CARTA DA PAZ SOCIAL (1946)
Coleção Documentos Fundantes CARTA DA PAZ SOCIAL (1946)
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Sumário
CARTA DA PAZ SOCIAL (1946) Corolário social e pedra fundamental por Alexandre Saes e Beatriz Saes..................................................................................................... 4 Carta da Paz Social ........................................................................................................................... 9 Matérias na imprensa ................................................................................................................. 22
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Corolário social e pedra fundamental por Alexandre Saes e Beatriz Saes
Corolário social e pedra fundamental por Alexandre Saes e Beatriz Saes Os inúmeros debates travados pelas classes produtoras brasileiras, entre o final do Estado Novo e o início da Quarta República, – exemplarmente, o I Congresso Brasileiro de Economia, o I Congresso Brasileiro da Indústria e a Conferência de Teresópolis – tinham ao menos dois eixos centrais (que se interconectavam): (i) as diretrizes político-econômicas que deveriam ser adotadas a partir de então – a definição do papel do Estado e da iniciativa privada, a disputa entre o “planejamento econômico” e certas visões mais “liberais” – e (ii) questões ligadas ao progresso e à “harmonia” social – o desenvolvimento do padrão de vida da população, o combate à pobreza e à carestia, em suma, a constituição de políticas capazes de promover certa noção de “justiça social”. Esses objetivos primeiros estão na base da Carta de Teresópolis, em que pese as outras recomendações e formulações (quer mais gerais, ou, de caráter específico), a qual, embora intitulada Carta Econômica, também não deixava de enfatizar temáticas sociais consideradas urgentes. Foi justamente como um aprofundamento desse “viés” social das discussões travadas no período – ou, como uma espécie de “corolário” do documento de Teresópolis1 – que os representantes das classes produtoras redigiram a Carta da Paz Social. Boa parte da imprensa repercutia as iniciativas do empresariado brasileiro. O jornalista e redator econômico Humberto Bastos associava as atitudes das classes produtoras brasileiras a projetos e acordos de “pacificação social” ocorridos em outros países (especialmente, nos Estados Unidos e na Inglaterra) enfatizando a importância da “distribuição de riquezas” e da “valorização do trabalho humano”, bem como, daquilo que seria “uma nova política de entendimento entre trabalhador e patrão”.2 De maneira semelhante, um editorial do Diário de Notícias aproximava as diretrizes da Carta da Paz Social com o tom de alguns discursos proferidos nos encontros da Organização das Nações Unidas (ONU)3 – “a justiça social e os melhores padrões de vida para todos são fatores essenciais na promoção e manutenção da paz mundial”. Ainda assim, apontava para a necessidade de uma maior amplitude em termos de política social – já que “angustia as classes pobres e reduz o país à miséria crescente uma série de problemas demasiado agudos”. Entendendo, as1 Termo usado por Manoel Francisco Lopes Meirelles para apresentar a reedição da Carta da Paz Social. Carta da Paz Social, São Paulo: Sesc, 1971. 2 Bastos, Humberto. “Um novo instrumento de pacificação”. Diário Carioca, Rio de Janeiro, 15 de agosto, 1945, p. 3. 3 Em Tribuna Popular, periódico do Rio de Janeiro, afirmava-se a respeito da Carta que “não se trata de uma inovação”, uma vez que corresponderia “ao pacto firmado nos Estados Unidos entre o presidente da Câmara do Comércio, Eric Johnston, e os presidentes das duas poderosas centrais sindicais operárias”; ademais, processos e acordos similares no México e no Chile também eram mencionados. Motta Lima, Pedro. “A Carta de paz social”. Tribuna Popular, Rio de Janeiro, 9 de setembro, 1945, p. 3.
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sim, as iniciativas patronais brasileiras – com o “compromisso de promoverem os empregadores o mais estreito entendimento com seus empregados” – como um primeiro e importante passo para “a paz social a que aspira e espera assegurar o Brasil”.4 Em novembro de 1945, o Diário de Notícias dava voz ao futuro presidente da Confederação Nacional do Comércio (CNC) (e então presidente da Associação Comercial do Rio de Janeiro), João Daudt de Oliveira, para anunciar a “assinatura em breves dias da Carta da Paz Social”.5 O empresário assumiria o posto no mês de janeiro do ano seguinte – com direito a evento solene, no Teatro Municipal do Rio de Janeiro – quando da ocasião de novo discurso saudando a referida Carta: um emblema de um novo mundo, de um “mundo onde seja digno viver”, uma vez que se estaria fundamentando, “sobre base sólida, a política de mútua compreensão e respeito recíproco”.6 Ao final do discurso, o documento foi apresentado integralmente – e, igualmente, publicado na íntegra nos principais jornais da época. As palavras finais da Carta certamente ecoavam a atmosfera e os anseios de boa parte da sociedade brasileira naqueles anos: (…) os signatários desta Carta esperam que, num clima de cooperação, fraternidade e respeito recíproco e na união de todas as forças vivas e conscientes da Nação, será possível estabelecer as bases de uma verdadeira democracia, assegurar as liberdades públicas, manter o equilíbrio social e conquistar para nossa Pátria o respeito e a admiração de todos os povos.7 A Carta da Paz Social é composta por 11 itens principais, alguns destes, subdivididos em um ou mais tópicos. É notável, ao longo de todo o documento, a centralidade de noções como solidariedade e harmonia social. Mais que um mero manifesto de princípios abstratos, a Carta é explícita nas suas intenções de criação de um Fundo Social – voltado para a implementação de aparelhos, obras e serviços – destinado ao bem-estar (das necessidades mais básicas ao lazer e à formação) dos trabalhadores em geral. Vejamos seus pontos principais: (1) viés democrático e solidário, donde a aproximação entre democracia política, “democracia econômica”, “felicidade social” e “dignidade humana”; (2) não limitação das atividades produtivas a meros fins lucrativos, isto é, o capital não deveria somente produzir lucro, atuando tanto como meio de “expansão econômica” como de “bem-estar coletivo”; (3) o aumento do poder aquisitivo de toda a população, especialmente nas áreas rurais, como uma meta central; (4) a criação, por parte dos empregadores, de um Fundo Social capaz de prover necessidades urgentes dos trabalhadores 4 “Democracia e paz social”. Diário de Notícias, 12 de janeiro, 1946, p. 4. 5 “Ambiente de desafogo e confiança nos meios produtores”. Diário de Notícias, 1 de novembro, 1945, p. 3. 6 “Elo da maior aproximação entre empregadores e empregados”. Diário de Notícias, 15 de janeiro, 1946, p. 7. 7 Carta da Paz Social. São Paulo: Sesc, 1971, p. 8.
