CENTRO UNIVERSITÁRIO SENAC ARQUITETURA E URBANISMO
VANESSA MEGUMI UEHARA Centro
CENTRO DE ACOLHIDA - REPÚBLICA
TRABALHO DE CONCLUSÃO DE CURSO
SÃO PAULO 2017
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VANESSA MEGUMI UEHARA
CENTRO DE ACOLHIDA - REPÚBLICA
Trabalho de Conclusão de Curso de graduação, apresentado ao curso de Arquitetura e Urbanismo do Centro Universitário Senac, como requisito parcial para a obtenção do título de Bacharel. Orientadora: Profª.Dra Valeria Fialho
SÃO PAULO 2017
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Monografia apresentada como requisito necessário para obtenção título de Bacharel em Arquitetura e Urbanismo. Qualquer citação atenderá as normas da ética científica.
_________________________________________ Vanessa Megumi Uehara
Monografia apresentada em __/__/__ _________________________________________
Orientadora Profª Dra Valeria Fialho _________________________________________ 1º Examinador (a) _________________________________________ 2º Examinador (a) _________________________________________
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AGRADECIMENTOS Agradeço em primeiro lugar a Deus, por me dar forças suficiente para nunca desistir dos meus objetivos. Agradeço também, a família e amigos, pois sem o apoio deles seria difícil vencer esse desafio. Em especial agradeço minha mãe que me ajudou de todas as maneiras possíveis desde o começo. Agradeço as amigas Lili, Agatha e Ariane que me fizeram descobrir o que é uma amizade de faculdade e foram fundamentais na minha trajetória até aqui. Agradeço ao Diego, que chegou na minha vida bem no final desse curso, mas me ajudou, me apoiou e me esperou por muitas vezes em frente a faculdade para me levar para casa. Agradeço a minha orientadora Profª. Valeria Fialho, pela sabedoria com que me guiou nesta trajetória. Enfim, agradeço de coração a todos os que por algum motivo contribuíram diretamente ou indiretamente para que eu chegasse até aqui.
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RESUMO Frequentemente nos deparamos com pessoas vivendo na rua, principalmente nos centros das grandes cidades. Baseado nisso, o objetivo desse trabalho é desenvolver um projeto arquitetônico de um centro de acolhida para moradores de rua. Entender as necessidades básicas dessa população heterogênea será fundamental para o sucesso de um projeto como esse. Reiterando que não é um trabalho de natureza sociológica. Para chegar na relação dessas necessidades será apresentado dados censitários realizados a pedida da prefeitura de São Paulo, pesquisas sobre moradores de rua em geral, reflexões e citações do mestrado da Paula Rochlitz, “Morar na rua: há projeto possível?”, bem como levantamentos do terreno escolhido e estudos de caso. Com todas essas informações foi desenvolvido um projeto de um centro de acolhida no distrito República, centro de São Paulo, bem próximo a ícones da arquitetura como o Copan e o Edifício Itália, que será apresentado no final desse trabalho.
Palavras-chave: Centro de acolhida. Albergue. Abrigo. Morador de rua.
ABSTRACT Frequently we come across people living on streets, especially in big cities’ downtown. Based on this, the aim of this work is to develop a homeless assistance center’s architectural project for homeless people. Understanding the basic needs of this heterogeneous population will be fundamental to succeed this work. Reiterating that it is not a work of a sociological nature. To do the list of basics needs will be presented census data requested by São Paulo’s prefecture, research on street dwellers in general, reflections and quotes from Paula Rochlitz master's degree, "Living on the street: is there a possible project?" As well as surveys of the land chosen and case studies. With all this information a project was developed for a homeless assitance center in República district, on São Paulo downtown, very close to architecture icons such as Copan and Edifício Itália, which will be presented at the end of this work. Keywords: Homeless assistance center. Hostel. Shelter. Homeless.
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LISTA DE FIGURAS Figura 1 – Morador de rua na Avenida do Ipiranga.............................................
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Figura 2 – Morador de rua na Praça da República I............................................ 4 Figura 3 – Morador de rua na Praça da República II........................................... 4 Figura 4 – The Bridge Homeless Center.............................................................
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Figura 5 – Bridge Homeless Center Implantação, sem escala............................ 10 Figura 6 – Bridge Homeless Center 1º andar, sem escala..................................
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Figura 7 – Bridge Homeless Center 2º andar, sem escala..................................
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Figura 8 – Bridge Homeless Center 3º andar, sem escala..................................
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Figura 9 – Bridge Homeless Center Corte I, sem escala..................................... 12 Figura 10 – Bridge Homeless Center Corte II, sem escala.................................. 12 Figura 11 – Bridge Homeless Center Restaurante para não residentes.............
