Revista ESPECIAL Nº06

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FICHA TÉCNICA

TÍTULO | TITLE Revista Portuguesa de Enfermagem em Saúde Mental | Portuguese Journal of Mental Health Nursing

PUBLICAÇÃO E PROPRIEDADE | PUBLISHING AND PROPERTY

A Sociedade Portuguesa de Enfermagem em Saúde Mental | The Portuguese Society of Mental Health Nursing

DIRETOR | MANAGING DIRECTOR

Carlos Sequeira, PhD - Escola Superior de Enfermagem do Porto, Portugal

COORDENADOR | COORDINATOR

Luís Sá, PhD - Instituto de Ciências da Saúde - Universidade Católica Portuguesa, Porto, Portugal

COORDENADOR DA COMISSÃO EDITORIAL | EDITORIAL BOARD COORDINATOR

Francisco Sampaio, MSc – Hospital de Braga, Portugal

COMISSÃO EDITORIAL | EDITORIAL BOARD

Amadeu Gonçalves, PhD - Escola Superior de Saúde, Instituto Politécnico de Viseu Analisa Candeias, MSc - Escola Superior de Enfermagem da Universidade do Minho Bruno Santos, MSc – Casa de Sáude do Bom Jesus - Braga Carlos Vilela, MSc - Escola Superior de Enfermagem do Porto Lia Sousa, MSc - Centro Hospital de São João, Porto Lucília Vale de Nogueira, MSc – Centro Hospitalar do Porto Luís Silva, MSc - Hospital de Magalhães Lemos, Porto Odete Araújo, MSc - Escola Superior de Enfermagem da Universidade do Minho Olga Cunha Rocha, MSc - Escola Superior de Enfermagem do Porto (Jubilada) Regina Pires, MSc – Escola Superior de Enfermagem do Porto Rita Costa, MSc - Unidade Local de Saúde de Matosinhos, Porto Rosa Silva, MSc - Instituto de Ciências da Saúde - Universidade Católica Portuguesa, Porto

COMISSÃO CIENTÍFICA | SCIENTIFIC REVIEWERS

Agustín Simónelli Muñoz, PhD - Universidad Católica San Antonio, Múrcia, Espanha Aida Mendes, PhD - Escola Superior de Enfermagem de Coimbra, Portugal Alexandre Marques Rodrigues, PhD - Escola Superior de Saúde de Aveiro, Aveiro, Portugal Beatriz Araújo, PhD - Instituto de Ciências da Saúde - Universidade Católica Portuguesa, Porto, Portugal Carlos Sequeira, PhD - Escola Superior de Enfermagem do Porto, Portugal Carme Ferré-Grau, PhD - Universitat Rovira i Virgili. Tarragona, Espanha Elaine Antunes Cortez, PhD - Escola de Enfermagem AAC - Universidade Federal Fluminense, Brasil Elizabete Borges, PhD - Escola Superior de Enfermagem do Porto, Portugal Francisca Manso, PhD - Escola Superior de Enfermagem de Lisboa, Portugal Geilsa Cavalcanti Valente, PhD - Escola de Enfermagem AAC - Universidade Federal Fluminense, Brasil Guilherme Correa Barbosa, PhD – Universidade Estadual Paulista “Júlio de Mesquita Filho”, Brasil Graça Pimenta, PhD - Escola Superior de Enfermagem do Porto, Portugal Isilda Ribeiro, PhD - Escola Superior de Enfermagem do Porto, Portugal Joaquim Passos, PhD – Escola Superior de Saúde do Instituto Politécnico de Viana do Castelo, Portugal José António Pinho, PhD – Centro Hospitalar do Porto, Portugal José Carlos Carvalho, PhD - Escola Superior de Enfermagem do Porto, Portugal José Carlos Gomes, PhD - Escola Superior de Saúde do Instituto Politécnico de Leiria, Portugal José Carlos Santos, PhD - Escola Superior de Enfermagem de Coimbra, Portugal Juan Roldan Merino, PhD - Escuela de Enfermería Sant Joan de Déu (adstrita a la UB), Espanha Júlia Martinho, PhD - Escola Superior de Enfermagem do Porto, Portugal Luís Sá, PhD - Instituto de Ciências da Saúde - Universidade Católica Portuguesa, Porto, Portugal Margarida Sotto Mayor, PhD - Hospital de Magalhães Lemos, Porto, Portugal Mar Lleixà-Fortuny, PhD - Universitat Rovira i Virgili. Tarragona, Espanha Marluce Miguel de Siqueira, PhD - Universidade Federal do Espírito Santo, Brasil Michell Araújo, PhD - Faculdade Católica Rainha do Sertão - Fortaleza e Hospital de M., Brasil Odete Araújo, PhD - Escola Superior de Enfermagem da Universidade do Minho, Portugal Odete Pereira, PhD - Escola de Enfermagem da Universidade de São Paulo, Brasil Raul Cordeiro, PhD – Escola Superior de Saúde do Instituto Politécnico de Portalegre, Portugal Teresa Barroso, PhD - Escola Superior de Enfermagem de Coimbra, Portugal Teresa Lluch-Canut, PhD – Escola Universitària d’Infermeria - Universitat de Barcelona, Espanha Zeyne Scherer, PhD – Escola de Enfermagem de Ribeirão Preto - Universidade de São Paulo, Brasil Revista Portuguesa de Enfermagem de Saúde Mental, ESPECIAL 6 (OUT.,2018) | 2


Público-alvo:

Enfermeiros, médicos, psicólogos, assistentes sociais, terapeutas ocupacionais e outras pessoas com interesse na área da saúde mental.

Objectivo:

Divulgação de evidências científicas sobre a promoção da saúde, prevenção de doenças, tratamento, reabilitação e reintegração das pessoas com doença mental ao longo da vida.

Âmbito:

Políticas e design dos cuidados de saúde; Avaliação, diagnóstico, intervenções e resultados de enfermagem; Sistemas de informação e indicadores em saúde mental; Direitos e deveres dos doentes mentais; Formação e investigação em enfermagem em saúde mental.

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ISSN:

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Índice

EDITORIAL CONVIDADO

1

A ESPERANÇA COMO FOCO DE ENFERMAGEM DE SAÚDE MENTAL .................................. 6

ARTIGOS DE INVESTIGAÇÃO

2

A IMPORTÂNCIA DA RESILIÊNCIA E DE UM SUPORTE SOCIAL EFETIVO NA VIVÊNCIA

DA GRAVIDEZ E MATERNIDADE PRECOCES .......................................................................... 9

3

COMPETÊNCIAS EMOCIONAIS E PREVENÇÃO DO ABANDONO NOS ESTUDANTES

DO ENSINO SUPERIOR POLITÉCNICO .................................................................................. 17

4

ESTRÉS EMOCIONAL EN CUIDADORES MAYORES DE PERSONAS MAYORES .................. 25

5

LITERACIA EM SAÚDE MENTAL SOBRE ABUSO DE ÁLCOOL: UM ESTUDO COM

ADOLESCENTES PORTUGUESES ......................................................................................... 31

6

PERSPETIVA DOS PAIS SOBRE AS PERTURBAÇÕES DO SONO DAS CRIANÇAS

EM IDADE PRÉ-ESCOLAR ........................................................................................................ 39

7

O EFEITO MODERADOR DA SATISFAÇÃO COM A VIDA NA ASSOCIAÇÃO ENTRE A

QUALIDADE DA RELAÇÃO PAIS/FILHOS(AS) E DEPRESSÃO NA ADOLESCÊNCIA

8

REGULAÇÃO EMOCIONAL E QUALIDADE DO RELACIONAMENTO COM OS PAIS COMO

PREDITORAS DE SINTOMATOLOGIA DEPRESSIVA EM ADOLESCENTES ............................... 52

9

STRESS E ENGAGEMENT NA PROFISSÃO DE ENFERMAGEM: ANÁLISE DE DOIS

CONTEXTOS INTERNACIONAIS ............................................................................................... 59

10

SOCIAL MEDIA DISORDER SCALE – SHORT FORM (SMDS-SF): ESTUDO DE ALGUMAS

PROPRIEDADES PSICOMÉTRICAS EM JOVENS ADULTOS PORTUGUESES ...................... 65

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........... 46


11

A SATISFAÇÃO COM A VIDA ACADÉMICA. RELAÇÃO COM BEM-ESTAR E DISTRESS

PSICOLÓGICO ........................................................................................................................... 71 12

