Revista Competência 2009/1

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Revista da Educação Superior do Senac-RS

V.2 - N.2 - Julho 2009 - ISSN 1984-2880


Revista da Educação Superior do Senac-RS

V.2 - N.2 - Julho 2009 - ISSN 1984-2880

Serviço Nacional de Aprendizagem Comercial Porto Alegre Rio Grande do Sul


Dados Internacionais de Catalogação na Publicação (CIP)

Competência: Revista da Educação Superior do Senac-RS / Serviço Nacional de Aprendizagem Comercial do Rio Grande do Sul. Vol. 1, n. 1 (dez. 2008) – Porto Alegre: Pallotti, 2008 v . ; 21 x 28 cm. Semestral (julho e dezembro) ISSN 1984-2880 1. Tecnologia da Informação 2. Gestão 3. Negócio 4. Moda 5. Turismo 6. Meio Ambiente 7. Ensino Superior 8. Educação I. Serviço Nacional de Aprendizagem Comercial do Rio Grande do Sul CDU 001

Bibliotecária responsável: Marisa Fernanda Miguellis CRB 10/1241


Revista da Educação Superior do Senac-RS

V.2 - N.2 - Julho 2009 - ISSN 1984-2880

Senac – Serviço Nacional de Aprendizagem Comercial do Rio Grande do Sul Presidente do Sistema Fecomércio e Presidente do Conselho Regional do Senac: Flávio Roberto Sabbadini Diretor Regional: José Paulo da Rosa Gerente da Educação Superior: Fabiane Franciscone Diretores das Faculdades Senac-RS: - Eduardo Cezar Pereira Cassal - Paulo Ivan Schutz Beux - Roberto Sarquis Berte Conselho Editorial: - Acacia Zeneida Kuenzer – UFPR - Avelino Francisco Zorzo – PUCRS - Beatriz Triceri Felippe – UNIRITTER - Claisy Maria Marinho-Araújo – UNB - Dieter Rugard Siedenberg – UNISC - Edegar Tomazzoni – UCS - Fábio Gandour – IBM - Fernando Vargas – Cinterfor (Colômbia) - Francisco Aparecido Cordão – CNE Conselho Nacional de Educação - Jacques Alkalai Wainberg – PUCRS - Jorge Antonio Menna Duarte – UniCEUB - Jose Clovis de Azevedo – Centro Universitário Metodista, do IPA - Leda Lísia Franciosi Portal – PUCRS - Léa Viveiros de Castro – Departamento Nacional Senac - Marta Luz Sisson de Castro – PUCRS - Margarida Maria Krohling Kunsch – USP - Milton Lafourcade Asmus – FURG - Susana Gastal – UCS Comissão Editorial: - Fabiane Franciscone - Presidente - Ana Delacoste - Augusto Niche Teixeira - Carlos Strey - Eduardo Cezar Pereira Cassal

- Franz Figueroa - Guilherme Tomachewski Netto - Jaciane Cristina Costa - Josué Toebe - Juliana Favretto - Marislei da Silveira Ribeiro - Maristela Shein Kellermann - Paulo Ivan Schutz Beux - Roberto Sarquis Berte - Tissiane Schmidt Dolci - Wagner Ladeira

Revisão inglês: - Julio Carlos Morandi

Editora Científica: - Anaí Zubik Camargo de Souza

Periodicidade: Semestral ( Julho e Dezembro)

Pareceristas convidados para a edição: - Prof.ª Doutoranda Gisele Palma (Unisinos) - Prof. Dr. Jorge Oneide Sausen (UNIJUÍ) - Prof. Dr. Jose Clovis de Azevedo (Centro Universitário Metodista, do IPA) - Prof. Doutorando Lindomal Ferreira (Universidade Federal do Pará) - Prof.ª Dr.a Luciana Paulo Gomes (Unisinos) - Prof. Dr. Luciano Sathler Rosa Guimarães (UMESP) - Prof.ª Me. Marion Velasco Rolim (Universidade Anhembi Morumbi, SP) - Prof.ª Dr.a Marlis Morosini Polidori (Centro Universitário Metodista, do IPA) - Prof.ª Dr.a Mérli Leal Silva (Instituto de Desenvolvimento Social BravaGente) - Prof.ª Dr.a Susana Gastal (UCS) - Prof. Me. Thiago Ingrassia Pereira (Rede Metodista de Educação do Sul)

Os artigos para publicação devem ser encaminhados para: Competência – Revista da Educação Superior do Senac-RS - Rua Alberto Bins, 665/7º andar – Centro – Porto Alegre – 90030-142 Fone: 51-3284-1925 E-mail: competencia@senacrs.com.br

Bibliotecária Responsável: - Marisa Miguellis CRB 10/1241 Projeto Gráfico e Diagramação: - Jaire Passos e Paula Jardim Revisão português: - Gabriela Koza

Revisão espanhol: - Gladys Miriam Fama Tiragem: 1.000 exemplares Impressão: Gráfica Editora Pallotti

Os conteúdos dos artigos são de responsabilidade exclusiva dos autores.


Sumário Editorial ............................................................................................................ 09 Blogues como artefatos culturais pós-modernos para fazer alfabetização científica ............................................................................................................ 1 1 Attico Chassot

O uso da informática na escola motiva os adolescentes a aprender? ......................2 9 Bettina Steren dos Santos; Denise Dalpiaz Antunes; Jussara Bernardi

Educação a distância e comunidades virtuais de aprendizagem: novos espaços, novas possibilidades...............................................................................................................4 3 Marcia Paul Waquil; Cláudia Zank; Josi Rosa de Oliveira; Regina Trilho Otero Xavier; Waléria Fortes de Oliveira Ressignificando o processo de mudança nas organizações de educação superior ......5 9 Adriana Rivoire Menelli de Oliveira Plano de desenvolvimento da educação: um caminho a ser analisado ...................7 3 Rosalir Viebrantz; Vera Lucia Felicetti; Marília Costa Morosini; Patrícia Somers Vingt Mille lieues sous lês mers: addressing four challenges of informal learning ......9 3 Daniel Schugurensky A interpelação dos discursos ético e econômico sobre a educação ...................... 117 Denalize Goulart Leite Usando o CHA para identificar competências e gerar resultados positivos na Gestão de Projetos ................................................................................................................ 129 Rafael Rodrigues Gestão das informações de moda no varejo de lojas multimarcas e marcas locais de vestuário feminino de shoppings de Porto Alegre .................................................. 141 Carlos Theodoro Strey; Débora Elman; Jandora Alvarez da Fonseca; Ananda Shopie Quadros Gonçalves

O uso dos sistemas de informação geográfica no manejo das áreas de preservação ambiental do distrito industrial de Rio Grande, RS, Brasil................................... 159 Tatiana S. da Silva; Milton L. Asmus

A identidade cultural na pós-modernidade ...............................................................171 Sabrina Hax Duro Rosa

Normas para publicação ................................................................................................176


Editorial

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om muita satisfação, apresentamos a segunda edição de Competência, a Revista da Educação Superior do SenacRS.

Nesta oportunidade foram selecionados artigos que enfocam relações entre tecnologia da informação e educação. Além dessa temática, também teremos a oportunidade de ler trabalhos que versam sobre mudança nas organizações de educação superior, plano de desenvolvimento da educação, capitalismo e ética, conhecimento, habilidade e atitude, moda e consumo, bem como sobre o uso de sistemas de informação geográfica. Destaco ainda o artigo de Daniel Schugurensky, do Ontário Institute for Studies in Education, da Universidade de Toronto, o qual trata de aprendizagem informal. A utilização das ferramentas de tecnologia da informação dentro da educação é um fato. Carece, entretanto, de pesquisas acadêmicas que permitam compreender a melhor forma de aproveitar as novas tecnologias em prol da educação. Os trabalhos aqui apresentados auxiliam na interpretação desse tema. Todos os artigos abordam questões relacionadas à competência. Durand escreveu em 1998 que a competência é uma nova forma de alquimia necessária às organizações, comparando a atuação dos gerentes e das próprias organizações a dos alquimistas nos tempos medievais. A competência tem sido discutida nos mundos acadêmico e empresarial. Discute-se especialmente a competência do indivíduo e as “core competences” organizacionais. O Senac, no seu trabalho de décadas com educação profissional, reforça sua missão por meio da qualidade dos articulistas desta revista. A pesquisa por eles desenvolvida tem a ver com a alquimia proposta por Durand. Eles conseguem, pelo seu trabalho científico e acadêmico, transformar a realidade do mundo do trabalho, criando as condições para que mais estudantes se apropriem das competências necessárias – para o seu crescimento profissional, para a longevidade das empresas em que atuam, para o desenvolvimento da sociedade e, especialmente, para a sua felicidade. José Paulo da Rosa Diretor Regional

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BLOGUES COMO ARTEFATOS CULTURAIS PÓS-MODERNOS PARA FAZER ALFABETIZAÇÃO CIENTÍFICA LOS BLOGS COMO ARTEFACTOS CULTURALES POSTMODERNOS PARA HACER ALFABETIZACIÓN CIENTÍFICA

Attico Chassot* A alegria e o rigor científico podem coexistir.

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- Attico Chassot é licenciado em Química e doutor em Ciências Humanas. Professor e pesquisador do Centro Universitário Metodista, do IPA. O blogue aqui referido está em www.atticochassot.com.br.

Resumo Este texto pretende mostrar o quanto artefatos culturais pós-modernos como os blogues podem ser usados para fazer alfabetização científica. O texto parte da experiência do autor que teve sua alfabetização em uma lousa e se faz bloguista. Na tentativa de responder a três interrogantes: O que escrevo? Como escrevo? e Por que escrevo?, o autor analisa o prazer da escrita e procura alternativas à dificuldade de escrita de textos acadêmicos. O texto refere uma Escola [aqui considerada como qualquer estabelecimento (de Educação Básica ou de Ensino Superior)] que na modernidade era disseminadora do conhecimento para transformar-se em uma receptora de conhecimento e questiona um abandono da Escola: a produção do conhecimento. Acena-se para os problemas do “amadorismo” nas escritas internéticas. Comenta-se a respeito de significados psicológicos acerca do escrever de si. Há ainda uma comparação das maneiras mais tradicionais de escritas de diários com aquelas mais modernas, como os blogues.

P a l a v r a s - C h a v e : Alfabetização Científica, Amadorismo Internético, Escrita de Blogues, Escrever de Si.

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La alegría y el rigor científico pueden coexistir.

Resumen Este texto pretende demostrar cuánto los artefactos culturales postmodernos como los blogs pueden ser usados para producir alfabetización científica. El texto parte de la experiencia del autor cuya alfabetización fue en una pizarra y se hizo bloguista. Con el propósito de responder a tres interrogantes: ¿Qué escribo? ¿Cómo escribo? y ¿Por qué escribo? el autor analiza el placer de la escritura y busca alternativas a la dificultad de escribir textos académicos. El texto se refiere a una Escuela [aquí considerada como cualquier establecimiento (de Educación Básica o de Enseñanza Superior)] que en la modernidad era diseminadora del conocimiento para transformarse en una receptora de conocimiento y cuestiona un vacío o abandono de la Escuela: la producción del conocimiento. Se alude a los problemas del “amateurismo” (aficionados o principiantes) en los escritos internéticos. Se hace referencia a los significados psicológicos acerca del escribir de sí mismo. Incluye además una comparación de las formas más tradicionales de escribir, como los diarios, con aquellas más modernas como los blogs.

P a l a b r a s - C l a v e s : Alfabetización Científica, Amateurismo Internético, Escribir Blogs, Escribir sobre sí mismo.

Como partitura Nossos textos são datados e têm histórias. Defendo que tal não se possa sonegar ao leitor. Assim me permito começar com um ofertório na trazida dessas informações. No começo de 2008, aceitei, talvez um tanto afoitamente, participar da mesa-redonda Educação Científica em Espaços Formais e Não Formais no XIV Encontro Nacional de Ensino de Química, que aconteceu em julho na UFPR, em Curitiba. Estava na minha praia; afinal, participara de todas as edições desse evento bisanual, logo não cabiam apreensões. Ao aceitar o convite, não me dava conta nem da extensão e nem da profundidade da proposta. Talvez até subestimasse sua importância. Quan12_


do olhava o tema das duas outras mesas que ocorriam em paralelo: uma, A Educação Especial e Inclusiva na Formação de Professores de Química: Desafios e Perspectivas, e outra, A Produção do Conhecimento Acadêmico e as Práticas Educacionais – Possibilidades e Desafios, parecia que aquela que participaria seria a menos relevante. Devo preambularmente dizer que mudei muito de opinião enquanto busquei um assunto para meu segmento e depois quando me defrontei com um auditório lotado. Acertara em trazer um tema polêmico. Agora, passado alguns meses do evento, vi quanto foi significativo escolher falar de blogues como artefatos culturais pós-modernos para fazer alfabetização científica. É muito bom, agora (outono de 2009), retomar aquele texto e prepará-lo para a revista Competência. Usualmente somos críticos nesse requentar de nossos textos. Com eles acontece um pouco como o café requentado. Perdem o aroma. Vou tentar superar isso na tentativa de fazê-lo novo. Aliás, um pouco adiante, vou discutir algo acerca do novo. Já antecipo aqui: o assunto que é objeto desse texto quer ser muito novo, mas envelhece – e se torna descartável – muito rapidamente. Só esse detalhe ratifica a exigência de datação de nossos textos. Presunçosamente, talvez possa tentar que se pareça com um café recém-passado. Quanto à adjetivação de tema polêmico que conferi a esse escrito, reportava-me ao quanto a Academia é refratária a certos assuntos. O que eu propunha discutir era um deles. Todavia, certamente exagerei quando trouxe como catalisador para meu segmento a afirmação: Anaxágoras foi expulso de Atenas há 2.500 anos A.P.1 por sugerir que o sol era maior que o Peloponeso!, dizendo que corria o risco de ser rejeitado pelo auditório por trazer algo profano: os blogues em um muito refinado ambiente acadêmico. Talvez, ao invés de polêmico, fosse mais bem posto rotulá-lo como alienígena à Academia.

1 - A.P. significa Antes do Presente, correspondendo assim 2.500 anos A.P. a 500 anos antes de Cristo. Esta referência a tempo (quando não há necessidade e/ou possibilidade de uma datação exata) é mais universal, considerando a existência de outros calendários, que não têm no nascimento de Cristo o seu marco zero.

Em busca de uma tese Anuncio que não vou teorizar acerca de Espaços Formais e Não Formais (título proposto para a mesa-redonda), até porque acredito que essa separação seja anódina e cada vez mais imperceptível, ou pelo menos dotada de pouco sentido. Semanas antes do evento, instado pela profa. dra. Adria_ 13


na Vitorino Rossi, coordenadora da mesa acerca do que desenvolveria no meu segmento, ocorreu-me, na pressa de responder a mais uma das muitas mensagens que nos chegam quase aos turbilhões, dizer que poderia partir da comparação de alguns artefatos culturais que usamos para fazer Educação: formais (livros e revistas) e não formais (os blogues). Aqui, tendo presente o quanto há de possibilidades de aprendizagens na rede, quando até as crianças do ensino fundamental “pesquisam” com buscadores internéticos, mais uma vez não me dava conta da audácia de minha proposta. Todavia, essa classificação superficial, feita no correr da resposta a uma mensagem, serviu de cristal germinal para este texto. Visto que adiante vou falar do “como escrevo”, já antecipo aqui: ter um indez é um excelente facilitador. Por estar me envolvendo em questionamentos acerca da rapidação disseminação de conhecimentos, parecia oportuno trazer o tema a um fórum mais amplo. Uso esta palavra rapidação, que cunhei há muito, mas que hoje parece conjugar qualidades muito exigentes que estão presentes nos blogues: rapidez + ação. Assim, enquanto em 2008 tive um livro publicado (Sete escritos sobre Educação e Ciências), que levou mais de dois anos para vir a lume, vejo nos blogues uma instantaneidade, pois o que escrevemos hoje está no mesmo momento com nossos leitores. Aqui parece estar uma apropriada (mas, muito discreta) sinalização para comparar algo dos dois artefatos culturais que considero: livros e blogues. Posso dizer quase naturalmente que um livro leva dois anos para vir a lume, mas seria completamente démodé dizer que a cada dia trago a lume uma blogada. Talvez esse seja um exemplo de quanto as palavras sejam marcadas ou datadas e marcam também os objetos que vestem. Por ser alguém que gosta de brincar com palavras, preciso fazer um comentário lateral. Há um tempo, em uma discussão acadêmica, defendia a necessidade da disseminação do conhecimento. Sou travado por uma linguista que me diz: “Não! Nós, mulheres! Nós não podemos disseminar conhecimento!”. Ante meu espanto, explica-me: “Não produzimos sêmen! Logo, não produzimos semente; logo, não nos cabe semear!”. Mesmo que possa brigar com meus alunos para que não usem americano ou norte-americano para se referirem a estadunidense, não costumo fazer tão rigoroso patrulhamento vocabular como minha colega. Quanto a “americano”, sabemos do uso generalizado de uma prática marcada pela prepotência de uma nação que faz do nome do continente seu gentílico, não 14_


tendo em seu dicionário uma palavra que corresponda a “estadunidense” como há em outros idiomas. Mais recentemente tenho visto o gentílico, não dicionarizado: “us americano”. Aliás, nós também somos americanos. Só há mais outro país que se apropria do continente para fazer só seu o gentílico: a África do Sul. É quase natural o desconhecimento da imprensa e do comum das pessoas o gentílico estadunidense. Feita essa já extensa digressão, volto ao texto. Não vou fazer o panegírico dos blogues e muito menos exorcizar os livros. Sei que aqueles têm na Academia uma usual resistência, como tudo que é novo. Vejam quantos ainda franzem o nariz quando dizemos que temos uma página ou uma comunidade no Orkut. A Wikipédia – um dos artefatos culturais que nos dias atuais faz a mais extensa democratização do conhecimento – é injustamente demonizada, sendo que há universidades que a colocam no índex. Já os livros são para mim objetos de desejo, com os quais mantenho um relacionamento quase obsessivo, sendo provavelmente os únicos artigos que disparam meu ser consumista. Mesmo que não vá discutir aqui o significado de novo, antes dizia da usual resistência (da Academia) ao novo. Recordo que, há não muito, afirmava em aula, para alunos menos crédulos, que um telefone fixo com 20 anos de uso é mais novo que um telefone celular com dois anos. Lateralmente, devo professar que não apenas resisto, mas combato a neopatia2 – a doença moderna cuja característica é ter sempre tudo novo. É um neopata quem tem (ou sonha em ter) o último modelo de aparelho de televisão, o último carro (hoje, por questão de segurança, isso se altera), o último computador, a última versão do Windows, o último telefone celular, a última câmera digital. Aliás, parece ser fácil aceitarmos que é o mercado que define a moda do momento para bombar nossos desejos. A ação verbal, ainda não dicionarizada, mas de muito trânsito entre os neopatas, foi escolhida com muita propriedade. A neopatia nos atinge gravemente em nossos afazeres. Ela é a vilã que não apenas erode nossas economias, mas também colabora para a degradação do planeta. Mesmo que os blogues já datem de 1997, como me ilustra a Wikipédia, dicionários mais usuais da língua portuguesa (Aurélio ou Houaiss) não registram a palavra blog, e os editores de texto, salvo que a adicionemos ao dicionário, colocam-na sempre como errada. Eu, já há muito, aportuguesei blog para blogue, pois defendo que se deve escrever como se fala. Por outro lado, insisto em usar sítio ao invés de site, pois referir-se a “saite” soa antiestético.

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- Vi a palavra neopatia usada por primeiro pelo prof. dr. Guy Bajoit, da Universidade Católica de Louvain, em 9 de setembro de 1998, então professor visitante do Programa de Pós-Graduação em Educação da Unisinos.

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Para escritor ou autor de um blogue, prefiro a acepção usada em Portugal “bloguista” ao brasileiro “blogueiro” – uma e outra não estão dicionarizadas. Para mim, blogueiro carrega um preconceito como o que tem a palavra motoqueiro. Observa-se a diferença entre motociclista e motoqueiro. Assim me considero um bloguista, e não um blogueiro. Há ainda mais vantagem em favor da forma de Portugal. É um substantivo epiceno; claro que não vou testar aqui e agora os conhecimentos de gramática de ninguém acerca de epicenos. A Wikipédia tem informações muito interessantes acerca de blogues e há uma muito curiosa ou pelo menos original, mesmo que possa ser dita como desprovida de valor: quase desafiaria quem soubesse responder por que dia 31 de agosto é o dia do blogue. Vejam a semelhança na escrita da data 3108 com a palavra blog. Mas isso é irrelevante e não é assunto para esse texto. Agora, remexendo no texto de então, assumo a tese: Blogues são ferramentas pós-modernas para se fazer alfabetização científica. Não sei se essa releitura amplia ou restringe o uso dos blogues como instrumentais para fazer educação. Antes parece necessário outro comentário lateral: não entro aqui nas discussões acerca de educação presencial versus educação a distância. Muito menos me disponho a elencar vantagens e desvantagens de uma e de outra modalidade. Até porque assento meu foco em um recorte que nem é preocupação da Academia: “educação a distância não formal. Quando levanto a defesa da tese: Blogues são ferramentas pós-modernas para se fazer alfabetização científica, estou assumindo duas dimensões para essa tese. Uma que ela seja educação a distância e outra que ela seja não formal; isto é, fora da Escola”. Fiz uma rápida pesquisa com um grupo de acadêmicos. Praticamente tudo que sabiam acerca de Darwin e mesmo do evolucionismo não aprenderam na Escola. Escola aqui considerada como qualquer estabelecimento (de Educação Básica ou de Ensino Superior). Isso me autoriza a trazer aqui outra tese. Tem-se a história (ocidental) de civilização marcada por rupturas paradigmáticas que definiram marcos e fizeram disciplinarização: Séculos 16/17: geocentrismo heliocentrismo; Século 18: flogisto oxigênio; Século 19: criacionismo evolucionismo; Século 20: consciente inconsciente; neste novel Século 21, entre muitas transições paradigmáticas que vivemos, há uma que talvez imperceptível, mas muito significativa: foi feita uma nova Escola. 16_


Uma de nossas preocupações é pensar o que nós, professoras e professores, vamos fazer nessa Escola que nós não mudamos, mas que foi mudada. Ela não é mais a referência como lugar de transmissão do saber, como foi desde seu surgimento na aurora da Modernidade (especialmente, devido à Reforma Protestante), mas se vê assolada pela chegada invasiva, incontrolada e massiva de novos conhecimentos. E isso não lhe dá alegrias. Seu argumento: junto com o trigo vem o joio. Mais uma vez, vitupere-se a Wikipédia que tem “coisas” erradas. Assim, quando trago aqui as possibilidades de os blogues fazerem alfabetização científica, é preciso ter em mente novas realidades presentes na Escola. Elenco pelo menos cinco: a) tecnodependências, cada vez mais exigentes que nos tornam muitas vezes reféns, por exemplo, de um data show ou de Power Point ou de um telefone celular; b) uma hiperconectividade que nos faz cada vez mais cidadãos públicos e invadidos em nossas privacidades (Orkut, Facebook, Second Life, Twitter...) e também altera, inclusive, as relações amorosas; c) o fim do efêmero onde nossa passagem deixa rastros que mesmo quando pensamos apagados podem ser “ressuscitados” (por exemplo, pelo Google Desktop), por outro lado há perda dos valiosos rascunhos ou páginas comentadas; d) o (não-) engajamento crítico que passa a ser primeiro uma exigência que pode conduzir à participação construtiva ou – ante sua renúncia – pode conduzir a uma alienação que leva a uma vida cultural vegetativa; e) os cada vez mais tênues limites entre o humano/não humano que nos fazem a não nos darmos conta de quanto os robôs são copartícipes de nosso cotidiano; e f ) a brecha cada vez maior que se estabelece entre os que têm acesso ao conhecimento e os marginalizados (falo adiante dos que pertencem ao MS@). Talvez a maior revolução que deva ocorrer nessa Escola que foi mudada – repito que estou considerando todos os níveis de escolarização – é que assuma o seu papel de produtora de conhecimento; não apenas de transmissora, e muito menos cerceadora do conhecimento. Claro que não podemos ser ingênuos. Todavia, também não apóstolos do apocalipse. Respeito opiniões como as de Andrew Keen, um escritor britânico que se notabilizou por suas críticas aos “erros que poluem a rede”, especialmente às iniciativas, como a Wikipédia, administradas por amadores. No livro O culto ao amador, Keen (2009) apresenta argumentos contrários ao domínio das ferramentas internéticas por neófitos, além de apon_ 17


tar graves prejuízos ao pensamento preestabelecido e corrente à maioria da população. Para Keen, blogues, MySpace, YouTube e a pirataria digital estão destruindo nossa economia, cultura e valores. Num meio onde toda a gente tem uma voz, a verdade não se faz por discussão racional; mas, por consenso. Os motores de busca que todos usamos são a prova de que “verdade” é tudo aquilo que os internautas elegem como verdade. É assim que a Wikipédia tem mais sucesso e autoridade do que, por exemplo, a vetusta Encyclopaedia Britannica. E acrescenta que em uma cultura on-line em que a propriedade intelectual é livremente trocada, baixada e recombinada, a proteção aos direitos autorais está em perigo: artistas, autores, jornalistas, músicos, editores e produtores têm os frutos de seu trabalho criativo usurpados. Além disso, o anonimato da rede cria um ambiente em que pedófilos e ladrões de identidade, por exemplo, podem agir livremente. Repito, aceito estas análises. Todavia, elas lembram-me o luddismo – é o nome do movimento contrário à mecanização do trabalho trazida pela Revolução Industrial. Adaptado aos dias de hoje, o termo luddita (este nome deriva de Ned Ludd, um dos líderes do movimento) identifica toda a pessoa que se opõe à industrialização intensa ou a novas tecnologias. Os ludditas ficaram lembrados como “os quebradores de máquinas”. Não será Andrew Keen uma reencarnação de Ned Ludd?

Os blogues e um bloguista É preciso darmo-nos conta do quanto com blogues podemos usufruir de uma rapidação na difusão do conhecimento... Um livro chega a levar dois anos entre o tempo de entrega a uma editora. Num blogue, o que produzimos hoje é lido hoje, instantaneamente em diferentes latitudes e longitudes. E mais, esses escritos são menos efêmeros do que se imagina. Não raro, meses depois de postado um assunto, se está recebendo retornos ao mesmo. Logo, não vale para uma lauda blogada aquilo que o senso comum atribui para o jornal de ontem: só serve para enrolar peixe. Lamento apenas que nossos leitores não tenham o hábito de comentar os escritos. Talvez menos de 2% da meia centena de leitores que visitam meu blogue deixam comentários. A possibilidade de interação dos participantes no binômio escrita leitura – uma das mais emocionantes criações dos humanos – faz os blogues instrumentos que levam grande vantagem sobre os livros. 18_


Desejo trazer a seguir três dimensões do meu ser bloguista. Minha análise pode ser suportada pela tentativa de compartilhar, aqui e agora, respostas a três interrogações: O que escrevo? Como escrevo? Por que escrevo? A primeira é de fácil resposta. A segunda vai trazer algo de como iniciar um texto. A terceira, mais complexa, já mereceu contribuições de leitores de diferentes linguagens e países. Já antecipo que talvez ainda tenha que buscar ajudas psicanalíticas para responder esta terceira pergunta. Quase antecipo que nesse ensaio só dê conta da resposta a primeira e talvez um pouco da segunda das perguntas. Mas antes de responder – ou melhor, tentar responder – uma e outra das perguntas, é preciso dizer algo sobre o cada dia colocar algo com um determinado cuidado literário, correspondente acerca de três páginas de um livro. Se pensarmos em um livro com em torno de 300 páginas, significa que a produção escrita do blogue corresponderia à produção anual de mais de três livros com aquele volume de páginas. Se nos dermos conta de que há um cuidado pelo ineditismo de cada texto (muitas vezes baldado por causa da periodicidade cíclica das postagens) e também de se fazer muitas poucas vezes transcrições de outros autores, só isso é uma razoável (ou, pelo menos, extensa) produção literária. A demonstração da quantidade do material produzido surpreendeu até a mim quando fiz esse cálculo, na preparação da fala que originou esse texto. Devo dizer que já tive convite de um editor para fazer seleção de algumas edições do blogue para publicá-las em suporte papel. Fiz uma tentativa de seleção, mas parece que os textos blogados resistem a outro tipo de materialização.

O que escrevo? Os dados recém-apresentados são facilitadores para responder a primeira pergunta: O que escrevo? As edições diárias têm perfis diferenciados, mas têm um fio condutor: a presença constante de um discreto diário. Pareceme, mesmo quando vá falar de um assunto acadêmico mais árduo, que preciso dar a cada edição uma marca pessoal e contextualizar no cotidiano. Esse cunho pessoal tem duas faces: de um lado, uma dose (aqui confessada) de exibicionismo do bloguista, e de outro, certo voyeurismo dos leitores; essas duas _ 19


faces são como nos programas do tipo Big Brother. Os blogues se extravasam, ou melhor, se deleitam nessas duas faces. Talvez pelo fato de no meu caso o bloguista ser um professor com certa inserção nacional, há alguma tietagem bimodal. Essa marca do pessoal pode ser um discreto comentário meteorológico (e isso já deu azo a obter a revelação de uma leitora, que vou contar adiante), algo sobre a agenda do dia ou relato de detalhes do local de onde está sendo feito a blogada. Com essa marca de fazer um “diário” usualmente presente, eis algumas variações de diferentes perfis cotidianos: A) Diário de um mestre-escola: [a modo de agenda eletrônica] conto das aulas que vou dar (falo da preparação das mesmas)/que dei (comento sucessos ou frustrações), mostro avaliações aplicadas e suas correções, comento desafios pedagógicos como naquele do 47º ano de magistério ter que pela primeira vez lecionar Políticas de Educação no Brasil para alunas e alunos de quatro licenciaturas diferentes, entre estas, uma turma de 60 alunas e alunos de Educação Física. Também, desde que mais recentemente (2007) passei a ser professor do Centro Universitário Metodista – IPA, tem sido me oportunizado trabalhar disciplinas inéditas para mim (Políticas da Educação Brasileira e Didática Geral – nesta, inclusive, para quase meia centena de estudantes de Música). Em 2009/1 (quando reescrevo este texto), trabalho com uma turma de Prática Pedagógica para licenciados em Filosofia. Detalhar as atividades que faço com o grupo tem oferecido, no comentário insuspeito de alguns leitores, alternativas para professoras e professores fazerem algo semelhante em suas salas de aula. Por serem esses os profissionais que acredito ser meu público mais fiel, tenho buscado um maior adensamento nesse primeiro perfil. B) Diário de viagem: narro minhas viagens, usualmente a trabalho. Assim, quando em julho de 2008 estive em Pedras de Fogo, que, provavelmente, nenhum de meus leitores sabia onde era, estes viajaram comigo cerca de 6 mil quilômetros em menos de dois dias. Minhas viagens de férias ganham espaços e têm consequências: um médico de Porto Alegre, que não me conhecia, um dia escreve-me uma mensagem em que dizia que incluíra a Croácia e a Eslovênia em seu roteiro pelo que leu acerca de minhas andanças nesses dois países em fevereiro de 2008. Quando voltou, foi a minha casa levar-me um mimo de viagem. Vale referir que, às vésperas da milésima blogada, já foi postado em 64 cidades diferentes: 23 no Rio Grande do Sul; em 27 cidades (de 20_


12 outros estados do Brasil); e 14 de 10 outros países. Isso também significa postagens em aeroportos, rodoviárias, ônibus, etc. Cada um desses locais de postagem foi de certa maneira geografado e/ou historiado no blogue. As conexões à Internet mudaram significativamente nesses meus quase três anos de bloguista. Claro que Panambi ou Três de Maio ganham mais visibilidade que Porto Alegre. Taimbé ou Pedras de Fogo, que Rio de Janeiro ou Brasília. Ou ainda Split ou Guanajuato, que Paris. C) Divulgação da Ciência: esta tem sido uma das minhas preocupações maiores. Exemplifico, na primeira semana de julho de 2008, em atenção ao fato de que o mundo mudou no dia 1º de julho de 1858, pois, há 150 anos, um grupo de naturalistas reunidos na Sociedade Lineana de Londres ouviu a leitura da teoria da evolução pela seleção natural pelo galês Alfred Russel Wallace e o inglês Charles Robert Darwin. Por isso, pareceu importante que, em tempos de ressurgimento de “fundamentalistas assentados no criacionismo”, fosse preciso conhecer um pouco de como se deu/dá/dará a construção do evolucionismo. Nesse 2009, no entorno da recordação dos 200 anos do nascimento de Darwin, associado aos 150 anos da primeira edição do livro A origem das espécies, houve várias edições darwinianas com discussões especiais acerca de criacionismo versus evolucionismo. Em outubro, quando do anúncio dos laureados com o Prêmio Nobel, o assunto merece destaque. D) Atenção aos assim chamados formadores de opinião. Na defesa dos movimentos sociais – tidos, muitas vezes, como inimigos por alguns –, por tal tem havido sucessivas edições em defesa do MST. Recentemente, as ações do Ministério Público contra as Escolas Itinerantes fizeram do blogue um espaço para arrecadar adesões em favor da Educação ligada ao MST. Muito cedo, leia-se com quase pioneirismo, houve posicionamentos, marcados por argumentação assentada em estudos contra o assim chamado “reflorestamento” que transforma a metade Sul do Estado em “desertos verdes”. E) Um espaço de resenhas [uma maneira de fazer ciberliteratura e de motivar a leitura de livros]: há tempo deixei de ter um espaço onde escrevia resenhas. O “Leia Livro”, um excelente portal dedicado à difusão do livro, mantido pela Secretaria de Cultura do Estado de São Paulo, parece que morreu. Agora o sítio está inerte. Muito me envolvi nele, escrevendo, por mais de 2 anos, a partir de agosto de 2004, fazendo partição de minhas leituras. Fiz ali 77 resenhas. Tenho usado o blogue para repartir com meus leitores os livros que leio. Há não muito recebi de um assíduo leitor a sugestão de reservar uma _ 21


edição semanal para resenha. Muito provavelmente programo isso para as blogadas sabatinas. Já fiz algum ensaio com a sugestão do historiador Marcos Bastos. Em evento de etnomatemática, encontrei uma ex-aluna, hoje doutoranda na UnB, que me disse: “Lá em casa, vez ou outra consultamos as resenhas do Chassot para ver o que ele está lendo e buscar inspiração”. Claro que isso envaidece um bloguista. Os filmes a que assisto usualmente são também trazidos aos leitores, acrescidos de algumas leituras, que às vezes extrapolam a narrativa cinematográfica, buscando uma contextualização (histórica). F) Um local para mostrar o que guardam os baús. Como tenho amealhado diários completos de algumas décadas e por estar preparando um livro para celebrar meus 50 anos como professor em 2011, o blogue tem sido mais recentemente um local para mostrar um pouco o que guardam os meus baús de memórias. Aqui baú está sendo usado em duas dimensões: a material e a espiritual. Uma e outra têm fornecido bastantes subsídios para evocativas blogadas que vão além do “guri paleolítico de Jacuí” que se alfabetizou escrevendo com estilete em uma pedra. Ele hoje se faz bloguista com um microcomputador, depois de ter usado pena de aço, caneta tinteiro, celebrado em 1954 a chegada da caneta esferográfica, usado uma máquina de escrever Remington no começo de seus anos de magistério e ter em 1989 adquirido um computador que não tinha disco rígido. Estou convencido da importância de escrever acerca de nossas memórias, pois elas fazem história (CHASSOT, 1996). Acredito no mote: “Quando morre um velho é como uma biblioteca que queima”. Parece que a pergunta “O que escrevo?” foi respondida na descrição desses seis perfis que traduzem as quase 1.000 edições postadas desde 30 de julho de 2006.

Como escrevo? Tenho um recurso para vencer a assim chamada “síndrome da folha em branco” ou, para usar uma metáfora mais adequada à pós-modernidade, “o pavor ante uma tela por desvirginar”. Nessas situações, socorro-me de algo que tem a ver com minha formação em Química. Quando se tem uma solução salina que contenha eletrólitos que, por diferentes parâmetros físicoquímicos, cristalizam com dificuldade, usa-se um gérmen de cristalização. Coloca-se na solução, amarrado com um tênue fio de linha, um pequeno cristal e desencadeia-se, então, a cristalização que estava inibida e, em redor 22_


do cristal semente, as diferentes espécies iônicas vão se arranjar produzindo, não raro, lindos cristais. Quando tenho texto para redigir, geralmente me dou conta de que já escrevi algo sobre o assunto. Procuro em meus arquivos um pequeno excerto, então, que vai funcionar como gérmen de cristalização. Nessa operação, o Google Desktop3,4 , é um excelente parceiro – sem me dar conta, chamo um buscador internético de parceiro, como se fosse um auxiliar de pesquisa –, pois me localiza até mensagens eletrônicas pertinentes. São os robôs do Google fazendo aquilo que em outros tempos faziam os bolsistas que auxiliavam os pesquisadores. Sem falar nas pesquisas realizadas por esses maravilhosos robôs no Google Acadêmico. Não sei quantos dos leitores conheceram uma prática de nossas avós, que a biopirataria das multinacionais que dominam o mercado dos galináceos sequestrou de nossos cotidianos, de usar um indez – este pode ser um caramujo ou uma pedra que se assemelhe a um ovo – para atrair galinhas em postura para colocar ovos em determinado ninho. Meu indez se constitui em uma alternativa para dar a partida. É preciso que confesse que há edições dos blogues que têm inúmeras redações, em madrugadas insones, na hora de exercícios físicos, especialmente durante a chatice do esteirar ou em viagens, em meu lapkopf. Atenção! Não estou me referindo a laptop. Criei, já há um tempo, a palavra lapkopf, aproveitando o substantivo alemão kopf (cabeça), por semelhança eufônica com laptop, para referir-me ao local de gestação de texto que faço em um disco não tão rígido e também com poucos recursos de salvar. Este texto, especialmente nesta reescrita outonal, foi também mexido e remexido no lapkopf, enquanto a versão (quase) final foi sendo gestada. Assim como uma mãe, durante a gravidez, curte preparar o enxoval do nascituro, muitas vezes, especialmente quando não havia tempo para uma imersão mais profunda em alguns de outros textos – e aqui outra informação para este como escrevo: tenho usualmente em produção simultânea dois ou mais textos –, vinha embalar este na tentativa de responder o que escrevo e por que escrevo. Seria preciso referir ainda as exigências estilísticas dos blogues: talvez vivamos o prelúdio de um novo gênero literário, de uma nova narrativa? É necessário fazê-lo em um texto comprimido pela pressão dos caracteres disponíveis. Devo confessar que não é raro, ao ter que cumprir a blogada nossa de cada dia, estar sem assunto. Lembro muito uma pergunta que minha mãe fazia, invariavelmente, a cada noite. O que vou cozinhar amanhã? Claro, para quem tinha que

3 - O Google Desktop [http:// desktop.google.com/] pesquisa aquilo que temos em nosso computador. É um recurso excelente, com muito mais eficiência que o “pesquisar do Windows”, pois não se restringe às locuções exatas, mas procura com mais amplidão trazendo os arquivos ordenados pelo uso mais recente, com descrição que nos permite melhor escolher. 4

- Há um tempo (11 fev. 06), a EFF (Electronic Frontier Foundation) sugeriu que os internautas não usassem a nova versão do Google Desktop anunciada. Segundo a Fundação, o novo produto pode representar uma “loja de conveniência para crackers”. Isso porque ele armazena informações sobre os arquivos de seus usuários em servidores do Google. A vantagem é que, dessa forma, o usuário pode fazer buscas em seus arquivos a partir de qualquer computador.

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prover nove bocas, com parcos recursos, a busca de alternativas era árdua. Eu, no presente, me defronto com uma pergunta que me assalta durante o dia: acerca de que vou escrever no blogue? Há dias nos quais os assuntos são naturais. Talvez a primeira definição é qual será o modelo de blogada, dentre aqueles que elenquei antes. Definido o modelo, a redação fica facilitada. Há dias que sou estéril na produção de textos... Em outros, há uma fertilidade que me excita intelectualmente. Mais recentemente (março de 2009), alterei o horário de postagem das blogadas. Agora procuro fazê-lo quase como primeira atividade (antes fazia ao entardecer). Isso me traz também uma tranquilidade e a sensação de dever cumprido. Essa afirmação pode parecer um paradoxo. Faço do redigir blogue um momento de grande fruição intelectual – leia-se: atividade de recreio (como resolver sudoku ou palavras cruzadas) –, entretanto isso também se faz presente como um dever a cumprir. Mas já estou antecipando algo da terceira pergunta. Talvez uma das maiores dificuldades no escrever esteja em não se saber a respeito do público-alvo. Quando elaboramos uma palestra, ou um parecer a uma dissertação ou tese, ou mesmo um artigo ou livro, temos o interlocutor imaginário. No blogue isso parece se fazer um pouco mais distante. Assim, merece aqui um comentário acerca de meus prováveis leitores. Tenho em média 50 visitas diárias. Há alguns – poderia citar o nome de uma meia dúzia – que reconheço por sua fidelidade e até por um continuado incentivo. Em muitos eventos que vou, deparo-me com alguns que me acompanham em minhas andanças. Por exemplo, quando estive no evento que apresentei uma prévia deste texto, encontrei alguns leitores. Assim, o Thiago Cristofoli comentou comigo detalhes de minhas andanças pelas bordas da Paraíba com Pernambuco na semana anterior ao evento. Há surpresas. No dia 20 de junho de 2008 finalizei a blogada assim: “Encerro com votos de um muito bom inverno, e, para meus eventuais leitores do hemisfério Norte, desejo um muito bom verão”. Não sei que votos expressar a leitores como os de Belém, que parecem não ter, pela proximidade do Equador, definidas estações como quem vive no Paralelo 30. A todos adito votos de um bom fim de semana. A referência àqueles próximos da linha do Equador devia-se ao fato de ter uma querida comunidade de amigos leitores em Belém do Pará, logo não desfrutam daquilo que chamamos, por exemplo, de primavera ou inverno. Pois no dia seguinte sou encantado com a presença de uma leitora que vive próximo da linha do Equador e que faz uma sugestão para os votos aos residentes em paralelos próximos ao zero. Vejam este querido comentário: 24_


“Debería desearnos vientos frescos para apaciguar el sol que calienta el año todo. Mis felicitaciones, Profesor Chassot, me encanta su manera ligera y a la vez profunda de expresar sus ideas. Saludos desde el siempre cálido Guayaquil, justo en el Ecuador, Matilde Kalil”. Dias depois, resposta a uma pergunta: “Soy del área Psicología Social y trabajo en Investigación de Mercados desde hace más de veinte años. La alegría por leerlo es grande, por haber encontrado un espacio de aprendizaje y pensamiento crítico valioso”. Esta resposta, um dos mais significativos retornos ao meu fazer pedagógico com artefato cultural pós-moderno, parece traduzir o êxito do trabalho na proposta de fazer do blogue um espaço privilegiado para produzir alfabetização científica. Talvez valesse recordar que o que difere os ricos – pessoas ou países – dos pobres não é só que os pobres possuem menos bens, mas é o fato de que a grande maioria deles está excluída da criação e dos benefícios do saber científico. Há uma exclusão daqueles que não têm um endereço com arroba. Nós defendemos a inclusão, mas os excluímos, quando dizemos, por exemplo, que, para aqueles que desejarem as lâminas de uma palestra nossa, é só pedir que as enviamos. Ocorre que só enviamos para quem tem correio eletrônico. Assim como tem o MST, ou Movimento dos Sem-Teto, devemos ajudar a diminuir o número dos presentes no MS@ – movimento daqueles que não têm um endereço onde consta arroba – Movimento dos Sem @. Nós que ascendemos à Academia é que devemos ajudar a disseminar o saber científico. Logo, meu pretenso fazer alfabetização científica com o blogue é elitista. Só atinjo os que não fazem parte do MS@, e destes, ainda os que têm tempo e acesso fácil a conexões de banda larga.

