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Ser atleta é ser humano

Ser olímpico ou a eterna busca pela excelência

Interseccionalidade: uma lente amplificadora do ser

Ser educador (a)

ser diferente?

Para começar a conversa

De onde eu vejo

Enquanto a sociedade cancela, o esporte aprova

Fabiana Alvim

Evelyn Vieira

Elizabeth Gomes

Criar e refletir

E na arte... / Para saber mais...

ser lgbtqiapn+

Para começar a conversa

De onde eu vejo

Para além das sexualidades visíveis – assexualidade

Edênia Garcia

Walmes Rangel

Alana Maldonado

Criar e refletir

E na arte... / Para saber mais...

ser migrante

Para começar a conversa

De onde eu vejo

Metáforas, memórias e ancestrais

Fernando Meligeni

Edson Cavalcante

Bruno Fratus

Criar e refletir

E na arte... / Para saber mais...

ser mulher

Para começar a conversa

De onde eu vejo

Empoderamento

Camille Rodrigues

Yane Marques

Fernanda Garay

Criar e refletir

E na arte... / Para saber mais...

ser negra e ser negro

Para começar a conversa

De onde eu vejo

Tornar-se Negro: uma revolução em curso

Melânia Luz

Roseane Santos

Alfredo Gomes

Criar e refletir

E na arte... / Para saber mais...

Ser atleta é ser humano

O movimento é a condição natural dos seres vivos, humanos e não humanos. Os corpos em sua ampla diversidade de tamanhos, formas e especificidades foram concebidos para atividade. Nessa perspectiva, ser atleta é ser humano. Contudo, ser atleta de alta performance esportiva exige circunstâncias e habilidades, nem sempre acessíveis a todas as pessoas.

O projeto Ser Atleta, iniciado em 2021, reúne uma série de histórias e depoimentos de pessoas que encontraram no esporte de competitividade extrema um lugar de desenvolvimento de habilidades e ampliação dos próprios limites. Neste ano, com o advento das Olimpíadas e Paraolimpíadas de Paris, outras narrativas foram incorporadas ao acervo, que conta ainda com um cuidadoso e aprofundado material de mediação sobre o esporte e suas interfaces com as diversidades contemporâneas.

Para o Sesc é uma oportunidade de reforçar o convite para uma aproximação com pessoas e corpos diversos em toda sua potência.

Que o presente conjunto de materiais possa estimular que mais pessoas encontrem um caminho para escolhas de vida mais ativas e saudáveis. Atletas ou não, explorem, divirtam-se e movimentem-se sempre!

Ser olímpico ou a eterna busca pela excelência

Na condição de produção sociocultural o esporte é um fenômeno em si, muito embora nele também se manifestem as tantas contradições humanas da atualidade. A humanização do esporte se dá pela presença do atleta, um ser para quem nada mais é possível se não a perfeição.

Por isso a excelência é um dos mais importantes valores olímpicos. Isso porque atletas têm suas vidas voltadas a fazer o seu melhor todos os dias, na busca de seu limite. E isso leva essas pessoas a se aproximarem de um gesto heroico.

Não é uma demanda externa, social, que mobiliza essas pessoas a repetirem, aprimorarem, repetirem, ampliarem, repetirem até alcançar o resultado desejado. E esse é apenas o ponto de partida para recomeçar um novo ciclo em busca de uma nova marca a ser conquistada.

Poucos têm a real dimensão do trabalho realizado para se alcançar a condição de ser atleta.

E essa mesma rotina realizam todos aqueles que em suas atividades buscam a excelência, seja na docência, na pesquisa, nas atividades industriais ou do comércio, no desenvolvimento humano, na agricultura, na compreensão da natureza. Não há avanço, desenvolvimento, sem todo esse esforço. Isso porque ele também envolve a derrota, a frustração do erro e do fracasso, recuos, saídas criativas para respostas não alcançadas, enfim, a metáfora do esporte encaixa como uma luva em todas as atividades humanas que envolvem desafio.

Katia Rubio

Curadora da exposição, mãe de muitos filhos, amante da preservação da memória e apaixonada pelo esporte.

Interseccionalidade: uma lente amplificadora do ser

Quando se olha rapidamente uma pintura, quando se ouve uma canção sem muita atenção, quando se vê de relance uma escultura, muitas informações passam despercebidas. Detalhes podem não ser observados e então, conhecimentos sobre tais fenômenos podem ser parcialmente armazenados. Quando se olha um ser humano, é possível escapar informações fundamentais para compreender sua totalidade e complexidade.

O olhar interseccional vai além da primeira impressão. Permite acompanhar ruas, ruelas e avenidas que atravessam cada ser. Essas vias carregam informações sobre idade, gênero, aspectos étnico-raciais, identidades, habilidades e tantas outras características que impactam e compõem cada pessoa, e que por vezes são invisibilizadas em grupos ditos homogêneos.

Cunhado por Kimberlé Crenshaw na década de 80, o conceito de interseccionalidade identifica essas categorizações que resultam em dinâmicas de discriminação, desigualdades e desvantagens. As sobreposições desses marcadores aproximam ou distanciam as pessoas das posições de poder e privilégio, das possibilidades de fala ou silenciamento.

Aprimorar o olhar de maneira interseccional amplia possibilidades de compreender as pessoas plenamente. Detectar marcadores permite traçar estratégias de valorização das diferenças e desenvolver metodologias e práticas educativas positivas e efetivas para cada pessoa ou grupo.

A interseccionalidade pode ser primordial para o estabelecimento de relações mais humanas, livres de opressões, injustiças e desigualdades sociais.

Adriana Inês de Paula

Mulher, negra, educadora, aprendiz, amiga, ex-atleta amadora e mãe de cachorrinhas!

Ser educador (a)

Quando se fala em SER atleta, de pronto vêm à mente aspectos repetidos quase automaticamente. A rotina extenuante de treinamentos. A abnegação dos prazeres da vida. A busca por um objetivo. A gangorra das vitórias ou derrotas. Para acessar o SER ATLETA profundamente, contudo, é preciso entender como estes olham e narram suas próprias trajetórias, humanizando o esporte para além das performances extraordinárias.

Para entender o SER EDUCADOR(A), também é necessária uma análise menos imediata. Será que é fácil delimitar seus campos de saberes e encontros? O que caracteriza o preparo, a demanda, ou mesmo a experiência de se expor ao imprevisível, parte fundante do exercício coletivo da educação? Como educadores e educadoras tecem suas singularidades? Como vivenciam as dinâmicas e reflexões contemporâneas, em constante fluxo? Como as abordam? Não há uma resposta, pois não há forma única de educar. Não existe uma forma correta de SER EDUCADOR(A).

Há várias. E possivelmente, todas se pautem pela ação de repensar o mundo e repensar-se continuamente. É comum que algo nos pareça ter uma unidade quando

visto à distância. Ao nos aproximarmos, porém, vamos aos poucos, mirando as nuances e camadas que cada coisa apresenta. Num processo educativo, quando nos aproximamos de algo novo e aprendemos um pouco, o mundo se abre e temos a sensação de saber muito. Quando realmente começamos a aprofundar o assunto, a sensação se inverte: nos damos conta de que ainda há muito para aprender.

A primeira versão deste material voltado a profissionais da educação foi criada para a virto-exposição SER ATLETA, lançada em julho de 2021. Três anos depois, acompanhando o novo ciclo olímpico, exposição e material se enriqueceram com uma versão atualizada e novos atletas.

Tal qual a virto-exposição, este material se estrutura a partir de 5 arcos temáticos e se caracteriza pela pluralidade. Criado conjuntamente por diferentes vozes, por meio de fragmentos, relatos pessoais, reflexões, dados e sugestões de práticas para ambientes de ensino, busca incluir você, que nos lê, neste diálogo que se constrói cotidianamente sobre temas em permanente transformação no esporte, na sociedade, na vida.

ser diferente?

Para começar a conversa

Citius, Altius, Fortius! Palavras em Latim que expressam o lema dos Jogos Olímpicos: mais rápido, mais alto, mais forte. Considerando essa máxima, é quase justificável imaginarmos corpos altos, fortes e longilíneos ao desenharmos em nossas mentes um corpo atlético.

Mas o que é, de fato, um corpo atlético?

Quando o lema foi proposto pela primeira vez, os Jogos Olímpicos continham nove modalidades esportivas. Hoje, são mais de quarenta. Existe, de fato UM corpo ideal?

Seria o corpo atlético de um ciclista, de um arremessador de martelo, de uma ginasta ou de uma judoca?

O conjunto de esportes olímpicos nos mostra que a alta habilidade, a beleza, a precisão e a reação rápida dos gestos estão presentes nos inúmeros e diversos formatos de corpos. Tamanho, peso, cor, idade, ausência de membros ou reduzida amplitude de movimento são peculiaridades que não impedem a disputa pelo pódio, seja

ele olímpico ou paralímpico – ao contrário, a diversificam e a compõem. E é nesta linda diversificação que nascem as infinitas possiblidades de performar, seja em modalidades coletivas, seja na solidão de uma raia. Particularidades e soluções inusitadas surgem nos diferentes corpos e operam a magia lúdica do esporte: liberdade, risco, invenção.

O esporte olímpico, ao se diversificar no tempo, nada mais fez que refletir pulsões sociais. A variedade de corpos é bem-vinda, assim como também é para uma sociedade a pluralidade de ideias, atitudes, filosofias e modos de viver. A história de atletas que, além de vencerem batalhas no esporte, tiveram que superar barreiras atitudinais impostas por quem valoriza uma forma

Pessoas com deficiência no Brasil

Cegos 35 milhões

Surdos 10 milhões

Deficiência motora 13 milhões

Deficiência intelectual 2,5 milhões

Proporção de pessoas com pelo menos uma das deficiências por grupo de idade

Uma entre quatro pessoas no Brasil declarou, em 2010, ter alguma deficiência. Como você acha que nosso país lida com pessoas com deficiência? E você?

ser diferente?

estreita de conceber o corpo, nos mostra que estamos ainda no início desta maratona.

Em outras palavras, ser diferente pode ser entendido como potência, não como problema ou ameaça. Não apenas no que diz respeito a diversidade de corpos, mas também pensamentos e escolhas. Assim como a biodiversidade é necessária a um ecossistema, uma sociedade deveria crescer equilibrada na coexistência das diferenças, para nelas se enriquecer. Quem nos ensina o contrário tem apenas medo de se transformar.

Estatísticas de cirurgias plásticas em 2017

Número de procedimentos cirúrgicos e não-cirúrgicos estéticos realizados no Brasil

Procedimentos feitos por jovens com 18 anos ou menos:

18,6% de cirurgiões plásticos fizeram procedimentos de aumento dos seios em mulheres com 17 anos ou menos no país

O Brasil é um dos líderes mundiais em número de cirurgias plásticas. O que você pensa sobre isso? Você já fez - ou faria - uma cirurgia estética no seu corpo?

