Outubro de 2013 www.omensageiro.org.br
Francisco de Assis e a Senhora Pobreza
SUMÁRIO
Publicação periódica da Associação Antoniana dos Frades Menores Conventuais. Rua América do Sul, 235 CEP 09270410 Santo André, SP. CNPJ 53.722.229/0001-04. Ligada à Província Padovana Frati Minori Conventuali e Messaggero di S. Antônio Basílica del Santo 35123 Padova - Itália. Reservam-se todos os direitos de reprodução. Com aprovação dos superiores. Registrada no Primeiro Registro Civil de Pessoas Jurídicas de Santo André, SP. Microfilme sob nº 69174 aos três de novembro de mil novecentos e oitenta e oito.
10 THEOBLOG
Francisco de Assis e a Senhora Pobreza
4 “Vai e reconstrói EDITORIAL
a minha igreja”
Frei Geraldo Monteiro DIRETOR E REDATOR
16
Frei Wilmar Villalba Ortiz REPORTAGEM
Distúrbios do sono
5 BUSCANDO VERDADEIRAMENTE
VICE-DIRETOR
Frei Everson Garcia GERENTE COMERCIAL
José Roberto de Queiroz
EQUIPE DE DIVULGAÇÃO
Frei Alessandro R. da Silva Frei Allan H. B. da Silva Frei André Beghini Vilela Frei Josimar Barros
REVISÃO
A DEUS
Alessandra Biral
O belo ancião
REPÓRTERES
8 Amar somente a verdade
Bernardete Melo Fábio Galhardi Leiriane T. Corrêa Silvia Valim
SANTO ANTÔNIO HOJE
14 O amor é essencial
CATEQUESE LITÚRGICA
IMPRESSÃO
Gráfica Oceano TIRAGEM
23 mil exemplares
PROJETO GRÁFICO
Ricardo Cruz
na liturgia
ISSN 2178-3721 Os artigos assinados são de responsabilidade de seus autores, não expressando necessariamente a opinião da revista.
DESENVOLVEDORA WEB
Fábia Limeira
NA HISTÓRIA 20 AQueIGREJA espiritualidade,
ASSISTENTES DE ARTE
Letícia Somensari Mariane Segantim
a do amor ou a do temor? Entre graça e liberdade
23
Fernando Altemeyer Júnior Frei Jacir de Freitas Faria Pe. José Alem José Tarcísio de Castro Luan Galani Moisés Sbardelotto Pe. Reginaldo Manzotti Pe. Valeriano dos Santos Costa Pe. Zezinho
DIRETOR RESPONSÁVEL
Correspondências: Caixa Postal 200 CEP 09015-970 Santo André - SP
COLABORADORES
EVANGELHOS DOMINICAIS COMENTADOS
É PRECISO 33 EVANGELIZAR Ide, esta é a missão! & COMUNICAÇÃO 34 IGREJA Comunicação, essência da
Igreja A BÍBLIA 36 ENTENDENDO Vocação profética – Isaías,
Jeremias, Jonas e Jesus PALAVRAS 39 CERTAS Nossa Senhora Feia
40 Darwin, o homem que
OS DOIS LIVROS DE DEUS
escancarou Deus
28 ESPECIAL
Nulidade matrimonial
42 46
Pe. Antônio José de Almeida Pe. Antônio Sagrado Bogaz Dom Bernardo Bonowitz Frei Danilo Salezze Revista
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O MENSAGEIRO DE SANTO ANTÔNIO ANO 57 – OUTUBRO DE 2013 – Nº 568 (11) 4472-5843 / 4475-1003
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A
eleição do cardeal Jorge Mario Bergoglio (1936-) em 13 de março (após a surpreendente renúncia de Bento XVI [1927-]) trouxe grandes expectativas, não só aos católicos, mas ao mundo todo. Além de ser o primeiro papa latino-americano e de pertencer à ordem religiosa dos jesuítas, o cardeal Bergoglio escolheu um nome de profundo significado na vida da Igreja e no mundo: Francisco. Amável, de sorriso largo, pouco dado aos protocolos, direto, sem rodeios, faz-se entender facilmente pelo povo, que aprecia, encantado, o jeito simples desse homem “que foram buscar no fim do mundo”, segundo as palavras dele. Parece que o mundo, tão líquido, tão relativo, redescobre a força do Amor, da solidariedade. Novamente um homem parece chacoalhar o mundo e acordá-lo de um sono profundo de esquecimento das coisas essenciais. Francisco de Assis (1182-1226), em uma época em que a vida eclesial era marcada por esplendor e por glórias, mas em ruínas espiritualmente e distante da sua verdadeira missão, renovou e reconstruiu a Igreja, sem apontar-lhe o dedo. Fez isso a partir da vivência pura e simples do Evangelho, sem nada de próprio. Vivendo em meio aos invisíveis de sua época, os hansenianos, converteu em doçura o que era amargo. A vaidade e a soberba deram lugar à simplicidade e à percepção de O MENSAGEIRO DE SANTO ANTÔNIO
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que, sem nada, já se tem o Tudo: o Cristo Pobre e Crucificado. Desposando a Senhora Pobreza, desvelou a riqueza e o esquecimento do Evangelho por parte dos prelados. Dialogando com o sultão, em terras sarracenas, expôs o equívoco das cruzadas, focadas na violência e nos interesses geopolíticos. Francisco de Assis ensinou que a confiança em Deus deve ser absoluta. Por isso, vivia como mendicante, ele e seus irmãos, pois confiava na providência divina, que nunca lhes faltava. Foi esse homem, pequenino, sem beleza, sem nada de extraordinário para oferecer, que sacudiu a vida da Igreja, e que, oitocentos anos depois, continua presente no imaginário do povo cristão como aquele que verdadeiramente viveu de modo pleno a proposta de Jesus de Nazaré e que serve como inspiração para aqueles que buscam a vivência evangélica. Parece que aquela frase, vinda do crucifixo de São Damião (“Vai e reconstrói a minha Igreja”), encontrou novamente outro Francisco, para nos lembrar do essencial. Vamos redescobrir esse precioso tesouro evangélico! Na coluna Theoblog, podemos conhecer um pouco mais sobre esse personagem tão emblemático na vida de ontem e de hoje da Igreja. Boa leitura a todos! Frei Wilmar Villalba Ortiz
(parte 16)
“VAI E RECONSTRÓI A MINHA IGREJA”
Como se faz um monge
Frei Wilmar Villalba Ortiz Diretor
O belo ancião
Arquivo MSA
EDITORIAL
Monge trapista, autor desconhecido
BUSCANDO VERDADEIRAMENTE A DEUS
S
omos abençoados por termos um bom número de outros mosteiros nos Estados vizinhos de São Paulo e Minas Gerais e somos abençoados pelo fato de que, frequentemente, monges ou monjas dessas comunidades vêm nos visitar, fazer um retiro ou participar em uma liturgia de profissão monástica. Em algum momento durante sua estadia, eles invariavelmente perguntam: “Você sabe o que eu invejo em sua comunidade?”; “O quê?”; “Seus anciãos. Há vários jovens em nossas comunidades, mas seria realmente maravilhoso termos alguns anciãos, pessoas que perseveraram na vida monástica por cinquenta ou sessenta anos e foram transformados por ela”. O M E NN SSAAGGEEIIRROO DDEE SSAANNT TOO AANNT TÔ ÔN NI OI O Outubro ddee 22001133 Outubro
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BUSCANDO VERDADEIRAMENTE A DEUS Esse apreço pela preciosidade do ancião tem sido uma constante na tradição monástica, desde os dias do deserto egípcio. Se as culturas secularizadas de hoje idolatram a juventude, a cultura monástica sempre possuiu uma espontânea e profunda veneração pela idade. Obviamente, não simplesmente pelo acúmulo dos anos, mas pelo produto de décadas de refinação e polimento por parte de Deus e de fidelidade e de abertura ao trabalho do Espírito por parte do monge. O produto final (o monge na reta final de sua corrida terrestre) é algo tranquilamente estonteante. Como um pôr do sol que muda as nuvens de violeta para laranja e para rosa. De fato, é exatamente a categoria de beleza que o monaquismo sempre empregou para descrever a qualidade única de um monge idoso. Desde o 4o século em diante, ele tem sido conhecido como o geron kalos, o ‘belo ancião’. Certamente os monges da Antiguidade sabiam que eles estavam mexendo com um paradoxo: que na mentalidade da maioria das pessoas a beleza é o domínio especial da juventude, um artigo que diminui progressivamente com o tempo, a ponto de não haver muita diferença entre o emurchecer dos muito idosos e a feiura da morte. Os monges do deserto não eram insensíveis à beleza da juventude; de fato, há algumas histórias maravilhosas sobre a capacidade de um monge ancião glorificar a Deus pela beleza de uma jovem atraente encontrada no caminho de ida ou de volta de Alexandria, onde os monges iam para vender os cestos que teciam para sua subsistência. Ao mesmo tempo, os monges do deserto encontravam-se diante de um fenômeno surpreendente e inegável: existe outro tipo de beleza que consiste na transfiguração do físico pelo espiritual. O espírito resplandece na carne dos monges e das monjas anciãos. Seus corpos são como delicados vasos de alabastro e a vida do Espírito dentro deles é como uma lâmpada de óleo mantida perpetuamente acesa. O resultado é que os anciãos simplesmente “refulgem”; o Espírito tornou-os permanentemente luminosos. Em um de seus sermões, Santo Isaac da Estrela (?-1171), nosso padre cisterciense, escreveu que, na convivência da carne e do espírito (que é O MENSAGEIRO DE SANTO ANTÔNIO