PREDITORES DO MOBBING NOS ENFERMEIROS EM CONTEXTO HOSPITALAR ............. 77

13

EXPLORAÇÃO DA AUTOCOMPAIXÃO NO CONTEXTO DE UM PROGRAMA DE

MINDFULNESS-BASED COGNITIVE THERAPY ...................................................................... 85

14

EVOLUÇÃO TEMPORAL DO SUICÍDIO NA PENÍNSULA IBÉRICA: 1971- 2013

.................... 93

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Editorial Convidado

1

Disponível em http://dx.doi.org/10.19131/rpesm.0206

A ESPERANÇA COMO FOCO DE ENFERMAGEM DE SAÚDE MENTAL | Ana Querido1 |

Enquanto há vida, há esperança!... As palavras sábias de Cícero que frequentemente utilizamos e que escutamos na nossa vivência diária são ilustradoras da dimensão universal da esperança. Inerente à vida humana, a esperança, ou a falta dela, aparece associada às várias dimensões da nossa existência na esfera pessoal, profissional, familiar e social, assumindo especial relevância na saúde mental. A esperança é frequentemente considerada um conceito fronteira, não sendo pertença de uma só disciplina, mas que, nas suas variadas facetas, diferentes abordagens teóricas, diversas estratégias de investigação com diferentes resultados, se revela um fenómeno multifacetado, multidimensional e transversal, com múltiplos significados. Reconhecendo a transversalidade da esperança à Filosofia, Teologia, Psicologia e Medicina, assumimos o conceito como uma área de estudo de Enfermagem e mais especificamente da Enfermagem de Saúde Mental. As suas referências este âmbito específico remontam a Vaillot no início dos anos setenta do séc. XX, defendendo a promoção da esperança como uma prática específica dos enfermeiros e sustentada posteriormente pelo modelo multidimensional de Dufault e Martocchio (1985), que abriu novas perspetivas na sua compreensão e avaliação, dando possibilidade à exploração de diferentes abordagens de intervenção (Cutcliffe, 2009). Enquanto foco de atenção da prática de Enfermagem, a esperança é definida como o sentimento de ter possibilidades, confiança nos outros e no futuro, entusiasmo pela vida, expressão de razões para viver e de desejo de viver, paz interior, otimismo; estando associada ao traçar de objetivos e mobilização de energia (International Council of Nurses [ICN], 2015). A esperança é um processo dinâmico, orientada para o futuro, mas atendendo ao passado e vivida no presente, implicando o estabelecimento e alcance de objetivos que, para a pessoa, sejam significativos. Ajudar os indivíduos e as suas famílias a encontrar significado no sofrimento e a manter um sentido de construção da esperança é um aspeto comum aos cuidados de Enfermagem e promover a esperança adequada

enquanto agente terapêutico deve ser uma preocupação de todos os enfermeiros independentemente da sua especialidade (Jones, 2007). Não obstante, esperança e desesperança constituem determinantes importantes da saúde mental. Enquanto a desesperança é um diagnóstico de Enfermagem e sintoma-chave da depressão e dos comportamentos suicidários (World Health Organization [WHO], 2010), a maioria das pessoas pode recuperar da doença mental através da promoção da esperança (O’ Sullivan, 2010) enquanto intervenção específica de Enfermagem. A esperança tem uma influência positiva na saúde mental das pessoas, no aumento do conforto e da qualidade de vida e na redução da depressão e suicídio, da redução da predisposição para a dependência e prevenção da exaustão familiar, com efeito preditivo no bem-estar subjetivo e protetor da saúde mental (Querido & Dixe, 2016). A promoção da esperança realista e a definição de objetivos é recomendada como princípio de boa prática clínica na abordagem das pessoas com distúrbios mentais e considerada uma intervenção efetiva no âmbito do apoio psicossocial nas situações de perturbações psicóticas (WHO, 2010). A sua relevância é também reconhecida no processo de recovery, onde aconselhar sobre esperança é uma intervenção específica de enfermagem que envolve o readquirir força, estabelecer saúde, a condição normal ou modo de vida das pessoas com doença mental, sobretudo em situações de ameaça e incerteza, quando os recursos pessoais estão esgotados (Herrman, Shaxena e Moodie, 2005; ICN, 2015). São ainda conhecidos efeitos positivos na esperança das pessoas com esquizofrenia, depressão e comportamentos da esfera suicidária. Parece ser consensual que os enfermeiros especialistas em saúde mental e psiquiatria têm um papel fundamental na esperança das pessoas, apoiando o uso de estratégias de manutenção e promoção de esperança e capacitando-as para enfrentarem os desafios complexos inerentes aos problemas de saúde mental (Cutcliffe, 2009; WHO, 2004). A questão fulcral que muitas vezes se coloca é: como? Daqui surgem três desafios: Como identificar? Como diagnosticar? Como intervir?

1 Enfermeira especialista em Enfermagem de Saúde Mental e Psiquiátrica; Mestre em Cuidados Paliativos; Doutora em Enfermagem; Investigadora Colaboradora no CINTESIS – Centro de Investigação em Tecnologias e Serviços de Saúde, grupo de investigação “NursID: Inovação & Desenvolvimento em Enfermagem”; Colaboradora do ciTechCare; Professora Adjunta na Escola Superior de Saúde do Instituto Politécnico de Leiria, Campus 2, Leiria, Portugal, ana.querido@ipleiria.pt Citação: Querido, A. (2018). A esperança como foco de enfermagem de saúde mental. Revista Portuguesa de Enfermagem de Saúde Mental (Spe. 6), 06-08. doi: 10.19131/ rpesm.0206 Revista Portuguesa de Enfermagem de Saúde Mental, ESPECIAL 6 (OUT.,2018) | 6


A identificação da esperança é o primeiro desafio que se coloca ao enfermeiro. Importa para isso, conhecer os modelos e teorias que a definem em enfermagem em saúde mental. Já abordámos o Modelo de Dufault e Martochio (1985) que concetualizaram a esperança em seis dimensões: afetiva (sentimentos e emoções), cognitiva (objeto desejado e resultado pretendido), comportamental (orientação para a ação e motivação), contextual, afiliativa (interação social e autotranscendência), temporal (tempo passado, presente e futuro) e contextual (circunstâncias e situações de vida). Incluímos ainda a teoria de esperança de Snyder que, em linha com a teoria de Bandura afirmam que a ação do indivíduo é determinante para a concretização dos objetivos em termos da potencialidade da ação e de capacidade para o resultado (por ex: “eu posso e eu irei fazer isto”) com ênfase na criação de caminhos alternativos e estratégias específicas para atingir determinados objetivos (Snyder, 2000). Na posse deste conhecimento, cabe ao enfermeiro escutar o outro identificando focos de desesperança / esperança: “já não vale a pena…” “Deixei de acreditar…”; “tudo está perdido…” “Já não sou mais nada…” ou “vivemos um dia de cada vez…” . “Isto vai lá… só não sei como…”, “a esperança é a última a morrer…” são alguns exemplos de expressões verbais profundamente marcadas pela esperança e que são expressões indicadores de necessidade de esperança. No mesmo sentido, expressões não verbais de suspiros, tristeza, perda de iniciativa, passividade na prestação de cuidados são indicadores da mesma necessidade. O segundo desafio que se coloca aos enfermeiros é como diagnosticar a esperança. Sendo um foco do foro emocional, subjetivo e altamente individualizado, implica uma avaliação com recurso a instrumentos específicos para tal. Uma das formas de avaliar a esperança é através do recurso à entrevista clínica, semiestruturada, com recurso a questões abertas no sentido de caracterizar a esperança, identificar objetos de esperança, identificar recursos, ameaças. Questões como “Quando ouve a palavra “esperança”, que imagem ou ideia lhe ocorre?”, “Como descreve a esperança na sua vida?”, “De que forma a situação de doença que vive neste momento, afeta a sua esperança?”, “Se pudesse identificar uma fonte de esperança para si, o que seria?”, “O que o ajuda a manter a esperança, ou o que o faz sentir desesperado?”, “O que espera no futuro?” (Querido, 2013) constituem exemplos de narrativas para avaliar a esperança reconhecidas na literatura como “Hope Communication Tool” (Olsman, Leget & Willems, 2015).