Por que escrevo? Há muito tempo tenho uma pergunta quase existencial. Essa pergunta já teve ajudas para respostas de vários de meus leitores. Tenho cerca de 9,3 mil dias (quase 25,5 anos) de diários ininterruptos sem faltar um dia, mesmo que mais de uma vez escrevesse até em UTI. Tenho ainda, anterior a 1984 (quando começa a série contínua de 26 volumes), alguns volumes esparsos. Já escrevi mais de um texto acerca da arte de escrever diário (CHASSOT, 2001; 2005). Logo, cabe ao interrogante, uma vez mais, tentar dar respostas a algo que se faz capital: Por que escrevo? _ 25


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- Esta citação está no texto “O umbigo vitoriano”, resenha do livro O coração desvelado, de Peter Gay, elaborada por Nicolau Sevcenko para o Jornal de Resenha – Folha de S.Paulo, p. 8, 12 de junho de 1999.

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- Sobre a obra Matando o tempo, escrevi uma resenha: “O desvelar-se de um mito incógnito. Episteme”. ISSN 1413-5736 04008 v.4, n. 8, p. 177-179, 1998.

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Uma tentativa de resposta está no desafio, no prazer intelectual para buscar tessituras e construir um texto. A minha fruição intelectual ou um prazer no escrever é algo que gostaria de testemunhar. Defendo a tese do quanto o escrever diários é uma alternativa para transformar escrevinhadores em escritores. Para justificar meu apego aos fazer diários, gosto de citar Oscar Wilde (1854-1900)5: “Nunca viajo sem o meu diário. É preciso sempre ter alguma coisa sensacional para ler no trem”. Se a minha tese não for válida, restará um subproduto muito precioso, do qual pelo menos nós seremos leitores encantados, mesmo que isso possa parecer narcíseo. Da minha experiência de mais de uma década na orientação de mestrandos e doutorandos e especialmente no cotidiano de sala de aula, liminarmente poderia afirmar não encontrar muitos entusiasmados nos discentes pelo escrever. Nos Programas de Pós-Graduação há a constatação: tiveram mais de quinze anos de estudo formais e não sabem redigir. O escrever é rotulado como algo traumático. É corrente a afirmação: “Já fiz os créditos; agora, só falta a tese ou a dissertação”. Mas, é quando está faltando o mais árduo ou até faltando quase tudo. Procuro outras situações e lembro-me, então, de Feyerabend (1996, p. 6 178) quando diz: “Escrever tornou-se uma atividade muito agradável – quase como compor uma obra de arte”. Talvez devêssemos buscar explicar também por que temos estudantes que gostam de escrever e o fazem com competência. Por que há aqueles que escrevem com estilo escorreito? Aventuro-me e permitam-me ser reducionista e trazer uma hipótese para explicar por que o escrever é algo prazeroso para mim: o redigir diários, primeiro e mais recentemente blogues, é um facilitador do exercício da escrita. Não estou assumindo que os blogues decretaram o fim dos diários. Mas, quando se fala em escrever diários se trata de considerar a escrita das coisas da gente. Isso pode demandar extensas discussões. Estas podem se iniciar com os instrumentais que estes artefatos culturais podem se constituir para os psicanalistas como muito bons instrumentos para suas avaliações. Contardo Caligaris (1997) diz que “falar ou escrever de si – e nisso traz a adesão de Foucault (1980) – é um dispositivo crucial da modernidade, uma necessidade cultural, já que a verdade é sempre e prioritariamente esperada do sujeito, subordinada à sua sinceridade”. Aliás, aqueles que se dedicam ao gênero autobiografia como fonte de seus estudos dão destaque a esses tipos de escritos como valiosos por serem histórica e culturalmente datados. Talvez seja por isso que, nós outros, não estudiosos do gênero autobiográfico,


nos sentimos muitas vezes como voyeurs quando lemos diários e também porque esse gênero literário (diários e autobiografia, especialmente aquelas que são “confissões” – das quais Santo Agostinho é um dos inauguradores da prática) é por demais apreciado. Hoje, há estudos historiográficos envolvendo tais textos (VIÑAO, 2000). Quando em 1999 tive um câncer, fiz escritoterapia. Produzi um livro (Uma rapsódia prostática) que, mesmo inédito, já ajudou algumas pessoas, inclusive um estadunidense e um dinamarquês. É verdade, e talvez já devesse ter dito isso antes, já que diários, e uma vez mais amplio isso aos blogues ou até às webcams, são textos de “escrever de si” – enquanto uma catarse necessária –, e o quanto este artigo não foge à norma, e por isso, também, intimista. E a alfabetização científica nos blogues? Para responder esta pergunta, que abre o segmento de encerramento deste texto, retomo o que está em outro livro (CHASSOT, 2000) e trago, uma vez mais, uma descrição de Ciência, que, mesmo que possa parecer reducionista, serve para os propósitos das discussões que se quer fazer neste encerramento. A Ciência pode ser considerada como uma linguagem construída pelos homens e pelas mulheres para explicar o nosso mundo natural. Compreendermos essa linguagem (da Ciência) – como entendemos algo escrito numa língua que conhecemos (por exemplo, quando se entende um texto escrito em português) – é podermos compreender a linguagem na qual está (sendo) escrita a natureza. Também é verdade que nossas dificuldades diante de um texto em uma língua que não dominamos podem ser comparadas às incompreensões para explicar muitos dos fenômenos que ocorrem na natureza. Por exemplo, é provável que alguns dos leitores deste texto não saibam distinguir se uma página de um livro ou de uma revista está escrita em sueco ou em norueguês, assim como deve haver nórdicos que talvez não reconheçam a diferença entre um texto em português e um em espanhol. Essa é a analogia que busco quando falo na Ciência como uma linguagem. Entender a Ciência nos facilita, também, que possamos contribuir para controlar e prever as transformações que ocorrem na natureza. Talvez o mérito mais significativo de meu ser bloguista é buscar levar meus leitores a uma mirada crítica do mundo e dos acontecimentos e fazê-los pensar/ questionar-se. Modestamente diria que sou um alfabetizador nas coisas da Ciência. Assim, teremos condições de fazer que estas transformações sejam _ 27


propostas para que conduzam a uma melhor qualidade de vida. Isto é, se quisermos colaborar para que estas transformações que envolvam o nosso cotidiano sejam conduzidas para que tenhamos melhores condições de vida. Isso é muito significativo. Talvez de maneira continuada não tenha feito mais do que isso em meu blogar cotidiano. Sei que muito pouco. Mas para mim vale o gratificante investimento. Pretendo continuar. E é muito bom ter nisso a adesão de mulheres e homens que me fazem parceria.

Referências CALLIGARIS, Contardo. 1997. “Verdades de autobiografias e diários íntimos”, disponível em www.cpdoc.fgv.br/revista/arq/236.pdf acessado em 20/05/2005. CHASSOT, Attico. Sobre o ferramental necessário para o trabalho de escrever. Estudos Leopoldenses, v. 32, n. 148, p. 37-55, 1996. ______. Alfabetização científica: questões e desafios para a educação. 4. ed. 2006, 438 p. ISSN: 8574291455, Ijuí: UNIJUÍ, 2000. ______. Sobre a arte de escrever diários. Entrelinhas, ano 1, n. 1. p. 11-15, março de 2001. ______. Alfabetização científica: uma possibilidade para a inclusão social. Revista Brasileira de Educação, São Paulo, n. 22, p. 89-100, 2003. FEYERABEND, Paul. Matando o tempo. São Paulo: Editora da Unesp, 1996. FOUCAULT, Michel. História da Sexualidade I: a vontade de saber. Rio de Janeiro: Graal, 1980. KEEN, Andrew. O culto do amador. Rio de Janeiro: Jorge Zahar. 2009. VIÑAO, Antonio. Las autobiografias, memorias y diarios como fuente histórico-educativa: tipologías y usos. Teias: Revista da Faculdade de Educação/UERJ, n. 1, p. 82-97, jun. 2000.

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O USO DA INFORMÁTICA NA ESCOLA MOTIVA OS ADOLESCENTES A APRENDER?1 ¿EL USO DE LA INFORMÁTICA EN LA ESCUELA MOTIVA A LOS ADOLESCENTES A APRENDER? Bettina Steren dos Santos* Denise Dalpiaz Antunes** Jussara Bernardi***

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- Artigo construído a partir da pesquisa Informática Educativa e o Processo Motivacional dos Adolescentes do Grupo de Pesquisa Processos Motivacionais em Contextos Educativos, cadastrado no CNPq, do qual todas as autoras fazem parte.

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- Professora da Pós-Graduação em Educação – Faculdade de Educação da PUCRS; doutora em Psicologia Evolutiva e da Educação – Universidade de Barcelona, Espanha. bettina@pucrs.br

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Resumo Este artigo sintetiza as principais reflexões decorrentes da investigação Informática Educativa e o Processo Motivacional dos Adolescentes, realizada por pesquisadores do Grupo de Pesquisa, Processos Motivacionais em Contextos Educativos, a respeito dos elementos que interferem nos processos motivacionais dos adolescentes, relacionando-os com as potencialidades oferecidas pelo uso das tecnologias da informação e da comunicação (TICs) em ambientes escolares, especificamente a utilização do Computador. A pesquisa desenvolveu-se numa abordagem qualitativa, em nível descritivo, através de testemunhos de 45 estudantes adolescentes com idade entre 12 e 16 anos. Essa amostra foi composta por 15 alunos oriundos de instituição privada, 15 da rede municipal de educação de Porto Alegre e 15 da rede estadual de educação do Rio Grande do Sul. Os resultados apontam que um dos motivos que levam os estudantes a irem para a escola é a busca pela socialização, característica esta evidenciada na construção da identidade na etapa da adolescência. Constatou-se, também, que nas escolas públicas existe um nível de motivação mais acentuado por parte dos estudantes, manifestado pela valorização do computador na escola e na perspectiva de um futuro de vida melhor. Outra questão revelada pela investigação evidencia que os adolescentes estariam mais motivados nas tarefas escolares se os professores realizassem mais atividades com o uso dos computadores. Ainda, pode-se concluir que as diferenças motivacionais dos estudantes estão diretamente relacionadas à situação social encontrada nas escolas.

- Professora da rede municipal de Porto Alegre e da rede estadual do RS; mestre em Educação – PUCRS. denise.dalpiaz@terra.com.br

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- Professora da rede municipal de Porto Alegre; mestre em Educação – PUCRS. jusbernardi@yahoo.com.br

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P a l a v r a s - C h a v e : Motivação, Adolescência, Informática Educativa.

Resumen Este artículo sintetiza las principales reflexiones derivadas de la investigación, “Informática Educativa y El Proceso Motivacional de los Adolescentes”, realizada por investigadores del Grupo de Investigación, “Procesos Motivacionales en Contextos Educativos”, sobre los elementos que interfieren en los procesos motivacionales de los adolescentes, relacionándolos con las potencialidades ofrecidas por el uso de las tecnologías de la información y comunicación (TICs) en ambientes escolares, específicamente, la utilización del Ordenador. La investigación tiene un abordaje cualitativo, descriptivo, a través de testimonios de 45 estudiantes adolescentes con edades entre 12 y 16 años. La muestra fue compuesta por 15 estudiantes de institución privada, 15 de la red municipal de educación de Porto Alegre y 15 de la rede estadual de educación de Río Grande del Sur. Los resultados apuntan que uno de los motivos que lleva a los estudiantes a ir a la escuela es la búsqueda por socialización, característica evidente en la construcción de la identidad en la etapa de la adolescencia. Se verificó también, que en las escuelas públicas existe un nivel de motivación más acentuado por parte de los estudiantes, manifestado por la valorización del ordenador en la escuela y en la perspectiva de un futuro de vida mejor. Otro aspecto revelado en la investigación se refiere a que los adolescentes estarían más motivados en las tareas escolares si los profesores realizasen más actividades con el uso de los ordenadores. También podemos concluir que las diferencias motivacionales de los estudiantes, están directamente relacionadas con la situación social encontrada en las escuelas.

P a l a b r a s - C l a v e s : Motivación, Adolescencia, Informática Educativa.

Introdução A pouca importância que os jovens estudantes têm atribuído às atividades escolares e ao estudo, de um modo geral, vem inquietando professores, famílias, 30_


pesquisadores e toda a comunidade educativa. A falta de motivação pelo processo de ensino e de aprendizagem justifica-se pelas oscilações de comportamento, característica da adolescência, e pelo fato de o adolescente encontrar-se num mundo em que a tecnologia invadiu a maioria dos lares e ambientes de socialização, e a instituição educativa, no entanto, permanece com práticas pedagógicas arcaicas, distante das realidades culturais, e, assim, pouco motivadora. Dominar o mundo tecnológico tornou-se prioridade para crianças e adolescentes que desejam estar “conectados”, e obrigação para a geração educativa nos dias atuais. Para satisfazer essas necessidades, as instituições educacionais precisam começar por ressignificar suas práticas pedagógicas, aliando-as às tecnologias da informação e suas possibilidades de aprender/ motivar. Nisso, a informática educativa pode constituir-se num instrumento interativo e motivador no processo de ensino e de aprendizagem à medida que contemplar os interesses, as realidades e os objetivos pessoais e socioculturais dos educandos. A escola tem condições de favorecer o processo motivacional de seus estudantes ao considerar que o aluno se motiva ou se desmotiva em função do significado que tem para ele as propostas de ensino, o trabalho escolar. Esse fato aliado a investigações e estudos realizados por este grupo de pesquisa conduziu à reflexão teórica e prática a respeito da relação entre informática educativa, processo motivacional e adolescência.

O significado evolutivo na adolescência O início da adolescência, momento crucial de desenvolvimento do indivíduo no ciclo da vida humana, convencionalmente denominado de primeira adolescência ou fase puberal, engloba todos os aspectos comportamentais ligados à aparência física, preparatórios para a própria vida adulta. De acordo com Osório (1992), a adolescência inicial marca, além da aquisição da imagem corporal definitiva, a ideia que o indivíduo tem do seu corpo e a estruturação da personalidade, ou seja, a construção da identidade. O período da adolescência pode ser caracterizado, segundo Mosquera e Stobäus (1984), pelas seguintes etapas evolutivas: a adolescência inicial ou puberdade (idade aproximada dos 12 aos 14 anos); a adolescência média (idade aproximada dos 14 aos 16 anos); e a adolescência final ou pré-adultez _ 31


jovem (idade aproximada dos 16 aos 20 anos). Entretanto, esta divisão por faixa etária apresenta várias contradições por ser a adolescência considerada um fenômeno fundamentalmente biopsicossocial, encontrando-se com influência direta dos aspectos biológicos, psicológicos, sociais, culturais e econômicos do ambiente onde o adolescente está inserido. Por isso, a chegada da adolescência não pode ser compreendida dissociadamente, visto que o biológico corresponde às mudanças físicas e possui fortes implicações psicológicas nos meninos e meninas, acrescidas de circunstâncias sociais, interferindo diretamente na autoimagem e autoestima de cada um. A partir desses acontecimentos e determinado pela herança genética, e mais experiências anteriores na infância, ocorre um processo evolutivo que experimentará modificações que poderão abalar o equilíbrio alcançado na etapa anterior. É importante salientar que as alterações físicas próprias do adolescer possibilitam, especialmente, a reformulação da sua identidade, constituída até o momento de maneira a possibilitar a inclusão das novas referências e características corporais, sendo que a aparência física representa a maior preocupação dessa fase vital. Embora a construção da identidade do ser humano já tenha sido iniciada com o ciclo da vida, é na fase puberal que ela se consolidará, pois é esta tarefa uma das incumbências primordiais da adolescência. Segundo Ferreira (2000, p. 23), “é na adolescência que se dá o verdadeiro conhecimento de si mesmo”. A autora segue acrescentando que o termo identidade significa o processo de reconhecimento que o indivíduo realiza de si mesmo e de suas características. Considerando sob o ponto de vista psicológico, a edificação da identidade pessoal se processa a partir das turbulências vividas pelo adolescente. Por isso, afirma-se que a crise evolutiva sofrida pelo adolescente é de certa forma uma crise de identidade. Osório (1992) acrescenta, também, que a organização da identidade se dá através da resolução do trinômio: “o que eu penso que sou” – “o que os outros pensam que sou” – “o que eu penso que os outros pensam que sou”. Chipkevitch (1995) destaca que, no percurso da elaboração da sua identidade, o adolescente deve cumprir uma série de tarefas de desenvolvimento. Essas englobam: estabilização da nova autoimagem corporal, elaboração da identidade sexual, aquisição da independência emocional, con32_


solidação do autoconceito, autodeterminação, aquisição do pensamento abstrato, estabelecimento de novas relações com os pares. Contudo, não existe uma definição homogênea sobre o desenvolvimento na adolescência, mas são as contribuições particulares das diferentes teorias que auxiliam na explicação desse período da vida humana, que significa construção, edificação da identidade a partir das inter-relações e intrarrelações.

O período da adolescência e o processo motivacional A motivação humana, um processo, é complexa e integra interesses intrínsecos, bem como interesses extrínsecos dos indivíduos. Acima de tudo, “a motivação do ser humano deve ser entendida na sua integralidade, mas percebida desde a sua singularidade” (SANTOS e ANTUNES, 2007, p. 159). Como processo internalizado, a motivação intrínseca está depositada na atividade, por tudo aquilo que ela representa para o sujeito. É um motivo baseado no prazer da própria realização da tarefa em si, onde a meta principal da ação é a execução de determinada atividade, não enfatizando o resultado que se espera dela. São condicionantes internos que impulsionam o indivíduo a apresentar interesses pessoais para suas ações. Nos motivos externos, há uma busca pela meta, por resultado e tudo aquilo que este pode proporcionar – êxito, vantagens financeiras, poder, entre outros. É aquilo que externamente ao indivíduo pode ativar objetivos próprios internalizados ao longo de suas relações interpessoais e de suas construções subjetivas. Assim, a motivação constitui-se, segundo Alonso Tapia e Fita (1999), de um conjunto de variáveis que ativam a conduta do ser humano e o orientam em determinado sentido para poder alcançar um objetivo. Também Huertas (2001, p. 54) enfatiza que por “motivação humana deve entender-se como um processo de ativação e orientação da ação”, no sentido de que o ser humano deve atuar e participar conscientemente de cada ação em sua vivência. Entretanto, a motivação é um processo que cada ser humano apreende de formas distintas, em virtude de suas relações interpessoais e intrapessoais. Desde a infância, as interações com outros seres humanos irão contribuir,

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mas não de forma determinista, à internalização de motivos intrínsecos que o indivíduo trará em sua diversidade durante toda a vida, a menos que novos motivos extrínsecos possam revelar-se em renovados processos motivacionais internalizados (SANTOS e ANTUNES, 2007, p. 157-158).

Contudo, o processo motivacional influencia diretamente o ensinar e o aprender de cada educando. A importância está em conhecer os motivos que estão implícitos nas ações dos alunos, se intrínsecos ou extrínsecos, e, sobretudo, em ter consciência de que estes motivos são elaborados nas relações interpessoais – em se tratando da educação escolar, nas relações proporcionadas pelas práticas educativas. Por isso, a motivação, por ser considerada um processo complexo e dinâmico, independe de formas isoladas de ação em sala de aula ou em outros ambientes educativos. Segundo Alonso Tapia (2005, p. 12), “há um conjunto de pautas de atuação que constituem entornos com um ambiente mais propício para que os alunos se interessem e se esforcem por aprender”. Assim, para entender a motivação e as atitudes acerca da aprendizagem, especificamente na puberdade, torna-se necessário analisar as mudanças que se produzem nessa fase da vida e a maneira de enfrentar o estudo, bem como os motivos ou valores que determinam o grau de esforço e dedicação que os alunos adolescentes apresentam, sem esquecer que eles estão imersos num contexto sociocultural. Ainda assim, no processo de ensino e de aprendizagem escolar, a motivação vincula-se ao interesse e ao esforço para a aprendizagem que os adolescentes apresentam enquanto permanecem na escola. Como por exemplo, a conduta de almejarem apenas uma nota para a aprovação, provavelmente pelos modelos culturais de ensino, bem como os desejos ao aprender, internalizados a partir de vivências pessoais. De grande importância na tarefa educativa, está a adoção de diferenciadas estratégias pedagógicas ou pessoais, por parte dos docentes, as quais poderão possibilitar a estimulação da motivação durante as atividades escolares. Nessa perspectiva, a maneira como o professor atua e se dirige aos adolescentes e propõe as atividades de ensino, já no início de sua aula e até o seu término, pode interferir diretamente de forma positiva ou negativa no processo motivacional dos alunos.

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Apesar disso, o grau de interesse e de esforço que os educandos empregam durante o processo de aprendizagem pode revelar a motivação internalizada ao aprender, indicando se cada pessoa se encontra motivada ou desmotivada em seu processo de ensino.

A utilização das tecnologias na escola As tecnologias da informação estão cada vez mais presentes em nosso cotidiano, e, principalmente, ganham destaque por parte dos adolescentes. Pode-se afirmar que a geração atual é constituída de indivíduos que praticamente “nasceram” junto com a popularização dessas ferramentas. É pequena a parcela da população que não tem acesso ao computador, não implicando o nível sociocultural. A criança de hoje, juntamente com as primeiras palavras, dá seus primeiros toques nos teclados. “Isso significa que as tecnologias da informação e da comunicação (TICs) se transformaram em elemento constituinte (e até instituinte) das nossas formas de ver e organizar o mundo” (ASSMANN, 2001, p. 270). Diante desta realidade, é mais do que imperativo que se faça um vínculo destes recursos com a realidade escolar, independentemente do sistema de ensino, incentivando o uso adequado desta ferramenta, e, ao mesmo tempo, instigando e permitindo que também outros alunos tenham acesso a este mundo que antes era distante. Além do que, as consequências da utilização das TICs e sua generalização de uso no dia-a-dia ultrapassam a “forma de conceber, criar, recuperar, transmitir, difundir, representar e aplicar o conhecimento” (SANCHO, 2007, p. 16); permite refletir diretamente na forma de fazer educação. Sancho (2007) também afirma nas pesquisas acerca da introdução de uma tecnologia tão suave como o computador, e depois a Internet, que, numa estrutura tão rígida, dura, como a escola, foi aceita naturalmente, por tradição e costume, como a única possível. Contudo, a informática está presente em todos os lugares possíveis e imagináveis, principalmente na vida dos adolescentes. Isso pode ser evidenciado através do MSN, e-mail, Orkut, Fotolog, blog, entre outros. Enfim, recursos que fazem que eles se comuniquem e criem uma linguagem, por muitas vezes, própria neste ambiente virtual. “Para que as novas tecnologias não _ 35


sejam vistas como apenas mais um modismo, mas com a relevância e o poder educacional transformador que elas possuem, é preciso refletir sobre o processo de ensino de maneira global” (KENSKI, 2003, p. 73). Certamente, um número grande dos jovens passa boa parte do tempo diante do computador, muito mais do que frequentando a escola. É preciso ensinar os adolescentes a fazer uso deste recurso tecnológico, da maneira mais adequada e benéfica possível, para seu aprendizado. Não é exagerado dizer que os novos recursos tecnológicos têm o papel ativo e constitutivo da própria morfogênese do conhecimento no que se refere às suas formas de criação, expressão e comunicação. A extraordinária versatilidade dos multimeios os transforma em “agentes cooperativos” das formas de aprendizagem (ASSMAN, 2001, p. 291).

São inúmeras as maneiras de interações possíveis no campo virtual. Pensar em computadores na educação não significa somente pensar na máquina, mas principalmente em novos processos e estratégias educacionais. Motivar alunos, mais do que dispor e depender de recursos técnicos, é resultado de uma proposta bem elaborada pelo professor; os conteúdos e os objetivos que busca alcançar devem estar de acordo com o nível dos alunos, suas faixas etárias e suas motivações de vida. Sendo assim, uma das competências do professor é estabelecer uma relação coerente entre conteúdo, objetivos e situações de aprendizagem. Os saberes são construídos em situações múltiplas, complexas, que muitas vezes tornam-se interdisciplinares e envolvem vários objetivos, trabalhados de forma não linear. O computador não deve ser visto apenas como um auxiliar do ensino, onde o professor, com uma boa formação, desempenhará um papel fundamental de mediador, já que é ele quem indaga sobre o uso do computador e as aprendizagens. Ele é quem avalia se este está contribuindo ou não para a construção de novos conhecimentos. Além disso, ele deve saber desafiar os alunos para que, a partir do projeto que cada um propõe, seja possível atingir os objetivos pedagógicos que ele determinou em seu planejamento. Assim, as mudanças educacionais também requerem criatividade no uso dos recursos tecnológicos, implicando um novo papel do professor que deve pesquisar com os alunos, apresentar problemas, desafiá-los. De acordo com Faria (2006, p. 60), “o computador é uma ‘ferramenta’ que in36_


termedeia a ação do professor e do aprender do aluno, é um auxiliar, sempre disponível e muito útil quando bem utilizado”. Por tudo isso, tais inovações tecnológicas, enquanto ferramentas a serem utilizadas pelo professor, facilitam a passagem do modelo mecanicista – de memorização – para uma educação baseada na construção do conhecimento. Argumenta Sancho (2007, p. 36) que “as TICs alteram a estrutura de nossos interesses, mudam o caráter dos símbolos e modificam a natureza da comunidade”.

Constituição da pesquisa A investigação foi desenvolvida através de uma abordagem qualitativa, em nível descritivo, através de testemunhos de alunos adolescentes do Ensino Fundamental de uma escola privada e de duas escolas públicas, no primeiro semestre de 2007. A metodologia utilizada foi o estudo de caso. Os dados da pesquisa foram coletados por meio da aplicação de um questionário semiestruturado, realizado com 45 estudantes adolescentes com idade entre 12 e 16 anos. Essa amostra foi composta por 15 alunos oriundos de instituição privada, 15 da rede municipal de educação de Porto Alegre e 15 da rede estadual de educação do Rio Grande do Sul. Esses questionários foram aplicados durante o horário escolar. O objetivo geral da pesquisa foi identificar e compreender as concepções dos alunos adolescentes sobre as motivações que os levam a ir para a escola relacionando-as com o uso do computador. As questões de pesquisa foram: • O que motiva você a ir para a escola? • Onde e como você aprendeu a usar o computador? • A escola utiliza os seus conhecimentos sobre informática? • Como a escola poderia utilizar esses conhecimentos para tornar as aulas mais interessantes? Os dados recolhidos pelo questionário foram estudados através da análise de conteúdo segundo Bardin (2004). A análise de conteúdo dos dados qualitativos consistiu em apreender todo o material arrecadado durante o trabalho de investigação, isto é, os dados transcritos das entrevistas realizadas. Essa fase implicou uma leitura flutuante que “consiste em estabelecer _ 37


contato com os documentos a analisar e em conhecer o texto deixando-se invadir por impressões e orientações”, como nos aponta Bardin (2004, p. 96). Essa análise deu-se em dois sentidos: a análise vertical e a análise horizontal, seguindo orientações de Bardin (2004). A adoção de um procedimento analítico tornou-se imprescindível para triangular as informações obtidas, confrontando e relacionando com o referencial teórico e procurando responder às questões norteadoras do estudo.

Concepção dos adolescentes Sobre os resultados encontrados até o momento, percebemos que existem alguns pontos que consideramos semelhantes e outros diferentes sobre as três realidades estudadas. A análise realizada refere-se as quatro questões norteadoras do estudo. Com relação aos motivos que levam os estudantes a irem para a escola, ficou evidente, quanto às semelhanças, que todos os alunos frequentam a escola em busca de socialização. Os alunos da escola privada destacam a importância da interação com os pares; já na instituição pública, além dos pares, eles salientam a relação com os docentes como sendo um aspecto motivador. Nesta faixa etária é peculiar a busca pelo estabelecimento de vínculos com os pares para a construção da própria identidade. Outro fator referido pelos sujeitos da pesquisa está relacionado com a aquisição do conhecimento. Existe uma percepção, na grande maioria dos adolescentes, em buscar na escola o conhecimento. Fica evidente que o aprendizado ainda é culturalmente institucionalizado. E que, para ser alguém na vida, precisa frequentar a escola. Sobre o lugar que aprenderam a utilizar o computador, percebemos que a totalidade dos estudantes aprendeu a usá-lo fora do ambiente escolar, por exemplo, em casa ou na casa de amigos e parentes. Com relação ao aproveitamento dos conhecimentos pessoais dos discentes sobre a informática, a grande maioria afirma que a escola não faz uso. Já na escola municipal fica evidenciado que se utilizam dessas habilidades nas atividades desenvolvidas no ambiente educativo. Na questão sobre como a escola poderia empregar esses conhecimentos para tornar as aulas mais interessantes, percebe-se que os adolescentes 38_


estariam mais motivados nas tarefas escolares se os professores realizassem mais atividades com os computadores, como trabalhos avaliativos, pesquisas diversificadas, entre outras. Também fica salientado que nas duas escolas públicas os estudantes desejam mais aulas de informática. Quanto às discrepâncias, os dados coletados evidenciam que os estudantes da escola privada frequentam a escola inicialmente pela socialização, mas apontam como um fator importante a obrigação determinada pelos pais especificada pelo valor pago à escola. Dessa forma, um número significativo de estudantes da rede privada responde que nada os motiva a irem para a escola. Por outro lado, os alunos das escolas públicas destacam como importante a possibilidade de um futuro melhor com uma carreira profissional bem-sucedida. No que diz respeito ao local em que os alunos aprenderam a usar o computador, na escola privada como na estadual, a grande maioria dos alunos traz de casa os conhecimentos sobre o uso do computador. Já na escola municipal, esse é diversificado, advindo ora da escola, ora da casa, entre outros locais, como cursos de informática e lan houses. Quanto à utilização da informática na prática educativa, a grande maioria dos alunos afirma que a escola pouco utiliza os conhecimentos que eles trazem, como descrito anteriormente. No entanto, na escola privada e na estadual, quase a totalidade deles é enfática ao dizer que a escola não usa suas habilidades; já na escola municipal, a grande parte dos estudantes aponta que a escola, sim, aproveita os seus conhecimentos sobre o uso do computador. Os alunos das escolas públicas demonstram mais interesse em frequentar aulas de informática e a necessidade de realizar mais trabalhos e pesquisas utilizando o computador em diferentes disciplinas. Os alunos da escola municipal também apresentaram interesse em utilizar o computador como ferramenta para a interação com outras pessoas, fato esse que não ocorre na escola privada e na estadual, já que esses possuem computadores nos seus lares. Opinando sobre a utilização dos conhecimentos para tornar as aulas mais motivadoras, os adolescentes da escola municipal e estadual manifestaram o desejo de terem mais aulas no laboratório de informática, mostrando, assim, a sua motivação para realizar atividades escolares. Já na escola privada, os alunos manifestaram interesse em possuírem computadores pessoais (laptop) para aulas interativas, evidenciando, assim, as diferentes características socioeconômicas das realidades estudadas. _ 39


Visão prospectiva A partir da análise dos dados recolhidos neste estudo, percebe-se a necessidade urgente de organizar atividades escolares que envolvam mais os estudantes e que os motive a aprender. A desmotivação é generalizada, tanto por parte dos estudantes como pelos professores. Quando se adentra no campo educacional, encontram-se cenários que denunciam uma escola estagnada no tempo, abstrata, desvinculada dos interesses dos alunos. Os educandos, sentados em suas carteiras, passivos e desmotivados, acreditam que a escola, apesar de necessária, pouco tem a contribuir para a sua formação, servindo apenas para fornecer-lhes um certificado exigido no mercado de trabalho. Esta é a realidade de muitas salas de aula em que os alunos apenas buscam alcançar o êxito mínimo exigido para que possam avançar no nível de escolaridade, e que, ao término da formação escolar, possuem uma baixa qualidade de aprendizagem e passam a compor o quadro de adolescentes desescolarizados. A característica mais marcante desse coletivo é a falta de motivação, de interesse a tudo que possa estar relacionado à escola. No entanto, constatou-se que nas escolas públicas existe um nível de motivação mais acentuado por parte dos estudantes, manifestado pela valorização do computador na escola e na perspectiva de um futuro de vida melhor. A qualidade de vida dos adolescentes da instituição pública está mais atrelada ao sucesso escolar do que os alunos da instituição privada. Estes podem ter acesso às informações no seu ambiente familiar, devido a um poder aquisitivo mais elevado. Pode-se atribuir a diferença entre as escolas públicas ao fato de a formação docente do município parecer ser de boa qualidade, na medida em que os educadores municipais têm mais oportunidades de atualização. Os docentes das escolas municipais, além de estarem em constante formação, dispõem de laboratório de informática com monitor, o que não acontece nas escolas estaduais. Já na escola privada, os docentes foram capacitados para utilizar as tecnologias nas suas aulas, bem como têm disponíveis equipamentos e laboratórios altamente atualizados. Sobretudo, a informática educativa pode constituir-se numa importante ferramenta que potencializa a aprendizagem, desde que sua utilização seja acompanhada pela mediação do professor, e por um novo paradigma educacional, diferente daquele que visava unicamente à transmissão e à memorização de informações. 40_


Nesse sentido e a partir das análises realizadas, pode-se concluir que as diferenças motivacionais dos estudantes estão diretamente relacionadas à situação social encontrada nas escolas. Dessa maneira, os alunos das escolas municipais apresentam um nível de motivação elevada; em contrapartida, os alunos da escola privada, mesmo com professores capacitados para a utilização das tecnologias, não possuem internalizados motivos para aprender. Nesse cenário, a escola estadual encontra-se entre essas duas situações, com alunos relativamente motivados mesmo possuindo professores, em sua maioria, sem formação continuada. Fica salientado que, quanto menor o nível socioeconômico dos estudantes, maior o desejo de frequentar a escola, e, portanto, a motivação para realizar as atividades do ensino e da aprendizagem. Mas só isso não é suficiente; os educadores devem pensar em uma transformação. Sancho (2007, p. 36) contribui com estas ideias anteriores, enfatizando: Para que o uso da TICs signifique uma transformação educativa que se transforme em melhora [...], muitas coisas terão de mudar. Muitas estão nas mãos dos próprios professores, que terão que redesenhar seu papel e sua responsabilidade na escola atual. Mas tantas outras escapam de seu controle e se inscrevem na esfera da direção da escola, da administração e da sociedade.

Sobretudo, é papel do professor ativar os motivos intrínsecos e facilitar a construção e o desenvolvimento da motivação para aprendizagem. Desvendando, assim, quais são as razões pessoais que podem mobilizar os estudantes adolescentes a se esforçarem para aprender, e não apenas para passar de ano ou cumprir obrigatoriedades sociais e familiares, configurando-se num excelente caminho para a transformação do desmotivado panorama educativo.

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Referências ALONSO TAPIA, Jesus. Motivar en la escuela, motivar en la família. Madrid: Morata, 2005. ALONSO TAPIA, Jesus; FITA, Henrique C. A motivação na sala de aula: o que é, como se faz. São Paulo: Loyola, 1999. ASSMANN, Hugo; SUNG, Jung Mo. Competência e sensibilidade solidária: educar para a esperança. 2. ed. Petrópolis: Vozes, 2001. BARDIN, Lawrence. Análise de conteúdo. 3. ed. Lisboa: Edições 70, 2004. CHIPKEVITCH, Eugenio. Puberdade e adolescência: aspectos biológicos, clínicos e psicossociais. São Paulo: Roca, 1995. FARIA, Elaine Turk. O professor e as novas tecnologias. In: ENRICONE, Délcia (org.). Ser professor. 5 ed. Porto Alegre: EDIPUCRS, 2006, p. 57-72. FERREIRA, Berta W. et al. Psicologia e educação: desenvolvimento humano, adolescência e vida adulta. Porto Alegre: EDIPUCRS, 2000. HUERTAS, Juan Antonio. Qué es esa cosa llamada motivación?. In: ______. (org.). Motivación: querer aprender. 2. ed. Buenos Aires/Argentina: Aique, 2001. HUERTAS, Juan Antonio; ARDURA, Arancha. Socialización y desarrollo de los motivos: uma perspectiva sociocultural. Revista Educação. Ano XXVII n. 1 (52), p. 11-37, jan./abr. 2004. KENSKI, Vani Moreira. Tecnologias e ensino presencial e a distância. 2. ed. Campinas: Papirus, 2003. MOSQUERA, Juan J. M.; STOBÄUS, Claus Dieter. Educação para a saúde: desafio para sociedade em mudança. 2. ed. Porto Alegre: D. C. Luzzatto Editores Ltda., 1984. SANCHO, Juana María. De tecnologias da informação e comunicação a recursos educativos. In: SANCHO, Juana María. et al. Tecnologias para transformar a educação. Porto Alegre: ARTMED, 2007. SANTOS, Bettina, S. dos; ANTUNES, Denise, D. Vida adulta, processos motivacionais e diversidade. Educação – PUCRS, ano XXX, n. 61, p. 149-164, jan./abr. 2007.

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EDUCAÇÃO A DISTÂNCIA E COMUNIDADES VIRTUAIS DE APRENDIZAGEM: NOVOS ESPAÇOS, NOVAS POSSIBILIDADES DISTANCE EDUCATION AND VIRTUAL LEARNING COMMUNITIES: NEW OPPORTUNITIES, NEW POSSIBILITIES *

Marcia Paul Waquil* Cláudia Zank** Josi Rosa de Oliveira*** Regina Trilho Otero Xavier**** Waléria Fortes de Oliveira*****

Resumo Este artigo apresenta a possibilidade de a Educação a Distância criar espaço para o incremento de Comunidades Virtuais de Aprendizagem. A partir da discussão sobre a teoria que fundamenta o desenvolvimento de um paradigma educacional diferenciado e do relato da experiência que um grupo de alunos e professores vivenciou no ambiente virtual de aprendizagem do Curso de Especialização em Educação a Distância do Senac EAD-RS, temse a oportunidade de conhecer uma maneira de aprender que, baseada na honestidade, correspondência, pertinência, respeito, franqueza e autonomia, pode levar à construção de uma Comunidade Virtual de Aprendizagem.

P a l a v r a s - C h a v e : Educação a Distância, Comunidade Virtual de Aprendizagem, Ambiente Virtual de Aprendizagem, Paradigma Educacional.

- Doutora em Educação pela Universidade Federal do Rio Grande do Sul (UFRGS), professora da Pós-Graduação a Distância do Serviço Nacional de Aprendizagem Comercial (Senac-RS). mpwaquil@cpovo.net

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- Mestranda em Educação (UFRGS), especialista em Educação a Distância (Senac EAD-RS) e professora em cursos técnicos de nível médio (Senac-RS e IFETRS). claudiazank@gmail.com

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- Especialista em Educação a Distância pelo Senac-RS, bacharel em Administração pela Faculdade Porto-Alegrense de Ciências Contábeis e Administrativas – FACCPA e licenciada em Ensino Profissionalizante pela Universidade de Santa Cruz do Sul – UNISC. josiro@unisc.br

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- Doutora em Informática na Educação pela Universidade Federal do Rio Grande do Sul (UFRGS), professora da Universidade Católica de Pelotas. trilhote@ ucpel.tche.br

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- Doutora em Educação pela Universidade Federal do Rio Grande do Sul (UFRGS), coordenadora e professora dos Cursos da Organização Mundial para a Educação Pré-Escolar (OMEP/BR/RS/Santa Maria). waleriafortes@gmail.com

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Abstract This paper presents the possibility for Distance Education to create opportunities to increase Virtual Learning Communities. From the discussion about the theory that provides the basis for the development of a differentiated educational paradigm, along with and the report of the experience that a group of students and teachers experienced in the virtual learning environment in the course of specialization in distance education offered by SENAC EAD-RS, one has the opportunity to find out a way of learning that can lead to the building of a Virtual Learning Community, based on honesty, correspondence, relevance, respect, openness and autonomy.

K e y w o r d s : Distance Education, Virtual Learning Community, Virtual Learning Environment, Educational Paradigm.