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a condição humana), nós inevitavelmente controle pela timidez, não é distorcido iremos em uma das duas direções. Ou o pelo cinismo, não é hollywoodizado por Espírito em sua soberana liberdade trauma consciência de estar diante da câbalhará com tanto êxito dentro da nossa mera da opinião das outras pessoas, não liberdade humana (como escreve Hans se vulgariza por conter algum pedido, Urs von Balthasar [1905-1988], em seu como se o monge quisesse comprar sua livro Credo) que ele espiritualizará todo benevolência com um sorriso a fim de o nosso ser, incluindo nosso corpo, ou que ele pudesse lhe pedir dez reais. O os impulsos da carne nos dominarão tão sorriso do belo ancião está simplesmente completamente (em ali. Quando você ennossos pensamentos contra o ancião, você Quando você encontra o e atitudes assim como encontra o sorriso. ancião, você encontra o em nossas palavras Você não é a princie ações) que mesmo pal fonte dele (não sorriso. Você não é a princinosso ser espiritual se gabe achando que pal fonte dele (não se gabe interior se tornará é). Ele brota de sua achando que é). Ele brota “materializado”, “carfelicidade em Deus; de sua felicidade em Deus; nalizado”. O belo anele brota de seu recião é uma história gozijo em Deus, que ele brota do seu regozijo da vitória do Espírito fez nele sua morada. em Deus, que fez nele sua Santo e de uma liberAo mesmo tempo, o morada. Ao mesmo tempo, dade humana complesorriso é para você, o sorriso é para você, é sustamente em sintonia é suscitado por você. com ele. Nesse ancião, A felicidade pacífica citado por você. A felicidade há um vislumbre do que o monge ancião pacífica que o monge ancião “corpo espiritual”, em estavelmente experiestavelmente experimenta que São Paulo (5-67) menta simplesmente simplesmente por viver e diz que todos nós tepor viver e por viver remos quando Cristo na presença de Deus por viver na presença de retornar e nos resé “reiniciada” quanDeus é “reiniciada” quando suscitar para a glória; do você aparece em você aparece em cena de fato, no ancião, cena. É isto o que nós experimentamos explica um dos detauma das provas mais convincentes da lhes mais amáveis da história monástica: ressurreição. Está ali bem diante de como o grande monge ortodoxo do século nossos olhos. Nós vemos e tocamos a XIX, São Serafim de Sarov (1759-1833), vida imortal. frequentemente chamado de São FrancisSeria algo interessante, experimentar co da Igreja Oriental, saudava cada um escrever um Cântico dos Cânticos do gedos milhares de visitantes que vinham a ron kalos, louvar sua beleza da cabeça aos sua cela para uma bênção, confissão ou pés, com muitas paradas intermediárias direção espiritual com a saudação: “Bempelo caminho (a propósito, o Cântico dos -vindo, minha alegria”. São Bernardo Cânticos possui sua origem na poesia (1090-1153) escreveu que nós só realamorosa egípcia, em que era uma tradição mente amamos nosso próximo quando enaltecer a excelência de cada parte do o amamos em Deus, quando o amamos corpo da amada). No escopo deste breve dentro de nosso amor todo-abrangente artigo, porém, teremos de nos contentar por Deus. Quando uma pessoa atinge tal com um rápido tour da beleza do ancião estado, então cada ser humano é mais monástico, pausando somente naqueles uma manifestação divina. É por isso que lugares que receberam uma avaliação o sorriso do ancião reluz um pouco mais cinco estrelas. brilhantemente quando lhe vê. Sem qualquer dúvida, a mais bela Por falar em “vê-lo” (com o sorriso do característica do ancião é seu “sorriso”. ancião, o que é mais extraordinário é seu É absolutamente aberto, absolutamen“olhar”). O olhar de um ancião é penetrante espontâneo. Ele não é mantido sob te sem fazer juízo. Ele mostra autêntico
Monge, projectm-online.com
interesse, mas não curiosidade; não está “caçando pneus e botas velhas em seu lago interior”, como disse certa vez um diretor espiritual meu. Seu olhar simplesmente faz aquilo que se espera que um olho faça: ele vê. Mas, ainda mais importante do que ver, ele comunica, e aquilo que ele comunica é a própria luz. Jesus disse: “o olho é a lâmpada do corpo” (cf. Lc 11,34a). Vale citar que o olho do ancião é uma lâmpada não apenas para o corpo dele, mas para o de vocês também. Quando ele olha para você, seu humor melhora. Sua esperança aumenta. Sua percepção do tremendo bem que há nas pessoas e nas coisas (seja latente, seja manifesto) se libera. O que está acontecendo? Simplesmente por olhá-lo, o ancião está lhe infundindo sua visão da realidade em seu coração. Isto não é hipnotismo
uma viagem. É um contato criativo, como o toque de Deus Pai em A criação do homem, de Michelangelo (1475-1564), em que, ao toque de Deus, Adão ganha vida. Ele é maternal e mariano também: há sempre um indício da presença de Nossa Senhora no abraço de um ancião. Não é de modo algum sentimental ou exigente. Antes, é confirmador e fortalecedor, como o sacramento da crisma. Se isto fez que você quisesse conhecer nossos anciãos, venha nos visitar e veja-os por si mesmo. Mas não pode levá-los com você! Eles são o presente de Deus para nossa comunidade. Dom Bernardo Bonowitz, OCSO
Arquivo pessoal
ou lavagem cerebral. Como diz São Paulo: “Nós vemos apenas parcialmente, como se através de um espelho” (cf. 1Cor 13,12). Mas o ancião é diferente. Ele chega muito perto de ver as coisas como elas são. Seu olhar lhe possibilita que também olhe para o real, pelo menos por tanto tempo quanto durar seu encontro com ele. Algo deste encontro sempre permanecerá em você e o mudará permanentemente para o bem. Finalmente, há seu “toque”. Todos nós temos saudades do afago de nossas mães e pensamos que ninguém poderá nos acarinhar de novo com a mesma ternura, com o mesmo afeto, o mesmo compromisso, a mesma pureza. Mas esse gesto é, em si mesmo, um sacramento do toque de Deus, o qual pode ser revivido no afago de um ancião. O gesto de um ancião é sempre uma bênção, quer esteja traçando um sinal da cruz sobre nossa fronte, quer nos dando um rápido abraço antes de empreendermos
Abade do Mosteiro Nossa Senhora do Novo Mundo, Campo do Tenente (PR)
O M E NN SSAAGGEEIIRROO DDEE SSAANNT TOO AANNT TÔ ÔN NI OI O Outubro ddee 22001133 Outubro
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SANTO ANTÔNIO HOJE
“O rapaz levantou-se da morte e afirmou que os parentes do bem-aventurado Antônio eram totalmente estranhos ao delito. Consequentemente, eles foram soltos e libertados do cárcere. O bem-aventurado Antônio permaneceu na companhia deles todo aquele dia: à noite, depois, saiu de Lisboa e na manhã seguinte voltou a Pádua” (Bartolomeu de Pisa, Vida de Santo Antônio)
O
santo de todos tomando cuidado dos próprios pais! Que cena maravilhosa, retratada no terceiro quadro em alto-relevo da parede de mármore que está ao redor do túmulo de Santo Antônio de Lisboa e Pádua (1195-1231). Nosso santo é representado em uma sala judiciária e está defendendo nada mais, nada menos que alguns parentes seus, entre os quais os próprios pais. Que sua família tivesse sido envolvida, estranha e inocentemente, em uma crônica de crime, é uma notícia bem possível, já que esse drama, com final feliz, teve lugar na catequese evangélica que se inspira O OMME N E NS SAAGGE EI IRROO DDEE SSAANNTTOO AANN TT ÔÔ N I O
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Amar somente a verdade “Não pronunciarás falso testemunho contra teu próximo” (Ex 20,16)
na vida de nosso santo. Por uma vez, somos levados a sua vida “particular”. Ele deixou sua veste de taumaturgo poderoso e universal para voltar a ser filho e irmão apreensivo com os próprios parentes que estão em perigo de sofrer uma injustiça. Em Lisboa, seus pais e seus parentes foram acusados de terem matado um rapaz, cujo cadáver foi encontrado no jardim da casa deles. Segundo as crônicas, enquanto vivia, Santo Antônio soube do caso (por dom de Deus e uma sensibilidade fora de comum) e tornou-se presente de maneira milagrosa próximo a seus caros. Por algumas horas, colocou-se novamente
Santo Antônio ressuscita um jovem para testemunhar, Giorgio Trevisan
Arquivo Il Messaggero
dentro dos afetos mais naturais, aqueles que o tornaram tão humano, e obteve de Deus que, por um momento, a vítima pudesse reviver para testemunhar a verdade do acontecido. Logo após, o frade voltou ao convento, provavelmente em Pádua. E – quem sabe? – em quantos casos semelhantes do povo, ele se dispôs a intervir, fosse em vida, fosse depois: eis porque até “as pedras falam”, como bem o demonstra o fino alto-relevo.
