Exposição Quem Sou Eu?

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Quem sou eu?

Eu sou o silêncio que escuto de ti

Você é a história que escuta de mim

Sou o outro que vive dentro de mim Você sou eu? Eu sou nós?

Ouça primeiro

Primeiro, ouça Todo mundo tem uma história para viver Todo mundo tem uma vida para contar

Uma história pode mudar seu jeito de ver o mundo O futuro dos museus está nas nossas próprias casas Os museus do futuro serão nossas próprias vidas

As histórias de vida serão como as pirâmides do Egito Quem sou eu? Eu sou nós?

Museu da Pessoa

Você faz parte da História

A História faz parte da sua vida Museu da Pessoa

Um grande ouvido para o mundo

Karen Worcman


QUESTÃO DE IDENTIDADE

A identidade de cada indivíduo pode ser entendida como uma construção social que se dá na relação do eu com o outro, num processo que envolve a percepção e o reconhecimento da diferença. Para que essa construção seja elaborada de maneira plural, superando ou minimizando posturas egocêntricas e/ou etnocêntricas, o diálogo e o convívio com o diverso são fundamentais. A partir do entendimento da importância do lugar da fala e da escuta, da compreensão de que somos, essencialmente, seres sociais e de que as narrativas dos eus são capazes de gerar outros em nós mesmos, o Museu da Pessoa desenvolve seu trabalho há 25 anos. Ao longo do tempo, a instituição constituiu um acervo de histórias e memórias de pessoas que não teriam seus testemunhos registrados por uma certa historiografia oficial, mas cujas vivências permitem uma compreensão mais aprofundada de nossa sociedade. Parte desse acervo, digitalizado e tratado com o apoio do Sesc, é agora apresentado na exposição Quem Sou Eu? e serviu como fonte de criação para os três artistas/curadores, Cristiano Burlan, Diógenes Moura e Viviane Ferreira, cujos espaços poéticos e imersivos abrigam experiências sensíveis, conduzidas pelas narrativas, que se distinguem em suas particularidades, mas se aproximam por contar parte de uma mesma história. O público visitante, ativador dessa memória e proposição, é também convidado a registrar suas reflexões. Nessa perspectiva, com propostas de incentivo às escutas e aos diálogos, provocando o público a ouvir sobre o outro e contar sobre si, o Sesc valoriza a diversidade cultural afirmando as diferenças como potência transformadora. Mais ainda, vislumbra a construção de uma sociedade que respeite a pluralidade de vozes, predisposta ao acolhimento de seus distintos atores.

Danilo Santos de Miranda Diretor Regional do Sesc São Paulo


Uma das muitas histórias possíveis

A Exposição Quem Sou Eu? é uma releitura do acervo de mais de 18 mil histórias de vida e 60 mil fotos e documentos coletados ao longo dos últimos 25 anos pelo Museu da Pessoa. Cristiano Burlan, Diógenes Moura e Viviane Ferreira são os artistas convidados para conhecer e escutar algumas dessas histórias e, a partir delas, construir outras. Juntam-se a estas as histórias da Coleção “Memórias dos Brasileiros”, constituída por 326 depoimentos colhidos em viagens pelo país. Em um espaço dedicado à educação, estão presentes as narrativas registradas por funcionários das 35 unidades do Sesc São Paulo, que utilizaram a tecnologia social de memória, desenvolvida pelo Museu da Pessoa, para conhecer seu público. Ainda, nesta mesma exposição, uma cabine está aberta ao público no espaço “Quem Sou Eu?”, para todas as pessoas que queiram transformar um pouco de suas experiências em mais um traço de nossa memória coletiva. Por fim, uma linha do tempo apresenta uma das muitas histórias possíveis do Museu da Pessoa. Há 25 anos nasceu o Museu da Pessoa, um dos primeiros museus virtuais do mundo. Dedicado às histórias de vida, nunca perdeu de vista seu compromisso de experimentar. Foram feitos livros, exposições, documentários, histórias de grupos, instituições, empresas e comunidades. Todos, absolutamente todos, baseados em histórias de vida. No entanto, não bastou apenas fazer. Foi preciso disseminar. Uma tecnologia social de memória foi, então, construída e aplicada em centenas de escolas e comunidades do país. Para que essa história tenha acontecido, a colaboração entre o Sesc São Paulo e o Museu da Pessoa foi definitiva. Dessa parceria nasceu o primeiro grande acervo de histórias do comércio de São Paulo. Nasceram também fóruns, formações, redes e, por fim, o apoio para que tratássemos parte de nosso acervo. A base dessa parceria é, desde o início, a crença de que a história das pessoas é importante. Tão importante quanto fundamental para que possamos repensar a história do Brasil. Karen Worcman Fundadora do Museu da Pessoa e Curadora