A educação a distância (EAD), que se desenvolve nos ambientes virtuais de aprendizagem (AVAs), locais da virtualidade, destinados a servir de cenografia para a construção de determinados saberes, chegou com força total neste milênio, viabilizando uma nova etapa no desenvolvimento do processo educativo. O uso de tecnologias digitais na educação busca integrar ao processo de ensino e aprendizagem recursos inovadores e eficientes que possibilitam as interações entre os participantes de uma comunidade. Mas somente o uso destas tecnologias não basta para que a aprendizagem se efetive com significação. Torna-se necessário que o paradigma educacional subjacente a esta prática se fundamente em princípios e teorias capazes de criar condições para a construção de conhecimentos nos AVAs. O cenário da atualidade nos apresenta inúmeras práticas educativas, introduzindo metodologias diferenciadas e voltadas à construção do conhecimento, nas quais os processos de aprendizagem valorizam as perspectivas cognitivas-socioculturais-afetivas permitidas pela interatividade, e que possibilitam às instituições realizarem experiências fora dos moldes tradicionais de “sala de aula”. Nesse cenário, o professor, enquanto tutor no AVA, desempenha o papel de mediador ou de agente desequilibrador, incentivando os alunos a participarem, a refletirem, orientando e ajudando na construção do conhecimento. Além do professor, também os outros alunos são fundamen44_


tais em um processo de aprendizagem nesta perspectiva. Por meio da interação, eles também aparecem como sujeitos mediadores ou desequilibradores, uma vez que, ao questionarem, ao levarem para o ambiente seus conhecimentos, dúvidas e experiências, ajudam o sujeito ativo a adquirir novas informações e a refletir sobre os conteúdos. A interação entre professor/aluno e aluno/aluno não só proporciona a construção do conhecimento, como possibilita a autonomia do sujeito ativo que busca mais do que o conteúdo inicial apresentado pelo programa pedagógico. A reflexão deste sujeito o torna uma pessoa com maior potencial crítico e, ao mesmo tempo, mais apto a aceitar as diferenças e os mais variados pontos de vista, cooperando no grupo. Para Piaget (1973, p. 105), “... cooperar na ação é operar em comum, isto é, ajustar por meio de novas operações (qualitativas ou métricas) de correspondência, reciprocidade ou complementaridade, as operações executadas por cada um dos parceiros”. O desafio, portanto, é sempre otimizar o processo, descobrindo e criando atitudes que permitam a este professor transitar neste mundo virtual da EAD, compreendendo não só o domínio das Tecnologias de Informação e Comunicação (TICs) e do conteúdo, mas a superação de dificuldades no campo pedagógico e inter-relacional dos sujeitos. É emergente que os agentes da EAD se apropriem da habilidade administrativa, de pessoas, de tempos e de conflitos, ou seja, de todas as situações que se apresentarem no AVA, para que possa se formar uma Comunidade Virtual de Aprendizagem (CVA). Em uma CVA, as atividades têm um sentido mais amplo do que a simples manipulação visual dos conteúdos: o pensar e o agir têm sentido criador, e visam não só à coordenação dos diversos modos de percepção e de sensação entre si e com o meio, mas também a expressão dos sentimentos, a afetividade. Se, por um lado, existe a possibilidade de optar por metodologias educativas que transformam o fazer pedagógico, por outro, existem as possibilidades tecnológicas que possibilitam uma interface gráfica, recursos de áudio e vídeo com encantamentos até então não previstos. Bem empregados, metodologia e tecnologia proporcionam uma completa interação entre os agentes do processo educativo, efetivando a colaboração e, consequentemente, melhores condições à construção do conhecimento. É importante observar que as trocas, por si só, não garantem às pessoas um melhor conhecimento de si e dos outros. A subjetividade, objetivi_ 45


dade, reciprocidade, cooperação e autonomia serão favorecidas com a grande quantidade de trocas, se elas acontecerem buscando a descentração e se a inspiração em princípios e valores éticos se fizerem presentes. No que diz respeito à lógica de comunicação, os recursos existentes na modalidade EAD dão ao professor e aos alunos a possibilidade de deixar de lado a lógica linear de comunicação, comum na maioria das salas de aula, onde um fala e os outros escutam. Nesse sentido, é necessário que o tutor apresente ideias que possibilitem a criação de um espaço onde todos possam se conectar, criando, então, uma verdadeira Comunidade Virtual de Aprendizagem. Hoje é possível, a qualquer hora e em qualquer lugar, a comunicação generalizada entre muitas pessoas, bem diferente do que acontece na aula presencial. Na EAD, o pensamento pode ser expresso muitas vezes de forma espontânea, sem as travas da autocensura. Alunos introspectivos sentem-se à vontade em suas manifestações, contribuindo para o enriquecimento do assunto em foco, o que dificilmente fariam de forma presencial. Porém, é importante observar que, embora os recursos em EAD coloquem à disposição de todos, professor e alunos, a possibilidade dessa nova lógica comunicacional, que facilita a interatividade, nada mudará se não houver disposição para mais abertura, trocas, intervenções e construções conjuntas. Além disso, a qualidade das trocas é mais importante do que o conteúdo que elas possuem. Assim sendo, torna-se mais fácil para o aluno reconhecer o real interesse do professor pela sua pessoa, pelo seu crescimento, pelo seu reconhecimento como um outro com potencialidades e características próprias, que devem ser respeitadas. O aluno em EAD valoriza e necessita de respostas rápidas, da “presença” deste professor que lhe confere um grau de importância no grupo quando lhe dá retornos e opina sobre seu pensar. Relações respeitosas e interessadas exercem forte influência na construção de personalidades éticas. O uso dos recursos do AVA permite ao professor e aos alunos a criação de verdadeiras Comunidades Virtuais de Aprendizagem (CVAs), que proporcionam uma identificação em comum, um sentimento de pertença, além de propósitos e conhecimentos generalizados. Fazer parte de um grupo com o qual se identifica é uma das características dos seres humanos, tal como unir-se para atingir objetivos comuns. Palloff e Pratt (2002) apresentam seis elementos que contribuem para o sucesso de uma CVA: honestidade, correspondência, pertinência, respeito, franqueza e autonomia. 46_


Para que estes elementos estejam presentes, há necessidade de que o AVA seja um espaço no qual se desenvolva um pensamento complexo, aberto e flexível que permita ao professor agir de acordo com a nova lógica de comunicação, que se constitui, também, em uma “porta aberta” para o conhecimento que pode levar a ações de solidariedade. O pensamento linear, cartesiano, não é suficiente para dar conta da complexidade do mundo e de cada ser humano de forma especial. O pensamento complexo atua como um ligador que supera as dicotomias e articula “saberes” vistos como separados. De acordo com Morin (2003), o movimento, a imprecisão, a incompletude, a união da complexidade e da simplificação, da ordem e da desordem, da subjetividade e da objetividade, são características do pensamento complexo. No entanto, este pensamento não pode ser ensinado, “ele se cria e se recria no próprio caminhar” (2002, p. 52), implica “reaprender a aprender num caminhar sem meta definida de antemão” (2002, p. 55). Porém, o autor ressalta que este pensamento que desconhece de antemão as respostas não é inconsequente. Ao contrário, ele se guia por princípios de responsabilidade em relação a si mesmo e para com o outro e pela consciência da interligação de todos os fatores, o que deixa tudo e todos com imensa responsabilidade pelo futuro da humanidade. A compreensão da complexidade existente é, também, a compreensão de que o todo está na parte assim como a parte está no todo. Logo, o pensamento complexo se inspira na busca da plenitude e completude dos sujeitos, permitindo-lhes cumprirem sua missão terrestre de salvaguardar a humanidade e dar continuidade ao processo de hominização. Ao atingir este tipo de pensamento, o professor e os alunos em EAD poderão se sentir em condições de atender sua proposta sob inspiração do paradigma da solidariedade. Nessas condições foi que criamos um contexto de aprendizagem e de formação em nosso Curso de Pós-Graduação em Educação a Distância do Senac EAD-RS, no qual a reflexão, a autonomia, a complexidade e as incertezas estavam presentes em nosso sistema relacional de ensino e aprendizagem. Nesse processo de mediação, passamos enquanto professor e alunos a aprender e a ensinar ao mesmo tempo, compartilhando nossas experiências pessoais e profissionais anteriores, inclusive como professores em distintos níveis de ensino, bem como construindo juntos novos “saberes”, que, segundo Charlot (2005), permitem-nos compreender melhor o sentido do mundo, da vida humana, das relações com os outros e consigo mesmo. _ 47


Com o objetivo de compreender as ações e vivências em nosso curso, apresentamos a seguir o quadro 1, com “falas” dos alunos, que poderão esclarecer melhor os sentimentos que perpassaram nossas ações. Esses exemplos foram obtidos analisando-se apenas as trocas aluno-aluno e aluno-professor, na ferramenta Fórum de Discussão do AVA denominado Moodle. Dividimos os exemplos em categorias, segundo os elementos que Palloff e Pratt (2002) apresentam como os que contribuem para o sucesso de uma Comunidade Virtual de Aprendizagem. No entanto, é importante elucidar que a separação em categorias foi realizada para fins didáticos, mas pode ocorrer que em uma determinada categoria seja possível observar traços de outra, o que demonstra a inter-relação destes elementos que devem ser compreendidos a partir de uma visão complexa. CATEGORIAS

EXEMPLOS DE INDICADORES DAS CATEGORIAS

Correspondência

Exemplo 1

(Aprender em uma CVA é um processo que exige interação entre os alunos e entre eles e o professor. A interação faz com que os participantes gerem a compreensão daquilo que estudam em conjunto e que sejam mutuamente responsáveis pela construção de conhecimentos.)

Olá L., É isso aí, a tua interação com os colegas está demais! Continue assim participativo. É muito bom ver teu envolvimento na construção do conhecimento, teu e dos colegas. D. Resposta do colega: D. A tua participação é que está demais!!!! És uma excelente mediadora. Tuas intervenções e devoluções são muito motivadoras, dignas de uma tutora com muito futuro. Muito bom. L. Exemplo 2 L. ... ... Ao afirmares que aprecias minhas modestas contribuições, envaidece o gaudério... e reforça a crença de que os laços sociais e de amizade são necessários, mesmo imprescindíveis, para bom termo, nesses ambientes virtuais de aprendizagem... cujo principal objetivo seria a construção de verdadeira comunidade virtual de aprendizagem... cooperação plena... psicointelectual, psicoafetiva, técnico-científica... ainda um tanto distante da realidade, especialmente em razão da diversidade de interesses e da administração do tempo de cada um... Vamos sentipensando, como nos ensinaram as manas W. e R... Sincero e feliz... C.

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Exemplo 3 Aí hem C., que lindo o que escreveste. Muito obrigada por ter-nos presenteado de uma forma tão carinhosa, tão divertida... adorei demais... Fui lendo e foi me vindo novamente na lembrança os nossos momentos que descreveste... e dá até uma saudade de tantas “tonturas”, ehehe. Isso tudo só valeu a pena pq temos esse grupo maravilhoso, que nos apoia, que nos incentiva, aqueles que sabemos que tentarão de alguma forma amparar, nos ajudando em vários momentos. Obrigada, queridos colegas, por serem assim. Eu aprendo muito, muito mesmo com vocês. Ah! Umas carinhas só para não perder o hábito, né? Beijaozão queridaaaaaaaa!!! D. Autonomia

Exemplo 1

(Os participantes de uma CVA assumem novos papéis e responsabilidades no processo de aprendizagem. O professor não é mais o centro do processo; o centro se desloca constantemente do professor para o aluno e vice-versa. O aluno passa a ter uma nova perspectiva de si mesmo e uma nova sensação de confiança em relação a sua capacidade de interagir com os conhecimentos.)

Olá, Caros Colegas, Esta semana está sendo, sem dúvida, uma das mais complexas (meu entendimento) no quesito tarefas. Em alguns momentos, somos tutores; em outros, observadores; outros, estudantes; outros, leitores; outros... enfim, trocamos de papéis constantemente. Ainda temos a questão do fórum que ficou (criptografado)... O aumento do prazo, a divisão da tarefa em duas... Além dos nossos grupos formais, damos nossos “pitacos” nos outros. A administração pessoal está sendo fundamental para gerenciar os tempos do curso. Hoje é quinta de manhã e já temos mais de 120 mensagens nos fóruns das atividades, e, o que é melhor, são comentários pertinentes e construtivos sobre o assunto e papéis do tutor. Por isso, como também enfatizamos que devemos estar atentos às sensações e sentimentos de nossos estudantes on-line, é que pensei ser importante criar um espaço onde pudéssemos falar sobre como estamos nos sentindo sobre isto, sobre como estamos nos vendo interiormente e aos outros no contexto da turma. Este é um espaço para que possamos escrever sem nenhum estresse; inclusive vou entender se não tiver nenhum post após este, pois entendo que temos muitas atividades... Podemos ter também a opinião das nossas profes/tutoras sobre como viram os “novos” tutores “se virando” nesta semana. Abraço e Feliz Páscoa. A.

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Exemplo 2 C., D., W., colegas e A., Gostei quando a C. falou sobre esses conceitos como um roteiro para a atuação do tutor... Aí pensei: será que não deveríamos, então, pensar em quais são nossos objetivos quando pensamos em “observação-intervenção-encaminhamentodevolução-síntese”? A W. já falou no desenvolvimento da autonomia e em pensamento crítico e autônomo. Eu tenho pensado muito (que mania essa!!!) em um termo que a W. usa – e que se tornou um hábito em muitos de nós (talvez todos nós) – ao finalizar seus posts: “PENSEMOS JUNTOS”. É tão simples, não? Duas palavras, somente! Mas, que representam um convite ao pensamento crítico, autônomo e cooperativo... Com carinho. R. Exemplo 3 E aí, foliões!!!! Chega de carnaval, está na hora de voltarmos ao trabalho!!! Que saudade de vocês!!! Foi muito bom dar uma descansada, mas eu confesso que tive que me segurar para não acessar o ambiente e dar uma espiadela em vocês. Pela rápida olhada que eu dei no ambiente, parece que vocês ficaram muito bem na minha ausência. Fico muito contente de estar participando da formação de pessoas autônomas, autoras, comprometidas e responsáveis, que mesmo sem o professor desenvolvem a tarefa solicitada até em dias de carnaval. Vocês são ótimos, parabéns para esta turma maravilhosa!!!!! Um beijo grande em todos e obrigado pela colaboração de cada um. M. Pertinência

Exemplo 1

(Trazer a vida de fora para dentro da sala de aula é o que envolve os alunos numa CVA. Ser estimulado a compartilhar exemplos de situações da vida real, textos que são significativos, amplia o resultado da aprendizagem e ajuda o grupo a construir sentidos.)

J., Como gostei das tuas palavras: “Interagir é se relacionar de forma aberta, consciente e responsável, é tornar o ‘educar’ mais próximo do ‘encantar’, do ‘compartilhar’, do ‘construir com significado’ do ‘realizar’”. Tornar o educar mais próximo do encantar. Que lindo, J.!!! Concordo, plenamente! E como nos encantamos, seja como alunos, seja como professores, quando conseguimos perceber o processo de EDUCAÇÃO acontecendo! O texto que a W. nos enviou, do qual fiz o resumo, me deixou encantada! Interagiu comigo, mobilizando meu lado intelectual, emocional, moral... Ser professor com possibilidade de interatividade e em um contexto de abertura, de indeterminância, de criação de territórios e estratégias, tem um sabor encantador para todos os participantes do processo, não achas? Com carinho. R.

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Exemplo 2 Mensagem no Fórum Tutores Aprendizes L., Colegas Tutores e Aprendizes e Tutoras, Este imprevisto que tiveste com o Teu computador, L., serve também como um aprendizado e experiência para todos nós. Trabalhando e dependendo da tecnologia para fazermos nosso trabalho, estamos sempre na eminência de ficarmos sem um equipamento ou uma ferramenta por um período. E, mesmo assim, temos que dar conta das tarefas, não é? Que sirva para aprendermos a contornar estas situações... E agora, o Teu computador já resolveu Te auxiliar de novo? Hehe... Caso precise de ajuda, fique à vontade para chamar... Um abraço, F. Exemplo 3 Olá, L., D., J. e M.! O artigo que a L. nos enviou é muito interessante, faz pensar (refletir); vai contribuir muito pra todos nós. Voto para socializar, postar no fórum. L., mais uma vez, parabéns, colega famosa. Beijos, V. Franqueza

Exemplo 1

(Em uma CVA, alunos e professores se sentem capazes de fazer e receber comentários com respeito e confiança, certos que a partir disso obterão bons resultados. Neste ambiente de franqueza se desenvolve um sentimento de liberdade para compartilhar pensamentos e sentimentos sem temer a resposta que receberão.)

Querida Professora A... A L. é minha vizinha, de Ijuí... sei que desenvolve trabalho complexo, marcado por longas jornadas... mas, essa é uma realidade de muitos... Observemos que a decisão de desistir do curso relaciona-se muito a fatores de ordem moral e emocional... a nossa amiga culpa-se por não poder participar como gostaria e, principalmente, julgar necessário... Não está totalmente errado esse pensar, mas é importante frisar que, sempre que pode, desenvolveu participação enriquecedora, à altura do seu grande potencial... aí reside outra característica pessoal, de imaginar que sempre precisará produzir extensas e ricas contribuições que, obviamente, demandam muito tempo, enquanto, na verdade, pode e deve participar de forma mais objetiva e direta... ai, ai, ai... já fui longe demais... não quero parecer pretensioso... talvez, algumas das atitudes e características pessoais de alguns de nós façam com que outros colegas julguem-se na obrigação de participar do curso de maneira muito intensa, com elevada frequência de acessos, contribuições sempre robustas e extensas, receio de parecerem medíocres, etc. Eu vou apelar... já que a L. nos ama tanto... que volte e fique no ninho... Estou mandando mensagem pessoal para a mana vizinha... Obrigado pelo apoio, maestra A.! Demonstraste fora do ambiente formal, sem proselitismo e com atitude, o que é realmente ser um tutor-educador solidário e atento... Abraços... C.

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Exemplo 2 L., vizinha... Estou encarando tua decisão com muito respeito à liberdade de escolha, baseada em pressupostos morais muito evidentes... Todavia, sinceramente, creio que possamos encontrar uma alternativa viável, que te possibilite conciliar essas jornadas múltiplas... Dentro de um espírito de companheirismo e honestidade, não posso evitar de sugerir que, juntos com a coordenação e tutoria do nosso curso, busquemos alternativa à desistência... Mano entristecido... C. Exemplo 3 Oi L.! Que situação difícil, hein, amiga!!! Sabes o que vais perder em sair deste curso com este grupo maravilhoso e estes colegas que são irmãos e te pedem que continues.... De qualquer forma, saibas que contribuíste muito com as tuas colocações sempre muito pertinentes; e em muitas questões, como colocastes em teu post, me identifico contigo. Um grande e carinhoso abraço, N. Exemplo 4 Queridos colegas e professoras! Estou com dificuldades de conciliar meus afazeres profissionais e o tempo disponível para este curso. Por isso estou comunicando que me afastarei, não estou conseguindo conviver com esta minha “falta”, me angustia muito o não poder participar como gostaria e produzir o quanto desejo! Agradeço de coração o carinho e os conhecimentos adquiridos com este maravilhoso grupo... queria ter participado mais, ter aprendido mais, ter curtido mais vocês, mas o tempo... não permitiu... É... a vida da gente é moldada por fatores que fogem a nossa vontade, sei também que cabe a nós “adequarmos” nosso tempo neste tempo maior... mas, confesso, não consegui, minhas pernas não alcançaram... Amo muito todos... sentirei imensa falta de tudo e todos!!! Quem sabe... um dia, consiga me organizar, aliviar minha carga horária... e voltar para concluir! Desejo a todos muito sucesso, e que vocês consigam mudar a cara da EAD no Brasil, tornando-a cada vez mais valorizada e respeitada... Este grupo é + que 10!!! Beijos a todos e todas!!!! L.

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Honestidade

Exemplo 1

(Para que uma CVA se desenvolva, é necessário que nas mensagens trocadas entre os seus membros os comentários sejam abertos e honestos. Além disso, quem envia a mensagem deve sentir que suas palavras serão recebidas em um ambiente em que haja carinho, confiança e interconexão.)

C., É bom saber que não me consideras tecnofóbica (eu mesma já estava desconfiando de mim...). Na verdade, adoro tecnologia. Tenho que me policiar para não me encantar, me fascinar. Além disso, sou uma eterna otimista: considero que sempre é possível melhorar, e acredito, como Piaget, que o homem é fundamentalmente bom e que tem uma tendência evolutiva de patamares inferiores para patamares superiores em termos de competências morais e intelectuais, sempre em direção ao equilíbrio perfeito (continuo acreditando, mesmo com tudo na volta nos provando que “a coisa” não é bem assim...). ... Nada fácil, também. Porém, como educadores, penso que temos a obrigação de ser otimistas e acreditar em um mundo melhor, sempre melhor!!! Forte abraço. R. Exemplo 2 (resposta a um colega que havia elogiado somente a autora da mensagem, quando o trabalho era realizado também por mais uma colega) Oi, L., Muito obrigada pelo elogio... elogiaste, ao mesmo tempo, a mim e à querida C., ehehehe, pois estamos realizando um excelente trabalho em conjunto, e ela está mediando, encaminhando e devolvendo conosco em diversos momentos. Beijinhos contentes, D. Exemplo 3 R., Colegas e M. Em relação ao que vc postou abaixo, em resposta ao post da C., permita-me, colegas, discordar especialmente do que eu assinalei em negrito. Sou extrovertida e me sinto tão confortável aqui nesse ambiente virtual quanto em sala de aula, seja com meus alunos e colegas. Não sei se estas “categorizações” nos ajudam, de fato, a compreender a diversidade das ações humanas, das suas vontades, desejos, modos de ser tão diversos. Discordemos... discordemos fraternalmente... Boa semana para todos com abraços em cada um. W.

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Respeito

Exemplo 1

(Os alunos se sentem como participantes iguais no processo de aprendizagem em uma CVA; ou seja, o professor não tem mais poder que os alunos. Sendo assim, a relação se fundamenta no respeito mútuo, e não na coerção.)

L., L. J., R., Tutores Aprendizes e N. Sentiram – após observarem –, tutores aprendizes, a provocação do L.? Ele está afirmando que o aluno também intervém, encaminha e devolve tal qual o tutor. Acho que a situação da R. é o exemplo disto, caro L. Concordo com você que um aluno ativo, participativo, autônomo, de fato, também exerce as funções de um tutor – como coadjuvante – quando instiga seus colegas a pensarem, de modo crítico e autônomo, e dizerem a própria palavra – como nos ensinou Paulo Freire (R., eu acrescentaria isso ao que disse em seu post – além de pensar por si mesmo, é preciso dizer, com autonomia, a própria palavra, correndo riscos, sendo ousado, não repetindo o que já foi dito.) Abraços em cada um, W. Exemplo 2 C., D. e Colegas, Permita-me discordar de ti, C., a respeito da ideia de ter uma turma mais homogênea. Por que buscar a homogeneidade em sala de aula ou em ambiente virtual? Abraços. W.

Quadro 1 – Trocas entre os alunos

Acreditamos que os exemplos apresentados no quadro 1 ilustram como, ao longo do curso, foi se desenvolvendo um ambiente propício para a formação de uma CVA, e do que Santos (2002) chama de uma nova subjetividade: a subjetividade da fronteira. Considerando que estamos vivendo novos tempos, teremos que trilhar caminhos totalmente desconhecidos, que fogem aos padrões anteriores fornecidos pelo paradigma da ciência moderna. Este autor diz que o sentimento ideal é semelhante àquele que os pioneiros tiveram ao desbravar terras desconhecidas, ao buscar as “terras de ninguém”. Acrescenta ainda que esta nova subjetividade não se guia por mapas, pois estes ainda não existem, tendo a sua gênese no futuro, dependente de uma autorreflexidade, que é exercida ex-ante, isto é, antes de ter acontecido – que, antes de agir, reflete, prudentemente, sobre as consequências de seus atos.

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Agir na fronteira, sem mapas referenciais, exige uma nova forma de sociabilidade, em que coexistem “hierarquias fracas, pluralidade de poderes e ordens jurídicas, fluidez das relações sociais, promiscuidade entre estranhos e íntimos, misturas de heranças e invenções” (SANTOS, 2002, p. 347). Esta forma de viver combina participação comunitária e autoria, eliminando, assim, a distinção entre sujeito e objeto. É, também, uma forma de viver onde praticamente não existe um poder central, uma única referência a ser seguida. Assim, para sobreviver, a autonomia e a criatividade são indispensáveis, bem como o sentimento de comunidade e a solidariedade. Para Santos, “nenhuma transformação paradigmática será possível sem a transformação paradigmática da subjetividade” (2002, p. 333). Essa subjetividade de fronteira, de que nos fala o autor (2002), é a que favorece as ações em EAD em uma perspectiva cooperativa, criando espaços para a formação de uma CVA. Cunha (2001) relata as tendências teóricas de revalorização da dimensão da subjetividade, em oposição à objetividade imposta pelo paradigma da ciência moderna. Citando Giroux (1994), esta autora fala da preocupação atual em compreender como acontece a produção de significados e de como estes estão vinculados aos processos cognitivos e emocionais dos aprendizes. Nesta perspectiva, saber como o aluno se vê e qual sua visão de futuro poderá ser o ponto de partida para fazer com que o processo educativo seja um momento de entusiasmo e prazer. Cunha denomina “mediação” esse “espaço das relações que envolvem professor, aluno e conhecimento”, que ... inclui prazer e entusiasmo como elemento-chave de recuperação das subjetividades dos envolvidos no processo; elege metodologias interativas como projetos de ação e pesquisa a partir da sala de aula; envolve, como possibilidade, novas tecnologias construtoras de habilidades intelectuais complexas (2001, p. 112).

Desse modo, ao recuperar a importância do reconhecimento das subjetividades, os docentes estarão caminhando na direção de Santos (2002), quando menciona que todo conhecimento é autoconhecimento. A ação docente na perspectiva do conhecimento-solidariedade reconhece, também, que as intersubjetividades dependem da concepção do próximo em uma teia de reciprocidade, isto é, esta nova subjetividade é muito mais dependente da reciprocidade do que da identidade, enfatizando a importância dos saberes éticos e “relacionais, gerados nas interações professor-alunos” conforme propõe Moraes (2004).

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Nessa perspectiva, os saberes relacionais e contextuais são, segundo Moraes, gerados “numa ecologia de ação e de significados a partir das conversações que surgem na convivência”, onde professor e alunos se transformam reciprocamente enquanto se autotransformam. Trata-se de um processo de cotransformação, mediante a criação conjunta de significados, onde importam as práticas, reflexões, relações e os significados que emergem nas interações. Com essa postura reflexiva, muda o padrão comunicacional e desencadeia-se a transformação do diálogo entre professor e alunos, convertendose em conversação voltada para o processo de construção de conhecimentos, onde ambos participam e colaboram. Cria-se, desta maneira, um ambiente cooperativo e solidário, onde professor e aluno transformam-se em aprendizes, na medida em que passam a evitar respostas autoritárias, centradas nas certezas, abrindo-se espaços para a imprevisibilidade, as incertezas, a criatividade e a formação de uma CVA. Nossa experiência como participantes do Curso de Especialização em Educação a Distância do Senac EAD-RS demonstrou que itens como a afetividade, a valorização do ser, do sentir e do pensar na construção do saber individual e coletivo são possíveis e podem ser duradouros se a comunidade assim desejar. Uma experiência exitosa como esta só acontece quando o grupo se automotiva, partilha saberes e distribui afeto. O elo estabelecido entre os integrantes do grupo remete-nos a um preceito Piagetiano que diz ser a afetividade o combustível para a aprendizagem. Acreditamos que a necessidade de pertença da natureza humana se intensifique nos grupos pelos seus integrantes. Em um ambiente no qual a honestidade, a correspondência, a pertinência, o respeito, a franqueza e a autonomia estiveram presentes e fundamentaram as ações do grupo, se formou naturalmente a CVA, que não teve fim com o encerramento do curso, pois os laços construídos entre as pessoas foram além deste. Assim, ao encerrarem a Especialização no ano de 2007, os alunos receberam por intermédio da direção do Senac EAD-RS um espaço no AVA Moodle para continuarem se encontrando e produzindo conhecimentos. Pelo seu excelente desempenho, o grupo tem até hoje um espaço de encontro e criação, sendo este artigo um dos resultados desta Comunidade Virtual de Aprendizagem. Foi, portanto, pela atuação dos professores e alunos participantes do Curso de Especialização que podemos, hoje, contar com a constância e a 56_


permanência deste grupo de estudo, comprometido com o enriquecimento individual e coletivo, mas principalmente com o Ser que da Comunidade Virtual de Aprendizagem participa e com os vínculos que se formaram e que são fomentados através das interações, trocas e construções cooperativas.

Referências CHARLOT, Bernard. Relação com o saber, formação dos professores e globalização: questões para a educação hoje. Porto Alegre: Artmed, 2005. CUNHA, Maria Isabel da. Aprendizagens significativas na formação inicial de professores: um estudo no espaço dos Cursos de Licenciatura. Interface: Comunicação, Saúde e Educação, v. 5, n. 9, p. 103-116, 2001. Disponível em http://www.interface.org.br/revista9/artigo1.pdf GIROUX, Henry. La pedagogia de los limites y la política del postmodernismo. In: ______; FLECHA, R. Igualdad educativa y diferencia cultural. 2 ed. Barcelona: El Roure Editorial, 1994. MORAES, Maria Cândida. Pensamento eco-sistêmico: educação, aprendizagem e cidadania no século XXI. Petrópolis, RJ: Vozes, 2004. MORIN, Edgar. Educar na era planetária: o pensamento complexo como método de aprendizagem no erro e na incerteza humana. São Paulo: Cortez Editora, 2003. PALLOF, Rena M; PRATT, Keith. Construindo comunidades de aprendizagem no ciberespaço: estratégias eficientes para salas de aula on-line. Porto Alegre: Editora. Artmed, 2002. SANTOS, Boaventura de Souza. A crítica da razão indolente: contra o desperdício da experiência. São Paulo: Cortez, 2002.

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RESSIGNIFICANDO O PROCESSO DE MUDANÇA NAS ORGANIZAÇÕES DE EDUCAÇÃO SUPERIOR THE PROCESS OF CHANGE IN HIGHER EDUCATION ORGANIZATIONS

Adriana Rivoire Menelli de Oliveira* *

Resumo O texto tem por objetivo trazer à luz a reflexão teórica sobre a importância da mudança nas organizações educacionais, a partir da ampliação dos espaços de reflexão e de participação, do desenvolvimento de ações inovadoras e estratégicas, além da busca sistemática pela emancipação e sustentabilidade para instituições de educação superior.

- Graduada em Letras Português e Literatura Brasileira, mestre e doutora em Educação pela PUCRS. Diretora-geral da Rede Metodista de Educação do Sul – IPA, IMEC, IU, Cesupa, IMC, reitora do Centro Universitário Metodista, do IPA, diretora da Faculdade de Direito de Porto Alegre, do IPA e diretora da Faculdade Metodista de Santa Maria, do IMC, entre 2006 e 2008. Contato: adriana@via-rs.net

P a l a v r a s - C h a v e : Participação, Mudança, Sustentabilidade, Organizações, Educação Superior.

Abstract The text aims to bring to light the theoretical reflection on the importance of change in educational organizations, by expanding space for reflection and participation, by development of innovative and strategic actions as well as by systematically searching for empowerment and sustainability of higher education institutions.

K e y w o r d s : Participation, Changing, Sustainability, Organizations, Higher Learning.

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Introdução O texto pretende refletir sobre a importância dos espaços de participação, da construção de ações estratégicas e da inovação em organizações educacionais para o alcance de um futuro sustentável. A primeira parte do texto trata sobre o processo de mudança quando desencadeado em uma organização, as condições para o enfrentamento das adversidades da sociedade atual, a busca de caminhos construtivos, coletivos e participativos, planejamento e de ações estratégicas bem definidas. Destarte, como o planejamento de uma organização educacional pode ser direcionado, principalmente, para a conquista da autossustentabilidade, da promoção de relações de participação e, por fim, da importância da instalação de um ambiente organizacional aberto e democrático que conduza à emancipação de cada indivíduo e da organização como um todo.

A organização como espaço para mudança

1 - Sistema Nacional de Avaliação da Educação Superior – SINAES, Programa Universidade para Todos – PROUNI, Programa de Apoio ao Plano de Reestruturação e Expansão das Universidades Federais – REUNI.

2

- A Unilab visa integrar países da Comunidade dos Países de Língua Portuguesa (CPLP) promovendo o intercâmbio acadêmico, fomentando pesquisas e ministrando ensino superior público entre países como Angola, Cabo Verde, Guiné-Bissau, Moçambique, Portugal, São Tomé e Príncipe, Timor Leste e até Macau, região administrativa especial da China, e que terá início em 2010.

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O ritmo das mudanças na sociedade tem ocorrido surpreendentemente rápido em todas as áreas, o que tem levado as organizações de ensino a buscar alternativas para uma adaptação ao contexto de transformações na específica área da educação. O momento educacional atual revela iniciativas importantes do Governo Federal que estão inovando o sistema de ensino brasileiro e que farão diferença no desenvolvimento do país nos próximos anos. Algumas destas iniciativas são promovidas pelas políticas públicas instituídas para a educação superior e já atendem parte da sociedade, como o SINAES, o PROUNI e o REUNI1 . A proposta mais recente do Ministério da Educação, cujo tema é a internacionalização do ensino, tem como principal objetivo o aprofundamento das ações de desenvolvimento para a educação da sociedade brasileira e a aproximação acadêmica com países de língua portuguesa. Esse desafio levou o Brasil a capitanear o projeto de internacionalização e mobilidade educacional, juntamente, com Portugal, Cabo Verde, Timor Leste, Guiné-Bissau, Moçambique, São Tomé e Príncipe e Macau2, e formar a Universidade Federal de


Integração Luso-Afro-Brasileira – UNILAB, a exemplo do que já ocorre na União Europeia, com a Declaração de Bolonha3, implantada há mais de uma década, e que impulsiona países de outros continentes a ousarem mudanças em suas propostas educacionais e de relações exteriores. O objetivo principal da proposta dos países de língua portuguesa é alcançar uma rápida aproximação entre as universidades de fala portuguesa, oferecendo maior mobilidade, trocas de experiências e de conhecimento entre seus acadêmicos. Tal proposta, certamente, ampliará a autonomia das universidades e a aproximação dos Governos, seus acadêmicos e docentes, além de permitir mudanças paradigmáticas no modelo tradicional de educação, promovido nas escolas e universidades desde suas origens aos dias de hoje. A proposta do MEC referente à mobilidade internacional para o ensino superior brasileiro corrobora com a discussão teórica discorrida neste artigo, sobre mudança nas organizações quando estas não atendem mais aos desafios do momento vivido. Da mesma forma, exemplifica como a mudança torna-se eminente em situações inesperadas, e, até mesmo, por ações inovadoras provocadas pelas transformações das necessidades da sociedade. A alternativa para uma situação como esta, portanto, é a instalação de um processo de mudança para que as transformações aconteçam e venham definir novos rumos para as organizações. Iniciativas importantes para a instalação de um processo de mudança passam pela definição do rumo que a instituição deseja tomar, a elaboração de um planejamento participativo, o investimento na capacitação técnica das diversas áreas de responsabilidade, o desenvolvimento das habilidades pessoais e interpessoais dos colaboradores, além do aperfeiçoamento das ações de marketing, de produção e a qualificação de setores, como o administrativo, o financeiro, o de gestão de pessoas e o pedagógico. Essas ações serão a base estrutural para que as lideranças desenvolvam habilidades, em todos os seus níveis de responsabilidade, necessárias para o crescimento do futuro da instituição. Certifica-se, portanto, que as mudanças quando desencadeadas não ocorrem isoladamente, mas de forma sistêmica e interligadas entre si. Neste sentido, Senge (1998) aprofunda a discussão sobre o tema da mudança nas organizações revelando que

3

- A Declaração de Bolonha, subscrita em junho de 1999, pelos ministros da Educação de 29 países europeus, objetiva a construção de um espaço europeu de ensino superior com os objetivos genéricos de promover a mobilidade e a empregabilidade dos graduados, por forma a dar conteúdo real ao direito de livre circulação e estabelecimento dos cidadãos, e de reforçar a competitividade internacional do ensino superior europeu no contexto da crescente globalização dos sistemas de ensino e formação.

[...] as mudanças necessárias não ocorrerão apenas nas “nossas organizações”, mas também dentro de nós... só mudando nossa forma de pensar é que podemos modificar políticas e práticas

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profundamente enraizadas. Só mudando nossa forma de interagir poderemos estabelecer visões e compreensões compartilhadas, e novas capacidades de ação coordenada... só ocorre dentro de uma comunidade de aprendizes (p. 23).

A organização aprendente, de acordo com os parâmetros do autor supracitado, necessita definir o seu processo de mudança a partir de [...] tecnologias componentes que convergem para a inovação das organizações e as coloca em um patamar de aprendizagem diferenciada. Defende o autor que cada organização deve atuar de forma sistêmica, com conexões claras, de forma a “[...] conduzir o processo a ser visto como um todo” (SENGE, 1998, p. 40). Logo, a aprendizagem em equipe tem sido uma forma comum de estabelecer laços fortes de cumplicidade entre todos os indivíduos que fazem parte da mesma organização, levando-os a desenvolver habilidades que estão além das perspectivas individuais de cada um. No caso de uma instituição de educação superior aprendente, a relação estabelecida entre indivíduos e saberes constituídos desencadeia um sistema interligado de redes, resultante da unidade e da concentração das forças que esta organização constrói. Uma vez estabelecida a cultura aprendente, as relações de poder acontecem de forma periférica e não interferem diretamente na substância política do sistema. Ao contrário da organização que estabelece uma relação de unidade, os modelos centralizadores têm ênfase nas contribuições individuais e no rígido controle de gerenciamento por parte de seus dirigentes. Nas organizações onde o nível de participação é mais amplo, há maior oxigenação nas relações, o que facilita o processo de crescimento institucional. São nestes espaços que os sujeitos experimentam exercícios de reflexão e autorreflexão sobre as ações. Geralmente, esta participação realiza-se por intermédio de colegiados que estabelecem relações de corresponsabilidade, além da contínua aplicação de negociação em busca de soluções. Funcionam como instâncias democráticas para a promoção dos processos na organização. Desse modo, quanto mais participativo, solidário e democrático o processo se estabelecer, maiores são as possibilidades para a promoção da qualidade de vida necessária. Historicamente, as práticas de gestão acadêmica têm se caracterizado por serem muito burocráticas, isto é, por darem mais valor aos meios, enrijecendo-os, ao invés de colocá-los a serviço dos fins. A instituição educacional, como organização, requer harmonia e unidade entre seus meios e fins. 62_


Os conselhos e os colegiados acadêmicos têm se tornado uma realidade que facilita o processo e a ação democrática da instituição, que deseja um futuro sustentável e sólido para os seus estudantes. A ação aberta e democrática, que amplia os espaços de reflexão e de debate, tem orientado a nova cultura organizacional. Este modelo de gestão privilegia diversas ações, tais como: a participação coletiva de seus colaboradores na elaboração de projetos e de planos institucionais; a aproximação entre docentes, discentes e funcionários, por meio de reuniões colegiadas para o debate e decisões sobre a organização da instituição, bem como, reafirmar uma gestão organizacional aberta e sistêmica. Para que a ação participativa e democrática se estabeleça em uma organização, o sistema de colegiados ou conselhos é uma alternativa propícia à democracia. Um exemplo concreto são os Conselhos Escolares e Acadêmicos, considerados modelos de inclusão, de gerência e de tomadas de decisão, como propõe a Lei de Diretrizes e Bases – LDB (DUTRA, 2007). Constituem-se como espaços privilegiados para a efetivação de um processo formativo e de uma prática democrática. Assim, pode-se afirmar que o Conselho Escolar é um processo e um produto de construção coletiva, cotidiana e particular que pode auxiliar e contribuir em processos de construção e de crescimento coletivo. [...] participação age como um processo de constante desenvolvimento da organização e seus indivíduos, como avaliadores permanentes dos caminhos pelos quais a participação se faz; por isso, cada vez mais, o caminho participativo está sendo relevante na superação dos problemas educacionais (WERLE, 1999, p. 86).