Os antigos frades da Basílica de Santo Antônio quiseram apresentá-lo aos peregrinos como o inimigo de qualquer mentira, testemunha de Jesus Cristo e de uma verdade sem descontos e reservas que ele proclamou nas igrejas e nas praças, diante do papa Gregório IX (1160-1241), diante da presunção dos hereges e da hipocrisia de certo clero, na presença do sanguinário Ezzelino da Romano (1194-1259) e de outros tiranos como ele. É verdade que ele repropôs (tanto ontem quanto hoje) a todo penitente sincero a importância de reconhecer um a um os próprios pecados diante de Deus, porque somente declarando sua intrínseca mentira todos poderão obter o perdão e permanecer em paz. Olhemos bem para nossa cena: bem ao centro, dois personagens com traços tensos e pesados, Martinho e Maria (pais) suplicavam confiantes a seu (filho) Fernando que a verdade de sua inocência fosse toda esclarecida. As mãos postas da mãe chegavam a tocar a manga do hábito do filho, como só uma genitora pode fazer. E o filho “saiu em voo” até eles e fez-se presente, atendendo àquela mesma chamada que levou São Francisco de Assis (1182-1226) a aparecer entre os frades que estavam distantes ou frei Pio de Pietrelcina (1887-1968) a visitar em espírito as pessoas sofredoras. Quem realmente quer bem sabe colocar-se nos “panos” dos outros até a pulverizar distâncias e obstáculos. Não existe
distância para a empatia em Cristo. Precisa, porém, apresentar aquela pureza de coração, que fez Santo Antônio dizer: “A verdade é maior e mais forte do que todas as coisas. A terra inteira invoca a verdade e os céus a bendizem.” Educar ao amor da verdade porque somente nela existe consistência: que desafio educativo! Santo Antônio, admirando a inocência dos pequenos, escreveu: “Observe a criança quando acorda. Em seu berço, chora; se estiver nua, não fica vermelha; não faz mal ao próximo; não conserva rancor; não odeia a ninguém, não faz preferências de pessoas”. Enfim, sabe dizer “sim” e “não“ como o Evangelho pede, instintivamente, sem malícia. Nós, adultos, bem o sabemos, como o resto seja fonte de tantos males nossos. Temos de conviver com a mentira, com a falsidade, com o que nos convém? Em um Convênio Eclesial do Vicariato de Roma, o papa Bento XVI (1927-) convidou a “dizer não, com todos os sacrifícios que isso comporta, a um tipo de cultura onde a verdade não tem vez, mas só a sensação, o espírito de calúnia e de destruição, uma cultura que não procura o bem”. Mentira e moralismo, muitas vezes, vão de mãos dadas; frequentemente, suas vítimas são a informação, as relações interpessoais, as próprias relações educativas. Santo Antônio lembra-nos ainda que a mãe de todas as mentiras é a negação de Deus, o viver como se Ele não existisse, com exclusiva atenção àquilo que se costuma dizer “bem-estar”. Recentemente, li uma frase de Mahatma Gandi (1869-1948) que me pareceu um bom conselho para sermos mais verdadeiros e sinceros uns com os outros, evitando fazer o mal: “O homem possui dois olhos e duas orelhas, mas uma só língua. Por isso, deveria dizer metade do que vê e ouve”. Além disso, vale citar os livros sapienciais da Bíblia, o famoso texto cristão “Imitação de Cristo” e a mensagem de São Francisco de Assis! Frei Danilo Salezze, OFMConv Ex-diretor da revista Messaggero di Sant’Antonio (Itália)
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São Francisco de Assis (detalhe), séc. XIII, Cimabue
THEOBLOG
Francisco de Assis
F
rancisco de Assis nasceu com o nome de Giovanni di Pietro di Bernardone, em 1182, na cidade de Assis, na Itália. Era filho de Pietro di Bernardone dei Moriconi, rico mercador de tecidos, e de Giovanna (ou Pica) Bourlemont, uma mulher nobre originária de Provence. Tinha um irmão, Ângelo. Viveu de forma frívola e superficial, sem indícios de que seguiria a profissão paterna. Seus sonhos estavam focados nas aventuras cavalheirescas e nas festas medievais. Falava o dialeto da região e o francês fluentemente. Na guerra entre Perugia e Assis, foi feito prisioneiro e adoeceu gravemente. Nesse momento, passou a pensar na vida de com introspecção, ocorrendo a conversão: decidiu colocar-se a serviço de Deus, contraindo um matrimônio com a “Senhora Pobreza”. A partir daí, houve um conflito agudo pessoal e de ruptura com seu pai, sua família e seus amigos. Ele tinha 25 anos. Todos pensavam que ele perdera o juízo. Após vender tudo, entregou aos pobres tudo o que possuía, vivendo em uma O OMME N E NS SAAGGE EI IRROO DDEE SSAANNTTOO AANN TT ÔÔ N I O
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e a Senhora
Pobreza
ermida nos arredores de Assis, no mais completo despojamento. Não pensou em respostas políticas ou sociais aos problemas do mundo. Não planejou rebeliões. Quis tão somente seguir Jesus na vida de pobreza. Ser uma testemunha radical do Evangelho, pois só o pobre conhece verdadeiramente o coração de Deus e Sua vontade. Alguns seguidores e futuros discípulos foram a seu encontro, passando a chamá-lo de Poverello (o pobrezinho). Francisco descobriu o ideal e o projeto de sua vida: louvar a Deus, anunciar Sua palavra viva e Seu amor universal, viver na pobreza, na castidade, na humildade e na alegria da paz profunda. Paradoxalmente esse modo de viver assumido por Francisco e seus companheiros iria contrastar frontalmente com a vida principesca de bispos e padres da época, completamente instalados, seduzidos pelo poder e vivendo faustosamente enquanto os pobres eram submetidos à miséria e doenças. Isso fez eclodir movimentos de rebeldia como os cátaros. Ao conviver com hansenianos, Francisco venceu a si mesmo e experimentou a doçura de uma nova vida e de novos valores. Alguns companheiros de juventude se juntaram a ele e, 1209, formaram o primeiro núcleo do que seria o futuro “franciscanismo”. Em 1210, o papa Inocêncio III (1160-1216) aprovou a regra de vida dos chamados “frades menores”. Em 1212, Clara de Assis (1194-1253), bela e sedutora jovem, colocou-se sob a direção espiritual de Francisco, fundando a ordem das “pobres damas” (1212), depois conhecidas como clarissas, como a segunda ordem franciscana. Pouco depois, brotaria da fecunda semente representada por esse santo uma ordem terceira (1221), para os leigos que desejavam participar e viviam esses valores e esse estilo de vida no trabalho e na vida familiar. Com a chegada de muitos discípulos e de novos membros, principiou-se a lenta organização do grupo de mendicantes, o que pareceu aos olhos de Francisco um recuo ao carisma original e muitas vezes um risco de perder novamente a fidelidade ao Evangelho substituindo-o por normas, riquezas ou clericalismos. Depois de uma viagem ao Egito, encontrou-se com o sultão Malik al-Kamil (1180-1238), ao qual se propôs a convertê-lo, sem sucesso. Ao voltar para a
Úmbria, passou a direção da confraria para Com isso, muitos enxergavam a retomada frei Pedro Cattani (?-1221), retirando-se vital do verdadeiro cristianismo e de uma para seu casebre na Porciúncula, perto de Igreja servidora e livre. Outros viam a Assis. Ali manteve sua pregação corajosa e beleza do testemunho e a liberdade do sua vida de oração e desprendimento. santo. Francisco era simpático e tocava Em 1224, rezando solitário em uma aos corações e as mentes de todos. gruta no Monte Alverne, nos Apeninos, Segundo Jacques le Goff (1924-), um durante a festa da Exaltação da Santa dos maiores especialistas em história Cruz, recebeu os estigmas da Paixão de medieval, os mendicantes marcaram a EuCristo em seu corpo já ropa, mudaram a Igreja frágil, em uma visão do e tocaram os nervos das Cristo Jesus na forma cidades com sua pregaSeguir à risca de um serafim alado. ção itinerante: “A mais o Evangelho de Jesus Das chagas do Cristo, espetacular é, sem dúCristo era sua meta saíram cinco raios de vida, a sua implantação fundamental, bem luz das mãos, pés e do em meio urbano e o fato costado, imprimindo de que as cidades são os como a de seus irmãos. em seu corpo os estigcentros essenciais da Pretendia imitar em mas da cruz. Em Assis, pregação e da atividade tudo a vida e os gestos ficou enfermo e perdeu dos dominicanos e dos de Jesus Salvador. Esta a visão, sendo venerado franciscanos. Os franciscomo uma relíquia viva canos, todavia, prolonespiritualidade singela por companheiros e gam essa atividade nos e radical foi assumida pelo povo. Em meio a caminhos por onde paspor muitos religiosos grandes sofrimentos sam como itinerantes e e pelo povo pobre de físicos, compôs o poeretirando-se em ermidas ma “Cântico ao Irmão nas montanhas. [...] Não todo o sul da França, Sol”, admirável tesouro são proprietários, não da Itália e de vastas teológico e litúrgico. dispõem de terras nem regiões da Europa. Esse é um primeiro de rendas. As ordens Com isso, muitos grande poema na línmendicantes colocam gua italiana. Morreu verdadeiramente Cristo enxergavam a retomada na Porciúncula na noite e o evangelho no centro vital do verdadeiro de três para quatro de não somente de suas cristianismo e de uma outubro de 1226, aos próprias devoções, mas Igreja servidora e livre 44 anos. Foi canonitambém das devoções zado em 16 de julho dos leigos. Francisco de de 1228, pelo próprio Assis levará ao extremo papa Gregório IX (1160-1241), que foi a identificação com Jesus a esse respeito. até a cidade de Assis. Nessa cidade, sua As ordens mendicantes ensinam também às tumba, custodiada pelos franciscanos, populações, particularmente urbanas, notornou-se um local de peregrinação munvas práticas religiosas graças a uma intensa dial. São Francisco de Assis foi assumido pregação. Com eles nasce uma Europa da como um santo universal e Patrono da palavra, do sermão, que, laicizado, será a Ecologia. Multiplicaram-se as represenEuropa do discurso, da tribuna, do discurtações artísticas, bem como a devoção e so militante”.1 os milagres a ele atribuídos. Seguir à risca o Evangelho de Jesus SÃO FRANCISCO NA ARTE Cristo era sua meta fundamental, bem como a de seus irmãos. Pretendia imitar A iconografia de Francisco de Assis é em tudo a vida e os gestos de Jesus imensa. Depois dos apóstolos e ao lado Salvador. Esta espiritualidade singela e de Santo Antônio de Pádua e Lisboa radical foi assumida por muitos religiosos (1195--1231), ele é um dos santos mais e pelo povo pobre de todo o sul da França, representados na arte. Exemplar é a obra da Itália e de vastas regiões da Europa. de Giotto realizada na basílica superior O MENSAGEIRO DE SANTO ANTÔNIO Outubro d e 2 0 1 3
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THEOBLOG de Assis, iniciada em 1228 e consagrada em 1253. Vários artistas de renome pintaram Francisco: Antoni Viladomat (1678-1755); Bonaventura Berlinghieri (1210-1287); Cimabue [Cenni di Petro] (1240-1302); Donatello [Donato di Niccoló di Betto Bardi] (1386-1466); Duccio di Buoninsegna (1255-1319); El Greco [Doménikos Theotokópoulo] (1541-1614); Francisco de Zurbarán (1598-1664); G e o rge s de la Tour (1593-1651); Giambellino [Giovanni Bellini] (1430-1516); Giotto di Bondone (1267-1337); Giunta Pisano (?-1236); Pietro Lorenzetti (1280-1348); Salvador Dalí (1904-1989); Sassetta [Stefano di Giovanni] (1392-1450) e Simone Martini (1284-1344). Dois episódios da vida de São Francisco merecem destaque: a estigmatização sobre o Monte Alverne, em particular na obra de Giotto, de 1300 (exposta no Museu do Louvre, em Paris), e a morte do santo na Porciúncula, em geral representada na arte de forma mais banal, cercado de frades, e muitas vezes com anjos guardiães para levá-lo aos céus. Desde o mestre Giotto, que inicia sua obra em 1296 com a Leggenda di san Francesco, até o século XVI, o santo foi representado sem barba. Mas, na arte da Contrarreforma, depois do século XVII, foi transformado em santo barbudo, menos sorridente e mais dolorista. Os ciclos que possuem como referência as legendas franciscanas e os fioretti (milagres) serão a base da arte, particularmente o presépio natalino de Greccio, o lobo de Gubbio, a cruz falante de São Damião e o sermão aos pássaros. São Francisco é sempre simbolizado por um crucifixo, pelo manto franciscano, por estigmas na carne e pelo cordão com três nós. É bom lembrar que o leigo Francisco se dedicou ao ministério da pregação e nunca foi um presbítero, o que fez que o clero sempre tivesse restrições a sua autoridade de pregador leigo ambulante. O MENSAGEIRO DE SANTO ANTÔNIO
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Até os dias de hoje, ele é inspirador e um homem semente, para todos os ministros da Igreja e de modo particular para os leigos. No Brasil, São Francisco de Assis é venerado em vários lugares, de modo particular na cidade de Canindé (CE), desde 1775. Há anos em que cem mil romeiros dirigem-se ao santuário em gesto de profunda fé e de-
voção popular. Atualmente, sua vida e sua personalidade inspiram filmes, romances literários e composições. Vale destacar a bela peça São Francisco de Assis pregando aos pássaros, composta para piano por Franz Liszt (1811-1886) em 1862/1863. AS NOVIDADES DE FRANCISCO Esse irmão universal é pleno de novidades em nossa espiritualidade de seguimento de Jesus. Foi professor da pobreza, modelo de penitência, pregador da verdade, espelho de santidade, exemplo evangélico. Ele é contrário aos poderes civis, dos senhores da guerra e mesmo aos privilégios eclesiásticos. Nunca se fez padre. Este radicalismo de Francisco lembra a célebre reflexão de Santo Tomás de Aquino (1225-1274), frade dominicano que afirma que a autoridade civil e religiosa exercida em todos os lugares é sempre uma consequência do pecado. Disse Tomás e assim viveu Francisco, que em um mundo sem pecado, ninguém teria de receber, de fora, ordens de alguém.
