Templo de Gelo - Mundo Angelical

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Débora Knittel & Érica Falcão





Débora Knittel & Érica Falcão


Templo de Gelo

copyright © 2015 Débora Knittel e Érica Falcão EDIÇÃO

Enéas Guerra Valéria Pergentino PROJETO GRÁFICO E DESIGN

Valéria Pergentino Elaine Quirelli CAPA

Enéas Guerra REVISÃO DE TEXTO

Maria José Navarro Maria José Bacelar CONSULTOR LITERÁRIO

James McSill

Texto revisado segundo o novo acordo ortográfico da língua portuguesa que entrou em vigor em 2009.

Dados Internacionais de Catalogação na Publicação (CIP) (Câmara Brasileira do Livro, SP, Brasil)

Knittel, Débora Templo de gelo : mundo angelical / Débora Knittel e Érica Falcão ; [ilustrações Enéas Guerra]. -- Lauro de Freitas, BA : Solisluna Editora, 2015. ISBN 978-85-89059-72-5 1. Ficção juvenil I. Guerra, Enéas. II. Título.

15-06629 CDD-028.5 Índices para catálogo sistemático: 1. Ficção : Literatura juvenil 028.5

Todos os direitos desta edição reservados à Solisluna Design Editora Ltda. 55 71 3379.6691 | 3369.2028 editora@solislunadesign.com.br www.solislunadesign.com.br www.solislunaeditora.com.br


Ă€ luz que irradia de todos os seres. Aos nossos maridos, filhos, familiares, amigos e leitores, que nos fortalecem em nossa jornada.





Prólogo Antes do Eclipse da Lua Azul Anjo Bérberus voou em direção à Quinta Hierarquia do Reino Angelical, a nebulosa entre o planeta Vênus e Marte. Logo atrás, outros anjos regressavam do planeta Terra, feridos e derrotados pelos seres das trevas. Os angelicais não conseguiram deter a destruição da Pirâmide de Cristal e evitar o aprisionamento dos Guardiões dos quatro elementos: água, terra, fogo e ar. Bérberus reconhecia a gravidade de ter revelado aos seres das trevas o local da Pirâmide de Cristal, mas o arrependimento não fazia parte dos seus planos. Ele atravessou o espectro translúcido da entrada do Reino Angelical regido pelo Arcanjo Camael, em direção ao Pessegueiro de Cristal, e olhou para trás, verificando se não era seguido por nenhum outro anjo. As pequenas folhas de cristal que cobriam os galhos do pessegueiro acolhiam os frutos de luz que irradiavam o espectro cor-de-rosa alaranjado. Bérberus abriu a mão onde estava a esfera gelatinosa e posicionou-a sobre um dos frutos. Com uma leve pressão 9


dos dedos, apertou-a, expelindo o líquido preto e viscoso que penetrou o fruto, deixando-o turvo. Em poucos segundos, o fruto voltou a ter o espectro cor-de-rosa alaranjado. A partir daquele momento Bérberus traçou seu próprio destino. – Bérberus! Ele se virou e lá estava o anjo de cabelos longos avermelhados e olhos cor de mel. Helena seria o único anjo de quem Bérberus sentiria falta. “A escolha já foi feita, minha amada, não posso voltar atrás nem mesmo por você.” Ele pensou, enquanto Helena se aproximava dele. – Você está bem, o que houve com sua energia? – a voz de Helena soou preocupada. Bérberus recuou, na tentativa de esconder a energia das trevas que já o dominava e também para não correr o risco de machucar Helena. – Não precisa se preocupar comigo – Bérberus cruzou os braços para conter o desejo de tocá-la. – Há uma semana que você tem evitado falar comigo. Está me escondendo algo? – Helena tocou o ombro de Bérberus e, como se tivesse tomado um choque, rapidamente tirou a mão. – O-que-você-fez? O semblante pálido de Helena deixou Bérberus, por alguns segundos, sem ação. – Não importa o que eu fiz – ele encarou Helena e disse em tom firme: – Afaste-se de mim!