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Figura 12 – Bridge Homeless Center Pavilhão aberto......................................... 13 Figura 13 – Bridge Homeless Center Pátio principal...........................................
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Figura 14 – Bridge Homeless Center Dormitórios...............................................
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Figura 15 – Foto aérea da oficina borácea..........................................................
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Figura 16 – Oficina borácea Planta, sem escala.................................................
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Figura 17 – Oficina borácea Dormitório...............................................................
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Figura 18 – Oficina borácea Estacionamento de carroças..................................
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Figura 19 – Localização do terreno.....................................................................
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Figura 20 – Edifício Renata Sampaio Ferreira..................................................... 18 Figura 21 – Foto do terreno I...............................................................................
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Figura 22 – Foto do terreno II..............................................................................
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Figura 23 – Foto do terreno III.............................................................................
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Figura 24 – Foto do terreno IV............................................................................. 19 Figura 25 - Foto tirada do Edifício Itália...............................................................
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Figura 26 - Mapa com pontos de ônibus e metro, sem escala............................
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Figura 27 - Mapa de serviços, sem escala..........................................................
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Figura 28 - Mapa de uso predominante do solo, sem escala..............................
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Figura 29 – 3D do terreno e seu entorno.............................................................
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LISTA DE GRÁFICOS Gráfico 1 – População em situação de rua em São Paulo..................................
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Gráfico 2 – Moradores de rua que já dormiram em Centro de Acolhida.............. 7
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LISTA DE TABELAS Tabela 1 - Número de pessoas em situação de rua, por Região 2015....................................................................................................
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Tabela 2 - Número de pessoas em situação de rua e acolhidos, por Distrito Municipal.............................................................................................
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Tabela 3 - Moradores de rua por gênero.............................................................. 5 Tabela 4 - Moradores de rua por faixa etária.......................................................
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Tabela 5 - Mulheres com filhos na rua.................................................................
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Tabela 6 - Tipos de serviço ofertados pela Rede de Centros de Acolhida...............................................................................................................
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Tabela 7 - Distribuição da rede de Centros de Acolhida e vagas noturnas............................................................................................................... Tabela 8 - Acolhidos por faixa etária...................................................................
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Tabela 9 - Área do terreno e recuos mínimos.....................................................
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Tabela 10 - Legislação.........................................................................................
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Tabela 11 – Programa..........................................................................................
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LISTA DE SIGLAS CA
Centro de Acolhida
CAE
Centro de Acolhida Especial
CONPRESP Conselho Municipal de Preservação do Patrimônio Histórico, Cultural e Ambiental da Cidade de São Paulo FIPE
Fundação Instituto de Pesquisas Econômicas
PMSP
Prefeitura do Município de São Paulo
SAS
Secretaria de Assistência Social
SMADS
Secretaria de Assistência e Desenvolvimento Social
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SUMÁRIO INTRODUÇÃO....................................................................................... 01 1
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FUNDAMENTAÇÃO.............................................................................. 02 1.1 Levantamento censitário da população de rua......................................
02
1.2 Perfil.......................................................................................................
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1.3 Abrigos e albergues...............................................................................
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ESTUDOS DE CASO............................................................................
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2.1 The Bridge Homeless Assistance Center..............................................
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2.2 Oficina Boracea.....................................................................................
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PROJETO..............................................................................................
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3.1 Terreno..................................................................................................
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3.2 Proposta................................................................................................. 22 4
MEMORIAL DESCRITIVO....................................................................
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CONSIDERAÇÕES FINAIS..................................................................
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REFERÊNCIAS.....................................................................................
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INTRODUÇÃO Caminhando pelo centro da cidade de São Paulo facilmente nos deparamos com muitas pessoas habitando os logradouros públicos, baixos de viadutos entre outros locais abandonados ou subutilizados. Comumente conhecidos como população em situação de rua, vivem expostos não só as intempéries bem como a todos os riscos psicológicos e violência que estar nessas condições oferecem. São pessoas em sua maioria discriminadas pela sociedade e subjugadas como merecedores do estado em que se encontram. Porém, a realidade como apresentaremos resumidamente nesse trabalho, é bem diferente. Trata-se de um grupo heterogêneo, ou seja, há uma diversidade de perfis, necessidades e razões pelas quais se encontram “morando na rua”. Com o intuito de desenvolver um trabalho voltado a projetos sociais me deparei com o tema: Centro de Acolhida para Moradores de rua. Após uma reflexão sobre o assunto decidi que seria esse o tema para o TCC (trabalho de conclusão do curso), pois é um assunto tratado com descaso tanto pelos governantes como a sociedade brasileira em geral. Esse TCC buscará entender as necessidades básicas das pessoas em situação de rua e desenvolver um projeto de um Centro de Acolhida que possibilite uma vida mais digna e renove as esperanças das pessoas que frequentarem esse espaço. Para isso foi realizado e será apresentado a fundamentação com dados censitários e pesquisas sobre o assunto.
