FICHA TÉCNICA
TÍTULO | TITLE Revista Portuguesa de Enfermagem em Saúde Mental | Portuguese Journal of Mental Health Nursing
PUBLICAÇÃO E PROPRIEDADE | PUBLISHING AND PROPERTY
Sociedade Portuguesa de Enfermagem em Saúde Mental | Portuguese Society of Mental Health Nursing
DIRETOR | MANAGING DIRECTOR
Carlos Sequeira, PhD - Escola Superior de Enfermagem do Porto, Portugal
COORDENADOR DA COMISSÃO EDITORIAL | EDITORIAL BOARD COORDINATOR
Francisco Sampaio, MSc – Hospital de Braga, Portugal
COMISSÃO EDITORIAL | EDITORIAL BOARD
Amadeu Gonçalves, MSc - Escola Superior de Enfermagem, Instituto Politécnico de Viseu Analisa Candeias, MSc - Escola Superior de Enfermagem da Universidade do Minho Bruno Santos, MSc – Casa de Sáude do Bom Jesus - Braga Carlos Vilela, MSc - Escola Superior de Enfermagem do Porto Lia Sousa, MSc - Centro Hospital de São João, Porto Luís Silva, MSc - Hospital de Magalhães Lemos, Porto Odete Araújo, MSc - Escola Superior de Enfermagem da Universidade do Minho Olga Cunha Rocha, MSc - Escola Superior de Enfermagem do Porto (Jubilada) Rita Costa, MSc - Unidade Local de Saúde de Matosinhos, Porto
COORDENADOR DA COMISSÃO CIENTÍFICA | SCIENTIFIC BOARD COORDINATOR
Luís Sá, PhD - Instituto de Ciências da Saúde - Universidade Católica Portuguesa, Porto, Portugal
COMISSÃO CIENTÍFICA | SCIENTIFIC REVIEWERS
Agustín Simónelli Muñoz, PhD - Universidad Católica San Antonio, Múrcia, Espanha Aida Mendes, PhD - Escola Superior de Enfermagem de Coimbra, Portugal Alexandre Marques Rodrigues, PhD - Escola Superior de Enfermagem da Cruz Vermelha Portuguesa de Oliveira de Azeméis Beatriz Araújo, PhD - Instituto de Ciências da Saúde - Universidade Católica Portuguesa, Porto, Portugal Carlos Sequeira, PhD - Escola Superior de Enfermagem do Porto, Portugal Carme Ferré Grau, PhD - Universitat Rovira i Virgili. Tarragona, Espanha Elaine Antunes Cortez, PhD - Escola de Enfermagem AAC - Universidade Federal Fluminense Elizabete Borges, PhD - Escola Superior de Enfermagem do Porto, Portugal Francisca Manso, PhD - Escola Superior de Enfermagem de Lisboa, Portugal Geilsa Cavalcanti Valente, PhD - Escola de Enfermagem AAC - Universidade Federal Fluminense Graça Pimenta, PhD - Escola Superior de Enfermagem do Porto, Portugal Isilda Ribeiro, PhD - Escola Superior de Enfermagem do Porto, Portugal Joaquim Passos, PhD - Escola Superior de Saúde do Instituto Politécnico de Viana do Castelo, Portugal José António Pinho, PhD - Centro Hospitalar do Porto, Portugal José Carlos Carvalho, PhD - Escola Superior de Enfermagem do Porto, Portugal José Carlos Gomes, PhD - Escola Superior de Saúde do Instituto Politécnico de Leiria, Portugal José Carlos Santos, PhD - Escola Superior de Enfermagem de Coimbra, Portugal Juan Roldan Merino, PhD - Escuela de Enfermería Sant Joan de Déu (adstrita a la UB), Espanha Júlia Martinho, PhD - Escola Superior de Enfermagem do Porto, Portugal Margarida Sotto Mayor, PhD - Hospital de Magalhães Lemos, Porto, Portugal Mar Lleixà-Fortuny, PhD - Universitat Rovira i Virgili. Tarragona, Espanha Marluce Miguel de Siqueira, PhD - Universidade Federal do Espírito Santo, Brasil Michell Araújo, PhD - Faculdade Católica Rainha do Sertão - Fortaleza e Hospital de M., Brasil Odete Pereira, PhD - Escola de Enfermagem da Universidade de São Paulo, Brasil Raul Cordeiro, PhD – Escola Superior de Saúde do Instituto Politécnico de Portalegre, Portugal Teresa Barroso, PhD - Escola Superior de Enfermagem de Coimbra, Portugal Teresa Lluch-Canut, PhD – Escola Universitària d’Infermeria - Universitat de Barcelona, Espanha Zeyne Scherer, PhD – Escola de Enfermagem de Ribeirão Preto - Universidade de São Paulo, Brasil
Revista Portuguesa de Enfermagem de Saúde Mental, Nº 11 (JUN.,2014) | 2
Público-alvo:
Enfermeiros, médicos, psicólogos, assistentes sociais, terapeutas ocupacionais e outras pessoas com interesse na área da saúde mental.
Objectivo:
Divulgação de evidências científicas sobre a promoção da saúde, prevenção de doenças, tratamento, reabilitação e reintegração das pessoas com doença mental ao longo da vida.
Âmbito:
Políticas e design dos cuidados de saúde; Avaliação, diagnóstico, intervenções e resultados de enfermagem; Sistemas de informação e indicadores em saúde mental; Direitos e deveres dos doentes mentais; Formação e investigação em enfermagem em saúde mental.
SUBSCRIÇÃO | SUBSCRIPTIONS
INDEXAÇÃO: A Revista da Sociedade Portuguesa de Enfermagem de Saúde Mental foi aceite para indexação em: SciELO Portugal - Scientific Electronic
Library Online
A revista cumpre os principais critérios de qualidade estabelecidos pela metodologia SciELO e foi aceite para integrar a plataforma SciELO. Já está disponível em formato electrónico: www.scielo.oces.mctes.pt/scielo.php?script=sci_serial&pid=1647-2160&nrm=iso&rep=
LATINDEX - Sistema Regional de Informação em linha para Revistas Científicas da América Latina, Carabíbas, Espanha e Portugal.
www.latindex.unam.mx/buscador/ficRev.html?folio=19823&opcion=2
Revista Portuguesa de Saúde mental é publicada duas vezes por ano, Junho e Dezembro O preço por número é: - para instituições € 10.00; - para particulares € 8.00 Portuguese Journal of Mental Nursing is published twice a year, June and December The price of each number is: - for institutions € 10.00; - for private subscribers € 8.00
CIBERE - Conselho Iberoamericano de
SECRETARIADO | SECRETARIAT
http://www.ebscohost.com/biomedical-libraries/cinahl-complete
Bruno Santos; Francisco Sampaio; António Carlos Amaral
ISSN:
1647-2160
FOTOS | PHOTOS Luís Silva
DEPÓSITO LEGAL | LEGAL REGISTRATION 294975/09
ENDEREÇO | ADDRESS
Prof. Carlos Sequeira - Escola Superior de Enfermagem do Porto Rua Dr. António Bernardino de Almeida, s/n, 4200-072, Porto, Portugal URL: www.aspesm.org E-mail: dir.spesm@gmail.com
Editores de Revistas de Enfermagem e Afins http://www.index-f.com/cibere/socios.php
CINAHL®, the Cumulative Index to
Nursing and Allied Health Literature
A revista cumpre os principais critérios de qualidade estabelecidos pela metodologia EBSCO e foi aceite para integrar esta base de dados. REV@Enf – Biblioteca Virtual em Saúde Enfermagem http://www.portal.revenf.bvsalud.org/php/index.php?lang=pt
SciELO Citation Index – Thomson Reuters
http://apps.web of knowle dge.com/sele ct_databases. do?highlighted_tab=select_databases&product=UA&SID=P 2h4wCk9ehzhdaSkRjK&last_prod=SCIELO&cacheurl=no
Aviso:
Os artigos publicados são propriedade da Revista Portuguesa de Enfermagem de Saúde Mental pelo que não podem ser reproduzidos, em parte ou no todo, sem a devida autorização da ASPESM, exceptuando o uso legal. A Responsabilidade pela idoneidade e conteúdo dos artigos é unica e exclusiva dos seus autores.
Revista Portuguesa de Enfermagem de Saúde Mental, Nº 11 (JUN.,2014) | 3
Índice 1
EDITORIAL: CONSENSOS EM SAÚDE MENTAL – DIAGNÓSTICOS, INTERVENÇÕES E
RESULTADOS .............................................................................................................................
6
ARTIGOS DE INVESTIGAÇÃO
2
INVENTÁRIO DE RAZÕES PARA VIVER: CONTRIBUTOS PARA A VALIDAÇÃO PARA A
POPULAÇÃO NÃO CLÍNICA PORTUGUESA .............................................................................. 9
3
ATIVIDADES DE OCUPAÇÃO TERAPÊUTICA – INTERVENÇÕES DE ENFERMAGEM
ESTRUTURADAS EM REABILITAÇÃO PSICOSSOCIAL ........................................................ 15
4
BURNOUT E INTERAÇÃO TRABALHO-FAMÍLIA EM ENFERMEIROS: ESTUDO
EXPLORATÓRIO COM O SURVEY WORK-HOME INTERACTION NIJMEGEN (SWING) ....... 24
5
COMUNICAÇÃO TERAPÊUTICA EM ENFERMAGEM: COMO A CARACTERIZAM OS
ENFERMEIROS
........................................................................................................................ 31
6
COMPETÊNCIAS PARA O TRABALHO NA ÁREA DE REABILITAÇÃO PSICOSSOCIAL ........ 39
7
AVALIAÇÃO DAS PROPRIEDADES PSICOMÉTRICAS DO QUESTIONÁRIO DE SAÚDE
MENTAL POSITIVA EM ESTUDANTES PORTUGUESES DO ENSINO SUPERIOR ............... 45
ARTIGOS DE BOAS PRÁTICAS
8
“PROJETO MENSANUS” – GANHOS EM SAÚDE MENTAL ................................................... 55
Revista Portuguesa de Enfermagem de Saúde Mental, Nº 11 (JUN.,2014) | 4
Revista Portuguesa de Enfermagem de Saúde Mental, Nº 11 (JUN.,2014) | 5
1
EDITORIAL: CONSENSOS EM SAÚDE MENTAL – DIAGNÓSTICOS, INTERVENÇÕES E RESULTADOS
Caras (os) colegas, A edição do número 11 da Revista Portuguesa de Enfermagem de Saúde Mental surge na véspera da realização do Seminário Internacional de Investigação em Saúde Mental e do V Congresso Internacional d’ ASPESM dedicado aos “Consensos em Saúde Mental”, que se realizam entre 18 a 20 de junho de 2014 no Hospital de Braga. O elevado número de propostas sugere uma excelente oportunidade de partilha de boas práticas e de resultados de investigação que carecem de ser divulgados. Para este número da revista submeteram-se um conjunto significativo de artigos de diversas áreas do saber, o que implicou um trabalho acrescido para a comissão editorial e científica, às quais queremos deixar o nosso agradecimento pelo empenho e rigor com que têm analisado as propostas de publicação, e contribuído de forma decisiva para a qualidade da revista. Por isso, alguns artigos que não puderam ser publicados neste número serão publicados nos números seguintes, o que nos possibilitará um maior período de tempo para o processo de revisão. Nesta edição da revista selecionamos seis artigos de investigação e um artigo de boas práticas. Os artigos de investigação abordam instrumentos de avaliação sobre: razões para viver; burnout e interação trabalho-família; e saúde mental positiva. Os artigos sobre intervenções abordam: atividades de ocupação terapêutica; comunicação terapêutica; e competências para a reabilitação psicossocial. Selecionamos ainda um trabalho sobre boas práticas: “Projeto Mensanus – ganhos em saúde mental”, uma vez que esse é também um dos principais objetivos da revista. No editorial deste número da Revista Portuguesa de Enfermagem de Saúde Mental problematizaremos a necessidade de consensos em Saúde Mental, essencialmente aqueles que importam e relevam para o exercício profissional dos enfermeiros.Considerase que nesta área é necessário evoluir no sentido de construir consensos em vários domínios, dos quais destacamos os conceitos, as classificações, os diagnósticos, as intervenções e os resultados.
Ao nível dos conceitos verifica-se que proliferam várias termos com semânticas muito similares, e que importa clarificar de modo a evitar redundâncias, a facilitar as prescrições e a possibilitar uma melhor avaliação. Por exemplo, ao nível das intervenções psicoterapêuticas existem varias intervenções com “rótulos diferentes”, mas que na prática clinica são prescritas de forma indiscriminada e as diferenças de conteúdo não são significativas – ex.: estimulação cognitiva; terapia pela reminiscência; remediação cognitiva; reabilitação cognitiva,… Com este exemplo podemos ver a amplitude das implicações da existência da multiplicidade de termos. Se nos centrarmos num serviço e em pessoas com o mesmo problema poderão ser-lhes indicadas nomes de intervenções diferentes, quando na realidade são similares, o que tem impacte na continuidade de cuidados e na avaliação dos resultados. Por isso, urge investir na clarificação dos conceitos, desde logo, com o conceito saúde mental na atualidade. O que se entende por saúde mental positiva (resiliência mental), saúde mental negativa (vulnerabilidade), normal e patológico, entre outros. Ao nível das classificações somos confrontados com uma revisão do DSM-IV - o DSM 5, que nos oferece um conjunto de alterações que não são consensuais. Por exemplo ao nível dos distúrbios globais do desenvolvimento, distúrbio cognitivo leve, distúrbio disfórico pré-menstrual, entre outros, existem muitas dúvidas sobre as suas caraterísticas definidoras e como em muitos casos se podem confundir com a “normalidade”. Em termos da Classificação Internacional para a Prática de Enfermagem (CIPE), também se verifica que algumas definições carecem de maior robustez, de forma a diminuir a subjetividade inter-individual. Por outro lado, há um conjunto de termos, sinais e sintomas que constam na classificação e outros em que não há qualquer referência.
Citação: Sequeira, C. (2014). Editorial: Consensos em saúde mental – diagnósticos, intervenções e resultados. Revista Portuguesa de Enfermagem de Saúde Mental (11), 0608.
Revista Portuguesa de Enfermagem de Saúde Mental, Nº 11 (JUN.,2014) | 6
Nesta classificação também é importante consensualizar os focos, que podem ser agrupados para facilitar a descrição e a prescrição de intervenções – ex.: quando devemos ter por foco a cognição em vez da memória e orientação, ou a confusão em vez de memória e orientação; a depressão em vez de tristeza, vontade de viver diminuída, humor depressivo,… As classificações são uma forma de consensualizar conceitos, diagnósticos, e por isso são uma mais-valia imprescindível para a prática clinica. No entanto, em alguns casos carecem de investigação que as suporte. No que se reporta aos enfermeiros é fundamental investigar sobre quais os focos que devem constar na CIPE, de modo a que esta traduza as necessidades das pessoas nos diferentes contextos em que se encontram (hospital/comunidade). Em termos dos diagnósticos verifica-se que, na atualidade, se dispõe de um conjunto significativo de recursos estandardizados, como escalas, índices, indicadores, etc. Por isso, o desafio está em consensualizar quais os melhores instrumentos a utilizar em função quer do doente, quer do contexto em que o mesmo se encontra. Por exemplo, num serviço de internamento de psiquiatria qual o melhor instrumento para avaliar a ansiedade, a impulsividade, o risco de agressividade,… O que se verifica é que cada instituição adota o instrumento que lhe parece mais adequado e não aquele que é suportado por maior evidência. As diferenças de avaliação são necessárias e desejáveis desde que surjam a partir de necessidades diferentes ou de objetivos diferentes. Por isso, faz sentido investigar na validação de instrumentos para a população portuguesa que nos permitam caraterizar melhor cada necessidade em cuidados de enfermagem. Em termos do processo de diagnóstico, a CIPE veio criar algumas regras uniformizadoras. Agora importa consensualizar o conjunto de dados mínimos que nos permite “dizer” com rigor que determinado diagnóstico está presente, ou seja, qual a completude de determinados dados face a um determinado diagnóstico, clarificando quais os dados que são indispensáveis para o enunciado diagnóstico e quais os dados que são acessórios, mas que permitem uma melhor caraterização de determinado enunciado.
Em saúde mental este trabalho é fundamental pois, de outro modo, podemos referir que todos os dados são importantes e, neste registo, é impossível recolher todos os dados, pelo que cada um recolhe aqueles que considera mais relevantes. Por exemplo, para o risco de tentativa de suicídio, todos os dados do sujeito importam, mas há um conjunto de dados que revelam um maior efeito “preditor” e por conseguinte uma maior utilidade diagnóstica face a outros. Com base na evidência científica é necessário encontrar esses consensos, entre o que é necessário, o que é desejável e o que é dispensável. Em termos de intervenções verificamos que há duas áreas fundamentais e sobre as quais é necessário refletir para a existência de um maior consenso clinico. Uma está relacionada com a prescrição e outra está relacionada com a sua execução das várias intervenções. Em termos de prescrição é importante consensualizar quais as intervenções que apresentam potencial terapêutico para os diferentes diagnósticos. Parece óbvio que se trata de uma área que carece de investigação sobre os diferentes níveis de efetividade das intervenções em função de determinados diagnósticos e das situações clinicas dos utentes pois, de outra forma, parece que todos as intervenções “servem” para todos os diagnósticos. A NANDANIC-NOC fornece-nos um conjunto de informações muito úteis para este registo. No entanto, as mesmas carecem de validação para o contexto português, uma vez que a realidade nos Estados Unidos da América é diferente da portuguesa, quer ao nível dos contextos quer ao nível das funções dos profissionais. Em Portugal utilizamos a CIPE com taxonomia e não a NANDA pelo que se deve avaliar quais as inter-relações possíveis entre os diagnósticos com base na (CIPE) e os diagnósticos com base na (NANDA) e depois iniciar o processo de criação de arquétipos que nos permitam estabelecer uma relação com integridade referencial entre os diagnósticos e as intervenções. Ao nível das intervenções também se verifica que existem muitas intervenções que não são intervenções, mas sim atitudes (boa prática), que existem intervenções sem diferenças significativas de conteúdo (incentivar, encorajar, motivar…; ensinar, educar, informar), e outras vazias de conteúdo. Revista Portuguesa de Enfermagem de Saúde Mental, Nº 11 (JUN.,2014) | 7
O desafio está em criar consensos sobre que intervenções privilegiar em situações similares – padrões de qualidade das práticas. Relativamente à sua execução/implementação, também é importante que se consensualizem os procedimentos que devem ser adotados para determinada intervenção. Por exemplo se um enfermeiro refere que executou uma intervenção denominada de “Relação de ajuda” supõe-se que ele tenha cumprido uma série de pressupostos que devem estar explícitos e disponíveis. Por isso, a criação de procedimentos para cada intervenção é fundamental para a garantia da implementação de práticas de qualidade. A sua ausência traduz que cada profissional pode dizer que executou uma intervenção, mas no concreto ter efetuado coisas totalmente diferentes. Ainda ao nível das intervenções é também necessário consensualizar os “rótulos” das intervenções, no sentido de se contribuir para a redução do número de intervenções que em termos procedimentais não acrescentam conteúdo significativo. Por último, em termos de indicadores é importante definir quais os indicadores que se devem extrair em função dos diferentes contextos.
Revista Portuguesa de Enfermagem de Saúde Mental, Nº 11 (JUN.,2014) | 8
Parece evidente que num serviço de intervenção intensiva os indicadores deverão ser diferentes de um serviço de Psicogeriatria, ou de um serviço de hospital de dia. Por isso, o que importa é em função dos indicadores epidemiológicos de cada contexto determinar quais os indicadores de resultados que são mais relevantes. Não faz sentido, por exemplo, num serviço de intervenção intensiva, onde o número de dias de permanência é de dois a três dias no máximo, ter um indicador de resultado sobre a prevenção de úlceras pressão e não ter um indicador sobre o risco de agressividade ou agitação. Como se pode constatar, a necessidade de consensos em diversas áreas é uma necessidade emergente para a implementação de padrões de qualidade onde o “SOMAR”, enquanto agregador de consensos, é uma mais-valia para as pessoas. Porto, 31 de Maio de 2014 O Diretor da Revista d’ ASPESM
2
INVENTÁRIO DE RAZÕES PARA VIVER: CONTRIBUTOS PARA A VALIDAÇÃO PARA A POPULAÇÃO NÃO CLÍNICA PORTUGUESA | Joana Matias1; José Carlos Santos2 |
RESUMO A intencionalidade suicida é um factor de risco relevante, relacionada com comportamentos auto-lesivos . A avaliação baseada em instrumentos de medição do risco de suicídio e em factores protectores, é crucial para a prevenção de comportamentos suicidários. O Inventário de Razões para Viver (Linehan, Goodstein, Nielsen e Chiles, 1983), elaborado tendo por base um quadro conceptual cognitivo-comportamental, é um questionário constituído por 48 itens, subdivididos em seis subescalas: Crenças de Sobrevivência e Mecanismos de Adaptação, Responsabilidade de Família, Preocupações com Crianças, Medo de Suicídio, Medo da Reprovação Social e Objecções Morais. Este inventário é um dos poucos instrumentos cuja abordagem é baseada nos mecanismos de coping adaptativos que estão habitualmente ausentes no indivíduo com ideação suicida, sendo a ênfase colocada em razões para viver e não em factores considerados de risco. O objetivo deste trabalho é contribuir para a sua validação em Portugal. Após validação consensual por peritos o RFLI foi aplicado a uma amostra de 505 sujeitos. A versão portuguesa revelou boa consistência interna. O valor global do alpha de Cronbach foi de 0,94; para as crenças de sobrevivência e mecanismos de adaptação foi de 0,95; medo de suicídio e da desaprovação social de 0,90; responsabilidade para com a família de 0,82; preocupações relacionadas com os filhos de 0,99 e objeções morais de 0,83. As propriedades da versão portuguesa do Inventário de Razões para Viver certificam a sua qualidade para avaliar as razões para viver. PALAVRAS-CHAVE: Ideação suicida; Suicídio; Fatores de risco; Psicometria
RESUMEN
ABSTRACT
“Asiento de razones para vivir: Contribución a la validación para la población no-clínica Portuguesa”
“Reasons for Living Inventory: Contributions to the validation for the non-clinical population Portuguese”
La intención suicida es un factor de riesgo relevante que se relaciona con los comportamientos autolesivos. La evaluación basada en instrumentos de medición del riesgo de suicidio y en factores protectores es crucial para la prevención de los comportamientos suicidas. El Inventario de Razones para Vivir (Linehan, Goodstein, Nielsen e Chiles, 1983), elaborado con base en un cuadro conceptual cognitivo – comportamental, es un cuestionario constituido por 48 ítems, subdivididos en seis subescalas: creencias de supervivencia y mecanismos de adaptación, responsabilidad familiar, preocupaciones relacionadas con los hijos, miedo al suicidio, miedo a la desaprobación social, y objeciones morales. Este inventario es uno de los pocos instrumentos cuyo enfoque se basa en los mecanismos de coping adaptativos que habitualmente están ausentes en el individuo con ideación suicida, y hace hincapié en las razones para vivir y no en los factores considerados de riesgo. El objetivo de este trabajo es contribuir a la validación en Portugal. Después de que un grupo de expertos realizase una validación consensual, se aplicó el RFLI a una muestra de 505 sujetos. La versión portuguesa mostró una buena consistencia interna. El valor global del alpha de Cronbach fue de 0,94; para creencias de supervivencia y mecanismos de adaptación fue de 0,95; para miedo al suicidio y a la desaprobación social de 0,90; para responsabilidad familiar de 0,82; para preocupaciones relacionadas con los hijos de 0,99, y para objeciones morales de 0,83. Las propiedades de la versión portuguesa del Inventario de Razones para Vivir certifican su calidad para evaluar las razones para vivir.
Suicidal intention is a relevant risk factor associated with selfinjurious behaviors. The assessment based on suicide risk assessment tools and on protective factors is essential to prevent suicidal behaviors. The Reasons for Living Inventory (Linehan, Goodstein, Nielsen e Chiles, 1983), designed based on a cognitive-behavioral conceptual framework, is a 48-item questionnaire divided into six subscales: Survival and Coping Beliefs, Responsibility to Family, Child-related Concerns, Fear of Suicide, Fear of Social Disapproval, and Moral Objections. This inventory is one of the few instruments whose approach is based on adaptive coping mechanisms which are usually lacking in individuals with suicidal ideation. Therefore, the emphasis is placed on reasons for living, rather than on risk factors. The objective of this work is to contribute to its validation in Portugal. After consensual validation from experts, the RFLI was applied to a sample of 505 individuals. The Portuguese version showed good internal consistency. Cronbach’s α for the global RFLI=0.94; for survival and coping beliefs=0.95; for fear of suicide and fear of social disapproval=0.90; for responsibility to family=0.82; for child-related concerns=0.99, and for moral objections=0.83. The properties of the Reasons for Living Inventory Portuguese version confirm that it is a reliable tool to assess reasons for living.
DESCRIPTORES: Ideación suicida; Suicidio; Factores de riesgo; Psicometría
KEYWORDS: Suicidal ideation; Suicide; Risk factors; Psychometrics Submetido em 04-12-2013 Aceite em 30-04-2014
1 Mestre em Enfermagem de Saúde Mental e Psiquiatria; Enfermeira no Centro Hospitalar Universitário de Coimbra, Serviço de Urgência, joanamatias82@gmail.com 2 Doutor em Saúde Mental; Professor Coordenador na Escola Superior de Enfermagem de Coimbra – UCP de Enfermagem de Saúde Mental e Psiquiatria, jcsantos@esenfc.pt Citação: Matias, J., & Santos, J. C. (2014). Inventário de Razões para Viver: Contributos para a validação para a população não clínica portuguesa. Revista Portuguesa de Enfermagem de Saúde Mental (11), 09-14 Revista Portuguesa de Enfermagem de Saúde Mental, Nº 11 (JUN.,2014) | 9
INTRODUÇÃO Portugal, no que concerne às taxas de suicídio, reflecte a realidade dos países mediterrâneos, contudo, quando comparado com Espanha, apresenta uma taxa de suicídio duas vezes superior. Em Portugal o suicídio é a segunda causa de morte em adolescentes, dai que seja crucial ter em conta a gravidade do problema e verificar que a prevenção constitui uma prioridade, sendo para isso indispensável reflectir e investigar conhecimentos sobre as estratégias que poderão ser desenvolvidas para a prevenção do mesmo (Henriques e Soeiro, 2006). De acordo com o Instituto Nacional de Estatística (2012), houve em Portugal 10,3 suicídios por cada 100.000 habitantes no ano de 2010, verificando-se ainda que o suicídio no sexo masculino tem vindo a aumentar enquanto que no sexo feminino houve uma ligeira diminuição, sendo sempre a taxa de suicídio superior no sexo masculino. Suicídio, Tentativa de Suicídio e Comportamentos Autolesivo sem Intenção: Conceitos O conceito de suicídio é respeitante ao acto deliberado de uma pessoa se auto-lesionar com a intenção de provocar a sua morte. Durkheim (1897) considera que o suicídio é todo o caso de morte que resulta directa ou indirectamente de um acto positivo ou negativo praticado pela própria vítima, acto em que a vítima sabia dever produzir esse resultado. Analisando esta definição verifica-se que ela contempla os aspectos essenciais que definem o suicídio: acto praticado pelo próprio, a intencionalidade do mesmo e ocorrência da morte. Na opinião de Saraiva (2006), o suicida pretende libertarse de estados emocionais internos muito penosos para si (angústia, depressão, culpabilidade) e de problemas externos, que sente como inevitáveis, intermináveis e intoleráveis, daí que a existência de factores protectores, como o suporte social e familiar e suporte da comunidade e dos serviços de saúde, constituem uma mais valia no sentido de ultrapassar os problemas externos percepcionados pelo indivíduo, ajudando nos casos de sofrimento emocional (Santos, 2006). Por sua vez, a tentativa de suicídio constitui um acto de auto-agressão deliberado, levado a cabo por um indivíduo e que visa a sua morte, mas que, por razões diversas, resulta frustrado (Direção Geral de Saúde, 2013). Caracteriza-se através dos gestos auto-destrutivos mas não fatais dos indivíduos, na maior parte das tentativas de suicídio, a auto-agressão, apesar de genuína, é insuficiente para provocar a morte. Revista Portuguesa de Enfermagem de Saúde Mental, Nº 11 (JUN.,2014) | 10
Relativamente aos comportamentos autolesivos há um comportamento sem intencão suicida, mas envolvendo atos autolesivos intencionais, como, por exemplo: cortar-se ou saltar de um local relativamente elevado; ingerir fármacos em doses superiores às posologias terapêuticas reconhecidas; ingerir uma droga ilícita ou substância psicoativa com propósito declaradamente autoagressivo; ingerir uma substância ou objeto não ingeríveis, p. ex. lixívia, detergente, lâminas ou pregos (Direção Geral de Saúde, 2013). Tem maior incidência no sexo feminino, caracterizando-se pela prática de actos que simulam longinquamente a vontade de terminar a vida, mas com a peculiaridade de deixar pistas para que o acto não resulte na própria morte. Habitualmente estão presentes sentimentos de desespero, depressão, isolamento, perdas (relacionais, sociais, laborais e financeiras), a incapacidade em procurar ajuda e o acesso fácil a substâncias (Santos, 2006). Factores de Protecção De acordo com a literatura, os factores de protecção dos comportamentos suicidários são fatores que actuam como elementos que, de certa forma, impedem a pessoa de realmente considerar a autodestruição como saída possível. A prevenção do suicídio baseia-se no reforço dos factores ditos protectores, ou de protecção, e concomitantemente na diminuição dos factores de risco, tanto a nível individual como colectivo (Botega, Werlang, Cais e Macedo, 2006). Entre os factores de protecção encontram-se o bom relacionamento familiar, os cuidados parentais preservados, o apoio familiar, as relações de confiança (factores familiares); as boas habilidades sociais, a iniciativa no pedido de ajuda e de conselhos, a noção de valor pessoal, a abertura para novas experiências e aprendizagens, as estratégias comunicacionais desenvolvidas, a receptividade à ajuda de terceiros, a noção e empenho em projectos de vida (estilo cognitivo e personalidade); os valores culturais, o lazer, a prática de actividade física, a pertença a um grupo religioso, as boas relações com amigos e colegas, o apoio de pessoas relevantes e amigos que não apresentem comportamentos aditivos (factores culturais e sóciodemográficos); uma dieta saudável, a boa qualidade do sono (factores ambientais) (WHO, 2002 citado por Werlang, Borges e Fensterseifer, 2005).
Uma percepção mais optimista da vida, com razões para viver, como por exemplo os laços afectivos com os filhos e a percepção/ sentimento de importância na vida de outras pessoas, constitui um factor de protecção contra os comportamentos suicidários, opondo-se ao sentimento de desesperança que se estabelece como um factor preditivo. Outra forma de protecção encontrada particularmente no sexo masculino é ter uma ocupação, estar empregado, sentir-se produtivo e socialmente mais integrado através da sua actividade profissional. Segundo Botega, Werlang, Cais e Macedo (2006) as pessoas com maior envolvimento religioso, possuem, de um modo geral, menores taxas de suicídios.De forma geral, o sentimento de pertença, no sentido de possuir uma forte ligação, quer seja a uma comunidade, a um grupo religioso ou étnico, a uma família ou a algumas instituições, protegem, de acordo com Benincasa e Rezende (2006), o indivíduo da adopção de comportamentos suicidários. Factores de Risco Os comportamentos suicidários são multideterminados. Em cada conduta suicidária estão envolvidas variáveis sociais, psicológicas, biológicas, interpessoais, culturais, genéticas e psiquiátricas. O desemprego, a doença, a pobreza súbita, a solidão, a velhice, o abuso de substâncias, as perturbações familiares, os conflitos interpessoais, as pressões decorrentes da vida, são alguns dos aspectos que podem contribuir para a adopção destes comportamentos (Saraiva, 2010). Apesar de não ser possível a predição do suicídio com exactidão, o conhecimento dos principais factores de risco para a adopção de comportamentos para-suicidários é essencial assim como a existência de escalas de avaliação de risco de comportamentos suicidários. Inventário de Razões para Viver O Reasons for Living Inventory (Inventário de Razões para Viver) foi elaborado por Marsha Linehan e seus colaboradores em 1983 a fim de avaliar as características adaptativas nos comportamentos suicidários, nomeadamente no suicídio, baseando-se no facto de que a crença em algo significativo para viver (sobrevivência, família, filhos, medo da morte, medo da desaprovação social e objecções morais), independentemente da sua forma, e as suas expectativas são significativas para a não adopção de comportamentos suicidários. É um questionário constituído por 48 itens, os quais avaliam uma série de crenças que diferenciam o indivíduo suicida de indivíduos não suicidas e que pode ser visto como uma medida do comprometimento de um indivíduo para várias razões para não cometer suicídio caso este pensamento ocorra.
