Código Penal DECRETO-LEI No 2.848, DE 7 DE DEZEMBRO DE 1940. O PRESIDENTE DA REPÚBLICA, usando da atribuição que lhe confere o art. 180 da Constituição, decreta a seguinte Lei:
Parte Geral
Título I – Da Aplicação da Lei Penal
Anterioridade da lei Art. 1 Não há crime sem lei anterior que o defina. Não há pena sem prévia cominação legal. o
(Redação dada pela Lei no 7.209, de 11/7/1984.)
Introdução O princípio da legalidade veio insculpido no inciso XXXIX do art. 5o da Constituição Federal, que diz: Não há crime sem lei anterior que o defina, nem pena sem prévia cominação legal –, redação que pouco difere daquela contida no art. 1o do Código Penal. É o princípio da legalidade, sem dúvida alguma, um dos mais importantes do Direito Penal. Conforme se extrai do art. 1o do Código Penal, bem como do inciso XXXIX do art. 5o da Constituição Federal, não se fala na existência de crime se não houver uma lei definindo-o como tal. A lei é a única fonte do Direito Penal quando se quer proibir ou impor condutas sob a ameaça de sanção. Tudo o que não for expressamente proibido é lícito em Direito Penal. Por essa razão,
von Liszt diz que o “Código Penal é a Carta Magna do delinquente”.1
Origem Alguns autores atribuem a origem desse princípio à Magna Carta Inglesa, de 1215, editada ao tempo do Rei João Sem Terra, cujo art. 39 vinha assim redigido: Art. 39. Nenhum homem livre será detido, nem preso, nem despojado de sua propriedade, de suas liberdades ou livres usos, nem posto fora da lei, nem exilado, nem perturbado de maneira alguma; e não poderemos, nem faremos pôr a mão sobre ele, a não ser em virtude de um juízo legal de seus pares e segundo as leis do País. No entanto, foi com a Revolução Francesa que o princípio atingiu os moldes exigidos pelo Direito Penal, conforme se pode verificar pela redação dos arts. 7o, 8o e 9o2 da Declaração dos Direitos do Homem e do Cidadão, de 1789, o que levou Eduardo García de Enterría a afirmar que “o princípio da legalidade dos delitos e das penas, intuído pela ilustração e concretado no
Dissertando sobre a expressão cunhada por von Liszt, ou seja, de que o Código Penal era a “Magna Carta do delinquente”, Claus Roxin aduz que “isso significa o seguinte: que assim como em seu momento a Magna Charta Libertatum britânica (1215) protegia o indivíduo das intromissões arbitrárias do poder estatal, o Código Penal põe a coberto o cidadão (tanto o honrado quanto o desonrado) de todo o castigo por uma conduta que não tenha sido claramente declarada punível antes do fato” (Derecho penal – Parte general, t. 1, p. 138). 2 Art. 7o Ninguém pode ser acusado, preso ou detido senão nos casos determinados pela lei e de acordo com as formas por esta prescritas. Os que solicitam, expedem, executam ou mandam executar ordens arbitrárias devem ser punidos; mas qualquer cidadão convocado ou detido em virtude da lei deve obedecer imediatamente, caso contrário torna-se culpado de resistência. Art. 8o A lei apenas deve estabelecer penas estrita e evidentemente necessárias e ninguém pode ser punido senão por força de uma lei estabelecida e promulgada antes do delito e legalmente aplicada. Art. 9o Todo acusado é considerado inocente até ser declarado culpado e, se se julgar indispensável prendê-lo, todo o rigor desnecessário à guarda da sua pessoa deverá ser severamente reprimido pela lei. 1
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Art. 1o grande livro de Beccaria, teve sua entrada solene na história através destes artigos da Declaração”.3
Funções O princípio da legalidade possui quatro funções fundamentais: 1a) proibir a retroatividade da lei penal (nullum crimen nulla poena sine lege praevia); a 2 ) proibir a criação de crimes e penas pelos costumes (nullum crimen nulla poena sine lege scripta); 3a) proibir o emprego de analogia para criar crimes, fundamentar ou agravar penas (nullum crimen nulla poena sine lege stricta); a 4 ) proibir incriminações vagas e indeterminadas (nullum crimen nulla poena sine lege certa). Legalidade formal e legalidade material A legalidade formal encontra-se ligada, diretamente, à obediência às formas exigidas para a criação do diploma legal, a exemplo do que ocorre com o procedimento necessário para a sua tramitação, quorum para aprovação do