Adahora estrela
Com diversas estatuetas da temporada de premiações em mãos, podemos dizer que Patricia Arquette vive o melhor momento de sua carreira. Mas continua com os dois pés fincados no chão, como atestamos em um simpático bate-papo com a estrela de Boyhood – Da Infância à Juventude
Boyhood – Da Infância à Juventude DISPONÍVEL NO NOW
por Sarah Mund, de Los angeles
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COM FALA ELOQUENTE, EMBORA em voz baixa, Patricia Arquette parece hipnotizar a plateia de jornalistas que ansiosamente aguardam sua vez para entrevistar uma das atrizes mais badaladas do momento. Mas ao contrário do que se possa imaginar, a veterana de 46 anos está longe de ter uma aitude arrogante tipo “rei na barriga”. Mesmo depois de levar para casa uma estatueta do SAG Awards e uma do Globo de Ouro, o que a elevou como favorita ao Oscar de Melhor Atriz Coadjuvante por Boyhood – Da Infância à Juventude, sua primeira indicação ao prêmio da Academia. Com o mesmo afinco com que se dedica a projetos independentes onde pode deixar fluir seu lado artístico, como o longa de Richard Linklater que foi filmado ao longo de 12 anos, ela também investe em trabalhos comerciais que lhe garantem o “pão nosso de cada dia”, como a série CSI: Cyber, que ainda não tem previsão de estreia no Brasil. “A indústria do cinema mudou nos últimos anos e muita gente boa está sofrendo para encontrar um papel, sem contar que poucos filmes pagam bem hoje em dia. Adoro fazer trabalhos menores em nome da arte, mas quando eles acabam tenho que me preocupar em como alimentar meus filhos. E aí entra a televisão. Já vi muitas pessoas recusarem trabalho por achar que o material não está à sua altura. Depois de um tempo, ninguém mais as procura. Então eu me sinto grata pela oportunidade”, explicou a atriz, quando perguntada por que decidiu voltar para a TV mesmo depois de tantos trabalhos de prestígio no cinema – além de seus filhos serem fãs da franquia CSI. Os holofotes voltaram a ela por sua interpretação de uma mãe que só se envolve em relacionamentos tumultuosos enquanto seus filhos passam pela infância, e Patricia se mostrou surpresa com toda a atenção que o filme atraiu. “É estranho. Amor à Queima Roupa (1993) foi superbem nas bilheterias e ninguém prestou muita atenção; depois estive em filmes superinteressantes, como Estrada Perdida (1997) e nada aconteceu. Tenho 46 anos e estou nesse negócio há muito tempo, então não esperava algo assim a essa altura da minha vida”, admitiu. Mas ela não é a única a atrair olhares da crítica, da indústria e dos colegiados das principais premiações do cinema. Richard Linklater, mais uma vez em parceria com Ethan Hawke, se confirma como um diretor de projetos de fôlego: Boyhood levou 12 anos para ser filmado e sua trilogia Antes do Amanhecer (1995), Antes do Pôr do Sol (2004) e Antes da Meia-Noite (2013) só foi concluída depois de oito. Temporada de prêmios – Acima, Patricia Arquette posa com as estatuetas do Globo de Ouro e do SAG Awards, e sua atuação em Boyhood – Da Infância à Juventude colocou a atriz à frente na corrida do Oscar de Melhor Atriz Coadjuvante; na imagem maior o momento em que seu nome foi anunciado como finalista ao prêmio da Academia de Artes e Ciências Cinematográficas pela primeira vez
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INTENSAMENTE PATRICIA A atriz transita como ninguém entre o cinema e a televisão. Confira alguns de seus papéis mais marcantes nas duas frentes
BOARDWALK EMPIRE (2013-2014) > Ela só participou do quarto e do quinto ano, mas sua atuação como a dona de um bar clandestino que mantém conexões com a máfia foi marcante.
ED WOOD (1994) > No divertido retrato que Tim Burton criou do diretor conhecido como o pior da história do cinema, ela se destaca no papel de uma atriz desajustada que cruza o caminho do cineasta.