Os 48 itens que constituem o Inventário de Razões para Viver são avaliados através de uma escala tipoLikert que varia de 1 (extremamente sem importância) a 6 pontos (extremamente importante), avaliando as diversas crenças relacionadas com as razões para não cometer o suicídio, caso o pensamento ocorra. Relativamente à sua estrutura, o Inventário de Razões para Viver (Linehan et al, 1983) tem seis subescalas: Crenças de Sobrevivência e Coping (SCB), Responsabilidade para com a Família (RF), Preocupações relacionadas com os Filhos (CRC), Medo de Suicídio (FS), Medo da Desaprovação Social (FSD) e Objecções Morais (MO). METODOLOGIA Neste estudo, o processo de tradução e retroversão do Inventário de Razões para Viver de Linehan et al (1983) decorreu de Outubro de 2010 a Junho de 2011. Inicialmente foi necessária fazer a tradução da versão original em Inglês para Português por um especialista que domina a língua, o conteúdo e a amostra do estudo, sendo posteriormente, realizada a retroversão da mesma a qual foi efectuada por uma tradutora, processo que decorreu de Setembro de 2010 a Março de 2011. Posteriormente, a versão original, a versão traduzida e a retroversão foram analisadas num painel de peritos pluridisciplinar . Neste estudo, foi realizado um pré-teste numa amostra de 42 pessoas com idades compreendidas entre os 18 e os 66 anos de idade. Da sua análise verificou-se que: as instruções do questionário são suficientes e adequadas; todas as questões são compreendidas; as opções de resposta inicialmente elaboradas “Nada Importante” e “Algo Sem Importância”, suscitavam algumas dúvidas, tendo sido reformuladas para “Irrelevante” e “Muito Pouco Importante”. O instrumento de recolha de dados é então composto por 4 partes: na primeira parte é utilizado um questionário de caracterização sócio-demográfica (sexo, idade, estado civil, habilitações literárias, situação profissional, área de residência (rural ou urbana) e agregado familiar). A segunda parte é constituída pelo Inventário de Razões para Viver (Linehan et al, 1983), na terceira parte encontra-se o Inventário Clínico de Auto-Conceito (Vaz Serra, 1986) e por último, o Inventário de Depressão de Beck (Vaz Serra, Pio Abreu, 1973). Revista Portuguesa de Enfermagem de Saúde Mental, Nº 11 (JUN.,2014) | 11
Relativamente ao processo de colheita de dados, considera-se que no estudo, o processo de amostragem é a amostragem não probabilística, do tipo acidental ou por conveniência, composta pelos alunos da Escola Superior de Enfermagem de Coimbra, seus familiares e pessoas suas conhecidas através da divulgação do instrumento de recolha de dados por correio electrónico, através do link https://www.surveymonkey. com/s/6YDJYS9, o qual se encontrou activo até 15 de Janeiro de 2012. RESULTADOS A amostra do estudo é constituída por 505 sujeitos, maioritariamente do sexo feminino (69,5%). Relativamente ao estado civil, verifica-se que os elementos da amostra são, na sua maioria, solteiros (56,8%), 54,7% trabalhadores por conta de outrem e a maioria reside em meio urbano. Pode-se ainda afirmar que a amostra contempla todos os níveis de literacia, abrangendo indivíduos sem escolaridade até com doutoramento, sendo que o nível habilitacional com maior número de sujeitos é a licenciatura (50,7%). Por último, pode-se afirmar que existe uma maior percentagem (30,3%) dos inquiridos a residirem com pais e irmãos. Os resultados obtidos para o autoconceito, depressão e inventário de razões para viver são compatíveis com uma população não clinica (Quadro 1). Quadro 1 - Estatística Descritiva da Versão Original do Inventário de Razões para Viver, do Inventário Clínico de Auto-Conceito e do Inventário da Depressão de Beckdiária Média
D. P
Mín. Máx.
Inventário de Razões para Viver (global)
211,10
34,52
48
288
Inventário Clínico de AutoConceito
71,98
8,66
20
95
Inventário de Depressão de Beck
5,20
6,59
0
63
A variância explicada do inventário com cinco dimensões é de 59,988% (Quadro 2). Quadro 2 - Total de Variância Explicada pelas Cinco Dimensões do Inventário de Razões para Viver Factores
1 2 3 4 5
Valores Iniciais (Somatório de Extracção de Cargas)
Somatório da Rotação de Cargas
Total
% % CuVariância mulativa
Total
% % CuVariância mulativa
14,965 6,645 2,873 2,253 2,059
31,176 13,843 5,985 4,693 4,291
12,297 6,337 4,114 3,078 2,969
25,619 13,202 8,570 6,412 6,185
31,176 45,019 51,004 55,697 59,988
Revista Portuguesa de Enfermagem de Saúde Mental, Nº 11 (JUN.,2014) | 12
25,619 38,821 47,391 53,803 59,988
Após a realização da análise factorial, com cinco dimensões os itens agruparam-se conforme expressa o Quadro 3. Quadro 3 - Análise Factorial com Rotação Varimax, com Cinco Dimensões, do Inventário de Razões para Viver para População Não Clínica Portuguesa Factores
Itens do Inventário de Razões para Viver
1
1, 2, 3, 4, 5, 6, 7, 8, 9, 10, 11, 12, 13, 14, 15, 16, 17, 18, 19, 20, 21, 22, 23, 24, 29
2
35, 36, 37, 38, 39, 40, 41, 42, 43, 44
3
25, 26, 27, 28, 30, 31
4
32, 33, 34
5
45, 46, 47, 48
Os valores para consistência interna do inventário são elevados para cada dimensão e para o global, pressupondo uma boa (Quadro 4). Quadro 4 - Estudo da Fidedignidade (Consistência Interna) do Inventário de Razões para Viver para a População Não Clínica Portuguesa Alfa de Cronbach Inventário de Razões para Viver (global) Inventário de Razões para Viver (Sub-Escalas): • Crenças de Sobrevivência e Mecanismos de Adaptação (SCB) • Medo do Suicídio e da Desaprovação Social (FS – FSD) • Responsabilidade para com a Família (RF) • Preocupações relacionadas com os Filhos (CRC) • Objecções Morais (MO)
Metade-Metade Spearman Brown
Guttman
0,94
0,57
0,55
0,95
0,93
0,92
0,90
0,87
0,87
0,82
0,85
0,85
0,99
0,99
0,88
0,83
0,87
0,86
No que diz respeito à correlação entre os itens e a escala total (consistência Interna do Item), verifica-se que todos eles satisfazem o critério de correlação com a escala total (r›0,40). Relativamente à Validade Convergente do Item, ou seja, à correlação dos itens com a sub-escala ou dimensão a que pertence, verifica-se que todos eles satisfazem o critério de existência de uma magnitude superior a r=0.40. Quanto à Validade Discriminante, verifica-se que todos os itens exibem uma correlação com a escala a que pertencem superior em 10 pontos à correlação com a sub-escala a que não pertencem. Assim, conclui-se que a maioria dos itens avaliam a dimensão a que pertencem, quer no que respeita à escala total, quer no que respeita a cada uma das sub-escalas. Quanto à correlação entre subescalas do Inventário de Razões para viver, pode-se afirmar que existe uma correlação significativa entre cada uma das sub-escalas, e entre estas e a escala global.
O valor desta correlação varia entre 0,18 e 0,78, evidenciando uma certa dependência entre as sub-escalas. A correlação do Inventário de Razões para Viver com o Inventário Clínico de Auto-conceito é positiva e estatisticamente significativa enquanto com o Inventário de Depressão de Beck a relação é inversa (Quadro 5) Quadro 5 - Correlação de Pearson entre o Inventário de Razões para Viver e o Inventário Clínico de Auto Conceito, e entre o Inventário de Razões para Viver e o Inventário de Depressão de Beck Inventário de Inventário Clínico Depressão de de Auto-conceito Beck Inventário de Razões 0,54** para Viver (global) ** Correlação significativa a 0,01
-0,24**
DISCUSSÃO A tradução do Inventário de Razões para Viver foi efectuada à luz das propriedades psicométricas, confiabilidade e validade convergente e discriminante. Através da análise dos resultados pode-se afirmar que, no presente estudo a análise factorial em seis factores (ou dimensões) não foi coincidente com a versão original do Inventário de Razões para Viver. Perante tais resultados, foi necessário fazer uma análise factorial confirmatória a cinco dimensões a qual explica 59,988% dos resultados do estudo. Nesta análise verificou-se que o item 29 “Amo e divirto-me demasiado com a minha família e não os conseguiria deixar” se associava a uma nova dimensão “Crenças de Sobrevivência e Mecanismos de Adaptação” ao invés da dimensão “Responsabilidade para com a Família”. Este item, faz referência ao amor e sentimento de pertença e bem-estar na família, factores que poderão ser entendidos como parte integrante dos Mecanismos de Adaptação do indivíduo, pelo que o item é congruente com a dimensão “Crenças de Sobrevivência e Mecanismos de Adaptação”. A análise factorial confirmatória a cinco dimensões revelou também que as dimensões “Medo do Suicídio” e “Medo da Desaprovação Social” se associavam, não permitindo uma separação entre as questões individuais e as sociais, reforçando sim o conceito Medo como uma forma protectora contra o suicídio relacionada com as questões culturais e individuais da pessoa. No que concerne à fidelidade, esta foi avaliada através do Alfa de Cronbach e do método Metade - Metade (com correcção de Spearman Brown e de Guttman). Verificou-se que o Inventário de Razões para Viver tem uma boa consistência interna no sentido em que se observa uma enorme homogeneidade dos itens,
apresentando um valor de Alpha de Cronbach entre 0,82 e 0,95 para as sub-escalas do Inventário de Razões para Viver e valores entre 0,85 e 0,99 no método Metade - Metade com correcção de Spearman Brown e entre 0,85 e 0,92 com correcção de Guttman. A fim de avaliar a validade de constructo procedeu-se a uma análise correlacional (correlação de Pearson) entre o Inventário de Razões para Viver (com cinco dimensões) e o Inventário Clínico de Auto-Conceito (Vaz Serra, 1986), sendo expectável uma correlação positiva. Dos resultados obtidos verificou-se a existência de uma correlação positiva e significativa entre estes dois instrumentos (correlação de 0,54). A expectativa de uma correlação positiva e significativa baseia-se no facto de o auto-conceito ser um fenómeno íntimo e pessoal que caracteriza a forma como cada pessoa se percepciona a si mesma, influenciando as razões que a mesma identifica para viver. Dado que o Auto-Conceito resulta da observação do Eu como objecto ou agente da própria acção, influenciando de forma directa a forma de estar do indivíduo. As pessoas com auto-conceito consistente, positivo e realista comportam-se de modo saudável, confiante e construtivo, e caracterizam-se por serem seguras, confiantes, com respeito próprio e sem necessidade da aprovação dos outros, sentem-se menos ameaçadas por tarefas difíceis, pessoas ou situações, sentemse confortáveis na relação com os outros e têm menor distorção da percepção da realidade, identificando mais razões para viver. Daí a correlação positiva entre o Inventário de Razões para Viver e o Inventário Clínico de Auto-Conceito utilizado. No presente estudo, avaliou-se ainda a existência de uma correlação negativa e significativa (-0,24) entre o Inventário de Razões para Viver (com cinco dimensões) e o Inventário de Depressão de Beck (validado por Vaz Serra e Pio Abreu, 1973). Tal facto seria também expectável uma vez que a depressão surge como a entidade nosológica mais frequentemente relatada e presente em mais de metade dos comportamentos suicidários, sustentada pelo humor depressivo, pensamento dicotómico, isolamento, constrição da mente, desesperança, o que faz com que a pessoa tenha dificuldade em identificar razões para viver. Assim, era expectável que uma pessoa com valor superior no Inventário de Depressão de Beck, apresentasse um valor inferior no Inventário de Razões para Viver, e vice-versa. Por tudo isto, pode-se afirmar que o Inventário de Razões para Viver apresenta uma boa validade de constructo, convergente e discriminante, significando que este inventário mede aquilo que se pretende que medir. Revista Portuguesa de Enfermagem de Saúde Mental, Nº 11 (JUN.,2014) | 13
Como tal, pode-se concluir que estamos perante um instrumento de avaliação válido e fidedigno, o qual pode ser muito útil quer para a investigação quer para a prática clínica. Uma vez que na amostra a percentagem de sujeitos com Habilitações Literárias superiores ou iguais ao grau académico de Bacharelato eram superiores às verificadas para a população geral, procedeu-se a uma análise factorial no sentido de perceber se este facto influenciaria, ou não, os resultados. Da sua análise verificou-se que as habilitações Literárias não influenciavam a análise factorial do Inventário de Razões para Viver para a população não clínica portuguesa. CONCLUSÃO A elaboração deste trabalho de investigação permite sistematizar e planificar o trabalho desenvolvido, no sentido de validar para a população não clínica portuguesa o Inventário de Razões para Viver, o qual nos fornece uma visão positiva ao dar ênfase às razões para não se cometer o suicídio, caso o pensamento acorra. Considera-se a intencionalidade suicida como um factor de risco relevante, relacionada com comportamentos de auto-agressão futuros. Estes achados sugerem que a avaliação baseada em instrumentos de medição do risco de suicídio e nos factores protectores são relevantes para a prevenção de comportamentos suicidários. Deste modo, surge a pertinência de validação para a população não clínica portuguesa do Inventário de Razões para Viver. A tradução do Inventário de Razões para Viver foi efectuada tendo por base as propriedades psicométricas do instrumento, a confiabilidade, a validade convergente e a validade discriminante. Após a análise factorial confirmatória conclui-se que as qualidades psicométricas do Inventário de Razões para Viver são bastante satisfatórias para a população não clínica portuguesa, possuindo elevadas semelhanças com o original.Como limitações a este estudo, consideramse a amostragem não probabilística , devendo os seus resultados serem extrapolados com prudência, bem como o processo de colheita de dados ter sido efectuado via electrónica, o que poderia ter sido uma desvantagem/ limitação à participação no estudo, por parte de alguns sujeitos. Implicações para a Prática Clínica Considera-se que a disponibilidade de mais um instrumento de avaliação do risco de comportamentos da esfera suicidária aumenta a capacidade para a detecção e intervenção precoce. Revista Portuguesa de Enfermagem de Saúde Mental, Nº 11 (JUN.,2014) | 14
REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS Benincasa, M., e Rezende, M. M. (2006). Tristeza e suicídio entre adolescentes: Fatores de risco e proteção. Boletim de Psicologia, 93-110. Botega, N. J., Werlang, B. S., Cais, C. F., e Macedo, M. M. (2006). Prevenção do Comportamento Suicida. Psicologia Clínica, 37(3), 213-220. Direção Geral de Saúde (2013). Plano Nacional de Prevenção do Suicídio. Programa Nacional de Saúde Mental. Lisboa. Durkheim, E. (1897.) Le suicide. Paris: Ed. Alcan. Henriques, M. N., e Soeiro, P. ( 2006). Prevenção do suicídio na escola. Sugestões para a elaboração dum projecto. In B. Peixoto, C. B. Saraiva, e D. Sampaio, Comportamentos Suicidários em Portugal (pp. 447-468). Coimbra: Redhorse Indústria Gráfica, Lda. Instituto Nacional de Estatística (2013). Acedido a 5 de setembro, 2013. Disponível em http://www.ine.pt/xportal/xmain?xpid=INE&xpgid=ine_indicadores&indOcor rCod=0001674&contexto=bd&selTab=tab2 Linehan, M., Godstein, J., Nielsen, S., & Chiles, J. (1983). Reasons for staying alive when you are thinking of killing yourself: the Reasons for Living Inventory. Journal of Consulting and Clinical Psychology, 51(2), 276-286. Santos, J. C. (2006). Conflitualidade familiar e comportamentos suicidários. O papel da emoção expressa. In B. Peixoto, C. B. Saraiva, e D. Sampaio, Comportamentos Suicidários em Portugal (pp. 183-206). Coimbra: Redhorse Indústria Gráfica, Lda. Santos, M. J. (2006). Algumas considerações sobre o risco de suicídio. In B. Peixoto, C. B. Saraiva, e D. Samapaio, Comportamentos Suicidários em Portugal (pp. 151-162). Coimbra: Redhorse Indústria Gráfica, Lda. Saraiva, C. B. (2006). Estudos sobre o Para-Suicídio: O que leva os jovens a espreitar a morte. Coimbra: Redhorse – Indústria Gráfica, Lda. Saraiva, C. (2010). Suicídio: de Durkheim a Shneidman, do determinismo social à dor psicológica individual. Psiquiatria Clínica, 31(3), 41-61. Vaz-Serra, A. (1986). O Inventário Clínico de Auto-Conceito. Psiquiatria Clínica, 7(2), 67-84. Vaz Serra, A., e Pio Abreu, J. L. (1973). Aferição dos quadros clínicos depressivos. I –Ensaio de aplicação do “Inventário Depressivo de Beck” a uma amostra portuguesa de doentes deprimidos. Coimbra Médica, XX, 623-644. Werlang, B. S., Borges, V. R., e Fensterseifer, L. (2005). Fatores de risco ou proteção para a presença de ideação suicida na adolescência. Revista Interamericana de Psicologia, 259-266.
3
ATIVIDADES DE OCUPAÇÃO TERAPÊUTICA – INTERVENÇÕES DE ENFERMAGEM ESTRUTURADAS EM REABILITAÇÃO PSICOSSOCIAL | Carlos Melo-Dias1; Amorim Rosa2; Alberto Pinto3 |
RESUMO A ocupação na sua dimensão terapêutica associada ao tratamento de pessoas com doença mental foi-se implementando, ganhando credibilidade e difundindo desde o início do século XX. Contudo, só recentemente passou a ser entendida como um processo adaptativo contínuo que permite à pessoa desenvolver habilidades, competências e identidade, participando em processos ocupacionais diversos ao longo do seu percurso de vida e nos diferentes contextos ambientais onde se insere. O processo de reabilitação e de recuperação psicossocial tem como objetivo intrínseco, ensinar e treinar os indivíduos incapacitados pela doença mental para o desempenho das habilidades físicas, emocionais e intelectuais necessárias à sua vida autónoma, num nível superior de bem-estar, e com a menor ajuda possível de profissionais de saúde. Este ensaio teórico tem como finalidade propor o conceito de Atividade Ocupacional Terapêutica (AOT) em Enfermagem, estabelecendo uma dinâmica particular entre os seus três elementos nucleares: enfermeiro-clienteatividade, bem como com os seus domínios de utilização. Sintetizam-se também algumas das formulações teóricas que sustentam a prática clínica de Enfermagem e alguns modelos de compreensão das intervenções no comportamento social. Em análise descritiva enumeram-se os objetivos, os determinantes e benefícios das AOT’s em ambiente de Enfermagem de Saúde Mental e Psiquiátrica, para por fim expor os fundamentos do processo de planeamento com enfase no papel autónomo do enfermeiro no diagnóstico, prescrição, execução e avaliação das intervenções. PALAVRAS-CHAVE: Atividade ocupacional terapêutica; Enfermagem; Reabilitação psicossocial; Saúde mental
RESUMEN
ABSTRACT
“Actividades de ocupación terapéutica – intervenciones de enfermería estructuradas en rehabilitación psicosocial”
“Therapeutic occupation activities – nursing structured interventions in psychosocial rehabilitation”
Desde el inicio del siglo XX, la ocupación, en su dimensión terapéutica asociada al tratamiento de personas con enfermedad mental, ha ido implementándose, ganando credibilidad y difundiéndose. Sin embargo, solo en fechas muy recientes ha pasado a ser entendida como un proceso adaptativo continuo que permite a la persona desarrollar habilidades, competencias y una identidad, participando en diversos procesos ocupacionales a lo largo de su trayectoria de vida y en los diferentes contextos ambientales en los que se encuentra. El proceso de rehabilitación y recuperación psicosocial tiene como objetivo intrínseco enseñar y formar a los individuos discapacitados por una enfermedad mental en torno al desempeño de las habilidades físicas, emocionales e intelectuales necesarias para llevar una vida autónoma, en un nivel superior de bienestar y con la menor ayuda de profesionales sanitarios posible. Este ensayo teórico tiene como finalidad proponer el concepto de Actividad Ocupacional Terapéutica (AOT) en Enfermería, estableciendo una dinámica particular entre sus tres elementos nucleares: enfermero – cliente – actividad, así como con sus dominios de utilización. Asimismo, se resumen algunas de las formulaciones teóricas que sostienen la práctica clínica de enfermería y algunos modelos de comprensión de las intervenciones en el comportamiento social. En un análisis descriptivo se enumeran los objetivos, los determinantes y los beneficios de las AOT en entornos de enfermería de salud mental y psiquiátrica, para, por último, exponer los fundamentos del proceso de planificación centrado en el papel autónomo del enfermero en el diagnóstico, la prescripción, la ejecución y la evaluación de las intervenciones.
In its therapeutic dimension associated with the treatment of people with mental illness, occupation has been gradually implementing, gaining credibility and spreading since the beginning of the 20th century. However, it was only recently that it started being understood as a continuous adaptive process which allows individuals to develop skills, competencies and their own identity, by participating in various occupational processes throughout the life cycle and within different environmental contexts. The process of psychosocial rehabilitation and recovery has the intrinsic goal of teaching and training mentally impaired individuals to perform the physical, emotional and intellectual skills needed for leading an autonomous life, with a higher level of well-being and the least possible help from health professionals. This theoretical essay aims to propose the concept of Therapeutic Occupational Activity (TOA) in Nursing, while establishing a specific dynamics between its three core elements, nurse-client-activity, as well as with its fields of use. Some theoretical formulations which sustain clinical nursing practice are also synthetized, as well as some models of understanding interventions in social behavior. Using descriptive analysis, the goals, determinants and benefits of TOAs in Mental and Psychiatric Health Nursing settings are listed to describe the foundations of the planning process with emphasis on the nurse’s autonomous role in the diagnosis, prescription, performance and evaluation of interventions.
DESCRIPTORES: Actividades ocupación terapéuticas; Enfermería; Rehabilitación psicosocial; Salud mental
KEYWORDS: Therapeutic occupation activities; Nursing; Psychosocial rehabilitation; Mental health Submetido em 06-03-2014 Aceite em 30-05-2014
1 Doutorando em Enfermagem na Universidade Católica Portuguesa, ICS - Porto; Investigador na Unidade de Investigação em Ciências da Saúde: Enfermagem (UICISA-E); Professor Adjunto Escola Superior de Enfermagem de Coimbra (ESEnfC) – UCP Enfermagem de Saúde Mental e Psiquiatria, Rua 5 de Outubro, Coimbra, cmelodias@esenfc.pt 2 Doutorando em Ciências de Enfermagem no ICBAS; Investigador na UICISA-E; Professor Adjunto na ESEnfC – UCP Enfermagem de Saúde Mental e Psiquiatria, amorim@ esenfc.pt 3 Doutorando; Investigador na UICISA-E; Professor Adjunto na ESEnfC - UCP Enfermagem de Saúde Mental e Psiquiatria, mpinto@esenfc.pt Citação: Melo-Dias, C., Rosa, A., & Pinto, A. (2014). Atividades de ocupação terapêutica – intervenções de enfermagem estruturadas em reabilitação psicossocial. Revista Portuguesa de Enfermagem de Saúde Mental (11), 15-23. Revista Portuguesa de Enfermagem de Saúde Mental, Nº 11 (JUN.,2014) | 15
INTRODUÇÃO O cuidar em Enfermagem promove os projetos de saúde que cada pessoa define, na procura da satisfação global das suas necessidades, concretizando o seu funcionamento social. Este princípio convoca intrinsecamente a reabilitação psicossocial na perspetiva das pessoas virem a atingir o seu máximo potencial de funcionamento e participação na sua comunidade. A ocupação terapêutica parece ser algo comum e ancestral. Para os ambientes terapêuticos de Enfermagem, é algo intrínseco à prática clinica, que urge estabelecer como construto científico. Com este ensaio propomos uma definição de Atividade Ocupacional Terapêutica (AOT) de uso universal e transversal em Enfermagem, prescrita por Enfermeiros, clinicamente focada, enquanto ação conjunta com o cliente para o seu máximo desempenho, autonomia e satisfação. Foi uma construção com processo de maturação de alguns anos, edificada com os fundamentos conceptuais que usamos na nossa prática da Docência, e com o histórico da diversidade de experiencias clínicas, aliado à atual experiencia na supervisão de estudantes de licenciatura e de mestrado em Enfermagem. Apresentamos neste artigo o que entendemos por AOT, enquadrando as suas caraterísticas e domínios. É definido o enquadramento conceptual das intervenções autónomas e das escolas de pensamento elencadas nas competências de pensamento e ação do cliente, no sentido de racionalizar o contínuo de independência/ dependência, e permitir a tomada de decisão clínica. Descreve-se também todo o processo de organização e planificação com ênfase nos benefícios, no impacto na saúde e no funcionamento social da pessoa e da comunidade. Sobre o Conceito de AOT – Atividade Ocupacional Terapêutica O princípio major do processo de reabilitação psicossocial é oferecer às pessoas incapacitadas pela doença mental, a oportunidade de atingir o seu máximo potencial de funcionamento independente na comunidade, ensinando-lhes o desempenho de habilidades físicas, emocionais, e intelectuais necessárias à vida em autonomia, no nível mais alto possível de bem-estar, e com a menor ajuda possível dos profissionais de saúde (Melo-Dias, p.60, 2014). Revista Portuguesa de Enfermagem de Saúde Mental, Nº 11 (JUN.,2014) | 16
Numa proposta de consenso, ensaia-se aqui a definição do conceito de AOT – enquanto atividade ou conjunto de atividades organizadas e sistemáticas que estruturam e dirigem o desempenho funcional do participante, enquadradas na relação interpessoal enfermeiro-cliente e na avaliação das necessidades humanas fundamentais (NHF), utilizando técnicas terapêuticas selecionadas e prescritas consoante o/s objetivo/s pretendido/s, com efeitos psicoterapêuticos, psicoeducacionais, psicomotricionais, psicossociais, socioterapêuticos, e espirituais, no sentido de promover, prevenir, habilitar, manter e/ou recuperar e desenvolver as habilidades da pessoa na obtenção do potencial máximo de desempenho, de autonomia e de satisfação nas suas NHF, nas atividades de vida, na ocupação para a realização, e na recreação. A utilização da ocupação como atividade terapêutica estabelece uma dinâmica particular entre os seus três elementos nucleares: terapeuta-cliente-atividade. Em algumas situações, a atividade funciona como objeto intermediário entre o terapeuta e o cliente, noutras é o terapeuta que funciona como intermediário entre o cliente e a atividade. A ocupação terapêutica, entendida como um processo adaptativo e contínuo no qual a pessoa desenvolve a sua identidade e competência, participando em atividades ocupacionais, ao longo do ciclo vital, e nos diferentes contextos ambientais onde se insere, permite a expressão individual, a construção identitária e o desenvolvimento de vínculos sociais e culturais, e possibilitalhe sentir-se elemento ativo da sociedade, com reflexos no seu bem-estar, e na sua saúde global. As atividades de ocupação terapêutica em enfermagem de saúde mental e psiquiátrica têm como características fundamentais: O = Objetiva - orientada por objetivos e clinicamente validada por indicadores de avaliação. C = Congruente - apresenta sintonia e congruência com o quotidiano. U = União - envolve e une o terapeuta e cliente, quer no plano, quer na ação. P = Prescrição - O enfermeiro na utilização do seu raciocínio clínico, cientificamente fundamentado, prescreve o programa/sessão de AOT, respeitando a avaliação das NHF, em triangulação com o exame do estado mental do cliente. A = Adaptada - é adaptada ao ambiente e é gradativa, permitindo sucesso na atividade. Os processos, o ambiente, os instrumentos, os materiais de trabalho, são adaptados e atingidos através da execução de passos/ etapas gradativos sensíveis ao setting.
C = Consentimento - o/a participante devidamente esclarecido e informado consente a sua participação e envolvimento na atividade. A = Acrescenta - é de alguma forma significativa para o cliente, acrescentando sempre algo à sua forma de sentir, perceber, executar, desempenhar, e memorizar. O = Orientação - dirige-se sempre para a qualidade de vida, autonomia e satisfação do funcionamento pessoal e social do participante. Domínios de Utilização da AOT Os domínios em que as AOT podem ser clinicamente relevantes e decisivos para a reabilitação psicossocial do cliente são: • Pessoal e Doméstico – por exemplo, atividades básicas de gestão pessoal, gestão do espaço pessoal e doméstico, treino de habilidades, etc. • Recreação e de Lazer – por exemplo, atividades de prazer, alegria e bem-estar, habitualmente feitas porque se quer, e não porque as temos de fazer. • Expressão Pessoal – música, drama, psicomotricidade, jogos, artes plásticas. • Formação/Aprendizagem - Psicoeducação, Educação para a Saúde. • Relações Interpessoais - dinâmica de grupos, resolução de problemas, treino de motivação, treino de assertividade, reuniões. Para uma correta ponderação dos objetivos a estabelecer e para uma pertinente escolha dos indicadores de avaliação, deveremos focar-nos nas pessoas nas suas dimensões: Sensoriomotora, Cognitiva, e Psicossocial. Sensório-neuro-motora - pode ser descrita em sensorial (sinais recebidos pelos sentidos…), neuromuscular (como reflexos, amplitude de movimentos, tónus muscular, força, resistência e postura), e motora (coordenação de movimentos, controlo motor). Cognitiva - refere-se à capacidade de utilizar as funções mentais mais complexas: estar alerta, categorização, sequenciamento, generalização, orientação, memória, capacidade de compreender e organizar a informação, de dar forma aos pensamentos e ideias, amplitude da atenção, resolução de problemas, a habilidade de aprender. Psicossocial - refere-se à gestão das inter-relações e ao processamento das emoções: o autoconceito, os interesses e os valores; a habilidade de gerir o tempo, os seus papéis de vida e a participação nas interações sociais, adaptação aos estímulos do ambiente. Apresenta-se também relevante para a planificação e sensibilidade das AOT a noção de contexto, podendo ter uma dimensão temporal e uma dimensão ambiental.
Na dimensão temporal podemos compreender a idade cronológica do cliente, o seu estádio desenvolvimental, a posição/papel na sua fase de vida (ex: carreira profissional, formação, educação), e ainda défices e comorbilidades. Na dimensão ambiental podemos compreender o aspeto estrutural (refere-se aos “objetos”), social (refere-se às pessoas significativas, aos grupos sociais, à influência das normas sociais e as expectativas de desempenho de papéis) e cultural (refere-se às crenças, hábitos, padrões de comportamento, expectativas passadas de geração em geração, fatores sociopolíticos, oportunidades de educação/aprendizagem, trabalho/ empregabilidade, e suporte financeiro). Quadro Conceptual Intervenções Autónomas de Enfermagem O exercício clínico da enfermagem centra-se na relação interpessoal entre um enfermeiro e uma pessoa/grupo. O estabelecimento da relação terapêutica, neste âmbito, distingue-se pela formação e experiência do enfermeiro que lhe permite entender e respeitar os outros, num quadro onde procura abster-se de juízos de valor e desenvolver em parceria as suas capacidade (Ordem dos Enfermeiros, 2001). As intervenções de enfermagem tomam por foco de atenção a promoção dos projetos de saúde que cada pessoa vive e persegue. Procura-se prevenir a doença e promover os processos de readaptação após a doença. Procura-se, também, a satisfação das NHF e a máxima independência no funcionamento pessoal e social, incluindo a adaptação funcional aos défices e a adaptação a múltiplos fatores em desequilíbrio – frequentemente através de processos de aprendizagem do cliente (OE, 2001).O exercício de Enfermagem insere-se num contexto de atuação multiprofissional, distinguindo-se dois tipos de intervenções de enfermagem: as intervenções interdisciplinares, iniciadas por outros técnicos, e as intervenções autónomas, iniciadas pela prescrição do enfermeiro (OE, 2001). No âmbito do exercício autónomo, o enfermeiro presta cuidados e realiza atividades de enfermagem com a finalidade de obter, em parceria com o cliente, a satisfação relativa das suas necessidades. As atividades de enfermagem devem ser entendidas como intervenções cujo âmbito requer uma relação e interação social, num formato potenciador dos cuidados e obrigatoriamente integradas na mesma planificação sistémica e sistemática, com o mesmo foco global de atenção, visando a satisfação das necessidades, mais especificamente nos aspetos que abordam a decisão, a ação e a interação com o cliente, procurando a máxima adaptação funcional através de processos de aprendizagem cognitiva, comportamental e afetiva. Revista Portuguesa de Enfermagem de Saúde Mental, Nº 11 (JUN.,2014) | 17
É neste enquadramento conceptual e clínico que inserimos as AOT enquanto intervenção autónoma, cuja responsabilidade pela prescrição e implementação técnica da intervenção, pertence ao enfermeiro, implicando a capacidade de tomada de decisão que orienta o exercício profissional autónomo. Competências de Receção, de Compreensão, e de Envio Considerando as competências em geral, reconhecemos três tipos: • Competências de Receção - capacidade de perceber de forma eficiente pistas ou sinais relevantes; • Competências de Processamento - capacidade de avaliar a informação recebida, de identificar os objetivos a médio e longo prazo, e de planear uma resposta comportamental que antecipe as possíveis consequências; • Competências de Envio - comportamentos verbais, não-verbais e comportamentos paralinguísticos que entram na interação social (Coelho e Palha, 2006). As competências de receção e de processamento (ou perceção social) implicam-se na habilidade do sujeito em interpretar as pistas dos estímulos sociais relacionando-as com a experiência passada, de forma a ser capaz de as usar num vasto leque de diferentes situações sociais. Por exemplo, às pessoas com perturbações psicóticas (PP) faltam frequentemente as habilidades percetivas devido a perturbações na seleção das pistas (Mueser & Sayers, 1992 citados por Coelho e Palha, 2006). As pessoas com perturbações do humor (PH) têm o pessimismo e perfecionismo, que conduzem ao excesso de realismo, à desesperança e ao desamparo (Segrin, 2000). Esta tendência para uma avaliação pessoal e social negativa, concorre e conduz a um défice na performance das habilidades sociais. Nas competências de envio, muitos clientes exibem um pobre comportamento interpessoal precisamente porque o seu foco de atenção é primariamente interno e apenas intermitentemente e seletivamente direcionado para o outro. Mesmo fora de um contexto terapêutico, estes indivíduos raramente percebem os outros pontos de vista e mostram pouco interesse nos outros. Esta dificuldade de atender à maioria das pistas relevantes parece ainda mais agravada com a falta de habilidades em pedir esclarecimentos, em generalizar alternativas, e na falta de iniciativa para lidar com os problemas do quotidiano. Revista Portuguesa de Enfermagem de Saúde Mental, Nº 11 (JUN.,2014) | 18
Acresce ainda, por ex. nas PP que as pessoas são sensíveis à crítica, evitando ou escapando às situações em que podem ser criticados ou nas quais possa haver conflito, apresentando elevados níveis de depressão e baixa autoestima (Yusupoff et al. 1996, citados por Coelho et al. 2002; Coelho e Palha, 2006). Nas PH, por ex. as pessoas expressam mais sentimentos depressivos, mal-estar pessoal, autoavaliação negativa, agressividade verbal e menos conteúdo com vista à solução de problemas. No comportamento não-verbal, as pessoas com PP, por ex. apresentam expressões faciais inapropriadas, gestos e posturas inadequados, e tendência para evitar o contacto ocular, sentindo-se desconfortáveis em situações sociais em que este é importante. Nas PH, por ex. as pessoas apresentam menor expressividade facial e corporal, assim como menor contacto ocular com o interlocutor. No comportamento paralinguístico, nas PP, por ex. em determinados indivíduos, a voz é monótona, tem menos entoação vocal, e o fluxo verbal é lento, o que além de desagradável na conversação, torna difícil a interpretação (Bellack et al. 1997, citados por Coelho e Palha, 2006). Nas PH as pessoas falam lentamente, mostram pausas mais longas, e levam mais tempo a responder às interpelações dos outros, e com um tom monótono (Segrin, 2000). Modelos Teóricos No ‘Modelo Cognitivo Comportamental’ tendo como principal objetivo encorajar a mudança comportamental, o Enfermeiro ao longo da AOT regista tudo aquilo que o cliente é capaz de fazer e todos os reforços que sejam significativos para esse cliente, oferecendo-lhe esse reforço em cada passo alcançado com vista ao comportamento desejado. Na mesma perspetiva, quando a resposta não é a adequada o enfermeiro pode ir fornecendo pistas que permitirão ao cliente alcançar esse passo e generalizar para atingir os seguintes. No ‘Modelo de Aprendizagem Social’ as consequências do comportamento influenciam a sua repetição, a observação de modelos exteriores (e.g. pessoas, filmes, livros, …) acelera mais as aprendizagens do que se esse comportamento tivesse de ser executado pelo “aprendiz” por si só. São aquisições de comportamentos que resultam da interação (interna e externa) por observação e imitação de um modelo.