A Escala de Esperança de Herth - PT é um instrumento de avaliação validado para a população portuguesa de pessoas com doença crónica adequado para avaliar e quantificar a esperança da pessoa (Querido, 2013) e também o genograma de esperança e ecomapa de esperança constituem importantes instrumentos para avaliação e compreensão dos vínculos de esperança e padrões de interação da família (Charepe, Figueiredo, Vieira & Neto, 2011). O terceiro e último desafio para o enfermeiro de saúde mental é a intervenção na promoção da esperança. Manter a esperança em situações de adversidade e na presença de sofrimento mental, requer uma gestão das condições facilitadoras e inibidoras da esperança, num equilíbrio que pode ser muito difícil conseguir sem a ajuda de profissionais competentes. Na ótica de Cutcliffe (2006), os enfermeiros inspiram e promovem esperança cuidando a pessoa de modo holístico, tendo em conta o seu bem-estar, num contexto de aliança terapêutica de parceria, sustentada no reconhecimento da pessoa cuidada e afirmação do seu valor. Assim, os enfermeiros de saúde mental podem desempenhar um papel de charneira na promoção da esperança junto dos seus clientes no âmbito da relação terapêutica que se pretende promotora de esperança. Uma relação terapêutica promotora de esperança pressupõe que o enfermeiro faça uso terapêutico de si próprio no sentido de se utilizar como instrumento de intervenção no desocultar da esperança do outro e poder intervir na sua promoção. Neste sentido a autoanálise e permite a autoconsciencialização dos próprios valores, sentimentos e perceções sobre a esperança do enfermeiro de modo a que estes não interfiram na relação. A promoção da esperança ocorre por isso no âmbito da relação nas diferentes etapas da relação definidas por Peplau. Na etapa de orientação no desempenho do papel de pessoa estranha a esperança deve ser utilizada de modo implícito ainda que intencional, em que a primazia deverá ser dada à identificação da esperança na narrativa do cliente; A etapa de identificação e exploração da relação é propícia à identificação de atributos de esperança e objetivos realistas, incorporada na negociação do plano terapêutico. A esperança como fator de resiliência pode ser explorada pelo enfermeiro utilizando técnicas de comunicação terapêutica centradas na narrativa de esperança, com expressões verbais que estimulam a potencialidade do cliente, no desempenho o papel de conselheiro e de pessoa de recurso.

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A promoção da esperança faz-se com as intervenções de identificar e apoiar as potencialidades e as forças; Ensino de estratégias de reenquadramento cognitivo, reforçar a autoeficácia e as capacidades do próprio cliente. A utilização de atividades terapêuticas promotoras de esperança pode incluir a identificação de símbolos de esperança, elaboração de diários e kits de esperança, planificação de objetivos e vias de os atingir. Na etapa de resolução a promoção da esperança passa pela utilização de cartas terapêuticas de alta. A promoção da esperança enquanto foco de enfermagem é imperativa na prática do enfermeiro especialista em enfermagem de saúde mental, no sentido de assistir e apoiar os clientes no uso de estratégias de esperança na capacitação para a gestão da complexidade dos problemas mentais. Não obstante este reconhecimento do papel do enfermeiro especialista em saúde mental na capacitação para a esperança, a forma como ela se desenvolve nos contextos da prática especializada carece de evidência e visibilidade. Acreditamos que um adequado treino e desenvolvimento de competências na área da promoção da esperança poderá impulsionar a transferência do conhecimento para os contextos de intervenção dos enfermeiros no sentido de contribuírem para a otimização da saúde mental das pessoas.

Herrman, H., Shaxena, S., & Moodie, R. (2005). Promoting mental health: Concepts, emerging evidence, practice. A report of the World Health Organization, Department of Mental Health and Substance Abuse in collaboration with the Victorian Health Promotion Foundation and The University of Melbourne. Genebra: WHO.

REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS

Querido, A., & Dixe, M. A. (2016). A esperança na saúde mental: Uma revisão integrativa da literatura. Revista Portuguesa de Enfermagem de Saúde Mental (3), 95-101. doi: 10.19131/rpesm.0124

Charepe, Z. B., Figueiredo, M., Vieira, M., & Neto, L. (2011). (Re)discovering hope in families of children with chronic disease through genogram and ecomap [Portuguese]. Texto & Contexto Enfermagem, 20(2), 349-358. doi: 10.1590/S0104-07072011000200018 Cutcliffe, J. R. (2006). The principles and processes of inspiring hope in bereavement counselling: A modified grounded theory study - Part one. Journal of Psychiatric and Mental Health Nursing, 13(5), 598.603. doi: 10.1111/j.1365-2850.2006.01019.x Cutcliffe, J. (2009). Hope: The eternal paradigm for psychiatric/mental health nursing. Journal of Psychiatric and Mental Health Nursing, 2009(16), 843-847. doi: 10.1111/j.1365-2850.2009.01490.x Dufault, K., & Martocchio, B. (1985). Hope: Its spheres and dimensions. Nursing Clinics of North America, 20(2), 379-391. Revista Portuguesa de Enfermagem de Saúde Mental, ESPECIAL 6 (OUT.,2018) | 8

International Council of Nurses. (2015). CIPE® Versão 2015 – Classificação Internacional Para a Prática de Enfermagem. Lisboa: Ordem dos Enfermeiros. Jones, A. (2007). Relevant hope to promote therapeutic change. Mental Health Nursing, 27(3), 14-15. Olsman, E., Leget, C., & Willems, D. (2015). Palliative care professionals’ evaluations of the feasibility of a hope communication tool: A pilot study. Progress in Palliative Care, 23(6), 321-326. doi: 10.1179/1743291X15Y.0000000003 Querido, A. (2013). A promoção da esperança em fim de vida: avaliação da efetividade de um programa de intervenção em pessoas com doença crónica avançada e progressiva (Tese de Doutoramento). Lisboa: Universidade Católica Portuguesa.

Snyder, C. R. (ed.) (2000). Handbook of hope: Theory, measures, and applications. San Diego, CA, US: Academic Press. World Health Organization. (2004). Factsheet ‘nursing matters: Developing nursing resources for mental health’. Genebra: WHO. World Health Organization. (2010). mhGAP intervention guide for mental, neurological and substance use disorders in non-specialized health settings, version 1.0. Genebra: WHO.


Artigo de Investigação

2

Disponível em http://dx.doi.org/10.19131/rpesm.0207

A IMPORTÂNCIA DA RESILIÊNCIA E DE UM SUPORTE SOCIAL EFETIVO NA VIVÊNCIA DA GRAVIDEZ E MATERNIDADE PRECOCES | Inês Esteves1; Isabel Bica2; Madalena Cunha3; Graça Aparício4; Manuela Ferreira5; Maria Helena Martins6 |

RESUMO INTRODUÇÃO: Estudo baseado no processo de intervenção de uma família que vivenciou uma gravidez e maternidade adolescente, não planeada, fruto de uma relação ocasional através de correspondência virtual. A resiliência constitui uma das variáveis descritas na literatura que parece conferir proteção para a adaptação à maternidade e que interfere no processo de vinculação. OBJETIVO: Avaliar a influência da resiliência e de um suporte social efetivo numa adolescente que tenha experienciado gravidez e/ou maternidade precoces. METODOLOGIA: Estudo de caso não experimental, qualitativo, de follow-up. Avaliação e intervenção familiar desenvolvida em 3 momentos distintos, tendo sido utilizados como instrumentos de recolha de dados: entrevista, questionários, escalas e observação, tendo como referencial teórico-operativo o Modelo Dinâmico de Avaliação e Intervenção Familiar (Figueiredo, 2013). RESULTADOS: Numa primeira fase: Relação conflituosa com os progenitores, prévia à gestação precoce. No final da mesma, a jovem interrompe o seu percurso escolar. Após o parto, verificou-se uma (in)definição do papel parental: a avó exercia um papel superprotetor sobre o recémnascido, sobrepondo-se à mãe nas diversas esferas (prestação de cuidados, vinculação). Follow-up: Exercício do papel parental da adolescente adequado, sem sobreposição de papéis. Vinculação forte e saudável entre jovem mãe e filho. Recém-nascido bem cuidado. Adolescente resiliente e satisfeita com o apoio que recebe da comunidade envolvente. Retoma o seu percurso escolar, pessoal, familiar e social. CONCLUSÕES: Mães adolescentes que beneficiam de um apoio social e familiar adequado, e que possuem fatores protetores de ordem individual e relacional conseguem atingir um nível favorável de adaptação à maternidade.