Pequeno Manifesto do Museu da Pessoa de por que vale a pena ouvir, preservar e transmitir histórias de vida

Não há uma história de vida igual a outra. Isso significa dizer que não há uma vida igual a outra. Imagine: 7 bilhões de vidas sobre a Terra. Nenhuma igual a outra. Cada uma com sua própria trama. Imagine. As vidas são únicas, assim como as formas de contá-las. Se pensarmos que cada pessoa pode construir muitas histórias sobre sua própria vida, isso resulta em 7 bilhões de vidas vezes inúmeras histórias, o que daria algo como infinitas histórias que pairam sobre a Terra. Quantas delas escutamos? Quantas delas são escutadas? Algumas são narradas em família. Outras se tornam romances, autobiografias, filmes. Outras, muito poucas, terminam dando nome a alguma rua ou a um museu. E todas as outras? Digamos que cerca de seis bilhões novecentos e noventa e nove milhões de histórias nunca são nem serão conhecidas. E daí? Que diferença isso faz? Estamos perdendo alguma coisa? O que muda, ou poderia mudar se passássemos a prestar mais atenção nas histórias das pessoas que estão sobre a Terra? Não sabemos exatamente. Apenas sabemos que algo mudaria. Sabemos que algo certamente mudaria. O Museu da Pessoa homenageia, nesta exposição, todos os museus que representam esforços humanos para dar valor às nossas vidas: um quadro com 4 mil bitucas de cigarro e anotações sobre quem as fumou abre o Museu da Inocência, criado em Istambul pelo escritor Orhan Pamuk; na comunidade de Morro Pintado, em Icapuí,

no litoral do Ceará, João Paulo e Marcos, dois rapazes gêmeos, dedicam suas vidas a recriar a casa de seus tataravôs Manoel Rebouças Filho e Maria da Conceição Rebouças. Gastam a maior parte do salário mínimo que ganham recomprando objetos para compor seu museu. Ali perto, Josué Crispim, pescador e arqueólogo de Ponta Grossa, desde a infância sobe e desce dunas em busca de “cacarecos e cacos” submersos pelas areias para construir seu Museu do Mar, que, entre cachimbos e instrumentos de caça e pesca indígenas, já possui mais de 5 mil peças; no District Six Museum, criado em 1994 na África do Sul, um senhor de cerca de 70 anos, muçulmano, antigo morador do bairro que misturava judeus, negros, muçulmanos, brancos e indianos no centro de Capetown, guia um grupo de colegiais pelo espaço e aponta para uma fotografia antiga, pregada em uma parede. Diz: “Aqui era minha casa bem antes dela ter sido destruída.” Em Ituiutaba, Minas Gerais, uma casa de cultura reúne pratos quebrados, rendas, bules e luminárias sob a placa: “Coisas antigas de nossa cidade”. Todos esses museus, assim como o próprio Museu da Pessoa, resultam de escolhas e de percepções de pessoas, grupos ou sociedades de que um certo objeto, um fato, um instante ou uma história valem ou valeram a pena. Valem porque constituem traços de nossas experiências sobre a Terra. Experiências que são narradas, criadas, recriadas e narradas mais uma vez. Valem não porque necessariamente mudaram o curso da História ou glorificaram um instante dela, mas apenas porque revelam nossas múltiplas humanidades.