Para isso ele inovou esposando a dama pobreza e praticando a virtude da humildade. A comunidade da Igreja não deve assemelhar-se demais à sociedade civil e menos ainda aos poderes de Estado. Obediência aos pequenos e aos pobres deve vir antes das rubricas e da submissão cega ao poder. Antes de afagar e fazer mesuras para os ricos e poderosos, a Igreja precisa cuidar dos pobres e viver pobremente. Um bispo não é um governador nem senador. Um padre não é um parlamentar nem um príncipe. Todos são servos do Evangelho de Cristo. Irmãos de seus irmãos e sempre serenos e suaves, amigos dos pobres e dos menores. Assim escrevia Jean Sulivan (1913-1980), escritor francês, nos idos de 1959: “Autoridade designa, etimologicamente e no sentido mais estrito, função de autor. Só tem autoridade sobre mim aquele que é capaz de me fazer existir mais. É o poder criador que Deus delega na autoridade. A comunhão real que supõe este paradoxo vivido: o chefe que desce do pedestal e lava os pés daqueles que ele dirige, não nos dias de cerimônia, mas na realidade cotidiana. É o inverso da sabedoria ordinária. Se aquele que manda não se humilha, o que é mandado é humilhado. Não se trata para o chefe cristão de manter no infantilismo eternas crianças, mas sim de promover adultos e irmãos”.2 Ele viveu sua fé cristã livre nas mãos de Deus, sendo sempre fiel a sua Igreja, mas questionando-a, reformando-a, criticando, rezando, amando e reunindo o povo na pregação viva e plena de unção. Para Francisco, a gratuidade era a palavra menos inadequada para exprimir o mistério de Deus e do ser humano. Gratuidade é pureza de amor, liberdade, ausência de cálculo e de lucros. Graça e gratuidade possuem uma raiz comum. A graça é gratuidade, a gratidão é gratuidade e a vida é sempre uma entrega de amor nas mãos de Deus. Francisco sabe que é preciso instituir uma pedagogia da gratuidade em um mundo marcado pela utilidade e pela necessidade. Ele fascina homens e mulheres até hoje. Este homem plenamente humano é um santo autêntico e único. Só a gratuidade pode consertar uma igreja que está desmoronando. Francisco é um pregador apaixonado que comove porque vive o que prega.
Cena do filme Irmão Sol, Irmã Lua (1972), de Franco Zeffirelli
Chiara Frugoni (1940-), historiadora italiana, disse: “Francisco tinha sucesso por causa de sua maneira especial de falar à multidão: pregava em vernáculo simples e espontâneo, usava gestos, mímica, cantos e melodias; era como assistir a um espetáculo, uma comédia religiosa. Certa vez, durante uma grave doença, ele comeu um pouco de frango, embora fosse época da Quaresma; tão logo se sentiu melhor, pediu a um companheiro, chegando às portas de Assis, que lhe amarrasse uma corda no pescoço e o levasse pela cidade, totalmente nu, como se fosse um ladrão. O frade, como arauto improvisado deveria gritar: ‘Olhai o glutão que se refestelou com carne de galinha sem que soubésseis!’. O
contraste entre as palavras que denunciavam uma pretensa hipocrisia e a visão do pobre corpo esquálido de um homem que todos reconheciam como santo causou uma grande comoção e teve efeito imediato, despertando entre os espectadores a disposição ao arrependimento e a uma vida melhor”.3 Francisco é nosso irmão, ele é o Pobre de Assis. Ele é o Santo da Ecologia, da pobreza e do amor universal. Ele é Francisco, nosso programa de vida e nossa inspiração da uma Igreja do jeito de Jesus. É preciso lembrar e celebrar em sua singela humanidade, sorrindo para cada um de nós e chamando a todos de irmãos e irmãs. Pela fé, pelo seguimento e pela fidelidade a Cristo, ele se transformou
REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS As raízes medievais da Europa. Petrópolis: Vozes, 2007. p. 200-201. 2 Provocação ou a fraqueza de Deus. São Paulo: Herder, 1966. p. 14-17. 3 Vida de um homem: Francisco de Assis. São Paulo: Companhia das Letras, 2011. p. 47. 4 Cântico ao Irmão Sol. In: Fontes franciscanas. Santo André: Editora O Mensageiro de Santo Antônio, 2004. p. 123. 1
Fernando Altemeyer Junior
Arquivo pessoal
Francisco é nosso irmão, ele é o Pobre de Assis. Ele é o Santo da Ecologia, da pobreza e do amor universal. Ele é Francisco, nosso programa de vida e nossa inspiração da uma Igreja do jeito de Jesus. É preciso lembrar e celebrar em sua singela humanidade, sorrindo para cada um de nós e chamando a todos de irmãos e irmãs. Pela fé, pelo seguimento e pela fidelidade a Cristo, ele se transformou em outro homem, sem perder a humanidade
em outro homem, sem perder a humanidade. É bonito lembrar que, agonizando, pediu aos frades para ver a caríssima Clara e sua amiga Jacoba de Settesoli (1190-1273), nobre romana, viúva de Frangipani. Pediu a ela que lhe trouxessem velas e um pano cru de cor cinzenta, para fazer sua mortalha, e os deliciosos doces de Roma, conhecidos como mostaccioli (feitos à base de amêndoas, farinha e mel). Francisco viu-se no caixão vestido como homem comum destinado a tornar-se pó, mas pediu que “frei Jacoba” (como ele a chamava familiarmente) lhe desse os docinhos para a viagem de adeus. Eis o ser humano plenamente alegre e singelo. Eis o irmão universal. No interior da majestosa Basílica de Santa Maria degli Angeli, permanece singela a minúscula igrejinha da Porciúncula, como metáfora a indicar que no coração da Mãe Igreja vive a “Senhora Pobreza”. Assim o expressam algumas estrofes de seu belo hino de amor: “Altíssimo, onipotente, bom Senhor. Teus são os louvores, a glória, a honra e toda benção. Só a ti, Altíssimo, eles convêm. E homem algum é digno de te mencionar. Louvado sejas, meu Senhor, com todas as Tuas criaturas, especialmente com o Senhor Irmão Sol, o qual é dia e por ele nos alumias. Louvado sejas, meu Senhor, pelos que por Teu amor perdoam, e sustentam enfermidades e tribulações. Bem-aventurados os que as sustentam em paz, pois, por Ti, Altíssimo, serão coroados. Louvai e bendizei a meu Senhor, rendei-Lhe graças e servi-O com grande humildade”.4
Departamento de Ciências da Religião, PUC-SP fajr@pucsp.br
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catholicscomehome.org
C AT E Q U E S E L I T Ú R G I C A
O AMOR
É ESSENCIAL NA LITURGIA
O
leitor pode se perguntar por que o tema do amor é tão frequente em nossa catequese litúrgica. É que o amor, entendido como ágape, ou seja, o amor de Deus derramado em nossos corações pelo Espírito Santo que nos foi doado (cf. Rm 5,5) já no batismo, é o fundamento de tudo na vida cristã. Não se pode compreender e realizar a liturgia senão sob o prisma do amor de Deus. O que distingue o amor divino é sua abertura absoluta para fora, gerando a possibilidade da verdadeira O OMME N E NS SAAGGE EI IRROO DDEE SSAANNTTOO AANN TT ÔÔ N I O
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comunicação no coração humano. Se isso não for considerado, a liturgia torna-se palco de compensações subjetivas e vaidades que emperram a obra de Deus em seu momento de ação mais pontual e eficaz. Pois tudo o que Cristo operou enquanto possuía sua visibilidade na história agora o faz por meio da liturgia da Igreja, disse São Leão Magno (?-461). Agora o Ressuscitado, tão presente quanto antes, continua a obra da Salvação pela liturgia da Igreja. Esta catequese pretende responder a uma questão crucial: por que muitas vezes
subsiste uma espécie de vazio em algumas liturgias, apesar dos paramentos brilhantes e do rito aparentemente perfeito? Por trás dessa pergunta, está a questão: por que nem sempre a beleza e a ordem atingem seu objetivo? A única resposta é que falta o essencial: o amor. Em tais situações, deve haver mais amor subjetivo (amor humano), que redunda em interesse próprio, não em interesse pelo outro, que representa a assembleia orante. Xavier Zubiri (1898-1983), filósofo espanhol, despertou-me para a fé no amor de Deus, que é concreto e não mera teoria abstrata. Por
1. Para celebrar o mistério de Cristo, que é o auge do amor entendido como ágape, qualquer celebrante que não tenha a mínima experiência desse tipo de amor
comporta-se como um “peixe fora d’água”. Não tem desempenho algum. Por isso, um ministro litúrgico pode até ter conhecimento das rubricas, mas, se não viver no amor, atuará na liturgia de maneira fria, nervosa e até grosseira.
nenhuma carência ou reserva e, eternamente, são felizes por isso.