PALAVRAS-CHAVE: Gravidez; Adolescente; Família; Resiliência psicológica; Ajustamento emocional

RESUMEN

ABSTRACT

“La importancia de la resiliencia y de un soporte social efectivo en la vivencia del embarazo y maternidad precoces”

“The importance of resilience and effective social support in the experience of early pregnancy and motherhood”

INTRODUCCIÓN: Estudio basado en el proceso de intervención de una familia que vivió un embarazo y maternidad adolescente, no planeada, fruto de una relación ocasional a través de correspondencia virtual. La resiliencia constituye una de las variables descritas en la literatura que parece conferir protección para la adaptación a la maternidad y que interfiere en el proceso de vinculación. OBJETIVO: Evaluar la influencia de la resiliencia y de un soporte social efectivo en una adolescente que haya experimentado embarazo y / o maternidad precoces. METODOLOGIA: Estudio de caso no experimental, cualitativo, de seguimiento. La evaluación e intervención familiar desarrollada en 3 momentos distintos, habiendo sido utilizados como instrumentos de recogida de datos: entrevista, cuestionarios, escalas y observación, teniendo como referencial teórico-operativo el Modelo Dinámico de Evaluación e Intervención Familiar (Figueiredo, 2013). RESULTADOS: En una primera fase: Relación conflictiva con los progenitores, previa a la gestación precoz. Al final de la misma, la joven interrumpe su recorrido escolar. Después del parto, se verificó una (in) definición del papel parental: la abuela ejercía un papel superprotector sobre el recién nacido, superponiéndose a la madre en las diversas esferas (prestación de cuidados, vinculación). Seguimiento: Ejercicio del papel parental de la adolescente adecuado, sin superposición de papeles. Vinculación fuerte y saludable entre joven madre y hijo. Recién nacido bien cuidado. Adolescente resiliente y satisfecha con el apoyo que recibe de la comunidad circundante. Retoma su recorrido escolar, personal, familiar y social. CONCLUSIONES: Las madres adolescentes que se benefician de un apoyo social y familiar adecuado, y que poseen factores protectores de orden individual y relacional logran alcanzar un nivel favorable de adaptación a la maternidad.

BACKGROUND: Study based on the intervention process of a family that experienced an unplanned adolescent pregnancy and motherhood, as a result of an occasional relationship through virtual correspondence. Resilience is one of the variables described in the literature that seems to confer protection for adaptation to motherhood and that interferes in the bonding process. OBJECTIVE: Evaluating the influence of resilience and effective social support in an adolescent who has experienced early pregnancy and / or maternity. METHODS: Non-experimental, qualitative, follow-up case study. Evaluation and family intervention developed in 3 different moments, using as data-gathering instruments: interview, questionnaires, scales and observation, using as a theoretical-operational reference the Dynamic Model of Family Assessment and Intervention (Figueiredo, 2013). RESULTS: In a first phase: Conflict relationship with the parents, prior to the early gestation. At the end of it, the young woman interrupts her school journey. After parturition, there was an (in) definition of the parental role: the grandmother played an overprotective role over the newborn, overlapping the mother in the various spheres (care, bonding). Follow-up: Adequate adolescent parental role exercise, without overlapping roles. Strong and healthy bonding between young mother and son. Well-baby newborn. Teen resilient and satisfied with the support she receives from the surrounding community. It resumes its school, personal, familiar and social journey. CONCLUSIONS: Adolescent mothers who benefit from adequate social and family support and who have protective factors of an individual and relational nature manage to reach a favorable level of adaptation to motherhood.

DESCRIPTORES: Embarazo; Adolescente; Familia; Resiliencia psicológica; Ajuste emocional

Submetido em 30-12-2017 Aceite em 26-03-2018

KEYWORDS: Pregnancy; Adolescent; Family; Resilience; Emotional adjustment

1 Enfermeira; Estudante de Mestrado em Enfermagem de Saúde Infantil e Pediatria na Escola Superior de Enfermagem do Porto; Investigadora no Center for Health Technologies Services Research (CINTESIS, inesmartinsesteves@gmail.com 2 Investigadora no CI&DETS; Investigadora no Center for Health Technologies Services Research (CINTESIS); Professora Adjunta no Instituto Politécnico de Viseu, Escola Superior de Saúde de Viseu, 3500-843 Viseu, Portugal, isabelbica@gmail.com 3 Investigadora no CI&DETS; Professora Coordenadora no Instituto Politécnico de Viseu, Escola Superior de Saúde de Viseu, 3500-843 Viseu, Portugal, madac@iol.pt 4 Investigadora no CI&DETS; Professora Coordenadora no Instituto Politécnico de Viseu, Escola Superior de Saúde de Viseu, Portugal, gaparicio5@hotmail.com 5 Investigadora no CI&DETS; Professora Coordenadora no Instituto Politécnico de Viseu, Escola Superior de Saúde de Viseu, 3500-843 Viseu, Portugal. 6 Professora Coordenadora na Universidade do Algarve, 8005-139 Faro, Portugal, mhmartin@ualg.pt Citação: Esteves, I., Bica, I., Cunha, M., Aparício, G., Ferreira, M., & Martins, M. H. (2018). A importância da resiliência e de um suporte social efetivo na vivência da gravidez e maternidade precoces. Revista Portuguesa de Enfermagem de Saúde Mental (Spe. 6), 09-16. doi: 10.19131/rpesm.0207 Revista Portuguesa de Enfermagem de Saúde Mental, ESPECIAL 5 (AGO.,2017) | 9

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INTRODUÇÃO A gravidez na adolescência adquiriu, sobretudo nos últimos 50 anos, o estatuto de problema social e de saúde pública nas sociedades desenvolvidas, particularmente nos países ocidentais, a cuja realidade se reporta (Canavarro & Pedrosa, 2012). Quando se fala em gravidez na adolescência não se deve ter apenas em conta os aspetos biológicos que se traduzem num impacto direto na vida da mãe e do bebé, mas também se deve compreender os fatores que estão na base da decisão do prosseguimento (ou não) da gravidez. Atualmente, há uma tendência em relacionar estas diferenças com as desvantagens do meio social e familiar e não com as características biológicas decorrentes da idade da jovem [(Canavarro & Pedrosa (2012); Baker, Guthrie, Hutchinson, Kane & Wellings (2007); Figueiredo, Pacheco, Costa, & Magarinho (2006); Gupta, Kiran & Bahl (2008); Klein (2005)]. Os fatores que podem influenciar a decisão reprodutiva podem ser divididos em individuais (idade da adolescente, competências cognitivas da adolescente, autonomia no processo de decisão e padrão contracetivo prévio), sociais (contexto social, características familiares, envolvimento escolar e religioso) e ambientais (local de residência) (Pires, Pereira, Pedrosa, Vilar, Vicente & Canavarro, 2015). Nestes contextos, a adolescente que engravida e se decide pela maternidade necessita de desempenhar determinadas tarefas e papéis, mesmo sem que esteja ainda preparada do ponto de vista cognitivo, emocional, social e desenvolvimental para tal (Figueiredo B., 2001). Estas adolescentes, além de lidarem com as tarefas desenvolvimentais requeridas nesta etapa, têm ainda de lidar com acontecimentos indutores de stress associados à gravidez e à maternidade. Realce-se que, nesta fase, as estratégias de coping para lidar com o stress ainda se encontram em desenvolvimento, pelo que a colisão de tarefas desenvolvimentais tão distintas motivam dificuldades acrescidas para a sua resolução (Dell, 2001; Drake, 1996; Soares, Marques, Martins, Figueiredo, Jongenelen, & Matos, 2001; Pedrosa, 2009; Canavarro & Pedrosa, 2012). Canavarro & Pedrosa (2012) defendem que a ocorrência de uma gravidez na adolescência não significa, inevitavelmente, que a mesma seja um desafio insuperável e conducente a situações de dano e desadaptação. Revista Portuguesa de Enfermagem de Saúde Mental, ESPECIAL 6 (OUT.,2018) | 10

Os resultados de maior ou menor sucesso na adaptação dependem, em grande parte, dos contextos em que a gestação e o nascimento ocorrem e do grau de apoio disponível para a jovem e para o seu filho (Canavarro, 1999; Shields & Pierce (2006); Beers & Hollo, 2009; Luster & Bates, 2002; Miller et al., 2004, cit. in Canavarro & Pedrosa, 2012). Para Figueiredo, B. (2001), cit. in Canavarro, & Pedrosa (2012, p. 41), os sucessivos enquadramentos conceptuais da maternidade na adolescência referem-se principalmente a dois aspetos: à compreensão dos seus antecedentes (fatores de risco) e à verificação das suas consequências (impacto desenvolvimental). Atualmente, tem sido dada particular importância não só aos fatores de risco e à sua interação, como também aos fatores protetores, determinantes muitas vezes, para um ajustamento adequado à gravidez precoce (Quadro 1.) Quadro 1 - Fatores de risco e fatores de proteção para um ajustamento adequado à gravidez precoce

Constituem fatores de risco para a ocorrência de uma gravidez na adolescência (cf. Quadro 1): (1) o facto da adolescente viver num ambiente familiar disfuncional e rígido (caracterizado por stress, pressão e conflitos); (2) menor supervisão e suporte parental, alicerçada num ambiente familiar desestruturado; (3) (4) vivenciar situação de pobreza e exclusão do sistema de ensino ou emprego; (5) vivência de situações de abuso sexual; (6) início precoce de atividade sexual, utilização ineficaz de métodos contracetivos e/ou consumo de álcool e drogas. Como principal fator de proteção para a gravidez precoce encontra-se a resiliência. Entende-se por resiliência o processo através do qual se pode conseguir uma adaptação positiva mesmo antes do confronto com situações adversas (Canavarro & Pedrosa, 2012). Os contextos sociofamiliares são também determinantes na adaptação para a parentalidade da adolescente.