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Ela fez menção de se afastar, mas Bérberus não controlou o impulso de puxá-la para junto de si. – Você ainda pode contar com a nossa ajuda – Helena falou com a voz baixa e trêmula, presa nos braços de Bérberus. – Não me dê sermões – ele roçou os lábios na face de Helena, que tentava se desvencilhar dele. – Bérberus! Solte-a! Você não tem como escapar! – a voz grave o fez soltar Helena e se virar para trás. Dois anjos guerreiros se aproximavam de Bérberus, apontando espadas douradas. – Venha comigo... – insistiu ele, segurando a mão de Helena com força. – Sinto muito... – ela olhou para os braços de Bérberus com o semblante assustado e depois, nos olhos dele, como se suplicasse para que se entregasse. O mal corria nas veias enegrecidas dos braços de Bérberus. Seria impossível voltar atrás. Agora ele pertencia às trevas e teria que encontrar outra forma de ter Helena ao seu lado para sempre. Furioso, ele levantou a mão e arremessou Helena nos anjos guerreiros, derrubando-os, e arrancou as próprias asas com as mãos. Depois, atirou-se no espaço sideral e deixou-se cair, entregue aos seres das trevas.

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CAPÍTULO UM

Sob o céu da Aurora Boreal

Rio de Janeiro, após o Eclipse da Lua Azul – Férias! – disse Holly, jogando-se sobre as almofadas do sofá da sala de estar. Agora Holly poderia passar mais tempo ao lado do seu namorado, o anjo Celino. O primeiro semestre da Universidade de Sociologia chegara ao fim e logo Celino se tornaria humano ou, pelo menos, ela tinha esperança de que isso acontecesse. Recostada no sofá, Holly se espreguiçou e notou, na cortina de voal branco da janela de vidro à sua frente, que transpareciam as nuances das cores deixadas pela Aurora Boreal após o Eclipse da Lua Azul. As cores permaneciam no céu, dia e noite, para os humanos que podiam vê-las. Para Holly, as cores a faziam lembrar-se dos momentos que passou ao lado de Maiara, Celino e Kami, lutando pelo planeta Terra. Desde o Eclipse da Lua Azul, alguns seres humanos voltaram 13


a se comunicar com os mundos Angelical e Elemental, e Holly tentava se encaixar nesse período de mudanças sem o seu pai. Durante meses, ela evitou pensar sobre a morte dele; era como se ele, a qualquer momento, pudesse voltar para ela. Buscar as coisas pessoais de seu pai no Museu seria a constatação de que ele partiu dessa vez para sempre. “Coragem garota!” Holly suspirou abraçando a almofada do sofá. Ela olhou para a parede da sala de estar, onde o relógio marcava 8 horas; ainda era cedo para ir ao Museu. Aquele seria o horário de tomar café da manhã com Maiara e os tios José e Rita. Holly se ergueu, deixando a almofada no colo, esticou o braço para pegar o porta-retratos sobre a mesa de apoio ao lado do sofá e tocou na foto da família que a acolheu com tanto amor naquela casa. Maiara estava na Amazônia, e os tios José e Rita foram a um congresso, nos Estados Unidos, sobre prevenção de doenças causadas pelo aumento da temperatura na Terra. “É tão bom quando descobrimos nosso propósito de vida. Admiro tanto vocês!” Pensou ela, colocando o porta-retratos de volta na mesa. Holly levantou-se do sofá e subiu as escadas para tomar banho. Antes, porém, remexeu os cabides até escolher a calça jeans com tachinhas douradas nos bolsos, a camiseta de malha com manga curta em tons dégradés laranja e as deixou sobre a cama. Após o banho, Holly se vestiu e sentou na banqueta em frente à penteadeira para calçar a sandália de salto anabela. Quebrou o silêncio colocando o fone de ouvido para ouvir música e 14


observou a sua imagem refletida no espelho da penteadeira enquanto desembaraçava os cabelos de forma mecânica, até que decidiu guardar a escova na gaveta da penteadeira e fazer uma maquiagem suave, passando apenas o protetor com base, o rímel e o gloss. Com o coração inquieto, Holly pensou se daria tempo de falar com Maiara por Messenger. Ela confirmou a hora no smartphone, tirou o fone do ouvido e teclou: Pode falar? Posso. Tudo bem? Mais ou menos L Como assim? Essa casa sem vcs é horrível. Não suporto mais esse silêncio. Que exagero! Vc sabe como eu sou. Rsrsrs Tá pronta para buscar as coisas de John no Museu? Acho que sim. Gostaria muito de estar aí com vc. Sei... mas não se preocupe. Dou conta. Sei, mas se não estiver bem... Sério! Tô legal J Me fale sobre vc? Novidades? Trabalhando muito... aprendendo muito... Acho que passo pelas provas. Ah! Vc duvida? Vc foi a escolhida. Nós fomos escolhidas. 15


Vc é diferente. Vc tem um dom especial. Todos nós temos. Holly parou de teclar e olhou para a tela do smartphone. Lembrou-se do momento em que teve ao seu lado o leopardo branco, o animal de poder que a acompanhou durante a jornada para libertar os Guardiões dos quatro elementos. Depois do Eclipse da Lua Azul, porém, ela não mais vivenciou a experiência de sentir a presença do espectro do leopardo branco. Ela voltou a teclar: Agora só quero que vc aproveite o seu momento e na volta me conte tudo. Ok? Conto sim... e vc e Celino? Vou ter que esperar... Ele continua dividido entre os mundos humano e angelical. Tenha paciência. Ainda preciso conquistar a paciência kkk Kkk Vc está bem mesmo? Aproveite a viagem J Então tá. A gente se fala depois. Se cuide. Bjs Se cuide também. Bjs Holly desligou o smartphone e o pressionou por alguns segundos no peito. Há tempos, ela prometeu a si mesma que 16


conduziria a própria vida com mais liberdade, sem deixar que a morte dos seus pais, John e Betânia, a fizesse viver com medo de perder todos os que ela amava. Ela se levantou da banqueta para pegar a câmara fotográfica de sua mãe no armário, olhou-a com carinho e depois a guardou na bolsa junto com o smartphone. Desceu as escadas e passou na cozinha para beber um suco de uva. Ela não tinha fome, mas não queria sair de casa com o estômago vazio. Antes de terminar de beber o suco, o alarme da agenda do smartphone tocou e Holly deu um longo suspiro... Não podia mais adiar aquele compromisso. r

Holly chegou ao Museu da Quinta da Boa Vista e ficou por algum tempo tirando fotos no jardim do lago que havia à sua volta. Durante os seis meses de namoro com Celino e das aulas na universidade, ela fez curso de fotografia. Aprendeu sobre luz e sombra e como captar os melhores ângulos. Sentia-se calma quando explorava as imagens através da lente da câmera fotográfica. Por mais triste que fosse estar ali sem o seu pai, o museu lhe trazia boas recordações e, entre um click e outro, ela se lembrava dos momentos que passou ao lado dele no jardim do Museu e se confortou. “Dad, tive pouco tempo com você e não soube aproveitar” – Holly entrelaçava os dedos na alça da câmera fotográfica – “Mas o que preciso fazer agora é seguir em frente.” 17


Ela guardou a câmera na bolsa, levantou-se, e foi em direção ao Museu. Antes de ir para o Núcleo de Pesquisas Arqueológicas, Holly parou no saguão, em frente ao meteorito do Bendegó. Aquele astrólito a fascinou desde o dia em que John contou a história do menino Bernardino da Mota Botelho, que, em 1784, o encontrou próximo ao riacho do Bendegó, no sertão baiano. “Está vendo, dear, não estamos sozinhos no universo.” Era como se o pai de Holly pudesse prever a existência de outros mundos. Holly tocou a superfície fria do meteorito e depois se dirigiu ao balcão da recepção. Após se identificar, ela recebeu da recepcionista, que lhe deu um sorriso cativante, a chave da sala que fora ocupada por John. Holly agradeceu e atravessou o Museu indo em direção ao prédio do Núcleo de Pesquisas Arqueológicas. De lá, subiu as escadas até o segundo andar. No final do corredor vazio, Holly parou em frente à porta da sala de seu pai e, antes de abri-la, notou que a placa com o nome dele havia sido retirada. Entrou e abriu as cortinas da janela para iluminar o ambiente, que estava com cheiro de papel velho. Os móveis de madeira escura, estilo inglês, ainda permaneciam no mesmo lugar, porém as mesas, prateleiras e paredes vazias daquela sala, confirmavam a ausência do seu pai. Os livros de pesquisas e as fotos de expedições agora faziam parte, apenas, da memória de Holly e do acervo do Museu. Espalhadas pelo chão, algumas caixas de papelão lacradas estavam endereçadas para outros destinos e, de 18


alguma forma, Holly ficou feliz em saber que todos os anos de dedicação e estudo de seu pai poderiam contribuir para a História da humanidade. Após deixar a bolsa no sofá de couro que continuava no canto da sala, Holly se aproximou da mesa em que seu pai trabalhava, repousou a mão sobre a caixa etiquetada com o nome dela e sentou na poltrona de couro macio em frente à mesa. – Posso ajudar? – a voz masculina e rouca quebrou o silêncio da sala. Holly recuou a mão da caixa e ergueu os olhos para o dono da voz. Parado na porta da sala, o rapaz de cabelo curto e escuro sorria com as mãos no bolso da calça de sarja caqui, botinas pretas e camisa bege com a manga dobrada na altura do cotovelo. Lembravam as roupas que John usava. Holly percebeu que tinha passado mais tempo do que devia e, fitando o rapaz da cabeça aos pés, levantou-se, meio sem jeito, da poltrona. Ele continuou sorrindo enquanto se aproximava de Holly. – Sou Pedro – ele estendeu a mão e preencheu a sala com cheiro de almíscar. – Pedro? – Holly estendeu a mão e, ao notar a indelicadeza dela por não ter se apresentado, continuou. – Sou Holly... vim buscar os pertences de John... sou a filha dele. – Eu sei... queria muito te encontrar – ele fitou Holly com os olhos pretos enigmáticos. – Nossa! Você consegue ser mais bonita do que nas fotos. 19


Em silêncio, Holly sentou-se na poltrona como se não tivesse ouvido o comentário de Pedro. – Não foi minha intenção incomodar você – Pedro desviou o olhar e passou a mão no cabelo. – Trabalho aqui no museu e fui o último assistente de John. Convivi pouco tempo com ele, mas achei educado da minha parte oferecer minha ajuda, caso você precisasse de algo e... – Meu pai nunca mencionou seu nome – Holly o interrompeu. – Se quiser posso mostrar meu cartão de estagiário do Núcleo de Pesquisas Arqueológicas – e, sem esperar resposta, tirou o cartão do bolso da camisa e o mostrou. – Sou estudante de arqueologia. Holly se levantou e deu uma espiada no cartão. – Acho que não fui gentil com você – disse, devolvendo o cartão. Pedro o guardou e contornou a mesa até chegar ao lado de Holly. – Eu compreendo – disse ele, apoiando a mão na mesa. – Comecei a trabalhar no museu três meses antes de John partir para a África, mas pude conhecer o profissional e o homem digno que ele foi. – Meu pai era incrível mesmo – Holly tocou na caixa sobre a mesa. – Desculpe Pedro... mas... – Holly... – Pedro a interrompeu. – Vou direto ao assunto. Na verdade, vim aqui para falar sobre a viagem que você e John fariam. 20


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