Homem Vitruviano, famoso desenho de Leonardo da Vinci, apresenta o corpo humano a partir de proporções consideradas ideais no Renascimento. Mas ideais para quem? Já pensou que estes padrões mudam? Por que de tempos em tempos surge um novo Homem ou Mulher Vitruvianos para nos impor padrões de beleza? Por que não ser diferente?

Saulo Cruz

De onde eu vejo

Esperei ansiosamente pelos Jogos do Rio - 2016. Minha relação com Olimpíadas remonta aos Jogos de Moscou, há tanto tempo que nem vale a pena contar. Criança, chorei no encerramento daqueles Jogos, suspeito que por conta de tudo, menos das competições. Festas, mascote, hinos, bandeiras, torcida. Agora, lá estava eu, e não pela TV. Eu mesmo me convidei a penetrar na maior festa esportiva do mundo. Comparecer ao vivo em territórios e arenas de modalidades menos populares – como esgrima, remo e ginástica - trouxe, aos meus olhos descondicionados, uma certeza inesperada: a percepção de que cada esporte contém uma cultura, para muito além do jogo em si, com estética e códigos de comportamento próprios, de atletas, árbitros e público. Vivenciar esta totalidade foi uma dádiva olímpica que me retornou aos 6 anos de idade. Mais do que nos resultados, a magia olímpica e paralímpica reside na diversidade destas culturas. Tantos povos, modalidades e códigos diferentes sob um mesmo teto. Utopia? Prefiro chamar de espírito lúdico. O círculo mágico que envolve os Jogoscom tempo, espaço e regras próprios - é

uma ficção criada para abarcar todos, e que ao nascer, mostrou nossas potências. Por que não expandir esta potência do convívio das culturas dos esportes para além deles? Para assim respeitar a diversidade. Valorizar a pluralidade dos modos de ser. Observar sem preconceito o diferente. Olhar para o que hoje desconhecemos com olhos curiosos. A história olímpica não é apenas doce e inclusiva. Boicotes, suspensões, repressões, escândalos e até atentados existiram. Mas nunca o espírito para acolher e abraçar se apagou totalmente. Manter este espírito aceso, para que não suspire apenas poucas semanas a cada 4 anos, e somente no esporte, este é o verdadeiro desafio olímpico. A oportunidade de sermos diferentes, nós e o mundo.

Alberto Duvivier Tembo é um educador que estuda o campo do jogo e chora em toda edição dos Jogos Olímpicos.

ser diferente?

Enquanto a sociedade cancela, o esporte aprova

Cancelado é uma palavra que está na moda. Somos cancelados quando estamos fora dos padrões sociais; quando pensamos ou vestimos diferente; ou até mesmo quando nos destacamos de forma positiva. Isso porque, os ambientes sociais estabelecem as categorias de pessoas que devem ser ali encontradas.

Mas, o cancelado existe desde os primórdios. Na Grécia antiga, por exemplo, havia os estigmatizados. Pessoas que possuíam estigmas - sinais corporais para evidenciar alguma coisa de extraordinário ou de mau sobre o status moral de quem os apresentava. Os sinais eram feitos com cortes ou fogo no corpo.

Hoje, as marcas foram substituídas por estigmas sociais, ou seja, uma forte desaprovação de características ou crenças pessoais, que vão contra normas culturais. Estigmas sociais frequentemente levam à segregação. Assim, as pessoas se agrupam onde se acham em condições de igualdade. Por mais que haja inclusão social, o primeiro olhar sobre esta pessoa sempre é reflexivo. Uma vez que normalmente, exige-se do indivíduo que ele se comporte de maneira tal que não signifique nem que sua carga é pesada e nem que carregá-la tornou-o diferente.

Nesse sentido, ser um atleta paralímpico é estar num espaço de pertencimento; é estar num grupo estigmatizado pela eficiência. O esporte é o lugar onde pessoas com deficiência se sentem fortes, ágeis, rápidos em equidade com os que ali estão. Capazes de realizar feitos extraordinários na busca da imagem heroica, de protagonizar o espetáculo. Portanto, em nossas reflexões é aconselhável partir do princípio que o diferente é relativo. Um atributo que estigmatiza alguém pode normalizar outro.

Luciane Maria Micheletti Tonon

Mãe adotiva de dois filhos, voluntária no Projeto Fast Whells Kids e amante do esporte paralímpico.

Fabiana Alvim

Vôlei

Nascida no Rio, Fabi Alvim foi desestimulada a seguir o sonho de jogar vôlei por causa de sua altura. Na modalidade em que tamanho parecia ser documento, fez-se gigante com 1,65m. Escreveu seu nome da história do esporte como líbero, função criada em 1998. A posição, focada na defesa, ajudou a democratizar o vôlei ao acolher maior diversidade de biotipos. Fabi hoje é bicampeã Olímpica e considerada como a melhor líbero de todos os tempos. Após 20 anos de carreira, largou as quadras e, ao lado da esposa, partiu para a conquista do novo título - o de mãe. Depois de desbravar caminhos num ambiente tão dominado pelos homens, espera que a filha cresça num mundo em que lugar de mulher seja onde ela quiser.

O esporte de alto nível exige muitos padrões e eu não me encaixava em muitos deles, especialmente na altura.
Fabi Alvim

A criação do líbero no vôlei teve como propósito permitir disputas mais longas de pontos, em uma época em que a média de altura e força dos jogadores aumentava.

A função, especialista em defesa, foi a solução para tornar o jogo mais atraente. A curiosidade é que foi justamente o aumento da média de altura que permitiu à Fabi, uma jogadora baixa, brilhar. A posição não foi criada para os mais baixos; mas os incluiu no jogo sem prejuízos. Isto levanta uma questão: será que não há mecanismos possíveis de inclusão de corpos diferentes, ainda não pensados, em várias áreas? Como educadores, não podemos propor tais mecanismos em ambientes de ensino?

Evelyn Vieira

Bocha Paralímpica

“Deficiência não é sinônimo de incapacidade”. Dita por Evelyn Vieira de Oliveira, jogadora de bocha paralímpica e medalha de ouro nos Jogos do Rio, a frase ganha ainda mais sentido. De família simples, ela nasceu com uma síndrome rara, que causa atrofia dos membros superiores e inferiores. Nenhuma escola a aceitou, e ela foi alfabetizada pelos pais. Só na adolescência teve sua primeira cadeira de rodas. Convidada a conhecer os esportes paralímpicos por uma professora do Sesi, hoje, joga a bocha com capacete apropriado para seus arremessos com a cabeça. Ser atleta a ajudou a desconstruir barreiras e encontrar seu espaço. Foi seu caminho para tornar-se mulher independente, inspiração para tanta gente.

Evelyn Vieira “ ”
A bocha me ajudou a desconstruir barreiras e encontrar meu espaço na sociedade.

A história de Evelyn pode ser analisada pelo viés de sua relação com os ambientes de ensino. A atleta nunca havia ido à escola, pois esta não a acolheu na infância. Seus pais desempenharam importante papel em

sua educação, até que a encontrassem uma escola, já em Suzano. Foi lá também que uma profissional da educação a levou para o esporte. Por fim, a atleta formou-se no Ensino Superior. Evelyn é um exemplo das dificuldades que muitas pessoas enfrentam para conseguirem estudar; mas também é um exemplo de como ser acolhido em um ambiente de ensino pode revolucionar a vida de uma pessoa. E, claro, também evidencia como o olhar atento de um educador pode transformar a vida de alguém.

Elizabeth Gomes

Atletismo Paralímpico

Carinhosamente conhecida como a Fênix, Beth Gomes nasceu em meados dos anos 60 em Santos-SP, cidade em que era Guarda Municipal e jogadora de voleibol. Diagnosticada com Esclerose Múltipla aos 27 anos, Beth tem transformado seus desafios em oportunidades. Superou inúmeros obstáculos, entre eles a depressão e brilhou e brilha em diferentes modalidades esportivas. Iniciou sua participação no paradesporto através do basquete em cadeira de rodas e anos mais tarde, encontrou sua verdadeira paixão no atletismo, conquistando medalhas paralímpicas e recordes mundiais no lançamento de disco, dardo e arremesso de peso. Aos 59 anos, em plena forma, Beth é um símbolo inspirador de resiliência e coragem.

Sou conhecida como fênix, porque cada dia eu me reinvento. O segredo é muita vontade, muito querer, o esporte corre nas minhas veias e como eu tenho paralisia por causa da esclerose múltipla, todo dia eu a driblo.

Beth passa a dedicar-se somente ao atletismo. Não apenas surtos inesperados atrapalham sua trajetória; mudanças técnicas tiram do Rio-2016 a prova do arremesso de peso na sua classe, a F55. Isso não abaterá uma fênix: em 2019, é ouro no Mundial em Dubai. E em 2021, o sonhado ouro paralímpico, em Tóquio, no lançamento de disco – com direito a recorde mundial. Detalhe: Beth tinha 56 anos. Era a atleta mais velha da delegação brasileira. A paralisia física nunca lhe tirou a flexibilidade de espírito, e Beth segue nos ensinando sobre como lidar com as diferentes novidades que a vida traz.

Criar e refletir

Igualzinho ao Diferente é um jogo simples, não-competitivo, que traz conceitos relacionados à identidade, diferenças e interseccionalidade. A brincadeira é possível a partir de 8 anos, mas mais indicada para grupos de adolescentes ou adultos. Viável com um mínimo de 4 pessoas, torna-se mais interessante com grupos numerosos, sem limite máximo.

Objetivo: agrupar-se com pessoas semelhantes a partir de comandos proferidos pela Voz - normalmente, o (a) professor (a).

Preparação: Escolha uma área onde os (as) participantes possam se movimentar livremente. O tamanho da área, naturalmente, dependerá do número de jogadores (as). A Voz, antes do jogo, escolhe até 8 critérios. Veja uma lista imaginária:

A. Idade

B. Número de irmãos

C. Estado onde nasceu

D. Cor dos olhos

E. Esporte favorito

F. Cor preferida

G. Time de futebol

H. Cantor favorito

A brincadeira: A Voz lê em voz alta o primeiro critério, e os (as) participantes se agrupam por semelhança. Por exemplo, após a Voz gritar “Idade”, as pessoas de 15 anos se juntam em um mesmo grupo; as de 16 em outro, e assim por diante. Depois de todos estarem alocados (as), a Voz diz “Número de irmãos” e todos (as) se reagrupam a partir das respostas. Para isso, as pessoas precisam se comunicar, e a Voz confere se estão corretos os agrupamentos. Assim segue a brincadeira até o fim da lista.

