A família pode ser considerada a primeira experiência de sociabilidade à qual os indivíduos são sujeitos e, nesse sentido, assume um caráter de núcleo relacional básico no qual se encenam experiências fundantes. Ainda que tenha passado por transformações ao longo do tempo, a unidade familiar manteve um papel de organização inicial da vida social, sendo aquela que arregimenta as primeiras necessidades e desejos individuais e seus decorrentes conflitos. É algo esperado que esse tema germinal para as relações humanas seja recorrente no fazer
teatral, sobretudo no teatro moderno, quando a leitura psicológica dos personagens permite vislumbrar características de impacto dramatúrgico. Um dos movimentos incisivos nesse sentido é a tradição realista do teatro norte-americano, da qual Nicky Silver, autor da peça Três Mudanças é originário. No texto encenado pela direção de Mário Bortolotto, eclodem questões caras ao contexto social atual, pela existência concomitante de diferentes tradições em choque e uma certa inaptidão ao desfecho inclusivo
das divergências. A dramaturgia proposta sugere saídas metalinguísticas que permitem entrever nuances da complexidade da condição humana. Para o Sesc, a realização de tal montagem é uma oportunidade de oferecer ao público algumas chaves para interpretações críticas sobre esta organização social basilar que, independentemente dos arranjos possíveis ou de papéis predeterminados, exerce um impacto formativo sobre os indivíduos.
Danilo Santos de Miranda Diretor do Sesc São Paulo
Nate e Laurel são um casal aparentemente feliz vivendo no Upper West Side, em Nova Iorque, ocupados, contentes e confortáveis até a chegada surpresa de Hal, irmão de Nate, há muito tempo distante. Recém-saído de reabilitação, Hal chegou a ser um bem sucedido escritor de televisão. Agora está só e sem dinheiro. O que parece ser apenas uma visita casual, rapidamente se transforma em um reencontro cheio de significados.
Até onde o ser humano se sujeita para corresponder às expectativas dos padrões sociais e assim sustentar em aparências possuir uma família feliz e perfeita? As instituições sociais são instrumentos de regulação da ordem ética e da convivência moral mesmo que, por muitas vezes, arraigadas de falsas verdades e hipocrisia. Carl Jung ao cunhar a expressão “inconsciente coletivo” define o ser humano e o seu conjunto de crenças comuns, não mais baseadas nas experiências individuais dos seres, mas em informações arquetípicas e
impessoais que se manifestam nos indivíduos e são transmitidas uns aos outros ao longo do processo de desenvolvimento da vida. Esses padrões de comportamento se traduzem em atitudes cabíveis à convivência social, limitandose em normas préestabelecidas por um comportamento coletivo, ou seja, as regras comuns se sobressaem sobre as normas individuais em questão moral. Nos é projetada a ideia de que os condicionamentos sociais são mais importantes do que a consciência pura onde aceitamos que qualquer coisa é possível no
âmbito espiritual. Nesse âmbito somos autorresponsáveis pela construção do nosso presente e da nossa realidade e só assim então talvez poderemos atingir a tão sonhada felicidade autêntica. Três Mudanças traz à tona esses questionamentos através de uma construção dramatúrgica em que ao espectador é dada a oportunidade de conhecer mais sobre a vida dessas personagens do que a ele mesmo. Nunca o aforismo grego “Conhece-te a ti mesmo” foi tão urgente como em nossa sociedade atual. Carolina Mânica Idealizadora
Há algumas dramaturgias nas quais não é possível apenas esbarrar, pedir desculpas e ir em frente. É preciso chamar para um chope numa tarde modorrenta qualquer e forçar a barra para um embate, mesmo correndo o risco de ser enxotado do bar após cinco minutos de conversa. Acredito que isso aconteça com Nicky Silver, esse dramaturgo americano tão obcecado pela extinção do núcleo familiar que acaba por ser um dos mais exaltados defensores de tal núcleo, mesmo que as ervas daninhas estejam nascendo inclementes sob a mesa de jantar.
O estudioso de teatro Jordan Schildcrout apontou para o tema recorrente do filho pródigo no trabalho de Silver. No caso dessa peça trata-se de Hal, um roteirista de TV cuja inescrupulosidade beira a vilania e rivaliza com seu assombroso carisma, resultando em um personagem dos mais ricos dramaturgicamente. Como diretor, creio que a melhor maneira de conseguir o efeito aparentemente proposto na dramaturgia é fazendo com que o ator tenha sempre a voz do
personagem soando ininterrupta em sua cabeça, conduzindo toda a dor sugerida, mas sem esquecer que como apontou Llyod Rose em uma resenha para o Washington Post, “Silver nunca encontrou uma dor de que ele não pudesse rir”. Mário Bortolotto Diretor
FICHA TÉCNICA DIREÇÃO Mário Bortolotto TEXTO Nicky Silver TRADUÇÃO Clara Carvalho IDEALIZAÇÃO Carolina Mânica ELENCO Carolina Mânica, Renata Becker, Nilton Bicudo, Bruno Guida e Lucas Romano CENÁRIO E ILUMINAÇÃO Marisa Bentivegna FIGURINO Fábio Namatame SONOPLASTIA Mário Bortolotto IDENTIDADE VISUAL Uibirá Barelli e Paulo Bueno / Estúdio Diorama FOTOS Julieta Benoit CENOTÉCNICO Zito Lemos CONSTRUÇÃO CENOGRÁFICA Cesar Rezende Santana CAMAREIRA Alessandra Ribeiro OPERADOR DE LUZ Rodrigo Damas OPERADOR DE SOM Ademir Muniz ASSISTENTE DE CENOGRAFIA Amanda Vieira ASSISTENTE DE FIGURINO Juliano Lopes ASSISTENTE DE PRODUÇÃO Veronica Jesus PRODUÇÃO Anayan Moretto
De 8 de fevereiro a 10 de março de 2019 Sexta e sábado, 21h | Domingo, 18h
Tradução em Libras na sessão de 1.03.2019 Teatro | 16 anos
Sesc Ipiranga Rua Bom Pastor, 822 CEP: 04203-000 | São Paulo/SP Tel.: +55 11 3340.2000 /sescipiranga sescsp.org.br/ipiranga