Administrar uma instituição educacional, portanto, requer uma ação diferenciada em seus procedimentos, em metas e em seus objetivos, pois se trata de uma instituição que educa pessoas, que transmite valores e conceitos para a formação e estrutura de vida para cada sujeito. A responsabilidade e o compromisso dos dirigentes e educadores é a formação, que ocorre por meio das relações e do conhecimento, de pessoas capazes de enfrentar um mundo e de estabelecer espaços de vida no ambiente em que vivem e convivem. Portanto, no meio educacional, entende-se que todos que compõem este espaço são responsáveis pela formação integral de todos que fazem parte deste meio; considerando que a ética e a moral devem permear todos os níveis de

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relações que se querem autênticos e verdadeiros. Este sistema funciona em rede, onde os seus organismos se relacionam entre si em busca de um mesmo objetivo. Por isso, os fios dessa teia ou rede devem estar interligados, buscando as interseções e encontros nas relações. Assim, toda organização faz parte de um sistema maior de ligações e inter-relações que compõem uma rede, o que leva a entender que, sendo esta uma instituição de educação superior, sua administração será complexa, específica e altamente diferenciada, porque se responsabiliza por formar pessoas e profissionais para o mercado de trabalho. Quando uma organização percebe que a mudança é necessária para o seu crescimento, a “tomada de decisão torna-se fundamental para a criação de uma nova forma de pensar sobre como, realmente, operam e como se planejam as ações” (MORGAN, 1996, p. 87). Este enfoque da “tomada de decisão” surgiu nos anos 40 e 50, a partir do pensamento do Prêmio Nobel Herbert Simon, que definiu a organização como um sistema cerebral. Conforme o seu ponto de vista, uma organização que funciona como “cérebro” estabelece as suas relações e as suas informações de forma complexa como uma rede neural em nível mental; é o produto ou o reflexo da capacidade de processamento da informação que ela produz. Assim, quando uma organização compartilha as suas informações em todos os níveis, em forma de rede, tanto decisões podem ser descentralizadas quanto as pessoas dentro da organização podem tomar decisões e fazer os encaminhamentos necessários para o crescimento da instituição. Para que isso ocorra, é importante uma mudança de mentalidade em todos os seus patamares hierárquicos. Esta é uma capacidade que a organização deve atingir, a de se auto-organizar, se quer ter como modelo a informação em todos os níveis. Este modelo, calcado nos princípios de Simon, proporciona um nível de participação e de responsabilidade em todo processo decisório, isto é, como seus componentes têm o entendimento do funcionamento de toda a organização e como conhecem os seus níveis de responsabilidade, comprometem-se com as pequenas e grandes decisões da organização. Quando uma organização não é capaz de auto-organizar-se e mudar o rumo, suas estratégias e objetivos acabam sucumbindo. Tal situação ocorre com muitas instituições que não superam as forças negativas e contrárias da pressão da própria organização. Conforme Fullan (2005), o processo de crescimento e de mudança em uma organização ocorre, principalmente, com a mudança de pensamento e de atuação dos seus líderes. Para isso, as lideranças devem pro64_


mover ações que garantam a autossustentabilidade da organização, buscando caminhos próprios e de sustentação. Acredita o autor que a sustentabilidade tem elementos importantes que um líder deve desenvolver, sendo o propósito moral um destes elementos. O propósito moral define a ação moral de um líder que está à frente de um processo de mudança e que atua de forma conjunta, com todos os demais da organização. A forma como atua diante do processo faz do propósito moral um sistema de qualidade, isto é, as relações são definidas pela moral de seus integrantes e isso define as relações de todos. Outro elemento de destaque para o autor é o comprometimento dos componentes em relação ao todo da organização, suas metas e valores para a mudança. Quando as pessoas são desafiadas a mudar, experimentam as suas capacidades de criação e de novos insights de tudo que pode ser consumado na organização. Também importante é a capacidade de relacionar-se com o maior número de pessoas, isto é, descentralizando as decisões, dando poder para que as pessoas saibam administrar suas ações e seus contatos. A capacidade de relacionar-se bem com as pessoas é uma habilidade que se aprende e se desenvolve quando se trabalha em equipe. Esta capacidade é fundamental nas organizações, pois não só o conhecimento técnico, mas também saber lidar com a informação e com as pessoas, trabalhar em equipe, resolver problemas e ter criatividade; esses são diferenciais para uma organização atualmente. Por outro lado, Fullan (2005) descreve outras capacidades relevantes que podem ser descritas como: a construção de relações com outras organizações, através de trocas e experiências; o aprendizado profundo, como meio de aperfeiçoamento permanente, como também a adaptação e a resolução coletiva dos problemas da organização. Destaca ainda que o comprometimento deve-se dar em todos os momentos, nos pequenos e grandes resultados. Os participantes do processo de mudança sentem-se responsáveis quando participam das discussões e dos resultados, sejam estes favoráveis ou não. As lideranças dedicam-se ao processo instituído utilizando-se de suas energias física, emocional, mental e espiritual, equilibrando e renovando-as sempre que necessário. De acordo com o autor, uma organização que se encontra em processo de mudança e não desenvolve determinadas capacidades que conduzem a sustentabilidade não alcançará o progresso. Os dois fatores citados por Morgan (1996) e Fullan (2005) mostram caminhos a serem seguidos em um processo de mudança em qualquer organização. O primeiro propõe que uma organização pode assumir a mudança a _ 65


partir da tomada de decisão, isto é, envolvendo a informação em todos os seus níveis, compartilhando decisões e proporcionando a participação intensa de seus componentes, levando-os a uma maior responsabilidade nos resultados e no crescimento alcançado; o segundo aborda as características importantes de uma organização resiliente, capaz de superar suas crises e promover a mudança em sua estrutura, através das suas lideranças; esses são fatores importantes e fundamentais para uma organização que visa à autossustentabilidade. Nesse aspecto, Clark (2006) chama à atenção: para que uma organização se torne sustentável, deve primeiro estabelecer em seu ambiente uma cultura empreendedora diante da produção do conhecimento, pois o empreendedorismo toma como base tudo o que é produzido na organização, neste caso, o que é produzido de conhecimento na universidade. Segundo o autor, uma universidade pode autossustentar-se buscando fundos de investimento e parcerias. Além disso, reforça o autor, fundos de investimento governamentais e privados, fundos de pesquisa capazes de suprir as necessidades das universidades, são caminhos essenciais para aumentar a chave de uma organização resiliente. As universidades empreendedoras sabem melhor controlar o seu suporte, pois, estabelecendo a cultura da transformação, a mudança torna-se um estado constante e parâmetro para a sustentabilidade organizacional. A mudança, portanto, não ocorre porque um comitê ou um presidente afirma uma nova ideia, mas por meio de decisões coletivas, que produzem compromisso coletivo. Organizações preparadas para a mudança engajam-se no incrementalismo cumulativo, isto é, avançam lentamente através de mudanças parciais rápidas, escolhem minimizar os riscos, iniciando muitos projetos diferentes ao mesmo tempo (CLARK, 2004). Para que organizações deem continuidade ao seu propósito de desenvolvimento, importa terem em mente que a auto-organização, a tomada de decisão e o pensamento empreendedor são fatores fundamentais em uma cultura resiliente, isto é, para que estas instituições sobrevivam, o fator sustentabilidade deve estar presente nas ações das lideranças e de todos que fazem parte do processo. Por fim, o autor afirma que se as universidades ou instituições que constituírem um estado de mudança tiverem autoconfiança estarão criando atos institucionais de mudança, porque este estado constante desenvolve a capacidade de tornarem-se o cerne de um desempenho continuado e bem-sucedido para a sustentabilidade. As universidades que criarem uma cultura empreendedora integrada terão a base para a transformação e para um futuro empreendedor. 66_


A organização como espaço de desenvolvimento Diferentes visões em educação têm feito parte das bases teóricas dos sistemas educacionais adotados em diferentes épocas, tanto por organizações públicas quanto privadas. Isso tem servido para estudos, enfocando as diversas culturas que regem as organizações. Em se tratando de instituições educacionais, estas deverão estar atentas ao aperfeiçoamento e à melhoria das condições de ensino, tendo em vista os desafios da sociedade, mais exigente, criteriosa e competitiva. A partir da intencionalidade como instituições de educação, necessitarão desenvolver uma cultura empreendedora, participativa, autossustentável, de abrangência global e de constantes mudanças dos dias atuais. Uma tendência destacada por Martinic (1997) é a organização de sistemas de gestão que favoreçam a autonomia dos estabelecimentos, isto é, a educação deverá ser capaz de assumir uma diversidade de situações e de inserções no mercado global, que obrigarão as autoridades educacionais a elaborar programas especiais para reparar as insuficiências e desigualdades que o processo de globalização tem gerado. Por certo, o ambiente de mudança necessitará de um campo de atuação amplo e definido da organização que deve iniciar com o desejo e a determinação dos gestores do processo. A partir desta decisão estratégica, é possível se elaborar uma proposta que atenda os interesses e necessidades da IES e da sociedade. Almeida (2001), por sua vez, afirma que um processo de mudança quando desencadeado em uma organização, tendo por base uma política autossustentável, deve ter presente que a ação mais efetiva para esta condição é a participação efetiva de todas as suas instâncias. Essa participação ocorre, geralmente, por meio de órgãos colegiados e em equipes, que defenderão decisões estratégicas, fundamentais para o processo de desenvolvimento institucional. As estratégias dar-se-ão pela negociação, além do gradualismo e da simultaneidade que oportunizarão que as mudanças aconteçam por partes. Além dessas estratégias, a postura positiva dos dirigentes torna-se fundamental no encaminhamento dos processos, pois esses devem se colocar como integrantes e participantes do planejamento, assumindo posturas democráticas e abertas. Da mesma forma, reafirma que em um processo de mudança tudo deve ocorrer conjuntamente, o estudo e a renovação das práticas acadêmicas, ao mesmo tempo em que estão sendo implantadas as mudanças estruturais _ 67


e participativas. A adoção de uma nova postura na organização em mudança propõe a inovação e a organização do ambiente, a partir das necessidades levantadas, para, então, partir-se para a elaboração de um planejamento estratégico, que definirá as ações a serem implantadas no desenvolvimento e na consolidação do novo modelo acadêmico em construção. Para Martinic (1997, p. 31), a educação “[...] deve ser capaz de favorecer uma reflexão crítica do próprio modo de ser, a fim de gerar uma mentalidade aberta a novas relações e culturas, promovendo uma cultura de liberdade”. Isto é, deve ser um lugar onde as pessoas se desterritorializam para construir novos ambientes, repletos da pulsão dos desejos de uma vida mais feliz e fraterna. Segundo o professor Geraldo Caravantes (2004), a época que atravessamos, neste início de século, é de mudanças em todos os aspectos sociais, políticos e econômicos, que se caracterizam pela profundidade e radicalidade com que se processam. Esta nova configuração de realidade, que conduz a rápidas mudanças e a relações extramuros, significa que há uma nova forma de administrar os desafios que se apresentam no mudo de hoje. O futuro para as organizações que vivem pelos moldes tradicionais é de rapidamente entrar em um processo de conscientização e de promoção de mudanças em sua atuação ou serão substituídas por outras, mais conscientes e capazes de responder às exigências do novo milênio, segundo coloca o autor supracitado. Há uma nova forma de organização que o autor acima defende como menos burocrática e simples, pela qual se caracteriza pelo surgimento de um novo sistema organizacional que desafia a burocracia, que corresponde à nova dinâmica ambiental e aos novos valores buscados pelo homem do início do novo milênio. Ao invés de estar subjugado às exigências de um determinado status quo, o homem adquirirá uma posição mais liberta e independente e que estará em constante mudança. Suas ligações organizacionais, pessoas, lugares e objetos, mudarão muito rapidamente neste contexto. As organizações de educação superior inseridas no cenário econômico atual de instabilidade financeira, proporcionado pelas políticas governamentais de abertura de capital estrangeiro nos ativos de instituições educacionais brasileiras, além da acirrada competição para a arregimentação de alunos, necessitam definir seu planejamento de futuro. Uma das ações importantes, nesse processo, é o planejamento que necessita ser constituído por modelo próprio, a partir das experiências e da cultura de cada organização ou 68_


instituição. Em relação às instituições de educação, não há como considerálas simples e comuns quando se fala em planejamento, pois se diferenciam pela complexidade, principalmente por se tratar de organizações que têm por objetivo a formação de pessoas. Enfrentar desafios impõe aos dirigentes e aos participantes do processo acadêmico ações que rompam paradigmas ultrapassados, os quais não mais auxiliam no desenvolvimento e no crescimento institucional. À medida que surgem novos referenciais, estes levam a outros desafios e a outros caminhos mais esclarecedores, com maior abrangência. Por isso, há que se buscar aprofundar o sistema de gestão de uma organização na direção da tomada de decisão e na participação, para melhorar o desempenho, definir melhor a forma de governo e a estrutura de poder. Este modelo requer um processo de mudança profundo, não só nas relações internas, nas estruturas, na arquitetura organizacional, mas também nas relações externas, por meio da internacionalização da gestão e das relações que possibilitarão maiores recursos, ampliação das oportunidades e trânsito de conhecimento. Torna-se evidente a necessidade de ações estratégicas, ordenadas e pensadas a partir de objetivos claros que levem a organização a um processo de qualificação e de abrangência no seu propósito acadêmico. As ações adotadas para adquirir um crescimento autossustentável identificam-se aos princípios definidos pelo tema Planejamento Estratégico das Ciências Aplicadas da área da Administração, mas, neste caso, com as peculiaridades e especificidades do mundo acadêmico. O pensar estrategicamente torna-se imprescindível para tipos de organização como as educacionais, que buscam, nos dias de hoje, caminhos para a estabilidade econômica, o profissionalismo e um ambiente estável. Infelizmente, muitas destas instituições ainda atuam administrativamente de forma amadora e intuitiva, e não calculam o risco em relação ao futuro. Por isso, estas organizações necessitam mudar, tornando-se mais profissionais, formais, sistemáticas e estáveis. Meyer Jr. (1988), por sua vez, afirma que o propósito do planejamento é prover os tomadores de decisão de alternativas para o desenvolvimento de ações que levem à solução dos problemas da organização. Ao contrário de um planejamento tradicional, centrado na figura do dirigente e acreditando em ações estáticas e de longo prazo, surge o planejamento estratégico atual, condizente com a realidade e necessidades prementes da organização. Esse planejamento traz consigo, e em seus referenciais, um planejamento contí_ 69


nuo, processual e continuado de tomada de decisões, não necessariamente seguindo um calendário preestabelecido (CASTRO, 1988). A visão, como parte do planejamento estratégico, é prospectiva e tem por objetivo conhecer o futuro provável, por meio de ações de curto e de médio prazo e que identificam a amplitude da sua análise. Além disso, inclui no seu processo a participação dos vários setores e grupos que compõem a organização, tornando o processo cada vez mais democrático e aberto. As organizações acadêmicas têm se utilizado de planos com esta perspectiva estratégica, pois os mesmos visam à utilização racional dos seus recursos físicos, materiais, financeiros e humanos. Um planejamento desta natureza deve fazer parte da expectativa da comunidade onde a IES está inserida e, de igual forma, dos envolvidos com a organização que desejam alcançar o crescimento e o desenvolvimento. Conforme Castro (1998), o planejamento faz parte do processo de desenvolvimento e de crescimento de cada organização e, certamente, imperioso para a tomada de decisão sobre o seu futuro. Para o autor, [...] o planejamento estratégico é um instrumento de trabalho poderoso, que requer certas condições para funcionar e que visa servir a direção mais eficaz das instituições. Para cada instituição haverá um sistema de gestão mais adequado que pode não ser o planejamento estratégico (CASTRO, 1988, p. 51).

Corroborando com as ideias já mencionadas, Gil (2001) assegura que o planejamento estratégico pode resultar em uma oportunidade para o exercício de reflexões criativas e de processos de responsabilização, contribuindo para a criação de uma organização redirecionada para o futuro e predisposta à implantação de mudanças. Assim, ao adotar um planejamento estratégico, uma organização deve estar preparada para mudanças estruturais como um todo, pois as ações estarão presentes em todos os seus níveis, desde a direção até os setores intermediários e de base. Somente, assim, proporcionando uma mudança geral, é que a organização se oxigena e tem condições de mudar o seu rumo para o crescimento e para o seu desenvolvimento.

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Considerações finais O processo de mudança e de transformação nas organizações requer o enfrentamento de desafios que as levem ao sucesso, à emancipação e à sustentabilidade almejada. No caso das organizações educacionais, em especial as de educação superior, quando desencadeiam um processo de mudança interna e assumem essa condição, fazem emergir a necessidade do estabelecimento de ações estratégicas e de planejamento. Isto é, a construção de um projeto de futuro, especial para cada uma das organizações, que defina o rumo e as metas a serem alcançadas. Além disso, torna-se imperativo que o processo aconteça em todos os níveis estruturais do mesmo ambiente organizacional, de forma participativa e democrática, garantindo um maior compromisso daqueles envolvidos nas mudanças. Necessariamente, essa atitude confere uma dinâmica participativa, que será amplamente discutida pelos colaboradores e seus dirigentes, ainda mais em se tratando de instituições de natureza acadêmica em que os colegiados fazem parte da sua estrutura organizacional. A partir de um plano bem elaborado, é possível buscar estratégias para o equilíbrio institucional, prever caminhos e definir rumos sustentáveis para seu futuro. Para tanto, e reforçando as ideias de Caravantes (2004) sobre estratégia, planejar é oferecer opções possíveis, que possam ser escolhidas e definidas, conforme o grau de segurança e indicando os caminhos potenciais. A eficácia só é alcançada quando vários órgãos diferentes atuam de forma ajustada e integrada. Pretendendo contribuir para o debate sobre o ressignificado conceitual dos processos de mudança enfrentados pelas IES nos dias de hoje, do planejamento estratégico adequado à realidade acadêmica, dos espaços participativos realmente democráticos e do entendimento do conceito de sustentabilidade, o artigo abre possibilidades para a discussão sobre o futuro de organizações, que são tão complexas e de caráter específico como as instituições de educação superior. Por fim, é possível compreender que caberá a cada organização buscar caminhos para a mudança de mentalidade de seus dirigentes e colaboradores, a tomada de decisão responsável e a definição de estratégias para o seu crescimento e desenvolvimento. Portanto, somente organizações que pensam e planejam seu futuro de forma coletiva, responsável e estratégica alcançam a emancipação perante a sociedade em que estão inseridas. _ 71


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PLANO DE DESENVOLVIMENTO DA EDUCAÇÃO: UM CAMINHO A SER ANALISADO ANALYSIS OF THE PLAN FOR EDUCATIONAL DEVELOPMENT Rosalir Viebrantz* Vera Lucia Felicetti* Marília Costa Morosini** Patrícia Somers***

Resumo Este artigo apresenta o Plano de Desenvolvimento da Educação (PDE), em especial o Decreto n° 6.094, de 24 de abril de 2007, que dispõe sobre a implantação do Plano de Metas Compromisso Todos pela Educação (TPE), de modo sucinto, a fim de proporcionar uma leitura objetiva do que vem a ser tais Planos. Também aponta algumas ações que estão sendo realizadas pelo Ministério da Educação Brasileira para que o PDE, bem como o TPE tenham sucesso. Analisa alguns fatores intervenientes em certos pontos do PDE, o que permite perceber a necessidade da participação da sociedade em geral, além da União Federal, dos Municípios, Distrito Federal e Estados, de modo que se efetive a melhoria na qualidade da Educação Básica no Brasil.

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- Doutorandas em Educação/ PUCRS na Universidade do Texas – Austin r.viebrantz@hotmail.com verafelicetti@ig.com.br

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- Pesquisadora Produtividade CNPq. Professora do Programa de Pós-Graduação em Educação/ PUCRS. Coordenadora no Brasil do Programa Conjunto CAPES UTexas Qualidade da Educação Superior. marilia.morosini@pucrs.br

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- Researcher Fulbright Coordination Higher Education Administration - Departament of Educational Administration in the University of Texas at Austin. Coordenadora nos USA do Programa Conjunto CAPES UTexas Qualidade da Educação Superior. pasomers@mail.utexas.edu

P a l a v r a s - C h a v e : Plano de Desenvolvimento da Educação (PDE), Educação Básica.

Abstract This article presents the PDE (Plano de Desenvolvimento da Educação – Education Development Plan), in particular the Decree nº 6094 of

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24 April 2007, which deals, in a succinct way, with the implementation of a TPE (Plano de Metas Compromisso Todos pela Educação, Plan of Education towards a Commitment to All Goals), so as to provide an objective reading of these plan. The plan also shows some actions being taken by the Brazilian Ministry of Education to make the PDE and the TPE successful. It discusses some intervening aspects of the PDE, which enables one to realize the need for the participation of society, as well as the Federal Union, Municipalities, the Federal District, and states, in order to effect an improvement in the quality of Basic Education in Brazil.

K e y w o r d s : Education Development Plan, Fundamental Education.

Introdução Neste trabalho, aborda-se de forma objetiva o Plano de Desenvolvimento da Educação – PDE (BRASIL, 2008), que é a conjunção de esforços da União, Estados, Distrito Federal e Municípios, atuando em regime de colaboração, das famílias e da comunidade, em proveito da melhoria da qualidade da Educação Básica. Em setembro de 2005, representantes da iniciativa privada, educadores, economistas, comunicadores e gestores públicos da educação passaram a se reunir para discutir caminhos e alternativas para a efetivação do direito à educação pública de qualidade no Brasil. Assim nasceu o compromisso Todos Pela Educação (TPE), uma mobilização nacional aberta à participação de todos em prol de uma meta comum, acima de interesses classistas, corporativistas ou político-partidários. Não se tratou de uma ação específica de uma organização, muito menos uma campanha publicitária com objetivos comerciais. E contou com o apoio de nomes de peso, como Milú Villela, do Itaú Cultural; Viviane Senna, do Instituto Ayrton Senna; Ana Maria Diniz, do Pão de Açúcar; Jorge Gerdau, da Gerdau; e José Roberto Marinho, da Rede Globo. O objetivo do Todos Pela Educação é efetivar o direito à educação pública de qualidade, garantindo as condições de acesso, permanência, conclusão e sucesso escolar para as crianças e jovens brasileiros, até 2022. Hoje, escola para todos ainda não significa educação para todos. O Plano convida cada ci74_


dadão a fazer sua parte – de forma integrada e sinérgica – para que até 2022, bicentenário da Independência do Brasil, toda criança e jovem tenham uma educação de qualidade. A educação é um dos instrumentos de independência.

Retrospectiva – histórica A instalação da República no Brasil e o surgimento das primeiras ideias de um plano que tratasse da educação para todo o território nacional aconteceram simultaneamente. À medida que o quadro social, político e econômico nesse período se desenhava, a educação começava a se impor como condição fundamental para o desenvolvimento do país. Havia grande preocupação com a instalação, nos seus diversos níveis e modalidades. Nas duas primeiras décadas, as várias reformas educacionais ajudaram no amadurecimento da percepção coletiva da educação como um problema nacional. Em 1932, um grupo de educadores (25), que fazia parte dos intelectuais brasileiros, lançou um manifesto ao povo e ao Governo que ficou conhecido como Manifesto dos Pioneiros da Educação. Propunham a reconstrução educacional, de grande alcance e de vastas proporções, [...] um plano com sentido unitário e de bases científicas [...] (AZEVEDO, 1932). O documento teve grande repercussão e motivou uma campanha que resultou na inclusão de um artigo específico na Constituição Brasileira de 16 de julho de 1934 (BRASIL, 1934). O Art. 150 declarava ser competência, da União, fixar o Plano Nacional de Educação, compreensivo do ensino de todos os graus e ramos, comuns e especializados; e coordenar e fiscalizar a execução, em todo o território do país. Atribuía também competência ao Conselho Nacional de Educação, organizado em forma de lei, a elaborar o plano para ser aprovado pelo Poder Legislativo, sugerindo ao Governo as medidas que julgasse necessárias para a melhor solução dos problemas educacionais bem como a distribuição adequada de fundos especiais. Percebe-se que todas as constituições posteriores, com exceção da carta de 37, incorporaram, implícita ou explicitamente, a ideia de um Plano Nacional de Educação. Havia subjacente o consenso de que o plano deveria ser fixado por lei, e a ideia prosperou e nunca mais foi inteiramente abandonada (BRASIL, 1937). _ 75


O primeiro Plano Nacional de Educação surgiu em 1962, elaborado já na vigência da primeira Lei de Diretrizes e Bases da Educação Nacional, Lei nº 4.024, de 1961 (BRASIL, 1961; 1962). Ele não foi proposto na forma de um projeto de lei, mas apenas como uma iniciativa do Ministério da Educação e Cultura; a iniciativa foi aprovada pelo Conselho Federal de Educação. O plano era um conjunto de metas qualitativas e quantitativas a serem alcançadas em oito anos. Em 1965, foi feita uma revisão, em que foram introduzidas normas descentralizadas e estimuladoras da elaboração de planos estaduais. Em 1966, uma nova revisão, que se chamou Plano Complementar de Educação, introduziu importantes alterações na distribuição dos recursos federais, beneficiando a implantação de ginásios orientados para o trabalho e o atendimento de analfabetos com mais de dez anos. Em 1967, novamente a ideia de uma lei ressurge, a qual foi proposta pelo Ministério da Educação e Cultura, e debatida em Encontros Nacionais de Planejamentos, sem que a iniciativa chegasse a se concretizar (BRASIL, 1967). Cinquenta anos após a primeira tentativa oficial, com a Constituição Federal de 1988, ressurge a ideia de um plano nacional em longo prazo, como força de lei, capaz de conferir estabilidade às iniciativas governamentais na área de educação. O artigo 214 contempla esta obrigatoriedade. Já a Lei nº 9.394, de 1996, que estabelece as Diretrizes e Bases da Educação Nacional, determina nos artigos 9º e 87º, respectivamente, que cabe à União a elaboração do Plano, em colaboração com os Estados, o Distrito Federal e os Municípios, e institui a Década da Educação. Define ainda que a União encaminhe o Plano ao Congresso Nacional, um ano após a publicação da citada lei, com diretrizes e metas para os dez anos seguintes, em concordância com a Declaração Mundial sobre Educação para todos (BRASIL, 1996). O projeto de Lei nº 4.155/1998 (BRASIL, 1998) aprovava o Plano Nacional de Educação. A construção deste plano atendeu aos compromissos assumidos pelo Fórum Nacional em defesa da escola pública, onde sua participação nos trabalhos da Assembleia Nacional Constituinte consolidou os trabalhos do I e do II Congresso Nacional de Educação – (CONED) e sistematizou contribuições advindas de diferentes segmentos da sociedade civil contemplando dimensões e problemas sociais, culturais, políticos e educacionais, embasados nas lutas e proposições daqueles que defendem uma sociedade mais justa e igualitária. 76_


No ano 2000, foi aprovado o Plano Nacional de Educação e teve como prioridades: a elevação global do nível de escolaridade da população; a melhoria da qualidade do ensino em todos os níveis; a redução das desigualdades sociais e regionais no tocante ao acesso e à permanência, com sucesso, na educação pública; e a democratização da gestão do ensino público. O contexto atual da educação nacional faz parte do nosso cotidiano, por isso deter-se-á, neste momento, ao estudo do Plano de Desenvolvimento da Educação.

Plano de Desenvolvimento da Educação O Brasil só será verdadeiramente independente quando todos os seus cidadãos tiverem acesso a uma educação de qualidade. Partindo deste princípio, representantes da sociedade civil, da iniciativa privada, organizações sociais e gestores públicos se uniram no movimento Todos Pela Educação (TPE) – uma aliança que tem como objetivo garantir educação básica de qualidade para todos os brasileiros até 2022. O TPE não é um projeto de uma organização específica; é um projeto de Nação. É uma união de esforços, em que cada cidadão ou instituição é corresponsável e se mobiliza, em sua área de atuação, para que todas as crianças e jovens tenham acesso a uma educação de qualidade. Em síntese, Todos pela Educação é uma organização social que tem por objetivo garantir o direito a uma educação de qualidade para todas as crianças e jovens brasileiros. Possui como estratégias de ação a sensibilização do país para o tema, o monitoramento da educação, o fomento ao debate e o estímulo à formação de agendas locais de acompanhamento, cobrança e apoio. A força deste programa está na articulação de esforços da sociedade civil, empresas e governos, de forma a criar a sinergia necessária para a superação do quadro atual da educação no Brasil, por meio de ações concretas e eficazes. Esse Plano foi elaborado porque o descaso histórico com que a educação tem sido tratada no Brasil, mais do que uma percepção equivocada em relação ao sistema de ensino e seus integrantes, reflete a falta de compromisso das elites públicas e privadas com o direito de cada cidadão a ter acesso a oportunidades efetivas de desenvolvimento do seu potencial pessoal, social _ 77


1

- Disponível em: http://portal. mec.gov.br/index.php?option=con tent&task=view&id=593&Itemid =910&sistem as=1. Acesso em 12 de abril de 2009.

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e produtivo. Enquanto a educação ocupar apenas o 7º lugar na lista de prioridades dos brasileiros (IBOPE, 2006), estará colocando em risco o presente e o futuro de milhões de brasileiros e do país. É nesse contexto que surge o Todos Pela Educação (TPE), que passa a ter uma oportunidade histórica de mudar esse quadro e alinhar esforços para o cumprimento de um direito de todos os brasileiros: uma educação de qualidade. Os esforços de cada setor – empresas, governos e sociedade civil –, se isolados, não serão suficientes para promover o salto necessário ao nosso país. De acordo com Delors, a educação desempenha um papel fundamental no desenvolvimento pessoal e social e “é um dos principais meios disponíveis, para procurar uma forma de desenvolvimento humano, mais profunda e harmoniosa, e, assim, diminuir a pobreza, a exclusão, a opressão, a ignorância e a guerra” (2001, p. 46). Partindo de uma visão crítica da presente situação da qualidade do ensino no país, Todos Pela Educação (TPE) pretende atuar de maneira construtiva, criativa e solidária, na ampliação e qualificação da demanda e na melhoria da oferta, fazendo com que essa causa seja parte integrante da consciência social, atuando em três frentes: monitoramento, mobilização e comunicação. Essa atuação acontecerá por meio das seguintes estratégias de ação: De Olho na Educação; Ação e Compromisso; Comitês; Agência de Notícias; Divulgação da Causa. A proposta é que, ao formalizarem suas adesões, as pessoas, instituições e governos se comprometam a agir em prol da educação. O comitê nacional do Todos Pela Educação (TPE) está fisicamente localizado em São Paulo, porém sua atuação é nacional, fortalecida pelos comitês regionais e alianças setoriais. Para alcançar a educação de que o Brasil precisa, foram definidas Cinco Metas1 específicas, compreensíveis e focadas em resultados mensuráveis, que devem ser atingidas até 7 de setembro de 2022: Meta 1 – Toda criança e jovem de 4 a 17 anos estarão na escola Esta meta se refere ao acesso e à permanência; ou seja, até 2022, 98% das crianças e jovens de 4 a 17 anos estarão e/ou deverão estar na escola. Em 2005, 72% das crianças frequentavam a Educação Infantil, 97% o Ensino Fundamental e 81% o Ensino Médio. Embora o Brasil tenha alcançado um notável progresso no acesso ao Ensino Fundamental, não pode ser ignorado que pelo menos uma a cada quatro crianças entre 4 e 7 anos encontrava-se fora da pré-escola e que 19% dos jovens não estavam matriculados no Ensino Médio. Já se sabe que o acesso, permanência e sucesso escolar influenciam


diretamente, de forma positiva, o futuro das crianças e jovens. Um ano a mais na escola pode representar, por exemplo, até 15% de acréscimo na renda de uma pessoa ao longo da vida. O Governo através do Instituto Nacional de Estudos e Pesquisas Educacionais Anísio Teixeira, Inep2 , realiza o Censo Escolar, que é o mais relevante e abrangente levantamento estatístico sobre a Educação Básica no país. Os dados do Censo 2008 mostram 0,4% a mais na matrícula total da Educação Básica de 2008 em relação ao ano de 2007, representando um aumento em 203.940 alunos. Tais informações contribuem para o cálculo de indicadores como o IDEB, Índice de Desenvolvimento da Educação Básica, que serve como referência às metas do Plano de Desenvolvimento da Educação, o PDE. Meta 2 – Toda criança plenamente alfabetizada até os 8 anos A meta que se refere à alfabetização prevê que até 2010, 80% e, até 2022, 100% das crianças de 8 anos de idade estarão e/ou deverão estar plenamente alfabetizadas. Meta esta que terá que vencer os dados apresentados pelo Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE), com base na Pesquisa Nacional por Amostra de Domicílios do ano 2006 (Pnad 2007, In: O GLOBO, 25/09/2008), onde, das crianças com 7 anos, 29% não sabiam ler e escrever, mesmo sendo 90,8% delas estudantes; e dos 8 a 14 anos, 5,4% delas são analfabetas. A alfabetização efetiva das crianças e jovens é pré-condição para seu sucesso na escola. É, ainda, muito importante que a alfabetização aconteça em idade apropriada, caso contrário o processo de aprendizagem poderá ser irremediavelmente comprometido. Os critérios operacionais para o acompanhamento desta meta precisarão ser definidos mais à frente, em função da implantação de avaliação da alfabetização, proposta no escopo do Plano de Desenvolvimento da Educação. Meta 3 – Todo aluno aprenderá o que é apropriado para a sua série Esta meta está diretamente relacionada com a qualidade do ensino, ou seja, até 2022, 70% dos alunos aprenderão e/ou deverão aprender o que é apropriado para a sua série. O grande esforço pela universalização do ensino não foi acompanhado pelo empenho e investimentos necessários para garantir sua qualidade. Aproveitamento baixo no processo de ensino e de aprendizagem, que as avaliações têm atestado, foi um resultado desse descompasso. A qualidade da educação, portanto, apresenta-se como o grande desafio do Brasil nesse começo de século, uma vez que ela promove crescimento econômico aliado ao desenvolvimento social. Além disso, a

2 - Informações estatísticas que abrangem todas as etapas da Educação Básica podem ser encontradas em: http://www.inep.gov.br/ imprensa/noticias/censo/escolar/ news09_02.htm. Acesso em 16 de maio de 2009.

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3 - Disponível em: http://www. inep.gov.br/imprensa/noticias/ saeb/news07_01.htm. Acesso em 15 de maio de 2009.

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qualidade da educação, ao lado do acesso, é um direito de todas as crianças e jovens. Políticas educacionais de ações têm sido realizadas a fim de assegurar a qualidade do ensino na Educação Básica. Dentre tais ações, destaca-se o Sistema de Avaliação da Educação Básica (Saeb3), o qual é composto por dois processos: a Avaliação Nacional da Educação Básica (Aneb) e a Avaliação Nacional do Rendimento Escolar (Anresc). A primeira é realizada em cada unidade da Federação e é por amostragem das redes de ensino, e tem foco nas gestões dos sistemas educacionais. A Aneb recebe o nome do Saeb em suas divulgações; já a segunda é mais detalhada e extensa que a Aneb e seu foco é em cada unidade escolar. Recebe o nome de Prova Brasil devido ao seu caráter universal. Através das informações do Saeb, o Ministério da Educação e as Secretarias Estaduais e Municipais podem definir ações voltadas à correção das distorções e debilidades identificadas nas redes de ensino. Portanto, o Saeb é um mecanismo que vem contribuir para a melhoria na qualidade de ensino na Educação Básica. Meta 4 – Todo aluno concluirá o Ensino Fundamental até os 16 anos de idade e o Ensino Médio até os 19 anos Até 2022, 95% dos alunos vão e/ou deverão concluir o Ensino Fundamental até os 16 anos de idade e 90% o Ensino Médio até os 19 anos. A quarta meta é relacionada à correção de fluxo e conclusão dos ciclos escolares. Atualmente, apenas 52% dos alunos concluíram o Ensino Fundamental até os 16 anos, e 35% terminaram o Ensino Médio até os 19 anos. Essa meta tem como pressuposto a redução das taxas atuais de evasão e repetência do Brasil, que figuram entre as mais altas do mundo. Esta meta parece ser complicada, pois de acordo com os dados do Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE), com base na Pesquisa Nacional por Amostra de Domicílios do ano 2006 (Pnad 2007), o Brasil possui 2,4 milhões de analfabetos entre 7 e 14 anos de idade, destes, 2,1 milhões (87,2%) frequentavam a escola. Do montante de 1,3 milhão de pessoas de 8 a 14 anos que não sabem ler e escrever, 84,5% está matriculada em alguma turma de Ensino Fundamental ou Médio, e 1,1 milhão de crianças e adolescentes que estão nas salas de aula são consideradas analfabetas (CALDAS, MELO, WEBER, ALMEIDA, In: O GLOBO, 25/09/2008). Para diminuir tais taxas, ações como Brasil Alfabetizado vêm sendo desenvolvidas.


Meta 5 – O investimento em educação deve ser garantido e gerido de forma eficiente e ética Até 2010, mantendo até 2022, o investimento público na Educação Básica será equivalente a 5% do PIB. A quinta meta propõe que o investimento em Educação Básica, necessário para o cumprimento das demais metas, passe de 3,5% para 5% do PIB, aliado à garantia de uma gestão eficaz e ética. Um estudo realizado pelo INEP, em setembro de 2008, apurou o investimento total4 em educação no Brasil nos últimos sete anos; esses estão indicados no quadro abaixo, e indicam um avanço significativo no investimento em direção aos 5% do PIB até 2010.

Ano

2000 2001 2002 2003 2004 2005 2006

4

- Investimento total corresponde a pessoal ativo e seus encargos sociais, a ajuda financeira aos estudantes, como bolsas de estudos e financiamento estudantil, despesas com pesquisas e desenvolvimento, transferências ao setor privado, estimativa para complemento da aposentadoria futura de pessoal ativo (cota patronal), além de outras despesas correntes e de capital.

Percentual do Investimento Público Total em Relação ao PIB Níveis de Ensino EnsinoFundamental Educação Educação De 1ª a Ensino Educação De 5ª a Total Básica Infantil Médio Terciária 4ª Séries 8ª Séries

4,7 4,8 4,8 4,6 4,5 4,5 5,0

3,7 3,8 3,8 3,7 3,6 3,7 4,2

0,4 0,4 0,4 0,4 0,4 0,4 0,4

ou Anos Iniciais 1,5 1,4 1,7 1,5 1,5 1,5 1,6

ou Anos Finais 1,2 1,3 1,3 1,2 1,3 1,3 1,5

0,6 0,7 0,5 0,6 0,5 0,5 0,7

0,9 0,9 1,0 0,9 0,8 0,9 0,8

Fonte: Inep/MEC Quadro elaborado pela DTDIE/Inep. Disponível em: http://www.inep.gov.br/ imprensa/noticias/outras/news08_26.htm. Acesso em 16 de maio de 2009.

O TPE acredita que o PDE pode contribuir decisivamente para a melhoria da educação, através da participação e do acompanhamento ativo das iniciativas, visando à continuidade das políticas públicas, sempre a partir da perspectiva de que apenas um projeto de Nação poderá garantir o cumprimento das 5 Metas. Os principais pontos do Plano de Desenvolvimento da Educação Identifica-se a seguir os principais pontos do PDE, descrevendo de forma sucinta cada um deles, bem como o que é e quais seus objetivos. E diante de tais pontos, pode-se conjecturar inúmeros aspectos, porém no escopo deste texto, apenas dois serão discutidos: o ponto Brasil Alfabetizado e a Inclusão Digital. _ 81


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PLANO

O QUE É

OBJETIVO

Criação do Ideb

Índice de Desenvolvimento da Educação Básica que vai de zero a 10 anos e leva em conta o rendimento dos alunos, a taxa de repetência e a evasão escolar.

Identificar cidades com pior ensino, que receberão auxílio federal, até atingir nota 6 até 2022.

Dinheiro da Escola

Dar às escolas que atingirem as metas do Ideb uma parcela extra, referente a 50% dos recursos do Programa Dinheiro Direto na Escola (PDDE).

Incentivar as escolas a melhorarem seu desempenho.

Provinha Brasil

Avaliação dos alunos de 6 a 8 anos.

Verificar se as crianças estão se alfabetizando e corrigir problemas, com aulas de reforço.

Transporte Escolar

Criação de linhas de financiamento do BNDES de R$ 600 milhões.

Facilitar a aquisição de veículos escolares por prefeituras e empresas.

Universidades Federais

Mais verbas às universidades que ampliarem vagas ou estimularem cursos noturnos.

Dobrar as vagas, hoje em 580 mil.

Brasil Alfabetizado

Professores da rede pública com turno livre vão receber bolsa de R$ 250,00 para alfabetizar.

Melhorar o nível salarial dos professores e a qualidade do programa.

Luz para Todos

Programa para levar energia elétrica às escolas.

Garantir energia em todas as escolas do país. Hoje, 18 mil escolas não têm eletricidade.


Piso Salarial5/ Magistério

Fixa um piso salarial mínimo para os professores de escolas públicas com jornada semanal de 40 horas.

Alcançar, gradualmente, até 2010 um piso salarial de R$ 850,00.

Pós-Doutorado

Bolsas para doutores recém-formados.

Evitar a fuga de cérebros para o Exterior.

Biblioteca na Escola

Investir R$ 17,5 milhões na ampliação e atualização das bibliotecas de 17 mil escolas.

Garantir acesso a obras literárias a 7,7 milhões de alunos até 2008.

Educação Profissional

Criação de Institutos Federais de Educação Tecnológica.

Reorganizar o sistema de ensino profissionalizante.

Proinfância

Investimento de R$ 800 milhões entre 2008 e 2010 na Educação Infantil.

Ampliar e qualificar a rede de creches e préescolas.

Gosto de ler

Estimular o estudo da leitura e escrita.

Competição com alunos de Ensino Fundamental de 80 mil escolas.

Formação

Criar novos polos de Ensino Superior a Distância.

Dar formação a milhares de professores sem Curso Superior.

FIES

Criar novos polos de Ensino Superior a Distância.

Dar formação a milhares de professores sem Curso Superior.

FUNDEB

Criar acesso facilitado – Fies: mais prazo para pagar ProUni: mais bolsas de estudo.

Para as instituições de Ensino Superior que aderirem ao ProUni, o Projeto de Lei prevê o parcelamento de débitos fiscais e previdenciários.

Regulamentação da lei do estágio.

Determinar, entre outras questões, a jornada máxima do estudante e o papel da instituição de ensino, do ofertante do estágio e do poder público.

Estágio

5

- Disponível em: http://www.fomezero.gov.br/noticias/lula-sanciona-piso-salarial-para-professoresdo-magisterio/?searchterm=None. Acesso em 12 de abril de 2009.

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Salas Multifuncionais

É um espaço organizado com equipamentos de informática.

Apoiar os sistemas públicos de ensino na organização e oferta do atendimento educacional especializado.

Censo pela Internet

Novo censo escolar terá detalhes individuais de cada aluno.

Educacenso: gestores conhecerão detalhes da educação no Brasil.

Todas as escolas públicas terão computadores.

O MEC vai distribuir computadores para todas as escolas públicas até 2010. Serão gastos cerca de R$ 650 milhões nas 130 mil escolas em mil microcomputadores.

Saúde nas Escolas

Alunos receberão atendimento sem sair de casa.

Garantir o atendimento de saúde a alunos e professores a fim de prevenir doenças e tratar outros males comuns à população escolar.

Professor Equivalente

Contratações de professores nas universidades federais.

Criação de um banco de vagas docentes.

Cidades - Polo

Brasil ganhará 150 novas escolas federais profissionais.

Um total de R$ 500 milhões serão investidos por ano para manutenção e implantação do quadro de pessoal das escolas. E, aproximadamente, R$ 750 milhões destinados à construção das novas unidades.

Concurso

Concursos ampliam quadros do FNDE e da rede profissional.

Novos concursos públicos para educação tecnológica.

Inclusão Digital

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Olhar Brasil

Crianças com dificuldade visual ganharão óculos.

Estimular os alunos da rede pública a não abandonar os estudos devido a problemas de visão.

Programa mais Educação

Os alunos terão mais atividades e mais tempo de escola.

O programa vai ampliar o tempo e o espaço educativo dos alunos da rede pública.

Guia de Tecnologias

Boas práticas para reforçar a Educação Básica.

Aproveitar as melhores experiências em tecnologias educacionais para qualificar a Educação Básica.

Acessibilidade

Universidades terão núcleos para definir ações de inclusão.

Universidades Federais farão adequação para pessoas com deficiência.

Fonte: http://portal.mec.gov.br/index.php?option=content&task=view&id=59 3&Itemid=910&sistemas=1. Acesso em 24 de junho de 2007.

