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A carência de espaços comuns nas zonas periféricas afeta a população, principalmente as crianças. Esses espaços comuns são fundamentais para o desenvolvimento e inserção social dos pequenos indivíduos em seus territórios. O desproporcional parcelamento de terras nas periferias reflete o descaso do Estado com a população dessas áreas. Foi realizado um estudo em bairros que são cortados pela rodovia Leste Oeste em Cariacica, um grande empreendimento logístico e imobiliário. Efetuei um levantamento cartográfico de equipamentos públicos de educação, saúde e locais de uso comum, além do levantamento do uso do solo no perímetro da rodovia, o estudo cartográfico dessa região indica um desequilíbrio no uso do solo, apontando a insuficiência de áreas comuns de qualidade. Destaquei um território de apropriação voluntária formado na região, o Terrão, essa área contém grandes qualidades para desenvolvimento motor, criativo, perceptivo e social das crianças, seus principais usuários. Essa requisitada área passa por um momento de especulação e intervenção exercida por agentes do capital imobiliário que adulteram a paisagem. De um lado a demanda populacional, do outro o capital imobiliário, o Terrão manifesta a problemática disputa de terras presente nas periferias de Cariacica, cabe a nós a discursão e lutar por uma cidade inclusiva, possibilitando que as crianças sejam livres para brincar.
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Anteriormente o Terrão era um morro coberto por gramíneas e arbustos, muito utilizado como local de passagem e permanência dos moradores vizinhos. Próximo ao local encontrava-se uma baixada, hoje parcialmente aterrada, verdejante e alagadiça onde se agregam dois cursos d’água o Córrego Maria Preta que flui paralelamente com a rodovia e o Córrego Campo Grande. Havia uma grande presença da fauna neste local, principalmente aves que buscavam abrigo e alimentação. Os moradores dos bairros, Campo Belo, Santa Catarina, Santa Paula e Jardim Campo Grande se apropriam diariamente nas redondezas do Terrão. Esse cenário apresenta o movimento dos presentes habitantes e suas práticas, além do movimento de agentes do capital imobiliário com a sua intervenção, composto por um maquinário manipulado por subordinados que adulteram a paisagem sob um sistemático movimento de terras. Nos finais de semana o Terrão é reclamado pelo seu povo, sendo apropriado ao uso recreativo. A percepção é desenvolvida neste espaço comum, contém ricos atributos sensoriais variando as formas, volumes, níveis, texturas, materiais, relevos, elementos da natureza, sons, odores e cores. Seu nome se deu pelos sucessivos taludes de terras, com suas cores intensas de roxo, vermelho, laranja, amarelo e bege. Seus desníveis e amplitude estimulam os movimentos na horizontal e vertical, como correr, pular, escalar, deslizar. Um cenário que proporciona o
brincar, a experiência de corpos em sintonia de comunhão com a terra e o céu. O empinar pipa se destaca nos meses das férias escolares, neste período o céu do Terrão fica repleto de pipas, cafifas, arraias, papagaios ou quadrados de variados tamanhos e cores. Pessoas de diversos locais comparecem neste festival que enfeita os céus de Cariacica com centenas de pipas. A área do Terrão, os ventos e o céu disponibilizam uma contagiante animação entre crianças e adultos que sob a batida do funk gozam de sua alegria. Podemos considerar o empinar pipa uma prática que envolve a criança desde a concepção do objeto até a ação da brincadeira que estimula o desenvolvimento dos movimentos, sentidos, a criatividade, a socialização e a percepção, educando a criança para uma autonomia, incluindo em sua formação um papel crítico e cidadão. As próprias crianças geralmente produzem suas pipas, é feito um arranjo de gravetos de bambu em seguida é colado papel de menor gramatura, a rabiola pode ser feita de sacolas plásticas cortadas em fitas e amarradas na linha. Quando feita o objetivo é fazer com que a pipa tome altura e crie movimentos no céu. O clímax do empinar pipa é uma disputa entre os dois brinquedos no céu, perde aquele que tem a linha de sua pipa cortada, ganha quem mantém a sua pipa no ar. Sem dono os ventos carregam a pipa cortada, a brincadeira continua quando outras crianças saem correndo em direção do brinquedo, neste momento quem apanha a pipa torna-se o novo dono, gerando assim uma prática que incluem todas as crianças, mesmo as que não tem pipa. Empinar pipas, ou qualquer outra ação de apropriação neste espaço de potencialidades tem um
limite. O Terrão é um local para seus habitantes, porém é uma área lucrativa para o poder imobiliário, corresponde a uma cena histórica entre inúmeras no Brasil, a disputa pela pose de terra. Esse local está sofrendo o processo de especulação, um campo no meio de um jogo, de um lado a demanda populacional, do outro a especulação imobiliária. Será implantado nesta área projetos do polo empresarial de Cariacica junto ao hospital geral, e um bairro residencial “planejado”. O refúgio das crianças, dos jovens e de todos os moradores da região desaparece a cada dia. As crianças que já perderam as ruas, agora observam em contagem regressiva o desaparecimento de seu território, mais uma vez banidas do seu lugar de brincar. Onde brincarão nossas crianças? Já que os seus bairros não dispõem de espaços comuns. Seus ricos atributos espaciais atraem além de moradores vizinhos pessoas de diversas regiões e classes sociais. Não há na região do Terrão outros locais de uso comum e de tamanha potencialidade. O Terrão proporciona às crianças o desenvolvimento da percepção espacial, dos movimentos, da criatividade e a socialização. Sua ampla área e suas cores vibrantes na terra e no céu dispõe a alegria entre os usuários. Esquecidas, as crianças carecem de espaços comuns de brincar. Como formaremos cidadãos com a ausência de espaços comuns, que são de extrema importância na formação do indivíduo em sociedade?
CANTEIRO DE OBRAS 3
COMBOIO 4
PAISAGEM ADULTERADA 5
SUBORDINADOS 6
CAPITAL IMOBILIÁRIO 7
HABITADO 8
RECREATIVO 9
PIPAS CÉU TERRA 10
SUCESSÃO LÚDICA 11
LIBERDADE EM MOVIMENTO 12
REFÚGIO DO BRINCAR 13
RESISTÊNCIA PERIFÉRICA 14
CÉU TERRA 15
TALUDES 16
TERRÃO É SÓ LAZER 17
NOSSO DIREITO 18
DEIXA OS GAROTO BRINCAR 19
DIBICANDO 20
LEGADO 21
CIDADANIA 22