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1 FUNDAMENTAÇÃO 1.1 Levantamento censitário da população em situação de rua Ainda hoje é muito comum a associar o morador de rua com o alcoolismo e as drogas. Porém, trata-se de um grupo social heterogêneo constituído de pessoas com diversos motivos pelas quais se encontram morando na rua e ainda há aqueles que estão nas ruas por opção. O descaso é tão grande que somente a partir do ano 2000, pelo menos na cidade de São Paulo é que se teve um censo para contar o número de pessoas em situação de rua, até então essas pessoas eram praticamente “inexistentes”. “São nômades que perambulam pela cidade, pedintes, desempregados ou subempregados. Mais do que viver, sobrevivem aos desafios que a falta de previsibilidade e de constância impõe: problemas tais como sujeição às intempéries, desproteção pessoal, acumulação do alimento recolhido, perturbação do sono, etc.” (MESTRADO DE PAULA ROCHLITZ, 2012) Para a pesquisa do censo de 2015 (FIPE) foram utilizados os seguintes termos, que serão utilizados também nesse trabalho: - Moradores de rua: pessoas sem moradia que pernoitam em logradouros da cidade, praças calçadas, marquises, jardins, baixos de viaduto; em locais abandonados, terrenos baldios, mocós, cemitérios e carcaça de veículos. - Acolhidos: pessoas sem moradia que pernoitam em abrigos, albergues ou centros de acolhida. “Considera-se população em situação de rua o grupo populacional heterogêneo que possui em comum a pobreza extrema, os vínculos familiares interrompidos ou fragilizados e a inexistência de moradia convencional regular, e que utiliza os logradouros públicos e as áreas degradadas como espaço de moradia e de sustento, de forma temporária ou permanente, bem como as unidades de acolhimento para pernoite temporário ou como moradia provisória.” (DECRETO Nº 7.053 DE 23 DE DEZEMBRO DE 2009) O termo população de rua será utilizada quando referir a somatória dos moradores de rua com os acolhidos em centros de acolhida ou albergues. De acordo com o levantamento da FIPE (Fundação Instituto de Pesquisas Econômicas) responsável pelo levantamento censitário em 2015, foram contabilizadas 15.905
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pessoas em situação de rua na cidade de São Paulo. No gráfico a seguir poderemos visualizar o crescimento população de rua ao longo de 15 anos.
7335
8570
14478 6765
7713
13666 6587
7079
8706 3693
5013
15905
Gráfico 1 – População em situação de rua na cidade de São Paulo
2000
2009
Moradores de Rua
Acolhidos
2011
2015
Total de Pessoas em Situação de Rua
Fonte: FIPE – Pesquisa censitária da população de rua, 2015
Como observamos o número da população de rua praticamente duplicou de 2000 a 2015. Claramente podemos perceber a ineficácia de políticas públicas nesse quesito. Embora cerca de 54% da população são acolhidos em algum abrigo ou albergue, seja por escolha ou por falta de opção, ainda assim existe uma demanda a ser suprida. Como mostra as tabelas abaixo a maioria das pessoas se encontram na região central. Tabela 1 – Número de pessoas em situação de rua, por Região 2015
Regiões Centro Sudeste Oeste Nordeste Centro Sul Leste 2 Leste 1 Sul Noroeste Total
Moradores de rua 3863 1084 682 516 485 209 188 167 141 7335
% 52,4 14,8 9,3 7,0 6,6 2,8 2,6 2,3 1,9 100
Fonte: FIPE – Pesquisa censitária da população de rua, 2015 Tabela 2 – Número de pessoas em situação de rua e acolhidos, por Distrito Municipal
Distritos Municipais Sé Santa Cecilia República Brás Santana
Moradores de rua 1.311 1.019 718 339 239
Acolhidos 137 1.687 205 394 59
Fonte: FIPE – Pesquisa censitária da população de rua, 201
O centro é uma região predominantemente de uso comercial e industrial, ou seja, a produção de materiais recicláveis é grande. Essa concentração desses indivíduos nessas áreas
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se deve ao fato de que pouco mais da metade trabalhar com a coleta desses produtos (FIPE, 2015).
“Ainda que todos aceitassem dormir nos albergues, é nas ruas que passam o dia em busca de trabalho e renda.” (MESTRADO DE PAULA ROCHLITZ, 2012) Figura 1 – Morador de rua na Avenida do Ipiranga Figura 2 – Morador de rua na Praça da República I
Fonte: Autoria Própria Figura 3 – Morador de rua na Praça da República II
Fonte: Autoria Própria
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1.2 Perfil Veremos a seguir mais informações para compreender melhor o perfil do cliente que o projeto do centro de acolhida atenderá. Como vimos anteriormente há pessoas que preferem continuar nas ruas por diversas razões, como por exemplo, o centro de acolhida é mal localizado, sujo, quente, etc. Baseado nisso, o entendimento desse público é muito importante para direcionar o projeto para que atende a maioria das necessidades. De acordo com o censo 2015 a taxa de analfabetismo é elevada esse aspecto é importante para propor salas de educação. A predominância da população de rua é masculina. Em relação a idade concentra-se na faixa entre 31 a 49 anos de idade conforme a tabela abaixo. A presença de idosos apesar de menor é um número significativo. Tabela 3 – Moradores de rua por gênero
Sexo Masculino Feminino Total Sem identificação Total
Número 5818 1110 6928 407 7335
% 78,3 15,1 94,5 5,5 100,0
Fonte: FIPE, 2015 Tabela 4 – Moradores de rua por faixa etária
Faixa etária Até 11 12 a 17 18 a 30 31 a 49 50 a 59 60 ou mais Total c/ informação Sem informação Total
Número 33 54 1081 2362 746 321 4597 2738 7335
% 0,4 0,7 14,7 32,2 10,2 4,4 62,7 37,3 100,0
Fonte: FIPE, 2015 Tabela 5 – Mulheres com filhos na rua
Mulher com filhos na rua Sim Não Total válido
Número 60 449 509
% 0,8 6,1 8,2
% Casos Válidos 11,8 88,2 100,0
Fonte: FIPE, 2015
Como podemos observar no quadro acima há um grande número em que não houve uma resposta por parte da entrevistada. Isso não quer dizer que esse número de filhos na rua não possa ser maior, da mesma forma que as que não tenham filhos morando na rua com a mãe, não tenham filhos.
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1.3 Abrigos e albergues “O sistema de acolhimento atual é constituído pelos centros de acolhida, que se traduzem pelos albergues e hotéis sociais, casas de convivência, e as “Tendas”. Os albergues (e hotéis sociais) servem a atividades variadas, mas, principalmente, ao pernoite. As casas de convivência e as tendas servem a atividades-dia. (Mestrado Paula Rochlitz, 2012) A SMADS oferece 72 Centros de Acolhida entre elas 11 são tipos de serviço que se destinam a população em situação de rua, com necessidades e condições especificas (FIPE, 2015). Tabela 6 – Tipos de serviço ofertados pela Rede de Centros de Acolhida
Tipo de serviço Abrigo Especial para Catadores Centro de Acolhida I – 16 horas Centro de Acolhida II – 24 horas Centro de Acolhida Especial para Família Centro de Acolhida Especial para Gestantes, Mães e Bebês Centro de Acolhida Especial para Idoso Centro de Acolhida Especial para Mulheres Centro de Acolhida Especial para Pessoas Convalescentes Centro de Acolhida de Emergência Projeto Família em Foco Projeto Especial Autonomia em Foco República para Adultos TOTAL
Quantidade 1 9 34 1 1 7 4 2 1 3 2 8 72
Vagas ofertadas 55 1292 5634 80 100 700 496 93 80 160 300 190 9180
Fonte: FIPE, 2015
Os Centros de Acolhida I e II quando somados representam 75,5% do total da rede conforme dados do quadro acima. Tabela 7 – Distribuição da rede de Centros de Acolhida e vagas noturnas Subprefeitura Distrito Nº de serviços Vagas noturnas Bela Vista 6 713 Bom Retiro 6 752 Sé Barra Funda 3 920 Liberdade 3 210 República 1 210 Santa Cecília 8 553 Fonte: FIPE, 2015
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Gráfico 2 – Moradores de rua que já dormiram em Centro de Acolhida
Moradores de rua que já dormiram em Centro de Acolhida
39% 61%
Dormiu em centro de acolhida
Não dormiu
Fonte: FIPE, 2015
Do total de moradores de rua que informaram já ter dormido em centro de acolhida, verificou-se que entre homens e mulheres, a maioria já passou por essa experiência. Mas a proporção de homens (63%) que já recorreram a esse serviço é maior que a de mulheres (51,6%). Este fato talvez possa ser explicado pelo menor número de serviços de acolhida que ofertam vagas à população feminina, uma vez que a população em situação de rua é majoritariamente masculina (FIPE, 2015). Tabela 8 – Acolhidos por faixa etária
Faixa etária Até 11 12 a 17 18 a 30 31 a 49 50 a 59 60 ou mais Sem informação Total
Nº 370 48 1352 3461 1458 1353 527 8570
% 4,3 0,6 15,8 40,4 17,0 15,8 6,1 100,0
Fonte: FIPE, 2015
De acordo com o censo 2015, nos centros de acolhida, cerca de 80% dos moradores afirmaram que atualmente vivem só e pouco menos de 20%, desfrutam da companhia de familiares, seja através de cônjuges, ou de família de origem, além de pessoas sem relação de parentesco nenhum. Quanto às relações familiares, os moradores de rua se diferenciam dos acolhidos. A proporção dos que vivem sozinhos é menor (69%) e os que mantêm relações familiares ou com outras pessoas sem parentesco são em maior proporção do que entre os acolhidos (31%). Na rua, vivem acompanhados de membros da família conjugal e em menor proporção, da família de origem ou de amigos. Para esse grupo a vida na rua também representou um rompimento e
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perda das relações familiares. Antes de chegarem ás ruas 82% moravam com a família e apenas 18% viviam sozinhos. A grande maioria dos acolhidos declarou já ter dormido na rua (82%) e parcela relativamente pequena dormiu apenas em CA (18%). Com relação à rua, é elevada a proporção de pessoas que pernoitaram em centro de acolhida (77%), enquanto os que só dormiam na rua são 23%.
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2 ESTUDOS DE CASO 2.1 The Bridge Homeless Centre Localização: Dallas, Estados Unidos Ano: 2008 Escritório: Overland Partners Figura 4 – The Bridge Homeless Center
Fonte: http://www.archdaily.com/115040/the-bridge-homeless-assistance-center-overland-partners
No início os moradores locais foram contra a construção desse projeto, pois, de acordo com eles aumentaria o número de moradores de rua na região e consequentemente a criminalidade. Porém, ao contrário do que se esperava houve uma redução de mais de 20% em criminalidade. Desde sua abertura foram distribuídas mais de 2,5 milhões de refeições, 750 pessoas foram alocadas em casas “permanentes” e o problema crônico de pessoas em situação de rua foi reduzido em 57%. Esse projeto de referência internacional em abrigos de moradores de rua é composto por um conjunto de 5 edifícios conectados por um pátio interno. Sendo elas, um edifício de serviços, um de recepção, depósito, um pavilhão aberto e o refeitório e seus equipamentos. O The bridge homeless center é a principal referência para esse trabalho, não só pelo design do edifício, mas principalmente pelo programa e pelas soluções de projeto para tratar desse grupo tão heterogêneo. O programa conta com espaços para animais de estimação, biblioteca, dormitórios fixos para pessoas que possuem emprego, alas especiais para idosos e deficientes físicos, além de salas para atendimentos médicos e assistência social.
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A parte de sustentabilidade é outro ponto de grande referência desse projeto. O edifício tem a certificação prata do LEED. Entre os pontos de sustentabilidade estão: reutilizar um prédio existente (pavilhão), telhado verde no prédio do restaurante, plantas nativas, sistema de reciclagem de água e resíduos materiais, energia solar, ventilação e iluminação natural. Figura 5 – The Bridge Homeless Center, Implantação, sem escala
Fonte: Overland Partners
Esse pátio interno é interessante, pois acolhe as novas pessoas que se abrigará nesse local e ao mesmo tempo conecta todos os edifícios. No primeiro andar do prédio de serviços tem-se a parte exclusiva para deficientes físicos e mentais, lobby e salas de treinamento. No edifício de recepção encontram-se as áreas comuns de recepção, serviços a mulher, biblioteca entre outros espaços de triagem. Já no prédio do “refeitório” tem-se a cozinha, depósito e mais à direita os chuveiros e banheiros externos. O pavilhão externo é destinado as pessoas em situação de rua que não se adaptam em dormir confinados novamente e ainda assim podem dormir da maneira que estão habituadas, porém em um local coberto e seguro.
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Figura 6 – The Bridge Homeless Center, 1º andar, sem escala
Fonte: Overland Partners Figura 7 – The Bridge Homeless Center, 2º andar, sem escala
Fonte: Overland Partners
No segundo andar o aspecto importante é a separação de dormitórios entre homens e mulheres através da área da administração, pois muitas vezes essas mulheres já sofrearam alguma agressão por parte dos homens.
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Figura 8 – The Bridge Homeless Center, 3º andar, sem escala
Fonte: Overland Partners
Figura 9 – The Bridge Homeless Center, Corte I, sem escala
Fonte: Overland Partners
Figura 10 – The Bridge Homeless Center, Corte II, sem escala
Fonte: Overland Partners
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Figura 11 – The Bridge Homeless Center, Restaurante para não residentes Figura 12 – The Bridge Homeless Center, Pavilhão de dormir para o pátio principal
Fonte: http://www.archdaily.com/115040/the-bridge-homeless-assistance-center-overland-partner Figura 13 – The Bridge Homeless Center, Pátio principal
Fonte: http://www.archdaily.com/115040/the-bridge-homeless-assistance-center-overland-partners Figura 14 – The Bridge Homeless Center, Dormitório
Fonte: http://www.archdaily.com/115040/the-bridge-homeless-assistance-center-overland-partners
Na imagem acima vemos uma boa referência para trazer privacidades aos moradores de rua que estão pernoitando. A falta de privacidade é umas das grandes queixas entre a população de rua que ainda prefere dormir na rua.