São quatro os determinantes deste modelo: ‘Processo de Atenção’ (por modelos mais disponíveis e mais significativos); ‘Processo de Retenção’ (o modelo com caraterísticas significativas será o mais recordado quando não estiver presente); ‘Processo de Reprodução’ (traduz as conceções do comportamento armazenado na memória em ações correspondentes); ‘Processo de Reforço’ (um comportamento recompensado tem mais probabilidades de ser imitado pelos observadores (Bandura, 1977; Woolfolk, 2000). Colheita de Dados, Raciocínio, e Técnicas Específicas a Utilizar nas Sessões Teoria das Necessidades Humanas Fundamentais O modelo de Virgínia Henderson congrega a Saúde, as Necessidades Humanas Fundamentais (NHF), e o Cliente como agente da sua própria saúde e independência na satisfação das necessidades e ainda o papel do enfermeiro em todos estes processos, nomeadamente na sua função única de ajudar a pessoa na realização e satisfação das necessidades e atividades que realizaria se tivesse força, vontade, e conhecimento necessários podendo construir novamente um estado de autonomia e independência no seu projeto de vida. O conceito “Necessidade” define-se como necessidade vital que a pessoa deve satisfazer a fim de conservar o seu equilíbrio físico, psicológico, social ou espiritual, e de assegurar o seu desenvolvimento (Phaneuf, 2001), mas também de défice, falta de algo que pode ser superado pelos cuidados prestados por enfermeiros (Powers, 2006; Fortin, 2006; Amar & Gueguen, 2007 citados por Rosa e Basto, 2009). Para Henderson a saúde é uma abordagem global, em que o ser humano é considerado como um ser completo, com um conjunto diverso de NHF, corretamente integrado no seu meio (Berger & Malloux-Prier, 1995), numa visão biopsicossocial e espiritual dos cuidados. A satisfação das necessidades apresenta variação relativa num continuum independência/dependência, segundo o grau (qualidade/quantidade) de ajuda que a pessoa requer ou precisa (quadro 1).
Estes seis níveis podem constituir uma base teórica crucial para definir/avaliar os indicadores de avaliação do desempenho dos clientes nas AOT. A necessidade de ocupar-se com vista a realizar-se refere-se à vontade de realizar coisas para si, de assumir os diferentes papéis que lhe incubem em função da sua idade e género, de cumprir as tarefas associadas aos diferentes estados do seu desenvolvimento (papel de estudante, de trabalhador, de esposo/a, de pai/mãe, e ainda o papel de doente que é marcado pelo nível de adesão e colaboração às indicações terapêuticas (Phaneuf, 2001). É fundamental contar com o papel da motivação na gradação do conceito deste continuum. Em termos pragmáticos a motivação é o conjunto de forças percebidas que levam a pessoa a agir, influenciada pelas suas experiências e outros fatores externos (Ryan & Deci, 2000; Deci & Ryan, 2000), ou seja, o esforço ou energia que a pessoa está disposta a despender para realizar uma tarefa. Considerando que o comportamento do ser humano é impelido por motivações intrínsecas e extrínsecas (Sprinthall & Sprinthall, 1993), podemos considerar diferentes níveis de motivação na procura da independência: ausência total; extrínseca (suscitada pela equipa prestadora de cuidados); e intrínseca (determinada internamente pela sua convicção e não pela vulnerabilidade). Assim, a independência só pode ser real e durável se a motivação e convicção para agir for intrínseca.
Quadro 1 - Contínuo de Independência/Dependência Independência
Dependência
Nível 0
Nível 1
Nível 2
Nível 3
Nível 4
Nível 5
Satisfaz por si próprio as suas necessidades de maneira relativa que permite assegurar a homeostasia. Segue um tratamento adequadamente ou utiliza uma ajuda técnica sem ajuda.
Têm necessidade de alguém para lhe ensinar como deve fazer para conservar ou reconquistar a independência e assegurar a homeostasia, para se assegurar que o faz bem.
Têm necessidade de alguém para seguir o tratamento adequadamente ou para utilizar uma ajuda técnica, pois apenas consegue participar parcialmente.
Conta com alguém para realizar as ações necessárias à satisfação das suas necessidades, ou para o seu tratamento, pois apenas consegue participar pouco.
Conta com alguém para realizar as ações necessárias à satisfação das necessidades, ou para o seu tratamento, pois tem uma participação mínima.
Depende totalmente de alguém para a satisfação das necessidades, ou para aplicar o seu tratamento, pois não consegue participar.
Fonte: Phaneuf, Margot (2001) Planificação de cuidados: um sistema integrado e personalizado. Quarteto, Coimbra. Revista Portuguesa de Enfermagem de Saúde Mental, Nº 11 (JUN.,2014) | 19
Raciocínio e Decisão Clínica na Seleção da Atividade Ocupacional Terapêutica Raciocínio clínico na prática de enfermagem será um processo de pensamento do Enfermeiro, fundamentado nos conhecimentos (teóricos e práticos) e experiência (profissional e pessoal), envolvendo toda a complexidade, reflexividade, criatividade, intuição e cognição (do enfermeiro, do cliente em foco, e do contexto), de modo a sistematicamente selecionar, comparar, testar, inferir e decidir sobre as evidências clínicas do percurso clínico do cliente, gerando decisões e conclusões que permitam atingir resultados esperados (Melo-Dias e Lopes, 2010). O raciocínio suporta-se ainda das seguintes razões clínicas: Minimiza o erro aumentando a precisão e acuidade; Modela os cuidados; Pode ter efeitos significativos na rapidez de obtenção de resultados, e na brevidade da alta clínica (Magalhães e Lopes, 2013). O processo de raciocínio clínico aplicado às AOT em Enfermagem de Saúde Mental e Psiquiátrica (ESMP) corresponde à decisão e escolhas de tratamento, em que o terapeuta perante as possibilidades e opções disponíveis constrói um modelo/tipo de atividade dirigido ao(s) cliente(s) e às suas necessidades, respeitando os princípios científico, ético, e estético. As indicações terapêuticas para prescrever AOT em ESMP expondo o participante a uma variedade de respostas potencialmente eficazes para lidar com a situação problemática, são: 1-Manutenção do máximo bem-estar; 2-Promoção das funções biopsicossociais; 3-Promoção da adaptação/integração social; 4-Implementação da recuperação/reabilitação; 5-Avaliação das situações clínicas: défices, incapacidades; 6-Prevenção da “degradação” cognitivo-comportamental; 7-Prevenção da hospitalização prolongada, e do fenómeno “porta-giratória”. Objetivos, Determinantes, e Benefícios da AOT Objetivos Apresenta-se intencionalmente, uma coleção de objetivos, disponíveis para serem utilizados no planeamento de programas ou sessões de AOT. Note-se que os objetivos poderão ser organizados e dirigidos à sessão propriamente dita (serão assim objetivos gerais ou finalidades) e/ou organizados e dirigidos ao desempenho dos participantes (sendo assim objetivos específicos ou resultados esperados): • Implementar estratégias de gestão das incapacidades; • Manter o contacto com a realidade dos settings; • Gerir as respostas do doente aos focos em défice; • Melhorar a qualidade de vida; Revista Portuguesa de Enfermagem de Saúde Mental, Nº 11 (JUN.,2014) | 20
• Concentrar o participante em algo útil (distraindo-o da sintomatologia e da doença); • Melhorar a coordenação, a postura e o tónus muscular; • Diminuir a ansiedade; • Estimular o relacionamento interpessoal; • Obter cooperação e interesse do cliente para o seu tratamento; • Facilitar a integração no meio familiar e profissional; • Preparar para a vida na comunidade e no trabalho; • Prevenir o risco de deterioração e de internamento prolongado; • Promover hábitos de vida saudáveis; • Promover o desenvolvimento do autorrespeito e autorresponsabilização; • Promover o uso construtivo do tempo de lazer; • Desenvolver habilidades de autocuidado; • Proporcionar reeducação; • Manter o máximo nível de funcionamento pessoal e social; • Reduzir comportamentos problemáticos. Determinantes das AOT em Enfermagem de Saúde Mental e Psiquiátrica Existem variáveis que determinam a escolha e decisão do tipo de AOT a prescrever: - Relacionadas com o setting: a) Estigma social; b) Normas e filosofia de cuidados da instituição; c) Dificuldades de financiamento dos programas; d) Motivação dos terapeutas. - Relacionadas com a pessoa: a) Biofísica: Perda ou limitação de capacidades motoras, dor, e atraso/perturbação no desenvolvimento global; b) Psicológica: incapacidade de realizar o teste de realidade; ausência de insight crítico; incapacidade para estar atento e concentrado; ausência ou diminuição da capacidade de perceber/evitar os riscos/perigos; c) Psicossociológica: Limitação das habilidades comunicacionais; limitação/pobreza no relacionamento interpessoal; incapacidade de participar em grupos; alterações estruturais ou funcionais do ambiente de vida; estigma e falta de conhecimentos sobre recursos disponíveis; d) Ocupacional: Incapacidade de se autocuidar; dificuldades na aprendizagem; limitações nas habilidades funcionais de jogar/trabalhar.
Benefícios das AOT em Enfermagem de Saúde Mental e Psiquiátrica Os benefícios correlacionados com os objetivos específicos dos clientes são: • Promoção da organização comportamental, a nível individual e grupal; • Oferece sentido de utilidade social, o ‘novo primeiro passo’ para o retorno ao trabalho/família, ou descoberta de novos interesses ou aquisição da destreza necessária; • Edificação da autoestima e autoimagem, despertando interesses; • Ressocialização, responsabilidade e cooperação pelas atividades grupais; • Redução dos comportamentos inapropriados/desadequados/problemáticos; • Prevenção da deterioração física e cognitiva geral; • Construção de uma imagem gratificante do Enfermeiro na execução e realização de AOT’s em ESMP. Processo de Planeamento das AOT As respostas humanas aos processos de desenvolvimento, de doença e às necessidades específicas de cada cliente, bem como o tempo e tipo de internamento, as caraterísticas culturais e demográficas, as expetativas e projetos de vida, as perturbações causadas pelos novos papéis, a dor e sofrimento (físico, mental e social), as dificuldades de adaptação e o comprometimento das capacidades psíquicas, influenciam o desenho das intervenções de enfermagem nas AOT (McGurk, et al. 2013; Melo-Dias, 2014; Rainforth, & Laurenson, 2014). As AOT deverão proporcionar o máximo de utilidade das suas intervenções ao máximo de clientes possível, mantendo o vínculo com a personalização, especificidade e habilidades disponíveis e a desenvolver, garantindo o seu fundamento na evidência científica (Mueser, Deavers, Penn, & Cassisi, 2013). As formas e procedimentos de colheita de dados, de intervenção e de avaliação deverão ser estabelecidos de acordo com os problemas/focos de enfermagem e respostas humanas apresentadas, acrescendo a condição de doença e a fase clínica, numa perspetiva global do tempo de duração do tratamento. O planeamento de uma AOT é sempre centrado na pessoa, alvo da sua intervenção, sendo perspetivado pelo Enfermeiro a interação das três variáveis: a pessoa, a ocupação, e o ambiente. O programa de AOT respeita sempre a avaliação prévia das NHF e as preferências dos clientes e estilo de vida, mantendo a adequação clínica, num cliente adequadamente informado.
As estratégias, ações e atividades específicas são descritas em pormenor de forma a proporcionar uma melhor integração do cliente na sua escolha e elaboração, bem como proporcionar que sejam avaliadas por pares de forma a aferir a sua utilidade, eficiência e eficácia. O desenho base de qualquer AOT em ESMP quer numa só sessão ou várias, será: • Tema ou Título. Indicação da Data, Hora, Local, e Duração prevista. • População alvo (indicação dos critérios de escolha dos participantes). • Objetivo Geral ou Finalidade • Objetivos Específicos ou Resultados Esperados. • Estratégias e Metodologia (descrição completa e cronológica de todas etapas a realizar). • Recursos necessários (diversos: humanos, materiais, financeiros, estruturais, intelectuais). • Avaliação (indicação dos critérios ou indicadores mensuráveis). • [Aspetos éticos a considerar (se for necessário)]. Avaliação do Desempenho dos Participantes Esta avaliação é feita através dos indicadores de avaliação definidos no planeamento, sintónicos com os objetivos específicos ou resultados esperados (de uma ou todas as dimensões sensoriomotora, cognitiva, e psicossocial), e que se concretizem sensíveis à intervenção do Enfermeiro, explicitando quantitativamente e qualitativamente resultados clínicos. Papel do Enfermeiro O papel terapêutico do enfermeiro em AOT’s contêm os demais requisitos básicos de intervenção na área científica da saúde, assegurando-se da eficiência e eficácia com pessoas com doenças mentais, nomeadamente excelentes competências interpessoais, familiaridade com os princípios das teorias de desenvolvimento e das terapias cognitivo-comportamentais, entusiasmo pelo trabalho, resiliência para gerir procedimentos minuciosos, bem como adaptá-los às exigências situacionais, e ainda a capacidade de recolher dados comportamentais para processos de feedback e feedforward. Consideram-se princípios gerais da ação socioterapêutica do Enfermeiro nas AOT’s: 1. Tomada de consciência de si mesmo durante a relação terapêutica. 2. Conhecimento dos procedimentos/intervenções da atividade; 3. Conhecimento das habilidades e das necessidades humanas fundamentais dos clientes, não perspetivando desenvolvimentos acima dos níveis pré-formação (e/ou pré-mórbidos). Revista Portuguesa de Enfermagem de Saúde Mental, Nº 11 (JUN.,2014) | 21
4. Instrui o mais sensível possível, numa rotina semelhante ao quotidiano do cliente. 5. Reforço e supervisão prevenindo o esquecimento do doente. 6. Encorajamento, sem pressionar o cliente. 7. Utilização de ajudas técnicas na ausência de capacidades motoras e/ou sensoriais. 8. Flexibilidade na adaptação dos procedimentos às sugestões dos clientes. 9. Sintonia de todos os que trabalham com o cliente, conhecendo o que está a ser trabalhado. (Hoeman, 1996; Coelho, 1999; Cordo, 2003; OE, 2011) CONCLUSÃO Apresentamos a proposta de definição de Atividade Ocupacional Terapêutica em Enfermagem de Saúde Mental e Psiquiátrica, que enfatiza a pessoa no centro da decisão, desde logo, através do consentimento informado da sua participação, sendo sempre o cliente quem “motiva” as dinâmicas que o terapeuta vai desenvolvendo durante a execução. Prospetiva-se, por isso, entre a tríade enfermeiro-cliente-atividade, uma relação terapêutica entre os dois primeiros elementos e um ajustamento do terceiro. As AOT decorrem no ambiente clínico de enfermagem, com base da caracterização NHF dando resposta a problemas/focos de atenção de enfermagem, sendo por isso prescritas, implementadas e avaliadas pelos enfermeiros, em função do raciocínio clínico e diagnósticos de enfermagem. Nas AOT a relação Enfermeiro-Cliente é a energia que vai “alimentar” as diferentes dimensões, sejam de natureza sensoriomotora, cognitiva ou psicossocial, daqui se confirma a necessidade da presença efetiva do enfermeiro em todas as fases planeadas da atividade, não tendo viabilidade clínica na delegação da sua execução. As AOT têm o seu suporte científico, entre outros, nos modelos Cognitivo-Comportamental, de Aprendizagem Social e na Teoria das Necessidades Humanas Fundamentais de Virgínia Henderson. O método reconhece-se como reprodutível e com ele é possível construir conhecimento, e podemos ainda questionar se se podem generalizar estes resultados para a população. De facto, as variáveis que interferem na forma como se pensa, se sente e se age convocam que haverá atividades e indicadores estruturados que poderão ser generalizáveis, embora não de forma metódica de todos os resultados a todos. Revista Portuguesa de Enfermagem de Saúde Mental, Nº 11 (JUN.,2014) | 22
Encorajamos a utilização desta ferramenta terapêutica, porque, para o Enfermeiro, um resultado significativo é prevenir a morbilidade e promover os processos de readaptação, procurando-se a satisfação das necessidades humanas fundamentais e a máxima independência na realização das atividades da vida (OE, 2001). Esperam os autores desenvolver nos enfermeiros leitores deste artigo, um movimento que vá, necessariamente, além da aceitação passiva da razoabilidade desta proposta de intervenção sistematizada de enfermagem e pensem, como diria Paulo Freire, de forma implicante e dialética, ou de forma mais pragmática – colocar em prática e depois pensar como fazer melhor (Freire, 2001). REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS Bandura, A. (1977). Self efficacy: toward a unifying theory of behavioral change. Psychological Review, 84,191-225. Berger, L., & Malloux-Prier, A. (1995). Pessoas idosas, uma abordagem global: Processo de enfermagem por necessidades. Loures: Lusodidacta. Coelho, C. S. M. (1999). Treino de habilidades sociais aplicado a clientes com esquizofrenia. Tese de Mestrado, Universidade do Minho. Coelho, C. S. M., e Palha, A. J. P. (2006). Treino de habilidades sociais aplicado a doentes com Eesquizofrenia. Lisboa: Climepsi Editores. Cordo, M. (2003). Reabilitação de pessoas com doença mental. Lisboa: Climepsi Editores Deci, E. L., & Ryan, R. M. (2000). The “what” and “why” of goal pursuits: Human needs and the self-determination of behavior. Psychological Inquiry, 11(4), 227-268. Fortin, J. (2006). Human needs and nursing theory. In H. Kim, & I. Kollak, Nursing theories – conceptual & philosophical foundations (pp. 10-26). New York: Springer Publishing Company. Freire, P. (2001). Pedagogia da autonomia: Saberes necessários à prática educativa (20ª ed.). São Paulo: Paz e Terra. Hoeman, S. (1996). Rehabilitation nursing: Process and application (2nd ed.). St. Louis: Mosby.
Magalhães, M. D., e Lopes, M. J. (2013). Raciocínio e tomada de decisão em enfermagem. Comunicação apresentada no âmbito das oficinas temáticas promovidas pelo centro de investigação em ciências e tecnologias da saúde e pela escola de enfermagem da universidade de Évora. Consultado a 2 junho, 2014. Disponível em https://dspace.uevora.pt/rdpc/handle/10174/10325 [Tese de Doutoramento em desenvolvimento na Universidade de Lisboa]. McGurk, S. R., Mueser, K. T., Covell, N. H., Cicerone, K. D., Drake, R. E., Silverstein, S. M.,... & Essock, S. M. (2013) Mental health system funding of cognitive enhancement interventions for schizophrenia: Summary and update of the New York Office of Mental Health expert panel and stakeholder meeting. Psychiatric Rehabilitation Journal, 36(3), 133-145. Melo-Dias, C. (2014) Investigar habilidades de conversação em adultos com esquizofrenia. In C. Sequeira, J. C. Carvalh, e L. Sá (Eds.), IV Congresso Internacional ASPESM: Padrões de Qualidade em Saúde Mental (pp. 58-69). Porto: ASPESM.
Ordem dos Enfermeiros (2001). Padrões de Qualidade dos Cuidados de Enfermagem. Enquadramento Conceptual. Enunciados Descritivos. Ordem dos Enfermeiros. Acedido em http://www.ordemenfermeiros.pt/ publicacoes/Documents/PadroesqualidadeCuidadosEnfermagem.pdf Phaneuf, M. (2001). Planificação de cuidados: Um sistema integrado e personalizado. Coimbra: Quarteto. Powers, P. (2006). The concept of need in nursing theory. In H. Kim, & I. Kollak, Nursing theories: conceptual & philosophical foundations (pp. 72-88). New York: Springer Publishing Company. Rainforth, M., & Laurenson, M. (2014). A literature review of case formulation to inform mental health practice. Journal of Psychiatric and Mental Health Nursing, 21, 206-213. Rosa, J. C., e Basto, M. L. (2009). Necessidade e necessidades. Revisitando o seu uso em enfermagem. Pensar Enfermagem, 13(1), 13-23.
Melo-Dias, C., e Lopes, M. (2010). Raciocínio Clínico em Enfermagem. Revista Portuguesa de Enfermagem, 21, 33-47.
Ryan, R. M., & Deci, E. L. (2000). Self-determination theory and the facilitation of intrinsic motivation, social development, and well-being. American Psychologist, 55(1), 68-78.
Mueser, K. T., Deavers, F., Penn, D. L., & Cassisi, J. E. (2013). Psychosocial treatments for schizophrenia. Annual Review of Clinical Psychology, 13(9), 465-497.
Sprinthall, R. C., & Sprinthall, N. A. (1993). Psicologia educacional: Uma abordagem desenvolvimentista. Lisboa: McGraw Hill.
Ordem dos Enfermeiros (2011). Regulamento das Competências Específicas do Enfermeiro Especialista em Enfermagem de Saúde Mental. Diário da República, 2.ª série - N.º 35 - 18 de Fevereiro de 2011.
Woolfolk, A. (2000). Psicologia da Educação. Porto Alegre: Artes Médicas. Segrin, C. (2000). Social skills deficits associated with depression. Clinical Psychology Review, 20(3), 379-403.
Revista Portuguesa de Enfermagem de Saúde Mental, Nº 11 (JUN.,2014) | 23
4
BURNOUT E INTERAÇÃO TRABALHO-FAMÍLIA EM ENFERMEIROS: ESTUDO EXPLORATÓRIO COM O SURVEY WORK-HOME INTERACTION NIJMEGEN (SWING) | Ana Mónica Pereira1; Cristina Queirós2; Sónia P. Gonçalves3; Mary Carlotto4; Elizabete Borges5 |
RESUMO O trabalho e a família constituem os principais contextos na sociedade atual. Inicialmente, as investigações centraram-se na perspetiva negativa da relação trabalho-família, nomeadamente no desencadear do burnout. Com o desenvolvimento da Psicologia Positiva, a investigação privilegiou a perspetiva positiva desta relação, mantendo-se a ideia de bidirecionalidade. Pelas exigências da sua atividade profissional os enfermeiros constituem um grupo vulnerável ao burnout e ao conflito entre trabalho e família. O Survey Work-Home Interaction Nijmegen (SWING, de Geurts et al., 2005) avalia esta bidirecionalidade nas duas perspetivas e neste trabalho pretende-se explorar as propriedades psicométricas do SWING numa amostra de enfermeiros e conhecer a prevalência da interação trabalho-família e sua relação com o burnout. Através do SWING e do Maslach Burnout Inventory foram recolhidos dados de 307 enfermeiros de hospitais públicos e centros de saúde portugueses. Os enfermeiros reportam baixos níveis de burnout, maior interação trabalho-família negativa do que interação família-trabalho negativa, e maior interação família-trabalho positiva do que interação trabalho-família positiva. A análise fatorial confirmatória revelou que o modelo de quatro fatores correlacionados, que distingue a direção da interação (trabalho-família ou família-trabalho) e a qualidade (negativa ou positiva), é o que melhor se adequa aos dados. A versão portuguesa do SWING apresenta boa consistência interna e existem correlações significativas entre as dimensões do SWING e o burnout. Os resultados permitem concluir que esta versão do SWING possui propriedades psicométricas satisfatórias, constituindo um instrumento de medida da interação trabalho-família adequado à língua portuguesa e útil para conhecer a realidade profissional dos enfermeiros. PALAVRAS-CHAVE: Enfermeiros; Burnout; Análise fatorial; Conflito
RESUMEN
ABSTRACT
“Burnout e interacción trabajo-familia en enfermeros: Estudio exploratorio con el Survey Work-Home Interaction Nijmegen (SWING)”
“Burnout and work-family interaction among nurses: An exploratory study with the Survey Work-Home Interaction Nijmegen (SWING)”
Trabajo y familia son los contextos principales en la sociedad actual. Inicialmente las investigaciones estudiaron la perspectiva negativa de la relación trabajo-familia, incluso lo surgimiento de burnout. El desarrollo de la Psicología Positiva centró la investigación en la perspectiva positiva de la relación, se manteniendo la idea de doble direccionalidad. Por las exigencias de la actividad profesional, los enfermeros son un grupo de riesgo para el burnout y el conflicto trabajo-familia. Survey Work-Home Interaction Nijmegen (SWING, Geurts et al., 2005) evalúa esta doble direccionalidad en las dos perspectivas. Este trabajo tiene como objetivos explorar las propiedades psicométricas del SWING en una muestra de enfermeros y conocer la prevalencia de la interacción trabajo-familia y su relación con el burnout. Con el SWING y Maslach Burnout Inventory se obtuvieron datos de 307 enfermeros que trabajan en hospitales públicos y centros de salud portugueses. Los enfermeros indicaron niveles bajos de burnout, mayor interacción trabajo-familia negativa que interacción familia-trabajo negativa, y mayor interacción familia-trabajo positiva que interacción trabajo-familia positiva. El análisis factorial confirmatorio hay revelado que el modelo de cuatro factores correlacionados, que distingue el sentido de la interacción (trabajo-familia o familia-trabajo) y la calidad (negativa o positiva), es lo que mejor se ajusta a los datos. La versión portuguesa del SWING presenta una buena consistencia interna y hay correlaciones significativas entre las dimensiones del SWING y burnout. Los resultados indican que esta versión del SWING tiene propiedades psicométricas satisfactorias, siendo un cuestionario adecuado para medir la interacción trabajo-familia en portugués y útil para conocer la realidad laboral de los enfermeros.
Work and family are the main contexts in the contemporary society. Initially, studies focused on the negative perspective of the relation between work and family, especially in what concerns burnout eliciting. With the development of Positive Psychology, research focused on positive perspective of this relationship, despite the idea of bidirectionality. Due the demands of their professional activity, nurses are vulnerable to burnout and to work-family conflict. The Survey Work-Home Interaction Nijmegen (SWING, Geurts et al., 2005) measures this bi-directionality using both perspectives. This study aims to explore the psychometric properties of the SWING in a sample of nurses, and to know the prevalence of work-family interaction and her relation with burnout. Data were collected from 307 nurses working in Portuguese public hospitals and health centres, using SWING and Maslach Burnout Inventory. Nurses reported lower levels of burnout, more negative work-home interaction than negative home-work interaction, and more positive home-work interaction than positive work-home interaction. Confirmatory factor analysis revealed that the four correlated factors model that distinguishes the direction of the interaction (work-home or home-work) and quality (negative or positive) provided best fit to the data. Portuguese version of SWING has good internal consistency and present significant correlations between SWING dimensions and burnout. The results show that this version of SWING has satisfactory psychometric properties, being an appropriate instrument to measure work-home interaction in Portuguese language and to better know the professional activity of nurses.
DESCRIPTORES: Enfermeros; Agotamiento professional; Análisis factorial; Conflicto
Submetido em 18-03-2014 Aceite em 15-05-2014
KEYWORDS: Nurses; Burnout; Factor analysis; Conflict
1 Mestre em Psicologia Clínica e da Saúde; Doutoranda em Psicologia; Psicóloga Clínica e da Saúde na FPCEUP/ESTSPIPP, ana.monica.pereira@gmail.com 2 Doutora em Psicologia; Professora Auxiliar na Faculdade de Psicologia e de Ciências da Educação da Universidade do Porto, cqueiros@fpce.up.pt 3 Doutora em Psicologia; Professora Auxiliar no Instituto Piaget – Instituto Superior de Estudos Interculturais e Transdisciplinares, sonia.goncalves@almada.ipiaget.pt 4 Doutora em Psicologia; Professora no Programa de Pós-Graduação em Psicologia da Pontifícia Universidade Católica do Rio Grande do Sul, mary.sandra@pucrs.br 5 Doutora em Enfermagem; Professora Adjunta na Escola Superior de Enfermagem do Porto, Porto, Portugal, elizabete@esenf.pt Citação: Pereira, A. M., Queirós, C., Gonçalves, S. P., Carlotto, M. S., & Borges, E. (2014). Burnout e interação trabalho-família em enfermeiros: Estudo exploratório com o Survey Work-Home Interaction Nijmegen (SWING) . Revista Portuguesa de Enfermagem de Saúde Mental (11), 24-30 Revista Portuguesa de Enfermagem de Saúde Mental, Nº 11 (JUN.,2014) | 24
INTRODUÇÃO Dados recentes da European Agency for Safety and Health at Work (2013) revelaram que 51% dos profissionais da União Europeia referem a existência de stress no seu trabalho, valor que antes de 2010 se situava nos cerca de 20%, sendo também notória a existência de sobrecarga horária, referida por 66% dos inquiridos. Uma das consequências do stress crónico no trabalho é o burnout, fenómeno que pode ser considerado um problema de saúde mental para o trabalhador e que tem sido alvo de extensa investigação desde a década de 70 até à atualidade (Braunstein-Bercovitz, 2013; Maslach, Schaufeli & Leiter, 2001). Definido como o síndrome da exaustão emocional, despersonalização e reduzida realização profissional (Maslach et al., 2001), o burnout afeta não só os profissionais, mas também as instituições, pela diminuição da produtividade e consequências na saúde do trabalhador, mas também pela influência negativa na qualidade dos serviços prestados. Os enfermeiros constituem um grupo suscetível de risco para o desenvolvimento de stress e de burnout, pois na sua atividade laboral sobrepõe-se fatores pessoais, profissionais e organizacionais que conduzem ao burnout (Borges & Ferreira, 2013; Queirós, Carlotto, Kaiseler, Dias & Pereira, 2013; Westermann, Kozak, Harling & Nienhaus, 2014). Alguns estudos revelam que na enfermagem o burnout está relacionado com uma pior saúde física e psicológica, maior número de baixas médicas, insatisfação profissional, intenção de abandonar a profissão e conflito trabalho-família (Anagnostopoulos & Niakas, 2010; Westermann et al., 2014). A sobrecarga do horário laboral é também um fator que pode desencadear burnout, mas, sobretudo, pode interferir com o equilíbrio entre o trabalho e a família. Ora, na sociedade atual o trabalho e a família constituem os principais papéis da maioria dos adultos e, inicialmente, as investigações sobre o tema centraramse na perspetiva negativa da relação entre o trabalho e a família, nomeadamente, no conflito trabalho-família. Este foi definido na década de 80 como um conflito inter-papéis ocorrido quando as exigências do trabalho e da família são mutuamente incompatíveis, dificultando o desempenho de ambos os papéis (Greenhaus & Powell, 2006). O interesse crescente da investigação na conciliação entre a vida profissional e familiar deve-se às consequências negativas da dificuldade em conciliar estes dois domínios, mas também devido aos benefícios associados ao desempenho de ambos os papéis (Greenhaus & Powell, 2006; Mcnall, Nicklin & Masuda, 2010).