projeto, etc. Contudo, em um Estado Constitucional de Direito, no qual se pretenda adotar um modelo penal garantista, além da legalidade formal deve haver, também, aquela de cunho material. Devem ser obedecidas não somente as formas e procedimentos impostos pela Constituição, mas também, e principalmente, o seu conteúdo, respeitando-se suas proibições e imposições para a garantia de nossos direitos fundamentais por ela previstos. Aqui, adota-se não a mera legalidade, mas, sim, como preleciona Ferrajoli, um princípio de estrita legalidade.4 Vigência e validade da lei O conceito de vigência da lei penal está para a legalidade formal assim como o conceito de validade está para a legalidade material. A lei penal formalmente editada pelo Estado pode, decorrido o período de vacatio legis, ser considerada em vigor. Contudo, sua vigência não é suficiente, ainda, para que possa vir a ser efetivamente aplicada. Assim, somente depois da aferição de sua validade, isto
Código Penal Comentado Rogério Greco
é, somente depois de conferir sua conformidade com o texto constitucional é que ela terá plena aplicabilidade, sendo considerada, portanto, válida.
Termo inicial de aplicação da lei penal Se a lei penal vier, de alguma forma, prejudicar o agente (com a criação, por exemplo, de novas figuras típicas, causas de aumento de pena, circunstâncias agravantes etc.), seu termo inicial de aplicação será, obrigatoriamente, o do início de sua vigência. No entanto, se a lei penal vier beneficiar o agente, ou seja, em caso de lex mitior, existe a possibilidade de ser aplicada ao caso concreto antes mesmo da sua entrada em vigor, visto que, segundo as determinações contidas no inciso XL do art. 5o da Constituição Federal e no parágrafo único do art. 2o do Código Penal, a lei posterior que de qualquer modo favorecer o agente deverá retroagir, ainda que o fato já tenha sido decidido por sentença condenatória transitada em julgado. O raciocínio que se faz, in casu, é no sentido de que se a lei, obrigatoriamente, terá de retroagir a fim de beneficiar o agente, por que não aplicá-la antes mesmo do início da sua vigência, mediante a sua só publicação? Por economia de tempo, portanto, não se exige que se aguarde a sua vigência, podendo ser aplicada a partir da sua publicação. Diferença entre princípio da legalidade e princípio da reserva legal Alguns autores, a exemplo de Flávio Augusto Monteiro de Barros,5 procuram levar a efeito uma distinção entre o princípio da legalidade e o da reserva legal. Segundo parte da doutrina, a diferença residiria no fato de que, falando-se tão somente em princípio da legalidade, estaríamos permitindo a adoção de quaisquer dos diplomas descritos no art. 59 da Constituição Federal (leis complementares, leis ordinárias, leis delegadas, medidas provisórias, decretos legislativos, resoluções); ao contrário, quando fazemos menção ao princípio da reserva legal, estamos limitando a criação legislativa, em matéria penal, tão somente às leis ordinárias – que é a regra geral – e às leis complementares.
GARCÍA de ENTERRÍA, Eduardo. La lengua de los derechos – La formación del derecho público europeo tras la revolución francesa, p. 158. 4 FERRAJOLI, Luigi. Derechos y garantías – La ley del más débil, p. 66. 5 BARROS, Flávio Augusto Monteiro de. Direito penal, p. 29-30. 3
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Título I Da Aplicação da Lei Penal
Acreditamos que o melhor seria restringir ainda mais a possibilidade de edição de diplomas penais, ficando limitada tal possibilidade às leis complementares, tal como ocorre na Espanha, que adota as chamadas Leis Orgânicas, que lhes são equivalentes. Assim, com a exigência de um quorum qualificado para a sua aprovação (maioria absoluta, de acordo com o art. 69 da Constituição Federal), tentaríamos, de alguma forma, conter a “fúria do legislador”, evitando a tão repugnada inflação legislativa. De qualquer forma, apesar das posições em contrário, mesmo adotando-se a expressão princípio da legalidade em sede de Direito Penal, outro raciocínio não se pode ter a não ser permitir a criação legislativa, nessa matéria, somente por intermédio de leis ordinárias e leis complementares, como visto, razão pela qual não vemos interesse em tal distinção.