8. A liturgia apresenta a potência de revolucionar o imaginário humano, e este segue naturalmente um processo diferente do da Santíssima Trindade. 2. Na mesma linha, a falta de amor no Aqui, as pessoas amam infinitamente e coração do ministro se comprazem unicamenlitúrgico nunca o te em amar. Ali, elas viPor que nem sempre possibilitará de devem sonhando com ala beleza e a ordem sempenhar seu miguém que as ame sem atingem seu objetivo? nistério com verdalimite. A revolução está deira competência, em reverter o processo, A única resposta é pois não terá o ende tal forma que o sonho que falta o essencial: canto que leva ao êxpasse a ser outro: amar o o amor. Em tais situatase do amor. próximo e praticar o perções, deve haver mais dão ilimitadamente, faamor subjetivo (amor 3. Por outro lado, o mizendo, assim, uma muhumano), que redunda nistro que vive no dança radical de lugar, amor se encanta cada uma compreensão totalem interesse próprio, vez mais pela liturgia e mente nova da vida. não em interesse pelo terá prazer em conheoutro, que representa cer os ritos com suas 9. Nesse sentido, ágape a assembleia orante rubricas. Estas servirão é protagonista, pois toma como precioso camia dianteira de todo o pronho para conduzir ao Mistério. cesso que leva à autodoação. Jesus Cristo fez questão de afirmar que a sua vida 4. Sendo ágape o amor oblativo, sem o não estava sendo roubada, mas Ele mescomprometimento de vida com o projemo a estava doando: “Ninguém me arreto de Cristo, o ministro litúrgico que bata, mas eu a dou livremente” (Jo tentar buscar o próprio bem em um mi10,18). Por isso, o verdadeiro convertido nistério que só tem sentido no amor torna-se discípulo e missionário de Crisencontrará enorme dificuldade e criará, to, por causa da força mesma de ágape. certamente, obstáculos à participação Reza para que permaneça no ágape, pois da assembleia em sua busca de realizar sabe que fora dela não conseguirá amar na liturgia a experiência de Deus. a Deus e ao próximo como convém: fortificados por este alimento sagrado [...], 5. Portanto, celebrar a liturgia é um desafazei que perseverem na sinceridade do fio que extrapola o conhecimento ravosso amor aqueles que fortalecestes cional. É um saber que só se adquire com a infusão do Espírito Santo. com a entrega da vida a Cristo, para poder realmente viver no amor. 10. Então, além de ser uma questão de fé, liturgia é uma questão de amor. 6. Ao incrementar nossa vida no amor, a liturgia renova as relações com Deus e Na próxima catequese, abordaremos o com o próximo, alimentando o sonho resultado que se caracteriza como experiênde um mundo regido por ágape. cia de Deus na liturgia: o êxtase do amor. 7. A fonte das relações cristãs é o ágape, cujo modelo está na Santíssima Trindade. A relação entre as Pessoas divinas prima pela perfeição do ágape e, portanto, são infinitamente oblativas. Pai, Filho e Espírito Santo dão-se sem
Pe. Valeriano dos Santos Costa Doutor em Liturgia pelo Pontifício Ateneo Santo Anselmo, Roma. Professor adjunto na Faculdade de Teologia da PUC-SP
Arquivo pessoal
isso, afirmou que, na Bíblia, a tradução de ágape por caridade não é exata, pois ágape é o amor em si, e caridade são as obras que provêm dele. O amor em si é Deus e existe sem depender de nós, ao passo que a caridade depende da nossa comunhão com o amor de Deus e da ação que isso gera em cada pessoa. Só quando acolhemos o amor divino temos verdadeiras condições de praticar a caridade autêntica. Isso na liturgia é fundamental. Por isso, devemos atuar na liturgia movidos pelo amor de Deus e não por interesses humanos, muitas vezes encobertos por palavras e trejeitos de bondade e dedicação, mas na verdade é o ser humano buscando a si mesmo e não a Deus. Na primeira Carta aos Coríntios, o hino de São Paulo (5-67) ao amor mostra a capacidade que o amor de Deus tem de influenciar os nossos comportamentos: o amor é paciente, prestativo, não é invejoso, não se ostenta, não se incha de orgulho, nada faz de inconveniente, não procura o próprio interesse, não se irrita, não guarda rancor, não se alegra com a injustiça, mas se regozija com a verdade, tudo desculpa, tudo crê, tudo espera, tudo suporta (cf. 1Cor 13,4-7). É tudo o que o ministro litúrgico deve buscar como ser humano purificado e transformado pelo amor divino. Isso sim é uma pessoa verdadeiramente humanizada. Precisamos desse humanismo na liturgia. No trecho citado, há quinze verbos que colocam a pessoa em estado de comunhão. É preciso atingir essa sintonia interior para se conseguir amar. Evidentemente, não se está tratando da condição humana como tal, porque ninguém pode ser assim se não estiver sob o influxo do amor de Deus – ágape. Porém, esse amor nos é dado de forma gratuita por parte do Pai, por meio de Cristo. Já é tempo de acordar, disse o apóstolo Paulo aos Romanos (cf. Rm 13,11), para vivermos nessa dimensão de luz que nos é dada pela fé. Basta de pessoas infelizes pregando a felicidade! É nesse sentido que o papa Francisco (1936-) tanto falou no Brasil a respeito da obrigação de a Igreja mostrar sua felicidade ao mundo. Então, para concluir a catequese sobre o amor como critério fundante da liturgia, faço as seguintes observações:
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Noites maldormidas podem indicar
DISTÚRBIOS DO SONO
ormir é o momento em que o corpo e a mente descansam da rotina diária. Mas, estatisticamente, sabe-se que grande parte da população mundial não apresenta uma noite de sono reparadora. No Brasil, uma pesquisa recente (coordenada pela Sociedade Brasileira do Sono), que avaliou cerca de 43 mil pessoas das principais capitais do País, revelou que mais da metade da população (53,9%) não tem um sono restaurador. E 43% dos brasileiros apresentam sinais de cansaço no decorrer do dia. A necessidade de sono também é individualizada, passando pelas seguintes etapas: O sono REM (Rapid Eye Moviment, ou Movimentos Oculares Rápidos) é o do sonho. Os grandes músculos do corpo ficam paralisados para evitar a vivência. O sono NREM (que não apresenta movimentos oculares) é composto de quatro estágios, sendo um o mais superficial e quatro o mais profundo. Nessa etapa, podem surgir imagens mentais; no entanto, não há conteúdo. Durante toda a noite, os estágios intercalam-se.
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menshealth.hu
REPORTAGEM
DORMIR OU MORRER
NÃO TER UMA QUANTIDADE SUFICIENTE DE SONO A CADA NOITE PODE PROVOCAR SÉRIOS RISCOS À SAÚDE, PODENDO CAUSAR EFEITOS PERMANENTES NO CORPO E NA MENTE
RISCOS À SAÚDE CAUSADOS POR HORAS DE SONO INSUFICIENTES RECOMENDADA. MELHORA DA SAÚDE 7-9 horas QUANTIDADE COM CONTROLE DIÁRIO DO SONO.
5-7 horas QUANTIDADE MÉDIA QUE OS ADULTOS DEVEM DORMIR A CADA NOITE.
0-5 horas QUANTIDADE DE HORAS CONSIDERADA DE ALTO RISCO, PROVOCANDO PROBLEMAS DE SAÚDE.
2,5 VEZES DE RISCO MAIOR PARA DIABETES. 45% DE RISCO MAIOR PARA ATAQUE CARDÍACO. 12% DE RISCO MAIOR PARA MORTE EM QUALQUER CIRCUNSTÂNCIA.
CONSEQUÊNCIAS DA INSÔNIA NO CÉREBRO A FALTA DE SONO FAZ QUE PARTES DO CÉREBRO SE TORNEM MAIS LENTAS OU DESLIGUEM COMPLETAMENTE LOBO PARIETAL
LOBO FRONTAL
MATEMÁTICA E LÓGICA EFEITOS: PROCESSOS MAIS LENTOS DE PENSAMENTO E DIFICULDADE EM SOLUCIONAR PROBLEMAS LÓGICOS.
PENSAMENTO CRIATIVO EFEITOS: FALTA DE IMAGINAÇÃO OU ORIGINALIDADE; FALTA DE FOCO, GAGUEIRA; USO DE CLICHÊS NO DISCURSO.
