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HARRY SEIDLER Foi há quase cem anos que nasceu, a 25 de junho de 1923, em Viena, Áustria, o arquiteto Harry Seidler. Quando era ainda um adolescente, e por ter descendência judaica, viu-se obrigado a refugiar-se junto do seu irmão mais velho em Inglaterra, aquando da invasão da Alemanha nazista. Durante este período, estudou construção na Cambridgeshire Technical School. Em 1940, os dois irmãos são enviados para um campo de concentração no Canadá. Cerca de um ano depois, em liberdade condicional, Harry tem finalmente a possibilidade de estudar arquitetura e gradua-se pela University of Manitoba. O jovem Seidler ganha ainda uma bolsa para estudar na Harvard Graduate School of Design, nos EUA, onde trabalha com professores como Marcel Breuer e Walter Gropius, que lhe ensinam os princípios da Bauhaus. Para além destes últimos, importa ainda referir a importância que personalidades como Oscar Niemeyer, Alvar Aalto e Le Corbusier tiveram na sua vida e obra.
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De modo isócrono, em 1948, Harry completa o seu ciclo de estudos e a sua família emigra para a Austrália, a fim de se juntar ao seu tio paterno, que desenvolvera um negócio de sucesso relacionado com a produção de t-shirts. No entanto, Harry continua a viver em Nova Iorque, onde trabalha no escritório de Breuer. Talvez para o seduzir a mudar-se definitivamente para a Austrália e poder ter novamente a família reunida, a sua mãe, Rose, pede-lhe que desenhe uma casa para si e para o seu marido.
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É então que, no ano de 1948, Seidler viaja até à Austrália para desenhar aquela que ficaria a ser conhecida como Rose Seidler House, a obra inaugural de Harry, cujos clientes foram os seus próprios pais. É justamente nesta atmosfera familiar que nasce o primeiro trabalho oficial do arquiteto, no qual são já visíveis traços e preferências que permearão o resto da sua carreira. Conceitos como o funcionalismo, o essencialismo e Gesamkunstwerk1 são postos em prática nesta casa, que provocou um enorme impacto na sociedade australiana da época e introduziu o país à arquitetura moderna. O êxito foi tal que, em 1951, um ano após o término da construção, a obra foi condecorada com o prémio RAIA Sir John Sulman. Dado o sucesso, e contrariamente ao que tinha planeado, Seidler não regressa aos EUA e decide continuar a sua carreira na “terra desconhecida do sul”.
Palavra alemã usada para descrever a ideologia que defende a integração de diferentes formas de expressão artística a fim de criar uma obra de arte total. 1
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“…A REALLY WONDERFUL ENCLAVE”
Rose Seidler House nasce num vasto terreno, abraçada pelos seus 6ha de vegetação aborígene. Era uma propriedade isolada e rochosa, mas que abrangia no horizonte o segundo parque nacional mais antigo do país, o Ku-ring-gai Chase. Num plano mais afastado, insere-se num subúrbio de Wahroonga, em Sydney. Esta zona da Austrália é caracterizada pelos seus verões quentes e húmidos e os invernos amenos, o que a torna num lugar ideal para viver.
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“Of course she [Rose] brought her friends here and they all said you’re crazy … you can’t dig yourself away out [there]. Mind you there was nothing there … Clissold Road didn’t exist – nobody was there – all it was, was a rough unmade road and flanked on both sides of the approach here were market gardens where people were growing vegetables, but once you came in it was a really wonderful enclave.”
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A casa é parte integrante de um projeto de complexos familiares composto por três moradias que Seidler desenvolveu: Rose Seidler House, Rose House e Marcus Seidler House. O terreno foi divido em três lotes e as duas últimas casas foram construídas de forma a criar um espaço medial que funcionasse como pátio das três casas, onde poderiam vir a ser construídos espaços comuns.
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O MOVIMENTO MODERNISTA
Sendo uma casa que nasce no final dos anos 40 e no início dos anos 50, insere-se na segunda onda das vanguardas modernistas, que refletem a mentalidade do pós-guerra. Rose Seidler House estabelece uma relação de semelhança com o neoplasticismo e aproxima-se das obras de um dos principais pintores deste movimento, Piet Mondrian. O arquiteto utiliza as cores primárias, magenta, azul ciano e amarelo nas cortinas, móveis e ainda no mural que caracteriza o terraço. O movimento é reafirmado através do desenho idiossincrático das janelas, que cria várias linhas geométricas, harmoniosas e desalinhadas entre si, onde o fim de uma não procura o início da outra. Este elemento arquitetónico parece mimicar os quadros do próprio Mondrian e, a sua pouco convencional estrutura, permite resolver propósitos estéticos e funcionais.
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A obra é também fortemente influenciada pelos princípios fundamentais de Le Corbusier. O uso de pilotis como sistema de sustentação permite libertar o piso térreo e criar um segundo espaço. A planta e fachada livres conferem dinamismo e amplitude. As janelas proporcionam um grande contacto com a natureza que rodeia a habitação e conferem um sentimento de permeabilidade. Vladimir Belogolovsky, autor do livro Harry Seidler Lifework, explica de que forma o arquiteto se inspira e a posição que toma perante o uso de referências: “always rational, but sometimes the building work took the form influenced by a fragment in a painting or a sculpture”2.
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Belogolovsky, V. & Frampton, K. (2014). Harry Seidler Lifework.Nova Iorque: Rizzoli International Publications.
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"...this house explodes the surfaces that enclose a normal house or space, and turns it into a continuum of free standing planes, through which the eye can never see an end, you are always intrigued what’s beyond, you can always see something floating into the distance, there is never an obstruction to your vision, it is a continuum (of space), that I believe 20th century man’s eye and senses respond positively to.”
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UMA NOVA FORMA DE HABITAR
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São 200m2 de casa que se erguem e enraízam no terreno, deliberadamente desenhados para estabelecerem uma relação de contraste com a paisagem envolvente. Encontra-se no projeto de Seidler uma vontade de distinguir o manufaturado do natural, de conferir a cada uma destas dimensões características próprias e de lhes dar espaço para se afirmarem, sem esquecer que habitam em simbiose. O dualismo entre ação humana e natureza é concretizado através da forma retilínea da habitação e dos materiais usados. O betão e o vidro opõem-se à identidade orgânica da terra, mas a madeira e a pedra natural, utilizada nos muros e na lareira, evocam a sua presença.
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A casa recebe-nos com vários acessos: um de caráter mais público, a rampa, elemento que permite distingui-la das outras pela sua força impactante no visual exterior da casa e caracterizá-la como única e um de carácter privado, que faz o acesso ao primeiro piso através das escadas do piso térreo. Existe ainda um outro percurso, a oeste, pontuado por uma escadaria, que difere da primeira por ser exterior. Estes dois tipos de acesso verificam-se também na Ville Savoye, de Le Corbusier.
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A rampa conduz-nos ao terraço, onde encontramos um mural da autoria do próprio Harry Seidler. Nesta pintura, estão reunidas as várias cores usadas ao longo da casa e, exatamente por isso, funciona como elemento de coesão. É a partir da porta oposta ao plano do mural que entramos. A ambição de maximizar o interior e criar fluidez materializa-se num espaço de forma cúbica, aberto em todas as faces e extremamente bem iluminado. A fachada principal é pousada com os olhos para este, deixando entrar a luz da alvorada. Esta luminosidade, tão característica da Rose Seidler House, juntamente com as cores vivas que a permeiam, fazem dela uma habitação tonante. Corte B Corte B
Corte A
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A ausência de grandes paredes acresce para este sentimento de continuidade. A delimitação entre sala de estar, sala de jantar e playroom é conseguida através de cortinas, uma das particularidades da casa. Ao entrar na sala, somos convidados a sentarmo-nos nos sofás modernos dispostos em redor da lareira de pedra que se ergue até ao teto. Este elemento assume uma posição central e funciona como mais um componente que permite separar as divisões sem recorrer a paredes. Nas costas dos sofás encontramos algumas cadeiras, de onde é possível apreciar a vista norte através das amplas janelas.