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2.1 Oficina Borácea Localização: São Paulo (Barra Funda), Brasil Ano: 2002 Escritório: LoebCapote Figura 15 – Foto aérea da oficina borácea
Fonte: http://www.loebcapote.com/projetos/19
Um terreno de 17.000m², onde funcionava uma antiga oficina de reparos de veículos e máquinas da Prefeitura desde 2002, passou a ser uma referência em centro de acolhida na cidade de São Paulo. Foi a primeira vez em que houve participação de moradores de rua juntamente com profissionais de diversas áreas para elaboração de um projeto que atendesse a maioria das necessidades dos futuros utilizadores desses espaços. O programa desse projeto é bem variado e interessante, pois oferece um atendimento básico necessário ao morador de rua, que muitas vezes se quer tem documento de identificação.
O local é aberto 24 horas por dia oferecendo pernoites para cerca de 400
moradores de rua. De acordo com a Paula Rochlitz, ao imaginar “todos” os tipos de serviços que poderiam ser usados dentro da oficina boracea isso acaba gerando uma segregação desses indivíduos da cidade, por não utilizar dos demais equipamentos que as outras pessoas utilizam.
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Figura 16 – Oficina borácea, Planta, sem escala
Fonte: Escritório LoebCapote
O programa é extenso e conta desde espaços para carroça e animais, lavanderia, oficinas educacionais, espaço para terceira idade, lojas, sala de informática, consultório médico tanto para pessoas como para animais, capela, guarda volumes entre outros. Figura 17 – Oficina borácea, Dormitório Figura 18 – Oficina borácea, Estacionamento de carroças
Fonte: http://www.loebcapote.com/projetos/19
De acordo com o escritório LoebCapote, o objetivo da recepção é evidenciar a valorização e o respeito que o projeto tem com o usuário, sendo também o espaço intermediário
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entre o ambiente interno e externo. Na área de estar encontram-se serviços, local de descanso e leitura. Uma central de informação, orientação e encaminhamento conduz e orienta as pessoas para os locais e serviços disponíveis. Para os que estão de passagem e utilizam o espaço como apoio e referência, a aproximação é quase como a de uma “ouvidoria”, reservado à escuta privilegiada dos que necessitam de apoio e informação, explica o escritório LoebCapote. Há ainda lanchonete com balcão de conveniências e máquinas de auto-serviço, banheiros, trocadores de roupa, posto de agência bancária, central de informática com banco de dados e banco de empregos, com computadores ligados à internet. O galpão funciona como dormitório. O projeto leva em conta a heterogeneidade da população de rua. Um sistema de divisórias móveis cria espaço versátil que permite diferentes disposições e arranjos familiares ou individuais. A arquitetura original do galpão foi preservada, e os fechamentos laterais e forro foram feitos com painéis de lona plástica constituindo espaços protegidos e luminosos.
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3 PROJETO 3.1 Terreno A área escolhida para o centro de acolhida é importante e tem forte relação com o sucesso ou o fracasso do centro de acolhida. De acordo com a Paula Rochlitz a CA deve se localizar próximo aos locais que a população de rua frequenta durante o dia, pois muitas vezes o deslocamento entre o trabalho e o local de descanso é inviável para o morador de rua então o mesmo prefere dormir no local em que parou no final do dia. Baseado na afirmação acima, o terreno escolhido para o projeto está localizado no centro de São Paulo mais especificamente no distrito da República. Como visto anteriormente é nas regiões centrais que se encontram o maior número de moradores de rua e no caso da Republica é o terceiro distrito com maior concentração desses indivíduos. As ruas adjacentes que formam o quarteirão em torno do terreno são: Rua Major Sertório, Rua Bento Freitas, Rua Araújo e Rua Epitácio Pessoa. Atualmente o terreno é de uso comercial composto por um estacionamento. Figura 19 – Localização do terreno
Fonte: Geosampa
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De acordo com o levantamento e reflexão da área do terreno e levando em conta ao programa que se deseja atender, foi considerado a demolição de todos os edifícios menos o edifício Renata Sampaio, de autoria do arquiteto Oswaldo Bratke, pois é tombado pelo CONPRESP em 2012. Após uma reflexão sobre o assunto, decidi não fazer essa demolição e utilizar apenas a área do estacionamento. Isso porque a área do entorno é bem servida de serviços e espaços para lazer. Então não há necessidade de demolir prédios existentes para abrigar esses mesmos espaços dentro do conjunto. Figura 20 – Edifício Renata Sampaio Ferreira