A perceção do apoio social e familiar constitui uma ação protetora dos riscos associados à maternidade precoce, uma vez que reduz a ansiedade associada à gravidez per si e ao desempenho das tarefas da maternidade, promovendo responsividade, sensibilidade e expressão de afeto para com o seu filho. Uma relação positiva com o pai do bebé é promotora da qualidade do ajustamento à gravidez. As características do grupo de pares tanto podem constituir um fator de proteção, pois é uma fonte de partilha de experiências e vivências, como fator de vulnerabilidade, pois a existência de comportamentos sexuais de risco no grupo de pares pode contribuir para incentivar e validar a adesão a essas práticas. Gravidez na Adolescência: Implicações Individuais, Familiares e Sociais A gravidez na adolescência é considerada um problema emergente da área de saúde não só pelas implicações que dela advêm a nível físico, mas também pelas implicações a nível emocional, social, cultural, económico e familiar. A nível emocional, as adolescentes que se tornam mães enfrentam múltiplas mudanças nos seus papéis sociais e relacionais. Frequentemente confrontam-se com a necessidade de aceitar as novas responsabilidades parentais e de resolver as suas tarefas desenvolvimentais divergentes. O modo como a adolescente, a família e as figuras significativas da sua rede social conseguem negociar estes desafios será crítico para a adaptação e desenvolvimento da jovem mãe e do seu bebé. Embora se trate de uma situação geradora de angústia inicialmente, acaba por mobilizar toda a família, desencadeando uma rede de apoio não só financeiro, mas também emocional (Leite & Bohry, 2012; Silva, Lamy, Rocha, Mendonça & Lima, 2014). O impacto da gravidez precoce no sistema familiar traduz-se em mudanças na dinâmica relacional entre os vários membros da família. A situação mais frequente é a coabitação da jovem mãe e do seu filho com a sua própria família nuclear ou alargada, ou com a do pai do bebé (East, 1998; East & Jacobson, 2000). Não obstante, salienta ainda a emergência de “paisavós” que, pela necessidade premente de prestar cuidados ao recém-nascido, acabam por dificultar o processo de autonomia e crescimento da adolescente enquanto mãe.

A nível social, a adolescente também sofre perdas, como sejam o abandono ou interrupção escolar ou até um início de vida profissional precário e mal remunerado, com a agravante de, nalgumas situações, o pai do bebé se desresponsabilizar e desinteressar por todos os aspetos respeitantes à esfera do seu filho (Carmona, 2012, p. 18). Tornar-se mãe irá ainda implicar, para a adolescente, mudanças significativas nas suas atividades e estilo de vida, particularmente se as relações com os pares e o grupo de amigos eram parte importante das rotinas (Beers & Hollo, 2009). O envolvimento nas tarefas parentais traduz-se, frequentemente, em menor disponibilidade para atividades de lazer, e mesmo, para atividades letivas ou profissionais, o que pode acarretar maior insatisfação com a vida em geral por parte das adolescentes com história de gravidez (Burke & Liston, 1994). Assim, uma gravidez na adolescência pode ser promotora de uma interrupção do desenvolvimento global, desorganizando a vida da adolescente e da restante família e desencadear problemas psicossociais relevantes. Apesar de todas as implicações nas diferentes esferas/ domínios da vida da adolescente e pessoas que lhe são mais próximas, Fonseca (2012) conclui que a prevalência tão elevada da gravidez adolescente não se justifica pelo desconhecimento acerca de métodos contracetivos, mas sim pela ausência de um projeto de vida nos adolescentes. Problema em Estudo O estudo teve por base o processo de intervenção de uma família que vivenciou uma gravidez e maternidade adolescente, não planeada e não vigiada até às 24 semanas de gestação, fruto de uma relação ocasional através de correspondência virtual. Questão de Investigação Definiu-se como questão geral de investigação “qual a influência da resiliência e de um suporte social efetivo numa adolescente que tenha experienciado gravidez e/ou maternidade precoces?” Objetivo O principal objetivo do estudo é avaliar a influência da resiliência e de um suporte social efetivo numa adolescente que tenha experienciado gravidez e/ou maternidade precoces. Revista Portuguesa de Enfermagem de Saúde Mental, ESPECIAL 6 (OUT.,2018) | 11


METODOLOGIA Trata-se de um estudo de caso não experimental, qualitativo descritivo. Relativamente ao tempo em que este decorre, é do tipo longitudinal ou de followup, tendo decorrido num horizonte temporal de maio de 2016 a junho de 2017, em três momentos distintos: inicialmente (para vigilância da gravidez), um mês (no pós-parto imediato) e um ano após o início do estudo (follow-up). Os dados apresentados reportamse aos resultados do estudo de follow-up. Para a sua realização foram utilizados os seguintes instrumentos de recolha de dados: entrevista, questionários e escalas – tendo por base o Modelo Dinâmico de Avaliação e Intervenção Familiar (Figueiredo, 2013), como referencial teórico e operativo – e ainda a observação. A tipologia de entrevista adotada no follow-up foi do tipo estruturada, com o objetivo de aplicar alguns instrumentos que permitissem a avaliação familiar (nomeadamente o genograma). Os dados obtidos durante a entrevista foram transcritos durante a mesma, sem recurso a gravação de áudio ou imagem. Os restantes instrumentos de recolha de dados (questionário e escalas) foram entregues em envelope fechado, a cada um dos participantes. O questionário foi dividido de acordo com a matriz operativa do MDAIF em diferentes dimensões. Ao nível da dimensão funcional, importante para a problemática em estudo, utilizaram-se a Apgar Familiar (Smilkstein, 1978), Escala de Satisfação com o Suporte Social (Pais-Ribeiro, 1999) e o instumento Healthy Kids Resilience Assessment Module, versão 6.0 (Constantine, & Benard, 2001; adaptado para português por Martins, 2002). O Apgar Familiar revela como os membros de uma determinada família percecionam o funcionamento da unidade familiar, na sua globalidade. É uma escala tipo Likert com possibilidades de resposta quase nunca, algumas vezes e quase sempre, sendo que o score de cada pergunta varia entre 0 e 2 pontos, respetivamente. Ao score total corresponde uma perceção da funcionalidade familiar: entre 7-10 pontos, família altamente funcional; entre 4-6 pontos, família moderadamente funcional e entre 0-3, família disfuncional. A Escala de Satisfação com o Suporte Social avalia as necessidades de suporte social e o grau de satisfação dos participantes relativamente aos seus familiares, amigos e atividades sociais desenvolvidas. Revista Portuguesa de Enfermagem de Saúde Mental, ESPECIAL 6 (OUT.,2018) | 12

É constituída por 15 itens, de resposta tipo Likert, com cinco opções de resposta. A cotação para a escala total varia entre 15 e 75 - quanto mais alta, maior o suporte social. O instrumento Healthy Kids Resilience Assessment Module é constituído originalmente por 58 questões e destina-se à avaliação e compreensão multidimensional dos fatores protetores e os traços de resiliência, nomeadamente fatores externos e internos (external and internal assets) para além de response-set breakers. Esta escala encontra-se dividida em subescalas do tipo Likert de quatro pontos, variando num continuum de totalmente falso (1 ponto), um pouco certo (2 pontos), bastante certo (3 pontos) e muito certo (4 pontos). No estudo foram utilizados apenas os traços de resiliência (internal assets), que se dividem em seis grupos: a cooperação e competências de comunicação, a autoeficácia, a empatia, as competências de resolução de problemas, a autoconsciência e os objetivos e aspirações. A sua pontuação varia entre 18 e 72 quanto maior o score obtido, maior a resiliência da adolescente face às adversidades. Foi utilizada uma versão para a adolescente, outra para pais e irmãos e equipa de enfermagem de Saúde Familiar. Participantes Os participantes que fazem parte deste estudo constituem uma amostra não aleatória, por conveniência. A inclusão dos participantes em estudo obedeceu aos seguintes critérios: família com filhos adolescentes; idade superior a 14 anos; um dos membros da família ser do sexo feminino com idade compreendida entre 14 e os 18 anos (exclusivé) que tenha experienciado a gravidez e/ou maternidade na adolescência. Assim, a família Fernandes é constituída pela jovem em estudo, Maria (M.F., sexo feminino, 17 anos), pelo seu filho Simão, (S.F., sexo masculino, um ano de idade), pelos seus irmãos Pedro (P.F., sexo masculino, 22 anos) e Carlos (C.F., sexo masculino, 16 anos) e pelos seus pais Paulo (P.F., sexo masculino, 48 anos) e Rita (R.F., sexo feminino, 44 anos) (Fig. 1). Figura 1 - Genograma da Família (maio de 2017)