Vale a pena porque Nenhum homem é uma ilha. Toda alma é um mundo inteiro e cada mundo desses mundos é diferente de todos os outros. Somos “irrepetíveis”, insubstituíveis e partes de um todo. Nenhum destino pode ser comparado a outro. Cada um de nós é como um elenco inteiro de personagens em um romance ou peça. Nenhuma situação se repete. Vale a pena porque Os seres humanos, independente de sua tribo, de sua cultura, compartilham uma memória. A pessoa singular não é mais pesada que o grupo, tampouco o eu mais importante que o você ou o nós. Cada um deve ser infinitamente importante. Assim, quem quer que destrua uma única alma conta como se tivesse destruído um mundo inteiro; e quem quer que salve uma alma conta como se tivesse salvo um mundo inteiro. Vale a pena porque O equilíbrio é alcançado quando todos são ouvidos. Ouvir é tão importante quanto falar. Ouvir pode mudar seu jeito de ver o mundo. Vale a pena porque Um dia haverá em que as histórias, pequenas ou grandes, cheias de aventuras ou plenas de banalidades, sejam percebidas como parte de nosso patrimônio. Um dia haverá em que as histórias serão consideradas as pirâmides do Egito. E os museus do futuro serão, então, as nossas vidas. Vale a pena porque Construímos a nós mesmos por meio das nossas histórias. Fabricar histórias é o meio para nos conciliarmos com as surpresas e estranhezas da vida. Ter sido é a mais segura forma de ser. Vale a pena porque O ser humano é, e sempre será, O ser que decide o que ele é. Esse manifesto conta com a generosa colaboração involuntária da Mishná e de Ailton Krenak, Amós Oz, John Donne, Ohran Pamuk, Sigmund Freud e Viktor Frankl.


Um instante que resiste

A partir das narrativas memoriais e do acervo audiovisual do Museu da Pessoa, busquei criar uma imersão numa relação entre imagem e som que estimulasse, antes de tudo, sensações, que provocasse a construção de uma escrita de si em diálogo com o outro. Cada narrativa, som, imagem e fotografia são resquícios de memória e um universo de possibilidades, em que o trabalho foi justapor essa materialidade, a fim de estimular a potência de ser e agir na vida através da relação entre memória, cidade, gênero, comunidade e sujeito. A narrativa só persiste quando alguém insiste em recontá-la. Cada entrevista abriga uma força de resistência. E as fotografias são habitadas pela mesma aura de persistência, como um coágulo do tempo; a fotografia é o registro de um instante que perdura até a matéria ser decomposta. E essa força de resistência me atravessa, ao passo que atravessa o tempo, que alarga o instante e o faz transitar pela vida tornando o passado sempre um agora. Diante das entrevistas, havia uma zona abissal, um universo pessoal que transitava pelo meu, ainda que eu não conhecesse nenhuma daquelas histórias em profundidade. O trabalho do Museu da Pessoa no registro dessas vozes cotidianas é de uma sensibilidade arrebatadora: devolve paixão às coisas cotidianas, às narrativas ordinárias, às vidas comuns, a mim. Reposiciona-me diante da vida, fazendo-me retornar a mim enquanto ouço o outro, enquanto sinto a geografia das vozes me comporem, fazendo-me descobrir compatibilidades, ressonâncias, travessias que se cruzam com a minha ou que me apresentam uma realidade tão distante, ainda


que íntima. O acervo de fotografias que perpassa a história do Brasil em diversos momentos me provoca na mesma intensidade. Faz com que eu visite a história através das vidas privadas, dos olhares íntimos. Sou conduzido, assim, a um passeio pictórico sobre uma nova história, uma narrativa não oficial. Os rostos desconhecidos se apresentam como paisagens; são ao mesmo tempo relevos particulares, vegetações nativas. O temperamento dos olhares faz povoar o pensamento com inúmeras histórias. É que, em certa medida, as imagens alijadas de sons provocam um imaginário auditivo, nos inquietam a imaginação com vozes, histórias e narrativas possíveis. O mesmo me acontece com o som destituído de imagem: ele constrói na vista cores, rostos, sorrisos. Compor um filme é, pois, a sobreposição desses acontecimentos. A construção de um diálogo entre som e imagem. Cada filme provoca no mundo uma cisão. O que está por trás de cada narrativa quando mergulhamos nela? A busca sempre foi pela interlocução, por manter acesa a chama do diálogo, por construir uma cartografia afetiva do outro. Nesse processo, foi preciso compreender que ouvir e falar são dois caminhos necessários e indispensáveis. Falar sobre si é fundamental num processo de autoestima e expressividade, em que a narrativa se torna um ato de resistência − esse único ato que resiste à finitude. O cinema sempre me foi necessário. É a forma com que me comunico, com que apreendo o mundo. O cinema é, para mim, um ato de fé. Ele reconta infindas vezes a mesma história. Cinema e amor necessitam da dor. A câmera ou o gravador diante