Princípio da reserva legal e princípio da tipicidade Em Direito Penal tem exponencial relevo o princípio da reserva legal, do qual emana o princípio da tipicidade, que preconiza ser imperativo que a conduta reprovável se encaixe no modelo descrito na lei penal vigente na data da ação ou da omissão (STJ, REsp. 300092/DF, Rel. Min. Vicente Leal, 6a T., DJ 22/4/2003, p. 277). Princípios afins Além do princípio da legalidade, existem outros princípios considerados fundamentais para o Direito Penal. Muitos deles encontram previsão expressa na Constituição Federal, a exemplo do princípio da individualização da pena (art. 5o, inciso XLVI); outros, tal como ocorre com o princípio da culpabilidade, são extraídos do próprio sistema constitucional. Apontaremos, a seguir, alguns desses princípios fundamentais: Princípio da intervenção mínima O princípio da intervenção mínima, ou ultima ratio, é o responsável não somente pela indicação dos bens de maior relevo que merecem a especial atenção do Direito Penal,6 mas se presta, também, a
Art. 1o fazer com que ocorra a chamada descriminalização. Se é com base nesse princípio que os bens são selecionados para permanecer sob a tutela do Direito Penal, porque considerados como os de maior importância, também será com fundamento nele que o legislador, atento às mutações da sociedade, que com a sua evolução deixa de dar importância a bens que, no passado, eram da maior relevância, fará retirar do nosso ordenamento jurídico-penal certos tipos incriminadores. Embora atualmente, em razão do alto índice de criminalidade e da consequente intranquilidade social, o Direito Penal brasileiro venha apresentando características mais intervencionistas, persiste o seu caráter fragmentário e subsidiário, dependendo a sua atuação da existência de ofensa a bem jurídico relevante, não defendido de forma eficaz por outros ramos do direito, de maneira que se mostre necessária a imposição de sanção penal (STJ, HC 201439/SP, Rel. Min. Haroldo Rodrigues, 6a T., DJe 10/8/2011). O paciente foi denunciado porque se constatou, em imóvel de sua propriedade, suposta subtração de água mediante ligação direta com a rede da concessionária do serviço público. Anote-se que, à época dos fatos, ele não residia no imóvel, mas quitou o respectivo débito. Dessarte, é aplicável o princípio da subsidiariedade, pelo qual a intervenção penal só é admissível quando os outros ramos do Direito não conseguem bem solucionar os conflitos sociais. Daí que, na hipótese, em que o ilícito toma contornos meramente contratuais e tem equacionamento no plano civil, não está justificada a persecução penal. Precedente citado: HC 14.337-GO, DJ 5/8/2002 (STJ, HC 197.601/ RJ, Rela Mina Maria Thereza de Assis Moura, 6a T., j. 28/6/2011, Informativo no 479). A intervenção do Direito Penal apenas se justifica quando o bem jurídico tutelado tenha sido exposto a um dano com relevante lesividade. Inocorrência de tipicidade material, mas apenas a formal, quando a conduta não possui relevância jurídica, afastando-se, por consequência, a ingerência da tutela penal, em face do postulado da intervenção mínima (STJ, HC 118481/SP, Rel. Min. Og Fernandes, 6a T., DJe 9/12/2008).
José E. Sáinz-Cantero Caparrós preleciona que “o setor punitivo somente deve ocupar-se das agressões mais intoleráveis aos bens jurídicos mais transcendentes, porque é o setor que impõe as mais traumáticas sanções” (La codelinquencia en los delitos imprudentes en el código penal de 1995, p. 73). 6
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Art. 1o Ao Direito Penal se comete a função de preservar a existência mesma da sociedade, indispensável à realização do homem como pessoa, seu valor supremo. Há de ser mínimo e subsidiário (STJ, REsp. 402419/RO, Rel. Min. Hamilton Carvalhido, 6a T., DJ 15/12/2003, p. 413).