De facto, o conflito trabalho-família reduz a satisfação com a vida, a satisfação conjugal e o bem-estar psicológico, aumentando problemas de saúde mental como depressão, burnout e abuso de substâncias ou álcool (Amstad, Meier, Fasel, Elfering & Semmer, 2011; Braunstein-Bercovitz, 2013; Liu, Zhan & Shi, 2010). Já a interação positiva entre o trabalho e a família está associada à eficácia profissional, satisfação profissional e familiar e um maior bem-estar (Mcnall et al., 2010; Rantanen, Kinnunen, Mauno & Tement, 2013). Com o desenvolvimento da Psicologia Positiva e o enfoque nas forças individuais, a investigação privilegiou a perspetiva positiva da relação entre o trabalho e a família, designada por facilitação/enriquecimento trabalho-família, onde “(...) as experiências de um papel melhoram a qualidade do domínio do outro papel” (Greenhaus & Powell, 2006, p.73). Para ambas as perspetivas, a relação trabalho-família tem uma natureza bidirecional, isto é, o trabalho tem influência na família, assim como a família tem influência no trabalho (Greenhaus & Powell, 2006). Relativamente à prevalência da interação trabalhofamília, estudos revelam que a interação trabalho-família negativa é superior à interação família-trabalho negativa, e a interação família-trabalho positiva é superior à interação trabalho-família positiva (Geurts et al., 2005; Marais, Mostert, Geurts & Taris, 2009). Os instrumentos que avaliam a relação entre o trabalho e a família geralmente privilegiam apenas a influência do trabalho na família ou a dimensão negativa desta interação e raramente a dimensão positiva. Para superar estas limitações, Geurts e colaboradores (2005) desenvolveram o Survey Work-Home Interaction-Nijmegen (SWING), que permite avaliar de forma integrada ambas as dimensões da interação trabalhofamília (positiva e negativa), considerando igualmente a sua bidirecionalidade. Neste modelo teórico a interação trabalho-família é definida (Geurts, et al., 2005, p.322) como “(…) um processo em que o funcionamento (comportamento) do profissional num domínio (e.g. casa) é influenciado pelas reações (positivas ou negativas) que foram desenvolvidas no outro domínio (e.g. trabalho)”. Inicialmente, o SWING era composto por 27 itens, distribuídos por quatro sub-escalas, que após análise fatorial exploratória e confirmatória foram reduzidos para 22 itens organizados em quatro subescalas de interação: trabalho-família negativa (oito itens), família-trabalho negativa (quatro itens), trabalho-família positiva (cinco itens) e família-trabalho positiva (cinco itens). Revista Portuguesa de Enfermagem de Saúde Mental, Nº 11 (JUN.,2014) | 25
Verificou-se (Geurts et al., 2005) que as quatro subescalas apresentam uma boa consistência interna, com valores de alfa acima de 0.75, e que o modelo de quatro fatores que distingue quer a direção (trabalho-família ou família-trabalho), quer a qualidade (positiva ou negativa) da interação, é o que apresenta um melhor ajustamento. A validade convergente do SWING foi confirmada pela sua relação com variáveis externas, teoricamente relevantes, como as características do trabalho e da família, e indicadores de saúde e bem-estar. Este instrumento foi já adaptado e validado para outros países como França (Lourel, Gana & Wawrzyniak, 2005), Espanha (Jiménez, Vergel, Muñoz & Geurts, 2009) e África do Sul (Marais et al., 2009) todos com propriedades psicométricas satisfatórias, confirmando o modelo de quatro fatores, apresentando uma boa consistência interna (valores de alpha entre 0.73 e 0.90 e apresentando correlações com variáveis do trabalho e da família e indicadores de bem-estar (Jiménez et al., 2009; Marais et al., 2009). Assim, o SWING parece ser até este momento o melhor instrumento de avaliação da relação entre o trabalho e a família, pois distingue quer a direção quer a qualidade da influência. Em Portugal encontram-se ainda poucos estudos sobre a interação trabalho-família, analisando apenas uma das interações ou num contexto pouco relacionado com o burnout (Tavares, Caetano & Silva, 2007; Vieira, Lopez & Matos, 2013).. Este trabalho tem como objetivo explorar as propriedades psicométricas do SWING numa amostra de enfermeiros, e conhecer a prevalência da interação trabalho-família e sua relação com o burnout. Espera-se que o instrumento apresente boas qualidades psicométricas no modelo de quatro fatores e que se correlacione significativamente com o burnout, de acordo com a especificidade das dimensões de cada instrumento. METODOLOGIA Participantes Foram inquiridos 307 enfermeiros de hospitais públicos e centros de saúde do litoral norte de Portugal, maioritariamente do sexo feminino (83%), casado ou em união de facto (70%), com filhos (67%) e com idades compreendidas entre os 25 e os 58 anos (M= 38,1 e DP = 8,1). Relativamente à formação académica, a maioria detinha o grau de Licenciatura (78%), seguindo-se a Pós-Graduação ou Mestrado (14%) e por último o Bacharelato (7%), desempenhando funções em hospitais (72%) ou centros de saúde (28%), maioritariamente a trabalhar por turnos (57%) e durante 35 horas por semana (91%). Foram distribuídos 476 questionários, dos quais foram devolvidos 307 (taxa de devolução de 65%). Revista Portuguesa de Enfermagem de Saúde Mental, Nº 11 (JUN.,2014) | 26
Instrumentos Foi aplicado um questionário demográfico e profissional construído para este estudo, recolhendo dados sobre o sexo, idade, estado civil, existência de filhos, habilitações literárias, local de trabalho, tipo de horário de trabalho e número horas de trabalho semanal. Foi a -inda utilizado o Maslach Burnout Inventory (Maslach & Jackson, 1997), constituído por 22 itens que avaliam as três dimensões do burnout (exaustão emocional, despersonalização e realização profissional), numa escala de Likert de sete pontos que varia entre zero (“Nunca”) e seis (“Todos os dias”). Por fim, foi usado o questionário de Interação Trabalho-Família Survey Work-Home Interaction Nijmen (SWING, Geurts et al., 2005). Após autorização da autora do SWING procedeu-se à tradução para português dos 22 itens e realizou-se o processo de retroversão para inglês e comparação das duas versões. A versão final em português foi submetida a um teste piloto com 30 enfermeiros, com características sociodemográficas semelhantes às da população em estudo (Pereira, Queirós & Geurts, 2010). Foram questionados quanto à compreensão dos itens mas não foi necessário realizar alterações. O SWING avalia a direção e qualidade da interação entre o trabalho e a família numa escala de Likert de quatro pontos que varia entre zero (“Nunca”) e três (“Sempre”). Procedimento Após autorização formal das instituições foram contactados os Enfermeiros-Chefes dos diferentes serviços, nos hospitais e centros de saúde, para explicar os objetivos do estudo e identificar o número de enfermeiros por cada instituição. Em seguida, foram entregues a cada Enfermeiro-Chefe os questionários, a declaração de consentimento informado e uma cópia do ofício de autorização do estudo. Cada Enfermeiro-Chefe ficou responsável pela distribuição e recolha dos questionários pelos respetivos colegas, num envelope comum colocado num local específico, de forma a garantir a confidencialidade dos dados. Os participantes foram voluntários, sendo sugerido preencher o questionário no local de trabalho, num espaço privado e em tempo livre, unicamente para evitar que ao levarem os questionários para fora do local de trabalho se esquecessem de os devolver. Aos participantes que pediram para preencher fora do local de trabalho, tal foi permitido, lembrando a sua entrega posterior, de forma a não baixar a taxa de devolução. A recolha foi efetuada dois meses após a entrega dos questionários.
O tratamento e análise dos dados foram realizados no programa SPSS (versão 20.0 para Windows) para as estatísticas descritivas e verificação do alfa de Cronbach e no programa AMOS (versão 18.0 para Windows) para a realização da análise fatorial confirmatória. RESULTADOS No que se refere à prevalência do burnout e da interação trabalho-família, bem como sua correlação, verifica-se (Tabela 1) que os enfermeiros reportam maior interação trabalho-família negativa do que interação famíliatrabalho negativa, e maior interação família-trabalho positiva do que interação trabalho-família positiva. No que se refere ao burnout, apresentam níveis de realização profissional elevados e baixos níveis de exaustão emocional e despersonalização. Existem correlações positivas entre as interações trabalho-família de cada qualidade (e.g. negativa com negativa) e a interação trabalho-família negativa correlaciona-se, como esperado, com o burnout. Apenas a interação família-trabalho negativa está negativamente correlacionada com a realização profissional, e quer a interação trabalho-família positiva, quer a interação família-trabalho positiva estão positivamente correlacionadas com a realização profissional. Relativamente às características psicométricas do SWING, a análise dos itens apresenta um adequado grau de assimetria, sendo no geral assimétricas positivas, e os indicadores de achatamento indicam que não existe uma distribuição normal nos itens. Para a validação da estrutura fatorial do SWING foram testados quatro modelos recorrendo a análises fatoriais confirmatórias. Em todas as análises os parâmetros foram estimados com base na matriz de variância-covariâncias dos itens da escala e usou-se o método da máxima verosimilhança para a estimativa desses parâmetros. Os fatores foram especificados como variáveis latentes, representando as componentes hipotetizadas por Geurts e colaboradores (2005) e as correlações entre os fatores foram especificadas para serem estimadas livremente. Para se assegurar a identificação estatística do modelo de medida, as variâncias dos fatores foram fixadas em 1,00.
Os quatro modelos fatoriais alternativos foram testados com base na conceptualização de Geurts e colaboradores (2005) e nos estudos de validação fatorial do SWING dos outros países já referidos. O Modelo 1 (M1) especifica uma estrutura fatorial constituída apenas por um fator de primeira ordem. Neste modelo, a hipótese é que todos os itens da escala medem apenas uma variável latente. O Modelo 2 (M2) especifica uma estrutura fatorial formada por dois fatores correlacionados relativos à direção da interação (interação trabalho-família vs. interação família-trabalho). O Modelo 3 (M3) especifica uma estrutura fatorial formada por dois fatores correlacionados relativos à qualidade da interação (negativa ou positiva). Finalmente, no Modelo 4 (M4) especificou-se um modelo de quatro fatores correlacionados (interação trabalho-família negativa, interação família-trabalho negativa, interação trabalho-família positiva, interação família-trabalho positiva). qualidade de ajustamento global dos modelos foi avaliada através dos seguintes índices: Qui-quadrado (X2), Comparative Fit Index (CFI), Parcimony Comparative Fit Index (PCFI), Tucker-Lewis Index (TLI), Root Mean Square Error of Approximation (RMSEA) e Akaike Information Criterion (AIC). Para a razão X²/g.l. (qui-quadrado/graus de liberdade), considera-se um valor igual ou menor que cinco, como indicador de um ajustamento adequado (Hair, Anderson, Tatham & Black, 2005). Para o CFI e TLI, valores mais próximos de um indicam melhor ajuste, com 0,90 como o valor de referência para aceitação do modelo (Hair et al., 2005). Valores de PCFI a partir de 0,6 indicam um adequado ajustamento (Marôco, 2010). Quanto ao RMSEA, considera-se que quanto mais próximo este índice for de zero, melhor o ajuste do modelo hipotético aos dados; admitem-se valores até 0.10, mas, geralmente, o ponto de corte é de 0,08 (Hair et al., 2005). Por fim, quanto ao AIC, para comparar modelos, o que apresenta o valor mais baixo é escolhido como o modelo que melhor se ajusta aos dados.
Tabela 1 - Estatísticas Descritivas e Correlações entre Variáveis
1. Exaustão Emocional 2. Despersonalização 3. Realização Profissional 4. Trabalho-família negativa 5. Família-trabalho negativa 6. Trabalho-família positiva 7. Família-trabalho positiva
M
SD
(1)
(2)
(3)
(4)
(5)
(6)
2,27 ,80 4,74 ,97 ,46 1,04 1,17
1,30 ,98 ,87 ,45 ,35 ,63 ,71
,448** -,144* ,524** ,283** -,030 -,042
-,217** ,237** ,244** ,034 ,036
-,111 -,159** ,191** ,210**
,220** ,045 ,061
,165** ,167**
,554**
**p<0,01 *p<0,05 Revista Portuguesa de Enfermagem de Saúde Mental, Nº 11 (JUN.,2014) | 27
Os resultados (Tabela 2) mostram que o Modelo 4 apresenta índices de ajustamento razoáveis, ajustando-se significativamente melhor aos dados do que os restantes três modelos, cujos valores dos índices de ajustamento estão muito aquém de serem aceitáveis. Todavia, apresenta valores de CFI e de TLI reveladores de um ajustamento razoável. Assim, realizou-se uma análise suplementar a este modelo, com o objetivo de verificar possíveis relações entre as variáveis do modelo que uma vez estimadas, melhorassem o seu ajustamento. A análise dos índices de modificação mostrou a e -xistência de correlações entre os erros de medida de duas variáveis (M4: e18 vs. e22). Quando se especifica no modelo as correlações entre estes erros de medida a serem estimadas livremente (Modelo 4a), o ajustamento aos dados do modelo hipotetizado melhora, com um aumento significativo relativamente ao modelo nos quais os erros de medida não estavam correlacionados (X2 = 452.96, sendo o menor valor df = 202, CFI = 0,90, PCFI = 0,79, TLI = 0,89, RMSEA = 0,06 e AIC = 598.98). Globalmente, os indicadores de ajustamento revelam um ajustamento bom para o Modelo 4a revelando que a estrutura fatorial com quatro fatores correlacionados é a melhor para traduzir a estrutura fatorial do SWING. Tabela 2 - Índices de Qualidade do Ajustamento dos Modelos Analisados do SWING Modelos
X2
gl
CFI
PCFI
TLI
RMSEA
AIC
M1: Um fator M2: Dois fatoresdireção M3: Dois fatores-qualidade M4: Quatro fatores M4a: Quatro fatores correlacionados
1684,633*** 1494,440***
209 208
0,430 0,503
0,389 0,453
0,370 0,448
0,152 0,142
1816,633 1628,440
1004,467***
208
0,692
0,624
0,658
0,112
1138,467
496,126***
203
0,887
0,779
0,871
0,069
654,126
452,975***
202
0,903
0,790
0,889
0,064
598,975
CFI=Comparative Fit Index; PCFI=Parcimony Comparative Fit Index; TLI=TuckerLewis Index; RMSEA=Root Mean Square Error of Approximation; AIC=Akaike Information Criterion; *** p < 0,001
Como era expectável, os itens apresentam valores fatoriais (loadings) elevados e significativos no fator para o qual foram especificados, e existem correlações significativas entre os fatores que seguem o sentido esperado. A Figura 1 apresenta os parâmetros padronizados (coe -ficientes estandardizados) estimados para o modelo fatorial em hipótese e que revelou melhor ajustamento.
Revista Portuguesa de Enfermagem de Saúde Mental, Nº 11 (JUN.,2014) | 28
Figura 1 - Análise Fatorial Confirmatória da Medida do SWING
Também se examinou a fiabilidade das quatro dimensões do SWING calculando a sua consistência interna através do alpha de Cronbach, bem como o valor de correlação inter-item. Os valores de alpha obtidos (Tabela 3) são adequados pois variam entre 0,72 e 0,86, sendo moderados e estando acima dos 0,70 habitualmente recomendados na análise estatística. Estes valores são semelhantes aos valores obtidos na versão original do questionário, bem como nas versões francesa, espa -nhola e sul-africana. Tabela 3 - Consistência Interna do SWING nas Diferentes Adaptações e Subescalas da Interação Estudo
Trabalhofamília negativa
Famíliatrabalho negativa
Trabalho- Famíliafamília trabalho positiva positiva
Holanda (Geurts et al., 2005) França (Lourel et al., 2005) África do Sul (Marais et al., 2009) Espanha (Jiménez et al., 2009) Portugal
0,84
0,75
0,75
0,81
0,77
0,66
0,69
0,73
0,90
0,84
0,87
0,82
0,89
0,84
0,77
0,85
0,84
0,72
0,87
0,83
Foram também verificados os valores e média das correlações inter-item, bem como os valores das correlações item-total. Os valores máximos das correlações inter-item cumprem na generalidade os critérios de Hair e colaboradores (2005), que referem o valor ideal como superior a 0,30. Este resultado é reforçado pelos valores da média das correlações inter-item que se aproximam dos valores habitualmente referenciados e que variam entre 0,20 e 0,40. Por fim, os valores das correlações item-total seguem o critério de Hair e colaboradores (2005), que referem um valor ideal como superior a 0,50. DISCUSSÃO Neste estudo apresenta-se a adaptação e validação do questionário SWING numa amostra de enfermeiros portugueses, sendo também analisada a prevalência da interação trabalho-família e sua relação com o burnout. Encontraram-se resultados de prevalência baixos mas semelhantes aos de estudos anteriores (Geurts et al., 2005; Marais et al., 2009) e correlações entre burnout e interação trabalho-família também já obtidos noutros estudos (Braunstein-Bercovitz, 2013; Marais et al., 2009). Os baixos valores de prevalência de burnout e de interação encontrados podem ser explicados pelo facto de os participantes terem sido voluntários, não se tendo uma amostra representativa. A versão portuguesa apresenta características psicométricas satisfatórias no que se refere à fiabilidade e validade, sendo os resultados concordantes com os da versão original holandesa (Geurts et al., 2005) e das versões francesa (Lourel et al., 2005), espanhola (Jiménez et al., 2009) e sul-africana (Marais et al., 2009). Neste estudo, o modelo de quatro fatores correlacionados, que distingue quer a direção, quer a qualidade da interação trabalho-família revelou ser, de todos os modelos analisados, o que melhor se adequa aos dados, tal como os resultados obtidos na versão de Geurts e colaboradores (2005). Quanto à fiabilidade, as quatro subescalas da adaptação portuguesa apresentam valores moderados e adequados a uma boa consistência interna, sendo semelhantes aos valores da versão original e das demais adaptações anteriormente mencionadas. Assim, o SWING demonstra ser um bom instrumento de medida da interação trabalho-família em toda a sua extensão, permitindo conhecer e intervir na interação trabalho-família.
CONCLUSÕES A psicologia da saúde ocupacional foca-se na melhoria da qualidade de vida no trabalho, identificando fontes de stress e de risco na proteção e promoção da segurança, saúde e bem-estar dos trabalhadores, pelo que o burnout e a interação trabalho-família constituem domínios indispensáveis na abordagem de questões relacionadas com a saúde ocupacional. Apesar da amostra inquirida apresentar baixos valores de burnout e de interação negativa reduzida, as qualidades psicométricas do SWING são satisfatórias, sugerindo que o questio -nário pode ser utilizado no contexto da enfermagem. De facto, as condições nas quais esta atividade é exercida podem potenciar uma influência negativa do trabalho na família, dificultando o repouso, e a longo prazo desencadeando burnout e diminuição da qualidade dos cuidados prestados, o que pode ter implicações na prática clínica dos enfermeiros. Este estudo tem algumas limitações, nomeadamente associadas à utilização das medidas de auto-relato, nas quais o SWING se enquadra. Deste modo, em futuras investigações sugere-se a utilização de outras fontes de informação (e.g. conjugue, colegas, chefe) e posterior comparação de resultados. Sugere-se igualmente a realização de estudos que incluam amostras de outras ca -tegorias profissionais de forma a confirmar a estrutura fatorial do SWING. Uma última limitação consiste na tipologia transversal do estudo que não permite estabelecer relações causais. Assim, sugere-se a realização de estudos longitudinais que analisem a relação entre as subescalas do SWING e os seus antecedentes e consequências. Pode-se concluir que a versão portuguesa do questionário SWING apresenta os requisitos necessários em termos de consistência interna e validade fatorial, estimulando o seu uso na avaliação da interação trabalho-família em enfermeiros, pois pode ser útil para conhecer a realidade profissional dos enfermeiros. REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS Amstad, F., Meier, L., Fasel, U., Elfering, A., & Semmer, N. (2011). A meta-analysis of work-family conflict and various outcomes with a special emphasis on crossdomain versus matching-domain relations. Journal of Occupational Health Psychology, 16(2), 151-169. doi: 10.1037/a0022170 Anagnostopoulos, F., & Niakas, D. (2010). Job burnout, health-related quality of life and sickness absence in Greek health professionals. European Psychologist, 15(2), 132-141. Revista Portuguesa de Enfermagem de Saúde Mental, Nº 11 (JUN.,2014) | 29
Borges, E., e Ferreira, T. (2013). Relaxamento: Estratégia de intervenção no stress. Revista Portuguesa de Enfermagem de Saúde Mental, 10, 37-42. Braunstein-Bercovitz, H. (2013). A multidimensional mediating model of perceived resource gain, workfamily conflict sources and burnout. International Journal of Stress Management, 20(2), 95-115. doi: 10.1037/ a0032948 European Agency for Safety and Health at Work (2013). European Opinion Poll on Occupational Safety and Health. Bilbao: EU-OSHA. Geurts, S., Taris, T., Kompier, M., Dikkers, J., Hoof, M., & Kinnunnen, U. (2005). Work-home interaction from a work psychological perspective: Development and validation of a new questionnaire, the SWING. Work & Stress, 19(4), 319-339. doi: 10.1080/02678370500410208 Greenhaus, J., & Powell, G. (2006). When work and family are allies: A theory of work-family enrichment. Academy of Management Review, 31(1), 72-92. Hair Jr., J., Anderson, R., Tatham, R., & Black, W. (2005). Análise Multivariada de Dados (5ª ed.). Porto Alegre: Bookman. Jiménez, B., Verger, A., Muñoz, A., y Geurts, S. (2009). Propriedades psicométricas de la versión española del Cuestionario de Interacción Trabajo-Familia (SWING). Psicothema, 21(2), 331-337. Liu, M., Zhan, Y., & Shi J. (2010). Daily work-family conflict and alcohol use: Testing the cross-level moderation effects of peer drinking norms and social support. Journal of Applied Psychology, 95(2), 377-386. doi: 10.1037/a0018138 Lourel, M., Gana, K., & Wawrzyniak, S. (2005). L’interface «vie privée-vie au travail»: Adaptation and validation of Survey Work-Home Interaction Nijmegen (SWING). Psychologie du travail et des organisations, 11, 227-239.
Revista Portuguesa de Enfermagem de Saúde Mental, Nº 11 (JUN.,2014) | 30
Marais, C., Mostert, K., Geurts, S., & Taris, T. (2009). The psychometric properties of a translated version of the Survey Work-Home Interaction Nijmegen (SWING) instrument. South African Journal of Psychology, 39(2), 202–219. Marôco, J. (2010). Análise de Equações Estruturais: Fundamentos teóricos, Software & Aplicações. Pêro Pinheiro: ReportNumber. Maslach, C., & Jackson, S. (1997). MBI, Inventário de Burnout de Maslach, síndrome del “quemado” por estrés laboral asistencial, manual. Madrid: TEA. Maslach, C., Schaufeli, W. B., & Leiter, M. (2001). Job burnout. Annual Review Psychology, 52, 397-422. Mcnall, L., Nicklin, J., & Masuda, A. (2010). A meta-analytic review of the consequences associated with workfamily enrichment. Journal of Business and Psychology, 25, 381-396. Pereira, A. M., Queirós, C., & Geurts, S. (2010). Burnout e o conflito trabalho-família em enfermeiras: Uma adaptação portuguesa da SWING. Comunicação oral in CDRom of Abstracts VII Congreso Iberoamericano de Psicología, 20-23 Julho, Oviedo, Spain, fiap\1123.html. Queirós, C., Carlotto, M. S., Kaiseler, M., Dias. S., & Pereira, A.M. (2013). Predictors of Burnout among nurses: An interactionist approach. Psicothema, 25(3), 330-335. doi: 10.7334/psicothema2012.246 Rantanen, J., Kinnunen, U., Mauno, S. & Tement, S. (2013). Patterns of conflict and enrichment in work-family balance: a three dimensional typology. Work & Stress, 27(2), 141-163. doi: 10.1080/02678373.2013.791074 Tavares, S., Caetano, A., e Silva, S. (2007). Não há bela sem senão: A identificação organizacional, os comportamentos de dedicação ao trabalho e o conflito trabalho-família. Psicologia, 21(1), 133-149. Westermann, C., Kozak, A., Harling, M., & Nienhaus, A. (2014). Burnout intervention studies for inpatient elderly care nursing staff: Systematic review. International Journal of Nursing Studies, 51(1), 63-71. doi: 10.1016/j. ijnurstu.2012.12.001
5
COMUNICAÇÃO TERAPÊUTICA EM CARATERIZAM OS ENFERMEIROS
ENFERMAGEM:
COMO
A
| Maria Teresa Vieira Coelho1; Carlos Sequeira2 |
RESUMO CONTEXTO: A comunicação terapêutica usada deliberadamente na prestação de cuidados é, ainda, um desafio para alguns enfermeiros. Essencial para a enfermagem, a comunicação terapêutica é um processo consciente que, de forma intencional, permite identificar e responder às necessidades de cada pessoa contribuindo simultaneamente para a melhoria da prática de enfermagem. Apresenta-se neste artigo parte dos resultados da tese desenvolvida no âmbito do curso de doutoramento, com o objetivo de caraterizar os itens que integram a comunicação terapêutica. METODOLOGIA: Trata-se de um estudo de enfoque quantitativo, exploratório e descritivo. Os dados foram obtidos com a aplicação de um questionário online, com a colaboração da Ordem dos Enfermeiros Portugueses (OE), ao qual responderam 448 enfermeiros. RESULTADOS: Mais de 90% dos inquiridos afirmam que a comunicação terapêutica é necessária em mais do que apenas intervenções psicoterapêuticas e, 54% concordam que toda a comunicação utilizada pelo enfermeiro é comunicação terapêutica. A quase totalidade dos enfermeiros inquiridos concorda com a maioria dos aspetos caraterizadores da comunicação terapêutica, sendo relevante que respetivamente 23,5% e 35,6% não concordam com o uso intencional e com o valor clinico autónomo da mesma. CONCLUSÕES: Pelos resultados obtidos é possível identificar uma tendência de maior concordância nos inquiridos detentores do título de especialista pela OE, com mais tempo de exercício profissional e com grau académico mais elevado. RELEVÂNCIA PARA A PRÁTICA CLÍNICA: Os resultados apresentados permitem sugerir o aprofundamento de aspetos relacionados com comunicação terapêutica na formação dos enfermeiros o que irá refletir-se na qualidade dos cuidados prestados. PALAVRAS-CHAVE: Comunicação; Enfermagem
RESUMEN
ABSTRACT
“Comunicación terapéutica en enfermería: Como es caracterizado por los enfermeros”
“Therapeutic communication in nursing: How it is characterized by nurses”
CONTEXTO: La comunicación terapéutica utilizada deliberadamente en la prestación de cuidados, sigue siendo un desafío para algunos enfermeros. Esencial para la enfermería, la comunicación terapéutica es un proceso consciente que intencionalmente permite identificar y responder a las necesidades de cada persona contribuyendo para mejorar la práctica de enfermería. Se presentan en este trabajo algunos resultados de la tesis desarrollada en el ámbito del Phd, con el objetivo de caracterizar elementos que comprenden la comunicación terapéutica. METODOLOGÍA: Esto es un estudio cuantitativo, exploratorio y descriptivo. Datos obtenidos con la aplicación de cuestionario en línea, con la colaboración de la Orden de los Enfermeros Portugueses (OE), contestado por 448 enfermeros. RESULTADOS: Más del 90% de los encuestados afirman que es necesaria la comunicación terapéutica en más que simples intervenciones psicoterapéuticas, y 54% acuerdan que toda la comunicación utilizada en enfermería es comunicación terapéutica. Casi todos los enfermeros encuestados están de acuerdo con la mayoría de los aspectos caracterizadores de la comunicación terapéutica, siendo relevante que, respectivamente, 23,5% y 35,6% no acuerdan con el uso previsto y el valor clínico independiente de ella. CONCLUSIONES: Los resultados obtenidos permiten identificar una tendencia de mayor acuerdo entre los inquiridos titulares de la experta de la OE, con más tiempo de práctica profesional y más alto grado académico. RELEVANCIA PARA LA PRÁCTICA CLÍNICA: Los resultados permiten sugerir la profundización de los aspectos relacionados con la comunicación terapéutica en la formación de los enfermeros que se reflejará en la calidad de la atención prestada.
CONTEXT: Therapeutic communication used deliberately in care provision is still a challenge to some nurses. Essential to nursing, therapeutic communication is a conscious process that, in an intentional way, allows identification and response to the needs of each person and simultaneously contributes to the improvement of nursing practice. It is presented in this article part of the results of the thesis developed under the doctorate, with the purpose of characterizing the items which integrate therapeutic communication. METHODOLOGY: It is a study of quantitative, exploratory and descriptive focus. The data was obtained with an online survey application, with the collaboration of the Portuguese Nursing Order, to which 448 nurses responded. RESULTS: Over 90% of the inquired state that therapeutic communication is necessary in more than just psychotherapeutic interventions and 54% agree that all communication used by a nurse is therapeutic communication. Almost all the inquired nurses agree with most of the characterizing aspects of therapeutic communication and it is worth noting that respectively 23.5% and 35.6% don’t agree with the intentional use and autonomous clinical value of it. CONCLUSIONS: With the obtained results it is possible to identify a major agreement tendency in the inquired, holders of the specialist title by the Order, with more professional exercise time and a higher academic degree. RELEVANCE TO CLINICAL PRACTICE: The results presented allow us to suggest the deepening of aspects related to therapeutic communication in nursing education what will reflect on the quality of care provided.
DESCRIPTORES: Comunicación; Enfermería
Submetido em 25-03-2014 – Aceite em 31-05-2014
KEYWORDS: Communication; Nursing
1 Mestre em Teologia e Ética da Saúde; Professora Adjunta no Instituto Politécnico de Santarém – Escola Superior de Saúde de Santarém, teresa.coelho@essaude.ipsantarem.pt 2 Doutor em Ciências de Enfermagem; Professor Coordenador na Escola Superior de Enfermagem do Porto, 4200-072 Porto, Portugal, carlossequeira@esenf.pt Citação: Coelho, M. T. V., & Sequeira, C. (2014). Comunicação terapêutica em enfermagem: Como a caraterizam os enfermeiros. Revista Portuguesa de Enfermagem de Saúde Mental (11), 31-xx. Revista Portuguesa de Enfermagem de Saúde Mental, Nº 11 (JUN.,2014) | 31
INTRODUÇÃO A ideia de que vivemos numa sociedade de comunicação é hoje bastante generalizada. Convém no entanto não esquecer que, comunicar mais, pode não significar obrigatoriamente comunicar melhor. Sendo esta uma ideia geral, pensamos ser pertinente a sua aplicação à realidade específica da enfermagem, em que o enfermeiro deve garantir o sucesso da comunicação que utiliza no âmbito da prestação de cuidados, uma vez que níveis de comunicação eficazes conduzem a resultados mais positivos (Gomes, Amendoeira e Martins, 2012). A comunicação é tanto mais importante quanto a constatação de que, comunicar com aqueles que nos rodeiam constitui uma das nossas principais atividades, pois a comunicação é indispensável para a sobrevivência dos seres humanos. Para Phaneuf (2005), numa comunicação as nossas trocas compreendem duas componentes principais: uma parte informativa, ligada ao domínio cognitivo – o quê da mensagem; e uma parte mais afetiva ligada à maneira como é transmitida – o como. É vasta a literatura que aponta para a existência de uma gama de elementos verbais e não-verbais presentes no processo comunicativo, tornando assim a comunicação numa totalidade que integra o verbal e o não-verbal. No processo comunicativo, sendo naturalmente importantes as trocas verbais, sabemos que estas representam uma pequena parcela no estabelecimento de uma boa comunicação, pois estima-se que apenas cerca de 7% do significado é transmitido por palavras, 38% por sinais paralinguísticos e 55% por gestos corporais (Stuart & Laraia, 2006). A comunicação não-verbal favorece uma perceção mais lúcida e totalizadora dos processos comunicativos. O seu emprego na vida quotidiana acrescenta capacidade de prestar atenção e reconhecer o que acontece para além das palavras, o que pode conduzir à implementação das estratégias mais adequadas (Rulicki & Cherny, 2007). Como afirmam Bertone, Ribeiro, e Guimarães (2007), a comunicação deve fazer parte do exercício profissional dos enfermeiros, para que estes possam garantir o êxito dos procedimentos técnicos e da convivência que competem para uma melhor qualidade de vida da pessoa que necessita dos cuidados de enfermagem. A comunicação é, desta forma, um denominador comum presente nas ações de enfermagem que terá influência na maneira como o cuidado é prestado a cada pessoa e deverá garantir a obtenção de ganhos terapêuticos (Gomes et al., 2012). Revista Portuguesa de Enfermagem de Saúde Mental, Nº 11 (JUN.,2014) | 32
Neste contexto surge a comunicação terapêutica, que é mais que comunicar-se com a pessoa no exercício do papel profissional de enfermeiro (Gefaell, 2007), é um método de comunicação através do qual o cuidador responde às necessidades explícitas e implícitas da pessoa (Fuller, 2007), é um processo consciente e deliberado usado para reunir informações relacionadas com o estado de saúde da pessoa como um todo e responder com uma abordagem verbal ou não verbal que promova o seu bem-estar, melhore a forma como este entende os cuidados prestados (Wold, 2013) e permita estabelecer uma relação terapêutica (Williams & Davis, 2005). No âmbito da saúde, a comunicação precisa de ser terapêutica, porque esta objetiva o cuidado e, através deste, favorece a tranquilidade, autoconfiança, respeito, individualidade, ética, compreensão e empatia pela pessoa cuidada (Bertone et al., 2007). É igualmente importante considerar que a comunicação terapêutica tem a finalidade de identificar e atender as necessidades de saúde de cada pessoa, e contribuir para melhorar a prática de enfermagem. Neste artigo pretende-se apresentar parte dos resultados obtidos com o desenvolvimento da tese no âmbito do curso de Doutoramento em Ciências de Enfermagem, no Instituto de Ciências Biomédicas Abel Salazar (ICBAS) – Universidade do Porto, no que se refere ao objetivo caraterizar os itens que integram a comunicação terapêutica. METODOLOGIA Trata-se de um estudo com enfoque quantitativo, exploratório, descritivo e transversal. Para a dimensão apresentada, tem como objetivo caraterizar os itens que integram a comunicação terapêutica. O instrumento de colheita de dados foi o questionário construído por nós, por não ter sido encontrado um instrumento que permitisse colher dados sobre as variáveis em estudo, tornando assim o seu desenvolvimento parte do processo de investigação em si (Coutinho, 2011). Na elaboração do questionário, considerámos as etapas descritas por Fortin ( 2009), tendo a construção do esboço do mesmo sido precedida por revisão da literatura. O esboço do questionário foi submetido a revisão, pois só com dados fiáveis se podem obter resultados válidos (Coutinho, 2011). Nesse sentido, procedeu-se à avaliação do questionário. Não tendo sido encontrada unanimidade quanto ao número de peritos a mobilizar nesta etapa, considerámos o referido por Lynn citado por Alexandre e Coluci (2011), que recomenda um mínimo de 5 e um máximo de 10 pessoas participantes neste processo.