Procedimentos Após a seleção dos instrumentos de colheita de dados, procedeu-se ao contacto com os autores, solicitando autorização para aplicação das diferentes escalas. Em relação à recolha de informação, sobre a família em estudo, e para a obtenção de dados relativos à vida privada e/ou dados de saúde, foram solicitadas autorizações à Comissão Nacional de Proteção de Dados, à Comissão de Ética da Administração Regional de Saúde do Centro e à Unidade em que foi realizado o estudo. Previamente, foi solicitada a colaboração da Unidade de Saúde em que se pretendia realizar o estudo, de forma a intermediar um primeiro contacto com a família. Só após o consentimento da família nesse contacto, é que as investigadoras contactaram os diferentes elementos da mesma. Todos os dados obtidos são de carater confidencial e o anonimato foi garantido com recurso a nomes fictícios. Os destinatários foram informados, no primeiro contacto, acerca da natureza facultativa da sua participação e da garantia da confidencialidade e anonimato. Os membros da família que aceitaram participar no estudo, assinaram um consentimento livre e esclarecido RESULTADOS Indo de encontro à problemática em estudo, apenas serão explicitados os resultados relativos à funcionalidade familiar. Contudo, para facilitar a compreensão do mesmo, importa perceber a estrutura e relações familiares. Após a intervenção da equipa multiprofissional, a família Fernandes tornou-se estrutural, organizacional e dinamicamente mais competente. De forma a compreender o impacto das intervenções de enfermagem no funcionamento familiar, decidiuse aplicar os seguintes instrumentos de recolha de dados: Escala Apgar Familiar, Escala de Satisfação com o Suporte Social e a Healthy Kids Resilience Assessment Module (versão 6.0). Em primeiro lugar foi utilizada a Escala de Apgar Familiar de Smilkstein (1978), com objetivo na compreensão de aspetos fundamentais do funcionamento familiar, como a coesão, a adaptabilidade da família e a perceção dos seus membros sobre a funcionalidade da mesma. A jovem em estudo, considerou a sua família como altamente funcional (score 8), referindo que se encontra quase sempre satisfeita em todos os pontos a que esta Escala faz referência.

Em segundo lugar, foi aplicada a Escala de Satisfação com o Suporte Social, de Pais-Ribeiro (1999). Descrevem-se na próxima tabela (Tabela 1), os resultados obtidos, após o preenchimento da mesma pela jovem em estudo. Tabela 1 - Classificação obtida no processo de recolha de dados e intervenção terapêutica, com a utilização do instrumento Escala de Satisfação com o Suporte Social Satisfação com os amigos

Intimidade

(máx. 25 pontos)

(máx. 20 pontos)

23

15

Atividades Satisfação sociais com a Família (máx. 15 (máx. 15 pontos)

14

pontos)

4

Na dimensão “Satisfação com os amigos” a jovem considera-se satisfeita com as suas amizades e com a forma como estas a apoiam. Na segunda dimensão, “Intimidade”, a jovem considera que na maior parte das vezes tem em seu redor um suporte social onde pode desabafar sobre coisas íntimas. Relativamente à “Satisfação com a Família”, a adolescente considera-se satisfeita com a forma como se relaciona com a família e com o tempo passado com a mesma. Por último, mas não menos importante, na dimensão “Atividades Sociais”, a jovem não se encontra satisfeita com as atividades sociais que realiza, pelo tempo e recursos que a maternidade lhe exige. Contudo, menciona que gostaria de sair mais com os amigos e participar mais em atividades de organizações, como clubes e desporto. A pontuação total da escala, englobando as quatro dimensões foi de 56 pontos. Este valor traduz que a adolescente se encontra, de forma geral, satisfeita com o suporte social existente ao seu redor. Por último, foi utilizada a Healthy Kids Resilience Assessment Module (Version 6.0), para a avaliação da resiliência da adolescente, em particular os fatores de resiliência - recursos internos (empatia, resolução de problemas e autoconhecimento). Esta escala foi preenchida pela jovem, pelos pais da jovem e pelos enfermeiros que intervieram e acompanharam o Estudo. A pontuação obtida nos diferentes participantes encontra-se na tabela seguinte (Tabela 2). Tabela 2 - Classificação obtida no processo de recolha de dados e intervenção terapêutica, com a utilização do instrumento Healthy Kids Resilience Assessment Module (version 6.0.).

Maria

Pais de Maria

Enfermeiro 1

Enfermeiro 2

51

41

40

41

Enfermeiro 3 40 pontos

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Enquanto que a família e a equipa de enfermagem percecionam a jovem com dificuldades em lidar com os problemas que vão surgindo, em adaptar-se às mudanças e superar os efeitos adversos em determinadas situações (cf. Tabela 2), a jovem autoperceciona a sua resiliência de forma mais positiva: considera que na maior parte das situações é capaz de enfrentar os problemas e as mudanças que lhe vão surgindo. Antes e durante a gravidez, a jovem não tinha ferramentas necessárias no seu desenvolvimento para resolver os seus problemas, pelo que evitava procurar ajuda e falar acerca dos seus problemas com os outros. No entanto, a maternidade e o processo de intervenção dos enfermeiros, capacitaram a jovem para o enfrentamento e resolução dos problemas. Atualmente, a jovem sabe onde encontrar ajuda (nomeadamente, no Centro de Saúde e em casa) e se necessário conversa com a mãe e/ou com a equipa de enfermagem sobre os seus problemas. Em suma, poder-se-á concluir que, na sua generalidade, as intervenções no âmbito da funcionalidade familiar obtiveram sucesso. DISCUSSÃO DOS RESULTADOS A investigação levada a cabo pelas autoras demonstra que as vivências e o ajustamento à gravidez e maternidade estão relacionados com o contexto familiar e ambiental de cada adolescente. Tal vai de encontro à opinião de Figueiredo, B. (2006), que salienta o apoio e as relações atuais com a família como elementos chave no ajustamento à gravidez. Dimensão Funcional Maria (nome fictício), considera, atualmente, a sua família como altamente funcional (score 8) na Escala de Apgar familiar de Smilkstein (1978). Corroborando, Oliveira, Araújo, Rodrigues (2012); Cuba, & Espinoza (2014) referem que um score final entre 7 e 10 pontos corresponde a um entendimento de família altamente funcional. Segundo, Olson (1988) & Figueiredo, M.H. (2013), os níveis centrais correspondentes à adaptabilidade (estruturada e/ou flexível) e à coesão (separada ou ligada) representam um melhor funcionamento familiar. Assim, a família em estudo considera-se uma família equilibrada em que percecionam um bom funcionamento em que cada elemento está apto a ser independente e ligado à família em simultâneo. Revista Portuguesa de Enfermagem de Saúde Mental, ESPECIAL 6 (OUT.,2018) | 14

Como principal fator de proteção para a gravidez precoce encontra-se a resiliência. Entende-se por resiliência o processo através do qual se pode conseguir uma adaptação positiva mesmo antes do confronto com situações adversas, de acordo com Luthar & Cicchetti (2000) cit. in Canavarro & Pedrosa (2012). Assim, no que diz respeito à avaliação da resiliência da jovem a família e a equipa de enfermagem percecionam a jovem menos resiliente do que a mesma se considera, obtendo um score mais elevado no preenchimento da Escala Healthy Kids Resilience Assessment Module, versão 6.0. Segundo Beers & Hollo (2009), tornar-se mãe irá ainda implicar, para a adolescente, mudanças significativas nas suas atividades e estilo de vida, particularmente se as relações com os pares e o grupo de amigos eram parte importante das rotinas. Burke & Liston (1994), demonstram a mesma opinião dizendo que o envolvimento nas tarefas parentais traduzse, frequentemente, em menor disponibilidade para atividades de lazer, e mesmo, para atividades letivas ou profissionais, o que pode acarretar maior insatisfação com a vida em geral por parte das adolescentes com história de gravidez. Assim, pela escala de Satisfação com o Suporte Social (Pais-Ribeiro, 1999) a jovem demonstra satisfação com o apoio da família e dos amigos e com a sua intimidade, no entanto, comprovando com os autores supracitados, esta revela insatisfação com a disponibilidade para atividades socias com o seu grupo de pares. CONCLUSÕES Com as alterações aos níveis estruturais, desenvolvimentais e de funcionalidade familiar, verificou-se a existência de uma maior flexibilidade, com redefinição de papéis e limites familiares. O apoio emocional e instrumental proporcionado pelos progenitores foi determinante na adaptação à maternidade. Também o grupo de amigos constituiu uma fonte importante de suporte emocional. A jovem reforçou um aumento da preocupação pelo bem-estar da própria por parte dos amigos e que isso também foi determinante para a sua adaptação. Apesar da jovem não passar tanto tempo quanto gostaria com os amigos, uma pelo facto de ter sido mãe recentemente, considera-se satisfeita com o apoio recebido quer pela família, quer pela comunidade envolvente (Escola e Unidade de Saúde).