do outro é também um ato criminoso por assaltar a ordem natural do esquecimento, da efemeridade, por fazer durarem os sons e as imagens. Não se filma impunemente; paga-se um preço alto por isso. Os indígenas já diziam que a fotografia, ao capturar a imagem, rouba a alma do outro. O trabalho que construí é uma soma, pois, de almas capturadas. Como curador, o trabalho de escolha e do recorte do material é também um recorte de como enxergo o mundo e o meu entorno, sobre as questões que me inquietam e sobre as vozes que me assaltam. Ainda que o distanciamento seja condição primeira para o trabalho, não é possível se ausentar de si. Um mergulho no outro é, sem dúvida, uma viagem para dentro também, para lugares nunca antes habitados. O trabalho é uma ode à memória, ao registro comum, ao ordinário profundamente necessário, às vozes que povoam nossa geografia, que constroem cotidianamente as paisagens das nossas lembranças. Reabrir as fendas da vida, como uma nascente subterrânea, pode gerar novas possibilidades insuspeitas, novas possibilidades de existência: o júbilo da vida. Afirmação total da existência: pôr em cena, frente a si mesmo, tornar-se o que se é. E, por fim, ressoa na minha pele, na retina e nos meus ouvidos a pergunta: quem sou eu?

Cristiano Burlan Curador


ENSAIO PARA SINÔNIMOS


Diante desses retratos, aqui nesta sala em silêncio, olho para você e a fotografia não basta. Não basta porque cada uma dessas imagens tem voz. Então, se eu olho para seu pai, sua mãe, seu avô, sua avó, seus irmãos e todos eles estão aqui na minha frente, do meu lado, eu penso em cada uma dessas histórias: na minha história, na história da minha família, dor e prazer, passado e futuro, encontro e abismo. Olhe, preste bem atenção. E pense no que cada uma dessas pessoas está dizendo para a câmera − o objeto, a tundra −, o espectro de uma vida, de muitas vidas, de tantos eus, de tantos tus, de um imenso nós atento a uma irmandade também silenciosa, porque você agora aqui está observando cada uma dessas personas diante do espelho que a humanidade produziu para ver o outro e a si mesma. Ou isso, ou nada. Por isso cada uma dessas fotografias será sempre um veredito. Um livro aberto, uma alvorada, um pôr de sol: arquivo de um museu que guarda histórias. Nada mais futurista. Nomes e sobrenomes. Aquela casa que escutou tantos segredos, lembra? A antiga palavra que nunca foi pronunciada, lembra? A mão que tocou a outra mão porque um verso possui o hálito encarnado. Um lustre, um castiçal, um quase sorriso. Quem será que está do meu lado na fotografia? Quem será que está do teu lado, aqui, diante desse álbum de família?

Uns todos. Todos um. Tempo e tempo: cornucópia, transparência, vida e morte, risco fino, ventania. Todos aqui, num ensaio para sinônimos. Uma fotografia, cada uma delas: o batizado na manhã de domingo, o casamento num dia de chuva, a chegada ao Brasil, uma recordação do passado. Uma fotografia será sempre um retrato, e um verdadeiro retrato não deixa rastros, porque uma história sempre vem de um tempo grávido de nomes, de coitos arredondados, de apelos, de dádivas, de inícios, de confins. Em planos abertos e fechados. Em ambientes públicos e privados. Carne, músculo, sangue, osso. Meu nome é Augusta Benedita. Meu nome é Jacob Osmundo. Meu nome é Cacilda Petty. Meu nome é Maria Miné. Meu nome é Yoshico Akiyama. Meu nome é Marciana Elemental. Meu nome é Felipe Fernandes. Meu nome é Valentina Amatuzzi. E o seu, qual o seu verdadeiro nome?