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por meio de obras, serviços e assistência social em geral (propiciando um melhoramento “físico e cultural da população”, bem como, seu “aperfeiçoamento profissional e cultural”); (5) esse Fundo sendo constituído por contribuição empresarial (“agrícola, industrial e comercial”), a partir de imposto sobre lucros, segundo declarações do Imposto de Renda das mesmas; (6) a administração do referido Fundo devendo ser maximamente eficiente, e, sua composição, mista (empregadores e empregados); (7) os empregadores imbuídos na promoção da racionalização, do aumento da produtividade e do barateamento dos custos e redução dos preços, bem como, evitando que as técnicas racionalizadas da produção pudessem afetar a “personalidade do trabalhador” de modo a não impactar em seus “valores humanos”, providenciando, pois, medidas educativas e assistenciais para tanto (ademais, políticas de premiações – por iniciativa, habilidade, eficiência e esforço – deveriam ser adotadas, assim como, cooperações para o aperfeiçoamento profissional e artístico dos trabalhadores); (8) aos empregados, cooperação ao máximo em relação à produção e, consequentemente, às políticas produtivas do país (para tanto, [a] estabilidade e assiduidade no emprego, [b] minoração de desentendimentos entre trabalhadores e entre empregadores e empregados, [c] zelo em relação às empresas, aos instrumentos e às instalações, [d] cooperação disciplinada, [e] busca de constante aperfeiçoamento (frisando-se a importância dos cursos oferecidos por Senai e Senac), [f ] incentivo “à produtividade individual”; (9) empregadores e empregados devendo também cooperar para resolver maximamente conflitos, evitando qualquer tipo de violência; (10) empregadores e empregados reivindicando do Estado [a] o combate à inflação, [b] a extinção de órgão públicos que atrapalhem a produção ou elevem preços de bens essenciais, [c] a redução de impostos sobre alimentos, [d] a abolição ou redução de impostos para moradias de trabalhadores urbanos e rurais, bem como, a proteção à habitação popular, [e] mudanças na Previdência Social em benefício de seus contribuintes, [f ] mudanças que garantam autonomia dos sindicatos, [g] a concretização dos direitos inscritos na legislação trabalhista vigente; (11) a constituição de uma Comissão Executiva Central, formada por empregadores e empregados, para execução efetiva dos planos então delineados.8 Desde a Carta de Teresópolis, a força de certas ideias ligadas ao desenvolvimento econômico do país – aprofundamento da industrialização, primado da iniciativa privada, medidas de planejamento econômico estabelecidas de acordo com as diretrizes e necessidades empresariais etc. – se fazia sentir. Do mesmo modo, a centralidade que os conflitos entre o capital e o trabalho ganhavam naquele momento eram em nada desprezíveis. Assim, as próprias noções de “paz” ou “harmonia” social operavam como respostas das classes produtoras brasileiras 8 Carta da Paz Social. São Paulo: Sesc, 1971.
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– ante agitações operárias e sindicais em plena vigência – a possíveis soluções disruptivas que porventura se associassem ao bloco socialista (que passava então a “dividir” a supremacia global com os EUA). Donde, desenvolvimento e bem-estar social como peças fundamentais de um arranjo brasileiro rumo ao progresso. Se a Carta de Teresópolis dava toda essa ênfase ao desenvolvimento, a certas medidas de planejamento econômico (planejamento que não poderia se confundir com a típica “planificação” tal qual se adotava no eixo socialista) e de bem-estar social, a Carta da Paz Social, por sua vez, levava adiante e propunha um plano de ação efetivo para as temáticas sociais – se se tratou mesmo de um “corolário”, não seria incorreto chamar de “corolário social” das diretrizes progressistas estabelecidas no documento de Teresópolis. Essa vocação é que determina a posição da Carta da Paz Social como um grande documento norteador ou inspirador. Documento que está na base da fundação do Serviço Social do Comércio – Sesc.
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CARTA DA PAZ SOCIAL Janeiro de 1946
Matérias na imprensa
Diário Carioca, 5 de julho de 1945
Diário Carioca, 26 de julho de 1945
Diário Carioca, 15 de agosto de 1945
Diário Carioca, 6 de setembro de 1945
Diário Carioca, 1 de novembro de 1945
Diário Carioca, 11 de novembro de 1945
Diário Carioca, 6 de dezembro de 1945
Diário Carioca, 6 de janeiro de 1946
Diário Carioca, 6 de dezembro de 1945
Diário Carioca, 6 de janeiro de 1946
Diário de Notícias, 1 de novembro de 1945
Diário de Notícias, 12 de janeiro de 1946
Diário de Notícias, 15 de janeiro de 1946
Tribuna Popular, 9 de setembro de 1945
Tribuna Popular, 15 de janeiro de 1946