Sem dúvida alguma, os pontos acima listados constituem-se caminhos que podem proporcionar a melhoria na qualidade de ensino da Educação Básica. Porém, os desafios são muitos. E segundo Demétrio Weber (2008), que comenta o pronunciamento do ministro da Educação Fernando Haddad a respeito do Educação para Todos, o Brasil está entre os 53 países que ainda não atingiram e não estão perto de atingir as metas do EPT até 20156. De acordo com esse autor, os principais desafios brasileiros são: a qualidade do ensino e a redução do analfabetismo entre jovens e adultos, onde ambos os desafios estão diretamente relacionados com a capacitação/qualificação dos professores. O programa Brasil Alfabetizado, objetiva a erradicação do analfabetismo e o progressivo atendimento a jovens e adultos até 2017. No entanto, os caminhos traçados para que isso de fato ocorra parecem divergir, pois o trabalho de voluntários e bolsas-auxílio permeiam o contexto da alfabetização brasileira. Para o trabalho do professor, alfabetizador de jovens e adultos, o governo disponibilizou uma verba para o programa, em 2009, de R$ 200 milhões, sendo esta repassada a Estados e Municípios, responsáveis pela co-

6 - Prazo acordado na Conferência Mundial de Educação em Dacar, Senegal, em 2000, que reuniu 164 países.

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- A partir de 1.º de janeiro de 2009, os professores passarão a receber dois terços da diferença do salário atual e dos R$ 950 instituídos pelo piso salarial. A integralidade do piso será paga a partir de 1.º de janeiro de 2010. “Essa é a primeira distinção que resgata a missão dos professores para o desenvolvimento do país.” Disponível em:http://www.fomezero.gov.br/noticias/lula-sancionapiso-salarial-para-professores-domagisterio/?searchterm=None. Acesso em 12 de abril de 2009.

ordenação das turmas. E os alfabetizadores recebem uma bolsa que varia de R$ 250,00 a R$ 500, 00, repassados diretamente pelo MEC (FNDE, 2009). Questiona-se aqui por que os alfabetizadores recebem uma bolsa? Esses profissionais não são professores, ou pelo menos deveriam ser? E nesse mesmo Plano de Desenvolvimento da Educação, o ponto que se refere ao piso salarial do magistério fixa um piso salarial mínimo para os professores de escolas públicas com jornada semanal de 40 horas, que deverá ser alcançado até 2010 em R$ 850,007. A partir do momento que os professores, com 20 horas semanais, passam a fazer parte da proposta Brasil Alfabetizado, aumentam a carga horária para 40 horas de jornada no magistério, criando aí uma contradição: bolsa versus piso salarial mínimo. No plano, diz que os alfabetizadores de jovens e adultos, são selecionados entre professores das redes públicas e voluntários com formação mínima de nível médio. A participação de professores das redes públicas na alfabetização de jovens e adultos visa, ainda, melhorar o nível salarial da categoria, especialmente no Nordeste, onde cerca de 62% dos professores trabalham 20 horas semanais e têm um turno livre, segundo dados da Pesquisa Nacional de Amostragem Domiciliar (PNDE/MEC, 2009).

Outra relevante questão é a seleção de voluntários para trabalharem com a educação de jovens e adultos, uma vez que o documento do Conselho Nacional de Educação da Educação de Jovens e Adultos (EJA) indica que: [...] o preparo de um docente voltado para a EJA deve incluir, além das exigências formativas para todo e qualquer professor, aquelas relativas à complexidade diferencial desta modalidade de ensino. Assim, esse profissional do magistério deve estar preparado para interagir empaticamente com esta parcela de estudantes e de estabelecer o exercício do diálogo. Jamais um professor aligeirado ou motivado apenas pela boa vontade ou por um voluntariado idealista, e sim um docente que se nutra do geral e também das especificidades que a habilitação como formação sistemática requer (BRASIL, 2000, p. 56). (grifo nosso)

É apontada ainda, no documento, a necessidade de uma docência que leve em conta as particularidades do ensino de jovens e adultos, tanto da diversidade cultural, de trabalho, quanto da necessidade de currículos adequados e, especialmente, de metodologias.

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E em face da complexidade da tarefa de ensinar, Maués (2007) reforça esta ideia dizendo que a formação docente deve estar alicerçada em uma sólida formação teórica, o que não é possível acontecer se o processo de formação docente for aligeirado, ou, segundo Brito (2006), limitada ao âmbito do tecnicismo. Nesse sentido, Nóvoa (2006) diz que o professor não pode ser somente um técnico executante, mas sim um profissional que (re)pensa sua prática. Fazse, então, necessária uma formação consolidada em pressupostos teóricos, visto que estes possibilitam a ampliação da leitura crítica da realidade. Portanto, a formação inicial do professor representa um espaço no qual ele vivencia questões preliminares do exercício docente e, logo, há de ser reconhecida como base na trajetória da aprendizagem desses profissionais. A preparação docente pressupõe uma formação ampla, além de ser um objeto de saber das Ciências da Educação; é também, uma atividade que exige diversos saberes, ou seja, bases do saber-ensinar não se remetem apenas a aspectos cognitivos, conteúdos em si, mas também a questões existenciais, sociais e pragmáticas que contribuem para a autonomia docente (TARDIF, 2002; CONTRERAS, 1997). O dia-a-dia do docente alfabetizador exige deste, além do domínio de conhecimentos gerais sobre o ensinar e o aprender, saberes específicos sobre o processo de aquisição da língua escrita. Logo, tratando de alfabetização, o professor deve dominar os conteúdos de Língua Portuguesa a serem ensinados, bem como os conteúdos iniciais de Matemática e principalmente as formas para ensiná-los, bem como o conhecimento dos processos de aprendizagem dos alunos (MOURA, et. al., 2006). É relevante destacar aqui os estudos de Laffin (2008), nos quais se observa o fato de que muitos trabalhos acadêmicos, por ela analisados, denunciam práticas de EJA que não correspondem às suas particularidades e à necessidade de condições de formação docente correspondentes às exigências da Educação de Jovens e Adultos. Observa-se nessa breve interlocução teórica a relevância da formação inicial do professor a fim de melhor consubstanciar a alfabetização, e junto a essa formação têm-se os saberes que são construídos no dia-a-dia da prática escolar. O fazer docente tem papel fundamental na educação, portanto, não pode ser remetido a voluntários e nem a bolsas-auxílio como forma de remuneração. Quanto ao ponto Inclusão Digital, entende-se a inserção de todos na sociedade da informação, ou seja, a democratização do acesso às tecnologias da informação e comunicação (TIC). Nesse sentido, o PDE entende a neces_ 87


sidade da inclusão digital a todos os estudantes das redes públicas de educação, onde o Ministério da Educação (MEC) distribuirá computadores para todas as escolas públicas até 2010. Após equipar as escolas de Ensino Médio em 2007, o MEC quer ampliar o acesso à tecnologia nas instituições públicas de 5ª a 8ª séries e, posteriormente, 1ª a 4ª séries (BRASIL, 2008). Diante do mundo globalizado e do avanço tecnológico a passos largos, pode-se acreditar que o uso de computadores nas escolas é um investimento necessário em prol da melhoria da qualidade educacional dos alunos. No entanto, estudos como de Dwyer (2007) afirmam ter constatado que, entre alunos da mesma classe social, os que sempre usam o computador para elaboração das tarefas têm pior desempenho. Isso evidencia que o uso do computador não é fator determinante a uma melhoria significativa no desempenho estudantil. Pode ser necessário, devido ao advento da sociedade de informação, mas não é suficiente. Assim, observam-se alguns aspectos em relação ao ponto Inclusão Digital: será que todos os professores da rede pública estão capacitados a fazer uso dos computadores em suas escolas de forma pedagogicamente viável a fortalecer o processo de ensino e de aprendizagem? Nossa experiência docente evidencia que não. Ou seja, um grande número de professores das redes públicas de ensino ainda não integra o mundo dos imigrantes digitais (PRENSKY, 2001), logo não estão preparados para atender a uma demanda, sejam alunos da geração digital (LEÃO, 2005) ou não. Vários outros aspectos em relação à inclusão digital podem ser discutidos, como, por exemplo, que a mesma esteja integrada aos conteúdos curriculares, o que requer uma adequada reelaboração do projeto pedagógico e grade curricular, mas volta-se atenção ao docente, uma vez que o professor vem a ser o elo para um bom uso dos computadores nos laboratórios escolares. Não basta ter computadores nas escolas, mas a qualificação dos profissionais para o uso dos mesmos é essencial, dentre os inúmeros aspectos que envolvem tal contexto. Poder-se-ia discorrer aqui uma série de aspectos em cada ponto do PDE, pontuando-os tanto de forma positiva quanto negativamente, entretanto a intenção do trabalho não é esta, mas sim chamar a atenção da importância de um estudo mais intenso e aprofundado dos prós e contras que podem intervir para o desenvolvimento e sucesso do Plano de Desenvolvimento da Educação. A menção ao Brasil Alfabetizado e à Inclusão Digital foi apenas um ensaio dessas possibilidades. 88_


Enquanto a luta e o trabalho pela causa da educação de qualidade para todos não fizerem parte, efetivamente, da consciência social, a má qualidade do ensino será um fenômeno aceito com resignação e passividade pelo conjunto da população. No entanto, consciência social se adquire na escola ou pelo menos é um caminho. Por essa razão, o Todos Pela Educação é um movimento nacional em prol de uma agenda comum, que se encontra acima de interesses classistas, corporativistas ou político-partidários. Esse movimento tem a proposta de atravessar mandatos e unir gerações. É preciso vencer a cultura burocrático-corporativa, bem como o clientelismo fisiológico, que os dirigentes políticos frequentemente costumam fazer da educação, tornando a política educacional um mero capítulo da política eleitoral. As Cinco Metas propostas pelo Compromisso Todos Pela Educação, além de marcos que traduzem aonde se quer chegar como Nação, são diretrizes para instituições e pessoas dispostas a promover, acompanhar, apoiar e cobrar a implementação de projetos e políticas para a educação. Cada projeto, programa ou política, que vise à melhoria da educação brasileira, deve se questionar se está contribuindo para que: toda criança e jovem de 4 a 17 anos esteja na escola. Toda criança de 8 anos saiba ler e escrever. Todo aluno aprenda o que é apropriado para sua série. Todo aluno conclua o Ensino Fundamental e o Médio. O investimento na Educação Básica seja garantido e bem gerido. Para que cada uma das metas seja alcançada, é fundamental a participação efetiva de toda a sociedade, pois, como se viu no texto acima, medidas estão sendo tomadas, mas a complexidade e os desafios para que se tornem eficazes são inúmeros, logo há a necessidade de uma participação global, a fim de se somar forças na direção da educação de qualidade para todos. E o conhecimento sucinto dos Planos acima apresentados pode intervir a esse favor.

Considerações finais O PDE, como se pode perceber no texto acima, foi escrito em tom otimista, mas entra Plano, sai Plano, e a educação brasileira continua lutando contra suas mazelas. De acordo com o e-educador8 – Portal Colaborativo do Educador, o ranking de qualidade do ensino divulgado pelo Ministério da Educação pode ser comemorado porque se atingiu a meta prevista para

8

- Portal e-educador – Disponível em: http://e-educador.com/index. php/artigos-mainmenu-100/1921brasil-ideb-o-que-diz-a-midia . Acesso em 12 de abril de 2009.

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2009. Entretanto, tem-se, ainda, um longo caminho a ser percorrido para que de fato se possa dizer que a educação brasileira vem apresentando melhoras significativas, uma vez que muitos estudantes oriundos da Educação Básica apresentam dificuldades elementares de leitura e escrita, como com a Matemática elementar. A melhoria, acima mencionada, pode ser atribuída a uma série de fatores: os esforços de governos para formar os professores e aprimorar os currículos; a valorização das metas; pressões de toda a sociedade para evitar o abandono; por questões demográficas, há menor taxa de natalidade, logo menos pressões por matrícula no Ensino Fundamental. O grande drama é que existe uma corrida. Fixou-se para 2022 atingirmos a meta dos países em desenvolvimento. Só que, nesse ano, esses países estarão mais avançados ainda. Assim sendo, os planos, por mais belos que sejam, se não existir vontade política bem como meios para implantação de suas metas, serão sempre um sonho que se sonhou por apenas um grupo de “iluminados”. Este Plano é apenas mais um dos tantos planos que o Brasil já teve, mas como nossa memória é “curta”, pensamos sempre que o plano atual é o melhor, o que vai “salvar a Pátria”, mas o que realmente é necessário é uma mudança cultural e estrutural em todos os níveis. Como isso pode ser viável em um país como o nosso? Acredita-se que a viabilidade da mudança está no contexto de cada escola, de cada comunidade, de cada núcleo familiar, de cada professor e aluno, ou seja, vencer o desafio educacional brasileiro passa pelo compromisso e pela ação de todos e de cada um. Em suma, mesmo não abdicando da visão sistêmica da educação, é preciso verificar que o sistema como um todo tem que centrar sua energia na melhoria da qualidade da Educação Básica. Pois, todavia, é notável o baixo salário dos professores atuantes nesse nível de ensino, bem como a falta de infraestrutura das escolas, a burocracia da rede, entre muitos outros fatores que intervêm no processo educacional de nosso país.

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VINGT MILLE LIEUES SOUS LÊS MERS: ADDRESSING FOUR CHALLENGES OF INFORMAL LEARNING1

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- Artigo traduzido por Julio Carlos Morandi, Multilínguas – FACAD – Senac-RS.

A VINTE MIL LÉGUAS SUBMARINAS: OS QUATRO DESAFIOS DA APRENDIZAGEM INFORMAL Daniel Schugurensky*

* - Ontario Institute for Studies in Education, University of Toronto (OISE/UT), e-mail: dschugurensky@oise.utoronto.ca

Abstract Informal learning has always been part of humankind. However, like an iceberg, most of it is submerged and invisible. Only recently has it started to be noticed by researchers, employers, community organizations and educational institutions. Paraphrasing Jules Verne, we are now in the first twenty leagues of a long journey that may be as long as twenty thousand. In this quest for knowledge about informal learning, we have to address four main challenges. This article discusses key issues in relation to these challenges.

K e y w o r d s : Informal Learning, Informal Education, Tacit Knowledge, Elicitation, Recognition, Validation.

Resumo A aprendizagem informal sempre fez parte da humanidade. No entanto, como um iceberg, sua maior parte fica submersa e invisível. Apenas recentemente começou a ser percebida por pesquisadores, empregados, organizações comunitárias e instituições educacionais. Parafraseando Júlio Verne, estamos agora nas vinte primeiras léguas de uma longa viagem que pode ter vinte mil léguas. Nesta busca pelo conhecimento sobre aprendizagem informal, temos que mencionar quatro grandes desafios. Este artigo discute questões-chave em relação a estes desafios.

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P a l a v r a s - C h a v e : Aprendizagem Informal, Educação Informal, Conhecimento Tácito, Eliciação, Reconhecimento, Validação.

1. Introdução A aprendizagem informal sempre fez parte da humanidade. Pode ser adquirida através de diversas experiências de vida que incluem situações de trabalho, responsabilidades na família, leituras, trabalhos voluntários, Internet, festivais, viagens, hobbies, atividades religiosas, grupos de estudo, filmes e televisão, teatro, museus, participação em oficinas, projetos de pesquisa independente, etc. No entanto, como um iceberg, sua maior parte fica submersa e invisível abaixo da superfície do mar. Parafraseando Júlio Verne, estamos agora nas vinte primeiras léguas de uma longa viagem que pode ter vinte mil léguas. Na investigação da aprendizagem informal, quatro desafios principais (conceituais, metodológicos, de reconhecimento e pedagógicos) são prováveis de aparecer. O desafio conceitual se refere à necessidade de abrir a caixa-preta da aprendizagem informal para entender melhor suas diferentes formas de expressão e seus aspectos internos. O desafio metodológico diz respeito à necessidade de se desenvolver estratégias criativas de pesquisa para superar as dificuldades na hora de eliciar a aprendizagem informal e o conhecimento tácito. O desafio de reconhecimento se relaciona à necessidade de aperfeiçoar mecanismos institucionais para avaliar e validar a aprendizagem informal. O desafio pedagógico diz respeito à necessidade da criação proposital de oportunidades significativas para uma aprendizagem informal relevante.

2. O desafio conceitual O conceito de aprendizagem informal é enganoso. Desde o estudo de Coombs e seus colaboradores, na década de 70, o termo é usado para referirse ao que abarca todo aquele conhecimento adquirido fora dos currículos de instituições e programas educacionais formais e não formais (COOMBS, 1968; COOMBS et al. 1973; e AHMED, 1974). 94_


Educação formal refere-se à escalada institucional que começa na pré-escola e vai até a universidade. Na maior parte do mundo, a educação formal é altamente regulada pelo Estado e tem um período inicial compulsório – educação básica – que cobre os primeiros anos de escolaridade. Umas das características do sistema formal é sua natureza propedêutica, no sentido de que a principal tarefa de cada nível é preparar os aprendizes para o próximo, e, para entrar num determinado nível, devem concluir o nível anterior satisfatoriamente. Educação não formal refere-se a todas as atividades educacionais organizadas que ocorrem fora do sistema escolar formal. Isso inclui uma vasta gama de programas, geralmente de curto prazo e voluntários, tais como: cursos de línguas, aulas de direção, aulas de culinária, treinamento técnico, oficinas de arte, aulas de tênis, de yoga, cursos promovidos por sindicatos, oficinas literárias e afins. Como na educação formal, há professores (geralmente chamados de instrutores ou facilitadores) e um currículo com diferentes graus de rigidez e flexibilidade. Diferentemente da educação formal, esses programas raramente exigem pré-requisitos em termos de escolaridade prévia. No entanto, por vezes é fornecido um certificado de capacitação e frequência. A educação não formal no geral atrai adultos, mas crianças e adolescentes também podem participar deste setor. Nesta taxonomia, educação informal refere-se a “tudo mais”, ou seja, todas aquelas experiências de aprendizagem que não fazem parte dos currículos oferecidos pelos programas e instituições de educação formal e não formal. Ao mesmo tempo que esta taxonomia é conveniente, um de seus problemas é que nela a educação informal torna-se uma categoria residual de uma categoria residual, colocando a aprendizagem informal à margem das margens da educação. Além disso, os termos “formal”, “não formal” e “informal” carregam um significado implícito que geralmente implica uma hierarquia de experiências de aprendizagem que deixa a “educação informal” na base da pirâmide (THOUGH, 1999; BILLET, 2001, p. 14). Como Illich (1970) e outros autores mostram, aprendizagem experimental raramente recebe o mesmo prestígio que tem a aprendizagem adquirida (e validada) através de sistemas formais e informais. Isso é paradoxal, pois é na esfera “informal”, tão desconsiderada, e na qual poucas pesquisas são feitas, que adquirimos o conhecimento informal _ 95


que aplicamos em nossa vida diária, desde o falar línguas até o desenvolvimento de variadas atividades através do trabalho, de hobbies, de viagens e de responsabilidades familiares. Também adquirimos uma ampla gama de informações e conhecimento através de conversas, livros, revistas, Internet, filmes, peças de teatro ou televisão. Aprendemos muito pelo fato de nos envolvermos em projetos de pesquisa independentes, trabalho voluntário, atividades religiosas ou movimentos sociais, ou nos engajarmos em grupos de estudos. Através de aprendizagem informal também adquirimos valores e atitudes e uma série de informações e conhecimento. A relevância da aprendizagem informal se aplica a todos os aspectos de nossas vidas e a pessoas em todas as profissões, inclusive educadores. Na verdade, num recente estudo de educação cívica de educadores de civismo, por exemplo, professores de civismo de ensino médio relataram que seu aprendizado cívico e político mais significativo ao longo de suas vidas se deu por canais informais (SCHUGURENSKY e MYERS, 2003). Enquanto a relevância da aprendizagem informal em nosso dia-a-dia está se tornando cada vez mais reconhecida, seu conceito em si nem sempre é totalmente claro, uma vez que é usado de várias maneiras e com diferentes significados.

3. Enfrentando o desafio conceitual Nesta seção, procuro fazer uma modesta contribuição sugerindo duas estratégias que podem nos auxiliar na conceitualização do termo. A primeira estratégia tem a ver com a distinção entre aprendizagem informal como espaço (ou lugar) e aprendizagem informal como processo. A segunda estratégia se propõe a explorar o universo interno da aprendizagem informal através da distinção entre suas diferentes formas. 3.1. Aprendizagem informal como espaço e como processo Na definição apresentada acima, a aprendizagem informal está conceitualizada como toda aquela aprendizagem adquirida fora do currículo da educação formal e não formal. Cabe notar que a definição não diz “fora da educação formal e não formal”, mas “fora do currículo da educação formal e não formal”. Devemos admitir que a maior parte da aprendizagem informal se dá fora das paredes das instituições educacionais. No entanto, a aprendi96_


zagem informal também pode ocorrer dentro das instituições de educação formal e informal. Isso ocorre através de diversas interações individuais e de grupo que não fazem parte das atividades curriculares ou planos de curso. Podem ocorrer durante o recesso, em forma de diversas atividades extracurriculares, como esportes, artes, festivais e reuniões, em almoços e até mesmo dentro da sala de aula. O currículo oculto, o qual inclui todas aquelas lições que os alunos aprendem pela experiência de frequentar escolas, além dos objetivos educacionais estabelecidos por estas instituições, é um dos casos. Dentro das escolas, muito aprendizado ocorre independentemente dos objetivos e conteúdos propostos pelo currículo explícito, sendo muitas vezes até mesmo contraditórios a eles. Os alunos podem estar fazendo um curso sobre democracia, por exemplo, mas através do método de ensino, das interações professor-aluno e do ambiente de sala de aula, podem também estar aprendendo sobre autoritarismo ou discriminação. Através do currículo oculto, portanto, os alunos aprendem diversas lições (tanto positivas quanto negativas) sobre poder, autoridade, raça, classe, gênero e outras questões. Além disso, durante o recesso os alunos podem aprender uns com os outros uma infinidade de informações sobre muitos tópicos, desde videogames até política, esporte ou namoro, engajar-se em discussões enriquecedoras as quais podem mudar suas posturas e valores quanto a certas questões, e podem até mesmo desafiar os conteúdos do currículo oficial através de pontos de vista alternativos. Por exemplo, pode-se aprender em uma aula que Colombo “descobriu” a América, e no recesso aprender que, na realidade, Colombo estava perdido. Na mesma linha, aprendizagem informal também pode ocorrer entre adultos na educação não formal, por exemplo, quando as pessoas trocam ideias durante um coffee break numa sessão de treinamento em seu trabalho. A questão aqui é que, enquanto boa parte da aprendizagem informal ocorre fora da escola (em casa, local de trabalho e na comunidade), também é evidente que os processos da aprendizagem informal podem ocorrer dentro das instituições educacionais. Isso nos remete ao fato de que a tipologia clássica do formal, não formal e informal, ao mesmo tempo que é útil por fornecer um mapa geral do território, não deveria ser aceita inquestionavelmente, pois o mundo real da aprendizagem é mais complexo e tem nuances (LIVINGSTONE, 2002; BROWN, 2000; COLLEY, HODKINSON e MALCOM, 2004; FOLEY, 1999; SCHUGURENSKY e MUNDEL, 2005). _ 97


3.2. As formas de aprendizagem informal Através da minha pesquisa sobre aprendizagem baseada em comunidades, identifiquei três formas de aprendizagem informal. Mesmo sabendo que taxonomias são, de certa forma, arbitrárias e que algumas distinções são mais claras no papel do que no mundo real, esta conceitualização propicia uma possibilidade de examinar mais a fundo a dinâmica interna da aprendizagem que, em vários aspectos, ainda é uma caixa-preta. Meu argumento é o de que o conceito de aprendizagem informal é muito vago e que para propósitos analíticos é conveniente fazer a distinção entre as formas de aprendizagem informal que são frequentemente combinadas. Através da aplicação de duas categorias (intencionalidade e conscientização), é possível identificar três formas de aprendizagem informal: aprendizagem autodirigida, aprendizagem acidental e socialização. Tabela 1: Três formas de aprendizagem informal Autodirecionada Acidental Socialização

Intencionalidade sim não não

Consciência sim sim não

A aprendizagem autodirigida se refere a “projetos de aprendizagem” assumidos pelos indivíduos (sozinhos ou como parte de um grupo) sem a assistência de um professor, embora possa incluir a presença de uma pessoa que não se considera profissional da educação, mas a quem se possa recorrer. Ela é tanto intencional como consciente; intencional porque o indivíduo tem o propósito de aprender algo mesmo antes que o processo de aprendizagem se inicie, e consciente porque o indivíduo está ciente de que aprendeu algo. Aprendizagem acidental refere-se a experiências de aprendizagem que ocorrem quando o aprendiz não teve qualquer intenção prévia de tirar alguma aprendizagem daquela experiência, mas depois toma ciência de que ocorreu alguma aprendizagem. Sendo assim, não é intencional, mas consciente. Socialização (ou aprendizagem tácita) refere-se à internalização quase natural de valores, atitudes, comportamentos, habilidades e conhecimento que ocorre durante a vida diária. Não só há uma ausência de uma intenção prévia de adquiri-los, mas há uma falta de consciência de que ocorreu uma 98_


aprendizagem. Embora a aprendizagem através da socialização geralmente seja um processo inconsciente, podemos, mais tarde, nos tornar cientes desta aprendizagem através de um processo de reconhecimento retrospectivo. Por exemplo, através da exposição a um ambiente social diferente, uma pessoa pode ser levada a reconhecer que tem certos preconceitos e tendências que foram o produto de uma primeira socialização. Da mesma forma, algumas pessoas podem não estar cientes de que aprenderam algo durante uma experiência até que tenham contato com outra pessoa que faça perguntas voltadas a eliciar um reconhecimento retrospectivo. Este é o assunto da próxima seção.

4. O desafio metodológico O reconhecimento relativamente recente da aprendizagem informal pelas instituições educacionais, organizações profissionais e locais de trabalho não foi da noite para o dia. Foi um processo que levou duas décadas e foi parcialmente influenciado pelo trabalho de alguns pesquisadores da área da educação que fizeram estudos sobre aprendizagem informal e chamaram a atenção da sociedade para este tópico. No Canadá, um dos pioneiros foi Allen Tough, da Universidade de Toronto. No final dos anos 60, ele realizou um dos primeiros estudos empíricos objetivando documentar a extensão e o conteúdo da aprendizagem informal, com foco exclusivo em aprendizagem autodirigida. A principal suposição de Tough era a de que adultos são aprendizes autodirigidos e que podem desenvolver planos para mudarem a si mesmos e seu meio ambiente. Assim, ele partiu para identificar os projetos de aprendizagem em que adultos se engajam através de projetos autodirigidos e conceitualizou projetos autodirigidos como esforços contínuos e altamente intencionais para aprender que são constituídos de uma série de episódios de aprendizagem. Um episódio de aprendizagem, por sua vez, ocorre quando existe uma intenção clara por parte do aprendiz de adquirir e reter habilidades ou um conhecimento específico. Neste estudo, cuja amostra inclui operários de fábrica, mulheres de classe média alta com filhos em idade de pré-escola e professores universitários, Tough e seus colaboradores descobriram que uma pessoa típica conduzia por volta de oito projetos de aprendizagem de 90 horas cada por ano, o que significou que cada pessoa, em média, dedicou aproximadamente de 700 a 800 horas anualmente à aprendizagem informal. _ 99


Tough descobriu que a maior parte dos projetos de aprendizagem autodirigida eram relacionados a trabalho, embora outras áreas como casa e responsabilidades pessoais, interesse pessoal, autoaprimoramento e mera curiosidade também eram aspectos motivacionais importantes. Em termos de motivações para aprendizagem informal, o estudo descobriu que as pessoas buscavam benefícios intelectuais, emocionais e materiais. O trabalho pioneiro de Tough inspirou uma segunda geração de pesquisadores canadenses que, no final da década de 90, juntaram-se na rede de trabalho chamada New Approaches to Lifelong Learning – NAAL (Novas Abordagens da Aprendizagem ao Longo da Vida). Esta rede, liderada por David Livingstone do Instituto de Ontário para Estudos de Educação da Universidade de Toronto, executou diversos projetos de pesquisa sobre aprendizagem informal, principalmente em relação a trabalho remunerado e não remunerado. Uma das descobertas mais interessantes da primeira enquete realizada por esta rede de trabalho foi a de que entre trabalho voluntário na comunidade e aprendizagem informal inserida na comunidade existe uma relação mais forte do que entre emprego e aprendizagem informal relacionada ao trabalho (LIVINGSTONE, 2000). Embora este estudo tenha focado a aprendizagem autodirigida entre adultos, cabe ressaltar que a aprendizagem informal acontece durante toda a vida (portanto, mais pesquisa se faz necessária sobre a aprendizagem informal de crianças e jovens) e que há outras formas de aprendizagem informal que não só a aprendizagem autodirigida (também sobre aprendizagem acidental e socialização mais pesquisa se faz necessária). 4.1. A difícil tarefa de eliciar aprendizagem informal – “O que você aprendeu no Orçamento Participativo?” – perguntei. – “Mmmmh... Nada” – respondeu ela. – “Verdade? Nada mesmo?” – perguntei novamente, surpreso. – “Bem, talvez muitas coisas, mas nada que eu consiga lembrar agora”. No ano de 1999, eu estava na cidade de Porto Alegre, Brasil, explorando as possibilidades de iniciar um estudo sobre a dimensão pedagógica da democracia participativa. Eu estava tendo uma conversa informal com Maria, uma representante local do Orçamento Participativo: um processo de deliberação e 100_


de decisão que envolve cidadãos comuns nas alocações do orçamento municipal. Ela já vinha participando do Orçamento Participativo há três anos, primeiro como membro da comunidade, e depois como delegada, e mais tarde como vereadora. Ela seria capaz de falar durante horas sobre a sua história pessoal de ativismo na comunidade, suas atividades atuais da participação cívica e os pontos fracos e fortes daquela experiência de democracia local. No entanto, quando a questionei sobre o que tinha aprendido com essa experiência, ela ficou me olhando sem entender, como quem pede explicações. Após algumas situações semelhantes com outros participantes, percebi que uma pergunta aberta sobre conhecimento tácito e informal, por si só, não seria suficiente para manter qualquer conversa significativa sobre esse assunto. Na maioria das vezes, o aspecto de aprendizagem desta experiência, que fez com que as pessoas viessem da periferia até o centro da comunidade de prática (LAVE e WENGER, 1991), foi imperceptível e inconsciente para os participantes. Pensando bem, isso não deveria ser surpreendente, absolutamente. Mesmo eu, que levantei a questão em primeiro lugar, poderia me atrapalhar para responder. Por exemplo, o que eu teria respondido se Maria tivesse me perguntado: “Daniel, o que você aprendeu no ano passado tendo utilizado o metrô diariamente, ou tendo assistido a comerciais de televisão, ou tendo participado de reuniões comunitárias em seu bairro, ou tendo jogado futebol nos fins de semana?”. Provavelmente eu teria ficado olhando para ela sem expressão, feito um esforço inútil para dizer algo sensato e teria respondido: “Talvez muitas coisas, mas nada que eu consiga lembrar agora”. Na verdade, a falta de autoconsciência da nossa própria aprendizagem informal não deve nos causar espanto, pois temos o famoso Polanyi (1967, p. 4), que observa, na abertura de páginas de The tacit dimension: “We know more than we can tell” (“sabemos mais do que podemos comunicar”). Muitas vezes, a aprendizagem informal resulta em conhecimento tácito, pois a aprendizagem informal não se dá no contexto de certos elementos (presentes na educação formal e não formal) que possam auxiliar os alunos na organização de conhecimentos adquiridos em relação a determinadas áreas de conteúdo, tais como currículo planejado, livro e material didático, a presença de um instrutor, objetivos educacionais claros, procedimentos de avaliação e afins. A aprendizagem informal, sobretudo quando não é autodirigida, muitas vezes ocorre de maneira mais difusa e desorganizada. Além disso, quando é autodirigida, cerca de 80 por cento da aprendizagem ainda é imperceptível e inconsciente para o aluno (TOUGH, 1999). _ 101


De qualquer forma, apenas uma pequena parcela da aprendizagem informal é adquirida de forma autodirigida. Pelo contrário, a maior parte da aprendizagem informal tende a ser ocasional ou a partir de processos de socialização cotidianos, com baixo grau de intencionalidade e de consciência e, portanto, com uma alta probabilidade de acabar como conhecimento tácito ou implícito. As pessoas tendem a subestimar grandemente a quantidade de sua aprendizagem informal, principalmente pelo fato de essa aprendizagem vir disfarçada e do consequente conhecimento tácito ser um dado adquirido sem que se perceba. Um bom exemplo disso é o caso de atividades do dia-adia que são realizadas com sucesso (ARGYRIS e SCHÖN, 1978; SCHÖN, 1988; ERAUT, 2000, 1999; LIVINGSTONE, 2001). Uma vez que, na maioria dos casos, atividades regulares ocorrem normalmente sem maiores problemas, é difícil para os pesquisadores eliciarem das pessoas que tipo de conhecimento adquirem com suas práticas diárias. Esta situação cria um duplo desafio para os investigadores. Por um lado, apresenta dificuldades para descobrir o difuso processo que é a aprendizagem. Por outro, coloca obstáculos para revelar os resultados desse processo, expresso em novas competências e talentos que muitas vezes desconhecemos. Como Illeris (2003) observa, a aprendizagem informal abrange dimensões cognitivas, emocionais e sociais, e, consequentemente, as estratégias para eliciá-las não devem focar apenas na aquisição de conhecimento.

5. Enfrentando o desafio metodológico Conforme Dewey (1916) e outros autores observam, a forma mais eficaz de aprender a democracia é exercendo-a e, portanto, é plausível imaginar que Maria e outros membros do Orçamento Participativo tivessem aprendido bastante a esse respeito. No entanto, depois dessa primeira conversa com Maria e do meu fracasso em eliciar conhecimento tácito através de perguntas abertas, percebi que, para ter uma conversa significativa sobre aprendizagem informal com membros do Orçamento Participativo, teria que superar o desafio metodológico e perguntar a mim mesmo que tipo de orientação ou indução poderia ajudar a eliciar conhecimento tácito. Esta pergunta me remeteu ao plano inicial e me pressionou a encontrar uma estratégia alternativa para solucionar a questão. Minha próxima tentativa consistiu no 102_


desenvolvimento de um roteiro de uma entrevista semiestruturada. O novo guia começava com perguntas abertas sobre experiências de vida e em democracia participativa e, em seguida, ia para uma seção mais estruturada com uma lista de resultados de aprendizagem em potencial que poderiam ser advindos do fato de as pessoas terem feito parte de um processo de governo local. Nessa seção, coloquei uma pequena lista de resultados de aprendizagem organizados em três categorias: (1) conhecimento, (2) competências, e (3) valores e atitudes. Para cada item, pedi aos participantes que representassem seu nível numa escala Lickert de 5 pontos, considerando dois momentos no tempo: antes de serem envolvidos no processo do Orçamento Participativo e no momento da entrevista. Quando os entrevistados relatavam uma mudança, eu pedia que explicassem como sabiam que aquela mudança havia ocorrido, e os incentivava a contar histórias e dar exemplos concretos. Felizmente, esta estratégia foi extremamente bem-sucedida para incentivar a autorreflexão sobre a aprendizagem informal e para eliciar conhecimento tácito. Os participantes se envolveram com tanto interesse no exercício que acabaram me relatando mais histórias do que o previsto em relação ao tempo que eu tinha alocado para escutá-las. Em alguns casos, reclamaram que a escala de 1 a 5 era insuficiente, e explicaram em pormenores por que achavam que sua curva de aprendizagem tinha ido de 0 a 7! Outro aspecto interessante de se utilizar uma escala de 5 pontos em dois momentos no tempo é que ela nos permite depreender não só a quantidade de aprendizagem e a mudança que ocorreram como resultado de uma experiência, mas também o ponto de partida. Por exemplo, se alguém relata uma mudança no falar em público de 1 a 3, e outro participante relata uma mudança de 3 a 5, o montante de progresso em relação a essa habilidade específica é aproximadamente o mesmo. No entanto, é evidente que um deles já tinha mais prática no processo do que o outro. No final do primeiro estudo de caso, percebi que aprender coisas novas não significava necessariamente colocá-las em prática em benefício da comunidade. Então, acrescentei uma quarta área que investigou as mudanças nas práticas e comportamentos (por exemplo, cívicos, políticos, sociais, ecológicos) que as pessoas tiveram como resultado da sua participação na democracia local. Para nos certificarmos de que a lista é relevante para o contexto, antes de entrevistarmos os participantes, o que fazemos é montar grupos de reflexão juntamente com as organizações envolvidas e as principais partes interessadas para testar o protocolo e fazer alterações de acordo com _ 103


o que for sugerido. Através desse processo, torna-se possível revisar conjuntamente diferentes aspectos do instrumento (por exemplo, comprimento, formato, objetivo, sequência) e criar, em conjunto, um guia de entrevista revisado adequado à situação. Depois dos grupos de reflexão, conduzem-se algumas entrevistas-piloto para afinar as perguntas, e só então se iniciam as entrevistas com o resto dos participantes. Em alguns casos, complementamos as entrevistas individuais com grupos de reflexão para lançar luz sobre as áreas que tiverem necessitado esclarecimento ou elaboração. Provavelmente, um dos momentos mais gratificantes do trabalho de campo ocorre ao final das entrevistas, quando a maioria dos participantes nos agradece por ajudá-los a descobrir sua aprendizagem tácita. Apesar de no início das entrevistas a maioria das pessoas, neste caso, não relatar ter experienciado qualquer aprendizado, até ao final da entrevista elas perceberam que tinham aprendido muito, e expressaram alegria em perceber o quanto aprenderam e quantas estratégias diferentes de aprendizagem utilizaram. Além disso, embora na maioria dos casos a aprendizagem tenha sido cumulativa (por exemplo, melhorar uma determinada habilidade), os participantes ficaram muito animados ao relatarem casos de aprendizagem transformadora (MEZIROW, 2000), na qual refletiram criticamente a respeito de seus pressupostos e valores sobre o mundo social e enganjaram-se em mais práticas democráticas. Outro aspecto gratificante do trabalho de campo foi ouvir os participantes relatarem muitos casos de aprendizagem informal que tinham vivenciado através da democracia local e que não estavam inicialmente previstos no instrumento. Como os participantes foram estimulados a adicionar tantos episódios de aprendizagem e de mudança quantos desejassem, depois de vários estudos de casos em outras cidades (por exemplo, Montevidéu, Rosário, Guelph), a lista inicial de 10 indicadores de aprendizagem cresceu para mais de 60 indicadores de aprendizagem e mudança. Hoje, essa abordagem metodológica está sendo adaptada e utilizada por outros grupos de investigação. 5.1. Algumas precauções sobre a metodologia da investigação A estratégia descrita acima para eliciar a aprendizagem informal, assim como qualquer outra abordagem metodológica, não é perfeita. Pela minha experiência, consigo identificar pelo menos duas limitações que 104_


dizem respeito a questões de autorrelato e exteriorização. A primeira limitação é o fato de que a aprendizagem autorrelatada pode significar, ou não, aprendizagem efetiva. Os problemas com autorrelato podem ser agravados pela tendência em potencial que têm os entrevistados de darem respostas “politicamente corretas”. Isso aparece especificamente em situações de aprendizagem e mudança relacionadas a atitudes, valores e questões como tolerância, abertura, solidariedade, respeito e carinho. Também a questões relacionadas a práticas democráticas e ecológicas como votar, escutar ou reciclar. Como uma segunda limitação, temos o fato de que os participantes podem atribuir uma determinada aprendizagem a uma certa experiência; no entanto, não é fácil distinguir os diferentes episódios de aprendizagem que se tem em diferentes situações. Por exemplo, os entrevistados podem expressar que a participação em um processo democrático os tornou melhores em resoluções de conflitos, aumentou a consciência dos seus próprios direitos de cidadãos, os ajudou a adquirir autoconfiança ou melhorou sua compreensão da política municipal. No entanto, é plausível supor que tenham adquirido conhecimentos, habilidades e atitudes a partir de uma variedade de experiências anteriores e simultâneas, e não apenas a partir do processo específico que está sendo analisado na entrevista. Os problemas com o “efeito de atribuição” são óbvios nos casos em que as pessoas ficaram envolvidas em um processo por um tempo longo. Por exemplo, alguns participantes na nossa investigação estiveram por duas décadas ativamente envolvidos com estruturas de controle de cooperativas de moradia. Nesses casos, torna-se difícil fazer com que se lembrem das competências, valores, atitudes e práticas que tinham antes de começarem o voluntariado em comitês e conselhos. Além disso, eles vivenciaram tantas coisas e em tantos contextos nessas duas décadas que não é fácil distinguir o aprendizado que se deu a partir de uma situação de aprendizagem que ocorreu em outra. Uma estratégia metodológica para reduzir essas dificuldades é a de pedir aos participantes que ilustrem o que consideram aprendizado com histórias e exemplos, e que façam conexões com experiências de aprendizados semelhantes em outros contextos. Por exemplo, no caso do desenvolvimento de habilidades de resolução dos conflitos, muitos dos participantes, que também eram mães e/ou professores foram capazes de fazer distinções e conexões entre as suas experiências de aprendizagem em casa, na escola e em processos _ 105


de democracia local. Além disso, recontando suas histórias, eles foram capazes de identificar casos em que um determinado conhecimento, habilidade ou talento adquirido em um contexto – por exemplo, o voluntariado – foram transferidos para outro: família, igreja, escola, etc.

6. O desafio do reconhecimento Em 1971, Tough previu que a quantidade de conhecimentos relevantes e competências adquiridas pelas pessoas através da aprendizagem informal seria muito maior no futuro. Hoje, três décadas e meia e uma revolução de informações mais tarde, parece que ele estava certo. Ao mesmo tempo, a aprendizagem informal ainda hoje permanece à margem da nossa consciência coletiva: Embora a aprendizagem informal pareça tão normal e natural na atividade humana, ela é tão imperceptível que as pessoas não parecem estar conscientes de sua própria aprendizagem, nem da aprendizagem de outras pessoas. Educadores não a levam em conta e assim por diante. As pessoas gastam 15 horas por semana com aprendizagem informal, em média, e ainda assim não se fala sobre ela, não é reconhecida, parece que é ignorada ou invisível (TOUGH, 1999, p. 2).