Diógenes Moura Curador


Coleção Vínculos-Afetivos


A disposição para imergir na história e trajetória de pessoas é a força motriz que deverá conduzir o olhar atento a cada fragmento de humanidade disposto e exposto em cada peça audiovisual que compõe a Coleção “Vínculos-Afetivos”. Quando temos a possibilidade de eternizar nossa existência a partir da partilha dos nossos vínculos de afetividade, somos capazes de desafiar a invisibilidade atribuída a determinadas subjetividades. Essa compreensão foi que guiou este olhar curatorial ao interagir com as Coleções “Vira-Vida” e “Memórias dos Brasileiros”, repletas de narrativas que nos forçam, todo momento, a observar os extremos de cada vivência curvilínea na humana arte de sobreviver, sonhando com o tão disputado “bem viver”. Aqui, proponho olharmos para pessoas que, ao narrarem suas histórias, trouxeram de maneira plena seus vínculos afetivos, levando-nos a compreender afetivamente como essas pessoas se vincularam a outras pessoas, atribuindo-lhes papéis sociais tão importantes em suas vidas, por meio de fatos cotidianos que marcaram suas memórias a ponto de contribuírem para a forja de suas identidades. É no aspecto identitário multifacetado, que compõe cada pessoa escolhida, que encontramos a estética ideal para apresentarmos as peças audiovisuais que compõem a Coleção “Vínculos-Afetivos”. O “corpo-identidade” não é solto no mundo, ele se relaciona sempre com um território, seja de origem ou de destino, esse território ajuda a moldar as pessoas e sua própria existência. Não raro, ter conhecimento do local de relação afetiva das pessoas torna-se uma carta de apresentação mais potente do que ter conhecimento sobre seu nome,

sobrenome, signo ou orixá. A Coleção “Vínculos-Afetivos” desnuda tenras e duras experiências registradas nos corpos-territórios de pessoas que, na esgrima da vida, puderam contar efetiva e afetivamente com outras pessoas para continuar existindo. Para tanto, pinçamos trajetórias de pessoas que, reunidas na Coleção “Vínculos-Afetivos”, quando postas em diálogo, são capazes de expressar a nossa busca por tornar visíveis territórios e identidades potentes de subjetividades que concorrem com a invisibilidade, que quase sempre lhes é destino, em meio às tensões sócio-raciais enfrentadas em seus cotidianos. É natural que, ao longo da vida, nos seja inerente a capacidade de sonhar. Mesmo quando o contexto social tenta impedir, seguimos insistindo em sonhos. Alguns coletivos, outros individuais. Inúmeros banais, incontáveis megalomaníacos... mas sempre sonhos. Realizados ou não, para além da concretude do que foi sonhado, as pessoas são alimentadas pelo brilho no olhar e o frio na barriga nas frações de segundos em que se permitem sonhar. É exatamente nessa dinâmica da tensão existente na narrativa de sonhos realizados e sonhos não realizados que a Coleção “Vínculos-Afetivos” debruça o olhar − nos fragmentos de sonhos de pessoas que sonharam em perpetuar vínculos com outras pessoas. E, assim, devemos seguir, após o diálogo com as sete trajetórias que compõem esta coleção, sonhando com a capacidade de nos mantermos vinculados às pessoas.

Viviane Ferreira Curadora


CONTE SUA HISTÓRIA

As memórias de mim mesmo me ajudaram a entender as tramas das quais fiz parte

foi o que disse Paulo Freire quando foi entrevistado pelo Museu da Pessoa, em 1992.

Todo ser humano constrói uma narrativa sobre sua própria vida. Narrar a própria história é uma forma de compreendermos os sentidos que damos às nossas experiências. Nossas narrativas de vida são também um grande legado para nossa família e para a sociedade como um todo. Pense, por exemplo, em como seria interessante poder estudar, na escola, a história das transformações da cidade de São Paulo por meio das histórias de brincadeiras de rua ou dos acendedores dos lampiões de gás das vias públicas.

Como começar? Que tema escolher? Quer algumas dicas?

O acervo do Museu da Pessoa está disponível para que estudantes, pesquisadores, escritores, jornalistas e você possam consultar e descobrir, das melhores formas, como as pessoas vivem ou viveram um dado fato, instante ou evento de suas vidas. E por que não você?

Dicas: www.museudapessoa.net Experimente contar sua história e compartilhá-la no Museu da Pessoa

Existem muitas maneiras de construir uma história. A seguir, sugerimos algumas estratégias para que você componha uma ou muitas histórias sobre sua vida.


LINHA DO TEMPO

UMA HISTÓRIA, UMA FOTO, UM TEXTO, UM VÍDEO

Apesar do nome ser composto pelas palavras linha e tempo, montar a sua pode significar mais do que listar os fatos de sua vida em ordem cronológica. Nossa memória é profundamente seletiva. Quando montamos nossa linha do tempo, escolhemos apenas os momentos marcantes, fatos e pessoas que nos impactaram e, então, articulamos cada um desses momentos em uma dada sequência, como se todos estivessem naturalmente relacionados. Não percebemos, em geral, que são escolhas e que essas mesmas escolhas são importantes para nossa vida e para o que acabamos por chamar de eu.