Tradução MSA, ingoodmeasure.net
Os distúrbios do sono caracterizam-se como as dificuldades relacionadas a esse período de repouso, incluindo adormecer ou permanecer adormecido, dormir em momentos inapropriados, tempo total de sono em excesso ou comportamentos anormais relacionados ao sono. Segundo o doutor Maurício Bagnato (ex-presidente e atual secretário da Sociedade Paulista de Medicina do Sono. Atualmente, trabalha no Laboratório do Sono do Hospital Sírio-Libanês e do Instituto do Sono da Escola Paulista de Medicina), sacrificar o sono para realizar outras atividades não traz benefício nenhum, podendo acarretar sérios problemas à saúde. A insônia é o transtorno de sono mais comum. É caracterizada pela dificuldade em iniciar e/ou manter o sono e pela sensação de não ter um descanso reparador durante pelo menos um mês, causando prejuízo significativo em áreas importantes da vida do indivíduo. Geralmente aparece no adulto jovem, sendo mais frequente na mulher, e apresenta um desenvolvimento crônico. Além da insônia, outros transtornos mais citados são a apneia e o ronco. O ronco é um ruído provocado por estreitamento ou obstrução nas vias respiratórias superiores durante o sono. Esse estreitamento dificulta a passagem do ar e provoca a vibração dessas estruturas. Ele pode ser considerado normal, quando a pessoa está dormindo em decúbito dorsal (de costas), por exemplo, porque a musculatura da garganta fica mais flácida e a língua cai um pouco para trás. Mas é classificado como
CÓRTEX PRÉ-FONTAL
NEOCÓRTEX
PENSAMENTOS E AÇÕES EFEITOS: VISÃO TURVA E ALUCINAÇÕES.
MEMÓRIA/APRENDIZAGEM: DIFICULDADE EM APRENDER NOVAS TAREFAS E REALIZAR NOVAS CONEXÕES. LOBO TEMPORAL FALA EFEITO: FALA ARRASTADA.
patológico, quando ocorrem grandes vibrações e ruído intenso. Na apneia, há uma parada repetida e temporária da respiração durante o sono. Ela pode ocorrer com a frequência de uma interrupção por minuto e só termina quando o cérebro percebe a queda na oxigenação, funcionando quase como um despertador rápido, para que a pessoa volte a respirar. Existem alguns tratamentos paliativos para o ronco e a apneia que podem
trazer resultados satisfatórios. Entre eles, indica-se o uso de uma pequena máscara nasal cuja função é manter a faringe mais aberta para o ar fluir melhor. Restabelecida a oxigenação normal, o sono volta a ficar profundo e sem fragmentação e, consequentemente, a pessoa passa a descansar melhor. O exame feito para investigar os distúrbios do sono denomina-se polissonografia. No Brasil, ele é realizado em hospitais e clínicas especializados. O M E NN SSAAGGEEIIRROO DDEE SSAANNT TOO AANNT TÔ ÔN NI OI O Outubro ddee 22001133 Outubro
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É importante lembrar que o diagnóstico correto sobre cada distúrbio e o estudo para descobrir suas causas são essenciais para o correto tratamento do transtorno. A partir daí, o especialista vai indicar as medidas psicológicas e medicamentosas necessárias para cada caso. “É necessário realizar exames detalhados no paciente, para diagnosticar o tipo de distúrbio, porque, muitas vezes, ele nem sabe que tem o problema”, explicou doutor Mauricio. Vale lembrar que o uso excessivo e descontrolado de remédios para dormir causa dependência, em vez de resolver o problema. “Os remédios viciam, por isso é necessário cuidado no uso deles. Medicamentos sedativos e hipnóticos fazem que a pessoa acabe associando o remédio a um sono contínuo, criando uma dependência”, alertou o especialista. EXEMPLOS DE DISTÚRBIOS DO SONO Bruxismo – é uma alteração do sono, de movimento. Não é tão frequente e muitas vezes o paciente não percebe que tem o problema e chega ao consultório por outro sintoma. O dentista é capaz de detectar o problema por causa do desgaste dos dentes. O paciente pode apresentar dores de cabeça e na mandíbula e ter seu sono afetado. O tratamento pode ser feito com o auxílio de placas de silicone entre os dentes. Narcolepsia – este é um transtorno relativamente comum. É um tipo de dissonia (distúrbios de sono classificados como problemas do sistema nervoso predominantemente orgânicos, mas com expressivos fatores psicológicos). Seus sintomas mais expressivos são a “preguiça” e a sonolência diurna excessiva, fazendo que a pessoa apresente dificuldades ao realizar atividades cotidianas. O tratamento requer mudanças no estilo de vida e o uso de remédios estimulantes para manter a pessoa desperta. Paralisia do sono – pode ser associada à narcolepsia e é um fenômeno no O MENSAGEIRO DE SANTO ANTÔNIO
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CONSEQUÊNCIAS DA FALTA DE DORMIR NO CORPO AUMENTO DE APETITE DE ALIMENTOS SALGADOS E GORDUROSOS A FALTA DE SONO ATIVA O SISTEMA NERVOSO SIMPÁTICO (SNS) DO CORPO, CAUSANDO ARMAZENAMENTO DE RESERVAS DE GORDURA E LIBERANDO HORMÔNIOS QUE IMPEDEM A PESSOA DE REPOUSAR À NOITE.
MENOS DE 7 HORAS DE SONO = GANHO DE PESO REDUÇÃO DA PRODUÇÃO DE LEPTINA = AUMENTO DE APETITE
CONDUÇÃO DE VEÍCULOS PREJUDICADA EM TESTES DE DIREÇÃO, ADULTOS QUE PERMANECERAM ACORDADOS POR LONGO PERÍODO TIVERAM O MESMO DESEMPENHO DE MOTORISTAS ALCOOLIZADOS.
17 - 19 HORAS SEM SONO EQUIVALEM A 0,05 dg/L (DECIGRAMAS DE ÁLCOOL POR LITRO DE SANGUE) 21 HORAS SEM SONO EQUIVALEM A 0,08 dg/L (DECIGRAMAS DE ÁLCOOL POR LITRO DE SANGUE) LEGALMENTE EMBRIAGADO
COMO TER UM SONO MELHOR O ESTABELECIMENTO DE UM PADRÃO NOTURNO DE SONO AJUDA A DORMIR MELHOR E A MELHORAR A SAÚDE RECOMENDADO: 7 HORAS DE SONO 60 MINUTOS DE INTERVALO ESTABELEÇA UM RITMO NATURAL IR PARA A CAMA E ACORDAR EM UM INTERVALO DE 60 MINUTOS. INTERVALOS DIÁRIOS ESTABELECEM OS RITMOS CARDÍACOS NATURALMENTE. .
60 MINUTOS ANTES DE DORMIR EVITE DISTRAÇÕES DESLIGUE A TV E O COMPUTADOR, APAGUE AS LUZES, OUÇA MÚSICA SUAVE OU LEIA UM LIVRO.
90 MINUTOS ANTES DE DORMIR TOME UM BANHO AQUECER O CORPO SEGUIDO POR RESFRIAMENTO LENTO PROVOCA RELAXAMENTO E SONOLÊNCIA.
EVITE ESTIMULANTES
DESLIGUE SEU CÉREBRO
CONTROLE O PESO
MESMO QUE VOCÊ ADORMEÇA DEPOIS DE TOMAR UM ENERGÉTICO, ESTIMULANTES INTERFEREM NA PRODUÇÃO DE MELATONINA, QUE RESULTA EM BAIXA QUALIDADE DO SONO E LENTIDÃO PELA MANHÃ.
EVITE ATIVIDADES RELACIONADAS AO TRABALHO OU AO LAZER QUE SOBRECARREGAM SEU CÉREBRO, COMO FILMES DE TERROR, CERCA DE UMA HORA ANTES DE DORMIR.
DORMIR POUCO AUMENTA AS TAXAS DE OBESIDADE E O GANHO DE PESO ELEVA O RISCO DE EFEITOS COLATERAIS ADVERSOS, COMO APNEIA DO SONO E HIPERTENSÃO.
qual a mente desperta, mas o corpo não. Nesse distúrbio, a pessoa tem a sensação de morte iminente. Dura apenas alguns segundos e é um descompasso entre
corpo e mente. O problema pode ser acompanhado ou não de alucinações. Alguns medicamentos podem ser usados para tratar o distúrbio.
Tradução MSA, ingoodmeasure.net
REPORTAGEM
Síndrome das pernas inquietas – este distúrbio é causado por uma alteração química no cérebro. Existe ligação genética e ele é tratado com remédios e exercícios físicos, que ajudam a melhorar a angústia nas pernas. Sonambulismo – mais comum em crianças, o sonambulismo, ou parassonia (manifestação noturna em forma de movimentos anormais durante o sono, resultando em interrupções no período de descanso), só precisa de ajuda médica quando causa problemas, pois ele tende a desaparecer com o tempo. Todavia, o mal também pode afetar adultos e seu principal risco é relacionado aos acidentes com escadas, objetos, janelas etc. O sonambulismo não apresenta relação com problemas mentais ou psicológicos e há tratamentos medicamentosos para tratar o distúrbio, que pode ter ligação genética, já que parentes de sonâmbulos possuem
dez vezes mais chances de apresentar o mal do que aqueles que não possuem ninguém na família com o distúrbio. Terror noturno – distúrbio caracterizado por gritos durante o sono acompanhado do semblante de terror, como se a pessoa estivesse vendo algo terrível durante o sono. Geralmente começa com manifestações comportamentais de intenso medo (ainda durante o sono), culminando em um despertar
abrupto com um grito de pânico e respiração agitada. Normalmente, inicia-se na primeira parte do sono e dura entre 1 e 10 minutos. Após acordar, a pessoa pode esquecer o teor do que sonhou. Transtorno Alimentar Noturno – tipo de parassonia no qual a pessoa se levanta durante o sono para comer. As pessoas que sofrem desse mal não necessariamente atacam a geladeira à procura de alimentos saborosos. Elas comem o que encontram e, geralmente, fazem combinações esquisitas, por exemplo, feijão com goiabada O tratamento também é realizado com medicação associada ou não à terapia. DICAS PARA UMA BOA NOITE DE SONO O tempo necessário para um sono reparador varia entre as pessoas. Aparentemente, os idosos dormem menos. Entretanto, o tempo que passam dormindo pode ser exatamente o mesmo que tinham na mocidade, dividido em períodos mais curtos e de sono mais superficial. É importante lembrar que dormir bem melhora o humor, ativa a memória, previne doenças e é um dos segredos para a longevidade. Entre as dicas para uma boa noite de sono, estão:
Sandra Alves Repórter
Arquivo pessoal
Getty Images
• Comer alimentos leves. • Manter regularidade na hora de dormir e de despertar. • Não permanecer na cama fora do horário de dormir. • Dormir em um ambiente silencioso e escuro. • Reduzir o consumo de cafeína (presente no café, chás, chocolates etc.). • Evitar o consumo de álcool.