Tough ficava muito intrigado com educadores de adultos que expressavam frustração dizendo que não conseguiam motivar seus alunos a aprender, já que 90% dos adultos engajam-se em algum tipo de aprendizagem intencional a cada ano: Talvez você não possa motivá-los a aprender o que você deseja que eles aprendam, mas eles estão motivados a aprender. Muitos educadores de adultos têm a impressão de que seus alunos normalmente não estão aprendendo e acreditam que devam, de alguma forma, motivá-los, forçá-los ou persuadi-los a aprender. Bem, os alunos já estão fazendo isso, apenas eles podem não estar fazendo da forma como o educador espera que façam (TOUGH, 1999, p. 4).

Devido ao fato de a maior parte da aprendizagem informal ser difícil de ser identificada, Tough (1999) criou a metáfora do iceberg da aprendizagem informal, dizendo que sua maior parte fica submersa, é explicada natu-

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ralmente e fica escondida tanto da sociedade quanto do aluno. Isso ajuda a explicar o porquê de, historicamente, a aprendizagem informal não ser reconhecida pelas instituições sociais, sejam elas escolas, universidades, locais de trabalho, órgãos reguladores ou associações profissionais. Esta situação começou a mudar lentamente desde o aparecimento dos sistemas de avaliação e validação de conhecimentos anteriores, cerca de duas décadas atrás (EVANS, 2000). Um desses sistemas, atualmente em uso em vários países, é conhecido como PLAR – Prior Learning Assessment and Recognition (Avaliação e Reconhecimento de Conhecimentos Anteriores). 6.1. Enfrentando o desafio metodológico O PLAR é um processo sistemático que usa uma variedade de ferramentas para ajudar o aluno a identificar, articular e demonstrar o aprendizado adquirido fora do sistema de ensino formal para efeitos de obtenção de reconhecimento por instituições educativas e outras agências. Como mencionado anteriormente, tal conhecimento pode ter sido adquirido através de uma variedade de experiências de vida em diferentes ambientes. Esta aprendizagem informal pode ser expressa em termos de conhecimentos, habilidades, atitudes e valores, tais como autossuficiência, colaboração ou preocupação com qualidade e justiça. Pelo fato de o PLAR se propor a ajudar as pessoas a demonstrarem e obterem o reconhecimento da aprendizagem que adquiriram fora do sistema de ensino formal, o foco é no que elas sabem e são capazes de fazer. Os princípios orientadores mais importantes do PLAR são que a aprendizagem significativa pode acontecer e acontece fora da sala de aula, e que essa aprendizagem pode e deve ser avaliada e considerada por instituições de ensino, assim como no momento de contratação e promoção no trabalho. Outro princípio é que, no momento de avaliação dos conhecimentos anteriores, o que foi aprendido é mais importante do que o quando, o onde ou o como foi aprendido. Um dos benefícios do PLAR é que os alunos (principalmente adultos) conseguem evitar uma duplicação desnecessária de aprendizagem, poupando-lhes tempo e dinheiro e permitindo-lhes concentrar-se no que eles desejam ou precisam aprender. Também reforça a sua autoestima e orgulho em relação às conquistas do passado e os habilita a des_ 107


cobrir e identificar pontos fortes e competências existentes. Além disso, o PLAR promove a filosofia da aprendizagem como um processo ao longo da vida e auxilia alunos a atingirem objetivos e aspirações pessoais. Da perspectiva institucional, o PLAR auxilia instituições educacionais e locais de trabalho a fazerem uma alocação mais eficiente de recursos (AARTS et al., 1999; DIAS et al., 2000). No Canadá, conhecimentos anteriores são reconhecidos pela maioria das faculdades e também por algumas universidades. Algumas províncias oferecem o PLAR também em nível de ensino secundário – ensino médio – através dos seus conselhos escolares. Além disso, certos órgãos de licenciamento e certificação, como a Faculdade de Técnicos em Odontologia de British Columbia e a Faculdade de Optometria de Ontário, utilizam o PLAR para avaliar os conhecimentos e as habilidades de candidatos formados em outros países que pretendam ingressar em suas profissões. Algumas organizações oferecem o PLAR para candidatos provenientes de outras províncias ou territórios canadenses. As instituições que utilizam o PLAR aplicam uma variedade de métodos para avaliar o nível de conhecimentos e habilidades das pessoas em um determinado campo ou área. Entre esses métodos estão demonstrações, entrevistas estruturadas e apresentações de portfólio com amostras de trabalhos anteriores. Para dar suporte aos alunos, algumas organizações oferecem cursos de como montar um portfólio. Muitas faculdades, universidades e órgãos profissionais de certificação e licenciamento também utilizam testes orais ou escritos para avaliar os conhecimentos anteriores de um candidato. Escolas do ensino secundário tendem a aplicar dois métodos principais para avaliar os conhecimentos e as competências que os alunos tenham adquirido fora do ensino secundário. O primeiro, conhecido como “equivalência”, é o processo de avaliação das credenciais de outras jurisdições. O segundo, conhecido como “desafio”, é o processo pelo qual os conhecimentos anteriores dos alunos são avaliados para efeito de concessão de crédito para um curso. Em ambos os casos, os conhecimentos dos alunos e as competências são avaliados comparando-os com o que está estabelecido em documentos que definem os currículos na província a fim de ganhar créditos para um diploma de ensino secundário. Embora o PLAR tenha trazido uma grande contribuição para o reconhecimento da aprendizagem informal, sua aplicação nem sempre é fácil. Entre os problemas mais frequentes estão a resistência das universidades em 108_


aceitá-lo, a dificuldade em transferi-lo a outros países ou jurisdições, a preocupação com a garantia de qualidade, o desconhecimento de sua existência, inclusive pelos alunos, a falta de incentivos para que instituições e professores se engajem no PLAR e a incoerência em relação a outros programas e políticas de aprendizagem de adultos mais amplos. Infelizmente, dois dos grupos que mais poderiam se beneficiar do PLAR no Canadá, imigrantes e indígenas, estão entre os menos propensos a utilizá-lo. Ao mesmo tempo, pesquisas com alunos que utilizaram o PLAR em faculdades revelam benefícios em termos de redução de tempo e custo, assim como melhora na autopercepção e autoestima (WIHAK, 2005).

7. O desafio pedagógico Voltando à situação de minha pesquisa sobre a aprendizagem informal na democracia local, no final de cada entrevista perguntei aos participantes sobre seus momentos de aprendizagem mais memoráveis e pedi que explicassem por que eram particularmente importantes. Esta estratégia funcionou bem e mais tarde fiquei contente quando descobri que outros pesquisadores (por exemplo, STERNBERG, 2000) também concluíram que o fato de fazer as pessoas lembrarem dos episódios que produziram os seus conhecimentos tácitos é uma boa estratégia para eliciar conhecimento tácito. Interessante foi descobrir que, entre muitos delegados do Orçamento Participativo de Porto Alegre, o episódio de aprendizagem mais mencionado foi o passeio de ônibus que fazem pela cidade antes de iniciar seus mandatos. Comentaram que foi esse momento que abriu suas mentes. Disseram que a visita permitiu-lhes passar de uma visão limitada para uma perspectiva mais ampla, ter uma melhor compreensão dos problemas enfrentados por outras comunidades, desenvolver um maior grau de solidariedade e defender o bem comum nas discussões do orçamento. Em seu estudo sobre o Orçamento Participativo, Harnecker (1999) também constatou que o passeio de ônibus ajudou os participantes não só a ganhar mais conhecimento sobre questões em nível municipal, mas também a desenvolver uma atitude mais compassiva em relação aos grupos que estavam enfrentando problemas maiores do que o deles. Menciono a história do passeio de ônibus porque se caracteriza em um bom exemplo para fazermos a distinção entre aprendizagem informal e educação informal. _ 109


7.1. Aprendizagem informal e educação informal Aprendizagem informal, tal como mencionado anteriormente, refere-se ao processo de aquisição de conhecimentos, competências e atitudes fora do currículo de instituições de educação formal e não formal. Educação informal, por outro lado, refere-se à busca deliberada de situações que promovam certas experiências de aprendizagem informal. Educação informal não tem professor, facilitador, currículo ou material didático, mas tem uma concepção e uma intenção pedagógica desenvolvida a priori por alguém que não é o aprendiz. No caso do passeio de ônibus do Orçamento Participativo, por exemplo, o projeto inclui um calendário (antes da primeira sessão do Conselho), um espaço (um ônibus escolar) e um itinerário específico, e entre as intenções pedagógicas está a de que os participantes ficam conhecendo melhor as questões que afetam outras comunidades, se solidarizam com as más condições dessas comunidades, expandem a sua compreensão das questões da cidade e consequentemente se tornam mais solidários durante o processo de alocação de recursos. Outro exemplo de educação informal é o de um programa de estudo de línguas de uma universidade para estudantes internacionais. A residência do campus tem apartamentos para quatro pessoas. Os organizadores do programa poderiam dar aos alunos a liberdade de escolher seus corresidentes, o que provavelmente resultaria em quatro pessoas que partilham a mesma língua e mesmo país de origem no mesmo espaço. No entanto, estabeleceram uma regra básica: não pode existir mais de um residente por país em cada apartamento. Isso proporciona uma intensificação da aprendizagem da nova língua – que se tornou a língua franca entre os quatro moradores – para que se desenvolva uma compreensão intercultural e uma consciência internacional. Um terceiro exemplo de educação informal foi um fórum sobre política urbana e deficiência organizada por cegos. Eles convidaram o prefeito da cidade e outros ligados a tomadas de decisão para participar e pediramlhes que permanecessem de olhos vendados durante o período do fórum. As autoridades disseram que naquelas horas aprenderam muito sobre os desafios enfrentados pelas pessoas cegas na cidade. Provavelmente, um dos mais conhecidos exemplos de educação informal é a aprendizagem experiencial utilizada em programas educacionais ao ar livre, como o movimento de escoteiros, no qual um grupo de jovens precisa aprender, por exemplo, a desenvolver habilidades de orientação e o uso adequado de uma bússola 110_


a fim de encontrar a rota de volta ao acampamento. Exemplos de educação informal na área da educação de cidadania democrática seriam as escolas autorreguladas (que têm longa tradição, desde a Summerhill) e a aprendizagem cooperativa (exemplo disso são algumas das atividades incluídas na abordagem pedagógica de Freinet). Através da educação informal, portanto, as pessoas podem adquirir determinados conhecimentos, habilidades, valores ou talentos sem a presença de um instrutor ou um livro. É diferente de aprendizagem informal, pois possui uma concepção pedagógica intencional e um resultado pretendido. Na educação informal, a questão é o currículo. Uma característica importante da educação informal é a qualidade e a orientação da experiência. Conforme Dewey (1938) observou, experiência e educação não podem ser equiparadas diretamente, pois as experiências podem educar ou maleducar e, portanto, o desafio central de uma educação baseada na experiência é selecionar o tipo de experiência que poderá ser ampliada e aprofundada de forma vantajosa e criativa em experiências futuras.

8. Síntese e considerações finais Este artigo abordou quatro desafios que estão presentes no campo da aprendizagem informal. Os principais pontos abordados no artigo podem ser resumidos nos dez itens descritos abaixo. Alguns deles podem parecer óbvios, mas, como dizia o educador brasileiro Paulo Freire, “por vezes é útil tornar o óbvio explícito”. 1. A aprendizagem informal se refere a toda aprendizagem que ocorre fora do currículo de programas e instituições de educação formal e não formal. No entanto, a aprendizagem informal pode ocorrer também dentro dos muros de instituições de educação formal e não formal (sob a forma de currículo oculto, por exemplo), daí a necessidade de fazer a distinção: a aprendizagem informal como espaço e como processo. 2. A aprendizagem informal tem uma dimensão ao longo da vida. Em outras palavras, ela pode ocorrer em qualquer lugar (por exemplo, no trabalho, na família, numa instituição religiosa, num museu, na rua, numa organização comunitária, numa festa, num teatro, numa escola, na Internet) e a qualquer momento entre o nascimento e a morte. _ 111


3. Embora a maioria dos conhecimentos, competências e valores importantes e relevantes que adquirimos ao longo da vida sejam através da aprendizagem informal e, embora “aprender fazendo” seja muitas vezes a forma mais eficaz de aprender, a aprendizagem informal é raramente reconhecida por instituições de educação formal e locais de trabalho. Muitas vezes ela também é imperceptível para os próprios alunos. Em razão disso, historicamente, pesquisadores da educação não deram uma atenção especial a essa questão. 4. No entanto, a concepção e a implementação de sistemas como o PLAR, Prior Learning Assessment and Recognition (Avaliação e Reconhecimento de Conhecimentos Anteriores) e a criação e o crescimento de novas redes de investigação dedicadas ao estudo da aprendizagem informal, durante as duas últimas décadas, vêm aos poucos trazendo o tópico das margens para o centro de debates públicos e acadêmicos. 5. Usando intencionalidade e consciência como principais critérios, é possível distinguir três formas de aprendizagem informal. Nesta tipologia, a aprendizagem autodirigida está num extremo do espectro, socialização está no outro extremo, e aprendizagem acidental está em algum lugar entre as duas. 6. A consciência de experiências de aprendizagem inconsciente e não intencional (socialização) pode ocorrer após a experiência, e o processo de reconhecimento retrospectivo pode ser gerado internamente ou conduzido externamente, ou o aprendizado pode acabar permanecendo inconsciente para sempre. 7. A aprendizagem informal pode ser cumulativa ou transformadora. A aprendizagem acumulada refere-se à soma de conhecimentos, ao aperfeiçoamento das habilidades e ao desenvolvimento de valores que expandam e fortaleçam os conhecimentos, habilidades e valores existentes. Em outras palavras, continuamos operando dentro do mesmo paradigma. A aprendizagem transformadora refere-se a experiências de aprendizagem que nos levem a desafiar nossos pressupostos e possam alterar radicalmente nosso conhecimento prévio, valores e abordagens. 8. A aprendizagem informal pode complementar e reforçar o aprendizado adquirido através do currículo formal e da educação não formal, mas também pode contestá-lo. Por exemplo, podemos aprender na escola que o sistema capitalista consiste numa grande contribuição para a humanidade, e aprender através de maneira informal que esse sistema é prejudicial à humanidade. Da mesma maneira, um indivíduo pode ser socializado pela comu112_


nidade que o cerca de modo a torná-lo preconceituoso, mas aprender a ser tolerante na escola. Além disso, ele pode frequentar uma escola e saber que através do currículo formal está aprendendo um determinado conteúdo, mas não ter consciência de que através do currículo oculto de aprendizagem também pode estar aprendendo o contrário (machismo, submissão e homofobia, por exemplo). 9. Na mesma linha, a aprendizagem adquirida através de qualquer um dos três tipos de aprendizagem informal (por exemplo, autodirigida) pode reforçar ou contradizer as aprendizagens adquiridas através dos outros dois (por exemplo: aprendizagem acidental). Digamos que numa festa alguém me diga que o aquecimento global não é totalmente causado pela ação humana. Mais tarde, no entanto, posso aprender o contrário lendo a literatura da área. Além disso, experiências conflitantes de aprendizagem podem ocorrer mesmo dentro de uma das três formas de aprendizagem informal. Uma pessoa pode se tornar religiosa através de uma primeira socialização, por exemplo, mas, através de uma segunda socialização, tornar-se agnóstico e vice-versa. 10. É possível fazer uma distinção entre aprendizagem informal e educação informal. A aprendizagem informal refere-se à aquisição de conhecimentos, competências e atitudes fora do currículo de instituições educativas formais e não formais. A educação informal consiste numa organização deliberada de situações que promovam certas experiências de aprendizagem informal. Ainda que na educação informal não existam professores, facilitadores ou livros didáticos, a experiência é projetada para ser uma experiência educativa e é concebida por um agente pedagógico com objetivos educacionais em mente. Na educação informal, a experiência é o currículo. Concluindo, há muitas questões que merecem discussão no campo da educação informal. Este trabalho procura contribuir para esse debate, abordando quatro dessas questões, entendidas como desafios. Em relação ao desafio conceitual, o presente trabalho situa a aprendizagem informal num contexto educacional mais amplo e propõe uma subdivisão interna das atividades de aprendizagem informal. Cabe reconhecer que a tipologia proposta neste trabalho não explica tudo o que se passa na aprendizagem informal. Limita-se a questionar se existe uma intenção de aprender alguma coisa e se o aluno está ciente de que alguma aprendizagem ocorre. Não questiona o tipo de intenção, no sentido de interesses de conhecimento como propõe Habermas (técnico, hermenêutico, emancipatório); não questiona se o propósito _ 113


da aprendizagem é de aperfeiçoamento individual ou de bem-estar coletivo, tampouco questiona as implicações dessas aprendizagens para controle e mudança social. No entanto, proponho que esta taxonomia não exclua esses tipos de análise, e pode muito bem ser complementada por eles. Em termos de conscientização do processo de aprendizagem, esta taxonomia não trata de questões como aprendizagem subliminar, hipnose e afins, mas reconhece estas áreas como dignas de serem investigadas. No que diz respeito ao desafio do reconhecimento, embora os diversos sistemas de avaliação e reconhecimento de conhecimentos anteriores estabelecidos estejam trazendo uma grande contribuição no sentido de trazer à consciência a parte escondida desse iceberg, ainda existem algumas áreas problemáticas em termos de concepção e execução. Entre elas, a possibilidade de transferência do PLAR de uma província ou país para outro, a baixa participação dos alunos (em parte devido à sua visão limitada dentro do universo da educação), a falta de padrões de qualidade e a relutância das universidades a adotá-lo. Em termos de desafio metodológico, a motivação para o desenvolvimento das estratégias para eliciar conhecimento tácito descrita neste trabalho surgiu a partir da falha inicial descoberta quando foi feita uma tentativa com perguntas de respostas abertas. Ao longo do tempo, a lista inicial de dez indicadores de aprendizagem informal cresceu para mais de 60, e uma quarta dimensão (mudanças nas práticas) foi adicionada. Esta quarta dimensão permitiu que os participantes não só falassem sobre as aplicações práticas dos seus novos conhecimentos, habilidades e valores, mas também elaborassem alguns dos ciclos de reflexão e de ação (práxis) aos quais se submeteram durante seu processo de aprendizagem. A abordagem metodológica pré e pós aqui descrita não é a única que pode ajudar a eliciar a aprendizagem informal e conhecimento tácito, e ela certamente tem limitações. Ao mesmo tempo, tem a vantagem de ser simples, direta e eficaz para trazer à tona a aprendizagem informal e para estimular os participantes a contarem suas histórias pessoais de aprendizado e mudança, refletindo sobre elas. Finalizando, quanto ao desafio pedagógico, pontuo que a área da educação informal tem um grande potencial para o desenvolvimento de iniciativas pedagógicas criativas que promovam experiências de aprendizagens positivas numa grande variedade de contextos e faixas etárias. É uma área para a qual nós, educadores, ainda não dedicamos discussões e ação suficientes, mas que oferece grandes possibilidades, principalmente no campo da educação para a cidadania democrática. 114_


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A INTERPELAÇÃO DOS DISCURSOS ÉTICO E ECONÔMICO SOBRE A EDUCAÇÃO LA INTERPELACION DE LOS DISCURSOS ETICO Y ECONÓMICO EN LA EDUCACIÓN

Denalize Goulart Leite*

Resumo

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- Mestranda em Educação – PUC-RS. Bolsista do Conselho Nacional de Desenvolvimento Científico e Tecnológico – CNPq, sendo orientada pela profª drª. Nadja Hermann. E-mail: deecon@hotmail.com

No contexto presente, a sociedade é individualista, imediatista, consumista, globalizada e empobrecida em seus valores éticos, onde há um Estado bastante complexo e enfraquecido, e uma educação subordinada aos interesses do capital. Este faz diversas exigências à educação, com o único objetivo de alcançar mais produtividade e melhores lucros. Sendo assim, no âmbito da economia e da sociedade, o indivíduo perde constantemente espaço para a eficácia, o lucro e o consumo. Por isso, se torna extremamente importante se pensar o papel da ética e da ciência econômica diante deste cenário. Porque, para que uma sociedade se mantenha e prospere, é fundamental uma educação ética e não unicamente técnica, conforme exige o sistema capitalista. No desenrolar da modernidade, temos o poder do dinheiro se sobrepondo a esta educação virtuosa.

P a l a v r a s - C h a v e : Educação, Capitalismo, Ética.

Resumen En el actual contexto, la sociedad es individualista, inmediatista, consumista, globalizada y empobrecida en sus valores éticos, donde existe un Estado bastante complejo y debilitado y una educación subordinada a los intereses del capital. El mismo hace distintas exigencias a la educación con el único objetivo de alcanzar una mayor productividad y mejores ganancias. Así, en el _ 117


ámbito de la economía y de la sociedad el individuo pierde constantemente el espacio para la eficacia, la ganancia y el consumo. Por eso es muy importante considerar el papel de la ética y de la ciencia económica frente este escenario. Porque para que una sociedad se mantenga y prospere es imprescindible una educación ética y no unicamente técnica, como exige el sistema capitalista. En el curso de la modernidad tenemos el poder del dinero sobreponiéndose a esta educación virtuosa.

P a l a b r a s - C l a v e s : Educación, Capitalismo, Ética.

1. A ruptura com os valores morais A atual concepção de indivíduo é constituída por princípios e normas muito diferentes daqueles cultivados no início da Idade Moderna. Conforme, Goergen (2001), a Idade Moderna começa substituindo uma cultura teocêntrica e metafísica por uma cultura antropocêntrica e secular, e com o passar do tempo se fundamenta na crença ilimitada do uso da razão como forma de garantir uma sociedade melhor. Em outras palavras, o indivíduo por intermédio da razão passaria a dirigir a si mesmo, e a se preocupar com a ampliação do saber através do progresso intelectual, moral e social da humanidade. Essas afirmações corroboram que as ideologias do contexto presente são o avesso do antigo ideal almejado de formação, que articulava a construção da subjetividade com uma ordem universal, como, por exemplo, o agir moral que proporcionaria as condições para se construir uma sociedade baseada nas ideias de igualdade e justiça. Tudo isso, no entanto, é o oposto do atual desvirtuamento do agir humano. No contexto presente, a sociedade é individualista, imediatista, globalizada, consumista e empobrecida em seus valores éticos. No âmbito da economia e da sociedade, o indivíduo perde constantemente espaço para a eficácia, o lucro e o consumo. Nesse cenário, excepcionalmente no âmbito econômico, predomina o modelo industrial; como função econômica e social, ostenta uma aparente neutralidade ao abster-se de qualquer crítica normativa; e, como função política, defende um Estado democrático bastante complexo e enfraquecido que trabalha em prol dos interesses do capital. De forma mais específica, pode-se 118_


dizer que nesse cenário predomina o paradigma racional instrumental1. Para este, conforme Goergen (2001, p. 20): “O que importa não é o conhecimento em si, mas o conhecimento com seu atributo tornado essencial: sua utilidade”. Esse paradigma, com seus avanços científicos e tecnológicos, condiciona os nossos valores, a nossa forma de pensar, perceber e fazer as coisas. colaborando e promovendo modificações no jeito de ver o mundo e no jeito de ver a si próprio. Como parte integrante deste quadro, a educação também sofreu modificações, pois a organização educacional que deveria ser a responsável pelo processo contínuo de construção de valores éticos e de solidariedade para com todos passou a ser a principal reprodutora das exigências do sistema vigente. Sendo assim, é importante se pensar o papel da educação diante deste cenário, pois, para que uma sociedade se mantenha e prospere, é fundamental uma educação ética, e não unicamente técnica. Afinal, uma educação técnica voltada unicamente para o desenvolvimento de competências cria e mantém mecanismos de exclusão e desigualdade, desvirtuando o papel da educação, que deveria ser a busca pela coesão social através de uma práxis ética orientada pelo educador. A educação virtuosa, promotora da justiça e do aperfeiçoamento do indivíduo, não pode ser deixada a cargo de um mercado que, por essência, é incapaz de criar as condições de igualdade (CORTINA, 2005).

1

- A racionalidade instrumental é um método que se fundamenta na relação meio-fim com o intuito de dominar tudo a sua volta.

2. O sistema econômico vigente As relações estabelecidas entre os indivíduos do século 21 são determinadas pela eficácia das transações econômicas. A ideia de lucro penetrou o mundo do trabalho e da educação. Sendo a educação profundamente interpelada pelo discurso econômico vigente, vê-se neste contexto somar a suas competências uma maior importância em relação ao desenvolvimento econômico dos países. O capitalismo impõe ao mundo sua visão economicista, ampliando constantemente a possibilidade de se empregar a astúcia e a traição (KESSELRING, 2007). O mercado dita as normas, e o trabalho, que antes era visto como um meio propagador de uma nova realidade e melhoria da qualidade de vida da sociedade, agora, “propaga a lógica do dinheiro e do poder, visando à busca não mais do entendimento, mas sim de interesses privados e particulares” _ 119


(DALBOSCO, 2005, p. 165). Acontece então, nesse atual sistema, uma ruptura dos laços de solidariedade, possibilitando a consolidação de relações baseadas unicamente em interesses individuais e de ganho financeiro. A seguir se faz uso das palavras de Kesselring para se ratificar este panorama: O atual sistema de mercado oferece para isso abundantes oportunidades. Segundo o princípio do egoísmo, ou do proveito próprio, cada um está disposto a explorar a realização de terceiros em seu próprio proveito (KESSELRING, 2007, p. 236).

2 - Aqui faço uma referência de forma bem ampla às diversas entidades e movimentos sociais que desenvolvem ações em prol de um mundo mais justo, mais igualitário.

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O fortalecimento do capitalismo tardio com seu discurso econômico consolidado nos anos oitenta com a industrialização, a aquisição de novas tecnologias e com o crescimento dos mercados globais, inseriu no sistema educativo a ideia de que o melhor para a sociedade é propiciar uma educação que a qualifique para o mercado de trabalho. Educação esta que subordina o indivíduo a uma moral burguesa que estabelece como aceitável viver numa sociedade assentada nas desigualdades sociais, materiais, culturais, etc. (SANFELICE, 2005). Desigualdades que desde o início do século 19 vêm aumentando em nível global, em vez de diminuir. “Ninguém nega que nossa geração se encontra confrontada com desafios fundamentais e que ela necessita, para a sua solução, de uma reforçada cooperação e de uma cooperação de todos com todos” (KESSELRING, 2007, p. 22). Entretanto, até mesmo no momento de cooperar o sistema capitalista deixa a desejar, pois ele opera em consonância com a máxima utilitarista que admite, segundo Kesselring (2007), o questionamento sobre: quais são as formas de desigualdades de fato eticamente relevantes? E, sendo assim, permite que a justiça e a solidariedade sejam praticadas com base em interesses individuais e que considere apenas os resultados quantitativos. Todavia, esse mesmo sistema causador do abismo abundância e escassez permitiu que se criassem conceitos de cooperação global2. Esta cooperação luta pelo desenvolvimento econômico, mas principalmente pelo desenvolvimento social da nação. Contudo, uma inclinação espontânea para o agir solidário é algo pouco provável nesta sociedade em que por décadas impera um sistema que prioriza as decisões econômicas e políticas sobre as sociais (trabalho, educação, moradia, saúde, benefícios sociais). E um exemplo dessa valorização do econômico e do político sobre o social pode ser a Teoria Econômica Keynesiana:


Keynesianismo visava mais preservar o capitalismo que conseguir a igualdade por motivos éticos. E, no que diz respeito à solidariedade, ocorre com ela o mesmo que com a liberdade: ela não pode ser imposta (CORTINA, 2005, p. 65).

O sistema capitalista trabalha em torno de uma “despotencialização ética” das relações humanas, de um desvirtuamento da ação educacional e da redução do poder do Estado (KESSELRING, 2008, p. 22), onde “quem não dispõe de dinheiro é excluído do mercado. Exclusão, apartheid, construção de muros invisíveis”3.

3

- Ibid., 275.

3. O Estado e a educação para o mercado de trabalho Como já se falou, muitos foram os avanços científicos e tecnológicos; contudo, um dos mais relevantes para esta fase avançada do capitalismo é o advento da globalização. Com a globalização, os assuntos econômicos ganharam maior magnitude, possibilitando ao mercado impor uma impotência ao Estado no que diz respeito a controlar os seus abusos. Sendo assim, o setor privado passou a ser o principal responsável por extirpar as desigualdades e promover o bem comum. Porém, não o faz como é evidente. No que segue, Goergen (2001, p. 6) explicita esta configuração advinda da globalização: O grande mote da última década foi a globalização da economia que, desimpedida dos “entraves” do Estado e da preocupação social e deslizando pelos azeitados trilhos da tecnologia da informação, deu fim a qualquer projeto ou mesmo controle social e político.

O Estado perante este panorama de impotência frente ao poder de mercado passou a aceitar e executar todas as exigências do sistema capitalista, inclusive as relativas ao ideário educacional. O sistema capitalista defende um “mercado escolar”, onde a educação é relegada ao status de mercadoria, e, sendo assim, deve ser produzida de forma rápida e de acordo com rigorosas normas de eficiência e de produtividade (GENTILI, 2004). Estado e educação tornam-se submissos aos interesses do capital, como segue em citação de Haddad e Graciano (2004, p. 67):

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[...] o governo federal instituiu uma reforma educacional que buscou adaptar o sistema de ensino à reforma do Estado, em consonância com as orientações das instituições financeiras multilaterais que, além de destacarem essa área como prioritária, indicaram uma série de medidas para o setor.

Em outras palavras, equivaleria a dizer que o Estado é unicamente político e econômico e, quando tange ao social, um dos aspectos como a educação passa a ter como única função adaptar o indivíduo às demandas da economia de mercado, destituindo-se de qualquer compromisso com uma educação crítica e solidária, incentivadora dos direitos humanos.

4. As exigências do mercado de trabalho

4

- Acredito que o termo submissão no mercado de trabalho poderia ser sinônimo de flexibilidade, pois esta determina o indivíduo que se submete a todas as imposições do mercado para se manter empregado.

5

- Ibid., p. 70.

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Diversas são as exigências que o sistema capitalista faz à educação (SANFELICE, 2005), com o objetivo único de impor ao mercado de trabalho o aumento da produtividade, visando sempre como valor supremo às taxas máximas de lucro (FRIGOTTO, 2005). Essa política condiciona o indivíduo a buscar um contínuo aperfeiçoamento, e cria ou reafirma os sentimentos de individualismo, concorrência e submissão4. [...] uma produção sempre mais eficiente que torna cada vez mais supérflua a força de trabalho, ou uma formação de forças de trabalho profissional sempre mais radicalmente especializado e mais caro. A colaboração para o desenvolvimento estará condenada ao fracasso se ela não atuar decididamente contra essas tendências (CORTINA, 2005, p. 263).

Conforme Cortina5, “o trabalho remunerado é fonte não só de dinheiro, mas de identificação e participação social”. Entretanto, no contexto capitalista ele deixou de ser unicamente o mecanismo pelo qual o indivíduo se socializa e procura satisfazer suas necessidades básicas; hoje, o trabalho é unicamente a busca pela riqueza, pelo lucro através da exploração da mão-de-obra. O trabalho já propiciou crescimento social, político e econômico ao indivíduo e às sociedades ao longo do contexto histórico. Na Grécia de Hesíodo, o trabalho era visto como fonte de justiça, propagador da felicidade e meritocrático; já na atualidade, ele é visto como excludente e gerador de desigualdades. Ou seja, ao longo da história o trabalho sofreu inúmeras transfor-


mações, tanto em sua base conceitual como na prática, que hoje conta com uma avançada tecnologia para a realização das tarefas. Contudo, a cada avanço tecnológico e científico, o que se verifica é uma quantidade imensurável de trabalhadores dispensados de seus postos de trabalho. O que faz com que alguns autores como Adorno e Horkheimer6 falem do fim do trabalho. E a respeito deste tema há uma vasta bibliografia como, por exemplo, Cortina (2005, p. 91), que diz: As empresas preferem reduzir o pessoal, acreditando que aumentar a competitividade exige seguir o imperativo da inovação tecnológica, reduzindo mão-de-obra, já que isso lhes permite poupar subsídios, planos assistenciais e fundos de pensão.

6

- Adorno e Horkheimer buscam desvendar a face oculta, negativa, do projeto da modernidade, procurando mostrar que, ao lado de suas inegáveis conquistas no campo da ciência e da tecnologia com consideráveis vantagens para o homem, exigiu dele sacrifícios imensos que, no limite, implicam a submissão total do ser humano (GOERGEN, 2001, p. 19).

No entanto, há quem discorde que este sistema gere aumento no número de desempregados, como, por exemplo, Mises (1990, p. 842): “Só pessoas cegas por ideias preconcebidas e por preconceitos partidários poderiam recorrer a tal explicação numa época em que a indústria supre as massas com novas mercadorias até então desconhecidas”. Todavia, não bastam apenas novos produtos e possibilidades de consumi-los para que o bem-estar de uma sociedade seja alcançado. Para que se alcance o bem-estar, é necessário relacionar o trabalho com os interesses pessoais, ter acessos a contatos interhumanos que o satisfaça e, além disso, um bom sistema educacional. Entretanto, para o pensamento econômico, o investimento em educação primária, secundária e superior foi por muito tempo negligenciado; nunca esteve entre as prioridades de investimento o cuidado com a formação do indivíduo, pois “a produção sempre foi explicada apenas em termos de terra, trabalho e capital, esquecendo-se do capital humano” (ARRUDA; WHITAKER; RAMOS, 2001, p. 159). Ou seja, por um longo tempo os investimentos priorizaram apenas esses três fatores da economia. E, até hoje, onde se exige um grau maior de formação para se ter acesso ao mercado de trabalho, a educação continua negligenciada, pois atualmente ela se encontra à mercê de um sistema capitalista que lhe concede apenas o status de mercadoria, impossibilitando que a instituição educacional cumpra com suas demais funções que, conforme Barreto (2003, p. 1), são: O espaço escolar deve privilegiar a pesquisa, a discussão e a análise crítica sobre a relação dos homens, na atualidade, com o mundo do trabalho. Estas relações impactam de diferentes formas o modo

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como as sociedades se organizam em todos os sentidos, além da geração de renda, do poder aquisitivo e do consumo. Estas questões têm relação direta com as reais possibilidades de transformação da sociedade no caminho da justiça, da solidariedade, da equidade social, do senso democrático.

5. O fenômeno do consumo e a mercantilização da educação O capitalismo já mencionado é um sistema que tem como objetivo único a obtenção de lucro através, entre outros meios, da compra e venda de bens e serviços para uma massa de consumidores inseridos em um mercado global. Com o passar dos tempos, este sistema adquiriu novos meios para alcançar seu objetivo único, sendo um deles o fenômeno do consumo: [...] a reprodução da sociedade capitalista é obtida mediante encontros transnacionais interminavelmente repetidos entre o capital no papel de comprador e o trabalho no de mercadoria; então, o Estado capitalista deve cuidar para que esses encontros ocorram com regularidade e atinjam seus propósitos, ou seja, culminem em transações de compra e venda (HABERMAS apud BAUMAN, 2008, p. 14).

Entretanto, houve uma mudança no conceito de consumo, que durante muito tempo foi a aquisição de bens e serviços voltados para a satisfação de necessidades externas. Mas, agora, tornou-se uma procura de satisfação interna. É como se através da compra o indivíduo conquistasse igualdade e felicidade. Aristóteles acreditava que o conceito de felicidade (eudaimonia) era a finalidade visada por todo ser humano e correspondia à excelência humana. Ou seja, a felicidade “está relacionada à realização humana e ao sucesso naquilo que se pretende obter, se aquilo que se faz é bem-feito” (MARCONDES, 2007, p. 40). Porém, esses conceitos foram sendo substituídos gradualmente pelos conceitos econômicos, devido à educação ter negligenciado a importância dos temas filosóficos em detrimento do receituário capitalista. E, sendo assim, o consumo passou a ser ora um meio para a felicidade, ora a própria felicidade. Dessa forma, isso gera uma realidade onde o capital compra felicidade, igualdade, educação, entre outras coisas.

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Em consonância com o fenômeno do consumo, temos a venda crescente da mercadoria educação. A OMC (Organização Mundial do Comércio) já estuda submeter à educação as regras do comércio global, e o Estado ao não tomar uma atitude enérgica para regular a educação faz com que ela esteja vulnerável à avidez das empresas internacionais em entrar e dominar este setor. Por fim, o que se vislumbra na nossa sociedade é a educação sendo comprada como um meio que possibilita a conquista de igualdade. A sociedade individualista e competitiva quer se educar para garantir sua subsistência através do salário pago pelo empresário capitalista, ávido por lucro. No entanto, o que de fato acontece é a exploração da mão-de-obra deste indivíduo técnico, instrumentalizado e acrítico. Este indivíduo é resultado de uma educação que garante apenas o mínimo de conhecimento necessário para se ocupar uma vaga no mercado de trabalho capitalista. O que contradiz o ideal de educação que é proporcionar tanto conhecimento tecnicamente utilizável como também o conhecimento que desenvolva no indivíduo a autonomia e o sentimento de pertencimento a uma sociedade.

6. Conclusão A modernidade é reconhecida como sinônimo de mudanças (RATTO, 2007), mudanças essas que trouxeram modificações e interferiram nos processos de urbanização, globalização, sistema educativo e consumo. O foco principal deste trabalho foram as modificações e as interferências ocorridas no discurso proferido pela educação. Esta influência transformadora oriunda em sua maioria do discurso econômico está agindo sobre a educação de modo a formar resultados negativos. Afinal, como já se falou anteriormente, a educação oferece apenas conhecimentos que adaptem o indivíduo à sociedade industrial de modo eficaz e que não conteste as regras do sistema capitalista; ou seja, a sociedade atual recebe uma educação puramente voltada para responder de forma eficiente às teorias econômicas. Essa dissemina o poder de consumo e ensina o que produzir, quanto e para quem produzir na busca incessante do lucro. Sendo assim, a interpelação do discurso ético na educação se faz de extrema importância, pois através de uma educação ético-moral é possível resgatar e ampliar a capacidade reflexiva do indivíduo, e, assim, possibilitar que este lute contra a lógica capitalista que causa tanta desigualdade. _ 125


A economia é uma ciência autônoma, porém deve agir em consonância com a ética, conforme Sen (2008): a filosofia moral pode trazer contribuições substanciais para economia. A ética não irá resolver o problema social de um Estado, no que tange suas desigualdades econômicas, mas proporcionará as bases conceituais necessárias para que uma política social seja solidária, justa e igualitária. Resumindo, o sistema econômico que vigora no mundo instaurou uma educação capitalista dissociada de qualquer outra influência que não as da teoria econômica. Sendo assim, a educação virou sinônimo de educar para o consumo, para as trocas e para o lucro, ignorando que a literatura ética pode contribuir para um agir moral que incentive a construção de uma sociedade melhor, mais igual, mais justa. Nas palavras de Goergen (2001, p. 9): “[...] a mudança de mentalidade, o nascer de uma nova consciência precisam ser estimulados através do processo educativo, educação e formação ética se tocam, necessariamente”.

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Referências

ARRUDA, Cecilia de; WHITAKER, Maria; RAMOS, José Maria. Fundamentos de ética empresarial e econômica. São Paulo: Editora Atlas S.A., 2001. BARRETO, Suely. Em pauta: Educação para o consumo. Coleção Gira Mundo, Rio de Janeiro, n. 14, 2003. Disponível em: http://www.multirio.rj.gov.br/portal/_download/gira14.pdf. Acessado em: 13 abr. 2009. BAUMAN, Zygmund. Vida para consumo: A transformação das pessoas em mercadoria. Rio de Janeiro: Zahar, 2008. CORTINA, Adela. Cidadão do mundo. São Paulo: Edições Loyola, 2005. DALBOSCO, Claudio. Desafios ético-educacionais diante da crescente colonização do mundo da vida. In: GOERGEN, Pedro; LOMBARDI, José (Org.). Ética e educação: reflexões filosóficas e históricas. São Paulo: Autores Associados, 2005. FRIGOTTO, Gaudêncio. Educação, trabalho e ética: desafios e perspectivas. In: GENTILLI, Pablo. Neoliberalismo e educação: manual do usuário. fírgoa universidade publica-espazo comunitario, Espanha, mar. 2004. Disponível em: http://firgoa.usc.es/drupal/node/3036. Acessado em: 24 mar. 2009. GOERGEN, Pedro. Pós-modernidade, ética e educação. Campinas, SP: Autores Associados, 2001. GOERGEN, Pedro; LOMBARDI, José (Org.). Ética e Educação: reflexões filosóficas e históricas. São Paulo: Autores Associados, 2005. GRACIANO, Mariângela; HADDAD, Sérgio. Educação direito universal ou mercado em expansão. São Paulo em Perspectiva, São Paulo, ano 3, n. 18, 2004. Disponível em: http://www.scielo.br/ pdf/spp/v18n3/24780.pdf. Acessado em: 9 abr. 2009. KESSELRING, Thomas. Ética, política e desenvolvimento humano: a justiça na era da globalização. Caxias do Sul, RS: Educs, 2007. MARCONDES, Danilo. Textos básicos de ética de Platão a Foucault. 2. ed. Rio de Janeiro: Zahar, 2007. MISES, Ludvig von. Ação humana: um tratado de economia. 3. ed. Rio de Janeiro: Instituto Liberal, 1990. RATTO, Cleber. Cultura e consumo: notas para um estudo antropológico do consumo na sociedade contemporânea. Porto Alegre, RS: Think, v. 5, p. 109-118, 2007. SANFELICE, José. Educação, trabalho e ética. In: GOERGEN, Pedro; LOMBARDI, José (Org.). Ética e educação: reflexões filosóficas e históricas. São Paulo: Autores Associados, 2005. SEN, Amartya. Sobre ética e economia. 7. ed. São Paulo: Companhia das Letras, 2008.