Princípio da lesividade O princípio da lesividade, cuja origem se atribui ao período iluminista, que por intermédio do movimento de secularização procurou desfazer a confusão que havia entre o direito e a moral, possui, no escólio de Nilo Batista,7 quatro principais funções, a saber: a) proibir a incriminação de uma atitude interna; b) proibir a incriminação de uma conduta que não exceda o âmbito do próprio autor; c) proibir a incriminação de simples estados ou condições existenciais; d) proibir a incriminação de condutas desviadas que não afetem qualquer bem jurídico. O sistema jurídico há de considerar a relevantíssima circunstância de que a privação da liberdade e a restrição de direitos do indivíduo somente se justificam quando estritamente necessárias à própria proteção das pessoas, da sociedade e de outros bens jurídicos que lhes sejam essenciais, notadamente naqueles casos em que os valores penalmente tutelados se exponham a dano, efetivo ou potencial, impregnado de significativa lesividade. O Direito Penal não se deve ocupar de condutas que produzam resultado, cujo desvalor – por não importar em lesão significativa a bens jurídicos relevantes – não represente, por isso mesmo, prejuízo importante, seja ao titular do bem jurídico tutelado, seja à integridade da própria ordem social (STF, HC 98152/MG, Rel. Min. Celso de Mello, 2a T., DJ 5/6/2009, p. 584). Para a teoria moderna – que dá realce primacial aos princípios da necessidade da incriminação e da lesividade do fato criminoso – o cuidar-se de crime de mera conduta – no sentido de não se exigir à sua configuração um resultado material exterior à ação – não implica admitir sua existência independentemente de lesão efetiva ou potencial
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ao bem jurídico tutelado pela incriminação da hipótese de fato (STF, RHC 81057/SP, Rela. Mina. Ellen Gracie, 1a T., DJ 9/4/2005, p. 30).
Princípio da adequação social O princípio da adequação social, concebido por Hans Welzel, possui dupla função. Uma delas é a de restringir a abrangência do tipo penal, limitando sua interpretação e dele excluindo as condutas consideradas socialmente adequadas e aceitas pela sociedade.8 Sua segunda função é dirigida ao legislador em duas vertentes. A primeira delas orienta o legislador quando da seleção das condutas que deseja proibir ou impor, com a finalidade de proteger os bens considerados mais importantes. Se a conduta que está na mira do legislador for considerada socialmente adequada, não poderá reprimi-la valendo-se do Direito Penal. Tal princípio serve-lhe, portanto, como norte. A segunda vertente destina-se a fazer com que o legislador repense os tipos penais e retire do ordenamento jurídico a proteção sobre aqueles bens cujas condutas já se adaptaram perfeitamente à evolução da sociedade. Assim, da mesma forma que o princípio da intervenção mínima, o princípio da adequação social, nesta última função, destina-se precipuamente ao legislador, orientando-o na escolha de condutas a serem proibidas ou impostas, bem como na revogação de tipos penais. Habeas corpus. Violação de direito autoral (art. 180, § 2o do CPB). Exposição à venda de 287 DVDs e 230 CDs piratas. Inadmissibilidade da tese de atipicidade da conduta, por força do princípio da adequação social. Incidência da norma penal incriminadora. Parecer pela denegação da ordem. Ordem denegada. 1. Os pacientes foram surpreendidos por policiais comercializando, com violação de direito autoral, 287 DVDs e 230 CDs conhecidos vulgarmente como piratas; ficou constatado, conforme laudo pericial, que os itens são cópias não autorizadas para comercialização (fls. 182). 2. Mostra-se inadmissível a tese de que a conduta do paciente é socialmente adequada, pois o fato de parte da população adquirir tais produtos
BATISTA, Nilo. Introdução crítica ao direito penal brasileiro, p. 92-94. Merece registro a crítica de Luis Greco quando aduz que, “por sua imprecisão, a teoria da adequação social é predominantemente recusada pela doutrina. Hoje, ela parece reduzida a um critério de interpretação: as elementares dos tipos devem ser concretizadas de tal maneira que não abranjam fatos socialmente adequados” (Introdução. In: ROXIN, Claus. Funcionalismo e imputação objetiva no direito penal, p. 32-33). 7 8