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O retorno do filho pródigo, Rembrandt Harmenszoon van Rijn
A IGREJA NA HISTÓRIA
Que espiritualidade, a do amor ou a do temor? Entre graça e liberdade
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A
s histórias da Igreja de que dispomos costumam deixar de lado um aspecto importante da vida cristã, dimensão que influencia profundamente seu meio e por ele é influenciado, do mesmo modo como ocorre com a cultura, as artes, a filosofia, a política, a economia e tantos outros aspectos da vida em sociedade. Esse aspecto a que me refiro é a espiritualidade, que assume características diversas, em cada momento da história da Igreja, de acordo com as moções do Espírito que leva os discípulos de Jesus, séculos após séculos, a responder com radicalidade e novidade aos desafios próprios de cada época. Porém existe uma razão para esse “esquecimento”, a espiritualidade é menos visível, ainda que produza frutos e consequências muito concretas na vida das pessoas. Toda autêntica espiritualidade é um modo de viver a vida cristã em um contexto bem particular, ao qual responde, confrontando-o ou sendo favorável a ele. Por vezes, as grandes reformas da Igreja aconteceram por meio da espiritualidade de alguns homens e mulheres que se deixaram conduzir pelo Espírito para viver fielmente o Evangelho e, só depois, a instituição hierárquica aceitou determinado caminho apontado por um santo ou místico. Penso que seria muito interessante se pudéssemos contar a história da Igreja por meio da história dos santos produzidos pelas épocas. Eles e elas, com suas opções e estilos, contam vivamente a história dessa comunidade a que pertencemos, nossa família católica. Mas o que a espiritualidade característica desse período pode nos contar sobre o século XVII? É o que iremos descobrir! Predominou no cenário europeu do século XVI (portanto um século antes), política e espiritualmente, a Península Ibérica, de modo especial a Espanha de Santa Teresa d’Ávila (1515-1583) e São João da Cruz (1542-1502), dois doutores da Igreja, místicos e contemplativos, reformadores da ordem carmelitana. Espanha que também foi pátria de Santo Inácio de Loyola (1491-1556), fundador dos jesuítas e de uma espiritualidade que moldou muitos eclesiásticos pelo método dos exercícios espirituais, e de São Francisco Xavier (1506-1552), Padroeiro das Missões. Todos eles voltados a uma reforma da Igreja, interna e externamente, ideia central no século XVI. Já o século XVII viu despontar a França como grande potência política e também
espiritual. Esse foi um século francês, em que reinaram o rei Luís XIII (1610-1643) e o rei Luís XIV (1643-1715), o Rei Sol, ambos da casa de Bourbon. No campo espiritual, moral e mesmo doutrinal, surgiu um movimento conhecido como jansenismo, porque foi levado a cabo por Cornelius Jansen (1585-1638), autor de Augustinus, seguido por Jean Du Vergier, mais conhecido por Saint-Cyran (1612-1694), nome do mosteiro de que se tornou abade, e pelos irmãos Antonio (?-1694) e Angélica Arnauld (1591-1661), a qual foi notável pelo trabalho reformador em Port-Royal, um mosteiro feminino cisterciense. Esses foram os principais expoentes do movimento jansenista sobre o qual também refletiremos neste artigo. O jansenismo foi uma resposta a duas situações peculiares de seu tempo: 1) Ao laxismo (uma espécie de relaxamento das exigências morais, visto como permissividade na forma de viver as exigências da vida cristã, diríamos hoje, uma espécie de cristianismo light, de que eram acusados principalmente os jesuítas em relação ao povo e os eclesiásticos em relação ao Estado). 2) Às controvérsias sobre a graça, levantadas pelos protestantes no século anterior, ainda muito vivas nas discussões teológicas entre ordens religiosas. Faz-se necessário clarear dois pontos, antes de avançarmos. Houve, de fato, um laxismo, tanto da parte dos teólogos quanto da parte do clero, então funcionário do Estado francês. Foram muitos problemas que advieram dessa situação, afinal era quase uma regra que, onde reinava um excessivo bem-estar econômico, também abundavam imoralidades. A máxima de Antonio Rosmini (1787-1855) resume a situação do episcopado no antigo regime: “Escravos de homens finamente vestidos, em vez de livres apóstolos de um Cristo despido”. Se, de um lado, reinavam
o luxo e a pompa, de outro havia uma massa de pobres, aos quais também muitos homens e mulheres da Igreja se puseram a servir, fundando congregações religiosas de acordo com as categorias de pessoas necessitadas: órfãos, viúvos, doentes, educação das meninas, dos meninos, e assim por diante. Do ponto de vista da teologia moral, muito se discutia nas universidades sobre a questão da graça, uma vez que o Concílio de Trento (1585-1563), sem fechar a questão, salvaguardou (garantiu) dois pontos basilares fundamentais (nem sempre bem equilibrados por católicos e protestantes): a liberdade humana e a graça divina. O modo como elas se conciliavam na vida de cada fiel, porém, ficava em aberto e muitas escolas teológicas buscavam explicar tal relação. Dominicanos e jesuítas diferiam em muitos pontos. Os primeiros estavam mais voltados a dizer que a graça predeterminava a ação humana, enquanto os jesuítas, com o religioso Luís de Molina (1535-1600), se inclinavam mais ao livre consentimento do homem: o homem permanecia livre para aceitar ou não a graça recebida de Deus. Um pouco antes, por volta de 1550, certo Miguel Baio (1513-1589) estava divulgando suas ideias sobre a corrupção total da natureza humana, de modo que o ser humano não dispunha de livre-arbítrio para resistir à graça divina. Isso quer dizer que, se Deus lhe desse a graça, então necessariamente o homem não pecaria, mas isso por coação da graça e não por livre escolha de quem vê e quer optar pelo bem na sua consciência. Por terem partido em missão com diferentes povos e se lançado na pastoral, no contato vivo com as pessoas, os jesuítas criaram situações muito boas e outras nem tanto. Uma delas foi que se devia analisar caso a caso e de acordo com isso se dar um parecer, o que ficou conhecido como casuística e degringolou para um laxismo, O MENSAGEIRO DE SANTO ANTÔNIO Outubro d e 2 0 1 3
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“Por que às vezes Deus dá a graça e em outras não?” Muito simples: para Jansen, Cristo não morreu por todos, mas pelos eleitos, e só a eles é dada a graça eficaz para vencer o pecado. Aí temos uma primeira e perigosa consequência: Jesus derramou “seu sangue somente por um grupo restrito de eleitos. Seja qual for essa tendência, está bem clara no jansenismo a inclinação em transformar a Igreja de uma sociedade em que há lugar para todos, de uma rede lançada ao mar que recolhe peixes bons e maus, santos, pecadores e tíbios, publicanos e meretrizes, desde que façam penitência, em uma seita, em um conventículo de poucos eleitos” sociedade em que há lugar para todos, de uma rede lançada ao mar que recolhe peixes bons e maus, santos, pecadores e tíbios, publicanos e meretrizes, desde que façam penitência, em uma seita, em um conventículo de poucos eleitos” (Martina, p. 206). Como contraponto, notamos que os jesuítas defendiam o contrário; por sua experiência missionária, eles diziam que também os que
não conheciam Deus realizavam boas ações e podiam fazer coisas boas; ou seja, para eles, como para a Igreja Católica como um todo, a natureza humana não foi totalmente corrompida, foi ferida sim, precisa da graça, mas não realiza só e unicamente o mal. E mais: Jesus morreu e quer a salvação de todos, todos os povos, raças e nações. Este artigo continua na próxima edição, mas permanecem estas questões, com base no presente: “Vocês perceberam esse traço mais pastoral (e jesuíta) no papa Francisco (1936-)? Isso é bom ou é ruim? Pelas palavras e atitudes do pontífice, podemos perceber que ele está construindo uma Igreja para uns poucos santos e perfeitos, ou para muitos, desde que queiram abraçar com humildade o Evangelho?” É importante percebermos como questões levantadas no passado sempre iluminam o presente. Continuamos no mês que vem. Até lá... Paz e bem! REFERÊNCIA BIBLIOGRÁFICA MARTINA, Giacomo. De Lutero a nossos dias: a era do absolutismo. 2. ed. São Paulo: Loyola, 2003. v. 2.