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USANDO O CHA PARA IDENTIFICAR COMPETÊNCIAS E GERAR RESULTADOS POSITIVOS NA GESTÃO DE PROJETOS USING CHA TO IDENTIFY COMPETENCES AND TO GENERATE POSITIVE RESULTS IN PROJECT MANAGEMENT *

Rafael Rodrigues*

Resumo Os tempos mudaram, não será mais possível gerenciar projetos com técnicas burocráticas dentro do pequeno espaço de tempo que o mercado exige. Estamos na era da informação e da aplicação inteligente deste, onde o que vale é o conhecimento, as habilidades e, principalmente, as atitudes de uma pessoa comprometida com resultados e metas. Neste artigo será explorado como trabalhar com esses três elementos do CHA (Conhecimento, Habilidade e Atitude) para identificar as competências certas na estruturação de uma equipe e obter a máxima performance dos gestores e de seu grupo para conquistar resultados positivos nos projetos executados.

- Prof. mestre da Faculdade de Tecnologia – SENAC Pelotas, graduado em Ciência da Computação pela Universidade Católica de Pelotas – UCPel, com mestrado na Faculdade de Tecnologia – UnB, na área de Gerência de Projetos e Educação a Distância. Possui mais de cinco anos de experiência na área de Tecnologia da Informação. Atualmente, mantém relacionamento com diversas instituições de ensino para o contínuo desenvolvimento dos processos de certificações, gerenciamento e metodologias de projetos.

P a l a v r a s - C h a v e : Competência, Conhecimento, Habilidade e Atitude. Abstract Times have changed; it will no longer be possible to manage projects with bureaucratic techniques within the small amount of time that the market demands. We are in the information era along with its intelligent application, in which what counts is the knowledge, the abilities and mainly the attitude of those who are committed to results and goals. This article will explore how to work with the three elements of CHA (Conhecimento,

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Habilidade e Atitude, knowledge, ability and attitude) to identify the right competences in staff structuring and also to obtain the managers and their groups’ maximum performance in order to achieve positive results in the implemented projects.

K e y w o r d s : Competence, Knowledge, Ability and Attitude.

Introdução Antigamente, um currículo com várias páginas, cheio de certificados e diplomas, era sinônimo de segurança para a contratante, que só devia se preocupar em achar este currículo no mercado e contratar o mais novo colaborador para os resultados começarem a aparecer. Hoje, a realidade do mercado de trabalho é completamente diferente; existem milhares de pessoas em busca de uma oportunidade, mas sem a qualificação adequada para as vagas existentes. E, para piorar, a dinamicidade do mundo atual exige um poder de adaptação das pessoas e de reciclagem das informações que muitas não têm. Com isso, a garantia de uma boa contratação não é mais precisa como antes, e o mercado de trabalho passa a focar-se no conhecimento, habilidades e atitudes das pessoas na prática, o famoso – CHA, ao invés de um longo currículo recheado de promessas. A competência é um termo usado para designar repertórios de comportamentos e capacitações que algumas pessoas ou organizações dominam melhor que outras, fazendo-as eficazes em uma determinada situação (GRAMIGNA, 2002, p. 15). Também, é um conjunto de Conhecimentos, Habilidades e Atitudes, que afetam a maior parte do trabalho de uma pessoa, e que se relacionam com seu desempenho no trabalho (LEME, 2005, p. 17). O CHA é composto, em sua essência, por três elementos básicos, como mostra a Figura 1.

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Figura 1: Composição do CHA1 De acordo com a representação gráfica da figura 1, podemos descrever os três elementos básicos do CHA como:

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- Figura 1: Composição do CHA – Imagem de autoria do próprio autor deste artigo, não possuindo assim fonte ou referência externa à bibliografia utilizada.

• Conhecimentos: tem como foco principal o saber. É baseado em conhecimentos técnicos, escolaridade e cursos realizados. • Habilidades: tem como foco principal o saber fazer. É baseado na experiência, nos conhecimentos. Ter colocado em prática o saber adquirido. • Atitudes: tem como foco principal o querer fazer. É baseado no ter atitudes compatíveis para obter resultados em relação aos conhecimentos e habilidades adquiridos ou a serem adquiridos. Posto esses conceitos, podemos concluir que os elementos do CHA podem ser subdivididos em duas categorias: competências técnicas e competência comportamental. Nas competências técnicas temos a inclusão do elemento conhecimento com o saber e o elemento habilidade com o saber fazer. Na categoria competência comportamental, temos o elemento atitude com o querer fazer, que, como veremos na sequência, é o elemento mais preocupante para que uma equipe tenha sucesso na gestão de projetos. Também, é possível utilizar a metáfora da “árvore das competências” para entender melhor o significado destes três elementos. Nessa metáfora, os _ 131


três componentes básicos de uma árvore (raiz, tronco e copa) formam um todo que, se tratado de forma adequada, a árvore segue seu curso natural, cresce sadia e gera bons frutos ou flores (GRAMIGNA, 2002, p. 18). Nesse contexto, é definido raiz (atitudes), tronco (conhecimento) e copa (habilidades) como: A raiz corresponde às atitudes. A raiz corresponde ao conjunto de valores, crenças e princípios, formados ao longo da vida, e determinam nossas atitudes. O grau de envolvimento e comprometimento das pessoas com os objetivos, metas e projetos coletivos está diretamente relacionado com a maneira como os valores e as crenças são manejados no contexto de trabalho. Se uma pessoa acredita, por exemplo, que ela é importante na construção de um mundo melhor para viver, suas atitudes certamente conduzirão a um esforço em direção às mudanças necessárias. Ao contrário, se não acredita que pode mudar o curso da história, sua atitude será de passividade e conformismo. A atitude é o início de tudo e o principal componente da competência. Está relacionada com “querer ser e querer agir”. O tronco corresponde ao conhecimento. O conhecimento é o segundo componente de uma competência. Trata-se do conjunto de informações que a pessoa armazena e lança mão quando precisa. Quanto maior este conhecimento, mais a competência se fortalece e permite que o profissional enfrente com flexibilidade e sabedoria os diversos desafios de seu dia-a-dia. Procurar ver além das fronteiras e dos muros, perceber as novas necessidades e buscar as fontes de pesquisa são comportamentos que tornam a caminhada do profissional divertida e rica. A copa (com seus frutos, flores e folhas) corresponde às habilidades. Agir com talento, capacidade e técnica, obtendo resultados positivos, é o que chamamos de “habilidade”. Algumas pessoas acumulam um baú de informações e têm dificuldade de abri-lo para uso. Com o tempo, o baú é esquecido e ninguém se beneficiou de seu conteúdo. Uma competência só é reconhecida quando disponibilizada. Não adianta alguém saber que sabe. Para obter o reconhecimento, precisa demonstrar que sabe.

De outra forma, o conceito de competência no gerenciamento de pessoas e projetos diz que (RAJ, 2007, p. 94): Existe a percepção de que o conhecimento é o principal fator de produção na atual sociedade e responsável pela competitividade de uma organização. Com isso, está sendo alcançado o consenso de que é importante gerir o conhecimento de forma estruturada e intencional. Se considerarmos que é o elemento humano que detém importante parcela do conhecimento necessário para a implementação de qualquer projeto, os gerentes precisam atuar como gestores das competências das pessoas para que elas realizem

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as atividades necessárias em cada etapa do projeto atual e se preparem para os projetos futuros. Nesse contexto, as organizações adotaram metodologias de gestão de conhecimento e de gestão de competências.

Posto isso, é notável que cada vez mais é preciso que a grande questão competência deva ser dada a devida atenção na seleção e, principalmente, na formação de uma equipe para execução de um projeto.

Formando uma equipe competente Antes de pensar nas pessoas que devem ser contratadas ou alocadas para formar a equipe do projeto, é preciso identificar as competências necessárias para cada atividade da EAP (Estrutura Analítica do Projeto) do projeto. A EAP trata de um agrupamento de elementos do projeto, orientados para resultados, que organiza e define o completo escopo do projeto. Cada nível descente representa uma definição cada vez mais detalhada do trabalho do projeto (TENSTEP, 2009). Com a EAP, o projeto é subdividido, através da técnica de decomposição, em seus principais componentes. Estes são quebrados em seus produtos e subprodutos até que chegue ao nível de pacote de trabalho, ou seja, até a menor unidade de um componente. A partir do pacote de trabalho são definidas as atividades e os recursos necessários. A EAP, como mostra a figura 2, é um instrumento amplamente utilizado e é recomendado pelo PMI (Project Management Institute) como instrumento padrão para gestão de projetos. O objetivo de uma EAP é identificar elementos terminais, ou seja, os itens reais a serem feitos em um projeto. Assim, a EAP serve como base para a maior parte do planejamento de projeto. Da mesma forma, antes da formação da equipe é preciso que a matriz de responsabilidades do projeto esteja pronta e com as devidas competências identificadas. A matriz de responsabilidades, como expõe a figura 3, é uma tabela que mostra a relação das pessoas associadas ao projeto e suas responsabilidades e competências (MARTINS, 2004, p. 43).

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- Figura 2: Modelo de uma EAP simplificada – Imagem de autoria do próprio autor deste artigo, não possuindo assim fonte ou referência externa à bibliografia utilizada.

Figura 2: Modelo de uma EAP simplificada2

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Figura 3: Modelo de uma matriz de responsabilidades3

- Figura 3: Modelo de uma matriz de responsabilidades – Imagem de autoria do próprio autor deste artigo, não possuindo assim fonte ou referência externa à bibliografia utilizada.

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A figura 2 apresenta uma EAP montada de forma simplificada para elucidar a ideia de montagem da EAP como primeiro passo da formação de uma equipe competente para execução de um projeto. Da mesma forma, a figura 3 apresenta um modelo de matriz de responsabilidades para exemplificar a especificação das atividades, competências e recursos humanos alocados para geração dos resultados esperados no trabalho a ser executado.


Esses dois passos apresentados, montagem da EAP e matriz de responsabilidades, não constituem uma tarefa fácil na etapa de planejamento de um projeto. É muito importante que antes da alocação das pessoas seja feita uma avaliação de cada atividade da EAP e a respectiva competência necessária para gerar o resultado esperado. Caso isso não ocorra, o gestor corre o risco de alocar algum recurso humano ao projeto que não tenha conhecimento, habilidade e atitude para resolver o problema. Uma vez identificadas as competências necessárias para cada atividade do projeto, é chegada a hora de avaliar as pessoas disponíveis e verificar se estas possuem o CHA para ocupar a vaga em aberto. Para uma aplicação prática, focada em resultados, e principalmente, possível de ser realizada e mantida nas empresas atuais, não se deve fazer separadamente o mapeamento dos conhecimentos, habilidades e atitudes (LEME, 2005, p. 23). Para se identificar o CHA que está sendo buscado, o ideal é que se dê a oportunidade ao longo do tempo para esta pessoa mostrar seus conhecimentos, suas habilidades e suas atitudes. Infelizmente, o mercado de trabalho é extremamente imediatista e, via de regra, não dá chances para o formador de equipes testar suas pessoas antes de começar um projeto. De qualquer forma, existem técnicas para se avaliar o CHA de uma pessoa no curto prazo. Abaixo é apresentada uma técnica pontual e objetiva para cada um dos elementos-chave do CHA: • Conhecimentos: uma técnica bastante utilizada para testar os conhecimentos de uma pessoa é submeter esta a uma prova teórica/ conceitual, explorando todos os problemas que supostamente serão encarados no desenvolvimento do projeto; • Habilidades: uma prova prática focada nos conhecimentos da prova teórica/conceitual é um mecanismo-chave para testar as habilidades de execução da pessoa em questão; • Atitudes: um trabalho em grupo, instigando a proatividade e as questões de liderança da pessoa é uma boa técnica para testar as atitudes do candidato.

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Caso, após a aplicação das técnicas apresentadas acima, seja identificado que o CHA do candidato para a vaga não é adequado, o melhor que se tem a fazer é buscar um plano alternativo. Buscar um plano alternativo significa aplicar soluções simples de remanejar membros de equipes, e esta pessoa que não tem perfil para o projeto em questão ser alocada em outro que tenha perfil, e este recurso substituído começa a fazer parte da nova equipe, ou até mesmo situações extremas de desligamento da empresa para esta pessoa que não tem o CHA adequado e contratação de outra que tenha as devidas competências. Em situações extremas, de novas contratações, de forma imediata e sem planejamento, uma forma de fazer uma entrevista e obter resultados positivos no curto prazo é utilizar a técnica de seleção por competência. Também, a técnica de seleção por competência diz que (RAJ, 2007, p. 112): Uma forma de fazer o recrutamento é realizar a análise das competências que serão necessárias para as tarefas que a posição exige e verificar, por meio de uma entrevista estruturada, na seleção dos candidatos, se essas competências existem no candidato. Para isso, tem sido utilizada uma técnica de entrevista por competências, baseada na elaboração prévia de perguntas que visam obter relatos de experiências, as quais indicarão a existência ou ausência das competências que estão sendo pesquisadas e que são necessárias para o bom desempenho das tarefas do profissional que está sendo selecionado. Os tipos de questões preparadas para essas entrevistas podem ser: • Quando queremos identificar a capacidade de iniciativa do candidato, poderemos pedir: relate uma mudança que você planejou implementar, mas que não obteve apoio da sua chefia; • Quando precisamos saber se o candidato é capaz de solucionar problemas: fale sobre uma situação imprevista que você teve que administrar.

De fato, o maior problema atualmente nas empresas é com relação ao elemento-chave atitude. Na grande maioria dos casos, as pessoas têm conhecimentos desejados, têm habilidade para colocar o conhecimento em prática, mas barram em questões de proatividade, liderança, espírito de querer mais, etc. Esta zona de conforto gerada pela própria pessoa faz com que os projetos atrasem, tenham qualidade aquém da esperada, custem mais do que planejado, etc.

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Como forma de garantir que o projeto a ser desenvolvido tenha resultados positivos, uma série de melhores práticas é apresentada na próxima seção com relação direta na manipulação do CHA.

Melhores práticas É possível elencarmos uma lista com ações-chave que não podem faltar em uma gestão de projetos, principalmente em projetos multidisciplinares, usando o CHA. Os 10 mandamentos de uma boa gestão para extração de resultados positivos no decorrer do projeto com CHA são: • Conheça você Se você foi nomeado para gerir um projeto, é porque alguém acredita no seu CHA. Se você se nomeou, este já é um grande passo no elemento atitude e acredita-se que você já conhece o suficiente o seu CHA, até mesmo para ter tomado esta decisão. • Conheça os gestores das suas equipes Você não vai conseguir gerir um projeto multidisciplinar sozinho. Por isso é bom você conhecer bem o CHA dos gestores que vão conduzir as equipes de produção. • Conheça os membros da sua equipe Tão importante quanto conhecer o seu CHA e dos seus gestores é você conhecer o CHA de todos os membros de cada equipe. Neste caso, limite-se a uma análise superficial de conhecimento; caso contrário, dependendo do número de envolvidos no projeto, você vai acabar não dando a devida importância para os outros itens do projeto que são mais importantes. • Conheça seus processos internos Os processos e o fluxo macro de todas as informações do projeto devem ser de seu total conhecimento e responsabilidade.

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• Conheça seus processos externos Também, muitas vezes você precisa adaptar os seus processos internos à realidade do cliente. É muito mais fácil e seguro ajustar aquilo que você tem controle – seus processos – do que aquilo que dificilmente você terá controle – processos do seu cliente. Por isso, conheça os processos do seu cliente para que você possa adaptar os seus. • Conheça o projeto Não basta conhecer o objetivo do projeto e imaginar que você consegue atingir. Tenha a habilidade de “correr atrás”. Toda informação levantada para conduzir o projeto é fundamental para conseguir bons resultados ao final. A multidisciplinaridade que envolve estes tipos de projetos faz de você um eterno buscador de informações. • Conheça o seu cliente Estas são as pessoas mais importantes a serem consideradas no projeto. Procure conhecer o CHA destes que serão seu norte durante todas as fases do projeto. • Conheça o seu patrocinador Cuidado! Considere o CHA deste envolvido como uma peça fundamental neste complexo quebra-cabeça do desenvolvimento de projetos. Qualquer movimento fora do que estava planejado, você precisará antecipar as reações de seu patrocinador, ter habilidade e atitude para contornar a situação e manter o projeto fora das estatísticas de fracasso. • Trabalhe Você já deve ter escutado aquela velha frase: “Sucesso só vem antes do Trabalho no dicionário”. Então, não pense que só conhecendo profundamente o CHA, processos e produtos você vai ter sucesso. É preciso trabalhar muito para colocar tudo o que foi visto até agora em prática e colher bons resultados. • Tenha atitude Por fim, mas não menos importante, é preciso que a atitude impere em todas as suas ações. Gerenciar um projeto multidisciplinar é uma tarefa com138_


plexa. Imponha o que é certo, reproduza o que em outros projetos deu resultado positivo, mude o que está errado, enfim, faça a roda girar para frente.

Conclusão Não existe nenhuma receita mágica para o sucesso de um projeto. Existe, sim, meios para se garantir a qualidade dos serviços prestados e produtos gerados durante todas as fases de desenvolvimento de um projeto. Esses meios, na esmagadora maioria das vezes, são simples; não é preciso nada complexo para se ter sucesso. Como foi mostrado, uma das principais preocupações que é preciso se ter em um projeto é fazer uma formação de equipe com competências essenciais. Competências essas que dão a garantia de resultados positivos no decorrer das entregas do projeto. A avaliação das competências para alocação dos recursos humanos certos para as atividades dos projetos constitui basicamente três elementoschave: conhecimento, habilidades e atitudes. Esses três elementos formam o CHA de uma pessoa e identificam se ela tem competência para uma atividade qualquer. Dessa forma, conhecendo-se as atividades do projeto, as competências para se executar as atividades e o CHA das pessoas que estão sendo recrutadas, é possível montar uma equipe que gere resultados positivos no decorrer do desenvolvimento de um projeto.

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Referências FGV. Gestão Empresarial. Rio de Janeiro: FGV Online, 2003. FILHO, Mauro Faccioni. Gestão de projetos e de equipes. 1 vol. Palhoça: UnisulVirtual, 2005. ______. Gestão de projetos e de equipes. 2 vol. Palhoça: UnisulVirtual, 2005. GRAMIGNA, Maria Rita. Modelo de Competência e Gestão de Talentos. São Paulo: Pearson Education do Brasil, 2002. ______. Seleção por Competências – Garimpando talentos e potenciais. Consultado no site www. rh.com.br/editoriais/entrevista, em 15/05/2006. LEME, Rogério. Aplicação prática de gestão de pessoas por competências. Mapeamento, treinamento, seleção, avaliação e mensuração de resultados de treinamento. Rio de Janeiro: Qualitymark, 2005. MARTINS, José Carlos Cordeiro. Gerenciando projetos de desenvolvimento de software com PMI, RUP e UML. Rio de Janeiro: Brasport, 2004. NISEMBAUM, Hugo. A competência essencial. São Paulo: Infinito, 2000. PMI. Um guia do conjunto de conhecimentos em gerenciamento de projetos. 3. ed. Pennsylvania: Project Management Institute, Inc. 2004. QUINN, Robert E.; et al. Competências Gerenciais: princípios e aplicações. Rio de Janeiro: Elsevier, 2003. RAJ, Paulo Pavarini. Gerenciamento de pessoas em projetos. Rio de Janeiro: FGV, 2007. TENSTEP. You can manage. Disponível em http://www.tenstep.com.br/br/. Acesso em 10/03/2009.

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GESTÃO DAS INFORMAÇÕES DE MODA NO VAREJO DE LOJAS MULTIMARCAS E MARCAS LOCAIS DE VESTUÁRIO FEMININO DE SHOPPINGS DE PORTO ALEGRE INFORMATION MANAGEMENT OF FASHION IN RETAIL STORES AND IN LOCAL BRAND STORES OF WOMEN’S CLOTHING IN MALLS FROM PORTO ALEGRE *

Carlos Theodoro Strey* Débora Elman** Jandora Alvarez da Fonseca*** Ananda Shopie Quadros Gonçalves****

Resumo As informações de tendências de moda percorrem alguns caminhos até chegarem ao consumidor final. O varejo de moda é parte da cadeia de moda em uma sociedade contemporânea que se baseia na efemeridade, orientada para o apogeu e declínio de uso de produtos, modelos e cores, alimentada pelo desejo de novidades pelo consumidor. A pesquisa das novas tendências de moda para atender a este desejo é parte deste processo mercadológico que se estabelece em dois eixos a serem contemplados neste trabalho: informação e consumo. Pressupondo que os estabelecimentos de moda ligados ao comércio varejista são segmentados e que a informação atualizada é índice de sucesso desses empreendimentos, é feita neste estudo a problematização do caminho da informação de moda em relação às estratégias de compra e venda das mercadorias, através de pesquisas.

- Mestre em Desenvolvimento Regional (UNISC), especialista em Gestão Empresarial (FGV), administrador de empresas (São Judas Tadeu).

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- Mestre em Comunicação (UFRGS), especialista em Educação Superior (PUCRS), arquiteta (UFRGS).

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- Aluna do Curso de Tecnologia em Marketing da Fatec SenacRS, bolsista de iniciação científica (BIC).

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- Aluna do Curso de Especialização em Moda, Criatividade e Inovação da Fatec Senac-RS, graduada em Design de Moda (FEEVALE), bolsista voluntária de iniciação científica.

P a l a v r a s - C h a v e : Informação, Consumo, Moda.

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Abstract The information about fashion tendency moves in some directions to reach the final consumer. Retail fashion stores are part of a fashion chain based on the ephemerality of the contemporary society. Moreover, they are prepared for the climax and for the decline of products usage, as well as to the desire of new models and color of consumers. Researches of new fashion tendencies in order to find what consumers desire is part of the marketing process, which is established in two axes that are going to be considered in this work: information and consumption. Assuming that fashion establishments associated to fashion retail stores are fragmented, and that updated information is an index of success of those establishments, this study questions the fashion information directions, related to buying and selling goods strategies through research.

K e y w o r d s : Information, Consumption, Fashion.

Introdução Este estudo parte da necessidade de detectar como o varejista obtém e distribui informações para constituir suas coleções e atender ao consumidor final. Por observações empíricas, nota-se um atraso na oferta inovadora de moda no Rio Grande do Sul em relação a outros mercados periféricos, tais como Santa Catarina, Paraná, Goiás, Mato Grosso do Sul, entre outros, o que nos faz propor e aprofundar esse estudo no intuito de fomentar a atividade varejista no Estado. A presente pesquisa pretende mapear a gestão da informação de moda no sentido de aumentar a competitividade do varejo das redes e multimarcas locais. O estudo foca o segmento de vestuário feminino, o qual, segundo Feghali e Dwyer (2001), possui intensa inovação no mercado, com grande desenvolvimento tecnológico e perceptível aumento no volume de vendas. É o segmento que pode contribuir com mais dados sobre o estado de gestão da informação no mercado varejista local. O mercado de moda do Rio Grande do Sul é muito dependente de informações de outros centros criadores, principalmente na interpretação do que se chama macrotendências. 142_


O conceito de macrotendências se confunde com a ideia de que existe um sentimento geral de visão do mundo, da sociedade e do futuro, o qual é embutido nas definições de evolução. De qualquer forma, parece haver alguma coisa na ideia de Zeigeist (espírito da época) ou, pelo menos, na de contágio mental. Pensamos que estamos enveredando bravamente por um caminho sem precedentes, e, de repente, olhamos em volta e descobrimos que estão no mesmo rumo toda sorte de pessoas de quem nunca ouvimos falar (GEERTZ1 apud CALDAS, 2004, p.73).

1 - GEERTZ, C. Nova Luz sobre a Antropologia. Rio de Janeiro: Jorge Zahar, 2001.

O emprego da palavra tendência no sentido da moda é o de “orientação comum a um grupo de pessoas” (CALDAS, 2004, p.25). Para dar conta da complexidade do mundo contemporâneo e da diversidade de grupos sociais, passou-se a insistir em espaços de segurança onde as pessoas possam circular seguindo regras de comportamento que reflitam suas posições de sujeito. Nesse caso “as tendências possibilitam a construção de fluxos de orientação que determinam a moda” (CALDAS, 2004, p. 50).

1. Moda e informação Alguns autores como Spencer, Tarde, Simmel e Veblen (CRANE, 2006) tentaram explicar o processo de adoção de mudanças constantes, principalmente observadas no vestuário, a partir de duas premissas: a imitação e a distinção. Herbert Spencer, em 1854, foi o primeiro a explicar a relação da aparência com a estrutura social, evidenciando que sua base está nos processos de imitação. Existiria um desejo de afirmar que se está nas mesmas condições do imitado ou de um respeito genuíno por quem se imita. A imitação competitiva começa na constituição de uma classe rica o suficiente para rivalizar, em ostentação, com grupos sociais mais elevados, o que efetivamente acontece no interior da sociedade moderna europeia. Gabriel de Tarde, em 1890, reafirma esta teoria, salientando que a aparência era uma forma de reunir os seres em uma sociedade e criar uma relação entre eles, pelo processo de imitação das novidades. O economista americano Veblen, em 1899, faz a primeira relação com o consumo. Chamada de “consumo conspícuo”, Veblen propõe que _ 143


o enquadramento da diferenciação de classes se dá através de três principais fatores mostrados pelas classes abastadas: o consumo e a exibição de artigos caros; a grande quantidade de ornamentações e a não praticidade, com inúmeras regras de etiqueta (que mostravam que a pessoa não precisava trabalhar, principalmente em algum tipo de trabalho físico); e se mostrar vestido na última moda, que significava estar apropriado ao seu tempo (KAWAMURA, 2005). Veblen sustenta que o consumo visível aplicado ao vestuário é uma forma de expressão de poder. George Simmel contextualiza seus estudos, em 1905, a partir de observações do espaço urbanizado e industrializado, defendendo a ideia de que as grandes cidades acentuam a individualidade e dão novo status à aparência pessoal, à apresentação. Simmel é o primeiro a tomar a moda como expressão, como exteriorização da personalidade. Conforme esse autor, a urbanização tornou-se responsável por promover a tomada de consciência dos homens a partir da movimentação das pessoas em espaços sociais ampliados, o que era impossível no meio rural. Para Bourdieu (1983), crescendo a distância em relação às necessidades primárias das pessoas, o estilo de vida vai se tornando, cada vez mais, o produto de uma “estilização da vida”, preferência sempre recorrente e que orienta e organiza as práticas mais diversas, desde a escolha de uma roupa, uma bebida, até a decoração da casa, a religião a que se adere ou as opções de lazer. Lipovetsky (1989) discute o tratamento histórico dado à moda, argumentando que o esquema da distinção entre classes, tanto na esfera do vestuário como na dos objetos e cultura modernos, é incapaz de explicar a lógica da moda: a inconstância, tanto organizacional quanto estética. No seu entender, a moda, mais que indicar os gostos que mudam de tempo em tempo para atender a vontade de distinção de um grupo social, seria um sistema que produz um tipo de sociedade caracterizada pela desqualificação do passado e pelo prestígio do novo. A pesquisa de tendências é uma atividade que tem que lidar com as capacidades de percepção e de leitura de sinais da sociedade, tendo como limites os interesses e as possibilidades dos parceiros da indústria e, como resultado, a aprovação ou não do público-alvo. Para Jobim e Neves (2008), a tendência de moda é a base do que fazer em termos de têxtil e vestuário e é desenvolvida por um conjunto de protagonistas, que têm, além dos interes144_


ses econômicos, a afirmação de criadores reconhecidos e de sinais captados sobre os desejos e as necessidades dos clientes e consumidores. Treptow (2005) descreve a tendência de moda “como um conjunto de itens do vestuário considerados como conceito de bem-vestir” (TREPTOW, 2005, p. 29), e se caracteriza pela temporalidade e massificação. Para a autora, as tendências têm um período de existência limitada e não têm pretensão de durar para sempre. Este período costuma ter início no lançamento por grupos de vanguarda até a total absorção pelo mercado e posterior massificação de consumo. Na etapa final, uma tendência de moda que pode ter surgido como manifesto social de um determinado grupo perde a característica de discurso contestador, tornandose, apenas, efêmero padrão de vestir (TREPTOW, 2005, p. 30). Para Palomino (2002, p. 36), as tendências são “o denominador comum da moda” e surgem na ponta inicial da cadeia têxtil com os produtores de fibras. Ela completa que a cadeia têxtil é composta de onze etapas, além das fibras e fiações; a tecelagem plana; a malharia; o beneficiamento; o acabamento; os químicos e auxiliares; as máquinas têxteis; a confecção; as máquinas para confecção e os serviços; alcançando o final da cadeia quando chega ao consumidor. A estrutura de mercados é de extrema importância, e o cenário na moda é de profunda e permanente interligação entre os mercados primário, secundário e terciário. O mercado primário é composto pelos produtores das matérias da base do sistema, como fibras, corantes, peles, metais, e ainda pelos fabricantes de tecidos. “A pesquisa com estes produtores é fundamental, pois eles produzem as matérias-primas e fabricam os tecidos. Podemos dizer que é aqui que começa o mundo da moda, é a fonte inicial que vai dar origem ao processo têxtil” ( JOBIM e NEVES, 2008, p. 232). O mercado secundário é composto pelos fabricantes de vestuário, que estabelecem, através dos designers, a ligação entre os produtores de matéria-prima, os varejistas e as diferentes organizações de venda. Esse mercado é dividido em dois grandes grupos: os que comercializam os seus produtos através de marcas e distribuição próprias, e os que trabalham com subcontratação de marcas. Já o mercado terciário é composto por varejistas, que compram e vendem obtendo lucro desta atividade. “... a força deste mercado é tão grande que influencia diretamente a moda, tendo estes agentes um papel importante na orientação das tendências” ( JOBIM e NEVES, 2008, p. 233). _ 145


2

- VINCENT-RICARD, Françoise. As espirais da moda. São Paulo: Paz e Terra, 1989.

O calendário, cronograma da criação industrial têxtil, traça datas precisas para os ciclos de desenvolvimento de novos produtos, antecipando as propostas para determinada estação e fixando parâmetros para a atuação dos parceiros da cadeia têxtil e de vestuário no mundo todo. Segundo VincentRicard2 apud Jobim e Neves (2008), as regras básicas para o estabelecimento de um calendário de moda para cada estação percorre, geralmente, um caminho determinado: com dois anos de antecedência são escolhidas as cores; com um ano e meio de antecedência, consideram-se os tecidos; com um ano de antecedência são pensadas as formas; com seis meses de antecedência, os produtos são apresentados e vendidos no varejo. Em função da evolução tecnológica, do acesso fácil à informação e da globalização dos mercados, este calendário já não equivale na totalidade à realidade dos prazos, que se tornaram mais curtos, variando conforme as exigências do consumidor, podendo haver modificações da organização entre os elos da cadeia têxtil quando aplicados na prática ( JOBIM e NEVES, 2008, p. 234).

Deve-se partir de uma coleta de dados ampla e abrangente para que, com um leque vasto de material, possa-se convergir os pontos de interesse que se coloca em causa na criação de cada produto, ou coleção em particular. Os elementos que servem como ferramentas de pesquisa ( JOBIM e NEVES, 2008) são: bibliografia especializada (livros e revistas) em design de moda, design conceitual, design têxtil, informação de cor, design de interiores e design gráfico; cadernos de informação de tendências, cadernos conceituais, cadernos de cor, cadernos têxteis, cadernos de amostras e cadernos de moda; ateliês de estilo/consultores; seminários e workshops; feiras profissionais; desfiles de moda; informação de empresas e entidades do setor, como universidades e escolas especializadas; agentes comerciais; e informações vindas dos principais clientes. A análise do ciclo de vida da moda e dos movimentos de adoção de estilos diferenciados é fundamental para o desenho das estratégias mercadológicas e de comunicação, pois visa determinar a duração de uma tendência e prever a introdução de novos estilos. O fenômeno da moda está fundamentado na introdução de novos produtos e na difusão da inovação. As inovações na moda podem se classificar em dois aspectos: inovação simbólica, quando possui um novo significado social; e tecnológica, quando determina uma dimensão tangível do que se apresenta como novo para a categoria do produto. 146_


É notório o papel dos líderes de opinião para o desenvolvimento da moda. O líder de opinião é alguém com envolvimento e energia para envolver-se e participar ativamente sobre as questões levantadas pelo tema que o seduz. O consumidor que é líder de opinião se envolve mais com produtos que despertem suas necessidades, valores e interesses pessoais, ou seja, que sejam reflexo de seu estilo de vida. As teorias de adoção de moda preveem toda uma lógica relacionada ao reconhecimento de liderança de opinião para sua difusão: 1. A teoria do trickle down theory prevê a existência de uma elite de adoção da moda. Alguns teóricos veem essa teoria como um conflito de classes e uma competição de classes por símbolos (a moda sendo usada pela elite para demarcá-los da não elite). Já Sproles3 apud Miranda e Garcia (2007) observa que os inovadores, seguidores e participantes são parte do processo coletivo que responde pelas mudanças em gosto e sensibilidade. Nesse caso, os objetos estariam a serviço da mobilidade social, sendo o que motivaria seu uso seria o seu valor de uso (LIPOVETSKY, 1989), visando ao posicionamento social que a posse do objeto simbolizaria. 2. A trickle across theory sustenta que a velocidade de adoção de uma nova tendência de moda varia entre grupos pertencentes ao mesmo estrato social. De acordo com Souza4 apud Miranda e Garcia (2007), o líder de opinião de um grupo de pares torna-se importante, e o movimento de adoção pode até sugerir uma lógica geográfica. A moda implica assim uma imposição de grupo e depende de uma aprovação social coletiva. 3. A trickle up theory defende a hipótese de que novas tendências de moda podem surgir por hábitos de grupos pertencentes às classes mais desprivilegiadas da camada social. Essa liderança estaria ligada à capacidade de criar diferentes estilos pelas subculturas ou grupos subculturais (adolescentes, esportistas, músicos) que estabelecem algum tipo de liderança relacionada a inventar e criar diferentes estilos que influenciam o mercado de massa. Existe a possibilidade de consenso entre o gosto individual e a pressão do coletivo. É importante para o homem, através da informação, conhecer a diversidade de elementos que interagem em determinado contexto, movido por sua atenção, preocupação e/ou interesse. Segundo Foina (2001, p. 27):

3

- SPROLES, G.B. Analyzing fashion life cycles: principles and perspectives. Journal of Marketing, v. 45, Fall, 1981.

4

- SOUZA, Gilda M. O espírito das roupas. São Paulo: Cia. das Letras, 1987.

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O desenvolvimento de instrumentos apoiados na tecnologia da informação (telefone, fax, correio eletrônico, computadores, etc.) promove significativo aumento da produtividade gerencial, permitindo que as informações sejam coletadas com qualidade (precisão e velocidade) e as diretrizes disseminadas com exatidão e com o concurso de poucos níveis intermediários entre o principal executivo da empresa e os funcionários que efetivamente executam tarefas produtivas.

De acordo com Ronchi (1977), para um sistema de informações ser eficiente, alguns elementos precisam estar evidenciados, tais como: a significância das informações, a rapidez com que as informações fluem e as características dos processos de decisão (periodicidade e grau de análise das decisões). Entretanto, as fontes, utilização e acesso a esse sistema pelas empresas tornam-se fatores preponderantes para o sucesso no ambiente competitivo, seja este local, regional ou global, pois o eficaz gerenciamento da informação vai depender das respectivas fontes, formas e usos nos níveis estratégico, tático e operacional. A informação, outrossim, precisa fluir de maneira satisfatória dentro da empresa, e seu acesso precisa ser democratizado e compartilhado, proporcionando suporte ao processo decisório, bem como ao desenvolvimento de estratégias, processos, estruturas e cultura organizacionais de uma empresa, aumentando o seu valor no ambiente concorrencial. Dessa forma, a busca por mecanismos que auxiliem os profissionais a definir a melhor maneira de obter e processar as informações é importante para a competitividade empresarial. Para uma empresa, não são somente as informações operacionais internas que precisam ser controladas e coletadas, e sim, também importante, que ela colete, controle e analise informações externas com o seu negócio, pois, de acordo com Batista (2004, p. 21): (...) a maneira de uma empresa tornar-se cada vez mais competitiva é possuir uma vasta gama de informações de todas as interações de seus subsistemas internos e sistemas externos para aumentar a capacidade de resposta às tormentas do ambiente em que se encontra.

A informação funciona como alavanca no processo de inovação. Por inovações, Schumpeter (1985) entende cinco categorias: a fabricação de um novo bem, a introdução de um novo método de produção, a abertura de um 148_


novo mercado, a conquista de uma nova fonte de matéria-prima e a implantação de uma nova forma de organização econômica da produção e do trabalho. Para Barquero (2001, p. 20 e 21): (…) os processos de difusão das inovações e do conhecimento estão condicionados pelo entorno (sistemas de empresas, instituições, atores econômicos e sociais) no qual as empresas tomam suas decisões de investimento. Elas investem em tecnologia e conhecimento, a fim de melhorar sua rentabilidade e posicionamento competitivo, ainda que suas necessidades e reações estejam determinadas pelo contexto no qual realizam sua atividade produtiva. Dessa forma, os resultados dependem da atuação dos competidores, do tipo de relações mantidas com o entorno e do caráter inovador ou não deste último a introdução de inovações que – são sempre um resultado coletivo da cooperação tácita entre as empresas – leva ao aumento da produtividade e da competitividade das economias locais.

2. Consumo e comportamento Segundo Boone e Kurtz (1998), o ponto de partida para decisão de compra é o reconhecimento de uma necessidade sentida. Uma necessidade é um desequilíbrio entre o estado real do consumidor e o estado desejado. Motivações são estados internos que conduzem uma pessoa em direção à meta de satisfazer uma necessidade sentida. Conhecida internacionalmente, a teoria desenvolvida por Maslow diz que as necessidades humanas podem ser categorizadas e ordenadas em uma hierarquia, a chamada “hierarquia das necessidades”. A hierarquia contém cinco níveis e começa com as necessidades fisiológicas das pessoas, seguida por necessidades de segurança, de aceitação social, autoestima e, por fim, de autorrealização. “Se certas necessidades são incontroláveis, repetitivas e vitais, e outras mais subjetivas, mais instáveis, mais racionais, os desejos dependem do domínio do irracional, do sonho e das fantasias” (ALLÉRÈS, 2006, p. 35). Enquanto as necessidades objetivas têm um limite (ALLÉRÈS, 2006), o campo dos desejos é ilimitado. O desejo é a expressão das necessidades e, sem ele, essas não podem ser nem procuradas, nem satisfeitas. Necessidades e desejos são duas entidades necessárias para a passagem para o ato de consumo; uma pertence ao campo do real, das necessidades, e a outra, ao campo do imaginário e dos símbolos. _ 149


Tudo o que concorre para a apresentação pessoal, para a simulação ou os simulacros, para o investimento em beleza traduz necessidades e desejos imutáveis, materializados por objetos portadores de mitos e símbolos, carregados de códigos de reconhecimento e signos de distinção (ALLÉRÈS, 2006, p. 37).

O estudo sobre o comportamento dos consumidores é essencial para o sistema da moda, pois parte de sua estrutura é baseada na aceitação do público, dos compradores e deveria ser o início e o fim deste processo. Este princípio é o estudo das necessidades, dos desejos e gostos dos consumidores, de modo que as empresa têxteis e de vestuário possam fabricar os seus produtos de acordo com essas necessidades. É por meio de dados e informações sobre estilo de vida dos consumidores que serão interpretados e investigados seus desejos, havendo um estudo do mercado e de outras disciplinas como marketing, sociologia e antropologia ( JOBIM e NEVES, 2008, p. 241).

O conhecimento detalhado do perfil dos clientes aumenta a competitividade das empresas: a avaliação de seu estilo de vida, suas características de consumo, suas expectativas e opiniões sobre os produtos e/ou serviços. As pesquisas que orientam a constituição dos perfis de consumidores são imprescindíveis para a criação de estratégias direcionadas, para o estreitamento das relações consumidor/empresa e principalmente para o desenvolvimento de ferramentas de fidelização do cliente. Para obter este perfil, as técnicas de pesquisa sobre o comportamento do consumidor estão mudando continuamente e constituem um novo e extenso campo de pesquisa. Para Engel et al. (1995), o comportamento do consumidor relaciona-se com as atividades diretamente envolvidas em obter, consumir e dispor de produtos e serviços, e incluem os processos decisórios que antecedem e sucedem estas ações. Uma vez conhecido o perfil e o comportamento do consumidor, torna-se facilitada a tarefa de estabelecer relações harmoniosas e de valor com os mesmos. Durante e depois do consumo e da utilização de um produto ou serviço, os consumidores desenvolvem sentimentos de satisfação ou insatisfação. A satisfação do consumidor é a atitude referente a um produto ou serviço após sua compra e uso. É o julgamento de avaliação pós-escolha que resulta de uma seleção de compra específica e da experiência de usá-la ou consumi-la. Partindo de uma

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perspectiva gerencial, manter ou intensificar a satisfação do cliente é essencial. (...) clientes satisfeitos influenciam positivamente os fluxos de caixa futuro. Assim, os programas de aumento de satisfação do cliente devem ser tratados como investimentos (MOWEN e MINOR, 2003, p. 221).

Por viverem em um ambiente complexo, em constante modificação e relacionando-se com diferentes pessoas, os consumidores podem vir a sofrer influência de diversos fatores que acabam afetando seu processo de tomada de decisão de compra. Visto isso, as influências ambientais sobre os consumidores devem ser levadas em consideração na realização de qualquer estudo ou pesquisa sobre o comportamento do consumidor. Solomon (2002) coloca que as escolhas de consumo refletem um “lugar” na sociedade. O autor afirma que os produtos e serviços que as pessoas compram muitas vezes têm por objetivo mostrar a outras qual a sua posição social – ou qual gostariam que fosse. Os produtos servem também como marcadores de classe social e são comprados e exibidos como símbolos de status. A escolha de cada traje (ALLÉRÉS, 2006) traduz um campo muito amplo de desejos como: mudanças no modo de vida (passagem da vida de estudante à vida de profissional), mudança de classe social (ascensão profissional, mudança de bairro, de cidade, de país), gosto pela moda (desejo de se ajustar, de imitar, de parecer), desejos de se identificar ou criar um personagem. O status conferido pela adoção de dada moda (GARCIA E MIRANDA, 2007) parece ser o benefício mais evidente a ser adquirido com o produto. Ressalta-se que status não é uma referência exclusiva de abastança financeira: basta que o indivíduo possua algo que seu grupo de referência gostaria de ter para que esse algo se transforme em símbolo de status. Como fontes (SCHIFFMAN E KANUK, 1997, p. 354) informais de comunicação, os formadores de opinião são extraordinariamente eficientes em influenciar consumidores nas suas decisões relacionadas a produtos e devem ser considerados para a formação de estratégias de marketing. Dentre as razões para a efetividade dessa influência está a credibilidade que o influenciador tem sobre o influenciado, visto que os formadores de opinião geralmente baseiam seus comentários em experiências de primeira mão, o que reduz para os receptores o risco percebido ou a ansiedade inerente à compra de um produto novo.