Com a utilização do MDAIF, os enfermeiros desenvolveram as suas competências para uma abordagem personalizada à família, centrada na adaptação e transição holística para o processo parental. A utilização deste Modelo permitiu dar resposta às necessidades da família identificadas, não só através da reestruturação de uma identidade parental e pessoal, sustentada em valores, objetivos pessoais e profissionais e prioridades (tendo a adolescente prosseguido com a formação académica), mas também promoção de um ambiente familiar assente em confiança e harmonia, não só pelo negoceio e moldagem de limites, mas também na aquisição de autonomia dos diferentes elementos. A utilização do MDAIF para a avaliação e intervenção familiar permitiu, não só conhecer melhor a família e explorar os aspetos que careciam de maior intervenção nas diferentes áreas, mas também personalizar essa abordagem na resolução das necessidades identificadas. IMPLICAÇÕES PARA A PRÁTICA CLÍNICA Mães adolescentes que beneficiam de um apoio de saúde e social adequado, conseguem atingir um nível favorável de adaptação, uma vez que este reduz a ansiedade associada às tarefas da maternidade. Além disto, fatores protetores de ordem individual, relacional e social são também aspetos a ter em conta no ajustamento socioemocional da adolescente ao processo de maternidade. A utilização do Modelo Dinâmico de Avaliação e Intervenção Familiar, ao invés de tantos outros Modelos aqui mencionados, permite dar um lugar de destaque a toda a família, enquanto unidade e orientar as práticas dos enfermeiros para a promoção da saúde familiar, tendo em conta as suas reais necessidades e recursos. Conclui-se esperando que a divulgação deste trabalho de investigação acerca da gravidez e maternidade na adolescência, numa perspetiva holística da família, tenha impacto na forma como os profissionais de saúde o abordam. REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS Baker, P., Guthrie, K., Hutchinson, C., Kane, R., & Wellings, K. (Eds.). (2007). Teenage Pregnancy and Reproductive Health. London: Royal College of Obstetricians and Gynaecologists Press.

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Artigo de Investigação

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Disponível em http://dx.doi.org/10.19131/rpesm.0208

COMPETÊNCIAS EMOCIONAIS E PREVENÇÃO DO ABANDONO NOS ESTUDANTES DO ENSINO SUPERIOR POLITÉCNICO | Manuela Ferreira1; João Duarte2; Ana Paula Cardoso3; Lídia Cabral4; Raquel Guiné5; Sofia Campos6; Cândida Alves7 |

RESUMO CONTEXTO: Nos últimos anos, a comunidade científica foi tomando consciência da importância do desenvolvimento de competências emocionais para o sucesso escolar e profissional dos estudantes. OBJETIVO(S): Identificar os fatores que influenciam o abandono escolar dos estudantes do ensino superior politécnico. Analisar a relação entre as competências emocionais e o abandono escolar dos estudantes do Ensino Superior Politécnico. METODOLOGIA: Estudo quantitativo, transversal, descritivo e correlacional. O instrumento de recolha de dados utilizado foi questionário de caracterização sociodemográfica dos estudantes e dos pais, a Escala de Motivos para Abandono do Ensino Superior (Ambiel, 2015) e a Escala Competências Emocionais (Taksic’, 2000), adaptada para Portugal por Faria e Santos (2006). Amostra constituída por 560 estudantes do ensino superior a frequentarem o 1.º ano do curso. RESULTADOS: Participaram 560 estudantes do ensino superior a frequentarem o 1.º ano do curso, maioritariamente feminina (69,3%), com uma idade mínima de 18 anos e uma máxima de 30 anos, correspondendo-lhe uma média de 19,76 anos (±2,06 anos), 36,6% da área da tecnologia. O sexo influenciou o abandono escolar dos estudantes do ensino superior, sendo os estudantes do sexo feminino os que revelam mais motivos para o abandono (p=0,010). Os estudantes cujas mães se encontram ativas profissionalmente manifestam mais Intenção de abandono (p=0,035). A perceção emocional, a expressão emocional e a capacidade de lidar com as emoções foram preditoras da intenção de abandono escolar. CONCLUSÕES: Os resultados apontam para a necessidade de inclusão nos programas de intervenção contra o abandono escolar, das variáveis sexo, idade e algumas dimensões das competências emocionais, para minimizar, assim, as suas consequências, quer para os estudantes, quer para a própria sociedade.

PALAVRAS-CHAVE: Competências emocionais; Prevenção do abandono; Estudantes do ensino superior

RESUMEN

ABSTRACT

“Competencias emocionales y prevención del abandono en los estudiantes de enseñanza superior politécnico”

“Emotional skills and prevention of dropout in students of polytechnic higher education”

CONTEXTO: En los últimos años, la comunidad científica ha sido consciente de la importancia del desarrollo de competencias emocionales para el éxito escolar y profesional de los estudiantes. OBJETIVO(S): Identificar los factores que influencian el abandono escolar de los estudiantes de la enseñanza superior politécnica. Analizar la relación entre las competencias emocionales y el abandono escolar de los estudiantes de la Enseñanza Superior Politécnica. METODOLOGÍA: Estudio cuantitativo, transversal, descriptivo y correlacional. El instrumento de recolección de datos utilizada fue cuestionario sociodemográfico de los estudiantes y los padres, Enseñanza Superior Abandono de Escala razones (Ambiel, 2015) y la Escala de Competencia Emocional (Taksic’, 2000), adaptado a Portugal por Faria y Santos (2006). Muestra constituida por 560 estudiantes de enseñanza superior que asisten al primer año del curso. RESULTADOS: Un total de 560 estudiantes de educación superior asistieron al primer año del curso, en su mayoría mujeres (69.3%), con una edad mínima de 18 años y un máximo de 30 años, lo que corresponde a un promedio de 19.76 años (± 2.06 años), 36.6 % del área de tecnología. El sexo influyó en la tasa de deserción escolar de los estudiantes de educación superior, y las alumnas mostraron más motivos para abandonar la escuela (p = 0.010). Los estudiantes cuya madre es profesionalmente activa muestran más intención de abandono (p = 0.035). La percepción emocional, la expresión emocional y la capacidad de manejar las emociones predecían la intención de abandonarla. CONCLUSIONES: Los resultados apuntan a la necesidad de incluir en los programas de intervención contra el abandono escolar las variables de género, edad y algunas dimensiones de las competencias emocionales, con el fin de minimizar sus consecuencias, tanto para los estudiantes como para la propia sociedad.

BACKGROUND: In recent years, the scientific community has become aware of the importance of the development of emotional competences for students’ academic and professional success. AIM: To identify the factors that influence the drop out of students of polytechnic higher education. To analyze the relation between the emotional competences and the school dropout of the students of Polytechnic Higher Education. METHODS: Quantitative, cross-sectional, descriptive and correlational study. The data collection instrument used was a sociodemographic characterization questionnaire for students and parents, the Motivation Scale for Abandonment of Higher Education (Ambiel, 2015) and the Emotional Skills Scale (Taksic ‘, 2000), adapted for Portugal by Faria and Santos (2006). Sample composed of 560 students of higher education attending the first year of the course. RESULTS: A total of 560 higher education students attended the first year of the course, mostly female (69.3%), with a minimum age of 18 years and a maximum of 30 years, corresponding to an average of 19.76 years (± 2.06 years), 36.6% of the technology area. Sex influenced the dropout rate of higher education students, with female students showing more reasons for dropout (p = 0.010). Students whose mother is professionally active show more intention of abandonment (p = 0.035). Emotional perception, emotional expression and the ability to deal with emotions were predictive of intention to drop out. CONCLUSIONS: The results point to the need to include in the intervention programs against school abandonment of the variables gender, age and some dimensions of emotional competences, in order to minimize their consequences, both for students and for society itself.

