

FISCAL 43 ANOS MATOSINHOS

Recusando o papel de “lobo mau”, descreve-se como alguém que contribui para o bom funcionamento do metro. Gosta do que faz. Pedro Jerónimo, 43 anos, é um dos fiscalizadores dos passageiros do metro do Porto. Em todas as situações, o segredo é “a boa educação”, garante. Desde agosto que a empresa de segurança 2045 é a responsável pela fiscalização, mas Pedro já tinha desempenhado esse papel antes. Por isso, considera-se já alguém “conhecido na rede do metro”. Histórias para contar não faltam. “A maior parte dos infratores achava que havia muita impunidade e reagiam à multa quase como se estivessem a fazer uma coleção de cromos”, conta. Pedro concorreu para fiscal em 2019. Justifica a atração pelo cargo com o facto de “achar que tem perfil para lidar com pessoas”. “A regra principal é a boa educação”, reforça. O ponto de encontro da equipa é sempre na estação de metro de Salgueiros. É nessa altura que cada um sabe a linha a fiscalizar e com quem. Tudo para evitar fugas de informação. Já durante a fiscalização e perante títulos inválidos, há sempre passageiros que resistem a mostrar o cartão de cidadão. Nesse caso, é chamada a PSP a intervir. A atitude muda: “Não vale a pena. Pegue lá e passe a multa”. Há, no entanto, episódios em que o infrator foge mesmo. “Não há nada a fazer”. Aos comentários mais desagradáveis, menos próprios ou até mesmo insultuosos, não liga e não reage. “As pessoas têm de perceber que estão erradas. Tentamos explicar-lhes da melhor maneira”, admite. A.C.

This article is from: