Melancolia pós-moderna A rápida ascensão da sociedade libertária pós-moderna é fielmente retratada por Houellebecq, que a vê com decepção
Digressões, cientificismo, descrições minuciosas e introspecção marcam o segundo livro do francês Michel Houellebecq, “Partículas Elementares”, de 1998 (Sulina, 340 páginas, R$50,00). Por meio de um romance de ideias, sem pudor e da maneira mais negativa possível, o autor ganha amplo destaque. Polêmico e provocador, Houellebecq chega a considerar que será o próximo a conquistar o Nobel. O autor é ganhador de diversos prêmios, como o Prêmio Goncourt, da França. Dois meios-irmãos atormentados pela ausência da mãe “hippie” e pela negligência dos pais constituem os personagens principais da trama. Michel Djerzinski, biólogo molecular, apesar de obter sucesso em sua carreira profissional, é determinista e desiludido com a vida, que vê com frieza. Bruno, em contrapartida, é professor de literatura e guiado por suas vontades, de caráter impulsivo e hedonista. A obra, dividida em três partes, segmenta as fases da relação dos irmãos: um primeiro momento, em que se conhecem; quando inicia a vida adulta e se aproximam; a separação dos dois. O livro é caracterizado por uma constante descrição da vida sexual dos personagens, de forma grotesca e animalesca, com riqueza de detalhes. Dessa maneira, Houellebecq aborda a transição da sociedade conservadora francesa para a era das liberdades e prazeres individuais, a partir da década de 1960. Ele aponta, inclusive, para mudanças como a legalização da contracepção e do aborto. Sem enaltecer a conjuntura da França anterior à Segunda Grande Guerra, o autor se apresenta reacionário, mesmo assim. A decadência dos costumes da sociedade ocidental do século XX, a passagem do tempo e a frequente introspecção tratados por Houellebecq levam o leitor a refletir sobre sua própria vida e a daqueles que o cercam. O livro se torna acessível para qualquer um, por abordar estes temas universais, ainda que de forma particular. Os termos técnicos científicos, por exemplo, estão presentes em todo o escrito, remetendo ao título, inclusive. A obra é repleta de análises e de referências, levando também à reflexão construtiva e profunda. “Na realidade, toda esperança de fusão tenso sido liquidada pela
evidência da morte física, a vaidade e a crueldade só podem ampliar-se. Em compensação – concluiu estranhamente – o mesmo vale para o amor”. Nessa fala de Djerzinki, o autor analisa o progresso da sociedade juntamente com seu comportamento, e a relação disto com o amor, provocando o leitor.