José Tarcísio de Castro Bacharel em Teologia Pastoral
Arquivo pessoal
que justificava muita coisa não tão coerente com o Evangelho. A questão é complicada e implica uma visão de ser humano e de Deus que aqui não podemos aprofundar. Mas o importante é saber que ela existiu e que influenciou muito a espiritualidade, a relação do homem com Deus. Dependendo de onde nos colocamos, essa visão teológica possui consequências muito concretas na vida de cada um. Afinal, se a graça determina tudo, então não temos responsabilidade nem pelos atos bons, nem pelos atos maus (que só podem acontecer quando Deus não nos dá a graça). É como se responsabilizássemos Deus tanto pelo bem quanto pelo mal. Por outro, pode parecer que o ser humano é quem faz e desfaz, escolhe, decide e tem força para resistir sozinho às más inclinações (oriundas do pecado original) em si. E todos sabemos, assim como o apóstolo Paulo, que não é bem assim (cf. Rm 7,19). No meio de toda essa “confusão”, é interessante lembrar da solução prática de Santo Inácio de Loyola: “Devemos fazer todas coisas como se tudo dependesse somente de nós e esperar tudo como se dependesse somente de Deus”. Mas, voltando, lembramos que as ideias de Miguel Baio, de que falamos anteriormente, foram condenadas pela Igreja por Pio V (1504-1572), em 1567, e por Gregório XIII (1502-1585), em 1580. Mesmo assim, Baio foi a inspiração, com Santo Agostinho de Hipona (354-430), de Jansen (que inspirou Saint-Cyran, o qual, por sua vez, foi orientador de Antonio e Angélica Arnauld), em seu pessimismo antropológico. Resumindo, o homem faz o bem quando Deus lhe dá a graça e segue sua concupiscência quando Deus não lhe dá a graça. Isso porque, para Jansen (como para Martinho Lutero [1483-1546] e João Calvino [1509-1564]), a natureza humana foi totalmente corrompida pelo pecado original, tornando-se incapaz de fazer o bem por si mesma. Aqui, talvez uma dúvida cruel o esteja atormentando, assim como a mim: “Por que às vezes Deus dá a graça e em outras não?” Muito simples: para Jansen, Cristo não morreu por todos, mas pelos eleitos, e só a eles é dada a graça eficaz para vencer o pecado. Aí temos uma primeira e perigosa consequência: Jesus derramou “seu sangue somente por um grupo restrito de eleitos. Seja qual for essa tendência, está bem clara no jansenismo a inclinação em transformar a Igreja de uma
Funeral religioso na abadia de Port-Royal, releitura de Horthemels Louise-Magdeleine
A IGREJA NA HISTÓRIA
Evangelhos DominicaiS
A exortação aos apóstolos, James Tissot
C O M E N T A D O S
6 DE OUTUBRO
27o DOMINGO DO TEMPO COMUM Lc 17,5-10 Se vós tivésseis fé!
J
esus continua à mesa, cercado por discípulos e pecadores. À mesa, revelou aos fariseus e aos escribas a misericórdia do Pai (cf. Lc 15,1ss.) e
ensinou aos discípulos como pô-la em prática (cf. Lc 16). Nessa altura, antes de iniciar a última etapa de sua caminhada para Jerusalém, aponta a misericórdia como “alma” da comunidade, nas suas relações internas e externas. Seu ensinamento materializa-se O MENSAGEIRO DE SANTO ANTÔNIO Outubro d e 2 0 1 3
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em quatro palavras: duas aos discípulos (cf. Lc 17,1) e duas aos apóstolos (cf. Lc 17,5), que, para Lucas, são só os Doze. A primeira palavra é sobre o escândalo (vv. 1-2). Deus não pode impedi-lo, pois nos criou livres e respeita a nossa liberdade. O escândalo, evidentemente, é um mal, aliás, um mal muito grave, pois induz o irmão ao erro. Mas, por que Deus nos ama – sobretudo quando erramos, na esperança de converter-nos –, o escândalo torna-se o lugar da máxima misericórdia. Da boca de Jesus sai, portanto, não uma palavra de maldição, como, às vezes, pensamos, mas uma palavra de lamento e dor por aquele que erra: “Ai de mim por vós!” A segunda palavra é sobre a correção fraterna (vv. 3-4). A correção fraterna é ajuda para o irmão sair do pecado que o enredou. A comunidade dos discípulos e discípulas de Jesus não é uma seita de puros, mas uma santa comunidade de pecadores. Ainda pode pecar e, de fato, peca. Por isso, entre seus membros, deve existir aquele perdão que o Pai nos dá assim como o damos aos irmãos que erram (cf. Lc 11,4). Devemos perdoar-nos uns aos outros como o Senhor nos perdoou em Cristo (cf. Ef 4,32). A acolhida incondicional do irmão que erra (cf. Lc 15) não contradiz nem elimina a correção fraterna. A acolhida é mãe da correção fraterna, filha do seu coração e da sua mente. A correção fraterna exprime, ao mesmo tempo, a caridade e a verdade, unidas para trazer de volta o irmão que erra. A terceira palavra dirige-se aos apóstolos, que pedem um aumento de sua fé (vv. 5-6). A fé não é outra coisa senão experiência da misericórdia de Deus, que leva a amar o irmão pecador como fomos, primeiro, amados por Deus. Ela é, ao mesmo tempo, fonte da vida nova da comunidade e fonte da missão aos distantes. A última palavra (Evangelho de amanhã) é sobre a gratuidade do ministério apostólico (vv. 7-10), cuja finalidade é prolongar no tempo e no espaço a misericórdia do Pai, que mostrou sua face humana em Cristo. A gratuidade é sinal essencial do amor e, por isso, é marca registrada dos que pertencem a Cristo. Ela nos torna como Ele, que se fez livremente servo de todos. Torna-nos como Ele, escravos por amor e, assim, livres como o Pai. A misericórdia que o discípulo precisa ter para superar o escândalo e perdoar de verdade (vv. 1-4) não só não é alheia à fé, mas é justamente aquela experiência radical de fé da qual brota a missão, que outra coisa não é senão testemunho do amor livre e gratuito do Pai (vv. 5-10). Temos, portanto, de fazer nosso o pedido dos discípulos: “Senhor, aumentai a nossa fé!” (Lc 17,5). O MENSAGEIRO DE SANTO ANTÔNIO
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13 DE OUTUBRO
28o DOMINGO DO TEMPO COMUM Lc 17,11-19 Não houve quem voltasse para dar glória a Deus, a não ser este estrangeiro
C
om o Evangelho de hoje, começa a terceira e última etapa da viagem a Jerusalém. Passagem obrigatória é Jericó, cidade mais antiga do mundo, porta da terra prometida (cf. Js 6). Só quem possui as mãos limpas e o coração puro pode subir o monte do Senhor (cf. Sl 24[23],3ss). Só o Justo possui forças para fazer a santa viagem (cf. Sl 84[83],6). Não é o nosso caso. Mesmo assim, pecadores e fugitivos, temos de subir a Jerusalém. A Sua palavra nos envia a fazer o que para nós é impossível. Mas Ele, único peregrino em condições de fazer essa viagem, no-la torna possível. Ele, com efeito, é o samaritano que vem ao nosso encontro, para assumir nossa lepra. Lucas quer levar o seu leitor à invocação que os leprosos de hoje (cf. Lc 17,13) e o cego da próxima
A cura dos leprosos, James Tissot
semana (cf. Lc 18,38) farão Àquele que pode salvá-los: “Jesus, Senhor, tem piedade”! A invocação dos leprosos será coletiva; a do cego, pessoal. É a invocação do Nome, que o monaquismo oriental, sobretudo russo, popularizou sob o nome de “Oração de Jesus”. A narração da cura dos leprosos é extremamente dinâmica: muda de cena a cada versículo; contém uma dezena de verbos de movimento; fala não da possibilidade, mas da realidade do impossível. A Salvação, que ninguém pode alcançar por si próprio, já foi dada àqueles dez leprosos. A partir daí, eles se encontram no mesmo caminho d’Aquele que veio para procurar a todos. Por ora, porém, só um tem a fé que salva e encontra o Salvador e, por isso, torna-se responsável pelos outros nove, para que se sintam curados e voltem ao Salvador, reconhecendo o dom recebido e dando ação de graças. A Salvação, na verdade, não é ser curado da lepra, mas encontrar-se com Aquele que nos cura. Nenhum copo d’água mata a sede, que sempre volta; é preciso encontrar a fonte, de onde jorra a água viva. Além disso, ao dom deve corresponder o dar graças. Na verdade, o dom só é completo quando acolhido com gratidão. Por isso, a Salvação vive daquela dinâmica que alguém chamou do “já” e do “ainda não”. A salvação “já” está oferecida a todos, mas “ainda não” foi acolhida por todos. Estatisticamente, diríamos que 90% ainda não sabem que a sua vida “já” foi remida da morte e, consequentemente, “ainda” vivem e morrem como leprosos. São semelhantes ao passarinho, preso
na gaiola, que não sabe que... a porta está aberta. Aqueles 10% (na verdade, aquele um) que voltam para dar graças são enviados a todos os demais para levar a boa-notícia: “Abram os olhos e vejam a luz!” O anúncio deve levar a encontrar e a aceitar o dom com gratidão. O dom só é plenamente dom quando aceito em um coração alegre e agradecido. Em Lucas, essa é a primeira vez que Jesus é chamado por nome, ressaltando o encontro verdadeiramente pessoal entre aquele que, impotente diante da sua necessidade, invoca e aquele que é invocado. O Lucas dos Atos como que comenta o Lucas do Evangelho: “Em nenhum outro existe salvação; de fato, não há outro nome dado aos homens debaixo do céu no qual podemos ser salvos” (At 4,12). O apelo do Evangelho de hoje é límpido como os leprosos depois da cura: somos chamados a identificar-nos com os leprosos que se tornam semelhantes a crianças (cf. 2Rs 5,14; Lc 18,15ss). Depois, teremos de nos tornar como o rico que se converte em Zaqueu (cf. Lc 18,18ss; 19,1ss). Sobretudo, temos de ser transformados no cego de Jericó, que o encontro com Jesus iluminou (cf. Lc 18,35ss) como sol de meio-dia às portas da terra prometida. Os leprosos são agraciados pela misericórdia de Jesus. Ele não recua diante deles. Ele não impede que d’Ele se aproximem. Ele ouve seu grito, Sua misericórdia os cura e devolve ao convívio social. Mas somente um volta para agradecer! Esse um somos nós, que, na celebração eucarística, nos reunimos para louvar, bendizer e agradecer ao Senhor. Não somos melhores que os outros. Somos apenas seus representantes no gesto de agradecer. Eucaristia é reconhecer a Salvação que Deus nos dá. Eucaristia é ação de graças.
20 DE OUTUBRO
29o DOMINGO DO TEMPO COMUM Lc 18,1-8 Deus fará justiça aos seus escolhidos que gritam por ele.
É
a parte final do “pequeno apocalipse” de Lucas, que começa com uma palavra sobre a fé [“Levanta-te, caminha, a tua fé te salvou” (Lc 17,19)] e termina com uma palavra sobre a fé [“Quando o Filho do Homem voltar, encontrará ainda fé sobre a terra?” (Lc 18,8a)]. Responde à pergunta O MENSAGEIRO DE SANTO ANTÔNIO Outubro d e 2 0 1 3
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