Pós-jogo: Converse com os (as) participantes a respeito do que descobriram sobre os (as) colegas, como se sentiram e

como foram percebidos (as) pelos outros (as). Sobre como podem se associar a uma pessoa sob um critério, mas não sob outro. Perceba as diferenças entre questões objetivas e subjetivas. Podese abordar temas como pertencimento, exclusão, diferenças e semelhanças. E principalmente, sobre como podemos ser “classificados (as)” de acordo com critérios.

Esta brincadeira pode ser usada com diversos fins: quebra-gelo, integração de um grupo novo, diagnóstico de grupo ou para abordar conteúdos mais densos. Tudo depende da lista de palavras usadas e da intenção do (a) educador (a) ao usá-la. Aqui apresentamos critérios mais leves; porém o (a) educador (a), conhecendo seu grupo, pode inserir temas polêmicos.

Aproprie-se desta brincadeira. Não faça igualzinho ao que está escrito. Aventure-se em fazer diferente.

E na arte...

Os padrões corporais de beleza e de normalidade são tema recorrente na arte contemporânea. Vale conhecer dois artistas brasileiros que abordam estes questionamentos a partir da suas próprias histórias. O artista paraplégico Pazé, com seu trabalho Transeuntes, e Nazareth Pacheco, com a criação de objetos que aludem a seu histórico de cirurgias para correções corporais, devido à uma síndrome congênita.

Para saber mais...

CANDAU, Vera Maria. Direitos humanos, Educação e Interculturalidade: As Tensões Entre Igualdade e Diferença. Revista Brasileira de Educação, v.13, n.37, jan-abr, 2008.

DAOLIO, Jocimar. Da Cultura do Corpo. Campinas, SP. Papirus, 1995.

PAULA, Adriana Inês. A Imagem Corporal e a Tão Propalada Padronização do Corpo BeloMagro-Forte. In: CAVALCANTE Jr., Francisco (Org.). Corpos Anárquicos. Curitiba, PR: CRV, 2014.

SHUSTERMAN, Richard. Consciência Corporal. São Paulo. É realizações, 2012.

Estatuto da Pessoa com Deficiência. Disponível em: bit.ly/estatutodeficiência

Manifesto Paralímpico. www.CPB.org.br Disponível em: bit.ly/manifestoparalímpico

ser lgbtqiapn+

Para começar a conversa

Quando falamos de diversidade, estamos falando também de identidade. A comunidade LGBTQIAPN+ carrega em si uma história de muitas lutas e conquistas, ganhando pouco a pouco terreno contra uma sociedade que replica estereótipos e intolerância. Muito se conquistou em termos de direito à dignidade humana, mas ainda há muito o que caminhar para combater a violência e o apagamento destas vozes.

Quando falamos no universo do esporte, é fácil de imaginar que, somados aos desafios próprios de cada modalidade, há os imensos obstáculos enfrentados pelos atletas desta

comunidade por respeito e equidade. Imensas são, igualmente, as conquistas. A cada vez que um atleta LGBTQIAPN+ vence uma prova, vence também a discriminação, o preconceito e a segregação, certamente companheiras de seu caminho até o pódio.

Vale refletir sobre a visibilidade que um atleta carrega consigo, como exemplo de superação no esporte. Quando se soma a isso uma voz que assume publicamente sua orientação sexual ou identidade de gênero, sabemos do impacto positivo que esta atitude pode gerar na sociedade, construindo lugares diferentes e normalizando as diversas formas de ser e

agir no mundo, para além das hegemonias. As pautas da diversidade vem ganhando cada vez mais espaço, felizmente, num cenário de uma sociedade conservadora e cheia de preconceitos. Muito se fala em liberdade para amar, o que certamente é uma pauta fundamental. Acima de tudo, porém, é preciso lutar pela liberdade de SER quem se é, antes de mais nada.

De 193 países...

proíbem a discriminação baseada em orientação sexual no trabalho 67

proíbem a discriminação baseada em identidade de gênero no trabalho 20

proíbem a discriminação baseada no fato de ser intersexo 3

Fonte: unfe.org/wp-content/uploads/2018/04/ Padroes-de-conduta-para-empresas.pdf

Tipo de violação

Violência psicológica 83,20%

Violência física 32,68%

Violência sexual 4,18%

Violência institucional 2,39%

Discriminação 74,01% Negligência 5,70% 0,10% 0,10% 0,03%

Tráfico de pessoas 1,13%

Abuso financeiro e econômico

Outras relacionadas ao dhs

Trabalho escravo

De onde eu vejo

Quando eu estava no segundo ano da faculdade, fiz um grande amigo. Vivíamos juntos o tempo todo, compartilhávamos afinidades como a música, a literatura e a alegria. Em pouco tempo já o sentia como um irmão. Era no ombro dele que eu chorava e ria dos amores, e estranhava que ele nunca se abria sobre sua vida sentimental. Ele era muito tímido, e embora me contasse tudo sobre todos os outros assuntos, eu colocava esse silêncio na conta do seu temperamento reservado. Um dia, num corredor antes da aula, ele disse que queria me contar uma coisa. Sentamo-nos cúmplices como sempre, mas ele parecia empacado. Depois de muito tempo em silêncio, eu compreendi. Ele disse que estava apaixonado, e não conseguiu dizer mais nada. Percebi que aquela notícia não era uma novidade para mim, mesmo eu que nunca tivesse pensado sobre isso. Ainda assim, num esforço imenso, me contou sussurrando, no ouvido: “mas não é por uma garota...”. Nos abraçamos e sorrimos, e ele se sentiu feliz de finalmente me contar tudo sobre o seu amor platônico. Neste dia me dei

conta de algo que nunca vivi. Ele era o meu melhor amigo, e ainda assim sussurrou no meu ouvido. Me soou alto como um grito. O grito de todas as pessoas que passaram em algum momento por isso. Desde então, reforçou-se em mim a vontade de que todos possam dizer ou silenciar suas identidades e desejos por escolha, e não por medo. Felizmente muito se caminhou desde então, embora ainda haja muita luta pela frente.

Stella Ramos é educadora e aprecia a escuta como espaço de aprendizado sobre as diversidades.

Para além das sexualidades visíveis – assexualidade

Quando se pensa na sexualidade humana, as orientações sexuais mencionadas são relacionadas ao prazer sexual, afetivo e romântico, tendo o ato sexual como determinante. A ideia de existir apenas essa forma de interagir no contexto das relações, impossibilita diversas maneiras de sentir ou não sentir atração sexual.

A assexualidade é a ausência, de formas diversas, de atração sexual. Ou seja, existem pessoas que não sentem atração sexual nunca, outras sentem em alguns contextos e circunstâncias que são diversos de acordo com cada pessoa.

A naturalização de que todas as pessoas sentem desejo sexual, é um problema para assexuais que são colocados num lugar de invisibilização. Porém, estudos do Relatório Kinsey apontavam para identidade assexual em 1953.

Pessoa alossexual é a que sente atração sexual. Este contraponto é importante para localizar como as pessoas sentem atração sexual de forma diferente.

O celibato não tem ligação com a assexualidade e sim as convicções religiosas e pessoais.

Existe preconceito devido a essa confusão. Assexualidade pode ser lida como algo desviante e que por isso precisa ser “curada”, passando pela dimensão da patologia erradamente.

Sendo a assexualidade uma identidade que foge a norma e reivindica maneiras diferentes de sentir atração sexual e formas outras de lidar com o sexo, fugindo da lógica hegemônica, merece ter mais visibilidade para ampliar as discussões sobre sexualidades, relações e maneiras de interagir com as pessoas na sociedade.

Leonardo Morjan Britto Peçanha

Filho de D. Valquíria Britto e Sr. José Peçanha, professor de educação física, pesquisador, ex-atleta amador e LGBTQIAPN+

Edênia Garcia

Natação Paralímpica

Mulher, com deficiência, lésbica, vinda do interior do Ceará e de origem humilde.

Edênia Garcia é uma desbravadora.

Atleta paralímpica de natação, recebeu 17 medalhas em mundiais e três em Paralimpíadas. As piscinas entraram em sua vida aos sete anos, para auxiliar no tratamento da doença degenerativa que prejudica o movimento de seus braços e pernas. Foi a primeira atleta brasileira a conquistar um tricampeonato mundial, e é hoje a única tetracampeã. Ela é a primeira embaixadora sul-americana entre atletas olímpicos e paralímpicos a integrar a Pride House France 2024 (Casa do Orgulho). O esporte foi seu passaporte para a liberdade. A partir dele, construiu sua identidade e virou referência para uma geração de meninas e mulheres que busca viver bem com seu próprio corpo e afirma o direito e a coragem de ser e amar quem quiser.

... Eu me cobrava muito por não ser igual a esses corpos e só depois dos 30 anos que eu comecei a me enxergar, a me aceitar.
Edênia Garcia

Ao longo de sua vida, Edênia superou muitos obstáculos, por conta de sua deficiência ou orientação sexual. Nas piscinas, transformou sua história em vitória, seja no esporte, seja na vida. Tornou-se a primeira embaixadora sul-americana, entre atletas olímpicos e paralímpicos, a integrar a Pride House France 2024, um espaço dedicado à comunidade LGBTQIAPN+ que promove a inclusão e o respeito pela diversidade no esporte. Edênia é exemplo onde podem se mirar pessoas que passam ou passaram por algum tipo de interdição social, trazendo coragem e alegria como bandeiras.

Walmes Rangel

Atletismo

Num ambiente em que a diferença era vista como fraqueza e falha, Walmes Rangel foi o primeiro atleta olímpico brasileiro a se assumir gay. Sua orientação sexual tornou-se pública numa entrevista concedida por um colega do atletismo. Walmes sofreu bullying, ameaças e agressões. Perdeu patrocínios, mas ganhou a chance de ser ele mesmo. O garoto, que foi deixado em frente a uma igreja ao nascer, decidiu aos seis anos que chegaria a uma Olimpíada. Descoberto por um projeto social, realizou o sonho nos Jogos Olímpicos de Atlanta 1996. Mas, desiludido com o esporte, partiu para uma bem-sucedida carreira de cabeleireiro e maquiador, que o levou à Irlanda. Ser campeão não é estar no pódio, é vencer na vida.

Ser um campeão é também saber a hora de mudar. É saber dar certo e fazer o certo. Ser quem você é.

Walmes

Rangel

Walmes Rangel escreveu sua história com coragem e orgulho. Lutou pelo sonho olímpico, a despeito de todas as dificuldades, e conquistou o sonho de participar de uma olimpíada. A coragem o acompanhou mesmo quando decidiu seguir outro caminho, assim como a sua determinação pela qualidade.