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Para Kotler e Armstrong (2006, p. 47), o mix de marketing pode ser definido como um conjunto de ferramentas de marketing, táticas e controláveis, que a empresa utiliza para produzir a resposta que deseja no mercadoalvo. Consiste em tudo que a empresa pode fazer para influenciar a demanda de seu produto. Para Neves (2005, p. 25): O planejamento deve ser orientado para o mercado, ou seja, devese saber em que extensão o foco no consumidor está impregnado em toda a organização, ter comprometimento com a entrega de valor, identificação e desenvolvimento de competências distintas, formação de parcerias estratégicas, desenvolvimento de fortes relações com importantes consumidores estratégicos, ênfase em segmentação de mercado, seleção de mercado-alvo e posicionamento, uso de informação sobre o consumidor como um bem estratégico, foco nos benefícios e serviços para o consumidor, melhoramento e inovação contínua, definição de qualidade baseada nas expectativas dos clientes e comprometimento em obter a melhor informação tecnológica disponível.

Um segmento de mercado de varejo é formado por um grupo de clientes, cujas necessidades são satisfeitas por meio do mesmo composto de varejo, porque possuem necessidades e desejos semelhantes e passam por processos de compra similares. Os varejistas são, ao mesmo tempo, consumidores e fornecedores na cadeia de distribuição. Comercializam produtos para os consumidores e, concomitantemente, são consumidores dos atacadistas e fabricantes. Se, no passado, a maioria das lojas mantinha o foco em um tipo específico de produto, os lojistas atualmente têm agrupado os produtos oferecidos seguindo os estilos de vida.

3. Procedimentos metodológicos A pesquisa foi realizada com a aplicação de questionários quantitativos nos shoppings centers Iguatemi, Praia de Belas, Moinhos, Total e Lindóia, de Porto Alegre/RS, nos meses de julho e agosto de 2008, com lojas varejistas multimarcas e marcas locais de vestuário feminino. Foram respondidos 77 questionários de uma amostra total de 109 lojas com o perfil desejado, com

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a seguinte distribuição, conforme figura 1. Os 22 questionários restantes se referem à negativa dos funcionários e/ou proprietários em respondê-los. Shoppings Frequency

Valid

Percent

Valid Percent

Cumulative Percent

Iguatemi

18

23,4

23,4

23,4

Praia de Belas

10

13,0

13,0

36,4

Moinhos

9

11,7

11,7

48,1

Lindóia

2

2,6

2,6

50,6

Total

38

49,4

49,4

100,0

Total

77

100,0

100,0

Figura 1: Distribuição da amostra pesquisada Fonte: Pesquisa 3.1 Informações sobre a amostra A amostra demonstra que 70% dos respondentes do questionário eram os compradores das lojas pesquisadas. Constatou-se que 61,1% dos pesquisados possuem ensino médio, e 31,2%, ensino superior, com uma renda média de até R$ 2.000,00. Segundo os respondentes, a idade percebida dos consumidores está situada entre 26 e 49 anos (66%), sendo 47% pertencentes à classe B. Quanto à percepção do estilo de vida dos clientes, os respondentes afirmaram que a maioria deles (41%) é considerado como tradicional nas suas escolhas de moda. Percebe-se um movimento no sentido da inovação, pois 28% desses clientes foram identificados como inovadores. De acordo com a coleta das informações, nota-se um equilíbrio entre atendimento, produtos atualizados, preço e qualidade, refletindo o perfil tradicional, percebido pelos entrevistados. 3.2 Informações sobre coleta e difusão das informações A pesquisa apontou que 94,8% dos respondentes relatam a existência de pessoas, dentro das lojas, responsáveis pela busca de informações de moda. De acordo com os pesquisados, a busca das informações de moda está concentrada nos proprietários das empresas (62,6%), enquanto que compra-

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dores e profissionais especializados correspondem a 10% da amostra. Quanto à área de formação desse profissional, constatou-se que 46,5% não são provenientes de áreas ligadas diretamente à moda, à gestão ou ao marketing, e apenas 18,3% têm alguma formação superior na área da moda. No processo de busca de informações, percebe-se uma grande diversidade de fontes, destacando-se a Internet, com 17,5%, e a mídia impressa especializada, com 8,5%. Nota-se, ainda, uma influência da informação proveniente da indústria, através de representantes e catálogos (28%), conforme demonstra a figura 2.

Figura 2: Processo de busca de informações Fonte: Pesquisa A pesquisa constatou que 71,4% dos lojistas possuem processo interno de difusão de informações de tendência de moda. Esse processo é difundido, principalmente, pela indústria, através de catálogos com 29,3%, e os representantes com 15,5%. Apenas 19,8% da difusão interna de informações é realizada por profissionais especializados. 154_


4. Considerações gerais A pesquisa foi submetida e autorizada pela administração de todos os shoppings centers entrevistados e foram obedecidas as normas estabelecidas quanto a datas e horários. O pouco entendimento dos profissionais do comércio em relação às pesquisas acadêmicas na área de moda e consumo estabeleceu, em um primeiro momento, um impasse na aplicação dos questionários, o que dificultou o recolhimento dos dados. A diferença entre o universo estabelecido e a amostra pesquisada indica que existe uma lacuna no comércio varejista dos shoppings centers avaliados, no que diz respeito a um melhor entendimento de informações pertinentes à própria administração do seu negócio. Isso demonstra a pouca profissionalização deste ramo de atividade e que existem oportunidades para capacitação dessas pessoas pelas instituições de ensino. A pesquisa realizada mostra que mais de 46% das pessoas diretamente ligadas ao comércio de moda não possuem capacitação nas áreas de moda, gestão e/ou marketing. Essa é uma possibilidade de atuação que pode ser realizada nos mais variados níveis da educação profissional. Apenas 23,9% dos entrevistados que estão atuando na gestão da informação de moda realizaram curso superior nas áreas descritas. A pesquisa constatou que o comércio varejista dos shoppings centers pesquisados demonstra uma tendência em ser um seguidor das informações de moda distribuídas pela indústria, tanto na busca quanto na distribuição interna aos seus vendedores. A indústria, por meio de catálogos e de seus representantes comerciais (38% das indicações de busca e 44,8% na distribuição), induz o comércio a ser apenas um repetidor de informações. Sugere-se uma maior parceria entre as áreas do comércio e indústria na questão do estabelecimento de relações e fidelização do seu cliente final, por meio dos serviços prestados e, dentro deste processo, acionando de forma mais efetiva os profissionais que atuam diretamente com a moda, como o vendedor, o comprador, o empresário e o próprio estilista, potencializando o aumento das vendas em toda a cadeia da moda.

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O USO DOS SISTEMAS DE INFORMAÇÃO GEOGRÁFICA NO MANEJO DAS ÁREAS DE PRESERVAÇÃO AMBIENTAL DO DISTRITO INDUSTRIAL DE RIO GRANDE, RS, BRASIL THE USE OF GEOGRAPHIC INFORMATION SYSTEMS IN THE MANAGEMENT OF ENVIRONMENTAL PRESERVATION AREAS OF THE RIO GRANDE INDUSTRIAL DISTRICT, RS, BRAZIL *

Tatiana S. da Silva* Milton L. Asmus**

- Prof.ª Dr.ª do Colégio Técnico Industrial, FURG, pesquisadora associada do Laboratório de Gerenciamento Costeiro, Instituto de Oceanografia, FURG, Av. Itália, km8, Campus Carreiros, e-mail: doctss@furg.br

**

Resumo

- Prof. Dr. do Instituto de Oceanografia, Laboratório de Gerenciamento Costeiro, FURG, Av. Itália, km8, Campus Carreiros, e-mail: docasmus@furg.br

Os sistemas de informação geográfica (SIGs) permitem que os usuários explorem possíveis relações espaciais entre dados e montem cenários de acordo com seus interesses. Durante a elaboração do Plano de Manejo das Áreas de Preservação (APs) do Distrito Industrial de Rio Grande, oito camadas de dados foram inseridas em um SIG e usadas na caracterização e avaliação espacial, além de auxiliar na tomada de decisões de manejo. A utilidade do SIG nesse caso é demonstrada, entre outros, pela possibilidade de corrigir delimitações espaciais errôneas ou inadequadas das APs, incluindo a redução de determinadas APs com compensação em outros locais, mais vantajosos sob o ponto de vista ambiental e da administração do setor industrial, o que só é possível através de procedimentos baseados na sobreposição de dados espaciais que o SIG oferece. A utilização do SIG no presente trabalho se mostrou de especial ajuda como interlocutor entre pesquisadores, industriais e a agência ambiental em nível estadual, responsável pelo licenciamento ambiental do Distrito Industrial.

P a l a v r a s - C h a v e : Sistemas de Informação Geográfica, Manejo Ambiental Participativo, Distrito Industrial. _ 159


Abstract The Geographic Information Systems (GIS) allow users to explore possible spatial relationships between data, and create scenarios according to their interests. During the elaboration of the Management Plan of Preservation Areas (PAs) of the Rio Grande Industrial District, eight data layers were inserted in on GIS and used in the characterization and spatial assessment as well as in helping management decision making. The usefulness of GIS in this case is demonstrated, besides others factors, by the possibility of correcting erroneous or inadequate spatial limits of PAs. This includes the reduction of certain PAs, to be compensated in some other areas, more advantageous under the environmental and industrial administration point of view, which is only possible through GIS-based procedures of overlaying spatial data. The use of GIS in this study was of particular help as an intermediary between researchers, industrialists, and the state environmental agency, which is responsible for the environmental licensing of the Industrial District.

K e y w o r d s : Geographic Information Systems, Participatory Environmental Management, Industrial District.

1. Introdução O Distrito Industrial de Rio Grande (DIRG), RS, caracteriza-se como um espaço especial, destinado a abrigar atividades industriais variadas e que vem experimentando nos últimos anos um aporte crescente de novas indústrias e a ação de outras empresas predominantemente relacionadas com as oportunidades de negócios e produção vinculadas com o Porto de Rio Grande. As condições estuarinas do porto, bem como sua localização geográfica, sendo o porto brasileiro mais próximo dos países do Mercosul, colocam-no em uma posição altamente favorável no contexto geopolítico nacional (TAGLIANI et al., 2003). O papel da região como centralizadora e articuladora da economia resultou, recentemente, na criação de um Polo Naval e continua a atrair novos investimentos em projetos de desenvolvimento. O DIRG possui como responsável administrativo a Secretaria Estadual do Desenvolvimento e dos Assuntos In160_


ternacionais do Estado do Rio Grande do Sul, responsável pela sua gestão e por conduzir o desenvolvimento econômico e ambiental do distrito. Legalmente, o Distrito Industrial de Rio Grande, por suas características operacionais, é uma entidade que necessita atuar respaldada por um Licenciamento Ambiental, nesse caso outorgado pelo órgão de controle ambiental do Estado – a Fundação Estadual de Proteção Ambiental (FEPAM). O processo para a obtenção do licenciamento ambiental para o DIRG iniciou-se há alguns anos e enfrentou uma série de exigências e recomendações por parte da FEPAM, dentre as quais, a elaboração de um Plano de Manejo Ambiental Integrado para as Áreas de Preservação Permanentes (APs) do DIRG. A existência de um plano de manejo para as APs deve estabelecer as ações necessárias para manter suas condições desejáveis, tentar remediar condições inapropriadas relacionadas com o seu uso ou o uso de áreas de seu entorno, ou prevenir que futuras atividades no DIRG venham a causar qualquer dano a essas áreas de preservação ambiental. Com base na demanda acima comentada, o Governo do Estado do Rio Grande do Sul, através da Secretaria do Desenvolvimento e dos Assuntos Internacionais (SEDAI), contratou a Universidade Federal do Rio Grande para a elaboração de uma proposta de um plano de manejo integrado para as áreas de preservação permanente (APs) do Distrito Industrial de Rio Grande. Para a elaboração de tal proposta, tecnologias da informação, como os sistemas de informação geográfica (SIG) e o sensoriamento remoto, foram utilizadas na criação de uma base de dados necessária para gerar alternativas locacionais em curto prazo, em vista do processo de licenciamento do DIRG, e tornar o manejo futuro de tais áreas mais eficiente e adequado sob o ponto de vista empreendedor e ecológico. O uso da tecnologia SIG no manejo de recursos naturais tem expandido rapidamente: é a ferramenta preferida para a análise de dados espaciais para vastas paisagens e é, tipicamente, o meio de apresentação para levar dados científicos na escala da paisagem para todos os tipos de audiência (DUNCAN & LACH, 2006). O uso do SIG neste trabalho possibilitou não somente a caracterização e avaliação ambiental, em grande parte dependente do caráter espacial das feições/componentes do sistema, mas serviu como interlocutor entre pesquisadores e industriais. A possibilidade de sobrepor e espacializar interesses ambientais e de novos loteamentos industriais gerou diferentes alternativas para a solução de conflitos _ 161


de ocupação do terreno, atuando de forma positiva no processo de tomada de decisão acerca das APs e seus entornos. Assim, o presente trabalho tem por objetivo avaliar o papel do uso das geotecnologias no processo de construção do plano de manejo integrado para as áreas de preservação permanente (APs) do Distrito Industrial de Rio Grande.

2. Descrição da área de estudo O Distrito Industrial de Rio Grande (DIRG) está localizado na zona estuarina da Lagoa dos Patos e abrange uma área de aproximadamente 25 Km2. As áreas de preservação permanente do distrito foram criadas com o intuito de resguardar as estruturas e funções ecológicas a elas associadas, têm forma e tamanhos variados, totalizando sete áreas distintas ao longo do DIRG. Essas áreas abrigam diferentes ecossistemas que incluem ambientes de marismas, bosque de figueiras, campos, matas de restinga, entre outros, sendo que nem sempre as inicialmente denominadas áreas de preservação permanente do DIRG correspondem a áreas de preservação permanente como previsto na legislação ambiental em nível federal (CONAMA, 2002). Em virtude desse fato, o plano de manejo proposto, seguindo as recomendações do órgão ambiental estadual – FEPAM, sugere a modificação na denominação dessas áreas para “áreas de preservação” (APs), evitando possíveis confusões com as áreas de preservação permanente previstas na legislação federal (APPs). A Figura 1 mostra a localização do DIRG e suas APs, bem como as áreas de preservação permanente previstas pela legislação federal. A seguir, a caracterização resumida das APs do DIRG: AP 1 – campos com ocorrência de banhados, compreende cerca de 77 ha. AP 2 – campos com ocorrência de banhados, compreende cerca de 41 ha. AP 3 – mata de figueiras, compreende cerca de 10 ha. AP 4 – campos e banhados, compreende cerca de 190 ha. AP 5 – campos e banhados, compreende cerca de 147 ha. AP 6 – campos e banhados com ocorrência de matas, compreende cerca de 75 ha. AP 7 – banhados com ocorrência de campos, compreende cerca de 92 ha.

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Figura 1. Localização do Distrito Industrial de Rio Grande e das APs e APPs.

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3. Material e métodos 3.1. Dados de sensoriamento remoto, mapas temáticos e software Os dados ambientais e de infraestrutura básicos necessários para a elaboração do plano de manejo das APs foram inseridos no sistema de informações geográficas Idrisi. Dados analógicos, que incluem a delimitação das áreas pertencentes às APs, bem como os limites do DIRG, o Plano Diretor Municipal, a rede de transmissão de energia elétrica e o sistema viário, foram digitalizados em tela e georreferenciados, com um erro de localização médio inferior a 10m. Foram utilizados nessa etapa plantas fornecidas pela SEDAI, cartas topográficas na escala de 1:50.000 e outros mapas disponíveis na prefeitura do município e na própria universidade. Os dados de unidades geoambientais existentes na região foram fornecidos pelo trabalho de Tagliani (1997). Outras informações no formato digital incluem imagens Landsat ETM+ de 12/11/2002 (USGS, 2002), que auxiliaram na correção dos limites das APs bem como na identificação dos principais ambientes presentes na área. Imagens do Suttle Radar Topographic Mission (USGS, 2000), que fornecem dados de altitude, também foram utilizadas e auxiliaram na detecção de áreas com maior potencial de alagamento (delimitação de banhados) e de áreas propícias para o desenvolvimento de Petunia heterophilla, uma espécie que, devido à sua suposta distribuição e caráter edáfico, fez com que o limite de uma das APs do distrito industrial fosse no passado ampliado, como descrito a seguir. Todos os dados encontram-se disponíveis tanto no formato vetorial quanto raster, sendo que a base raster mantém uma resolução espacial de 15m. Se, por um lado, a base raster permitiu o cálculo de áreas e distâncias, a álgebra com mapas e outros procedimentos com imagens, a base vetorial facilitou a comunicação com a SEDAI, constituída em grande parte por engenheiros usuários de Computer Aided Design softwares (CAD). Todos os dados estão no sistema de referência Universal Transversa de Mercator (UTM-22s), datum WGS 84. Tanto os procedimentos de mapeamento quanto os relacionados à caracterização e distribuição de petúnias na área de estudo foram complementados por saídas de campo.

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3.2. Procedimentos analíticos Os dados ambientais e de infraestrutura, bem como o Plano Diretor Municipal, foram sobrepostos a fim de evidenciar possíveis conflitos em termos espaciais relacionados às APs do distrito. Para tanto, ferramentas como a álgebra com mapas, a modelagem lógica e a tabulação cruzada foram utilizadas. O cálculo de áreas foi de especial importância, uma vez que permitiu quantificar as porções do território que apresentavam problemas ou mesmo na simples caracterização dos ambientes. Tais procedimentos também foram utilizados para mapear as áreas adequadas ao crescimento de petúnias (solos secos, arenosos e com baixa cobertura vegetal) e gerar alternativas de utilização do território (loteamentos industriais, redefinição espacial de APs).

4. Resultados e discussão 4.1. Análise espacial das APs A fotointerpretação das imagens Landsat, juntamente com os dados do SRTM e o mapa de unidades geoambientais, permitiu o mapeamento (digitalização) dos principais ambientes e uso do solo do distrito. Os atributos geológicos e geomorfológicos da área em questão, quando considerados em conjunto, estabelecem a natureza da vegetação, das comunidades faunísticas e das complexas interações do meio biótico e abiótico, por meio das quais os ecossistemas mantêm sua funcionalidade em um equilíbrio dinâmico (TAGLIANI, op. cit.). A área de estudo apresenta os seguintes ambientes e usos: arroios, banhados, marismas, matas de figueiras, matas nativas, florestamentos de eucalipto, áreas construídas, estradas e campos com uso pela pecuária (Figura 2). Desses, os banhados, marismas, matas de figueiras e matas nativas constituem áreas de preservação permanente segundo a legislação federal, nem sempre sobrepostas às áreas de preservação do distrito (Figura 1).

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Figura 2. Cobertura e uso do solo no DI. A tabulação cruzada entre o mapa de vegetação e uso do solo e as APs mostra alguns problemas na delimitação espacial dessas últimas. A AP 3, segundo as plantas da SEDAI, está localizada em área vizinha a uma mata de figueiras (na Figura 1, a APP ao lado da AP 3 corresponde a essa mata). Supôs-se que o objetivo da AP 3 era proteger essas figueiras e foi apresentada à SEDAI essa divergência, mais tarde confirmada por seus técnicos em ava166_


liação em campo com GPS. A correção na delimitação espacial da AP 3 nos documentos oficiais, então, é uma das recomendações do plano. 4.2. Ocorrência e distribuição do gênero Petunia em Rio Grande: verdade de campo A área de preservação permanente 7 do DIRG foi originalmente limitada como uma faixa contígua ao Saco da Mangueira com uma largura de 150 metros a partir da margem desta enseada estuarina. Essa demarcação como AP estaria de acordo com a legislação ambiental que protege as margens de corpos d’água como o Saco da Mangueira, além de preservar um ambiente de marisma de indiscutível importância ecológica. No entanto, após um estudo sobre a ocorrência de Petunia heterophilla na AP 7 por parte da Fundação Zoobotânica do Rio Grande do Sul (Parecer N° 02/94 – NVSI/MCN de 06 de outubro de 1994), em que uma alteração na faixa de preservação da AP 7 de 150 para 300 metros era sugerida, essa alteração foi levada a cabo, definindo os novos limites da AP. Em correspondência datada de 11 de maio de 2002 da FEPAM para a Secretaria do Desenvolvimento e dos Assuntos Internacionais, após reconsideração do parecer supracitado e de um laudo técnico produzido sobre o tema (outubro de 2000), a FEPAM reafirmou a delimitação da AP 7 em 300 metros da margem. Tal alargamento da AP 7, no entanto, trouxe conflitos sérios com os interesses industriais, por se tratar de uma área nobre para a atividade. Somado a esse fato, existiam muitas dúvidas sobre o significado da ocorrência de petúnias nesta APP, o que levou à verificação em campo da ocorrência e distribuição do gênero Petunia, como segue. No município de Rio Grande, segundo o Herbário da FURG e observações de campo realizadas entre janeiro e março de 2005, foram registradas as ocorrências das seguintes espécies do gênero Petunia (Família Solanaceae): Petunia caesia Sendt, Petunia integrifolia (Hook) Schinz & Thellung, Petunia linearis (Hook) Paxton, Petunia ericifolia R.E. Fries, Petunia violacea Lindley e Petunia heterophylla Sendt. Das espécies de Petunia existentes no Estado, consta que somente a espécie Petunia exserta J.R. Stehmann aparece na Lista de Espécies Ameaçadas da Flora do Rio Grande do Sul (1998), publicada pela Sociedade Botânica do Brasil – Seção Regional do RS. A mesma espécie aparece como a única espécie de Petunia ameaçada (EN – em perigo) _ 167


na listagem da SEMA (2002). Entretanto, esta espécie não ocorre no município de Rio Grande. Dentre as espécies citadas para o município de Rio Grande, Petunia integrifolia e Petunia heterophylla foram as mais frequentes. Essas espécies ocorrem preferencialmente em locais arenosos secos e com baixa cobertura vegetal. Apresentam uma ampla distribuição geográfica sendo encontradas não só no Sul do Brasil, mas também no Uruguai e Nordeste da Argentina. A Petunia heterophylla, em específico, foi observada em vários outros locais além da Área de Preservação Permanente 7 (AP 7), como mostra a Figura 3.

Figura 3. Ocorrência de Petunia heterophylla na área de estudo e arredores. Outro problema na delimitação espacial concerne à AP 7: o alargamento dessa área para 300 metros em função da ocorrência de petúnias criou um conflito muito grave com os industriais por conter a porção mais nobre do distrito para novos loteamentos. A observação das petúnias em campo, com a respectiva localização geográfica com GPS, respaldada pela pesquisa documental, trouxe informações importantes para lidar com esse problema: (1) a Petunia heterophylla é abundante em várias localidades do município de Rio Grande, sendo que sua ocorrência não é, de forma alguma, restrita à área da AP 7; (2) não há indícios de que Petunia heterophylla esteja sofrendo ameaça de extinção ou mesmo de diminuição significativa em sua ocorrência na região; e (3) as condições ambientais na área da AP 7 não são na sua maioria ideais para a ocorrência de Petunia heterophylla (grosso modo, apenas um terço da área possui condições favoráveis ao seu estabelecimento). 168_


Além disso, a faixa de marismas que se encontra nessa AP é muito estreita. Sendo assim, com base nesses dados, foi recomendado um ajuste do limite da AP 7 de 300 para 150 metros a partir da margem, faixa suficientemente larga para abrigar as marismas (como mostra o SIG) sem que a ecologia de Petunia heterophylla seja ameaçada na região de Rio Grande. Entretanto, o órgão ambiental estadual (FEPAM) não autorizou a redução no total das áreas de preservação, mas aceitou que fosse indicada uma nova área, de igual dimensão da área a ser reduzida na AP 7 (aproximadamente 83 ha), em outro local, desde que adequado ao desenvolvimento de petúnias e ao mesmo tempo não conflitasse com os interesses dos industriais. Assim, com base nas imagens SRTM e Landsat e no parecer do especialista em botânica, foram apontadas quatro diferentes alternativas, sendo que aquela que melhor convinha à SEDAI foi recomendada à FEPAM como compensação pela redução da AP 7, que aprovou a proposta.

Conclusão Mesmo antes do advento das tecnologias de informação espacial, a importância da representação de feições de diversos temas na forma de mapas, para o seu melhor entendimento e do contexto onde estão inseridas, já era vastamente reconhecida. Um mapa fala atravessando barreiras de linguagem (ROBINSON & PETCHENIK, 1976). As novas possibilidades de manipulação de dados espaciais, modelagem e geração de cenários, trazidas pelo SIG, levam o uso dos “mapas” (agora entendidos como imagens ou arquivos de vetores) a um outro patamar em termos de utilidade na caracterização do espaço e na solução de problemas e conflitos. Os procedimentos tradicionalmente aceitos de produção de mapas mudaram suficientemente para levar a uma revisão da maneira com que pensamos sobre, aprendemos com e usamos mapas, especialmente no processo de envolvimento público no manejo de recursos naturais. O uso do SIG, como ferramenta de auxílio ao manejo das áreas de preservação do Distrito Industrial de Rio Grande, possibilitou a obtenção e análise de informações em velocidade adequada à demanda do licenciamento ambiental e compatibilizou interesses tão divergentes quanto o ambiental e o industrial. O SIG, neste caso, tem um papel que vai muito além da simples apresentação de resultados. Ele permitiu o _ 169


estabelecimento de uma base de dados espaciais, facilitando a criação e o manejo de mapas temáticos e de seus atributos associados. Ainda, o SIG atuou como interlocutor entre os setores industrial, científico e gestor, envolvidos em um problema comum a todos, sobre o qual tinham diferentes interpretações e interesses. Assim, o uso participativo do SIG tornou-se estratégico na orientação do planejamento ambiental e na geração de alternativas em vistas à melhor utilização do território nesse espaço.

Referências BAPTISTA, L.R.M. & LONGHI-WAGNER, H.M. (coord.). Lista preliminar de espécies ameaçadas da flora do Rio Grande do Sul. Sociedade Botânica do Brasil, Porto Alegre. 1998. CONAMA. Resolução CONAMA n.º. 303, de 20 de março de 2002 – Dispõe sobre Área de Preservação Permanente. Publicada no DOU n.º 90, de 13 de maio de 2002, Seção 1, página 68. 2002. ROBINSON, A. H. & PETCHENIK, B.B. The nature of maps. University of Chicago Press, Chicago, IL. 1976. SEMA. 2002. Lista de espécies da flora ameaçadas de extinção no RS. Disponível em http://www. sema.rs.gov.br/sema/html/especextrs1.htm. Secretaria do Meio Ambiente do Estado do Rio Grande do Sul. Acesso em: 15 out. 2005. TAGLIANI, C.R.A. (1997). Proposta para o manejo da exploração de areia no município costeiro de Rio Grande – RS, dentro de um enfoque sistêmico. Tese de mestrado – UNISINOS. São Leopoldo. 158 p. 1997. TAGLIANI, P.R.T., LANDAZURIB, H., REIS, E.G., TAGLIANI, C.R., ASMUS, M.L., SÁNCHEZ-ARCILLA, A. Integrated coastal zone management in the Patos Lagoon estuary: perspectives in context of developing country. Ocean and Coastal Management. v. 46, p. 807-822. 2003. U.S. Geological Survey. 2002. Landsat ETM+, Cena 221_082 de 12/11/2002, WRS-2, Nível Ortorretificada, Sioux Falls, South Dakota: USGS. U.S. Geological Survey. 2000. SRTM, Cena 221_082 de 2000, WRS-2, 3arcsec, Nível não-finalizada, College Park, Maryland: The Global Land Cover Facility.

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RESENHA

A IDENTIDADE CULTURAL NA

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- HALL, Stuart. A identidade cultural na pós-modernidade. Traduzido por Tomaz Tadeu da Silva, Guaracira Lopes Louro. 9. ed. Rio de Janeiro: DP&A, 2004. 104 p. Tradução de: The question of cultural identity.

PÓS-MODERNIDADE1 *

Sabrina Hax Duro Rosa*

- Formada em Letras – habilitação Português e Inglês e mestre em Linguística Aplicada pela UCPel, professora do curso de Graduação em Análise e Desenvolvimento de Sistemas da FATEC Pelotas. sabrinadrosa@ hotmail.com

A temática do livro A identidade cultural na pós-modernidade abarca uma questão extremamente complexa, pois, para melhor entendê-la, necessitamos refletir a respeito de o que é identidade, o que é cultural e o que é pós-moderno. O autor da obra, Stuart Hall, é capaz de tratar o assunto de maneira didática e clara, fazendo com que o leitor alcance um entendimento do proposto. Isso se dá devido à vasta experiência de Hall na área. Nascido na Jamaica, é um teórico cultural que trabalha no Reino Unido, tendo sido um dos fundadores do Centre for Contemporary Cultural Studies, da Universidade de Birmingham, Inglaterra, local onde os estudos culturais foram iniciados, sendo seu diretor de 1970 a 1979. Algumas de suas obras-chave que influenciaram a área de estudos culturais, dos meios de comunicação, assim como o debate político foram: The Hard Road to Renewall (1988), Resistance through Rituals (1989), The formation of Modernity (1992), Questions of Cultural Identity (1996) e Cultural Representations and Signifying Practices (1997). Por meio desta obra, Hall explora algumas das questões sobre a identidade cultural na modernidade tardia e avalia se existe uma “crise de identidade”, em que consiste essa crise e qual o rumo que está tomando. Portanto, o assunto é objeto de estudo e de interesse de pesquisadores das diferentes áreas do saber como sociologia (MATTELART e NEVEU, 2006), filosofia (FOUCAULT, 1986; MORAIS, 1992), antropologia (GEERTTZ, 1989), psicologia (PINKER, 1995) e linguística (GARCEZ, 2000; SCHLATTER, 2000; KRAMSCH, 1998). O autor ainda tem a humildade de reconhecer que “como muitos outros fenômenos sociais, é impossível oferecer afirma-

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ções conclusivas ou fazer julgamentos seguros sobre as alegações e proposições teóricas que estão sendo apresentadas” (p. 8 e 9) em seu livro. Isso faz com que o leitor reflita e tire suas conclusões a cada capítulo da obra. Aos Linguistas Aplicados, em especial aos que trabalham com Língua Estrangeira (LE), a obra é de grande valor, pois apresenta ao leitor aspectos que são importantes e têm influência no aprendizado da Língua Alvo (LA) como, por exemplo, o alerta para a importância de compreender a identidade e a cultura do aprendiz, bem como a identidade e a cultura do povo que fala a LA. Hall faz com que o leitor acompanhe a evolução do sujeito: do sujeito do Iluminismo – centrado, unificado, autossuficiente; do sujeito sociológico – dependente do outro para sua formação e transformação como indivíduo pertencente àquela comunidade e, portanto, àquela cultura; e do sujeito pósmoderno – interpelado pelas múltiplas representações culturais e identidades cambiantes. O sujeito pós-moderno, portanto, vive uma “crise de identidade” devido à mudança estrutural das sociedades modernas, levando à descentração do sujeito, ou seja, à “perda de um sentido de si”. O descentramento do sujeito da modernidade tardia (a segunda metade do século XX) é resultado de cinco grandes avanços na teoria social e nas ciências humanas ocorridas nessa mesma época. A primeira descentração foi influenciada pelo pensamento marxista do século XIX: “[...] os homens fazem a sua história, mas apenas sob as condições que lhes são dadas” (p. 34). Essa afirmação foi reinterpretada no século XX como um argumento de que o sujeito não é dono da sua própria história, pois vive a história criada e recriada por outros, utilizando os recursos materiais e de cultura que lhes foram fornecidos pelas gerações passadas. O segundo descentramento vem de Freud com sua teoria do inconsciente. Essa teoria é lida por Jacques Lacan como o motor que gera a identidade do sujeito por meio da “formação do eu no ‘olhar’ do Outro”, mostrando que a identidade muda de acordo com as representações que nos são oferecidas e as quais interpretamos – “incluindo a língua, a cultura e a diferença sexual”. O terceiro descentramento foi influenciado pelo trabalho do linguista Ferdinand Saussure que argumentava que nós não somos “autores” do que dizemos. A língua é um sistema social e ao utilizá-la ativamos os significados que já estão inseridos em nossa língua e em nossos sistemas culturais. O quarto descentramento ocorre no trabalho do filósofo e historiador francês Michel Foucault que declara a instituição do “poder disciplinar”. 172_


Esse poder está preocupado em regular a espécie humana, bem como cada indivíduo e seu corpo, disciplinando as populações modernas por meio de estruturas físicas concretas, mas que aprisionam também a psique do indivíduo – prisões, escolas, quartéis, hospitais, entre outros aparelhos bem conhecidos em nossa sociedade moderna. O quinto descentramento é o movimento feminista, pois faz parte do grupo de “novos movimentos sociais” questionando questões políticas, sociais e culturais, trazendo um novo conceito de identidade para a modernidade tardia. Esse sentimento do sujeito ter múltiplas identidades dentro da sua própria comunidade ainda é maior quando visualizamos “os fluxos culturais” entre as nações criando as “identidades partilhadas”. Portanto, a ideia de que temos uma identidade cultural nacional pura é um mito, ou como Hall afirma, “imaginada”. De acordo com o autor: Uma cultura nacional é um discurso – um modo de construir sentidos que influencia e organiza tanto nossas ações quanto a concepção que temos de nós mesmos. As culturas nacionais, ao produzir sentidos sobre “a nação”, sentidos com os quais podemos nos identificar, constroem identidades. Esses sentidos estão contidos nas estórias que são contadas sobre a nação, memórias que conectam seu presente com seu passado e imagens que dela são construídas (p. 50 e 51).

Um fator que está deslocando as identidades culturais nacionais é o que se convencionou chamar de “globalização”. A globalização se refere àqueles aspectos que ultrapassam as fronteiras das nações, mesclando-as e conectando-as de forma que não há mais uma interferência de espaço e tempo. Essa “interdependência global está levando ao colapso de todas as identidades culturais fortes e está produzindo aquela fragmentação de códigos culturais [...] [acarretando] no impermanente [...] e no pluralismo cultural [...]” (p. 73). Entretanto, não se deve pensar que as identidades culturais se extinguiram. O que acontece é uma nova representação ou identidade que está em constante movimento devido ao “bombardeio” de informações e consumos que os países lançam – principalmente os países dominantes do Ocidente. É estranho imaginar que ao mesmo tempo em que há esta “homogeneização global” existe uma atração pela diferença, mas é isso que acontece. As comunidades culturais buscam como atrativo o que têm de diferencial

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e geralmente se orgulham disso – suas vitórias, suas tragédias, suas crenças, seus valores e tudo mais que as façam acreditar serem nações unificadas e, portanto, formando a cultura nacional. “[...] ao produzir sentidos sobre a nação, sentidos com os quais podemos nos identificar [...]” (p. 51), construímos nossa identidade. O autor argumenta que “[...] ao invés de pensar no global como ‘substituindo’ o local seria mais acurado pensar numa nova articulação entre ‘o global’ e ‘o local’ [produzindo, simultaneamente] novas identificações ‘locais’” (p. 78). Hall conclui seu livro expondo que a globalização está, de fato, mexendo com as identidades culturais dos sujeitos, mas seu descentramento ainda é lento para dar fim às “comunidades imaginadas”. O livro instiga o leitor a uma reflexão participativa, pois podemos imaginar e até visualizar nossa própria identidade cultural no mundo globalizado. Entretanto, como o autor mesmo coloca no início da obra, as suas formulações são provisórias e abertas à contestação, assim como tudo que diz respeito ao ser humano.

Referências FOUCAULT, M. The subject and power. In: DREYFUS, J e RABINOW, P. Michel Foucault: Beyond structuralism and Henrmeneutics. Brighton: Harvester, 1986. GARCEZ, P. Cultura invisível e variação cultural na fala-em-interação social: o que os educadores da linguagem têm a ver com isso. In: INDURSKY, F. Discurso, memória e identidade. Coleção Ensaios. Porto Alegre: Sagra Luzzato, 2000. GEERTZ, C. A interpretação das culturas. Rio de Janeiro: Guanabara Koogan S.A., 1989. HALL, Stuart. A identidade cultural na pós-modernidade. Tradução Tomaz Tadeu da Silva, Guaracira Lopes Louro. 9. ed. Rio de Janeiro: DP&A, 2004. KRAMSCH, C. Language and Culture. Oxford University Press, 1998. MATTELART, A. e NEVEU, E. Introdução aos estudos culturais. Tradução de Marcos Marcionilo. 2. ed. São Paulo: Parábola Editorial, 2006. MORAIS, R. Estudos de filosofia da cultura. São Paulo: Loyola, 1992. PINKER, S. The language instinct. Collins, 1995. SCHLATTER, M. Inimiga ou aliada? O papel da cultura no ensino da Língua Estrangeira. In: INDURSKY, F. Discurso, memória e identidade. Coleção Ensaios. Porto Alegre: Sagra Luzzato, 2000.

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Normas para Publicação Competência - Revista da Educação Superior do Senac-RS é uma publicação de periodicidade semestral, cujo objetivo é promover e divulgar artigos e resenhas que contribuam para o desenvolvimento de áreas multidisciplinares. Os artigos publicados são resultado da produção de mestres e doutores e versam sobre Educação, Moda, Meio Ambiente, Gestão e Negócios, Comunicação e Informação, Hospitalidade e Lazer. A Revista também aceita resenhas de livros de pesquisadores e discentes de cursos de Pós-Graduação Stricto Sensu, desde que as obras contemplem as áreas já mencionadas. Os textos devem seguir as recomendações abaixo: 1. Somente serão publicados trabalhos inéditos, de natureza técnicocientífica, relacionados a Educação, Moda, Meio Ambiente, Gestão e Negócios, Comunicação e Informação, Hospitalidade e Lazer; nas línguas portuguesa, inglesa e espanhola. 2. A aceitação da publicação de artigo implicará transferência de direitos autorais para o Senac-RS, de acordo com a Lei de Direitos Autorais. A Instituição não se compromete a devolver as colaborações recebidas. Os autores dos textos publicados receberão dois exemplares da Revista como cortesia. 3. Os originais encaminhados para análise serão submetidos ao Conselho Consultivo para emissão de parecer. No processo avaliativo, os nomes dos autores, assim como dos pareceristas, serão omitidos. 4. Diante da necessidade de qualquer modificação no texto, essa será submetida ao autor. 5. Todos os autores receberão retorno sobre o aceite da respectiva proposta. 6. Os artigos devem possuir no mínimo dez e no máximo 15 páginas no formato A4, incluídas referências bibliográficas e notas; espaçamento 1,5 e fonte Times New Roman 12pt. 7. As propostas de artigo necessitam apresentar título e resumo com até 250 palavras em português e inglês ou espanhol, seguido de três a cinco palavras-chave nos dois idiomas (português e inglês ou espanhol), obedecendo à NBR 6028. É necessário constar também o nome do autor ou autores; indicação da instituição principal à qual está vinculado; cargo ou função; titulação; endereço; e-mail e telefone para contato. 176_


8. Deve ser encaminhada uma cópia impressa (textos e figuras) dos originais para o endereço: Av. Alberto Bins, 665 – 7º andar, Porto Alegre/ RS, aos cuidados da Comissão Editorial da Revista Competência, e também arquivo eletrônico, modo attached, no formato Word, para o e-mail competencia@senacrs.com.br. 9. Os textos que contiverem ilustrações, tabelas, etc., deverão ser encaminhados em formato original e em arquivos separados para o mesmo endereço eletrônico, com as indicações de inserção no texto, bem como legenda e referência de autoria (tratando-se de reprodução). 10. As tabelas devem estar de acordo com as normas de apresentação tabular do Instituto Brasileiro de Geografia Estatística – IBGE, 3. ed. Rio de Janeiro, 1993. 11. As notas numeradas e as referências bibliográficas (em ordem alfabética) seguem as NBR 10520 e NBR 6023 da ABNT. Na apresentação, as notas devem preceder as referências.

Livros: ALVES, Roque de Brito. Ciência Criminal. Rio de Janeiro: Forense, 1995. REGO, L.L.B. O desenvolvimento cognitivo e a prontidão para a alfabetização. In: CARRARO, T. N. (Org.). Aprender pensando. 6. Ed. Petrópolis: Vozes, 1991. p. 31-40.

Artigo de periódico: NOGUEIRA, Ronidalva. Michel Foucault numa breve visita às prisões de Pernambuco. Cadernos de Estudo Sociais, Recife, v. 6, n. 2, p. 269-282, jul./ dez. 1990.

Artigos e ou matérias de revista, boletim etc. em meio eletrônico: RIBEIRO, P. S. G. Adoção à brasileira: uma análise sociojurídica. Dataveni@, São Paulo, ano 3, n. 18, ago. 1998. Disponível em: http://www.datavenia.inf.br/frame.artig.html. Acesso em: 10 set. 1998. 12. As citações devem ser indicadas no texto somente pelo sistema autor-data e estarem de acordo com a NBR 10520 da ABNT. Citações com mais de três linhas devem ser apresentadas em corpo 10, recuadas em 4cm da margem esquerda, sem aspas, com espaçamento 1,5. _ 177


13. As aspas duplas serão empregadas somente para citações textuais de até três linhas, que estejam contidas no texto e em transcrições. 14. Os destaques, tais como, nomes de publicações, obras de arte, categorias, etc. serão realizados por meio de itálico. 15. Caso o artigo contenha numeração progressiva, devem ser respeitadas as orientações da NBR 6024. 16. As resenhas, com extensão máxima de cinco páginas, devem conter as referências completas das obras analisadas e obedecer aos padrões acima especificados. 15. Os textos são de inteira responsabilidade de seus autores.

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