Cultura 19 de Fevereiro de 2012
Rectificar antes de ratificar e reflectir antes de agir Wa-Zani Com o fim da moratória solicitada por Angola para ratificação do Acordo Ortográfico (AO), o nosso país apresentou, no dia 6 de Fevereiro, no Conselho Extraordinário de Ministros da CPLP, realizado na nova sede da organização, em Lisboa, um parecer técnico e os resultados da auscultação interna e externa, tendo em vista a sua aplicabilidade. De acordo com o parecer, o Acordo Ortográfico de 1990, atendendo às simplificações e correcções, apresenta aspectos positivos em relação ao de 1945, hoje em vigor no nosso país, nos PALOP e em Timor Leste. Contudo, a inexistência de um Vocabulário Ortográfico Comum feito a partir de outros Vocabulários Ortográficos da Língua Portuguesa de cada Estado membro da CPLP – que, apenas, o Brasil e Portugal os têm, por serem países mais antigos e com Academias já institucionalizadas – o elevado número de excepções à regra e de palavras com dupla grafia, a perspectiva utópica da existência de uma única grafia da Língua Portuguesa, causam, evidentemente, constrangimentos. Há situações aporéticas, já que, cientificamente, existem aspectos não explicados e outros não verificáveis. A auscultação em Portugal Da auscultação realizada, em Portugal, entre prós e contras, constata-se que os “prós” primam pela promoção e difusão da Língua Portuguesa junto das Organizações Internacionais, reconhecem a existência de erros, mas consideram-nos de minimizar ou de os solucionar à posteriori. O próprio Professor Doutor Malaca Casteleiro, promotor do Acordo Ortográfico de 1990, reconhece haver erros, mas afirma que se podem resolver com a criação do Vocabulário Ortográfico Comum. Os “contras” acham prioritária a correcção do Acordo Ortográfico para não prejudicar as escolas e que não é relevante para a entrada da Língua Portuguesa nas Organizações Internacionais. O Secretário de Estado da Cultura de Portugal, Francisco José Viegas, em entrevista ao jornal “Correio da Manhã”, considera o Acordo Ortográfico irreversível. Porém, afirma o seguinte: “(…) o facto de ser irreversível não quer dizer que não seja corrigível”. O Ministério da Educação de Portugal encontrava-se, à época, ainda sem programa de qualificação de professores e com dificuldades financeiras para alterar os manuais escolares. Confrontação académica no Brasil No “Jornal de Brasil” do passado dia 14 de Outubro, tomámos conhecimento que “a Academia Brasileira de Letras e demais autoridades públicas estão sendo processadas em ação popular movida pelo professor Ernani Pimentel, líder do movimento Acordar Melhor. A ação acusa a Academia de lesão ao patrimônio cultural brasileiro com a implantação do Novo Acordo Ortográfico. De acordo com o professor Ernani Pimentel, a
execução do acordo a partir do próximo ano contraria e extrapola pontos acordados entre os países que falam a Língua Portuguesa, sem aprovação do Congresso Nacional. Além disso, segundo ele, a Academia não conta com a participação ativa de outras importantes entidades para definir as regras do Acordo, como exige a Legislação. Entidades como ANPAC (Associação Nacional dos Concursos Públicos), ABI (Associação Brasileira de Imprensa) e a OAB (Organização dos Advogados do Brasil) são contra o posicionamento da ABL. O processo movido prevê a prorrogação da implementação do acordo, de forma que ele seja reconduzido à legalidade e adequado aos parâmetros pedagógicos atuais para beneficiar todos os países de Língua Portuguesa”. Reacção ao parecer de Angola Cabo Verde, foi o primeiro Estado membro a ratificar o Acordo Ortográfico, mas não tinha ainda desenvolvido nenhuma acção de reflexão sobre o mesmo. O parecer de Angola foi considerado oportuno e útil para Cabo Verde e este país quer apoiar o nosso país na melhoria do Acordo Ortográfico de 1990, em acção concertada com os PALOP. Para justificar as correcções e, posteriormente, a necessidade de se elaborar uma adenda ao próprio acordo, há técnicos cabo-verdianos que propõem que o período actual seja considerado de experimentação. A Guiné-Bissau ratificou o Acordo Ortográfico, mas não depositou os seus instrumentos. Apoiou o parecer de Angola e solicitou uma parceria para a elaboração do seu próprio Vocabulário Ortográfico Comum. Moçambique que, tal como Angola, não ratificou ainda o Acordo Ortográfico, fez uma única reflexão sobre o assunto, em Novembro de 2008 e recolhe subsídios, por regiões, para submeter a questão da ratificação ao Conselho de Ministros. Considera o parecer de Angola importante para Moçambique e apoia o nosso país na melhoria do Acordo Ortográfico, em acção concertada com os PALOP. Por último, S. Tomé e Príncipe, que, antes de Portugal, foi o terceiro Estado membro a ratificar o Acordo Ortográfico, não tinha, também, desenvolvido nenhuma acção de reflexão sobre o mesmo e a própria reforma educativa, que haviam acabado de realizar, tinha sido feita com base nos princípios do Acordo Ortográfico de 1945. Considera o parecer de Angola útil, uma vez que encontraram pontos de convergência. Tal como os outros países comprometem-se a apoiar Angola na melhoria do Acordo Ortográfico, em acção concertada com os PALOP. Perigos da ratificação apressada Do ponto de vista linguístico é necessário caucionar situações aporéticas, constrangimentos e a universalização de forma consciente das dificuldades, para além da ausência de um Vocabulário Ortográfico Comum e da falta de cooperação efectiva entre a Língua Portuguesa e a linguística bantu, crioulística e malaio-polinésia, como reza a Declaração Constitutiva da CPLP. Do ponto de vista educativo, coloca-se a dificuldade em formar professores e estudantes em aspectos relacionados com o Acordo Ortográfica de 1990, não suficientemente consistentes do ponto de vista científico, com a agravante de, alguns países se encontrarem em situação de reforma educativa, o que impede a aplicação de alterações à ortografia dos manuais, para não adulterar a avaliação geral de todo o processo. Do ponto de vista económico, a mudança de manuais escolares, com pouco tempo de duração, implica um esforço financeiro acrescido ao processo de “Educação para Todos”
e um novo investimento em meios didácticos, com prejuízo para outras componentes, nomeadamente, a formação inicial e contínua de professores. O Acordo Ortográfico de 1990, depois de assinado por todos os Estados membros da CPLP, impõe obrigações a todos. Todavia, tem de ser rectificado antes de ratificado, para que os constrangimentos e as aporias hoje identificadas, não venham, a curto ou médio prazo, a ser valorizadas e validadas, forçando, posteriormente, os países, com défice de parques editoriais, a novas importações de manuais escolares, sem se levar em conta o tempo útil de cada uma deles. Fonte: http://jornaldeangola.sapo.ao/17/39/rectificar_antes_de_ratificar_e_reflectir_antes_de_agir
Publicado na Biblioteca do Desacordo Ortográfico a 19 de Fevereiro de 2012 Subscreva a Iniciativa Legislativa de Cidadãos contra o Acordo Ortográfico