Fonte: www.cimentoitambe.com.br Figura 21 – Foto do terreno no cruzamento da Rua Major Sertório com a Rua Bento Freitas Figura 22 – Foto do terreno tirada da Rua Bento Freitas
Fonte: Autoria Própria
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Figura 23 – Foto do terreno tirada da Rua Epitácio Pessoa Figura 24 – Foto do terreno tirada da Avenida Ipiranga
Fonte: Autoria Própria
Figura 25 – Foto tirada do Edifício Itália
Fonte: Autoria Própria
Tabela 9 – Área do terreno e recuos mínimos
Área do terreno 1.613m²
Frente mínima 5m
Recuos mínimos-fundos e laterais 3m (se a altura da edificação for superior a 10m) Tabela 10 – Legislação
Zoneamento ZEIS-5
Coeficiente de aproveitamento 4
Taxa de ocupação 0,70
Taxa de permeabilidade 0,25
Pontuação de QA mínimo 0,60
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Figura 26 – Mapa com pontos de ônibus e metro, sem escala
Fonte: Geosampa
Figura 27 – Mapa de serviços, sem escala
Fonte: Geosampa
O mapa de uso predominante do solo como podemos observar a seguir, nos certifica que a área é bem servida de comércios e serviços, isso é importante para auxiliar no trabalho dos catadores de materiais recicláveis que se encontram morando na rua.
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Figura 28 – Mapa de uso predominante do solo, sem escala
Azul: Residencial vertical médio/alto padrão Vermelho: Comercial/serviços Laranja: Residencial e comércios/serviços Marrom: Praça Roxo: Equipamentos públicos Fonte: Geosampa Figura 29 – 3D do terreno e seu entorno
Em roxo: terreno; azul: edifício tombado; vermelho: demais prédios, sem escala Fonte: Autoria Própria
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3.2 Proposta Tabela 11 – Programa
AMBIENTE
QUANTIDADE
ÁREA
Recepção
1
6m²
Dormitório masculino
10
1.630m²
Dormitório feminino
2
326m
Dormitório misto/familiar
2
326m
Dormitório para idosos
2
326m²
Dormitório fixo masculino
2
326m²
Dormitório fixo feminino
2
326m²
Assistência social
1
6m²
Enfermagem
1
10m²
Psicólogo
1
6m²
Cabelereiro
1
7,3m²
Triagem
1
20m²
Refeitório para moradores fixos
1
113m²
Área de estar
1
76m²
Lavanderia coletiva
1
28m²
Administração
1
27m²
Sala de reuniões
2
28m²
Refeitório para funcionários
1
42m²
Salas flexíveis
2
56m²
Canil
1
134m²
Estacionamento de carroças
1
398m²
Consultório veterinário
1
19m²
Apoio
1
19m²
Lavatório para animais
1
36m²
Sanitários
34
750m²
Salas multifuncionais
4
160m²
Sala de estudos
1
95m²
Biblioteca
1
116m²
Refeitório
1
235m²
Cozinha
1
91m²
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AMBIENTE
QUANTIDADE
ÁREA
Segurança
11
38m²
Pavilhão masculino
1
163m
Pavilhão feminino
1
163m²
Caixa d’água
4
43,2m²
Circulação vertical
12
572m²
Horta
1
86m²
Telhado verde
2
270m²
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IMPLANTAÇÃO
Desde o princípio a prioridade foi manter o térreo o mais livre possível, abrigando apenas aquilo que fosse necessário estar no térreo. O projeto foi implantado no terreno de modo que os quatros lados ficassem soltos e livres de qualquer construção. Permitindo a passagem nos quatro sentidos.
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SUBSOLO
Uma das queixas levantadas nesse estudo é a inexistência de local para as carroças e animais. Esse é um dos motivos pelas quais algumas pessoas ainda preferem dormir nas ruas, pois não há local seguro para abrigar seus animais e a carroça que são utilizadas para a coleta de materiais recicláveis para vender. Atendendo a essa necessidade, no subsolo estão localizados o estacionamento de carroças, canil, sala veterinária e um lavatório dos animais. Esse local é ventilado e iluminado por um talude na lateral oeste que forma uma ventilação cruzada com o lado oposto através de um fosso.
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TÉRREO
Como dito anteriormente, o térreo foi projetado para ter a maior área de espaço livre possível abrigando apenas aquilo que fosse necessário. A entrada principal é pela ala norte, onde se localiza a recepção e através de um corredor que liga a triagem e demais serviços com o hall de entrada a escada e aos elevadores. Com a projeção do edifício temse uma cobertura no térreo, ou seja, é possível proteger os moradores de rua das intempéries. No lado sul, tem-se o refeitório e a cozinha. Foi necessário utilizar todo esse espaço por conta do número de pessoas que serão abrigadas.