Contámos assim com a colaboração de 7 peritos seleccionados de acordo com os seguintes critérios: grau académico de doutor, experiência de pelo menos dois anos na área da saúde/enfermagem ou como investigador na área da comunicação, pois, de acordo com Carvalho et al., (2008), deve considerar-se o tempo mínimo de dois anos para quem está no intervalo entre iniciado e perito. Após a primeira avaliação pelos juízes foram introduzidas no questionário todas as sugestões, à exceção das que tinham a ver como uso da terminologia própria dos autores mobilizados e identificados no mesmo. Após esta etapa o questionário foi de novo reenviado aos juízes tendo obtido a concordância dos mesmos. Procedeu-se ainda ao pré teste do questionário, que foi aplicado a 12 indivíduos com características semelhantes às da população do estudo, tendo em conta, como afirma Fortin (2009), que este deve ocorrer numa pequena amostra da população, entre 10 a 20 pessoas. Foi o questionário resultante deste processo que foi utilizado no estudo. Trata-se de um questionário misto, no entanto, os resultados que apresentamos resultam de perguntas onde foi utilizada escala de Likert, com 5 opções de resposta (1 discordo totalmente a 5 concordo totalmente). Os participantes do estudo e de acordo com o critério definido - ser enfermeiro e estar inscrito na OE, constituíram-se numa amostra não probabilística acidental ou de conveniência. A colheita de dados foi feita com a colaboração da Ordem dos Enfermeiros (OE), através da aplicação online do questionário, cujo link de acesso ao mesmo esteve disponível na página da OE para todos os enfermeiros inscritos na mesma, entre os dias 4 e 25 de Novembro de 2013. Responderam ao questionário, de forma válida, 448 enfermeiros. O tratamento dos dados foi efectuado com recurso a estatística descritiva e com auxílio do programa SPSS (Statistical Package for the Social Sciences), versão 20. Os resultados são apresentados em tabelas e gráficos. O projeto de pesquisa foi aprovado pela Comissão de Ética do ICBAS, Universidade do Porto. Foram tidos em conta os princípios éticos de que se destacam o consentimento livre e esclarecido e o respeito pela confidencialidade de todas as informações. Identificamos como principais limitações deste estudo o facto de não termos encontrado outros estudos que permitissem a comparação dos resultados; a divulgação do Link para acesso ao questionário não ter chegado a todos os enfermeiros; e, o número de questionários respondidos não permitir extrapolar os resultados para a população.
RESULTADOS Caracterização dos Participantes Apresentam-se no quadro nº 1 os dados que consideramos mais relevantes referentes às variáveis de caracterização. Quadro 1 - Caracterização dos Participantes Dados demográficos Caracterização Média Desvio dos Participantes padrão N (%) Sexo (N = 447) Feminino Masculino
351 (78,5) 96 (21,5)
Idade (N= 434) 21-30 31 -40 41-50 51-60
173 (39,9) 113 (26) 110 (25,4) 38 (8,7)
Habilitações académicas (N=446) Bacharelato Licenciatura Mestrado Doutoramento
4 (0,9) 301 (67,5) 127 (28,5) 14 (3,1)
Ser detentor do titulo de especialista pela OE (N=447) Sim Não
192 (43) 255 (57)
Categoria Profissional (N=427) Enfermeiro Docente
381 (89,2) 46 (10,8)
Tempo de exercício profissional (N = 448) Ate 10 anos 220 (50,5) Mais de 10 anos 216 (49,5)
35,7
10
13,7
9,916
Aspetos Caraterizadores da Comunicação Terapêutica Apresentamos de seguida dados que nos permitem caraterizar a comunicação terapêutica de acordo com a opinião dos enfermeiros. Através dos resultados apresentados no quadro nº 2, podemos verificar que 94,2% dos enfermeiros referem a sua discordância quanto à afirmação “a comunicação terapêutica só é necessária nas intervenções psicoterapêuticas”, sendo de salientar que 60,6% afirmam discordar totalmente. Em relação à afirmação “toda a comunicação utilizada pelo enfermeiro é comunicação terapêutica”, discordam 38,2%, no entanto, 54,7% dos enfermeiros assinalam a sua concordância.
Revista Portuguesa de Enfermagem de Saúde Mental, Nº 11 (JUN.,2014) | 33
Quadro 2 - Distribuição dos Respondentes Segundo o Grau de Concordância face às Expressões Apresentadas Em relação à comunicação utilizada pelo enfermeiro, considera que:
Discordo totalmente Discordo
Indeciso
Concordo Concordo totalmente
Total
A comunicação terapêutica só é necessária nas intervenções psicoterapêuticas Toda a comunicação utilizada pelo enfermeiro é comunicação terapêutica
60,6%
33,6%
1,0%
2,7%
2,2%
100,0%
7,5%
30,7%
7,1%
30,2%
24,5%
100,0%
Perante a constatação de que para mais de 50% dos inquiridos toda a comunicação utilizada pelo enfermeiro é comunicação terapêutica e não sendo esta, também para os teóricos, uma afirmação consensual, procedemos a uma análise cruzada com as variáveis de caraterização dos inquiridos, de forma a melhor compreender e descrever este posicionamento. Como podemos verificar pelo quadro nº 3, que apresentamos de seguida, a concordância (concordo + concordo totalmente) com a expressão “toda a comunicação utilizada pelo enfermeiro é comunicação terapêutica” é maior nos inquiridos do sexo feminino, com a categoria profissional de enfermeiros e não detentores do título de especialista pela OE. Quanto ao grau académico, o nível de concordância vai diminuindo ao longo do percurso académico, sendo que, os doutores são os que menos concordam. Quadro 3 - Distribuição do Grau de Concordância com a Expressão «Toda a comunicação utilizada pelo enfermeiro é comunicação terapêutica» pelas Categorias das Variáveis: Habilitações Académicas, Título de Especialista, Categoria Profissional e Sexo Variáveis
Categorias
Discordo totalmente
Discordo
Indeciso
Concordo
Concordo totalmente
Habilitações académicas
Bacharelato Licenciatura Mestrado Doutoramento
5,9 10,8 15,4
30,0 32,5 38,5
7,7 5,8 7,7
33,3 32,1 25,0 30,8
66,7 24,4 25,8 7,7
Titulo especialista
Especialista Não Especialista
9,4 6,2
31,7 30,0
8,3 6,2
26,1 32,9
24,4 24,7
Categoria profissional
Enfermeiro Docente
6,9 14,0
28,9 41,9
6,9 9,3
32,5 16,3
24,8 18,6
Sexo
Feminino Masculino
6,5 10,8
30,5 31,2
6,6 8,6
29,9 31,2
26,3 18,3
Os dados do quadro nº 4, permitem-nos verificar que há uma concordância expressiva dos enfermeiros quanto às características da comunicação terapêutica. Para mais de 90% dos enfermeiros questionados, a comunicação para ser terapêutica deve: atender à individualidade da pessoa; identificar as verdadeiras necessidades de saúde das pessoas; contribuir para a melhoria da prática de enfermagem; responder às verdadeiras necessidades de saúde das pessoas; aumentar a eficácia da relação terapêutica; possuir valor terapêutico complementar, aumentando ou complementando a eficácia de outras intervenções. Quanto aos itens “ser utilizada de forma intencional” e “possuir valor clínico autónomo de outras intervenções”, salienta-se que, respetivamente 23,5% e 35,6% dos respondentes não concordaram (por discordância ou indecisão) com estas afirmações. Quadro 4 - Distribuição dos Respondentes segundo o Grau de Concordância face às Afirmações Para ser terapêutica a comunicação utilizada pelo enfermeiro deve: Ser utilizada de forma intencional Atender à individualidade das pessoas Identificar as verdadeiras necessidades de saúde das pessoas Responder às verdadeiras necessidades de saúde das pessoas Possuir valor clínico autónomo de outras intervenções Possuir valor terapêutico complementar, aumentando ou complementando a eficácia de outras intervenções Aumentar a eficácia da relação terapêutica Contribuir para a melhoria da prática de enfermagem Revista Portuguesa de Enfermagem de Saúde Mental, Nº 11 (JUN.,2014) | 34
Discordo totalmente
Discordo
Indeciso
Concordo
Concordo totalmente
Total
2,2% 0,0% 0,5%
12,9% 0,2% 0,5%
8,4% 0,2% 1,4%
47,8% 32,3% 43,2%
28,7% 67,2% 54,4%
100% 100% 100%
0,5%
0,5%
2,4%
42,8%
53,8%
100%
3,1% 0,0%
16,6% 1,4%
15,9% 5,5%
38,7% 50,6%
25,7% 42,4%
100% 100%
0,2% 0,5%
0,7% 1,2%
2,9% 1,4%
45,9% 34,4%
50,2% 62,5%
100% 100%
Porque se destacam pela menor concordância obtida, procedeu-se ao cruzamento da concordância dos enfermeiros quanto à expressão “ser utilizada de forma intencional” e “possuir valor clinico autónomo de outras intervenções”, com as variáveis de caraterização. Verifica-se, de acordo com o quadro nº 5, que a concordância com a afirmação “ser utilizado de forma intencional”, é maior para os inquiridos com mais de 10 anos de experiência profissional, especialistas em enfermagem pela OE e docentes. Quanto ao grau académico verifica-se que todos os bacharéis concordam, sendo importante ter em conta a baixa percentagem de respondentes neste grupo e, em relação aos outros graus, o nível de concordância aumenta nos graus mais elevados, sendo que todos os doutores concordam. Quadro 5 - Distribuição do Grau de Concordância com a Expressão «Ser utilizada de forma intencional» pelas Categorias das Variáveis: Habilitações Académicas, Título de Especialista, Categoria Profissional e Tempo de Exercício Profissional Variáveis
Categorias
Discordo totalmente
Discordo
Indeciso
Concordo
Concordo totalmente
Habilitações académicas
Bacharelato Licenciatura Mestrado Doutoramento
2,1 2,5 -
16,3 6,7 -
9,9 5,9 -
66,7 45,7 48,7 76,9
33,3 25,9 36,1 23,1
Titulo especialista
Especialista Não Especialista
2,3 2,1
10,2 14,9
6,8 9,5
46,0 49,4
34,7 24,1
Categoria profissional
Enfermeiro Docente
1,9 -
14,2 -
9,7 -
47,9 45,2
26,2 54,8
Tempo de exercício profissional
Até 10 anos Mais de 10 anos
1,9 2,5
15,8 9,9
10,5 6,4
45,9 49,3
25,8 32,0
Quanto à concordância dos inquiridos com a expressão “possui valor clínico autónomo de outras intervenções”, e pela análise do quadro nº 6, verifica-se que esta é maior para os doutores, para os que têm o título de especialista pela OE, para os docentes e para os que têm mais de 10 anos de exercício profissional.
Quadro 6 - Distribuição do Grau de Concordância com a Expressão «Possui valor clínico autónomo de outras intervenções» pelas Categorias das Variáveis: Habilitações Académicas, Titulo de Especialista, Categoria Profissional e Tempo de Exercício Profissional Variáveis
Categorias
Discordo totalmente
Discordo
Indeciso
Concordo
Concordo totalmente
Habilitações académicas
Bacharelato Licenciatura Mestrado Doutoramento
3,6 2,5 -
17,4 16,1 -
33,3 15,3 17,8 7,7
33,3 41,3 32,2 46,2
33,3 22,4 31,4 46,2
Titulo especialista
Especialista Não Especialista
1,7 4,2
14,8 18,0
17,6 14,6
35,2 41,0
30,7 22,2
Categoria profissional
Enfermeiro Docente
3,4 2,4
17,1 4,8
17,4 9,5
38,2 47,6
23,9 35,7
Tempo de exercício profissional
Até 10 anos Mais de 10 anos
4,3 2,0
16,9 16,7
15,9 16,3
36,2 40,4
26,6 24,6
DISCUSSÃO
Através da análise conjunta dos resultados referentes aos aspetos caraterizadores da comunicação terapêutica, verifica-se que os enfermeiros parecem não ter dúvidas de que a utilização desta está presente em mais do que intervenções psicoterapêuticas. No entanto, perante a afirmação de que toda a comunicação que o enfermeiro utiliza é comunicação terapêutica, as opiniões são menos unânimes. Estamos assim, perante resultados que parecem confirmar a afirmação de que comunicação terapêutica é uma expressão empregue de diferentes maneiras no domínio dos cuidados de enfermagem, uma vez que, para alguns, ela pode ter uma abordagem terapêutica específica e, para outros, abranger todas as interações cuidador – cuidado (Rubenfeld & Scheffer,1999). No entanto, é fundamental não esquecer que a comunicação deve fazer parte do exercício profissional dos enfermeiros, para que estes possam garantir o êxito dos procedimentos técnicos e da convivência que competem para uma melhor qualidade de vida da pessoa que necessita dos cuidados de enfermagem (Bertone et al., 2007) pois esta constitui a principal ferramenta terapêutica de que dispõe o enfermeiro (Phaneuf, 2005). Falamos desta forma da comunicação terapêutica que, sendo uma componente essencial dos cuidados de saúde para qualquer cliente (Tamparo & Lindh,2008), é a base da enfermagem (Gefaell, 2007). É igualmente importante que os enfermeiros tenham em conta que, de entre as mensagens emitidas, algumas são voluntárias ou intencionais e respondem às necessidades do momento, outras porém são involuntárias (Phaneuf, 2005), tornando difícil que toda a comunicação seja terapêutica. Revista Portuguesa de Enfermagem de Saúde Mental, Nº 11 (JUN.,2014) | 35
A constatação de que são os especialistas pela OE e os que têm mais formação académica a concordar menos com a afirmação de que toda a comunicação utilizada pelo enfermeiro é terapêutica, permite-nos considerar a importância da formação profissional e académica na atenção a esta temática, sobretudo tendo em conta que a comunicação terapêutica é um comportamento adquirido, exige um compromisso ativo, não depende da sorte nem é casual (Fuller, 2007) o que reforça a importância da formação nesta matéria. Nesta sequência, quando são apresentados aos inquiridos alguns aspetos que de acordo com vários autores caraterizam a comunicação terapêutica, há, como já referimos, uma quase unanimidade com a maioria deles. Evidencia-se porém a menor concordância com as afirmações “ser utilizada de forma intencional” e “possuir valor clínico autónomo de outras intervenções”. O não reconhecimento, por parte de alguns enfermeiros, da importância da utilização intencional da comunicação terapêutica, pode pôr em causa a eficácia da mesma e dessa forma contribuir para o insuficiente reconhecimento da dimensão humana na saúde, identificado pela Organização Mundial da Saúde (2008), sendo que, pelo contrário, o seu uso efectivo pode constituir-se num contributo importante para que os serviços de saúde adaptem as suas respostas à especificidade de cada individuo e comunidade, aumentando assim os ganhos em saúde (OMS, 2008). Estabelecer um paralelismo entre a afirmação “possuir valor terapêutico complementar, aumentando ou complementando a eficácia de outras intervenções” onde a concordância dos inquiridos foi quase total, com a afirmação “possuir valor clínico autónomo de outras intervenções” em relação à qual 35,6% dos respondentes não concordaram, leva-nos a refletir sobre as dimensões interdependente e autónoma dos cuidados de enfermagem. Ainda que a complementaridade da comunicação terapêutica possa ocorrer tanto em relação a intervenções autónomas como interdependentes, parece-nos oportuno ter em conta que, e de acordo com o Regulamento do Exercício Profissional dos Enfermeiros - REPE (Decreto Lei nº 161/96 de 4 de setembro) no nº 2 do artigo 9º, se consideram “autónomas as ações realizadas pelo enfermeiro sob sua única e exclusiva iniciativa e responsabilidade de acordo com as respetivas qualificações profissionais…”, o que parece incluir a comunicação terapêutica, pois, como afirma Gefaell (2007), a comunicação terapêutica é parte do papel autónomo do enfermeiro e requer pensar de uma maneira específica. Revista Portuguesa de Enfermagem de Saúde Mental, Nº 11 (JUN.,2014) | 36
Existem porém alguns enfermeiros para quem este aspeto parece não ser tão claro, o que pode ter influência na decisão de utilizar ou mesmo na utilização da comunicação terapêutica na sua verdadeira abrangência, aspeto da maior relevância, reforçado pelo estudo de Pontes, Leitão e Ramos, (2008), ao concluir que o processo de comunicação terapêutica deve ser priorizado como actividade de enfermagem relevante e essencial, para efectivar a comunicação terapêutica enfermeiro paciente. O facto de se tratar, como temos vindo a referir, de aspetos que sendo importantes na caracterização da comunicação terapêutica vão influenciar na concretização da mesma e que não congregam a unanimidade dos respondentes, levou-nos a procurar de entre estes os que manifestaram maior concordância. Encontramos uma tendência de maior concordância nos enfermeiros que trabalham há mais de 10 anos, são especialistas em enfermagem pela OE, são docentes, e doutores. A importância dos aspetos apresentados é referida por autores como Carvalho et al., (2008), ao identificar o tempo de serviço como indicador de experiência que influencia na tomada de decisão, e por Benner (2001) que, ao ter por base a experiência, refere que são enfermeiros com mais experiência que estão mais próximos do estado de proficiente, aquele que é capaz de percecionar as situações na sua globalidade, ou de perito, que tem uma enorme experiência e compreende de maneira intuitiva cada situação. Verifica-se assim, pelas respostas dos enfermeiros, que tanto o percurso profissional como o formativo, que acontecem frequentemente em simultâneo, têm influência na forma como estes se posicionam em relação à comunicação terapêutica, sendo que esta ideia pode ser reforçada por Negreiros, Fernandes, MacedoCosta e Silva (2010) ao apresentarem como conclusão do seu estudo a importância de um maior investimento na educação permanente, alertando e esclarecendo os profissionais sobre a importância da comunicação terapêutica. CONCLUSÃO O estudo efectuado permite concluir que, a comunicação terapêutica é considerada pelos enfermeiros necessária em mais do que só intervenções psicoterapêuticas, havendo enfermeiros que consideram que toda a comunicação que utilizam é comunicação terapêutica e outros que não comungam desta opinião.
Globalmente existe uma manifesta concordância dos inquiridos em relação aos aspetos caraterizadores da comunicação terapêutica, salientando-se no entanto o facto de esta concordância ser menor quando se refere ao uso intencional e ao valor clínico autónomo, fundamentais para o desenvolvimento da dimensão autónoma dos cuidados. Salienta-se também que os inquiridos que mais referem concordar com os itens caraterizadores da comunicação terapêutica trabalham há mais tempo, são especialistas pela OE, têm grau académico mais elevado e são docentes, o que nos permite refletir no que se refere à comunicação terapêutica e à forma como esta é tida em conta pelos enfermeiros, na importância da formação académica e profissional, e da experiência/ percurso profissional. RELEVÂNCIA PARA A PRÁTICA CLÍNICA Os resultados deste estudo permitem conhecer não só a forma como os enfermeiros relevam os aspetos apresentados, como também identificar variáveis que influenciam a opinião dos mesmos. Esta identificação permite-nos sugerir a inclusão e/ou o aprofundamento dos aspetos relacionados com a comunicação terapêutica, sobretudo na formação inicial dos enfermeiros e ao nível da formação contínua desde o início da atividade profissional, o que acreditamos se irá refletir numa utilização mais efectiva e adequada da comunicação terapêutica, e, dessa forma, em cuidados de enfermagem que respondam às verdadeiras necessidades de saúde das pessoas em cada situação. REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS Alexandre, N. M., e Coluci, M. O. (2011). Validade de conteúdo nos processos de construção e adaptação de instrumentos de medidas. Revista Ciência & Saúde Coletiva, 16(7), 3061-3068. Acedido em http://www.scielo.br/pdf/csc/v16n7/06.pdf Benner, P. (2001). De Iniciado a Perito. Coimbra: Quarteto. Bertone, T. B., Ribeiro, A. P., e Guimarães, J. (2007). Considerações sobre o relacionamento interpessoal enfermeiro-paciente. Revista Fafibe On Line, 3, 1-5. Acedido em http://www.unifafibe.com.br/revistasonline/arquivos/revistafafibeonline/sumario/11/19042010141352. pdf
Carvalho, E. C., Mello, A. D., Napoleão, A. A., Bachion, M. M., Dalri, M. C., e Canini, S. R. (2008). Validação de diagnóstico de enfermagem: Reflexão sobre dificulddaes enfrentadas por pesquisadores. Revista Eletrônica de Enfermagem, 10(1), 235-240. Acedido em http:// www.fen.ufg.br/revista/v10/n1/v10n1a22.htm Coutinho, C. P. (2011). Metodologias de Investigação em Ciências Sociais e Huimanas: Teoria e Prática. Coimbra: Almedina. Decreto Lei nº 161/96 de 4 de Setembro. Diário da República nº205/96 - I Série - A. Ministério da Saúde. Lisboa. Fortin, M. F. (2009). Fundamentos e etapas do processo de investigação. Loures: Lusodidacta. Fuller, J. K. (2007). Instrumentación quirúrgica: Teoria, técnicas y procedimientos. Querétaro México: Editorial Medica Panamericna. Gefaell, C. V. (2007). Comunicación Terapéutica en Enfermería. Madrid: Difusión Avances de Enfermería. Gomes, F., Amendoeira, J., e Martins, M. (2012). A comunicação no processo terapêutico das familias de doentes mentais. Revista Portuguesa de Enfermagem de Saúde Mental, 7, 54-60. Acedido em http://issuu. com/spesm/docs/revistan_7_spesm_final Negreiros, P. D., Fernandes, M. D., Macedo-Costa, K. N., e Silva, G. R. (2010). Comunicação terapêutica entre enfermeiros e pacientes de uma unidade hospitalar. Revista Eletrônica de Enfermagem, 12(1), 120-132. Acedido em http://www.fen.ufg.br/revista/v12/n1/v12n1a15. htm Organização Mundial da Saúde (2008). Relatório Mundial de Saúde 2008: Cuidados de Saúde Primários Agora Mais que Nunca. Lisboa: Alto Comissariado da Saúde, Acedido em http://www.who.int/whr/2008/ whr08_pr.pdf Phaneuf, M. (2005). Comunicação, entrevista, relação de ajuda e validação. Loures: Lusociência. Pontes, A. C., Leitão, I. M., e Ramos, I. C. (2008). Comunicação terapêutica em enfermagem: Instrumento essencial do cuidado. Revista Brasileira de Enfermagem, 6(3), 312-318. Acedido em http://www.scielo.br/ pdf/reben/v61n3/a06v61n3.pdf Rubenfeld, M. G., & Scheffer, B. K. (1999). Raisonnement critique en soins infirmiers: Guide d’apprentissage. Paris: De Boeck Université s.a. Revista Portuguesa de Enfermagem de Saúde Mental, Nº 11 (JUN.,2014) | 37
Rulicki, S., & Cherny, M. (2007). Comunicación No Verbal: Como la inteligencia emocional se expressa a través de los gestos. Buenos Aires: Ediciones Granica, S.A. Stuart, G. W., & Laraia, M. T. (2006). Enfermería psiquiátrica: Principios y práctica (8ª ed.). Madrid: Elsevier España S. A.
Revista Portuguesa de Enfermagem de Saúde Mental, Nº 11 (JUN.,2014) | 38
Tamparo, C. T., & lindh, W. Q. (2008). Therapeutic Communication for Health Professionals (3ª ed.). New York: Delmar. Williams, C., & Davis, C. (2005). Therapeutic Interacton in Nursing. London: Jones and Bartlett Publishers Wold, G. H. (2013). Enfermagem Gerontológica (5ª ed.). São Paulo: Elsevier Editora Ltda.
6
COMPETÊNCIAS PARA O TRABALHO NA ÁREA DE REABILITAÇÃO PSICOSSOCIAL | Ana Sara Freitas Veloso1 |
RESUMO INTRODUÇÃO: A reabilitação psicossocial é um processo que visa à conquista de oportunidades para muitos utentes, promovendo a aceitação e a integração social. Neste contexto, os trabalhadores devem aprimorar as suas competências e introduzir mudanças neste processo de forma a desenvolver a sua formação e a alcançar os objetivos pretendidos. OBJETIVO: Esta investigação teve como objetivo identificar as competências necessárias dos trabalhadores em reabilitação–o psicossocial, do ponto de vista dos próprios trabalhadores. METODOLOGIA: A metodologia é descritiva e qualitativa. Como instrumento de recolha de dados foi utilizada uma entrevista semiestruturada, aplicada a 10 trabalhadores de um serviço de reabilitação psicossocial (Espaço T – Porto), durante o mês de fevereiro de 2013, na qual os dados foram tratados por análise de conteúdo. RESULTADOS: As categorias identificadas representam as competências adquiridas após a análise de dados: competência na resolução de novos problemas e situações complexas; competência comunicativa e relacional; competência para o trabalho em equipa; competências atitudinais; competência para a aprendizagem ativa e competências “reabilitadoras”, “resgatar no outro” o desempenho, autonomia, identidade e dignidade. Os trabalhadores ressalvaram que as competências devem ser adquiridas num processo dinâmico de construção, isto é, adquiridas e aprofundadas através da procura constante de novos e diversificados conhecimentos e competências. CONCLUSÕES: Verificou-se que as experiências vividas junto dos utentes é a principal fonte para a aquisição das competências desejadas, porque é através da prática que conseguem identificar os problemas, aplicar os seus conhecimentos e desenvolver estratégias de acordo com cada situação. PALAVRAS-CHAVE: Reabilitação psicossocial; Competências; Saúde mental
RESUMEN
ABSTRACT
“Competencias para trabajar en el área de rehabilitación psicosocial”
“Skills to work in the area of psychosocial rehabilitation”
INTRODUCCIÓN: Psicosocial rehabilitación es un proceso orientado a la conquista de oportunidades para muchos usuarios, la promoción de la aceptación y la integración social. En este contexto, los trabajadores deben mejorar sus habilidades e introducir cambios en este proceso con el fin de desarrollar su formación y lograr los objetivos deseados. OBJETIVO: Este estudio tuvo como objetivo identificar las competencias necesarias de los trabajadores en la rehabilitación psicosocial, desde el punto de vista de los propios trabajadores. METODOLOGÍA: La metodología es descriptiva y cualitativa. Como instrumento de recolección de datos se utilizo entrevistas individuales semiestructuradas a 10 empleados de un servicio de rehabilitación psicosocial (Espaço T – Porto), durante el mes de febrero de 2013, en la que los datos fueron tratados mediante el análisis de contenido. RESULTADOS: Las categorías identificadas representan las habilidades adquiridas después del análisis de los datos: la competencia en la solución de nuevos problemas y situaciones complejas; competencia comunicativa y relacional; competencia para trabajar en equipo; competência actitudinales; las competencias en activo y “rehabilitación” habilidades de aprendizaje, “para rescatar a los otros” rendimiento, autonomía, identidad y dignidad. Los trabajadores advirtieron que las habilidades deben ser adquiridas en un proceso dinámico de construcción, es decir, adquieren y se profundizaron a través de la constante búsqueda de conocimientos y habilidades nuevas y diversas. CONCLUSIONES: Se encontró que las experiencias entre los usuarios es la principal fuente para la adquisición de las habilidades deseadas, ya que es a través de la práctica que pueden identificar problemas, aplicar sus conocimientos y desarrollar estrategias en función de cada situación.
DESCRIPTORES: Rehabilitación psicosocial; Habilidades; Salud mental
INTRODUCTION: Psychosocial rehabilitation is a process aimed at the conquest of opportunities for many users, promoting acceptance and social integration. In this context, workers should enhance their skills and introduce changes in this process in order to develop their training and achieve the desired goals. OBJECTIVE: This study aimed to identify the skills required of workers in psychosocial rehabilitation, from the point of view of the workers themselves. METHODOLOGY: The methodology is descriptive and qualitative. As an instrument of data collection was used semi-structured interviews to 10 employees of a psychosocial rehabilitation service (Espaço T – Porto), during the month of February 2013, in which the data were treated by analysis of content. RESULTS: The identified categories represent the skills acquired after analyzing data: competence in solving new problems and complex situations; communicative and relational competence; competence to work in a team; attitudinal skills; competence for active and “rehabilitative” learning skills, “to rescue the other” performance, autonomy, identity and dignity. Workers cautioned that skills must be acquired in a dynamic process of construction, that is, acquired and deepened through the constant search for new and diverse knowledge and skills. CONCLUSIONS: It was found that the experiences among users is the main source for acquiring the desired skills, because it is through practice that can identify problems, apply their knowledge and develop strategies according to each situation.
KEYWORDS: Psychosocial rehabilitation; Skills; Mental health Submetido em 30-09-2013 Aceite em 30-05-2014
1 Enfermeira (sem afiliação institucional), Rua Cardeal Dom Américo, Bloco 13, Entrada 105, Casa 44, 4000-077 Porto, Portugal, veloso.anasara@hotmail.com Citação: Veloso, A. S. F. (2014). Competências para o trabalho na área de reabilitação psicossocial. Revista Portuguesa de Enfermagem de Saúde Mental (11), 39-44. Revista Portuguesa de Enfermagem de Saúde Mental, Nº 11 (JUN.,2014) | 39
INTRODUÇÃO
METODOLOGIA
Há muitos anos, os utentes que apresentavam algum défice ou “anormalidade” no seu comportamento eram discriminados, marginalizados, excluídos da sociedade e desvalorizados quanto à sua autonomia e independência. Sendo que a proposta de reabilitação psicossocial surge na contra corrente dessa realidade. Segundo Faro (2006, pág. 129) “A reabilitação é um processo de desenvolvimento de conhecimentos, habilidades e atitudes com os quais os pacientes possam viver com dependência mínima, para que se sintam capazes como seres humanos produtivos”, isto é através da reabilitação é possível que cada utente desenvolva habilidades e competências teórico/práticas que lhes possibilitem uma vida diária mais estável, tornando-os mais independentes e autônomos na realização das suas tarefas. A Coordenação Nacional para a Saúde Mental (2008), valoriza as intervenções reabilitadoras e refere que todas as pessoas com problemas de saúde mental têm o direito à qualidade nos cuidados de saúde, incluindo as que pertencem a grupos especialmente vulneráveis, devendo o plano de reabilitação promover e proteger os direitos humanos e reduzir o impacto das perturbações mentais, com o objetivo de contribuir para a promoção da saúde mental nas populações. As pessoas portadoras de alguma deficiência e com limitações na sua inserção social, só poderão ver cumpridos os seus objetivos através do seu esforço, mas também se tiverem uma equipa que os acompanhe, apoie e os ajude através das suas competências, a alcançar uma etapa positiva, com adaptação e reinserção social, de acordo com as suas necessidades. Segundo Babinsk e Hirdes (2004) para o trabalho em reabilitação psicossocial num novo paradigma é necessário que os profissionais estejam comprometidos com uma nova abordagem ao doente mental. Desta forma, surge a necessidade de compreender a dinâmica dos trabalhadores de reabilitação, os seus objetivos e as suas competências, a fim de contribuir para a formação destes trabalhadores e para uma melhoria na qualidade da reabilitação dos utentes. Neste sentido, propusemos como objetivo principal deste estudo, identificar as competências necessárias para o trabalho em reabilitação psicossocial do ponto de vista dos próprios trabalhadores.
Para alcançar o objetivo proposto utilizamos o método descritivo, exploratório, inserido num paradigma qualitativo, uma vez que se pretendeu compreender as competências dos trabalhadores de reabilitação psicossocial, através das suas opiniões e experiências partilhadas. O local escolhido para a realização deste estudo foi o Espaço T, uma instituição de reabilitação situada na cidade do Porto, que presta apoio à integração social e comunitária, com o fim de combater a pobreza, a exclusão social e de apoiar as pessoas com dificuldades bio-psico-sociais. Foi utilizado como instrumento de recolha de dados a entrevista semiestruturada, aplicada a 10 elementos, indicados pelo Diretor do serviço. Portanto, a amostra foi constituída de forma intencional e por saturação, sendo utilizado como critério de inclusão o desenvolvimento de uma prática direta junto do utente, com o objetivo de reabilitação. Assim, neste estudo, os entrevistados foram denominamos de trabalhadores, com formações diversas (90% deles com o curso superior) e não representam uma categoria profissional específica. As entrevistas foram realizadas no mês de fevereiro de 2013 após a obtenção do consentimento livre e informado e gravadas em aparelho áudio para garantir uma melhor precisão das informações. Os dados recolhidos foram transcritos cuidadosamente e foram tratados através da análise de conteúdo, cujas as categorias são apresentadas de seguida.
Revista Portuguesa de Enfermagem de Saúde Mental, Nº 11 (JUN.,2014) | 40
RESULTADOS Os trabalhadores de reabilitação psicossocial idealmente, devem respeitar e corresponder com as necessidades de cada utente auxiliando-os durante o seu tratamento e na sua integração na sociedade. Desta forma, é essencial desenvolver atividades que lhes permitam sociabilizar e interagir com os outros e também permitir que se tornem mais independentes nas atividades da vida diária. Partindo deste princípio, procuramos conhecer quais são as competências que estes trabalhadores apresentaram como importantes para o desenvolvimento deste trabalho.
Os resultados serão apresentados e discutidos a seguir, através das categorias que emergiram da análise de conteúdo e que representam as principais competências manifestadas pelos trabalhadores em reabilitação psicossocial, do ponto de vista dos próprios trabalhadores: • Competência na resolução de novos problemas e situações complexas; • Competência comunicativa e relacional; • Competência para o trabalho em equipa; • Competências atitudinais; • Competências para a aprendizagem ativa; • Competências “reabilitadoras”: “resgatar no outro” desempenho, autonomia, identidade e dignidade. DISCUSSÃO Competência na Resolução de Novos Problemas e Situações Complexas Num trabalho complexo e dinâmico, os trabalhadores de reabilitação psicossocial, devem desenvolver as suas competências para se adaptarem e lidarem com novas situações, procurando uma resolução adequada para cada situação. Neste sentido, a flexibilidade foi destacada pelos entrevistados, como uma das características essenciais na resolução de novos problemas. Ser flexível, é possuir a capacidade de aceitar a realidade sem criar barreiras, é ter uma mente aberta a novas soluções, é ser criativo e adaptar-se a trabalhar de diferentes formas (Hasselmann, 2009). As expressões seguintes ilustram a flexibilidade e a capacidade de adaptação valorizada pelos trabalhadores: “É sempre diferente, nunca é igual, nós chegamos cá contatamos com realidades diferentes e essas realidades mudam de dia para dia.” (E1) “Há um trabalho bastante polivalente e acabamos por ir adaptando o trabalho às necessidades.” (E4) Segundo Martins, Kobayashi, Ayoub, e Leite (2006), os movimentos e as transformações que ocorrem no trabalho, trazem conflitos e desafios que devem ser enfrentados, utilizando a flexibilidade nos diversos papéis profissionais de equipa e nas ações diárias. As frases abaixo fazem referência a competência identificada: “Eu atendo aqui todo o tipo de pessoas, portanto os dias vão variando.” (E5) “Ao longo das aulas não tenho sempre o mesmo sistema, tento sempre adaptar a cada pessoa.” (E9) Foi possível identificar esta categoria na maioria das expressões dos trabalhadores, porque valorizam esta competência para a resolução de novos problemas, destacando o interesse e a flexibilidade como necessários para o trabalho desenvolvido no processo de reabilitação, especialmente para encontrar estratégias adaptativas.
Competência Comunicativa e Relacional Segundo Silva (2011), o trabalho dos profissionais está baseado nas relações humanas que se estabelece. A comunicação é base de tudo para criar uma boa relação terapêutica, sendo um dos métodos mais utilizados para emitir, transmitir e capturar as informações. Das entrevistas realizadas, pode-se constatar que os trabalhadores de reabilitação destacam a relação e a comunicação, como o grande elo para desenvolver uma boa interação com os utentes: “Gosto de ensinar, transmitir conhecimentos, comunicar com eles, conhecer novas realidades, porque nestas formações contactamos com todo o tipo de gente.” (E10) “Gosto da convivência com eles e de estar com eles a conversar.” (E1) “Gosto da relação que se estabelece com os alunos e quando sinto que as pessoas estão a gostar.” (E8) De acordo com o que foi mencionado, a comunicação é fundamental na reabilitação psicossocial, porque para além de permitir que a pessoa exponha os seus problemas, é uma das formas que os reabilitadores utilizam para compreende-los e adaptar estratégias que vão ao encontro das suas necessidades. De acordo com Deslandes e Mitre (2009), a comunicação procura um consenso que se baseia numa troca ativa e pacífica de informações entre os utentes e os profissionais. O exercício da compreensão envolve um processo ativo e de construção que procura significados e interpretações. Os trabalhadores do Espaço T, referem uma boa capacidade de comunicação, mas também interesse em manter uma boa relação com os utentes, porque acreditam que para além de facilitar o processo de reabilitação, também lhes permitem adquirir outros conhecimentos e valores com a relação que estabelecem. Competência para o Trabalho em Equipa Segundo Crevelim e Peduzzi (2005), o trabalho em equipa é um trabalho coletivo, que estabelece uma relação recíproca entre as intervenções técnicas e a interação dos profissionais. Assim sendo, é possível coordenar os planos de ação utilizando a comunicação e a empatia, de forma a corresponder com todas as necessidades da equipa. Trabalhar em equipa torna-se uma das competências mais importantes na reabilitação psicossocial, porque para alcançarem um objetivo comum, necessitam de trabalhar em conjunto. Esta ligação proporciona vantagens não só para cada elemento, como também para os utentes, porque trabalham todos para a mesma finalidade e na presença de algum problema, existe uma resolução mais eficaz. Revista Portuguesa de Enfermagem de Saúde Mental, Nº 11 (JUN.,2014) | 41
Nos resultados obtidos neste estudo, denota-se que a ligação entre os elementos da equipa significa um fator importante em todo o processo da reabilitação psicossocial: “Em equipa trabalho sempre, é assim o trabalho social, implica trabalhadores em equipa, e eu não faço um trabalho isolado, nunca poderei fazer (...) estamos os dois a trabalhar nesses planos...está também a trabalhar o colega do outro lado.” (E2) “Nós trabalhamos em equipa (…) temos sempre interrelações, só assim é que funciona.” (E3) Segundo Araújo e Rocha (2007, p 456) “o trabalho em equipe tem como objetivo a obtenção de impactos sobre os diferentes fatores que interferem no processo “saúde-doença”, sendo que esta prática possibilita ao profissional reconstruir-se na prática do outro e realizar uma intervenção na realidade em que estão inseridos”. As citações seguintes manifestam a valorização das relações estabelecidas entre os elementos da equipa: “Aqui o trabalho é sempre feito em equipa, porque as pessoas chegam e precisam de vários apoios (…) eu aqui sinto-me um bocado como irmãos, são pessoas que eu conheço muito bem.” (E5) “Sinto que aprendo diariamente com todos e para mim isso é muito gratificante.” (E10) Os trabalhadores entrevistados reconhecem ganhos com o trabalho em equipa, como as novas aprendizagens, além de ser possível verificar que existe conforto por se integrarem na equipa em questão. Competências Atitudinais Associadas às competências profissionais, estes trabalhadores valorizam certas características pessoais que acabam por influenciar o seu trabalho na reabilitação. De certa forma, apresentam um perfil profissional que consideram importante para que se obtenha mais rendimento e aproximação dos objetivos a que se propõem. Segundo Martins, Kobayashi, Ayoub, e Leite (2006), o profissional é um agente de transformação de conhecimentos, habilidades e atitudes, em competências entregues à organização, ressaltando o entendimento de agregação de forma a melhorar o processo e atingir as metas pertendidas. Algumas transcrições a seguir ilustram as características pessoais que se destacaram nos trabalhadores: “Tu tens desafios novos que queres encarar, que queres abraçar e tu próprio os crias. É engraçado e motivador tu teres que resolver os problemas diariamente.” (E2)
Revista Portuguesa de Enfermagem de Saúde Mental, Nº 11 (JUN.,2014) | 42
Os profissionais revelam empenho, dedicação, responsabilidade, colaboração e aceitação de novos desafios como importantes características no desenvolvimento dos projetos. Demonstram interesse na visualização social positiva do trabalho que é elaborado pela equipa e pelos utentes. As citações que se seguem ilustram estas afirmações: “O que eu gostava mesmo era que a cidade perceba que aqui se tenta fazer um trabalho honesto, sincero e diferente.” (E5) “É lutar por um objetivo comum, porque muitas pessoas são desprezadas e parece que o mundo está contra tudo isso.” (E9) “Estou disposta a novos desafios.” (E10) Os trabalhadores entrevistados parecem acreditar que o desempenho profissional também recebe interferências das características pessoais e atitudinais que cada um apresenta. Demonstram que para reabilitar é necessário desenvolver competências e perfis especiais. Além disso, os entrevistados manifestaram satisfação com as competências e características atitudinais que apresentam no desenvolvimento do trabalho em reabilitação. Competências para a Aprendizagem Ativa Segundo Leite e Costa (2007), a gestão do conhecimento desenvolve o ambiente das organizações mas também acaba por desevolver o conhecimento científico. O conhecimento deve ser construído pelo esforço, pela investigação e também quando surgem dúvidas que necessitam de ser esclarecidas. Ao longo da vida é necessário aprofundar as habilidades, para que desta forma se consiga superar os conflitos, as ideias inaqueadas e reorganizar o pensamento de acordo com as nossas acções. Ser ativo implica estar presente em formações, adquirir conhecimentos diariamente com experiências ou outras situações, ou seja, é reaproveitar e utilizar todas as vivências para se adaptar e preparar para as transformações que vão ocorrendo ao longo da vida. Segundo Hesbeen (2003), os profissionais de reabilitação psicossocial devem ter uma formação de base, que passe por três etapas (1º etapa: ser generalista; 2º etapa: aquisição de conhecimentos e aptidões especializadas; 3º etapa: prática de cuidados). Em reabilitação é importante dar continuidade a formação básica e a formação especializada, porque o ser humano está em constante mudança, assim sendo, cada profissional, deve constantemente adquirir novos saberes e aptidões.
Os resultados obtidos nas entrevistas deste estudo vêm ao encontro destas afirmações, sendo que os trabalhadores demonstram ter a necessidade de se atualizarem, conforme se verifica nas seguintes expressões: “A experiência é que me vai fazendo, vai-nos dando os conhecimentos e depois é um pouco, a pessoa ter de ser autodidata, tem que se pegar nos livros e dar uma vista de olhos tirando informações.” (E1) “Estou sempre a receber formações, ou tu estagnas ou então realmente te empenhas e investes em ti, mas isso é constante, não podes parar se não depois ficas para trás.” (E2) “Eu pessoalmente sempre procurei formação paralela (...) eu acho que não há um único ano em que eu não tenha um pequeno curso.” (E4) É evidente o interesse dos entrevistados na aquisição e atualização de conhecimentos como uma forma de aprimorar as suas competências e consequentemente, o atendimento prestado. Competências “Reabilitadoras”: “Resgatar no Outro”, Desempenho, Autonomia, Identidade e Dignidade Segundo Hesbeen (2003), a competência diz respeito à capacidade que o profissional tem em se organizar e prestar cuidados numa dada situação, desta forma, os profissionais devem de organizar o seu trabalho e estabelecer prioridades e estratégias, intervindo de forma individualizada com cada utente, para que seja possível que ele desenvolva os seus objetivos e que se torne reinserido na sociedade. Neste estudo, foi possível identificar um conjunto de ações específicas da reabilitação, que exigem competências igualmente específicas para a realização dos objetivos e da missão do serviço de reabilitação (Espaço T), assim sendo, ilustram-se algumas citações dos trabalhadores que refletem estas competências: “Nós cá, temos uma missão de, primeiro, proporcionar a eles alguns momentos de compreensão, de que se sintam bem, de que aprendam a viver em sociedade (...) que entrem na vida ativa, não é que seja fácil, mas esse é sempre o objetivo.” (E1) “É dotar as pessoas de competências pessoais, sociais, que elas também adquirem nas actividades.” (E2) Ao apresentarem as competências “reabilitadoras”, eles justificam o próprio objetivo do seu trabalho e a missão do serviço de reabilitação, ou seja, estão a reabilitar os utentes numa vertente psicossocial para a vida. Os excertos abaixo ilustram estas afirmações:
“Objetivo principal é a promoção e a integração de um conjunto muito diferenciado de pessoas, é promover uma mudança social, a aceitação da diferença... no fundo é ajudar por um lado a integração das pessoas, por outro lado à sensibilização da comunidade para a aceitação dos mesmos.” (E3) “Reabilitar-se e, por outro lado, fazer com que a sociedade também as aceite na sua diferença.” (E5) “Permitir que as pessoas aumentem os seus conhecimentos e que isso também lhes seja útil para utilizarem no dia-a-dia e sem dúvida a integração de todos.” (E8) “Permitir a integração de todos na sociedade (...) e reaprender outras competências.” (E9) “É reabilitar as pessoas sem as rotular pelas características que apresentam; todos nós temos direito a igualdade.” (E10) As competências “reabilitadoras”, para os entrevistados, significam respeitar os direitos dos indivíduos, não discriminar, oferecer oportunidades, integrar, aceitar as diferenças, entre outros aspectos, que representam o objetivo do próprio trabalho em reabilitação. CONCLUSÕES Os serviços de reabilitação psicossocial podem contribuir positivamente para a qualidade de vida dos portadores de doenças mentais e para a sociedade como um todo. Neste sentido, estes serviços revestem uma importância fundamental e merecem uma atenção especial. Por reconhecer tal importância, pretendeu-se com o estudo das competências, contribuir no âmbito da formação dos trabalhadores e da constituição de equipas mais adequadas para o trabalho em reabilitação psicossocial. Desta forma, foi possível conhecer as competências que os próprios trabalhadores consideram necessárias para o trabalho e compreender que devem de ser adquiridas num processo dinâmico e de construção, ou seja, aprofundadas através de uma procura constante de novos e diversificados conhecimentos, dando relevância a todas as suas experiências. Após a realização deste estudo, consideramos que os profissionais reconhecem a importância do domínio dos conhecimentos específicos que resultam da sua formação, treinamento e experiência, uma vez que indicam as competências necessárias para o exercício de funções reabilitadoras. Verificou-se que as experiências vividas junto dos utentes é a principal fonte para a aquisição das competências desejadas, porque é através da prática que conseguem identificar os problemas, aplicar os conhecimentos e desenvolver estratégias de acordo com cada situação. Revista Portuguesa de Enfermagem de Saúde Mental, Nº 11 (JUN.,2014) | 43
O principal contributo deste estudo será na área de formação dos profissionais para atuarem na área de reabilitação. Acreditamos que a adequação da formação possibilitará uma atuação profissional mais qualificada e com maiores possibilidades de resultados positivos na reintegração social e também de forma a contribuir para um estudo continuado na área de saúde mental e reabilitação.
Deslandes, S. F., e Mitre, R. M. (2009). Processo comunicativo e humanização em saúde. Acedido Junho 25, 2013, em http://www.scielo.br/scielo.php?pid=S141432832009000500015&script=sci_arttext
REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS
Hasselmann, J. A. (2009). Flexibilidade para se moldar ao mercado. Acedido Junho 19, 2013, em http://www. weg.net/files/weg-em-revista/WR-57.pdf
Araújo, M. B., e Rocha, P. M. (2007). O trabalho em equipe: Um desafio para a consolidação da estratégia de saúde da família. Ciência & Saúde Coletiva, 12(2), 455-464. Babinski, T., e Hirdes, A. (2004). Reabilitação psicossocial: A perspectiva de profissionais de centros de atenção psicossocial do Rio Grande do Sul. Texto & Contexto-Enfermagem, 13(4), 568-576. Comissão Nacional para Reestruturação dos Serviços de Saúde Mental (2007). Relatório – Proposta de Plano de Acção para a Reestruturação e Desenvolvimento dos Serviços de Saúde Mental em Portugal. Acedido Junho 20, 2013, em http://www.saudemental.pt/wp-content/ uploads/2011/02/relatorioplanoaccaoservicossaude mental.pdf Crevelim, M. A., e Peduzzi, M. (2005). A participação da comunidade na equipe de saúde da família: Como estabelecer um projeto comum entre trabalhadores e usuários? Ciência & Saúde Coletiva, 10(2), 323-331
Revista Portuguesa de Enfermagem de Saúde Mental, Nº 11 (JUN.,2014) | 44
Faro, A. C. (2006). Enfermagem em reabilitação: Ampliando os horizontes, legitimando o saber. Acedido Fevereiro 12, 2013, em http://www.scielo.br/pdf/reeusp/ v40n1/a18v40n1.pdf
Hesbeen, W. (2003). A reabilitação: Criar novos caminhos. Loures: Lusociência. Leite, F. C., e Costa, S. M. (2007). Gestão do conhecimento científico: Proposta de um modelo conceitual com base em processos de comunicação científica. Acedido Junho 24, 2013, em http:// www.scielo.br/scielo.php?script=sci_arttext&pid =S0100-19652007000100007 Martins, C., Kobayashi, R. M., Ayoub, A. C., e Leite, M. M. (2006). Perfil do enfermeiro e necessidades de desenvolvimento de competência profissional. Acedido Maio 10, 2013, em http://www. scielo.br/scielo.php?script=sci_arttext&pid=S010407072006000300012&lang=pt Silva, M. L. (2011). Reabilitação psicossocial, um dispositivo da reforma psiquiátrica brasileira. Acedido Junho 4, 2013, em http://bibliodigital.unijui.edu. br:8080/xmlui/bitstream/handle/123456789/835
7
AVALIAÇÃO DAS PROPRIEDADES PSICOMÉTRICAS DO QUESTIONÁRIO DE SAÚDE MENTAL POSITIVA EM ESTUDANTES PORTUGUESES DO ENSINO SUPERIOR | Carlos Sequeira1; José Carlos Carvalho2; Francisco Sampaio3; Luís Sá4; Teresa Lluch-Canut5; Juan Roldán-Merino6 |
RESUMO CONTEXTO: A Saúde Mental é referida como um estado de funcionamento ideal do ser humano, o que sublinha a importância de promover as qualidades da pessoa na otimização de seu potencial. Os estudantes do ensino superior precisam de alcançar resultados positivos na esfera académica e pessoal, pelo que a sua Saúde Mental será vital neste processo de transição. OBJETIVOS: Avaliar as propriedades psicométricas do Questionário de Saúde Mental Positiva nos estudantes do Ensino Superior. METODOLOGIA: Estudo metodológico, para tradução e validação para a população portuguesa do Questionário de Saúde Mental Positiva. A amostra foi constituída por 942 estudantes de uma instituição do ensino superior. Os dados foram recolhidos através de uma plataforma online. Foi realizada a tradução do Questionário de Saúde Mental Positiva para português, seguindo-se a sua retroversão para espanhol. RESULTADOS: O Questionário de Saúde Mental Positiva revelou-se um instrumento com muito boa consistência interna (α Cronbach=0,92), com uma estrutura fatorial semelhante ao estudo original (Espanha), composta por seis fatores, todos eles com consistência interna variando entre 0,60 e 0,84. O instrumento apresenta uma boa estabilidade (avaliada através do teste-reteste realizado com um intervalo de dois meses) – 0,98. CONCLUSÕES: Os resultados sugerem que o Questionário de Saúde Mental Positiva é um instrumento fiável e de fácil utilização em estudantes do Ensino Superior. Este estudo fornece evidência para a fidelidade, validade de conteúdo, e validade de critério do instrumento. PALAVRAS-CHAVE: Questionário; Saúde Mental; Estudantes; Enfermagem
RESUMEN
ABSTRACT
“Evaluación de las propiedades psicométricas del Cuestionario de Salud Mental Positiva en estudiantes portugueses de educación superior”
“Evaluation of the psychometric properties of the Positive Mental Health Questionnaire in Portuguese higher education students”
CONTEXTO: La Salud Mental, que se conoce como un estado de funcionamiento óptimo del ser humano, hace hincapié en la importancia de promover las cualidades de la persona en la optimización de su potencial. Los estudiantes de educación superior necesitan conseguir resultados positivos en el ámbito académico y personal, por lo que su salud mental será vital en este proceso de transición. OBJETIVOS: Evaluar las propiedades psicométricas del Cuestionario de Salud Mental Positiva en estudiantes de educación superior. METODOLOGÍA: Estudio exploratorio, en el que se lleva a cabo la traducción y adaptación para la población portuguesa del Cuestionario de Salud Mental Positiva. La población estuvo constituida por todos los alumnos de una institución de educación superior. Los datos fueron recogidos a través de una plataforma online utilizando el Cuestionario de Salud Mental Positiva y el Inventario de Salud Mental. Se realizó la traducción del Cuestionario de Salud Mental Positiva para los portugueses, seguida de su retro traducción al español. RESULTADOS: El Cuestionario de Salud Mental Positiva resultó ser un instrumento fiable con una buena consistencia interna (alfa de 0,92) con una estructura factorial similar a la del estudio original (España), con seis factores, todos con consistencia interna que variaban de 0,60 a 0,84. El instrumento tiene una buena estabilidad (evaluada con recurso al test-retest realizado con un intervalo de dos meses) – 0,98. CONCLUSIONES: Los resultados muestran que el Cuestionario de Salud Mental Positiva es un instrumento fiable de usar para los estudiantes de educación superior. Este estudio proporciona evidencia de la validez de contenido, validez de criterio y una buena consistencia interna.
DESCRIPTORES: Cuestionario; Salud Mental; Estudiantes; Enfermería
BACKGROUND: Mental health is referred as a state of optimal functioning of the human being, which emphasizes the importance of promoting the qualities of the person in optimizing their potential. Students in higher education need to achieve positive results in academic and personal sphere, so their mental health will be vital in this transition process. AIM: To evaluate the psychometric properties of the Positive Mental Health Questionnaire in higher education students. METHODS: A methodological study, for translation and validation for the Portuguese population of the Positive Mental Health Questionnaire. The sample consisted of 942 students from an institution of higher education. Data were collected through an online platform. The translation of the Positive Mental Health Questionnaire to Portuguese was performed, followed by the retroversion to Spanish. RESULTS: The Positive Mental Health Questionnaire proved to be an instrument with very good internal consistency (Cronbach α=0.92), with a factorial structure similar to the original study (Spain), composed by six factors, all of them with internal consistency ranging from 0.60 and 0.84. The instrument presents a good test-retest reliability (performed with an interval of two months) – 0.98. CONCLUSIONS: The results suggest that the Positive Mental Health Questionnaire is a reliable and easy to use tool for higher education students. This study provides evidence for the fidelity, content validity, and criterion validity of the instrument.
KEYWORDS: Questionnaire; Mental Health; Students; Nursing Submetido em 30-03-2014 Aceite em 31-05-2014
1 Doutor em Ciências de Enfermagem; Professor Coordenador na Escola Superior de Enfermagem do Porto, 4200-072 Porto, Portugal, carlossequeira@esenf.pt 2 Doutor em Ciências de Enfermagem; Professor Adjunto na Escola Superior de Enfermagem do Porto, 4200-072 Porto, Portugal, zecarlos@esenf.pt 3 MSc em Enfermagem de Saúde Mental e Psiquiatria; Doutorando em Ciências de Enfermagem no ICBAS; Enferm. no Hosp. de Braga, francisco.sampaio@hospitaldebraga.pt 4 Doutor em Saúde Mental; Professor Auxiliar na Universidade Católica Portuguesa, Instituto de Ciências da Saúde, 4200-072 Porto, Portugal, lsa@porto.ucp.pt 5 Doctora en Psicología; Catedrática de Enfermería Psicosocial y Salud Mental en la Universidad de Barcelona – Escuela d’ Enfermería, España, tlluch@ub.edu 6 Doctor en Ciencias de Enfermería; Profesor Titular en la Escuela Universitaria de Enfermería Sant Joan de Déu, Barcelona, España, JRoldan@santjoandedeu.edu.es Citação: Sequeira, C., Carvalho, J. C., Sampaio, F., Sá, L., Lluch-Canut, T., & Roldán-Merino, J. (2014). Avaliação das propriedades psicométricas do Questionário de Saúde Mental Positiva em estudantes portugueses do ensino superior. Revista Portuguesa de Enfermagem de Saúde Mental (11), 45-53. Revista Portuguesa de Enfermagem de Saúde Mental, Nº 11 (JUN.,2014) | 45
INTRODUÇÃO A saúde é o bem mais precioso que as pessoas tentam preservar ao longo do seu ciclo de vida. A saúde é, também, um fenómeno com forte componente social, psicológico, mental, espiritual e físico. Numa perspetiva transcultural, é quase impossível definir Saúde Mental de uma forma completa. Concorda-se quanto ao facto de que Saúde Mental é algo mais do que a ausência de distúrbios mentais. É importante compreender a Saúde Mental e, de modo mais geral, o funcionamento mental, porque daí advém a base sobre a qual se formará uma compreensão mais completa do desenvolvimento dos distúrbios mentais e comportamentais. A Saúde Mental é determinada pela inter-relação de fatores físicos, ambientais, sociais, psicológicos e espirituais, e é parte integrante de todo o desenvolvimento humano. A maioria das abordagens da saúde mental, sob o ponto de vista da investigação, tem privilegiado o estudo de psicopatologia, com base na existência de sinais e sintomas, em vez do estudo das qualidades que podem proteger as pessoas com problemas de Saúde Mental. Na sociedade atual a maioria das pessoas vive sujeita a uma elevada sobrecarga de stress quotidiano devido, em grande parte, ao estilo de vida adotado, no qual a competição é por vezes o principal denominador. Esta semelhança é também uma realidade nos estudantes do Ensino Superior, que são alvos de inúmeras pressões, desde a separação física dos pais, à exigência do ensino, à adaptação a uma nova etapa (amigos, meio físico, entre outros.), bem como à necessidade de corresponder às expetativas depositadas sobre eles. A ansiedade constitui uma variável que interfere com o desempenho dos estudantes que lidam com situações stressantes que, em regra, maximiza os sentimentos de insegurança e opressão intrínsecos ao papel do estudante. Estes fatores podem ser percecionados de forma positiva (bem-estar psicológico) ou de forma negativa (distress psicológico) quando não se verifica uma adequada adaptação (Sequeira, 2006). O ingresso no Ensino Superior associa-se a um processo de transição que necessita de ser bem nutrido, com conteúdos e apoios, de modo a contribuir para o sucesso e a evitar a insatisfação/morbilidade. O período letivo está recheado de fontes de stress (frequências, avaliações, ensinos clínicos, competitividade, as notas para ingresso no mundo laboral, entre outros.) que exigem dos estudantes a robustez necessária para transformar o possível distress em eustress. Revista Portuguesa de Enfermagem de Saúde Mental, Nº 11 (JUN.,2014) | 46
Em termos positivos, entende-se a Saúde Mental como um estado de funcionamento ótimo do ser humano, no qual a promoção das qualidades da pessoa para otimizar o seu potencial é fundamental (Lluch, 2002, 2003). Entende-se a Saúde Mental Positiva como um estado de funcionamento ótimo do ser humano, o que salienta a importância da promoção das qualidades da pessoa na otimização do seu potencial. Desde esta perspetiva positiva, a Organização Mundial de Saúde (OMS) tem definido a Saúde Mental como um estado de bem-estar, na qual os indivíduos reco¬nhecem as suas habilidades, são capazes de enfrentar o stress normal do dia-a-dia, trabalhar de forma produtiva e contribuir para a sua comu¬nidade (Herman, Saxena, & Moodie, 2005). A avaliação dos aspetos positivos da Saúde Mental constitui-se como um recurso determinante para a promoção da saúde das pessoas, privilegiando-se um modelo de Saúde Mental Positiva, em detrimento de um modelo centrado na doença (Barry, 2009; Lluch in Fornes y Gómez, 2008). A Saúde Mental Positiva pode ser definida como um valor em si (sentir-se bem) ou como uma capacidade para perceber, compreender e interpretar o meio, para se adaptar e alterá-lo, se necessário, para pensar e comunicar com os outros (Lehtinen, 2004). Os investigadores da área da Saúde Mental têm manifestado muito interesse na forma como a saúde pode ser influenciada pelas dimensões positivas das experiências (integração social, autoeficácia, controle percebido entre outros). Nos últimos anos, os conceitos da Saúde Mental Positiva (efeito positivo, bem-estar, benefício) têm tido uma valorização crescente na investigação em saúde. Numa perspetiva salutogénica, as variáveis promotoras de Saúde Mental assumem uma importância acrescida, na qual se entende a Saúde Mental como indicador de integração e adaptação (Sequeira, 2006). A necessidade deste estudo surgiu pela constatação da inexistência de instrumentos validados na população portuguesa que avaliem o potencial humano protetor no adoecer mental e a resiliência mental. Este estudo tem como objetivo avaliar as propriedades psicométricas do Questionário de Saúde Mental Positiva (QSM+) na população portuguesa. Pretende-se que esta seja um instrumento de avaliação que permita identificar os estudantes que apresentam um menor risco de morbilidade psiquiátrica. Trata-se de um instrumento fundamental para que se possa intervir de forma precoce, evitando o aparecimento de determinadas problemáticas como a depressão e a ansiedade, ou minorando as suas complicações.
METODOLOGIA Procedimentos O QSM+ foi desenvolvido por Lluch (2002, 2003), tendo sido construído sobre a operacionalização dos critérios de Saúde Mental Positiva de Jahoda (1958). A autora, através de uma investigação inicial (Lluch, 1999, 2002) propõe um Modelo Multifatorial de Saúde Mental Positiva configurado por seis fatores, algo diferentes dos critérios iniciais formulados por Jahoda. Os fatores propostos por Lluch (1999, 2003) e que configuram a estrutura fatorial do QSM+ estão descritos na tabela 1. Tabela 1 - Fatores e Pontuações do Questionário de Saúde Mental Positiva Fatores
Nº Itens *
Pontuação mínima/ máxima
Definição
F1: Satisfação Pessoal
4, 6, 7, 12, 14, 31, 38 e 39
8 /32
- Autoconceito / Autoestima - Satisfação com a vida pessoal - Perspetiva otimista de futuro
F2: Atitude Pró-social
1, 3, 23, 25 e 37
5 /20
- Predisposição ativa para o social / para a sociedade - Atitude social “altruísta” / Atitude de ajuda-apoio para com os outros - Aceitação dos outros e dos factos sociais diferentes
F3: Autocontrolo
2, 5, 21, 22 e 26
5 /20
- Capacidade para el enfrentamento do stress / de situações conflituosas - Equilíbrio emocional / controlo emocional - Tolerância à frustração, à ansiedade e ao stress
F4: Autonomia
10, 13, 19, 33 e 34
5 /20
- Capacidade para ter critérios próprios - Independência - Autorregulação da própria conduta - Segurança pessoal / Confiança em si mesmo
F5: Resolução de Problemas 15, 16, 17, 27, y Realização pessoal 28, 29, 32, 35 e 36
9 /36
- Capacidade de análise - Habilidade para tomar decisões - Flexibilidade / capacidade para adaptar-se às mudanças - Atitude de crescimento e desenvolvimento pessoal continuo
F6: Habilidades de Relação Interpessoal
7 /28
- Habilidade para estabelecer relaciones interpessoais - Empatia / capacidade para entender os sentimentos dos outros - Habilidade para dar apoio emocional - Habilidade para estabelecer e manter relações interpessoais íntimas
Total dos itens
8, 9, 11, 18, 20, 24 e 30
39/156
*Estão enunciadas de forma positiva as questões: 4, 5, 11, 15, 16, 17, 18, 20, 21, 22, 23, 25, 26, 27, 28, 29, 32, 35, 36, 37. As restantes estão enunciadas de forma negativa. Nota. adaptado de Lluch in Fornes y Gómez (2008).
O QSM+ foi traduzido para português (duas traduções independentes), a partir da sua versão original espanhola, sendo criada uma versão de consenso, que posteriormente foi alvo de um processo inverso (retroversão e avaliação da retroversão. A retroversão do questionário foi feita por um enfermeiro doutorado em Saúde Mental e por um professor de Inglês bilingue. Foram analisados os aspetos convergentes/divergentes com cinco investigadores, dos quais três são doutorados em Saúde Mental e dois em Psicologia. Este foi um processo simples, uma vez que este instrumento se encontra validado em Espanha, país com algumas semelhanças linguísticas e até mesmo culturais relativamente a Portugal.
Seguidamente procedeu-se à análise do conteúdo dos itens, por um grupo de peritos (três psiquiatras, três enfermeiros especialistas em Enfermagem de Saúde Mental, um psicólogo clínico, e um antropólogo – todos doutorados – e um professor de Inglês bilingue). Finalmente, foi realizado um pré-teste para avaliar eventuais dificuldades na aplicação do instrumento, um estudo-piloto, e a aplicação do mesmo num estudo de maior dimensão amostral, para avaliar as suas propriedades psicométricas. O QSM+ trata-se de um questionário que contém uma série de afirmações, sobre a forma de pensar, sentir e agir, apresentando 39 questões agrupadas em seis dimensões, de acordo com a tabela1. Revista Portuguesa de Enfermagem de Saúde Mental, Nº 11 (JUN.,2014) | 47
O questionário está cotado numa escala de Likert de 1 a 4 pontos, de acordo com as seguintes possibilidades de resposta: sempre ou quase sempre (1 ponto), na maioria das vezes (2 pontos), algumas vezes (3 pontos), raramente ou nunca (4 pontos). Estudo-Piloto O estudo-piloto teve por objetivo obter informação, de modo a fazer o ajustamento da versão preliminar do QSM+ em função da população-alvo na qual seria aplicado. Este estudo incidiu numa amostra de 120 estudantes do ensino superior de uma instituição de Ensino Superior de Portugal (Sequeira & Carvalho, 2009). Em termos de propriedades psicométricas, os resultados preliminares sugerem um instrumento com caraterísticas muito semelhantes à versão espanhola. Verificou-se que o QSM+ apresenta uma boa consistência interna (α Cronbach=0,92). Através da análise fatorial identificaram-se seis fatores, à semelhança da versão original: satisfação pessoal; atitude pró-social; autocontrolo; autonomia; capacidade de resolução de problemas e realização pessoal; habilidades de relação interpessoal. Posteriormente, colocou-se uma informação online, de modo a que os estudantes que preencheram o QSM+ se pudessem inscrever para uma entrevista sobre o instrumento, com o limite máximo de 10 inscritos. Daqui resultou uma subamostra de 10 estudantes aos quais se efetuou uma entrevista, com o propósito de avaliar a perceção dos mesmos sobre o QSM+. A opinião generalizada dos estudantes foi de que se trata de um instrumento de fácil resposta, com questões compreensivas e direcionadas para o contexto em estudo. Participantes A população em estudo foram os estudantes de uma instituição do ensino superior de Portugal, a partir da qual se selecionou uma amostra não probabilística acidental. A Amostra foi constituída por 942 estudantes (obtida a partir de uma população de 4000 estudantes – taxa de adesão de 24%). Foi enviado a cada estudante um link com o questionário através do qual, após ler o consentimento informado e validar a sua participação voluntária no estudo, procedeu ao seu preenchimento. Os questionários dispunham de um texto introdutório, explicando os objetivos e a finalidade do estudo, o consentimento informado e a aceitação da participação no mesmo, sendo preenchidos numa base online, sem qualquer possibilidade de identificação dos inquiridos, entre 2011 e 2012. Revista Portuguesa de Enfermagem de Saúde Mental, Nº 11 (JUN.,2014) | 48
Instrumentos O instrumento utlizado era constituído por três partes: a) Questionário com questões sociodemográficas – idade, género, ano de curso, atividades de lazer, estilos de vida, consumo de substâncias psicoativas, incluindo tabaco, álcool, drogas, e psicofármacos (hipnóticos, tranquilizantes e sedativos); b) QSM+ (Lluch, 2003) já descrito anteriormente; c) Inventário de Saúde Mental (ISM) (Ribeiro, 2001) – questionário de autopreenchimento que inclui 38 itens, com cinco a seis possibilidades de resposta, que se distribuem por cinco subescalas: ansiedade, com 10 itens; depressão, com cinco itens; perda de controlo emocional, com nove itens; afeto positivo, com 11 itens; laços emocionais, com três itens. Por sua vez, os itens compõem duas grandes dimensões: o distress psicológico (ansiedade, depressão e perda de controlo emocional) e o bem-estar psicológico (afeto positivo e laços emocionais). A cotação final resulta do somatório dos valores de cada item, nos quais valores mais elevados correspondem a uma melhor saúde mental.
Recolha de Dados
Os dados foram recolhidos através do questionário online e transferidos para um ficheiro do SPSS, onde foram editados pelo investigador numa base especificamente criada para o efeito no programa IBM SPSS Statistics 19. Apenas foram validados os questionários preenchidos de forma correta. A duração média de preenchimento do questionário era de cerca de 15 minutos. Considerações Éticas Foram cumpridos todos os princípios éticos, de acordo com a declaração de Helsínquia, para uma investigação desta natureza. O estudo foi autorizado pela instituição do Ensino Superior, após aprovação pela Comissão de Ética. Obteve-se a devida autorização para a aplicação dos instrumentos de colheita de dados. A participação foi voluntária, e obteve-se o consentimento informado dos estudantes. Os questionários eram anónimos, sem qualquer possibilidade de identificar os participantes, assegurando a confidencialidade dos dados. Foi disponibilizado um e-mail, para o qual os estudantes podiam solicitar mais esclarecimentos acerca do trabalho.
Análise de Dados
Para a análise da validade concetual realizou-se uma análise fatorial exploratória, segundo o método de Componentes Principais, aplicando uma rotação oblíqua (Direct Oblimin) que, segundo Nunnally e Bernstein (1995) pode conduzir a uma definição fatorial mais precisa. Dado que o instrumento segue um modelo teórico de Saúde Mental Positiva composto por seis fatores (Jahoda, 1958), o número de fatores a extrair foi limitado a seis. Foi previamente definido que, dada a dimensão da amostra, seriam consideradas aceitáveis cargas fatoriais superiores a 0,30 (Hair, Anderson, Tatham & Black, 2007). Nos casos em que um dado item apresentasse maior carga num dado fator, apresentando discordância com a estrutura original do instrumento (Lluch, 2003), optou-se por manter-se essa estrutura, sendo que, para a realização desta opção, foram adotados, cumulativamente, os seguintes critérios: manter a estrutura original sempre que as diferenças na carga fatorial fossem pouco significativas e sempre que a carga fatorial do item fosse minimamente aceitável (superior a 0,30). Ao nível da validade concetual, foi ainda realizada análise da validade convergente e divergente, respetivamente, com as dimensões “Bem-Estar Psicológico” e “Distress Psicológico” do Inventário de Saúde Mental (Ribeiro, 2001). A fidelidade do instrumento foi calculada mediante: a consistência interna (avaliada pelo alfa de Cronbach); a estabilidade (teste-reteste), para medir a estabilidade temporal do instrumento. Para a avaliação do alfa de Cronbach foi considerado como aceitável, para cada fator, um valor mínimo de 0,60, e para a score global um valor mínimo de 0,80 (Fortin, Côté & Filion, 2009). Foram ainda analisadas as correlações entre os fatores, assumindo-se como aceitável um máximo de 0,70, valor limite, segundo Nunally e Bernstein (1995), para se manter uma conceção multifatorial.
Análise dos Itens
Verificou-se que apenas os itens 1 e 11 apresentavam uma correlação item/fator inferior a 0,25. Optou-se pela manutenção dos mesmos visto que, em ambos os casos, a sua eliminação não iria resultar num aumento substancial da consistência interna dos fatores sendo que, no caso do item 1, a sua eliminação iria, inclusivamente, reduzir a consistência interna do fator.
Validade
Antes da análise fatorial, a adequação dos dados foi estimada utilizando o Kaiser-Meyer-Olkin (KMO) e o teste de esfericidade de Bartlett. Teste de esfericidade de Bartlett foi de 278.606 (p<0,001), indicando alta correlação entre os itens. O valor de KMO foi de 0,80, indicando adequação da amostra para a análise fatorial. Os resultados do teste de esfericidade e a medida de KMO de Bartlett sugeriram que a análise de fator foi adequado para este conjunto de dados. Na análise fatorial os seis fatores extraídos permitiram explicar 51,0% da variância total do questionário. O fator 1 (satisfação pessoal) foi o que explicou uma maior percentagem da variância (25,6%), enquanto os outros cinco fatores explicaram uma percentagem muito menor, que foi desde os 8,1% do fator 6 até aos 3,1% do fator 3. Na matriz fatorial resultante (Tabela 2) os pesos de cada item foram, em todos os casos, superiores a 0,30, pelo que se manteve a estrutura do questionário com um total de 39 itens. Porém, os fatores resultantes não correspondem, totalmente, à configuração proposta por Lluch (2003). Assim: o item 24 passou do fator 6 para o fator 2; o item 35 passou do fator 5 para o fator 4; o item 11 passou do fator 6 para o fator 5; os itens 23, 25 e 37 passaram do fator 2 para o fator 5.
RESULTADOS A idade média dos estudantes foi de 22,7 anos (DP=3,13; idades entre 19-48 anos). A amostra foi, maioritariamente, do género feminino (89,3%). Quanto ao ano do curso, a distribuição foi relativamente equitativa, com 24,5% dos estudantes a frequentarem o primeiro ano, 27,8% o segundo, 20,2% o terceiro, e 27,5% a frequentarem o quarto ano. Revista Portuguesa de Enfermagem de Saúde Mental, Nº 11 (JUN.,2014) | 49
Tabela 2 - Matriz Fatorial dos 39 Itens que Configuram o Questionário de Saúde Mental Positiva (N=942) Itens
Fatores F1
4
0,58
7
0,61
12
0,45
14
0,55
31
0,60
38
0,74
39
0,75
6
0,39
F2
F3
F4
F5
F6
Correlações entre Fatores
As correlações entre os seis fatores estão apresentadas na Tabela 3. Pode verificar-se que todos os fatores apresentaram uma correlação estatisticamente significativa (p<0,05) com a questionário global. Todas as correlações entre fatores foram inferiores a 0,70. Fatores F1
Tabela 3 - Correlação entre Fatores (N=942) F1 F2 F3 F4 F5 -
0,51*
0,57*
0,49*
0,51*
-
0,14*
0,19*
0,35*
0,42*
-
0,42*
0,63*
0,35*
-
0,45*
0,38*
-
0,50*
0,82*
0,73*
F2 F3
1
0,62
3
0,58
24
0,53
F4 F5 Total
2
0,43
5
0,83
21
0,84
22
0,81
26
0,66
0,81*
F6
0,24*
0,46*
0,73*
0,70*
Nota. F1: Satisfação Pessoal; F2: Atitude Pró-social; F3: Autocontrolo; F4: Autonomia; F5: Resolução de Problemas e Realização pessoal; F6: Habilidades de Relação Interpessoal *p<0,001
Fidelidade
10
0,72
13
0,74
15
0,37
19
0,74
34
0,47
35
0,42
11
0,40
16
0,42
17
0,67
23
0,39
25
0,65
27
0,48
28
0,51
29
0,38
32
0,62
36
0,52
37
0,67
8
0,58
9
0,50
18
0,43
20
0,44
30
0,58
33
0,57
Nota. F1: Satisfação Pessoal; F2: Atitude Pró-social; F3: Autocontrolo; F4: Autonomia; F5: Resolução de Problemas e Realização pessoal; F6: Habilidades de Relação Interpessoal.
No que respeita à validade convergente esta foi verificada, com uma correlação do QSM+ com a dimensão “Bem-Estar Psicológico” do Inventário de Saúde Mental de r=0,60 (p<0,001). A validade divergente foi igualmente verificada, com uma correlação do QSM+ com a dimensão “Distress Psicológico” de r=-0,61 (p<0,001). Revista Portuguesa de Enfermagem de Saúde Mental, Nº 11 (JUN.,2014) | 50
Os resultados apresentados na Tabela 3 permitem verificar que a consistência interna do instrumento foi muito boa (α Cronbach=0,92), e que todos os fatores, exceto o 2 (Atitude Pró-social), obtiveram uma consistência interna superior a 0,60, com valores que oscilaram entre 0,77 e 0,84. Porém, optou-se pela não eliminação do fator 2 considerando que a sua consistência interna é compreensível, visto ser composto somente por três itens. A consistência interna dos itens de cada fator foi boa mas, no caso dos itens 2, 6, 11 e 35, a sua exclusão permitiria o aumento da consistência interna dos fatores em que se enquadram. No entanto, optou-se pela não eliminação destes itens, visto que: os fatores a que pertencem apresentam uma boa consistência interna; os ganhos resultantes da eliminação dos itens são pouco expressivos. Para testar este tipo de fiabilidade, o QSM+ foi administrado duas vezes a uma amostra de 120 estudantes com o intervalo de dois meses. A fiabilidade do teste depende do valor do coeficiente de correlação entre os dois momentos. Os valores encontrados foram muito altos, conforme se pode ver na Tabela 4. Os valores oscilaram entre 0,92 e os 0,98. Estes valores sugerem que o questionário apresenta uma boa fiabilidade temporal. Tabela 4 - Coeficiente Alfa (N=942) e Correlações Teste-Reteste (N=120) dos Seis Fatores e do Questionário Global
Fator
α Cronbach
Teste-Reteste
F1: Satisfação Pessoal F2: Atitude Pró-social F3: Autocontrolo F4: Autonomia F5: Resolução de Problemas e Realização pessoal F6: Habilidades de Relação Interpessoal
0,84 0,51 0,84 0,77 0,84 0,69
0,98 0,92 0,96 0,94 0,98 0,92
Global
0,92
0,98
Após o estudo das propriedades psicométricas do Questionário de Saúde Mental Positiva para a população portuguesa, a estrutura final do mesmo pode ser representada de acordo com o apresentado na Tabela 5. Tabela 5 - Estrutura do Questionário de Saúde Mental Positiva (Versão Portuguesa)
Itens
Fatores F1
F2
F3
F4
F5
F6
4
1
2
10
11
8
6
3
5
13
15
9
7
24
21
19
16
18
12
-
22
33
17
20
14
-
26
34
23
30
31
-
-
35
25
-
38
-
-
-
27
-
39
-
-
-
28
-
-
-
-
-
29
-
-
-
-
-
32
-
-
-
-
-
38
-
-
-
-
-
37
-
Nota. F1: Satisfação Pessoal; F2: Atitude Pró-social; F3: Autocontrolo; F4: Autonomia; F5: Resolução de Problemas e Realização pessoal; F6: Habilidades de Relação Interpessoal
DISCUSSÃO O processo de tradução do QSM+ foi sistemático e conduzido de forma rigorosa, de modo a assegurar a equivalência concetual, dos itens, semântica, operacional, de medida, e funcional, tal como preconizado por Herdman, Fox-Rushby e Badia (1998). A análise fatorial confirmatória foi, de um modo geral, de encontro ao que havia sido obtido por Lluch (2003) aquando do seu trabalho de construção e análise psicométrica do QSM+. Porém, na análise fatorial realizada foram definidas cargas fatoriais mínimas para os itens tendo em consideração o tamanho da amostra, pelo que acabaram por ser realizadas algumas alterações no que se refere às dimensões a que pertence cada item. Ainda assim, optou-se por não alterar a nomeação das dimensões sugerida por Lluch (2003) na medida em que, apesar de se terem verificado algumas alterações significativas, sobretudo na dimensão 5, se considerar que era mantida a congruência entre a designação das dimensões e os itens que nelas se encontravam incorporados. Ainda ao nível da análise fatorial, verifica-se e destaca-se, como aspeto positivo, o facto de os seis fatores extraídos terem permitido explicar uma maior percentagem da variância total do Questionário (51,0%) do que no caso do estudo realizado, em 2003, por Lluch (46,8%).
Passando à análise das propriedades psicométricas do QSM+, por comparação com o trabalho de criação e validação inicial do instrumento (Lluch, 2003), verificase que em ambos os casos se verificou uma correlação estatisticamente significativa entre os seis fatores extraídos e o global, sendo que todas as correlações foram inferiores a 0,70. Ao nível da consistência interna, os valores foram muito semelhantes, sendo a consistência interna do instrumento até ligeiramente superior à do instrumento na sua versão original (α=0,92 contra α=0,91). Quanto à consistência interna de cada fator, os resultados foram também muito semelhantes aos do estudo de criação e validação inicial do instrumento, apenas com o fator 2 a apresentar resultados menos positivos, ainda assim explicáveis pelo reduzido número de itens que o integram. Resultados extremamente positivos foram verificados ao nível da reprodutibilidade (estabilidade), tendo a correlação teste-reteste atingido valores de excelência (0,98), mesmo confrontando com os valores igualmente positivos obtidos, em 2003, por Lluch (0,85). A reprodutibilidade de cada fator também obteve valores superiores aos descritos no estudo de criação e validação inicial do QSM+. Confrontando o QSM+ com o instrumento que foi utilizado para aferição da validade convergente e divergente (ISM) e, em particular, com o seu estudo de adaptação à população portuguesa (Ribeiro, 2001), verifica-se que o ISM apresenta uma maior consistência interna, com um α de Cronbach na ordem dos 0,96. Porém, a análise comparativa não pode ser realizada de forma tão simplista. Ao analisar o ISM, verificamos que este apresenta duas dimensões: Distress Psicológico e Bem Estar Psicológico. Considerando que o QSM+ é um instrumento que apenas avalia dimensões de saúde mental positivas, será lógico realizar a comparação apenas com a dimensão positiva do ISM: Bem Estar Psicológico. Ao realizar essa análise os resultados mostram que esta dimensão apresenta um α de Cronbach de 0,91, ligeiramente inferior ao apresentado pelo QSM+. Perante os dados obtidos, o presente estudo oferece uma nova visão acerca da importância da avaliação da Saúde Mental Positiva, integrada numa lógica de Promoção da Saúde Mental, defendida como prioritária, há vários anos, por diversas organizações de renome internacional, entre as quais se conta a World Health Organization (2004). Revista Portuguesa de Enfermagem de Saúde Mental, Nº 11 (JUN.,2014) | 51
CONCLUSÃO
Também ao nível da Enfermagem a promoção da saúde mental parece constituir uma janela de oportunidade para o futuro (Woodhouse, 2010), sobretudo se considerarmos que, perante as atuais políticas de restrição económica, e tendo os conta os crescentes custos associados ao aumento dos casos de doença mental, a promoção da saúde mental começa a apresentar resultados motivadores ao nível do custo-efetividade, sobretudo se as intervenções ocorrerem de forma integrada em programas de desenvolvimento da segunda infância (Zechmeister, Kilian, McDaid & MHEEN group, 2008). Relativamente à comparação com a versão original (espanhola) do instrumento, serão necessários estudos adicionais que permitam esclarecer algumas dúvidas relativamente à estrutura do QSM+. A tabela 6 apresenta, a estrutura resultante do QSM+ em ambas as versões (espanhola e portuguesa). Em futuras investigações deverão realizar-se análises fatoriais confirmatórias e análises de covariância com amostras mais amplas, para poder continuar a explorar tanto a estrutura fatorial do QSM+ como o Modelo Multifatorial de Saúde Mental Positiva que o suporta. Tal como referido inicialmente, Lluch construiu o QSM+, inicialmente, seguindo os critérios de Saúde Mental Positiva formulados por Jahoda. Posteriormente, Lluch formulou a sua própria formulação concetual e métrica da Saúde Mental Positiva. Neste estudo realizou-se um novo avanço para a validação do QSM+. O processo de construção e validação de instrumentos psicométricos é um processo lento, que deve realizar-se com o maior rigor possível. Neste sentido, acredita-se que tanto os resultados obtidos na versão espanhola como na versão portuguesa do QSM+ devem ser considerados exploratórios e, em futuros estudos, deverá continuar a explorar-se tanto a estrutura de itens da versão original como a da versão portuguesa, como forma de tentar melhorar a robustez do instrumento. Fatores
IMPLICAÇÕES PARA A PRÁTICA CLÍNICA O QSM+ trata-se de um instrumento de grande relevância para a prática clinica, na medida em que permite avaliar o potencial das pessoas para lidar com as adversidades e, por outro lado, permite identificar as pessoas com maior vulnerabilidade mental. A questão da vulnerabilidade é muito importante para a prevenção da morbilidade, uma vez que possibilita aos profissionais de saúde uma intervenção mais precoce.
Tabela 6 - Relação da Distribuição dos Itens do QSM+ na Versão Portuguesa e na Versão Espanhola
F1 Itens
O Questionário de Saúde Mental Positiva revelou-se como instrumento fiável para avaliar a saúde mental dos estudantes do Ensino Superior. Verifica-se que as propriedades psicométricas do questionário e das suas dimensões são boas, o que atesta sobre a validade do instrumento. As dimensões que apresentam um menor consistência foram a F2 – atitude pró-social e a F6 – habilidades de relação pessoal. Em termos da comparação dos itens que integram as dimensões sugeridas no estudo original constata-se que as dimensões “Satisfação pessoal”, “Autocontrolo”, “Autonomia” e “Habilidades de relação interpessoal” são muito similares. Na dimensão “Atitude pró-social” e na dimensão “Resolução de problemas e Realização pessoal” verificam-se algumas diferenças nos itens que as compõem quando comparadas com a original. Deste modo, consideramos ser muito importante desenvolver mais estudos que permitam aferir as caraterísticas definidoras mais específicas para estas dimensões.
F2
F3
F4
F5
F6
POR
ESP
POR
ESP
POR
ESP
POR
ESP
POR
ESP
POR
ESP
4 6
4 6
1 3
2 5
2 5
10 13
10 13
11* 15
15
8 9
7 12
7 12
24 -
1 3 23*
21 22
21 22
19 33
19 33
16 17
16 17
18 20
14 31 38 39 -
14 31 38 39
-
26 -
26
34 35* -
34
23* 25* 27 28 29 32
8 9 11* 18 20 24* 30
-
25* 37*
-
Nota. *Itens que sofreram alterações Revista Portuguesa de Enfermagem de Saúde Mental, Nº 11 (JUN.,2014) | 52
-
-
36 37*
27 28 29 32 35 36
30 -
Um outro fator de relevância para a prática clinica está relacionado com o facto de este instrumento possibilitar uma avaliação salutogénica da Saúde Mental e permitir que os profissionais de saúde sejam agentes promotores de saúde através da implementação de intervenções capazes de promover a satisfação, atitude pró-social, autocontrolo a autonomia, capacidade de resolução de problemas e habilidades de relação interpessoal. REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS Barry, M. M. (2009). Addressing the determinants of positive mental health: Concepts, evidence and practice. International Journal of Mental Health Promotion, 11(3), 4-17. Davis N. J. (2002). The promotion of mental health and the prevention of mental and behavioral disorders: Surely the time is right. International Journal of Emergency Mental Health, 4(1), 3-29. Fortin, M. F., Côté, J. & Filion, F. (2009). Fundamentos e etapas do processo de investigação. Loures: Lusodidacta. Hair, J. F., Tatham, R. L., Anderson, R. E. & Black, W. (2007). Análise multivariada de dados (5ª ed.). Porto Alegre: Bookman. Herdman, M., Fox-Rushby, J. & Badia, X. (1998). A model of equivalence in the cultural adaptation of HRQoL instruments: the universalist approach. Quality of Life Research, 7(4), 323-335. Herman, H., Saxena, S. & Moodie, R. (2005). Promoting mental health: Concepts, emerging evidence, practice. A report of the World Health Organization, Department of Mental Health and Substance Abuse in collaboration with the Victorian Health Promotion Foundation and The University of Melbourne. Geneva: World Health Organization.
Lluch, M. T. (2002). Evaluación empírica de un modelo conceptual de salud mental positiva. Salud Mental, 25(4), 42-55. Lluch, M. T. (2003). Construcción y análisis psicométrico de un cuestionario para evaluar la salud mental positiva. Psicología Conductal, 11(1), 61-78. Lluch, M. T. (2008). Concepto de salud mental positiva: Factores relacionados. In J. Fornes, y J. Gómez (coord.), Recursos y programas para la salud mental. Enfermería psicosocial II (pp. 37-69). Madrid: Fuden, Colección líneas de especialización en enfermería. Lluch-Canut, T., Puig-Llobet, M., Sánchez Ortega, A., Roldán-Merino, J., Ferré-Grau, C., & Positive Mental Health Research Group (2013). Assessing positive mental health in people with chronic physical health problems: correlations with socio-demographic variables and physical health status. BMC Public Health, 13, 928. doi: 10.1186/10.1186/1471-2458-13-928 Nunnally, J. C. y Bernstein, I.J. (1995). Teoria psicométrica (3ª ed.). México: McGraw Hill/Interamericana de México. Ribeiro, J. L. P. (2001). Mental health inventory: Um estudo de adaptação à população portuguesa. Psicologia, Saúde & Doenças, 2(1), 77-99. Sequeira, C. (2006). Introdução à prática clínica: Do diagnóstico à intervenção em enfermagem de saúde mental e psiquiatria. Coimbra: Quarteto Editora. Sequeira, C. e Carvalho, J.C. (2009.) Tradução para a População Portuguesa do Questionário de Saúde Mental Positiva (QSM+). In C. Sequeira, J.C. Carvalho, I. Ribeiro, T. Martins, e T. Rodrigues (Eds.), Saúde e Qualidade de Vida em análise (pp. 303-314). Porto: Escola Superior de Enfermagem do Porto.
Jahoda, M. (1958). Current concepts of positive mental health. New York: Basic Books.
Woodhouse, A. (2010). Is there a future in mental health promotion and consultation for nurses? Contemporary Nurse, 34(2), 177-189. doi:10.5172/conu.2010.34.2.177
Keyes C. L. (2007). Promoting and protecting mental health as flourishing: a complementary strategy for improving national mental health. American Psychologist, 62(2), 95-108.
World Health Organization (2004). Promoting mental health: Concepts, emerging evidence, practice: summary report. Geneva: World Health Organization.
Lehtinen, V. (2004). Action for mental health: activities co-funded from European Community Public Health Programmes 1997-2004. Acedido em http://ec.europa.eu/ health/archive/ph_determinants/life_style/mental/docs/ action_1997_2004_en.pdf
Zechmeister, I., Kilian, R., McDaid, D. & MHEEN group (2008). Is it worth investing in mental health promotion and prevention of mental illness? A systematic review of the evidence from economic evaluations. BMC Public Health, 8(20). doi:10.1186/1471-2458-8-20
Lluch, M. T. (1999). Construcción de una escala para evaluar la salud mental positiva (Tese de Doutoramento Não Publicada). Universidad de Barcelona, Barcelona. Revista Portuguesa de Enfermagem de Saúde Mental, Nº 11 (JUN.,2014) | 53
Revista Portuguesa de Enfermagem de Saúde Mental, Nº 11 (JUN.,2014) | 54
8
“PROJETO MENSANUS” – GANHOS EM SAÚDE MENTAL | Fernanda Lopes1; Karina Oliveira2; Márcia David3; Raquel Rebelo4 |
RESUMO Os problemas de saúde mental constituem a principal causa de incapacidade e uma das principais causas de morbilidade, em Portugal. Alguns estudos preveem ainda o agravamento destes números, em especial nos grupos vulneráveis. Consciente desta realidade, Médicos do Mundo Portugal desenhou e implementou o Projeto Mensanus, no grande Porto, vocacionado para a intervenção ao nível da saúde mental, em contexto de proximidade, com o principal objetivo de melhorar a qualidade de vida das pessoas com problemas mentais, em especial nestes grupos vulneráveis, através da inclusão social e da proteção dos seus direitos e dignidade. No final do projecto propusemo-nos a avaliar a intervenção desenvolvida, mediante análise dos ganhos em saúde mental verificados nos utentes que foram acompanhados pela equipa técnica. Desta análise, os resultados obtidos têm todos os indicadores (nove) com taxa de sucesso acima dos 50%. Assim, concluímos que as estratégias, metodologias e atividades desenvolvidas encontram-se perfeitamente adaptadas, revelam-se eficazes e consequentemente a produzir os efeitos desejados dado que permitiram a uma equipa técnica reduzida, em número e horas afetas alcançar os objetivos propostos. PALAVRAS-CHAVE: Indicadores; Saúde mental; Avaliação de programas e projetos de saúde
RESUMEN
ABSTRACT
“‘Proyecto Mensanus’ – benefícios en la salud mental”
“‘Mensanus Project’ – mental health gains”
Los problemas de salud mental son la causa principal de discapacidad y una causa importante de morbilidad en Portugal. Algunos estudios incluso predecir el empeoramiento de estas cifras, sobre todo en los grupos vulnerables. Conscientes de esta realidad, Medicos del Mundo Portugal diseñó e implementó el proyeto Mensanus en Oporto, para intervenir en el ámbito de la salud mental en el contexto de la proximidad, con el objetivo principal de mejorar la calidad de vida de las personas con problemas de salud mental, sobre todo en estos grupos vulnerables a través de la inclusión social y la protección de sus derechos y dignidad. Al final del proyecto se propone evaluar la intervención desarrollada a través de un análisis de los avances registrados en los clientes de salud mental que fueron acompañados por el equipo técnico. Este análisis, los resultados tienen todos los indicadores (nueve) con una tasa de éxito superior al 50%. Por lo tanto, se concluye que las estrategias, metodologías y actividades desarrolladas se adaptan perfectamente demostrado tener éxito y en consecuencia producir los efectos deseados ya que permitieron que un pequeño equipo técnico en número y hora afetas lograr los objetivo propuestos.
The mental health problems are the leading cause of disability and a major cause of morbidity in Portugal. Some studies even predict the worsening of these numbers, especially in vulnerable groups. Aware of this reality, Doctor of the world Portugal, designed and implemented Mensanus project, in Oporto, geared to intervene at the level of mental health in the proximity context, with the main objective of improving the quality of life of people with mental health problems, particularly in these vulnerable groups through social inclusion and protection of their rights and dignity. At the end of the project we propose to evaluate the intervention developed through analysis of the gains recorded in mental health clients who were accompanied by the technical team. This analysis, the results have all indicators (nine) with a success rate above 50%. Thus, we conclude that the strategies, methodologies and activities developed are perfectly adapted proved successful and consequently produce the desired effects since allowed a small technical team in number and hours spent achieve the proposed objectives.
DESCRIPTORES: Indicadores; Salud mental; Evaluación de programas y proyectos de salud
KEYWORDS: Indicators; Mental health; Program evaluation
1 Enfermeira especialista em Enfermagem de Saúde Mental e Psiquiatria no Centro Hospitalar entre Douro e Vouga – Hospital de Dia de Psiquiatria, Avenida Dr. Domingos Caetano de Sousa, nº 522 4º M, 4520-211 Santa Maria da Feira, Portugal, enfermeirananda1@hotmail.com 2 Mestre em Acção Humanitária, Cooperação e Desenvolvimento; Enfermeira especialista em Enfermagem de Saúde Mental e Psiquiatria no ACeS Baixo Vouga – Unidade de Saúde Familiar Beira Ria, 3830-596 Gafanha da Nazaré, Portugal, karina_f_o@hotmail.com 3 Técnica Superior de Educação Social na Médicos do Mundo Portugal – Representação Norte, 4050-374 Porto, Portugal, marcia.david@medicosdomundo.pt 4 Técnica Superior de Educação Social; Coordenadora de Projectos na Médicos do Mundo Portugal – Representação Norte, Porto, raquel.rebelo@medicosdomundo.pt Submetido em 10-03-2014 – Aceite em 31-05-2014 Citação: Lopes, F., Oliveira, K., David, M., & Rebelo, R. (2014). “Projecto Mensanus” – ganhos em saúde mental. Revista Portuguesa de Enfermagem de Saúde Mental (11), 55-60. Revista Portuguesa de Enfermagem de Saúde Mental, Nº 11 (JUN.,2014) | 55
INTRODUÇÃO De acordo com o Plano Nacional de Saúde Mental 2007-2016 (Portugal, 2008), a principal causa de incapacidade e uma das principais causas de morbilidade, nas sociedades atuais, são as perturbações psiquiátricas e os problemas de saúde mental. Em Portugal, embora a prevalência da problemática acompanhe a tendência europeia, estudos apontam para que a situação dos grupos mais vulneráveis (mulheres, pobres e idosos) se encontra agravada. Ainda segundo o Plano Nacional de Saúde Mental - 2007-2016, (Portugal, 2008), o número de pessoas em contato com os serviços públicos mostra que apenas uma pequena parte das que têm problemas de saúde mental têm acesso a serviços públicos especializados de saúde mental; o internamento continua a consumir a maioria dos recursos (83%), quando toda a evidência científica mostra que as intervenções na comunidade, mais próximas das pessoas, são as mais efetivas e as que colhem a preferência dos utentes e família e ainda o recurso preferencial aos serviços de urgência e as dificuldades reportadas na marcação de consultas, sugerem a existência de problemas de acessibilidade aos cuidados especializados. Foi neste contexto que, Médicos do Mundo (Mdm) Portugal (Organização Não Governamental de Ajuda Humanitária e Cooperação para o Desenvolvimento, fundada na França em 1980, dando origem a rede internacional MdM, sendo que em Portugal surge em 1998. Intervém especificamente na área da saúde em populações vulneráveis) sentiu a necessidade de delinear uma intervenção específica e direcionada para a área da saúde mental (avaliação, diagnóstico, tratamento e reinserção). Em 2009, nasceu, deste modo, o Projeto Mensanus, centralizado na reabilitação, redução de danos e reinserção social de pessoas em situação de isolamento/exclusão social, ao nível da saúde mental e com fatores de risco associados, nomeadamente, acesso a substâncias psicoativas; deficitária vinculação social; ausência de retaguarda familiar; desintegração das estruturas/redes sociais sobretudo em relação à saúde; baixa escolaridade, percurso profissional inexistente ou precário, desemprego de longa duração; ausência de documentação válida e impedimentos jurídicos à resolução da situação; incapacidade de satisfazer as necessidades básicas por meio próprio. A população abrangida pelo projecto é na sua maioria pessoas do sexo masculino, com idades compreendidas entre os 20 e os 65 anos. Revista Portuguesa de Enfermagem de Saúde Mental, Nº 11 (JUN.,2014) | 56
O projeto Mensanus foi co-financiado pelo Alto Comissariado da Saúde desde Abril de 2009 e até Março 2013 e tinha como objetivo geral a melhoria da qualidade de vida das pessoas com problemas mentais, através da inclusão social e da proteção dos seus direitos e dignidade. Foi implementado e desenvolvido através de uma equipa técnica interdisciplinar, constituída por uma educadora social, um enfermeiro especialista em reabilitação (Abril 2009 a Janeiro de 2012) e duas Enfermeiras Especialistas em Saúde Mental. Com este artigo pretende-se apresentar, de uma forma breve, uma boa prática em saúde mental em Portugal através da apresentação do projecto e as suas especificidades, nomeadamente, objectivos propostos, população-alvo, descrição de metodologia e actividades desenvolvidas e principalmente ganhos em saúde mental. Porquê Avaliar Ganhos em Saúde Mental? De acordo com a Organização Mundial de Saúde (OMS, 2001), a Saúde Mental é essencial para o bem-estar das pessoas, das sociedades e dos países, devendo ser universalmente encarada sob um novo prisma e em ambientes transdisciplinares. Com base nos últimos dados epidemiológicos, referidos no documento Reatualização do Plano Nacional de Saúde Mental (Portugal, 2012), os problemas relacionados com a saúde mental são ainda a principal causa de incapacidade e uma das principais causas de morbilidade do país. Embora tenha havido melhoria dos indicadores expresso pela melhoria da assistência em saúde mental no país, continua a ser necessário desenvolver medidas, pois a promoção de saúde mental de uma população é encarada como um ganho em saúde não só para o individuo como para a sociedade. Os ganhos em saúde são entendidos como resultados positivos em indicadores da saúde e incluem referências sobre a respetiva evolução. Expressam a melhoria dos resultados (Nutbeam, 1998) e traduzem-se, na sociedade, por ganhos em anos de vida, pela redução de episódios de doença ou encurtamento da sua duração, pela diminuição das situações de incapacidade temporária ou permanente, pelo aumento da funcionalidade física e psicossocial e, ainda, pela redução do sofrimento evitável e melhoria da qualidade de vida relacionada ou condicionada pela saúde (OMS, 2001). Neste sentido, pretendemos avaliar os ganhos em saúde dos beneficiários do projeto, de modo a expressar de forma efetiva e mensurável a importância da continuidade e disseminação da intervenção.