Essas perguntas e algumas outras servem também para que você monte uma história de sua vida (que pode ser narrada em texto, em vídeo ou através de imagens). Você pode também escolher um único momento ou tema como, por exemplo, a história de um grande amor, de uma grande conquista ou perda, de um momento mágico ou a história da sua família. Porém nunca esqueça que suas histórias são seu maior patrimônio. Trate-as com carinho e compartilhe. São também um grande legado.

Convidamos você a construir a sua linha do tempo. Como sugestão, pense em listar, primeiro, os eventos que mostrem as escolhas que fez ou faz. Comece respondendo, por exemplo, às seguintes questões:

O Museu da Pessoa é um espaço aberto, colaborativo e gratuito para que você registre e compartilhe suas histórias. O futuro agradece!

Quais são os principais marcos da sua vida? · (Escolha, por exemplo, 5, no máximo 10) · Por que são marcos? · Quais as grandes rupturas da sua vida? (Escolha de 3 a 5 ) · Por que são rupturas? Quais foram suas maiores escolhas? O que as motivou? · (Limite a 5 também) · Quais as pessoas mais significativas? · Por que foram ou são significativas?

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Agora, organize esses eventos, pessoas, ou momentos no tempo e, uma vez listados, pense nas relações entre eles. Se quiser, acrescente imagens, documentos.

Se você tem interesse em contar a história de sua família ou mesmo a de alguém que acha interessante, então a entrevista é um excelente caminho.


COMO FAZER UMA ENTREVISTA DE HISTÓRIA DE VIDA

Existem muitos tipos de entrevistas. Entrevistas jornalísticas, entrevistas de trabalho, entrevistas médicas... As entrevistas de história de vida são especiais. O que as diferencia de todas as outras é a escuta. Uma boa entrevista de história de vida resulta da combinação entre três fatores:

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A intenção do entrevistado O entrevistado deve ter consciência de que está gravando sua história de vida para ser compartilhada. Deve também ter claro que está livre da obrigação de se justificar, de dar informações precisas, de ter que organizar uma aula. Quanto mais ele entender que é a sua história de vida o que tem a oferecer de mais interessante, mais pode colaborar com a qualidade de sua entrevista.

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O contexto da entrevista Saber que uma entrevista é um momento sagrado é importante. Isso pode ser transmitido de muitas maneiras. As mais simples são, por exemplo, escolher um lugar silencioso para gravá-la, separar um tempo (o entrevistador e o entrevistado) para realizá-la (pelo menos 1 ou 2 horas), tirar de cena as interferências, como celulares e relógios de pulso, e garantir uma boa gravação (cuidar da luz e do fundo no vídeo e do áudio).

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A postura do entrevistador Uma entrevista resulta da coautoria entre entrevistado e entrevistador. Um bom entrevistador é aquele que escuta ativamente seu entrevistado e o estimula com perguntas que o ajudem a compor sua narrativa.

Dicas para o entrevistador O que é escutar ativamente? A escuta ativa pressupõe que o entrevistador esteja atento à fala de seu entrevistado de uma forma bastante especial. Ele não deve esperar a confirmação de uma opinião pessoal ou querer registrar uma informação precisa. Suas perguntas partem dos ganchos dados pelo próprio entrevistado, de forma a estimulá-lo a continuar. Não cabe ao entrevistador ter pena, admiração ou compaixão pelo entrevistado. O entrevistador deve ouvir sem julgar, pressupor ou comentar. As perguntas devem buscar histórias, não opiniões ou comentários. O silêncio é bem-vindo. O elo entre o entrevistado e o entrevistador é o olhar. O poder transformador de uma entrevista Na entrevista, não devemos simplesmente buscar o extraordinário de cada ser humano. Quando entrevistamos, descobrimos o ordinário, o dia a dia, as ações movidas por raivas, frustrações e os acontecimentos que dão movimento à vida. É na imperfeição que o ser se faz humano. Quando o entrevistador enxerga no outro a sua humanidade, termina por encontrar a sua própria. Isso é profundamente transformador.