Alana Maldonado

Judô Paralímpico

Incentivada pela avó, começa a praticar judô aos 4 e aos 6 anos começa a competir. Aos 14 anos, descobre uma doença degenerativa, que afeta a retina e causa a perda progressiva da visão. Em 2014, entra para o judô paralímpico e começa a cursar Educação Física. Alana chega a ser a atleta mais premiada dos Jogos Paralímpicos, se tornando a primeira mulher brasileira do judô a conquistar a medalha de ouro nos Jogos Paralímpicos 2021. Confirmada para Jogos Paralímpicos 2024, ela é campeã Mundial de Judô Paralímpico e Tetracampeã Brasileira. A atleta é casada com Wedja S. Maldonado, que também é atleta de judô.

Meu objetivo como atleta é inspirar outros atletas, outras meninas, a praticar e a mostrar a força da mulher, o quanto nós somos capazes de conquistar grandes resultados e quebrar grandes barreiras.

Alana Maldonado

Alana é casada com outra judoca, Wedja Santos Maldonado. Ambas expõem nas redes sociais aspectos de seu relacionamento amoroso com muita naturalidade, junto de outras postagens sobre treinamentos, relações familiares, viagens. Suas exposições serenas e positivas a respeito, ao lado de tantos outros assuntos que nos constituem diariamente, são como um sopro tranquilo que nos mostra como o mundo poderia – e pode – ser, com espaços seguros para as manifestações múltiplas do afeto humano.

Criar e refletir

Nos textos deste arco, SER LGBTQIAPN+, nos aproximamos de histórias de afirmações de identidade, buscando o respeito por sua diversidade plena. Vamos fazer uma prática a partir de um processo artístico, que nos instiga a refletir sobre nossa identidade e a do outro.

Esta prática pode ser feita com 3 ou mais pessoas.

Você vai precisar de:

Papel sem pauta (pode ser branco, sulfite comum, ou de qualquer cor)

Lápis ou canetas para desenhar Mesa ou prancheta para apoiar

A brincadeira aqui é estética e reflexiva, e vai funcionar num esquema de rodízio.

A cada rodada, sempre haverá uma pessoa sendo desenhada e outras duas desenhando. Prontos?

Para começar, cada um pega um papel e dobra ao meio. Aquele será o papel em que o seu retrato será feito. A seguir, decidam quem vai ser o primeiro a servir de “modelo” para o desenho. Os outros dois irão fazer o retrato do seu rosto.

Lembre-se: a cada rodada, uma mesma pessoa deve ser desenhada por outras duas. É importante que o desenho seja feito apenas na metade do papel e que fique bem combinado quem faz a metade esquerda e quem faz a metade direita. Para facilitar, vale combinar antes, com um risquinho, algumas marcações de orientação, como o topo da cabeça e o limite do queixo, por exemplo. Assim, os dois desenhos vão ter o mesmo limite da área do rosto da pessoa desenhada.

Quando terminarem, escrevam atrás o nome de quem foi retratado e o lado do rosto -

direito ou esquerdo. Guardem por enquanto, sem deixar que o modelo da vez veja.

Na rodada seguinte, outra pessoa será retratada, enquanto as outras duas fazem a metade de seu retrato, repetindo o processo. Depois que todos tiverem sido retratados, é hora de ver os desenhos.

Juntem a metade esquerda e a direita, formando o rosto. Vejam juntos, rosto por rosto e observem: as duas metades ficaram parecidas ou muito diferentes?

Olhar alguém é contemplar uma diversidade de elementos, um universo rico e complexo. Será que todos, ao nos olharem, veem as mesmas características como destaque? E quando olhamos para o outro, conseguimos abarcar sua complexidade?

Unsplash

E na arte...

Leonilson foi um importante artista visual brasileiro. Com obras que conjugavam delicadeza e força, trazia à tona seu universo pessoal e questionamentos de várias ordens. Em muitas de suas obras trazia à campo temas ligados a sua homosexualidade, fosse em declarações de amor, de receio ou de solidão. Misturando desenho e palavra, abordou de maneira muito sensível questões pessoais que tocam a vida do espectador de maneira pungente.

Para saber mais...

JESUS, Jaqueline Gomes de. Homofobia: Identificar e Prevenir. Rio de Janeiro. Metanoia. 2015.

LOURO, Guacira Lopes. Gênero, Sexualidade e Educação: Uma Perspectiva PósEstruturalista. Petrópolis. Vozes, 1997.

Princípio de Yogyakarta

Princípios sobre a aplicação da legislação internacional de direitos humanos em relação à orientação sexual e identidade de gênero. 2007. Disponível em: www.dhnet.org.br/direitos/sos/gays/ principios_de_yogyakarta.pdf/ Atualização Princípio de Yogyakarta 2017: yogyakartaprinciples.org/wp-content/ uploads/2017/11/A5_yogyakartaWEB-2.pdf Acesso em 15 mar 2020.

Livreto informativo Coletivo Abrace drive.google.com/file/d/1EZwgGoX_ sKPYB3miyNzlkGgSr4zgK3ZB/view

ONU. Nações Unidas e Direitos Humanos. Enfrentando a Discriminação Contra Lésbicas, Gays, Bissexuais, Travestis, Pessoas Trans e Intersexo - Padrões de Conduta para Empresas. Disponível em: www.unfe.org/wp-content/ uploads/2018/04/Padroes-de-condutapara-empresas.pdf Acesso em julho/2021.

ser migrante

Para começar a conversa

Ao analisar a história da espécie humana, uma pessoa poderia afirmar que somos seres migratórios. Uma segunda pessoa rebateria esta estranha classificação, que nos aproxima de andorinhas, salmões e gafanhotos. Afinal a cultura humana ergueu impérios norteada pelo desejo de permanência. Porém, a primeira insistiria que esta aventura sedentária seria apenas um intervalo na história humana, pois desde o surgimento do Homo Sapiens vivemos pouquíssimo tempo fixos em cidades. Na maior parte do tempo fomos nômades em busca de caça e ambientes favoráveis, e só após a agricultura assentamos de verdade. E a outra pessoa refutaria: só não tínhamos conhecimento suficiente antes, pois o que buscamos é estabilidade...

Brasil mais exporta do que recebe gente

Brasileiros no exterior

Edinanci

Estrangeiros no Brasil

O que faz um país exportar mais gente do que recebe?

Você já se sentiu estrangeiro?

O que faria você migrar para longe do seu lar?

Xenofobia é a aversão e ódio contra estrangeiros. Normalmente, é acompanhada de estereótipos e da ideia de que a própria cultura é superior à outra. Esse preconceito tornou-se mais comum com o grande número de migrações no mundo.

Este diálogo imaginário de opostos serve para evidenciar que migrações, por vocação ou necessidade, sempre caminharam ao nosso lado e nos formaram. Por meio delas, humanos partiram da África há 70 mil anos, para ocupar o mundo todo, gerando miscigenações, erradicações, aculturações e diversificações. Você já pensou que somos, de certa forma, todos parentes? Relacionados a ancestrais comuns que se espalharam pelo globo? Infelizmente, isto nunca evitou

sectarismos. Com o sedentarismo, surgiram propriedades privadas, cidades e nações. Sucederam guerras por fronteiras. As migrações continuaram, voluntárias ou não, decorrências de projetos de governos, segregações, guerras, miséria, desejos, oportunidades.

Hoje, em um mundo interconectado, onde a percepção do tempo e espaço se relativizou, as fronteiras geográficas parecem menos importantes que as econômicas. Ainda assim, resistem a uma globalização supostamente inevitável algumas tradições e culturas não-hegemônicas. A cada quatro anos, Jogos Olímpicos em constante mutação nos oferecem uma luz sobre como anda esta pulsão entre o particular/local e o universal/global.

As migrações? Elas persistem, tanto dentro de países, quanto entre nações, como pode atestar a diversidade de motivos e de histórias que levaram atletas migrantes – ou migrantes atletas - a abandonar seus locais de origem e permanecer em outros lugares.

Até quando existirão? Sempre que houver diferenças.

Fonte: Organização das Nações Unidas/2017

De onde eu vejo

- Ô alemão, passa a bola!

Uma irritação irrompia na infância. Não da solicitação pela bola, eu nunca fui fominha. Vinha de outro fato: eu também nunca fui alemão. O cabelo bastava para me associar a uma cultura com a qual eu não tinha relação específica, e eu sentia que, na esteira daquela nomeação, vinham ideias associadas sobre quem eu deveria ser. Isso me era especialmente incômodo. Nascido nos EUA, com seis meses já vivia definitivamente no Brasil. Era um detalhe, o do nascimento, que quando descoberto vinha seguido de uma inevitável pergunta: você é norte-americano? Não, mesmo que a lei me concedesse o privilégio da dupla nacionalidade em um mundo desigual, onde algumas pessoas não conseguem ter uma sequer. Afinal: é a lei que define onde pertencemos, pelo acaso do nascimento? São os genes dos antepassados que nos

identificam? Ou a cultura que nos envolve? Em um mundo crescentemente fluido, de deslocamentos, relações efêmeras e um mercado multinacional, a ideia de pertencimento também migra e rompe fronteiras, transformandose em caminho. Ideal seria estar onde quiséssemos, com autonomia para nos definir como parte do povo ou nação a qual queremos pertencer. Quanto a mim, sou brasileiro.

Alberto Duvivier Tembo é um educador e artista brasileiro, nascido nos EUA meio por acaso.

Metáforas, memórias e ancestrais

Metáfora é uma figura de linguagem especial. Abstrações ajudam a compreender conceitos complexos e abrem espaços para reflexões e interpretações.

Metaforicamente, podemos pensar em nossas vidas como um livro. Em uma moda de viola, foi cantado que cada um constrói a sua vida e sua história. Todavia, o prefácio do livro de nossas vidas já está escrito antes de nascermos. De modo múltiplo, com uma riqueza de cores, tons e estilos, nossos antepassados deixam marcas que vão aparecer novamente, ocultas ou explícitas, naquilo que nos caberá escrever.

Há migrantes voluntários, que tiveram a oportunidade da escolha de começar um novo capítulo nesse livro da vida. Há aqueles que foram obrigados a deixar para trás o lugar onde nasceram, e tiveram de começar um novo capítulo com a sensação que as páginas anteriores não tiveram um ponto final. Interrogações, exclamações, interjeições que acompanham para sempre as trajetórias.

Presente em nossa constituição biológica de maneira invisível a olho nu, pelos traços do DNA, a ancestralidade ganha força e visibilidade nas atitudes cotidianas e relações sociais. No sabor do alimento, nas cores das vestimentas, na construção do vocabulário, nas conexões com aqueles que nos rodeiam.

Como uma remada rumo à terceira margem do rio, quem busca a ancestralidade nem sempre conhece aquilo que procura. A única certeza é que nossa história começou mesmo antes de nós.

Ser Migrante é construir novos capítulos em novos locais. Não significa um divórcio com o passado. O pretérito que já foi escrito ganha novas interpretações a cada nova leitura.

William Douglas de Almeida Francano de nascimento, bauruense de coração e jundiaiense por opção. Pai da Aurora.

Fernando Meligeni

Tênis

Quis o destino que um dos melhores tenistas da história do Brasil nascesse na Argentina. Fernando Meligeni chegou ao Brasil com apenas quatro anos. Aqui cresceu e naturalizou-se brasileiro, a contragosto dos pais. Escolheu vestir a camisa verde e amarela. Num ambiente em que o atleta se torna símbolo da nação que representa, Meligeni era tratado como “argenta”, no Brasil, e “brazuca”, na Argentina, precisando provar a todo momento suas conexões com o país que abraçou. Ganhou ouro no Pan-Americano de Santo Domingo e alcançou o quarto lugar na Olimpíada de Atlanta, maior resultado de um tenista brasileiro em Jogos Olímpicos.

Fernando Meligeni “ ”

Sabe qual é a diferença entre nós?

Vocês nasceram no Brasil. Não tiveram escolha. Eu tive. Eu decidi ser brasileiro.

Meligeni, um argentino que enfrentou a família pelo desejo de ser brasileiro, precisou ainda resistir a um arrastado processo de naturalização. O que faz de alguém digno ou indigno de receber uma nacionalidade? O filósofo Zygmunt Bauman vem à mente: Quem sabe, em vez de falar sobre identidades, herdadas ou adquiridas, estaria mais próximo da realidade do mundo globalizado falar de identificação, uma atividade que nunca termina, sempre incompleta, na qual todos nós, por necessidade ou escolha, estamos engajados.

Edson Cavalcante

Atletismo Paralímpico

Filho de um soldado da borracha na Segunda Guerra Mundial, Edson Cavalcante nasceu no interior do Acre. No parto sem assistência, com falta de oxigênio, teve paralisia cerebral, o que prejudicou o movimento do braço e da perna direita. Só quando se mudou com a família para Rondônia, deu-se conta da deficiência. Lá descobriu o esporte. Começou no tênis de mesa e migrou para o atletismo, no qual conquistou bronze na Rio 2016. Ser atleta, vindo de onde veio, nunca foi fácil. Praticava em pista de terra. Como tantos, precisou correr o país em busca de treinamento. Vindo do seringal, pisou pela primeira vez numa pista de borracha em São Paulo, local em que hoje reside e, já veterano, consegue viver do esporte.

.

“ ”
Eu vim

de uma cidade do interior do Acre, bem distante, um lugar em que

a gente não tem muitas expectativas.
Édson Cavalcante

Edson, diferente de Meligeni, não precisou lutar para ter uma nacionalidade brasileira. Mas precisou lutar pela vida. Sua trajetória, saindo do Acre para Rondônia, e de lá para São Paulo, não se deu por identificação com outra cultura. Deu-se por uma necessidade de crescimento: a cada migração, Edson conseguiu melhores condições de vida e de treinamento. Encontrou realidades discrepantes dentro do seu próprio país e precisou migrar para se compreender, depois se destacar, e por fim, sobreviver do esporte. Quantos países existem dentro do Brasil? O que os une sob uma mesma bandeira?

Bruno Fratus

Natação

Nascido em Macaé, no interior do Rio de Janeiro, Bruno Fratus viveu uma infância e juventude de mudança de cidades. Devido à profissão do pai, as trocas de município eram constantes. As mudanças de grupos, e os traços de personalidade, também fizeram de Bruno um amante de esportes individuais, e foi na natação que ele se destacou. Treinando no Rio Grande do Norte, desbancou adversários do Pinheiros, tradicional clube paulistano, e com isso ganhou a confiança do treinador para mudar-se justamente para a Capital Paulista. Anos depois, em busca do aperfeiçoamento técnico, mudou-se para os Estados Unidos, onde vive até os dias atuais. Medalhista de bronze nos Jogos Olímpicos de Tóquio, não tem apenas uma cidade para chamar de sua, mas um país que ele sabe ser seu lar: o Brasil.

“ ”

No Brasil os atletas não são ouvidos. E existem muitas razões pelas quais eles deveriam ter voz. Por exemplo, o desgaste físico gerado pelo excesso de competições e o fato da maioria dos clubes tratarem os atletas como descartáveis. Sou prova viva disso, e conheço muitos outros que também passaram por essa situação.

Sair do Brasil permite a Bruno um aprimoramento não apenas técnico. Ao viver outra cultura, adquire um repertório que lhe permite enriquecer o debate sobre o esporte nacional - caso seja ouvido. Pois é esta a potência da abertura ao intercâmbio: melhorar todas as partes envolvidas.

Criar e refletir

Mundo em Movimento é uma vivência lúdica relacionada a fluxos migratórios, para ser jogada em ambientes de ensino, por no mínimo 10 pessoas. A partir de 12 anos.

Objetivo do grupo: terminar o jogo com a população igualmente distribuída pelos 4 países.

Objetivo individual: terminar o jogo no seu país de origem, ou conhecer todos os países.

Preparação: será necessário um dado e fita crepe:

A. Demarque 4 grandes áreas com fita no chão. Elas representarão 4 países ou continentes. Deixe um espaçamento entre elas para movimentação.

B. Em seguida, os países devem ser ocupados pelos jogadores, do modo mais equilibrado possível.

C. Os habitantes batizam seus países, que a partir daí serão chamados pelo novo nome.

D. Escreva esta lista:

1. Guerra

2. Pobreza Econômica

3. Desastre Ambiental

4. Conflitos internos

5. Migração Livre

6. Prosperidade

Início: Decida a ordem dos países. Cada país joga uma vez o dado por rodada. O número do dado define a ação do país:

1. Guerra: o país escolhe outro país para uma guerra de dados. Quem perder no dado será assolado por miséria, e perderá um habitante, que migrará para outro país –menos o que venceu a guerra.

2. Pobreza: A situação está terrível, e um habitante perdeu a esperança. Ele migrará para o país menos populoso do jogo.

3. Desastre Ambiental: Aquecimento global, desmatamento... impossível sobreviver. Dois participantes migrarão para países diferentes.

4. Conflitos: A desarmonia interna está enorme. Dois habitantes batalharão com dados. O perdedor torna-se um inimigo político do estado – e foge para outro país.

5. Migração Livre: Quaisquer habitantes podem migrar para outro país, se quiserem.

6. Prosperidade: A vida está ótima. Todo mundo quer morar aí. Vocês podem dar o visto para alguém de sua escolha.

O jogo tem 3 rodadas. Ao final, sobrarão países com configurações diferentes das originais.

Faça uma leitura com o grupo sobre o que aconteceu com tantos fluxos. Pergunte como se sentiram durante o jogo (exemplo: quando foram forçados a migrar) e relacione, se possível, a fatos históricos. Quanto mais você criar uma narrativa, melhor.

Adapte as regras, aumente as rodadas, crie desafios e use esta vivência para abordar as complexidades das migrações!

E na arte...

Você sabia que há uma corrente de artistas que usa caminhadas como um ato artístico?

A vertente surgiu na Inglaterra no fim dos anos 60, e com o passar do tempo migrou para o mundo todo. No Brasil, um exemplo é o artista Paulo Nazareth, que transformou sua migração em arte. O projeto Notícias de América, de 2011, consistiu em andar, a pé ou de carona, de Belo Horizonte até Nova Iorque. A aventura de 7 meses, foi registrada em diversas imagens em que o artista aparece com frases provocativas.

Para saber mais...

BAUMAN, Z. Globalização: As Consequências Humanas. São Paulo. Schwarcz - Companhia das Letras, 1999.

HALL, S. Da Diáspora. Belo Horizonte. UFMG, 2003.

MONTAGNA, P. Alma Migrante. Revista USP, v.0, n.114 SE - Dossiê Interculturalidades, 16 set. 2017. Disponível em: www.periodicos. usp.br/revusp/article/view/142371.

SANTOS, M. Por Uma Outra Globalização. Do Pensamento Único à Consciência Universal.

São Paulo. Record, 2000.

Conheça os atletas refugiados que competem nos Jogos Olímpicos e Paralímpicos de Tóquio 2020: UNHCR ACNUR Agência da ONU para Refugiados. Disponível em: bit.ly/atletasrefugiados

ALMEIDA, William Douglas de. Brasileiros, por que não? Trajetória e identidade dos migrantes internacionais no esporte olímpico do Brasil. Laços, 2019.

ser mulher

Para começar a conversa

Que perguntas nos fazemos quando pensamos no que significa ser mulher? Ou ainda, como são diferentes as maneiras de se perceber mulher no mundo em que vivemos? A famosa frase de Simone de Beauvoir “Não se nasce mulher, torna-se mulher“ segue atual e necessária.

As histórias de todas as mulheres são múltiplas, diversas, únicas. Ao mesmo tempo compartilham um campo comum, ainda que vivenciado de formas diferentes. A sociedade machista e patriarcal que é o pano de fundo das nossas experiências no mundo nos defronta com desigualdade de condições no mercado de trabalho, sobrecargas com filhos e responsabilidades domésticas. Feminicídio, assédio, silenciamento e violência de várias

ordens perseguem todas as mulheres. Algumas, entretanto, sentem um peso ainda maior de cada forma de abuso em suas vidas. É importante que levemos em conta que dentro do universo de ser mulher, há recortes fundamentais. A experiência de habitar o mundo de uma mulher branca é bastante diferente da que vive uma mulher negra, ou de uma mulher negra

Estruturas econômicas, participação em atividades produtivas e acesso a recursos

Tempo dedicado aos cuidados de pessoas e/ou afazeres domésticos

(horas semanas)

Diferença de rendimentos

(rendimento habitual médio mensal de todos os trabalhos)

A luta das mulheres no Brasil e no mundo pela equiparação de direitos e melhoria na sua qualidade de vida não é nova e segue pulsante. Como é de se imaginar, no esporte as histórias das mulheres se cruzam com estas experiências. As modalidades esportivas eram campo exclusivamente masculino. A partir de ações pioneiras abriram-se pouco a pouco a participação das mulheres. Ainda assim, as desigualdades seguem evidentes. Conseguimos imaginar com facilidade um atleta homem com filhos que tem uma rotina intensa de treinamentos.

Possivelmente nem nos perguntamos se eles tem ou não filhos. Nos sentimos do mesmo modo ao imaginar a vida de uma atleta mulher na mesma situação? Tendemos, mesmo que sem perceber, a classificá-las como guerreiras, às vezes glamourizando a superação das dificuldades impostas socialmente, sem refletir sobre as mudanças necessárias.

Vida pública e tomada de decisão

Representação política / 2017

Cargos gerenciais / 2016

dos assentos na câmara dos deputados são ocupados por mulheres No mundo, as mulheres ocupavam 23,6% dos assentos 10,5% ocupados por homens ocupados por mulheres 62,2% 37,8% x

Ano referência: 2016. Fonte: IBGE, Diretoria de Pesquisas, Coordenação de População e Indicadores Sociais.
Homens
Total
Branca
Preta ou parda Mulheres
Fonte: IBGE, Diretoria de Pesquisas, Coordenação de População e Indicadores Sociais.

De onde eu vejo

Qual foi a primeira vez que você percebeu o machismo na sua vida? Me lembro de quando senti que o jogo não era o mesmo para todos. Quando criança, era comum frequentar eventualmente o trabalho da minha mãe depois da escola. Eu me divertia, mas não tinha a dimensão de que ela não tinha outra escolha. Éramos nós duas e só, do meu pai não ouvia nada ou mesmo o via já há bastante tempo. Foi assim por muitos anos, e só mudou quando eu fui atrás de retomar o contato com ele. Naquela época, era comum receber amigos em casa. A música era convidada certa, assim como boa comida, mas nunca entendi por que, na hora de arrumar as coisas, os homens eram acometidos por algum tipo de moleza e só as mulheres tiravam a mesa e lavavam a louça… Isso se repetiu com tanta recorrência no contato com outras famílias ao longo da vida que a certa

altura começou quase a parecer natural. Quase. Um dia, décadas depois, ouvi de um conhecido que estava feliz por ter feito um ateliê do lado de fora da casa, assim podia trabalhar com tranquilidade sem ser interrompido por seus filhos. Olhei para minha bebê, a caçula, e pensei se as crianças dele desapareciam como mágica quando ele fechava a porta. As minhas, não, nunca. E certamente as da esposa dele também não.

Stella Ramos é uma mulher cis, educadora, artista e mãe de dois filhos.

Empoderamento

Há quem já ouviu falar em Empoderamento, palavra que ressoa na vida de muitas pessoas. Mas, você já procurou saber sobre essa definição? Então vamos lá: “Passar a ter domínio sobre a sua própria vida; ser capaz de tomar decisões sobre o que lhe diz respeito. Exemplo: empoderamento das mulheres.”

Empoderar é trazer para si a consciência de que seu corpo está sob seu domínio. Palavras de ordem como “meu corpo, minhas regras”, “jogue como uma garota”, “meu black é power” demonstram esse conceito. É um processo de entendimento da quebra de paradigmas. Empoderar é dar poder de decisão, é poder ser cidadã, é ter direitos humanos.

Empoderar mulheres é afirmar o individual numa consciência coletiva feminina. É entender que a afirmação mulher sexo frágil resulta de um imaginário masculino dominador, que não foi capaz de impedir ações de mulheres como: Maria Amélia Queiróz, que lutou pela abolição da escravatura; Nísia Floresta com a publicação de seu livro “Direito das Mulheres e injustiças dos homens”; Maria Bonita, a mulher que participou de um grupo de cangaceiros. Assim, abriuse espaço para que Seiko Hashimoto fosse a Presidente da Comissão Organizadora dos Jogos Olímpicos de Tóquio, em 2021. Todo poder às mulheres.

Ser Mulher é ultrapassar as barreiras que respaldam o caminhar. É entender sobre seu poder e suas múltiplas ações. Para tanto é preciso ressignificar o caminho e assim empoderar outras mulheres. O coletivo é mais do que a soma de individualidades. É a sua interação. É entender que Lugar de Mulher é onde ela quiser.

Ellen Moraes Scherrer

Filha de Méa Olivia e Etiel Scherrer, feminista negra, criadora de conteúdo, ex-atleta, profissional da educação física e pesquisadora.

ser mulher

Camille Rodrigues

Natação Paralímpica

Camille Rodrigues é nadadora, bailarina e digital influencer. Coleciona medalhas paralímpicas nas piscinas do Brasil e do mundo, e milhares de fãs nas redes sociais. Por causa de uma má formação congênita, teve a perna amputada ainda criança. A prótese ela exibe com orgulho, mostrando a todos que lugar de mulher com deficiência também é onde ela quiser. Sua atuação dentro e fora do desporto é símbolo de representatividade e quebra de paradigmas. Medalhista de ouro nos Jogos Parapan-Americanos de Toronto, ela já se apresentou com a cantora Anitta e na abertura do Fantástico. A dança a ajudou a gostar do próprio corpo e, através dela, Camille segue empoderando outras pessoas por aí.

Eu posso dizer que eu sou uma mulher que influencia pessoas, que eu sou independente, empoderada - a gente adora falar isso agora. Minha personalidade é muito forte e isso tem tudo a ver.

Camille Rodrigues

Camille nos lembra o quão redutor é definir alguém a partir de um único aspecto – seja gênero, compleição física, ocupação. Ela não é apenas atleta. É nutricionista, ocupação profissional a que também se dedica; é dançarina, presente em videoclipes, programas de TV e eventos; é influenciadora digital com mais de 750 mil seguidores, dentre Instagram e Tik Tok, que expõe suas opiniões e seu corpo sem medo de sua sensualidade natural. Camille é uma mulher múltipla - como tantas outras, que muitas vezes são (ainda) vistas apenas por um aspecto de suas vidas, como o matrimônio, o lar ou a maternidade.

Comitê Paralímpico

Yane Marques

Pentatlo Moderno

Natural do Sertão de Pernambuco, Yane Marques firmou-se campeã, numa modalidade tradicionalmente masculina e de influência militar. Desde 1912, o Pentatlo Moderno integra os Jogos Olímpicos, mas apenas no ano 2000 a participação feminina foi permitida. Nas Olimpíadas de Londres, Yane foi lá e trouxe para o Brasil a primeira e única medalha do país nesse esporte, uma conquista que nenhum homem conseguiu. Eleita Presidente da Comissão de Atletas do COB em 2021, Yane é gestora na Secretaria Executiva de Esportes no Recife. Num mundo ainda tão desigual, abre brechas com sua própria trajetória e conquista território para todas. A existência de uma mulher em papel de liderança será sempre política.

Yane Marques “ ”
Queria que esta fosse a última Olimpíada com só uma atleta do Brasil no pentatlo moderno.

A trajetória de Yane é inspiradora para muitas meninas. É importante povoar o campo da imaginação com mulheres que ocupam lugares em que com frequência vemos apenas homens. Não basta declarar um desejo de equidade ou mesmo afirmar sua possibilidade. Na prática, as mulheres precisam caminhar muito mais para ocupar espaços que estão tacitamente abertos aos homens. A sensação de interdição nos é transmitida silenciosamente. Quando uma mulher quebra essas barreiras, entretanto, seu exemplo ecoa alto no imaginário de todas e de todos nós.

Fernanda Garay

Vôlei

Fernanda Garay Rodrigues, mais conhecida como Fe Garay, nasceu no dia 10 de Maio de 1986 em Porto Alegre, capital do Rio Grande do Sul. Estimulada desde pequena ao esporte por conta de sua família, Fe Garay inicia no voleibol aos 11 anos e se destaca rapidamente na modalidade, sua história em Ser Mulher atleta conta com grandes conquistas e se torna referência por suas decisões de estar e se envolver no esporte, levando-a ao cenário internacional esportivo e destaque na seleção brasileira. Entre suas medalhas, Fe Garay conquista a prata no mundial no Japão em 2010 e bronze na Itália em 2014 e as sonhadas medalhas Olímpicas, ouro em Londres 2012 e prata em Tóquio 2021, ano que anuncia sua aposentadoria nas quadras e, nesta edição dos Jogos Olímpicos 2024, ela estreia como comentarista de vôlei na Rede Globo.

“ ”

Vocês não devem fazer ideia do quanto é difícil para nós mulheres atletas entendermos nossa decisão de interromper nossa carreira para realizar o sonho de ser mãe. (...) Mas às vésperas de completar 35 anos, e depois de ter tomado um susto muito grande com relação à saúde, eu tive a certeza no meu coração de que esse é o momento e que não valeria mais a pena esperar por isso.

Fernanda Garay

É preciso coragem para reverter o funcionamento naturalizado das coisas, pois muitas vezes elas podem negar nossas naturezas. Fernanda demonstrou muita coragem, não apenas ao sair de quadra, mas também ao se reinventar fora dela. Em constante transformação, constituiu-se em voz ativa contra o racismo; e descobriu-se ao longo deste processo uma comunicadora carismática. Fê Garay, uma mulher cada vez mais admirável.

Comitê Olímpico do BrasilCOB

Criar e refletir

Pensar sobre o que significa algo feminino pode parecer simples. Será que é tão fácil cercar tudo que este universo contempla? A própria experiência de ser mulher, como já vimos, é muito diversa e cheia de nuanças. Vamos tirar partido desta multiplicidade para uma atividade poética. Num poema as palavras são usadas em toda sua versatilidade e potência: som, imagem, múltiplos significados.

Prontos para o Jogo de Palavras?

A atividade foi pensada a partir de dois participantes, mas fica mais interessante se você puder chamar mais gente. Podem ser familiares, amigos ou mesmo sua turma de alunos.

Para isso, leia bem o conjunto todo. Vale pensar que a interpretação de cada palavra muda a partir dos olhos de quem lê.

O material é bem simples: tiras de papel recortadas, do tipo que você tiver à mão, além de canetas ou lápis e seu pensamento.

Começa assim: cada um ganha o mesmo número de tiras. Podem ser dez para cada um. Você deve escrever, em cada uma delas, uma palavra que associa à ideia de Feminino

Atenção, a regra é clara: você pode escrever apenas uma palavra por tira, nada mais e nada menos.

Pronto? A seguir, recolha todas as tiras que foram escritas, e as misture bem. Agora é hora de sortear dez palavras para cada participante, do conjunto todo. Como as palavras foram todas misturadas, cada um vai receber um conjunto bem diverso de ideias, expressas nas palavras.

Hora de colocar a mão na massa: dessas dez palavras que você recebeu, deve usar no mínimo sete para escrever um poema.

Reflita e a partir da sua escolha deixe a escrita fluir, pensando nas imagens e nos sons como parte importante da construção poética. Você pode usar uma palavra em cada verso, ou ainda usar mais de uma se achar que funciona bem.

Lembre-se: as palavras das tiras vão compor o texto final que vocês irão escrever na forma de um poema.

Ao final, leiam os de todos e conversem sobre o que se transformou no olhar de vocês neste processo. A ideia é quebrar estereótipos sobre o feminino, ampliando o olhar sobre este universo: como as mulheres se veem e como são vistas? Aproveite a atividade para observar a si mesmo e sua relação com esta multiplicidade.

E na arte...

Há muitas artistas que trazem as lutas das mulheres como tema fundamental de seu trabalho. O coletivo Guerrilla Girls, embora seja norte americano, problematiza a visibilidade e a participação de mulheres no campo das artes e dos museus em diversos lugares do mundo. Em 2017 elas montaram uma exposição em São Paulo, no Masp, trazendo cartazes que deixavam bem visíveis os parâmetros diferentes para artistas homens e mulheres em diferentes lugares do mundo. Apresentam-se sempre com máscaras de gorila, em ações performáticas que problematizam o uso da imagem da mulher no cotidiano e na história da arte.

Para saber mais...

DAVIS, Angela. Mulheres, Raça e Classe. Tradução de Heci Regina Candiani. São Paulo. Boitempo, 2016.

HOOKS, Bell. O Feminismo é Para Todo Mundo: Políticas Arrebatadoras. 1 ed. Rio de Janeiro. Rosa dos Tempos, 2018.

RUBIO, Katia (Org). Mulheres e Esporte no Brasil: Muitos Papéis, Uma Única Luta.

São Paulo. Laços, 2021.

Documentário Mulheres Olímpicas Produção de Laís Bodanzi.

São Paulo. ESPN, 2013. Disponível em: www.espn.com.br/video/583320_ mulheres-olimpicas-assista-aodocumentario-na-integra. Acesso em 07/2021.

Instituto Mattos Filho. Direitos das Mulheres. 2020. Disponível em: www.politize.com.br/equidade/tema/direitosdas-mulheres/?gclid=Cj0KCQjwxJqHBhC4ARI sAChq4atpz1sxKin9MxNBwBg7lxxtFIDMxDXyq _61UAm7faqiDYf-Z4WXtEkaAkTHEALw_wcB. Acesso em 07/2021.

Para começar a conversa

ser negra e ser negro

Dentre tantas formas de SER, de existir no mundo, está a de SER negra e SER negro. A cor da pele é a qualidade que salta aos olhos, revelando parcialmente essas identidades tão diversas. Em comum, uma história marcada pela diáspora africana, a imigração forçada de seus antepassados que pertencentes a distintas regiões e etnias deste grande continente cruzaram o Atlântico em direção às Américas. Em meio a escravidão a que foram submetidos, estes povos e culturas vem entrelaçar aqui seus saberes, histórias, memórias e afetos reinventando suas identidades e formas de existência.

É importante considerar que a abolição da escravidão não ocorreu por um gesto de benevolência imperial, mas foi resultado

Qual a cor/ raça do seu chefe?

Atual e último, entre aqueles que já tiveram um chefe

Brancos 65%

Pardos 22%

Pretos 10%

Amarelos 3%

Índios 1%

Fonte: Observatório das Desigualdades: O Racismo no Mercado de Trabalho em Infográficos, 2020

de pressões e revoltas protagonizadas por negras e negros escravizados e abolicionistas. O que se segue é a construção de uma República que dá continuidade a uma estrutura desigual e opressora. O temor da expressiva presença negra em nosso país é motivo de políticas públicas declaradas que buscam apagá-la a todo custo. Este foi o caso, por exemplo, da promoção da imigração de europeus, no início do séc XX que visava um gradual embranquecimento da população. Os apagamentos e negação de direitos ainda permanecem como base de nossa estrutura social, mesmo que de forma velada. Frente a estas questões o que é ou tem sido SER

negra e SER negro neste país? De que forma vivenciam tantos discursos contraditórios, que ditam seus modos de SER e moldam tão profundamente nossa consciência, imaginário e relações sociais? Como, enquanto brasileiros, não nos chocamos diariamente com a ausência negra em tantos âmbitos de nossa sociedade? A necessidade de compreensão e luta é constante. No esporte, assim como em vários outros

campos sociais, homens e mulheres negras exercem sua expressão e centralidade e assim traçam suas próprias narrativas, inspirando tantos outros. De formas diversas ocupam seu estar no mundo, exigem seus direitos, alargam fronteiras em meio a muitos enfrentamentos e opressões. SER aquilo que se tem desejo de SER. Ter a liberdade de SER o que se é e de deixar-se vir a ser.

Quem são as vítimas de ofensas racistas no futebol

Dos 82 (oitenta e dois) casos que dizem respeito à discriminação racial no futebol:

fazem parte do quadro de arbitragem ou são ex-árbitros 9,75%

Quem são os acusados de cometer ofensas racistas no futebol

Dos 82 (oitenta e dois) casos que dizem respeito à discriminação racial no futebol:

a agressão partiu de outro atleta

Anual da Discriminalização Racial no Futebol. 2019.

De onde eu vejo

Sempre tive grande afinidade e admiração pela expressão da cultura negra brasileira, principalmente por meio da música e das artes visuais como também muito interesse nas questões sobre a história e cultura afrobrasileira. Isso, no entanto, não tornou mais fácil a escuta de discursos mais dolorosos, duros e enfáticos sobre os processos de violência sofridos pela população negra. A urgência destas vozes e a impossibilidade de uma troca afetiva causava em mim uma certa recusa de me deixar afetar por elas. Foi nos últimos anos, como formadora de equipes de mediadores culturais que a questão de ser negro e negra no Brasil chegaram até mim de maneira avassaladora e transformadora.

A forte presença de jovens negros como educadores-estagiários nas exposições de arte, fruto, entre outras coisas, das políticas de ações afirmativas nas universidades, tornou possível encontros potentes em meio

a um clima de escuta, troca, confiança e respeito. Pude acompanhar em uma das exposições - Geringonças de Mestre Molina – um singelo relato que revelou a dor do educador negro ao se deparar com a leitura recorrente por parte do público da obra Vida na Roça, somente com uma cena da escravidão, sem outras possibilidades de imaginários e narrativas. Naquele momento compreendi melhor a intensidade e por vezes agressividade daquelas falas e acolhê-las e legitimá-las tem sido para mim mulher branca um movimento libertador.

Thelma Löbel é mulher, branca, educadora, pesquisadora e mãe de Ana Clara, de 8 meses.

ser negra e ser negro

Tornar-se Negro: uma revolução em curso

Tornar-se Negro é, em essência, uma tarefa revolucionária que não se encerra no encontro de homens e mulheres com identidades culturais ressignificadas. Trata-se, fundamentalmente, de um acerto de contas da história com humanidades irredutíveis, herdeiras de uma fortuna ancestral que lhes foi roubada, mas que seria imediatamente reivindicada na modernidade, mediante luta e resistência.

Nesse contexto, a palavra Negro vai deixar de ser mero recurso colonial de designação da “degradação da raça”, para se tornar, no seio dos movimentos abolicionistas e anticoloniais, um símbolo de liberdade, de humanidade inalienável e de diferenças incontestáveis. No Brasil, há pelo menos cento e vinte milhões de formas de ser negro e negra. E há quem, com razão, reivindique dessas experiências a sua porção latino-americana e transnacional.

Mas embora a negritude ocupe hoje o centro do debate sobre os direitos de ser, o corpo negro continua sendo o alvo principal de um sistema econômico e jurídico que insiste em fazer do racismo a sua coluna vertebral e das violências institucionas uma política. A isto se soma um conjunto de violências simbólicas, responsáveis por transformar relações cotidianas em verdadeiras guerras de interdição às formas de ser negras. Realidade que se expressa no esporte de modo exemplar, mas nunca sem resistência dos seus protagonistas.

Parte dessa resistência é partilhada por nós, que assumimos a tarefa de cultivar o encanto crítico dessas trajetórias negras, cientes de que a disputa pelo reconhecimento também precisa ser vencida no plano da memória e da história.

Osasquense de nascença, carapicuibano de formação, antirracista com forte apelo anticapitalista, o maior fã do D’Angelo que esse país já conheceu.

Melânia Luz

Atletismo

Provavelmente não exista nome mais apropriado para a primeira mulher negra do Brasil a brilhar em uma edição olímpica. Melânia Luz dos Santos nasceu no Bom Retiro, capital paulista, em 17 de maio de 1928. Especialista em provas de velocidade e salto em distância, disputou os Jogos Olímpicos de Londres, em 1948. Vestindo a camisa do São Paulo Futebol Clube e do Clube Esperia, esteve entre as melhores do circuito nacional e sul-americano entre os anos 1945 e 1950, compondo assim a constelação de atletas negros que dominaram a cena esportiva nacional e olímpica da primeira metade do século XX. Encerrou a carreira precocemente para assumir a função de enfermeira. Sabendo mensurar o tamanho do seu feito, afirmou: “Competi, entrei para a história, não é que me deixaram”.

Para valorizar o pioneirismo de Melânia é preciso entendê-lo. Em uma época patriarcal, onde a inserção feminina no esporte enfrentava resistência, sob o argumento de uma “virilização “ da mulher, ela avançou. Saltou por entre as contradições de uma sociedade em que clubes e agremiações contratavam atletas negros e negras, mas barravam suas presenças em setores e ocasiões solenes. Ela ocupou um espaço de destaque normalmente vetado à mulher, e mais ainda à mulher negra, simplesmente pela sua excelência. Melânia nunca largou o emprego que tinha na área da saúde,

e que a sustentava financeiramente. Pouco a pouco foi se afastando do esporte, mas seu legado, recentemente revisitado, permanece cada vez mais junto de nós.

“ ”

Hoje o negro, ele é mais atrevido. Ele quer fazer, ele vai lá e faz. Naquela época não existiam tantos atletas negros, hoje tem muito mais.

Melânia Luz

Roseane Santos

Atletismo Paralímpico

Roseane Ferreira dos Santos tinha 18 anos e era empregada doméstica, quando foi atropelada e teve a perna amputada.

“A gente já sofre preconceito por ser negro, pobre, mulher, agora deficiente... Era muito peso pra carregar”. O esporte descortinou um novo mundo, que aliviou esse fardo. Especialista em arremessos de dardo, disco e peso, Rosinha é dona de dois recordes mundiais e duas medalhas paralímpicas. Mirou certeira no sonho até então distante de viajar e comprar uma casa para a mãe. Alcançou, não sem dificuldades. Competiu em meio a um tratamento de câncer; precisou de uma vaquinha para se preparar para os Jogos de 2016. Nunca perdeu o bom-humor. A adversidade, ela transforma em sabedoria.

Abraçar a vida com paixão, perder com classe e vencer com ousadia. Porque o mundo pertence a quem se atreve e a vida é muito para ser insignificante.

Rosinha

O esporte nos inspira e arrebata com suas histórias repletas de determinação, coragem e superação. Como não se emocionar com uma trajetória como a de Rosinha, tão humana, cheia de enfrentamentos, dores, superações, realizações e reviravoltas. Até onde pode chegar nossa vontade, nossos sonhos? Quais barreiras esta mulher, negra, deficiente - que representa tantas outras - precisa transpor diariamente? Em meio a tantas adversidades, no anseio de “ser alguém”, a vida lhe trouxe possibilidades de virar o jogo. O desafio foi aceito. Após tantas vitórias ela não se ilude. Longe dos pódios e consciente de sua história volta-se finalmente para o maior dos desafios: a descoberta de si.