MEDIUM (2005-2011) > Possivelmente o papel pelo qual é mais lembrada, uma mãe de família que durante o sono tem visões de como pessoas morreram e usa esse dom para ajudar nas investigações da polícia.
STIGMATA (1999)> Nesse terror a atriz vive uma cabeleireira que passa a exibir manifestações físicas dos estigmas de Cristo e a verdade por trás disso pode prejudicar o futuro da Igreja Católica.
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Mas mesmo com todos os méritos do filme, que consegue fazer uma transição quase imperceptível do tempo, não dá para negar que as atenções estão mesmo voltadas para Patricia. Mesmo que ela e seus três irmãos não tenham sido criados para se tornarem atores, todos acabaram seguindo a vocação familiar que vem desde os bisavós – sendo David Arquette o segundo mais conhecido, especialmente pela franquia de terror Pânico. “Nós não sabíamos que nossa casa era diferente, mas sem dúvida as coisas pareciam mais dramáticas e divertidas. Em nenhum momento nossos pais nos orientaram a virarmos artistas, mas de qualquer forma foi o que acabaram fazendo”, relembrou a atriz sobre a infância. E, ao que tudo indica, sua filha Harlow (12 anos) corre sério risco de seguir o mesmo caminho, sendo que Enzo (26) já entrou para a profissão: “Me lembro que costumávamos brincar de sermos uma família de ursos, mas de um jeito muito complexo envolvendo as
emoções e os sentimentos de cada um. Acho que outras famílias não passariam horas se divertindo com isso”, contou, entre risos. Além da aptidão para atuação, a criação que o casal de atores Lewis Arquette (1935-2001) e Brenda Denaut (1939-1997) deu aos filhos deixou outra marca em Patricia: manter os pés no chão. “A infância de qualquer um traz influências para a vida adulta. Passamos por muitas dificuldades e chegamos a morar em uma comunidade hippie onde tudo era dividido. Quando nos mudamos de lá e as crianças me perguntavam que tipo de carro meu pai tinha, eu nem sabia que existiam marcas melhores que outras, eu só dizia que não era um caminhão. Eu sei o que é pobreza, não ter sapatos para usar e passar fome. Então nunca levei a sério essa ilusão de fama que Hollywood cria, porque, quando me tornei mãe solteira com 20 anos, tive que enfrentar as mesmas dificuldades que meus pais passaram, sem saber como criar uma criança sem dinheiro”, revelou. Por isso não é de se estranhar que, diferente de outros atores que negam trabalhos que não tragam prestígio, Patricia Arquette não pense duas vezes antes de se comprometer com produções mais comerciais. “Há mais oportunidades para mulheres na tele6 0 + M on e t + M A R Ç O
visão e tenho orgulho de fazer parte de uma indústria que incentiva as mulheres”, afirmou, revelando suas posições feministas e em defesa da privacidade, inclusive dos famosos. “Existe uma química de amor e ódio em relação às celebridades e isso se mostrou muito com as atrizes que tiveram fotos íntimas roubadas. Esse é um crime muito sério, mas as pessoas acham que têm algum poder sobre a sexualidade dessas mulheres”, opinou, para depois lançar mão de uma comparação certeira. “Se fossem fotos das esposas dos nossos soldados que estão no Afeganistão, a reação teria sido outra. É preciso ser realista. Quando você passa meses a milhares de quilômetros de distância da pessoa que ama, vai tentar manter a intimidade de alguma forma, como mandar imagens íntimas. A sociedade tem a tendência de condenar a vítima, mas imoral é quem se acha no direito de compartilhar imagens que não lhes pertence”, advogou em defesa de jovens atrizes como Jennifer Lawrence e Kirsten Dunst, confortável como formadora de opinião.
FOTOS: GETTY IMAGES E DIVULGAÇÃO
Laços de família – As filmagens para o cinema envolvem os atores geralmente por alguns meses, mas o caso de Boyhood – Da Infância à Juventude não se aplica à regra. Depois de 12 anos voltando para reprisar seus papéis, é de se esperar que o elenco tenha criado uma conexão especial, como é fácil notar a cada encontro para promover o longa. Nas imagens, Patricia Arquette aparece em cena com o jovem Ellar Coltrane e atualmente nos bastidores de uma premiação