Mais dicas:

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Organize um roteiro prévio, Mas não se prenda a ele durante a entrevista. perguntas que ajudam são, em geral: · As• Descritivas – porque recuperam detalhes envolventes (por exemplo, “descreva o quarto de sua infância”). • De movimento – porque ajudam a continuar a história (por exemplo, “o que você fez quando saiu de casa?”). • Avaliativas – provocam momentos de reflexão (por exemplo, “o que você mudaria na sua trajetória de vida?”). perguntas que atrapalham são: · As• Indutivas − levam o entrevistado a dar uma resposta já pronta

(por exemplo, “a pobreza da sua infância o marcou muito?”). • Genéricas − estimulam respostas genéricas, sem histórias (por exemplo, “como foi sua infância?”). • Puramente informativas – desconcertam e interrompem o entrevistado (por exemplo, “qual a data exata em que você começou a trabalhar?”). • Com julgamento de valor − que atendem apenas ao anseio do entrevistador (por exemplo, “você se sente mal por seu trabalho destruir o ambiente?”).

Leia mais sobre como fazer entrevista em:

· Encadeamento Comece com perguntas fáceis de responder, como nome, ·local e data de nascimento. Além de contextualizar a pessoa, essas perguntas têm a função de “esquentar” a entrevista. É como um começo delicado de um relacionamento, e nada como perguntas simples e objetivas para deixar o entrevistado à vontade e ajudá-lo a mergulhar em suas memórias.

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Continue com sequência cronológica. Mas atenção! Este é apenas um fio condutor da conversa. Não é o único. Vale observar se a pessoa tem outro caminho para organizar sua narrativa e não impor o seu próprio. Se você seguir o critério cronológico, o roteiro pode ser organizado em três grandes blocos de perguntas: • Introdução – Origem da pessoa, pais, avós, infância. • Desenvolvimento – Fases da sua trajetória, incluindo, se for o caso, o tema específico do projeto. • Finalização – Relação com o presente e avaliação.

Você pode ver como ficou a sua entrevista e conferir outras histórias de vida em:

Você pode até montar uma coleção com suas entrevistas:


COMO MONTAR SUA COLEÇÃO NO MUSEU DA PESSOA

Dicas de como montar uma coleção

Desde quando os seres humanos possuem o hábito de colecionar? O que os motiva? São várias as respostas, mas é indiscutível que esta é uma atividade presente em nossas vidas (muito presente na infância) há muitos e muitos anos. A origem dos museus está relacionada ao hábito humano de colecionar. Objetos de valor, curiosidades, obras de arte, livros raros, animais... qualquer coisa pode ser selecionada, classificada e organizada para fazer parte de um museu. Independente do objeto escolhido, a coleção permite a construção de um novo olhar à medida que relaciona, compara e descreve cada um dos objetos escolhidos.

Que histórias me tocaram ou me fizeram pensar? Algo me fez pensar ou mudar? O quê?

O Sesc São Paulo e o Museu da Pessoa convidam você a montar uma coleção. O objeto em questão são as pessoas e suas narrativas de vida. Essas pessoas podem ser as entrevistadas ou descritas por você ou, ainda, podem frazer parte do acervo do Museu. Você escolhe entre montar uma coleção de histórias, de fotografias, de vídeos ou da mistura entre todas essas mídias. O importante é a sua motivação. Ela dá origem à sua busca e permite que você selecione, junte, descreva e ofereça ao público um olhar seu sobre a vida. Essa possibilidade, em geral reservada aos especialistas de museus, está aberta para que você dê sua contribuição à memória de nossa sociedade.

Pense que tipo de narrativa você considera importante

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Quem eu gostaria que conhecesse essas histórias, imagens, vídeos? Por quê?

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Quais imagens traduzem um momento, uma época um grupo social que vale a pena ser conhecido?

· O que eu gostaria de transmitir com minha coleção? Como montar?

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Navegue pelo portal do Museu da Pessoa, leia as histórias, veja vídeos ou fotos. Para adicionar o conteúdo a uma coleção, basta utilizar o botão “Adicionar a uma coleção”, clicando na estrela no canto superior direito.

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Você também pode utilizar a busca avançada para encontrar personagens, histórias, vídeos e fotos com temas e perfis específicos, como amor, superação, década de 1970, professores, cidade de nascimento, Campeonato Paulista de Futebol, entre inúmeras outras possibilidades e combinações.

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>> Para inspirar!

Pense em para quem ou para quê você acha que essa coleção pode interessar e faça uma descrição explicando o que motivou você a organizá-la. Também não se esqueça de selecionar uma foto de capa para sua coleção.