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não tem o condão de impedir a incidência, diante da conduta praticada, do tipo previsto no art. 184, § 2o do CPB; a não aplicação de uma norma penal incriminadora, mesmo que por prolongado tempo, ou a sua inobservância pela sociedade, não acarretam a sua eliminação do ordenamento jurídico, por se tratar de comportamento social contra legem. 3. O prejuízo causado nesses casos não está vinculado apenas ao valor econômico dos bens apreendidos, mas deve ser aferido, também, pelo grau de reprovabilidade da conduta, que, nesses casos, é alto, tendo em vista as consequências nefastas para as artes, a cultura e a economia do País, conforme amplamente divulgado pelos mais diversos meios de comunicação (HC 113.702/RJ, Rel. Min. Arnaldo Esteves Lima, DJe 3/8/2009 e HC 161.019/SP, Rel. Min. Napoleão Nunes Maia Filho, DJe 1o/4/2011). 4. Ordem denegada (STJ, HC 197370/MS, Rel. Min. Napoleão Nunes Maia Filho, 5a T., DJe 30/5/2011). A Turma indeferiu habeas corpus em que a Defensoria Pública do Estado de São Paulo requeria, com base no princípio da adequação social, a declaração de atipicidade da conduta imputada a condenado como incurso nas penas do art. 184, § 2o, do CP (‘Art. 184. Violar direitos de autor e os que lhe são conexos: [...] § 2o Na mesma pena do § 1o incorre quem, com o intuito de lucro direto ou indireto, distribui, vende, expõe à venda, aluga, introduz no País, adquire, oculta, tem em depósito, original ou cópia de obra intelectual ou fonograma reproduzido com violação do direito de autor, do direito de artista intérprete ou executante ou do direito do produtor de fonograma, ou, ainda, aluga original ou cópia de obra intelectual ou fonograma, sem a expressa autorização dos titulares dos direitos ou de quem os represente’). Sustentava-se que a referida conduta seria socialmente adequada, haja vista que a coletividade não recriminaria o vendedor de CDs e DVDs reproduzidos sem a autorização do titular do direito autoral, mas, ao contrário, estimularia a sua prática em virtude dos altos preços desses produtos, insuscetíveis de serem adquiridos por grande parte da população. Asseverou-se que o fato de a sociedade tolerar a prática do delito em questão não implicaria dizer que o comportamento do
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Art. 1o paciente poderia ser considerado lícito. Salientouse, ademais, que a violação de direito autoral e a comercialização de produtos ‘piratas’ sempre fora objeto de fiscalização e repressão. Afirmou-se que a conduta descrita nos autos causaria enormes prejuízos ao Fisco pela burla do pagamento de impostos, à indústria fonográfica e aos comerciantes regularmente estabelecidos. Rejeitou-se, por fim, o pedido formulado na tribuna de que fosse, então, aplicado na espécie o princípio da insignificância – já que o paciente fora surpreendido na posse de 180 CDs ‘piratas’ – ao fundamento de que o juízo sentenciante também denegara o pleito tendo em conta a reincidência do paciente em relação ao mesmo delito (HC 98898/SP, rel. Min. Ricardo Lewandowski, 20/4/2010).
Princípio da fragmentariedade Conforme esclarece Muñoz Conde, “nem todas as ações que atacam bens jurídicos são proibidas pelo Direito Penal, nem tampouco todos os bens jurídicos são protegidos por ele. O Direito penal, repito mais uma vez, se limita somente a castigar as ações mais graves contra os bens jurídicos mais importantes, daí seu caráter ‘fragmentário’, pois de toda a gama de ações proibidas e bens jurídicos protegidos pelo ordenamento jurídico, o Direito Penal só se ocupa de uma parte, fragmentos, se bem que da maior importância”.9 Não há se subestimar a natureza subsidiária, fragmentária do Direito Penal, que só deve ser acionado quando os outros ramos do direito não sejam suficientes para a proteção dos bens jurídicos envolvidos (STF, RHC 89624/RS, Rela. Mina. Cármen Lúcia, 1a T., DJ 7/12/2006, p. 511). Princípio da insignificância Analisado em sede de tipicidade material, abrangida pelo conceito de tipicidade conglobante, tem a finalidade de afastar do âmbito do Direito Penal aqueles fatos que, à primeira vista, estariam compreendidos pela figura típica, mas que, dada a sua pouca ou nenhuma importância, não podem merecer a atenção do ramo mais radical do ordenamento jurídico. Os fatos praticados sob o manto da insignificância são reconhecidos como de bagatela.
MUÑOZ CONDE, Francisco. Introducción al derecho penal, p. 71-72.
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