Alfredo Gomes

Atletismo

Neto de escravizados, o corredor Alfredo Gomes foi o primeiro atleta negro brasileiro a disputar uma Olimpíada. Naqueles Jogos de 1924, em Paris, carregou a bandeira verdeamarela na cerimônia de abertura. No ano seguinte, cravaria mais uma vez seu nome na história, ao vencer a primeira Corrida de São Silvestre. A namorada, quando engravidou, terminou o relacionamento sem lhe dizer nada. Persuadida pelo racismo de sua época, se viu obrigada a não se casar e a esconder da filha a existência do pai negro, dado como morto. Os olhares da discriminação ele percebia no esporte e no trabalho de técnico e inspetor de telefonia, função que desempenhou por 50 anos. Através do esporte, fez-se herói preto, em um país que se queria branco.

Aquela enorme multidão que se comprimia pelas ruas me aplaudia como se eu fosse um candidato real ao título da XXX Corrida de São Silvestre. Eu ouvia aquelas vozes a me estimular: “Vamos Alfredo, Vamos Alfredo”, Todos me aplaudiam e me animavam com gritos e palmas.

“ ”

Alfredo Gomes

Outro pioneirismo, que lhe rendeu notoriedade, foi ser o primeiro ganhador da Corrida de São Silvestre, em 1925. Trinta anos depois, com 55 anos, correu novamente a tradicional corrida, com o único desejo de cumprir seu trajeto. E recebeu, merecidamente, seu reconhecimento popular.

Arquivo
pessoal

Criar e refletir

Para existir e não apenas resistir é necessário imaginar, sonhar, se amar e ter a liberdade de traçar os próprios significados e destinos.

Muitas das histórias e memórias de homens e mulheres negras sofreram constantes processos de negação e apagamento, não sem muita luta. Cabe a todos nós caminhar no sentido de recuperar o tamanho do mundo fazendo vir a tona a diversidade de visões e entendimento sobre ele.

Histórias como a de Alfredo e Rosinha são repletas de acontecimentos, enfrentamentos e superações dignas de verdadeiros heróis e heroínas. É preciso celebrá-las, sem, no entanto, romantizar ou naturalizar as violências pelas quais estas pessoas negras passaram. Por outro lado, ver a presença delas no esporte nos ajuda a reconhecer outras centralidades, potências, discursos e imagens. Você conhece heróis e heroínas com rosto africano? Eles e elas estão por toda parte.

Em sua pesquisa, Neilton Ferreira Júnior problematiza dimensões simbólicas que envolvem o campo esportivo de um modo geral, mas que atravessam as trajetórias negras de modo particular. Apoiado em Clyde Ford, o pesquisador identifica que a condição do herói olímpico negro se impõe no esporte como um ato de resistência às estruturas que forjam a negação da sua humanidade.

A partir destas reflexões e inspirações reúna seu grupo e proponha o seguinte desafio:

1

Pesquisar sobre a história de vida de uma personalidade negra inspiradora, pode ser uma pessoa comum ou preferencialmente não muito conhecida.

2 3 4

Escrever esta história com suas palavras, uma página no máximo

Formar duplas de trabalho, cada um deve narrar sua história para o colega

A partir da escuta desta história, fazer uma imagem/representação bidimensional - pintura ou desenhotendo como objetivo uma imaginação mais generosa e diversificada de homens e mulheres negras

Para Inspirar

Conheça as obras, que fazem parte do acervo do Pinacoteca de São Paulo, que ilustram o livro Enciclopédia Negra, de Flávio dos Santos Gomes e Lilia Moritz Schwartz. (consultar Para saber mais...).

Conheça também a série Heróis de Todo Mundo que retrata personalidades da cultura afro-brasileira que se destacaram na história do Brasil (consultar Para saber mais...).

Comitê Olímpico do BrasilCOB
Diogo Silva

E na arte...

Rosana Paulino é mulher, negra, artista visual, pesquisadora e educadora. Sua produção é ligada a questões sociais, de gênero, identidade e representação negra. Em sua obra Parede da Memória, de 1994, questões como história, afetividade, violência e silenciamento se destacam. Nela, a artista utiliza retratos de seu arquivo familiar impressos em pequenas almofadas bordadas ao modo de patuás. Entre as imagens, a presença do homem branco nos faz pensar sobre a miscigenação como base destas relações e da formação das famílias brasileiras. Conheça o site da artista: www.rosanapaulino.com.br

Para saber mais...

ALMEIDA, Silvio. Racismo Estrutural. São Paulo. Sueli Carneiro - Pólen, 2019. Coleção Feminismos Plurais.

ESCRIVÃO, Marco; MENDONÇA, Thiago B; CALASANS, Laura. Procura-se Irenice. 2016.

Disponível em: fb.watch/v/3LKrhcAs_/ Acesso em junho de 2021.

FERREIRA JÚNIOR, Neilton de Sousa.

Revisitando a “Raça” e o Racismo no Esporte Brasileiro: Implicações para a Psicologia Social. In: RUBIO, Katia; CAMILO, Juliana (Orgs). Psicologia Social do Esporte. São Paul. Képos, pp. 183-208, 2019.

FERREIRA JÚNIOR, Neilton de Sousa. O

Herói com Rosto Africano e o Atleta Olímpico Negro. In: RUBIO, Katia (Org.). Esporte e Mito. São Paulo. Laços, pp. 199-220, 2017.

Heróis de Todo Mundo. A cor da Cultura. Disponível em: https://bit.ly/3k1wM4x Acesso em junho de 2021.

SOUZA, Neusa Santos. Tornar-se Negro ou As Vicissitudes da Identidade do Negro Brasileiro em Ascenção Social.

Rio de Janeiro. Graal, 2ª ed., 1983.

TEIXEIRA, Marina Dias. Enciclopédia Negra: Pesquisadoras Indicam Personalidades. Site: SP Arte 365, 2021. Disponível em: https://bit. ly/3hRKVyu. Acesso em junho de 2021.

Programa de Atividades para a Implementação da Década Internacional de Afrodescendentes. Nações Unidas. 2021. Disponível em: decada-afro-onu.org Acesso em julho de 2021.

A exposição virtual Ser Atleta apresenta a história de 30 atletas, divididos nos 5 arcos presentes na exposição. A seguir, a lista de todos os atletas contemplados na exposição, e o convite para que pesquisem a história notável destes atletas do esporte nacional.

ser diferente?

Elizabeth Gomes - Atletismo Paralímpico

Darlan Romani - Atletismo

Evelyn Vieira - Bocha Paralímpica

Fabiana Alvim - Vôlei

Joana Neves - Natação Paralímpica

Maria Elisabete - Halterofilismo

ser lgbtqiapn+

Alana Maldonado - Judô Paralímpico

Edênia Garcia - Natação Paralímpica

Ian Matos - Salto Ornamental

Isadora Cerullo - Rúgbi

Júlia Vasconcelos - Taekwondo

Walmes Rangel - Atletismo

ser migrante

Bruno Fratus - Natação

Edinanci Silva - Judô

Edson Cavalcante - Atletismo Paralímpico

Fernando Meligeni - Tênis

Juliano Di Fiori - Rúgbi

Maurício Dumbo - Futebol de Cinco

ser mulher

Benedicta Oliveira - Atletismo

Camille Rodrigues - Natação Paralímpica

Fernanda Garay - Vôlei

Jackie Silva - Vôlei / Vôlei de Praia

Joanna Maranhão - Natação

Yane Marques - Pentatlo Moderno

ser negra e ser negro

Alfredo Gomes - Atletismo

Diogo Silva - Taekwondo

Melânia Luz - Atletismo

Milton Costa de Castro - Atletismo

Raíssa Rocha Machado - Atletismo Paralímpico

Roseane Santos (Rosinha) - Atletismo Paralímpico

Sesc – Serviço Social do Comércio

Administração Regional no Estado de São Paulo

Presidente do Conselho Regional

Abram Szajman

Diretor do Departamento Regional

Luiz Deoclecio Massaro Galina

Superintendentes

Técnico-Social

Rosana Paulo da Cunha

Comunicação Social

Ricardo Gentil

Administração

Jackson Andrade de Matos

Assessoria Jurídica

Carla Bertucci Barbieri

Gerentes

Desenvolvimento Físico-Esportivo Carolina Seixas

Artes Visuais e Tecnologia Juliana Braga de Mattos

Estudos e Programas Sociais Flávia Carvalho Artes

Gráficas Rogerio Ianelli Estudos e Desenvolvimento

João Paulo Guadanucci Sesc Digital Fernando Amodeo

Tuacek Sesc Itaquera Ricardo de Oliveira Silva

Exposição Virtual Ser Atleta

Curadoria Katia Rubio

Assessoria de Diversidade Adriana Inês de Paula, Ellen Moraes Scherrer, Leonardo Morjan Britto

Peçanha, Neilton de Sousa Ferreira Junior e William Douglas de Almeida

Equipe Sesc Adriano Alves Pinto, Alessandra Aparecida

Neves Garcia, Alexandre Kesper Pimenta, André Dias,

Beatriz Souza Pereira, Bruno Serrano Lucca, Caio

Mombeli Desiderio, Carlos Eduardo Santos Almeida,

Claudia Regina de Souza, Eduardo Garcia, Elder Regis

Deorato Marques, Fabiano Cersossimo Gonçalves,

Guilhermo Bonini Panebianco, Gustavo Higa Yoshioka,

Isadora Cunha Poci, Jaynne de Souza Cardeal, Juliana

Okuda Campaneli, Juliane Lorena, Karina Carmargo

Leal, Lourdes Teixeira Benedan, Mariana Martelli, Regina Gambini, Ricardo Carrero, Ricardo Tacioli, Roberta Lobo, Sergio Gobbo, Silvia Hirao, Simone

Araújo de Souza, Simone Gomes Mello Alves Pereira

Nascimento e Ubiratan Rezende

Produção Esportiva Fluture Produções e Eventos Ltda.

Produção Artística Loma Filmes

Direção Fernando Nogueira

Produção Executiva Fernando Nogueira e Heloisa

Jinzenji

Produção Heloisa Jinzenji, Carolina Kotscho

e Clara Ramos

Assistente de Produção Alayne Ferreira

Designer Gráfico - Identidade Visual Carla Sarmento

e Patrícia Gonçalves

Roteiro Dillner Gomes

Direção de Fotografia Anna Júllia Santos

Técnico de Som Tomás Franco

Montagem Danilo do Valle

Trilha Sonora Original Dan Zimmerman

Recursos de Acessibilidade All Dubbing Group

Ação Educativa Zebra5 - Alberto Duvivier Tembo

Press-kit e Diagramação do Material de Mediação

Educativa Karen Gameiro

Parceria Institucional COB - Comitê Olímpico do Brasil e CPB - Comitê Paralímpico Brasileiro

instagram.com/sescitaquera

youtube.com/sescitaquera

facebook.com/sescitaquera

Parceria Institucional: Realização:

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