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1º ANDAR
No primeiro andar localizam-se os espaços voltados para a educação.
DO 2º ANDAR AO 6º ANDAR
Nesses andares estão os dormitórios masculinos, femininos, mistos (famílias ou casos especiais), dormitórios voltados para as necessidades dos idosos e deficientes físicos e dormitórios fixos (um incentivo para aqueles que estão trabalhando e precisam de um local com estadia prolongada). Os dormitórios masculinos ficam no prédio da lateral oeste, os demais dormitórios que tem seu uso um pouco mais restrito estão localizados no prédio ao leste. Essa separação se faz por um acesso único central na entrada do andar, onde se localiza área para segurança.
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7º ANDAR
Nesse andar está a área administrativa, refeitório para funcionários, refeitório, lavanderia e uma pequena área de estar para aqueles moradores de rua que pernoitarão no Centro de Acolhida.
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8º ANDAR
Esse é um andar multiuso. É livre de paredes internas e abrigará conforme a necessidade. É possível ser uma expansão no inverno, abrigar mais salas multifuncionais entre outras atividades que necessitem de um espaço mais aberto. Pode ser um espaço também que abrigará pessoas que estão a muito tempo morando na rua e não conseguem se adaptar dormindo em camas e espaços muito delimitados.
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COBERTURA
A cobertura é um grande telhado verde onde as pessoas poderão caminhar ou simplesmente sentar e apreciar os edifícios em volta. Estão localizadas as caixas d’água e uma horta.
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4 MEMORIAL DESCRITIVO Localizado no distrito República, zona central de São Paulo e próximo aos mais renomados edifícios da cidade, o centro de acolhida para moradores de rua encontra-se em um terreno com visão privilegiada e muito bem servido de transporte público e comércios. O projeto consiste em dois edifícios em laminas paralelas conectadas por um corredor central. No térreo se localiza a recepção, triagem, salas de assistência social, enfermagem, cabelereiro e o restaurante. Através de uma rampa os carroceiros que pernoitarão, tem acesso ao subsolo, onde encontram-se o estacionamento de carroças, um canil, veterinário e um lavatório para animais. O subsolo é iluminado e arejado através de um talude na lateral oeste que abre o subsolo para o exterior, na fachada oposta há duas grandes saídas de ar que formam uma ventilação cruzada e permite um local arejado e mais iluminado. Nas fachadas voltadas para o exterior tem-se duas longas faixas de janelas, uma principal e uma em cima colado na laje, protegidas de insolação excessiva por um beiral e uma extensão da laje. Nas fachadas internas também há uma longa faixa de janelas bem próximas ao teto, formando uma ventilação cruzada possibilitando um ótimo conforto térmico. O sistema construtivo utilizado é o concreto armado nas colunas e lajes e blocos cerâmicos para vedação. Já o corredor que conecta os dois edifícios é em estrutura metálica.
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5 CONSIDERAÇÕES FINAIS A elaboração deste projeto surgiu de um desejo em trabalhar com projetos sociais, com uma parcela da população que é praticamente invisível aos olhos de muitos cidadãos. Baseado nos estudos e pesquisas levantados ao longo do ano, deu-se origem ao projeto Centro de Acolhida – República. Para isso, foi primordial entender as reais necessidades dos moradores de rua para que o centro fosse devidamente utilizado e desejado. Ao que posso dizer no final desse trabalho, é que o trabalho está apenas começando. O desejo de trabalhar com projetos sociais só aumentou e continuarei estudando e refletindo para transformar a vidas das pessoas, seja ela quem for, através da arquitetura.
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REFERÊNCIAS Prefeitura de São Paulo. CENSO DA POPULAÇÃO EM SITUAÇÃO DE RUA NA MUNICIPALIDADE DE SÃO PAULO (2011) QUINTÂO, Paula Rochlitz. Morar na rua: há projeto possível?. São Paulo: Arquitetura USP, 2012. DAVIS, Sam. Designing for the Homeless: Architecture That Works. university of califórnia press: berkeley, 2004. ARCHDAILY. The Bridge Homeless Center disponível em: http://www.archdaily.com/115040/the-bridge-homeless-assistance-center-overlandpartners Acesso: 15 em março 2017 LOEBCAPOTE ARQUITETOS. Oficina Boracea disponível em: http://www.loebcapote.com/projetos/19 Acesso: 15 em março 2017 OVERLAND PARTNERS. The Bridge Homeless Center disponível em: http://www.overlandpartners.com/projects/the-bridge-homeless-assistance-center/ Acesso: 18 em março 2017
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