CANAVILHAS E A LEI

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O cumprimento da Lei visto por Gabriela Canavilhas João Roque Dias, CT

Em declarações ao i, a ex-ministra da Cultura, Gabriela Canavilhas, defende que as novas regras se aplicam JÁ ao Centro Cultural de Belém: «Absolutamente. É uma instituição pública. O ordenamento jurídico estabeleceu o dia 1 de Janeiro como a data de aplicação interna. Tudo o resto que não suceda nesse sentido é uma atitude que está acima da lei.»

Falemos então de instituições públicas e do cumprimento de ordenamento jurídicos e de leis, Gabriela Canavilhas!

Sabe você, Gabriela Canavilhas, que o Estado português publicou no D.R., a 17 de Setembro de 2010, o aviso de ratificação do AO por parte de Portugal 1 ANO E 4 MESES DEPOIS de o ter feito (13 de Maio de 2009)? E que o governo disse ainda, nesse mesmo aviso, que o AO tinha entrado em vigor a 13 de Maio de 2009, i.e., 1 ANO E 4 MESES ANTES? Não lhe cheirou a esturro, Gabriela Canavilhas? Foi no seu governo...

E sabe você, Gabriela Canavilhas, que a Constituição obriga à publicação em D.R. dos avisos de ratificação de tratados internacionais, sob pena de "ineficácia jurídica"? Foi no seu governo. Porque não se insurgiu, Gabriela Canavilhas, contra esta tortuosa, senão ilegal, aplicação da lei?

E sabe também você, Gabriela Canavilhas, que o "período de transição" do AO (6 anos) é agora referido pelo secretário de Estado da Cultura como uma espécie de período "experimental" para depois se ver se se fazem alterações ao AO? E você, Gabriela Canavilhas, não se insurge? Afinal, o AO é um tratado internacional que um governante diz agora que pode ser alterado...

E porque não se insurge, Gabriela Canavilhas, quando os órgãos do Estado apregoam que o período de transição para aplicação do AO em Portugal decorre até 2014, quando 6 anos após 2009 (mesmo admitindo esta data como correcta...) nos leva, pelo menos, até 2015 e não até 2014... Que raio de aplicação da lei é esta, Gabriela Canavilhas, contra a qual não se insurge?

E sabe Gabriela Canavilhas que o autor português do AO, Malaca Casteleiro, defende que as “incongruências”, “falhas”, “lapsos” e “lacunas” do AO (as palavras são dele) podem ser sanadas pelos “vocabulários ortográficos”? Como pode o texto de um tratado internacional ser alterado pela publicação de um livro (caso do Brasil) ou por uma lista de palavras na Internet (caso de Portugal)? Você, Gabriela Canavilhas, devia saber que a Convenção de Viena do Direito dos Tratados impede que o texto dos tratados seja alterado por meios espúrios. E não se insurgiu, Gabriela Canavilhas?


E como pode Malaca Casteleiro referir “vocabulários ortográficos”, se o art.º 2.º do AO (um tratado internacional) estipula UM “vocabulário ortográfico comum”. Você, Gabriela Canavilhas, não se insurgiu contra a defesa desta miserável violação de um tratado internacional?

E quando o Estado português ratificou o 1.º protocolo modificativo do AO, eliminando misteriosamente a obrigatoriedade de haver um vocabulário ortográfico comum UM ano ANTES do AO entrar em vigor e que, até HOJE, nunca foi feito, também se insurgiu, Gabriela Canavilhas, com o artigo 2.º do AO (uma tratado internacional) na mão, como faz hoje com a lei que, agora, tanto gosta de referir?

E quando o Brasil publicou unilateralmente o VOLP (deve saber o que é, Gabriela Canavilhas...), em violação do AO, a Gabriela Canavilhas também se insurgiu? Ou o Brasil está acima da lei num tratado que assinou com Portugal?

Lembra-se, Gabriela Canavilhas, quando disse a 7 de Junho de 2010, perante as publicações abusivas e ilegais do VOLP brasileiro, do VOLP da Porto Editora e da disponibilidade da Academia das Ciências para fazer também um VOP/VOLP (quando o art.º 2.º do AO exigia a publicação de UM vocabulário ortográfico comum), que «os vários vocabulários ortográficos não são antagónicos, são complementares e que, se calhar, não vai ser preciso um vocabulário ortográfico oficial porque o uso quotidiano fará a selecção das formas ortográficas»? Então, você, Gabriela Canavilhas, um membro do governo de um país signatário de um tratado internacional não se insurgiu contra as mais claras e diversas violações – fora e dentro de portas – do tratado que Portugal assinou. E ainda disse que não seria preciso nenhum vocabulário oficial? Você, Gabriela Canavilhas, julgava-se acima da lei?

E quando o ILTEC (português) publicou o VLP (também deve saber o que é, Gabriela Canavilhas...) com alterações e excepções ao definido no AO (um tratado internacional) e em violação do disposto na Convenção de Viena de Direito dos Tratados (uma Lei internacional), também se insurgiu, Gabriela Canavilhas?

E porque acha Gabriela Canavilhas que, por uma lei estar em vigor, não se pode lutar pela sua revogação? Ou dito de outro modo, porque acha que ninguém, no Estado, se pode bater pela sua revogação? Se a sua resposta for afirmativa, Gabriela Canavilhas, mande prender rapidamente todos os governantes e todos os deputados (não se esqueça de si, Gabriela Canavilhas!), já que, uns e outros, se batem todos os dias pela revogação de leis existentes. Não sabia disto, Gabriela Canavilhas?

E, já agora, Gabriela Canavilhas, já leu a Resolução da Assembleia da República n.º 35/2008? Não sabe o que é, Gabriela Canavilhas? Eu dou-lhe uma ajuda, Gabriela Canavilhas: é o acordo ortográfico! E depois de o ler, com as “incongruências”, “falhas”, “lapsos” e “lacunas” apontadas por um dos seus autores, não se insurgiu, Gabriela Canavilhas?

Publicado na Biblioteca do (Des)Acordo Ortográfico a 4 de Fevereiro de 2012 Subscreva a Iniciativa Legislativa de Cidadãos contra o Acordo Ortográfico


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