De forma global, indicadores de saúde são instrumentos de medida sumária que refletem, directa ou indiretamente, informações relevantes sobre diferentes atributos e dimensões da saúde bem como os fatores que a determinam. Os Indicadores de Saúde podem ser usados para melhorar o conhecimento sobre os determinantes da saúde, identificar lacunas no estado de saúde e/ou populações específicas e são igualmente úteis para informar o planeamento, a política de saúde e gerir o sistema de saúde. Assim, os indicadores de ganhos potenciais em saúde inerentes aos objetivos e à população do projecto Mensanus encontram-se descritos na tabela 1. Tabela 1 - Indicadores de Ganhos Potenciais em Saúde GRUPO INDICADOR Morbilidade
Número de internamentos hospitalares por doenças atribuíveis ao álcool Número de internamentos hospitalares atribuíveis ao consumo de drogas Número de internamentos hospitalares por doenças atribuíveis a outras patologias mentais Número de utentes com acompanhamento em cuidados de saúde primários
Incapacidade
Número de utentes que aderiram ao regime terapêutico Número de utentes capacitados para lidar com a doença e com o autocuidado. Número de utentes que sofreram recaídas
Auto perceção Número de utentes reinseridos na rede de suporte Número de utentes que praticam atividades socialmente úteis
Ganhos em saúde 1, 2, 3, 4 – Os cuidados de saúde primários ou atenção primária, segundo proposta de definição na declaração de Alma Ata (WHO, 1978) consiste na prestação de assistência de saúde essencial, baseada em métodos e técnicas práticas, apropriadas sob o ponto de vista científico e aceites socialmente, colocadas ao alcance de todas as unidades e famílias das comunidades, com a sua inteira participação e que possa ser financeiramente mantida pelo país e pela comunidade, em todas as fases do seu desenvolvimento, num espírito de auto responsabilidade e autodeterminação. Um adequado acompanhamento a nível de atendimento primário, promove o bem-estar da população e previne situações de doença evitáveis ou indesejadas, ao mesmo tempo, que reduz os custos elevadíssimos associados aos recorrentes e sistemáticos internamentos hospitalares (WHO, 1978; OE, 2009).
Ganhos em Saúde 5 – A adesão ao regime terapêutico define-se como o grau de concordância entre as recomendações dos prestadores de cuidados de saúde e o comportamento da pessoa relativamente ao regime terapêutico proposto (Haynes, McDonald, Garg, & Montague, 2002). Ganhos em Saúde 6 – O autocuidado é o que cada pessoa faz por si mesma para estabelecer e/ou manter a saúde, prevenir e lidar com a doença. É um conceito amplo, abrangendo: higiene (geral e pessoa), nutrição (tipo e qualidade do alimento ingerido), estilos de vida (atividade física, lazer, etc); fatores ambientais (condições de vida, hábitos sociais, etc.); fatores sócioeconómicos (nível de renda, crenças culturais, etc.) e automedicação(WHO, 1998). Ganhos em Saúde 7 – Recaída pode ser entendida como uma recorrência dos sintomas da doença, após um período de melhoria. Adaptando este conceito ao contexto do projecto, a recaída seria então o retorno a níveis anteriores do comportamento, seguido da tentativa de parar ou diminuir o mesmo, ou simplesmente o fracasso de atingir objectivos estabelecidos por um indivíduo após um período definido de tempo. A Recaída é um dos estádios da mudança comportamental. É um aspeto essencial a ser entendido quando se fala em mudança de hábito. Muitas pessoas sofrem recaídas e têm que recomeçar o processo novamente. É importante encarar a recaída não como um facto isolado, mas sim como uma série de processos cognitivos, comportamentais e afectivos. Da mesma forma, a recaída não pode ser encarada como um fracasso do indivíduo ou do profissional e sim como parte do processo da mudança (Jungerman & Laranjeira, 1999). Ganhos em Saúde 8 – A Reinserção tem como objectivo capacitar o indivíduo de instrumentos necessários para superar a sua dependência e poder reintegrar-se no seu contexto social específico. Trata-se de uma construção individual, auto-suficiente, qualificante, capacitadora e capacitante, partindo sempre do indivíduo enquanto pessoa principal do seu próprio desenvolvimento pessoal e social. A reinserção é o estabelecer comunicações entre a pessoa excluída e o resto da sociedade, com o objectivo de lhes proporcionar acesso aos factores de identidade social. Em suma, a reinserção social visa a reintegração da pessoa excluída da sociedade, promovendo a reconstituição, ou mesmo, a criação de novos laços com os que a rodeiam (Carvalho, 2007; López & Laviana, 2007). Revista Portuguesa de Enfermagem de Saúde Mental, Nº 11 (JUN.,2014) | 57
Ganhos em Saúde 9 – Atividades socialmente úteis são aquelas em que de forma livre ou planificada, a pessoa gere o seu tempo de uma forma satisfatório e saudável. Pretende, desta forma, desenvolver iniciativas no sentido de encontrar ocupações alternativas para o tempo livre; recuperar o lado do lazer na vida quotidiana; aumentar a valorização pessoal e social e consequentemente a auto-estima, no sentido da promoção da sua autonomia e das suas potencialidades; permitir que encontre outras fontes de prazer reduzindo a identificação do prazer/diversão com o consumo de substâncias quando justificado (Carvalho, 2007). METODOLOGIA O objectivo geral do projecto centra-se em Melhorar a qualidade de vida das pessoas com problemas mentais através da inclusão social e da protecção dos seus direitos e da dignidade. No projecto, delinearam-se como metas, até Março de 2013: aumentar em 40% o acesso dos utilizadores em processo de gestão de caso aos cuidados de saúde mental; aumentar em 20% os níveis de autonomia e de independência dos utilizadores identificados com grau de dependência. Privilegiou-se as seguintes estratégias de intervenção: Outreach, Intervenção em situação de crise, Treino de Assertividade, Capacitação e Advocacia, Potenciação dos fatores de proteção; e as seguintes metodologias: o Modelo de intervenção de proximidade; Modelo Transteórico; Modelo de intervenção centrado no utente e Modelo de Relação de Ajuda. No que respeita às atividades, o processo de acompanhamento aos utentes consistia em: - Intervenção social dinâmica - articulação institucional, acompanhamento e encaminhamento às instituições de apoio, atendimentos e educação de competências, (re) integração na rede de suporte e/ou familiar, promoção da ocupação produtiva dos tempos livres; - Intervenção comportamental - aconselhamento, codefinição do projecto de vida, entrevista motivacional, prevenção de recaídas; - Prestação de cuidados de saúde - consulta, atribuição de medicação, co-definição do plano terapêutico, monitorização dos efeitos secundários, tratamentos, monitorização do cumprimento do plano terapêutico, articulação institucional, intervenção em situação de crise, promoção do autocuidado, psicoeducação individual e em grupo; - Informação, educação e mudança de comportamentos - acções individuais, coletivas e distribuição de material informativo; Revista Portuguesa de Enfermagem de Saúde Mental, Nº 11 (JUN.,2014) | 58
- Visita Domiciliária - consultas, avaliação das condições de habitabilidade, monitorização das condições para adesão ao plano terapêutico. Não havia uma periodicidade de intervenção fixa. A periodicidade das actividades podiam ser diárias, duas a três vezes por semana, semanais, quinzenais e ou mensais. Assim como as intervenções poderiam ser com uma classe profissional ou multiprofissional. Esta diversidade dependida da situação e da necessidade de intervenção. A família também era alvo de intervenção. Na maioria das situações, foi efectuado contacto com familiares directos ou indirectos dos beneficiários, levando a que se pudessem (re)construir laços familiares até ao momento inexistentes ou pouco firmes. A intervenção familiar tinha sobretudo o objectivo de capacitar os familiares a lidar com as situações de doença dos seus familiares. À semelhança de outros projetos desenvolvidos por MdM, acreditamos que uma das chaves para o sucesso de projetos que visam o desenvolvimento comunitário assenta no trabalho em rede. Especificando, um trabalho baseado na articulação interinstitucional, na rentabilização de recursos e saberes das parcerias e nas intervenções holísticas e multicontextuais. Falamos portanto, de uma intervenção que entende o sujeito como participante ativo no seu processo de (re) construção do projeto de vida e na qual, a rede de suporte assume verdadeiramente o seu papel, intervindo e responsabilizando-se pela (re) integração plena do sujeito. RESULTADOS O projecto iniciou, em Abril 2009, com 55 utilizadores em gestão de caso. Em Julho 2010, 24 utilizadores (com mais de 65 anos) foram inseridos num projecto para idosos da Médicos do Mundo - Representação Norte e 1 foi repatriado. Em 2013, no final do projecto: 7 abandonaram o projeto por iniciativa própria, 1 utente foi suspenso o acompanhamento por parte da Médicos do Mundo, 5 foram transferidos para outras instituições e 17 foram reinseridos, em redes de sociabilidade primária (familiar ou institucional). Com base nos objetivos do projeto e nas diretrizes do Plano Nacional de Saúde Mental - 2007-2016, (Portugal, 2008), e devido as metas propostas em 2009 não traduziam efectivamente os ganhos em saúde mental dos beneficiários do projecto, foram criados, no ultimo semestre do projecto, indicadores capazes de avaliar os ganhos a nível da saúde mental dos referidos beneficiadores anteriormente descritos.
Os dados obtidos resultam, da consulta dos processos individuais dos utentes, da análise do sistema de informação do projeto Mensanus e da aplicação de inquérito por entrevista informal aos utentes que encontravam em acompanhamento. De salientar, que apesar de só terem sido definidos no ultimo semestre, estes dados se referem ao período temporal de 4 anos, duração do projecto. Tabela 2 - Resultados dos Indicadores de Ganhos em Saúde GRUPO INDICADOR RESULTADOS Morbilidade
Incapacidade
Número de internamentos hospitalares por doenças atribuíveis ao álcool Número de internamentos hospitalares atribuíveis ao consumo de drogas Número de internamentos hospitalares por doenças atribuíveis a outras patologias mentais Número de utentes com acompanhamento em cuidados de saúde primários
25% 10% 7% 100%
Número de utentes que aderiram ao 72% regime terapêutico Número de utentes capacitados para 80% lidar com a doença e com o autocuidado. Número de utentes que sofreram 47% recaídas
Auto perceção Número de utentes reinseridos na rede de suporte Número de utentes que praticam atividades socialmente úteis
57% 53 %
DISCUSSÃO De forma geral, os resultados obtidos permitem concluir que as estratégias, metodologias e atividades desenvolvidas pelo projecto Mensanus revelam-se eficazes na consecução dos objetivos propostos em candidatura. Todos os indicadores têm taxa de sucesso acima dos 50 %. Os indicadores de morbilidade encontram-se acima dos 70%. É relevante referir que os indicadores relacionados com (in)capacidade/auto percepção do utente encontram-se entre 50% e os 60 %. Estes últimos indicadores estão intimamente relacionados, por um lado, com o perfil da população-alvo (a motivação e adesão dos próprios são áreas centrais de intervenção contínua de todos os profissionais), por outro, nem sempre encontramos na rede de suporte estruturas adequadas e capazes de integrar estes utentes, quer em termos afetivos, quer em termos profissionais/ ocupacionais.
No entanto, considerando que todos os técnicos envolvidos no projeto trabalham num total de 23 horas por semana, podemos concluir que os resultados obtidos e consequentemente os ganhos em saúde são muito positivos. Na verdade, as horas de cuidados estão relacionadas com potencial de recuperação previsto. Isto é, quanto maior for o investimento em horas de cuidados a um utente, maior será o potencial de recuperação, capacitação e autonomia. CONCLUSÕES FINAIS O Plano Nacional de Saúde Mental: 2007-2016 (Portugal, 2008), inclui disposições claras sobre a necessidade de se assegurar cuidados específicos de Saúde Mental a grupos especialmente vulneráveis. O projecto Mensanus possibilitou, a quem dele usufruiu, o acesso equitativo a cuidados de saúde de qualidade a todas as pessoas com problemas de saúde mental em situação social vulnerável, promovendo e protegendo os seus direitos, apesar de constrangimentos financeiros e técnicos (horas de afetação ao projeto). Colocar a pessoa no centro do dispositivo de acção, respeitando os seus direitos, vontades, e dignidade; trabalhar em equipa e em articulação inter institucional, funcionando como ponte entre os vários actores no processo do cuidar e assegurar um acompanhamento sistemático a cada pessoa com o seu projectos de vida próprio foram panos de fundo que permitiram a reinserção de pessoas sem-abrigo. Os profissionais de saúde, com especial enfoque nos enfermeiros com especialidade em saúde mental, têm um papel importantíssimo no acompanhamento a nível da atenção primária, em articulação com outros profissionais, no sentido de evitar a desinserção/desestruturação/desvinculação social destes grupos vulneráveis, uma vez que, estamos perante indivíduos que necessitam de apoio e reabilitação intensiva e contínua, durante um período mais alargado de tempo. Os resultados da avaliação dos ganhos em saúde são considerados satisfatórios e elevados, se pensarmos que se circunscrevem a um espaço temporal de 4 anos e a uma intervenção técnica especializada em saúde mental e experiente no que respeita à intervenção com grupos vulneráveis. No entanto, facilmente se conclui que percentagens superiores poderiam ser alcançadas, com uma equipa de terreno operacional a tempo inteiro. Urge uma maior consciência da importância de implementação de projectos que privilegiam a intervenção comunitária, que se desloque aos sítios onde estas pessoas pernoitam e frequentam, isto é, equipas de terreno, que trabalham junto para e com este grupo vulnerável. Revista Portuguesa de Enfermagem de Saúde Mental, Nº 11 (JUN.,2014) | 59
AGRADECIMENTOS Para a elaboração deste artigo, que tem como base o projecto Mensanus, agradecemos a todos os profissionais de saúde, alunos de estágios curriculares e voluntários, que desde o ano de 2009, contribuíram para a concretização, implementação e desenvolvimento destes indicadores de sucesso. REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS Carvalho, S. (2007). Manual das boas práticas em reinserção (1º Caderno): Enquadramento teórico. Lisboa: Instituto de Drogas e Toxicodependências. Acedido março 29, 2013 em http://www.idt.pt/PT/CentroDocumentacao/Documents/Manual_Reinsercao.pdf Hayes, R. B., McDonald, H., Garg, A. X., & Montagne, P. (2002). Interventions for helping patients to follow prescriptions for medications. The Cochrane Library, 2(CD000011),1-50. Acedido maio 06, 2014 em http:// www.ncbi.nlm.nih.gov/pubmed/12076376 Jungerman F. S., e Laranjeira R. (1999). Entrevista motivacional: Bases teóricas e práticas. São Paulo: CD UNIAD – UNIFESP. López, M., & Laviana, M. (2007). Rehabilitación, apoyo social e atención comunitária a personas com transtorno mental grave: Propuestas desde Andalucía. Revista de la Asociacíon Española de Neuropsiquiatria, XXVII(9), 187-223. Nutbeam, D. (1998). Health promotion glossary. Health Promotion International,113(4), 349-364.
Revista Portuguesa de Enfermagem de Saúde Mental, Nº 11 (JUN.,2014) | 60
Ordem dos Enfermeiros (2009). Rede Nacional de Cuidados Continuados Integrados: Referencial de Enfermeiros. Conselho de Enfermagem da Ordem dos Enfermeiros. Acedido março 29, 2013 em http://www. ordemenfermeiros.pt/documentosoficiais/Documents/ RNCCI%20-%20v.FINAL%20Referencial%20do%20 Enfermeiro%20-%20Abril%202009.pdf Organização Mundial de Saúde (2001). Relatório sobre a saúde no mundo 2001: Saúde Mental: Nova Compreensão, Nova Esperança. Geneve: OMS. Acedido março 29, 2013 em http://www.abebe.org.br/wp-content/uploads/ oms2001.pdf Alto Comissariado da Saúde, Coordenação Nacional para a Saúde Mental (2012). Reatualização do Plano Nacional de Saúde Mental. Lisboa: Coordenação Nacional para a Saúde Mental. Acedido abril 29, 2014 em http:// www.saudemental.pt/wp-content/uploads/2012/06/ Recalendarizac%CC%A7a%CC%83o_PNSM.pdf Alto Comissariado da Saúde, Coordenação Nacional para a Saúde Mental (2008). Plano Nacional de Saúde Mental 2007-2016: Resumo Executivo. Lisboa: Coordenação Nacional para a Saúde Mental. Acedido março 29, 2013 em http://www.acs.min-saude.pt/2008/01/18/ plano-accao-servicos-de-saude-mental. WHO (1978). Declaração de Alma-Ata: Saúde para todos no ano 2000. In: Conferência Internacional sobre Cuidados de Saúde Primários, Cazaquistão, 6-12 Set. 1978. WHO (1998). The role of the pharmacist in self-medication and self-care. Genebra: WHO. Acedido março 29, 2013 em http://apps.who.int/medicinedocs/pdf/ whozip32e/whozip32e.pdf
9
NORMAS DE PUBLICAÇÃO DA ENFERMAGEM DE SAÚDE MENTAL
REVISTA
PORTUGUESA
DE
A Revista Portuguesa de Enfermagem de Saúde Mental é publicada duas vezes por ano, em junho e dezembro, tratando-se de uma revista indexada em bases de dados nacionais e internacionais. A Revista apresenta, atualmente, as seguintes secções: Artigos de Investigação; Artigos de Revisão (Narrativa, Sistemática e Integrativa) da Literatura; Artigos de Boas Práticas/Reflexão. 1 – Procedimentos de Submissão do Artigo: 1.1 – Submissão eletrónica: os artigos devem ser sempre submetidos eletronicamente no sítio da Sociedade Portuguesa de Enfermagem de Saúde Mental: http://www.aspesm.org/. 1.2 – Para a submissão dos artigos, deverão sempre ser enviados os seguintes documentos: a) Artigo integral, obedecendo às normas da revista; b) Checklist de autoverificação, preenchida na totalidade c) Declaração de Cedência de Direitos de Autor e de Observação dos Princípios Éticos da Investigação, provando que os autores concordam que o artigo, uma vez aceite, fique da propriedade d’ ASPESM, não podendo, por isso, ser publicado noutra fonte, e que foram cumpridos todos os princípios éticos inerentes a um trabalho de investigação. Nota: a Direção da Revista reserva-se o direito de retirar um artigo do processo de revisão ou das bases de dados (no caso dos artigos publicados), sempre que se verifique que os autores publicaram uma versão idêntica noutra Revista. 2 – Processo de Revisão: Os artigos propostos são apreciados num processo Double Blinded (duplamente cego). Neste processo, o artigo é enviado por dois Peer Reviewers (Pares Revisores), os quais o examinam e arbitram sobre a sua qualidade, dando as recomendações que julgarem convenientes. Sempre que não se verifique acordo entre os dois revisores, o Diretor da Revista reserva-se o direito de indicar um terceiro revisor. A Direção da Revista enviará ao autor informação sobre a eventual aceitação definitiva, aceitação com alterações, ou não aceitação. No caso da aceitação com alterações, os autores receberão os pareceres e recomendações sugeridas pelos Peer Reviewers. O autor deve efetuar as alterações e reenviar o documento, via eletrónica, no tempo regulamentado. Nota: caso não se verifique o cumprimento rigoroso do tempo estipulado para correção do artigo, este pode ser excluído do processo de revisão. Cada artigo será, posteriormente, verificado pelo Diretor e Coordenador da Revista, que analisam a primeira versão do artigo e a versão corrigida, em função das recomendações dos Peer Reviewers. O processo de revisão será efetuado online. As fases do processo de revisão e recomendações encontram-se descritos no quadro abaixo: Fase Receção do Artigo Revisão Reformulação do Autor Verificação Redatorial Publicação
Procedimento Após o envio do artigo, este será submetido a um processo de revisão técnica (revisão dos aspetos formais e de normalização, de acordo com as normas de publicação da Revista). O artigo é enviado para 2 Peer Reviewers, que o examinam e arbitram sobre a sua qualidade, dando as recomendações convenientes. A Direção da Revista enviará ao autor informação sobre a aceitação definitiva, aceitação com alterações, ou não aceitação, bem como os pareceres e recomendações dos Peer Reviewers. As alterações a efetuar pelo autor deverão ir, rigorosamente, de acordo com as recomendações dos Peer Reviewers. Cada artigo deverá ser verificado pelo Diretor e pelo Coordenador da Revista, que analisam a primeira versão do artigo e a versão corrigida, em função das recomendações dos Peer Reviewers. A oportunidade de publicação é da inteira responsabilidade da Direção da Revista.
Revista Portuguesa de Enfermagem de Saúde Mental, Nº 11 (JUN.,2014) | 61
3 – A decisão final acerca da oportunidade de publicação dos artigos é da responsabilidade do Diretor da Revista. 4 – O artigo: 4.1 – Tipo de artigo: devem ser artigos científicos originais e versarem temas de saúde mental, Enfermagem de saúde mental ou educação em saúde mental. O conteúdo dos artigos é da exclusiva responsabilidade dos seus autores, aos quais compete respeitar os princípios éticos da investigação e cumprir as normas da edição da Revista. A Revista Portuguesa de Enfermagem de Saúde Mental poderá incluir artigos em língua portuguesa, espanhola, inglesa ou francesa, consoante a origem dos artigos. 4.2 – Estrutura do artigo 4.2.1 - Título: o artigo deverá incluir um título informativo (que vá de encontro ao âmbito do trabalho) e sucinto (em português, espanhol e inglês); máximo de 16 palavras, sem abreviaturas e sem a indicação da localização geográfica da investigação. 4.2.2 - Autores: os autores devem estar devidamente identificados, com o nome, habilitações académicas, categoria profissional, instituição onde exercem funções, contactos (morada, e-mail e telefone institucionais) e informação no caso de o artigo ser extraído de Dissertação ou Tese (indicando o título, ano e instituição onde foi apresentada). O nome e afiliação dos autores deve surgir imediatamente após o título em português. As afiliações devem estar por extenso (ex.: Local de Trabalho – Escola Superior de Enfermagem do Porto). Os endereços de correio eletrónico dos autores dos artigos devem estar com hiperligação (com link disponível). 4.2.3 - Resumo: o resumo do trabalho deve ser apresentado em português, espanhol e inglês, e não deve exceder as 250 palavras, devendo incluir a descrição do contexto, objetivo(s), metodologia, resultados e conclusões. 4.2.4 - Palavras-Chave: o artigo deve apresentar, no máximo, 4 palavras-chave, transcritas de acordo com os descritores MeSH (em português, ver DeCS), em português, espanhol e inglês. 4.2.5 - Corpo do artigo: O artigo (tratando-se de um trabalho de investigação) deve ser estruturado em secções, devendo incluir os seguintes capítulos: Introdução, Metodologia, Resultados, Discussão, Conclusão, e Implicações para a Prática Clínica). Os artigos de revisão e de boas práticas/reflexão não têm que obedecer, necessariamente, a esta divisão. 4.3 - Formato: • O texto deve ser apresentado em formato Word, letra Arial, tamanho 11, espaçamento 1,5, páginas em formato A4, em coluna única, evitando negritos e sublinhados, variação do tipo de letra, fundos de cor, etc.; • Todas as margens devem ter 2,5 cm.; • Não devem ser incluídas notas de rodapé. • O artigo não deve ultrapassar as 15 páginas incluindo resumo (em português, espanhol e inglês), referências, tabelas, quadro e figuras. • O artigo não deverá ser paginado. • Os parágrafos não devem ser indentados. • O artigo deve ser redigido de acordo com o Novo Acordo Ortográfico (caso não o seja, a Comissão Editorial reserva-se o direito de realizar a conversão). Nota: caso o(s) autor(es) se recuse(m) a redigir o artigo segundo o Novo Acordo Ortográfico devem, aquando do seu envio, manifestar essa posição de forma clara e inequívoca. • Na primeira utilização de uma sigla esta deve estar, primeiramente, por extenso, por exemplo: Terapia Cognitivo-Comportamental (TCC). • Quando se realizarem citações de três a cinco autores, todos os nomes devem ser mencionados na primeira vez que a citação é feita (ex.: Bradley, Ramirez, & Soo, 1999). Nas vezes seguintes, deve utilizar-se apenas o nome do primeiro autor seguido de “et al.” (ex.: Bradley et al., 1999). Caso a citação seja de seis ou mais autores, logo na primeira vez em que a citação é feita deve utilizar-se apenas o nome do primeiro autor seguido de “et al.”. Revista Portuguesa de Enfermagem de Saúde Mental, Nº 11 (JUN.,2014) | 62
• No corpo do artigo, ao citar autores coletivos, na primeira vez que a citação é feita, deve ser mencionado o nome por extenso (ex.: National Institute of Mental Health [NIMH], 2003). Nas vezes seguintes, pode ser utilizada a abreviatura (ex.: NIMH, 2003). • Os títulos dos capítulos devem seguir a seguinte estrutura: Nível do Título Formato 1 Centrado, Negrito, com Maiúsculas e Minúsculas 2 Alinhado à Esquerda, Negrito, com Maiúsculas e Minúsculas 3 Indentado, negrito, em minúsculas terminando com ponto final. 4 Indentado, negrito, itálico, em minúsculas terminando com ponto final. 5 Indentado, itálico, em minúsculas terminando com ponto final. 4.3.1 - Tabelas, quadros, gráficos e figuras: devem ser incluídos apenas os que sejam absolutamente essenciais para a compreensão do artigo e numerados por ordem de inclusão no texto, em função de cada tipo. As tabelas e quadros devem apresentar o título em cabeçalho e os gráficos e figuras devem apresentar o título por baixo. Para tabelas e quadros o tamanho da letra pode ser reduzido até um mínimo de 9 e sem espaçamentos. As tabelas, quadros, gráficos e figuras devem surgir imediatamente após o parágrafo em que é feita referência às mesmas. 4.3.2 - Citações: todos os autores citados no artigo devem constar da lista de referências bibliográficas. Exemplo: Sequeira (2006), (Sequeira, 2006), ou “Em 2006, Sequeira (...)”. Deve indicar-se o número de página, no caso de citação textual, tal como nos exemplos: Sequeira (2006, p. 32) ou (Sequeira, 2006, p. 32). Quando citar dois ou mais autores numa mesma paráfrase, deve ordená-los por ordem alfabética, tal como no exemplo: (Miller, 1999; Shafranske & Mahoney, 1998). Nota: utilizar o símbolo “&” apenas nas paráfrases em que os autores citados sejam de países em que o português não é uma língua oficial (ex.: EUA, Reino Unido, etc.). 4.3.3 - Referências Bibliográficas: • As referências selecionadas devem permitir evidenciar as publicações mais representativas do “estado da arte” da problemática em estudo (últimos 5 anos, extensíveis a 10 anos para problemáticas que tenham sido pouco estudadas), resultando da pesquisa de bases de dados de revistas indexadas nacionais e internacionais. • As referências bibliográficas devem estar elaboradas de acordo com as normas da 6ª Edição da American Psychological Association (APA). Todas elas deverão estar citadas no artigo. • Nas referências bibliográficas, independentemente do número de autores, estes devem ser todos referidos, não sendo permitido o uso de “et al.”. • O título das revistas nunca deve ser abreviado nas referências bibliográficas. Por exemplo, não se deve escrever “RPESM”, mas sim “Revista Portuguesa de Enfermagem de Saúde Mental”. • Sempre que se inclua um site nas referências bibliográficas, a sua hiperligação deve estar presente e funcionante. Nota: as fontes devem ser alvo de seleção criteriosa, em função da sua pertinência, e não devem ultrapassar um total de 20 referências, organizadas por apelido do autor e ordenadas por ordem alfabética. APA 6ª Edição (Exemplos – consultar http://www.apastyle.org/) 4.3.3.1 Modelo de referências (indicar o nome de todos os autores – não usar “et al.”): Livros Shotton, M. A. (1989). Computer addiction? A study of computer dependency. London, England: Taylor & Francis. Trabalho académico (Dissertação/Tese) Healey, D. (2005). Attention deficit/hyperactivity disorder and creativity: An investigation into their relationship. Tese de Doutoramento, University of Canterbury, Christchurch, New Zealand. Revista Portuguesa de Enfermagem de Saúde Mental, Nº 11 (JUN.,2014) | 63
Trabalho académico (Dissertação/Tese) Healey, D. (2005). Attention deficit/hyperactivity disorder and creativity: An investigation into their relationship. Tese de Doutoramento, University of Canterbury, Christchurch, New Zealand. Editor literário Barkley, R. A. (Ed.) (2008). Transtorno de déficit de atenção/hiperatividade: Manual para diagnóstico e tratamento (3ª ed.). Porto Alegre: Artmed. Capítulos de livros Haybron, D. M. (2008). Philosofy and the science of subjective well-being. In M. Eid & R. J. Larsen (Eds.), The Science of subjective well-being (pp. 17-43). New York, NY: Guilford Press. Autor coletivo American Psychological Association. (2010). Publication manual of the American Psychological Association (6ª ed.). Washington, DC: Author. Artigos de publicações periódicas Com DOI Herbst-Damm, K. L. & Kulik, J. A. (2005). Volunteer support, marital status, and the survival times of terminally ill patients. Health Psychology, 24, 225-229. doi: 10.1037/0278-6133.24.2.225 Sem DOI Light, M. A. & Light, I. H. (2008). The geographic expansion of Mexican immigration in the United States and its implications for local law enforcement. Law Enforcement Executive Forum Journal, 8(1), 73-82. Documentos eletrónicos Livros Schiraldi, G. R. (2001). The post-traumatic stress disorder sourcebook: A guide to healing, recovery, and growth [Adobe Digital Editions version]. doi: 10.1036/10071393722 Artigos de publicações periódicas Wheeler, D. P. & Bragin, M. (2007). Bringing it all back home: Social work and the challenge of returning veterans. Health and Social Work, 32(1), 297-300. Acedido em http://www.naswpressonline.org Outros (póster, comunicação livre, etc.) Leclerc, C. M. & Hess, T. M. (2005, agosto). Age diferences in processing of affectively primed information. Póster apresentado na 113ª Annual Convention of the American Psychological Association, Washington, DC. Nota: no caso de os autores serem de países de língua oficial portuguesa, nas referências bibliográficas o “&” deve ser substituído por “e”. 5 – Formato Padrão do Artigo a submeter: Primeira Página • Título (em português, espanhol e inglês) • Nome dos autores (separados por ponto e vírgula); • Afiliações dos autores (uma afiliação por linha); • Indicação caso o artigo seja extraído de Dissertação/Tese. Nota: esta página, posteriormente, é retirada pelo Coordenador da Comissão Editorial, sendo atribuído um número codificado que identifica o artigo junto dos revisores Revista Portuguesa de Enfermagem de Saúde Mental, Nº 11 (JUN.,2014) | 64
Segunda Página • Titulo (em português); • Resumo (em português); • Palavras-Chave (em português); • Título (em espanhol); • Resumen; • Descriptores; • Titulo (em inglês); • Abstract; • Keywords. Páginas Seguintes: • Introdução; • Metodologia; • Resultados; • Discussão; • Conclusões; • Referências bibliográficas; • Apêndices (se existentes), agradecimentos (se existentes), conflitos de interesses (se existentes), fontes de financiamento (se existentes), e contribuições dos autores (se aplicável).
Revista Portuguesa de Enfermagem de Saúde Mental, Nº 11 (JUN.,2014) | 65
MAIS INFORMAÇÕES SOBRE A SPESM EM:
WWW.ASPESM.ORG
ASPESM