Vale dar uma olhada nas centenas de coleções já existentes no portal do Museu www.museudapessoa.net

Agora é só divulgar! Envie o link para amigos, familiares e todos que possam se interessar. Divulgue em suas redes sociais e mostre sua coleção para o mundo.

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SESC – SERVIÇO SOCIAL DO COMÉRCIO Administração Regional no Estado de São Paulo PRESIDENTE DO CONSELHO REGIONAL Abram v DIRETOR REGIONAL Danilo Santos de Miranda SUPERINTENDÊNCIAS Técnico-Social Joel Naimayer Padula Comunicação Social Ivan Giannini Administração Luiz Deoclécio Massaro Galina Assessoria Técnica e de Planejamento Sérgio José Battistelli GERÊNCIAS Artes Visuais e Tecnologia Juliana Braga de Mattos Adjunta Nilva Luz Assistentes Sandra Leibovici e Kelly Teixeira Estudos e Desenvolvimento Marta Raquel Colabone Adjunto Iã Paulo Ribeiro Assistentes Daniel Douek, Elizabeth Brasileiro, Ilona Hertel e Terezinha Augusta Gouvêa Ação Cultural Rosana Paula da Cunha Adjunta Kelly Adriano de Oliveira Assistentes Rodrigo Gerace e Talita Rebizzi Relações com o Público Milton Soares de Souza Adjunto Carlos Cabral Assistentes André Venâncio e Naiara Candido Sacilotto De Pessoas José Menezes Adjunta Cecília Camargo Mamam Pasteur Assistente Vania Feichas Vieira, Elaine Cristina Marques e Thamires Andrade Reiss Artes Gráficas Hélcio Magalhães Adjunta Karina Musumeci Sesc Digital Gilberto Paschoal Adjunto Fernando Tuacek Assistente Malu Maia Sesc Vila Mariana Mariangela Abbatepaulo Adjunta Patricia Dini SESC VILA MARIANA Programação Mara Rita Oriolo (coordenação) Núcleo Integrado de Artes Carolina Rios, Priscila Lourenção, Tiago Marchesano e Sara Centofante Comunicação Natália dos Reis (coordenação), Cláudia Souza, Carlos Curado, Daniel Rosa, Julia Parpulov, Luciana Garcia, Renato Perez e Thais Helena Infraestrutura Camila Paes (coordenação) e Clayton Coelho Administrativo Manoel Expedito de Freitas (coordenação) Alimentação Célia Tucunduva Operações e Serviços Carlos Valini, Alexandre Tremanti, Kleber Araújo e Jefferson Pereira

QUEM SOU EU? Curadoria Karen Worcman Direção Executiva Sonia London Coordenação Marcos Terra Relações Institucionais Rosana Miziara Curadores Convidados Viviane Ferreira, Cristiano Burlan e Diógenes Moura Projeto Expográfico e de Iluminação Marcelo Larrea Assistentes de Expografia Beatriz Christal e Pedro Dualibi Produção Executiva Valeria Prata/Prata Produções Assistente de Produção Roberta Prata e Gabriela Ottengy Comunicação Visual Mariana Afonso e Natalia Zapella Montagem Cenográfica Maxxy Stands Montagem Fina Matiz Projeto de Audiovisual e Instalação Multimídia “Quem Sou Eu?” Fabi Loyola e Ricardo Palmieri Revisão de Texto Sílvia Balderama Pesquisa de Acervo Felipe Rocha e Lucas Ferreira de Lara Imagens Utilizadas Acervo Museu da Pessoa e Márcia Zoet Tratamento das Histórias Carolina Margiotte Grohmann, Lucas Figueirêdo Torigoe, Paulo Abe e Viviane Aguiar Direção e Produção do Vídeo “Processo” Joyce Pais Edição de Vídeo Anna Horta, Carolina Rocha Braz, Diego Lombo, Gabriel Medeiros Morais e Vitor Scarpelli Campanha Virtual Bruno Pinho, Carolina Alves e Tamires Youssef Formação Educativa Cartola Filmes, Danilo Eiji Lopes, Lia Cristina Lotito Paraventi, Marcia Trezza Apoio Institucional Allan Russo Fava, Caio Coimbra, Dalci Alves da Silva, Daniel Ajzental, Jefferson Santos e Keli Garrafa

AGRADECIMENTOS A todos aqueles que contribuíram com a sua história de vida para a construção do acervo do Museu da Pessoa.


Idealização:

Realização:


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