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Atrás da lareira, o espaço destinado à sala de jantar e, logo de seguida, a cozinha, ligada à zona de refeições através de pequenas portas de correr entre as bancadas e os armários. Excecionalmente, a cozinha é separada das outras áreas por uma parede, no entanto, as aberturas que existem nesta continuam a permitir a fusão de ambientes.
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Do lado esquerdo da divisão, encontramos o playroom, uma sala usada como escritório que faz a transição entre as partes comuns da casa e as privadas. Para lá, estão localizados os dois quartos, um deles uma suíte e, também, a casa de banho principal, iluminada através de uma clarabóia no teto. Constatamos assim que o lado oeste é dedicado às divisões comuns e, consequentemente, o este alberga as privadas.
Corte A
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NOS DIAS DE HOJE…
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No ano de 1967, Rose morre. Pouco depois, o viúvo Max Seidler muda-se para um lar e a casa fica, pela primeira vez, inabitada. Nos anos seguintes, acompanhando as mudanças de residentes, passa por três grandes restaurações, a última em 1988. O esquema de cores original foi reavivado e, ainda nesse ano, Harry decide oferecer a obra ao estado, para que pudesse ser visitada por admiradores e turistas. Desde então que é uma casa-museu, pertencente ao espólio de Sydney Living Museums e aberta ao público todos os domingos. Harry Seidler foi um dos grandes percursores da arquitetura moderna australiana e tornou-se num dos mais importantes arquitetos da segunda metade do século XX. Os seus projetos mais célebres compreendem a Embaixada da Austrália em Paris, o Hong Kong Club, no centro de Hong Kong, e, acima de tudo, as suas torres, que definiram a essência de Sydney. No entanto, Rose Seidler House destacar-se-á para sempre por ter marcado o brotar de toda uma carreira e vida.
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“Good design doesn’t date”
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NOTAS Capa: 'Sydney Showpiece' Australian Home Beautiful, 1951. Fotografia 1: Walter Gropius (à esquerda) e Harry Seidler, 1954. Max Dupain. Fotografia 2: Rose Seidler (à esquerda) com Bea Evans sentadas na sala de estar, Rose Seidler House, 1965. Photo © John Evans. Fotografia 3: Desenho de processo da Rose Seidler House, de Harry Seidler. Sydney Living Museums. Fotografia 4: Fachada Norte, Rose Seidler House, 1950. Photo © Walter Norris. Sydney Living Museums. Citação pag.11: Colleen Morris em entrevista a Harry Seidler, Maio 2001. Reimpresso. Morris, C. & Britton, G.. Historic Houses Trust of NSW, 2001, pag.8. Fotografia 5: Fachada sul, Rose Seidler House, Photo © Luisa Brimble. Fotografia 5: Vista geral a partir da estrada de acesso, Rose Seidler House. Photo © Luisa Brimble.
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Fotografia 7: Fachada sudoeste, Rose Seidler House. Photo© Luisa Brimble. Citação pag.22: Rose Seidler House – the House that Harry built. . Review, Austrália: ABC TV. 14 Abril 1991. Fotografia 8: Vista geral a partir do início da rampa, Rose Seidler House. Photo © Luisa Brimble. Fotografia 9: Exterior, vista das traseiras da rampa, Rose Seidler House. Sydney Living Museums. Photo © Luisa Brimble. Fotografia 10: Rampa, Rose Seidler House. Photo © Luisa Brimble. Fotografia 11: Terraço, Rose Seidler House. Photo © Luisa Brimble. Fotografia 12: Sala de estar, Rose Seidler House. Photo © Luisa Brimble. Fotografia 13: Cozinha, Rose Seidler House. Photo © Luisa Brimble. Fotografia 14: Quarto principal, Rose Seidler House. Photo © Luisa Brimble. Fotografia 15: Quarto, Rose Seidler House. Photo Luisa Brimble. Citação pag.45: Seidler, H.
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