DESCRIPTORES: Competencias emocionales; Prevención del abandono; Estudiantes de enseñanza superior

KEYWORDS: Emotional competences; Prevention of abandonment; Students of higher education Submetido em 30-12-2017 Aceite em 21-03-2018

1 Doutoramento; Professora Coordenadora no Instituto Politécnico de Viseu, Escola Superior de Saúde, Viseu, Portugal, mmcferreira@gmail.com 2 Doutoramento; Professor Coordenador no Instituto Politécnico de Viseu (IPV), Escola Superior de Saúde, 3500-843 Viseu, Portugal, duarte.johnny@gmail.com 3 Agregação; Professora Coordenadora no IPV, Escola Superior de Educação, Departamento de Psicologia e Ciências da Educação, a.p.cardoso@esev.ipv.pt 4 Doutoramento; Professora Coordenadora no Instituto Politécnico de Viseu, Escola Superior de Saúde, 3500-843 Viseu, Portugal, lcabral@essv.ipv.pt 5 Agregação; Professora Coordenadora no Instituto Politécnico de Viseu, Escola Superior Agrária, 3500 - 606 Viseu, raquelguine@esav.ipv.pt 6 Doutoramento; Professora Convidada no Instituto Politécnico de Viseu, Escola Superior de Saúde, 3500-843 Viseu, Portugal, sofiamargaridacampos@gmail.com 7 Doutoramento; Professora Doutora na Universidade de Ceuma, 65065-470 São Luís, MA, Brasil, candida.alves@hotmail.com Citação: Ferreira, M., Duarte, J., Cardoso, A. P., Cabral, L., Guiné, R., Campos, S., & Alves, C. (2018). Competências emocionais e prevenção do abandono nos estudantes do ensino superior politécnico. Revista Portuguesa de Enfermagem de Saúde Mental (Spe. 6), 17-24. doi: 10.19131/rpesm.0208 Revista Portuguesa de Enfermagem de Saúde Mental, ESPECIAL 6 (OUT.,2018) | 17


INTRODUÇÃO

METODOLOGIA

O abandono escolar precoce é um fenómeno com drásticas consequências negativas na vida dos estudantes no ensino superior, que ficam mais expostos ao desemprego ou a empregos precários e mal remunerados e mais suscetíveis de depender dos pais e de programas sociais ao longo de toda a vida, enfrentando maior risco de pobreza e de exclusão social. Por este motivo, os países europeus assumiram o compromisso de reduzir a taxa média de abandono escolar para menos de 10% até 2020 e iniciaram um processo de cooperação política que objetiva a aprendizagem interpares e o intercâmbio de boas práticas (Baptista, 2015; Rabelo, 2017). O Governo Português tem procurado incentivar várias instituições a desenvolverem estudos para compreender o fenómeno, como é o caso do Observatório Permanente do Abandono e Promoção do Sucesso Escolar da Universidade de Trás-os-Montes e Alto Douro, referenciado por Rabelo (2017), que concluiu que, no ano letivo 2015/2016, a maior parte dos estudantes do ensino superior que abandonaram os estudos frequentavam o 1.º ano de licenciatura ou o mestrado integrado (68%) e os restantes 32% frequentavam os 2.º, 3.º e 4.º anos. O abandono escolar significa que um estudante deixa a escola sem concluir o grau de ensino frequentado por outras razões que não sejam a transferência ou casos graves (Ferreira & Fernandes, 2015). Este constitui-se como um problema complexo associado a inúmeras causas muitas vezes interligadas, podendo ser influenciado por fatores que vão de problemas pessoais e familiares, dificuldades de aprendizagem, experiências escolares negativas e situações socioeconómicas precárias, que importa aprofundar e compreender. Uma vez que as dificuldades começam precisamente no ingresso do ensino superior, delineou-se assim uma investigação com o objetivo geral de identificar os fatores que estão associados ao abandono escolar dos estudantes do 1.º ano dos estudantes do Instituto Politécnico de Viseu. Mais especificamente, procurou-se identificar que variáveis sociodemográficas influenciam o abandono escolar dos estudantes do ensino superior; averiguar de que modo as variáveis de contexto académico influenciam o abandono escolar; identificar se existe relação entre as competências emocionais e o abandono escolar destes estudantes.

Para o efeito, realizou-se um estudo quantitativo, transversal, descritivo e correlacional, com recurso ao inquérito por questionário. Os instrumentos de recolha de dados utilizados foram questionário de caracterização sociodemográfica dos estudantes e dos pais, a Escala performance de Aprendizagem, a Escala de motivos para abandono do ensino superior (Ambiel, 2015) e a Escala Competências Emocionais (Taksic’, 2000), adaptada para a população portuguesa por Faria e Santos (2006).

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Participantes e Sua Caraterização Recorreu-se a uma amostra não probabilística por conveniência constituída por 560 estudantes do ensino superior do Instituto Politécnico de Viseu a frequentar o 1.º ano do curso, em maior percentagem da Escola Superior de Tecnologia de Viseu (36,6%) e da Escola Superior de Educação de Viseu (30,5%). No desenvolvimento da investigação foram salvaguardados os direitos dos participantes e os princípios éticos considerados fundamentais neste tipo de estudo. As estatísticas da idade por sexo revelam, para a totalidade da amostra, que esta é maioritariamente feminina (69,3%), com uma idade mínima de 18 anos e uma máxima de 30 anos, correspondendo-lhe uma média de 19,76 anos (±2,06 anos), e um coeficiente de variação de 21,31% sugestivo de dispersão moderada. Em relação à idade, sobressaem os estudantes mais velhos, com 20 ou mais anos de idade (42,1%), dos quais 51,7% são do sexo masculino e 37,9% do sexo feminino. São também expressivos os percentuais registados em relação aos estudantes com 19 anos, com uma representatividade de 30,4% no total da amostra, fazendo parte deste grupo 31,5% do sexo masculino e 34,3 do sexo feminino. O grupo etário dos 18 anos representa 27,5% da amostra (26,7% do sexo masculino vs. 27,8% do sexo feminino), resultando em diferenças estatisticamente significativas (X2=11,880; p=0,003) que se localizam entre participantes do sexo feminino e com idade de 19 anos e masculino com idade superior ou igual a 20 anos. Instrumentos de Recolha de Dados Para operacionalizar os objetivos definidos recorreuse ao inquérito por questionário a ser preenchido pelos próprios estudantes. Este instrumento está subdividido em várias secções.


A primeira secção é constituída por um questionário sociodemográfico dos estudantes e pais, composta por 11 questões, 9 das quais permitem colher informação acerca dos dados pessoais dos estudantes (idade, sexo, ano de curso, 1.º ano letivo de matrícula no curso que frequenta, estatuto, benefícios sociais, deslocação da residência habitual) e 2 relativas a dados sobre os pais dos estudantes (profissão e habilitações literárias). A segunda secção inclui a Escala de Motivos para Evasão do Ensino Superior (M-ES), composta por 67 itens relacionados com os motivos que influenciam a decisão de um aluno do ensino superior evadir-se do seu curso superior. A chave de resposta é em formato likert de cinco pontos, variando entre “1 – muito fraco” e “5 – muito forte”. Trata-se de um inventário que avalia os motivos potenciais de estudantes ativos para deixarem seus respetivos cursos antes da conclusão. A escala utilizada neste trabalho foi adaptada, sendo que a nossa apresenta apenas 4 fatores: Fatores Organizacionais (e.g., “A instituição não oferecer nenhum programa de acompanhamento pedagógico”); Fatores de Gestão de Vida (e.g., “Trabalhar no mesmo horário das aulas”); Fatores Relacionais (e.g., “Ter uma classe social diferente dos meus colegas”); e Fatores da Profissão/Carreira (e.g., “Perceber que a atividade profissional não será tão agradável quanto eu imaginei”). O estudo de consistência interna da escala revela que os coeficientes alfa de Cronbach, por item, situamse todos acima dos 0,957. Relativamente a cada uma das subescalas os valores são de 0,900 (F1), 0,848 (F2), 0.827 (F3), 0,852 (F4). A última secção integra o Questionário de Competência Emocional (QCE) (Taksic’, 2000), já adaptado para Portugal por Faria e Lima Santos (2006) e que se funda no modelo teórico de Mayer e Salovey (1997). O QCE é composto por 45 itens respondidos numa escala de Likert de 6 pontos, entre “Nunca” e “Sempre”. As pontuações mais elevadas são reveladoras de maior inteligência ou competência emocional. A escala também foi adaptada para o presente estudo, sendo que a nossa, ao contrário da que foi adaptada para Portugal, apresenta 4 fatores, e não 3: F1 - Perceção emocional (e.g., “Percebo quando alguém tenta esconder os seus verdadeiros sentimentos”); F2- Expressão emocional (e.g., “Consigo descrever o meu estado emocional atual”); F3 - Capacidade de lidar com a emoção (e.g., “Procuro moderar as emoções desagradáveis e reforçar as positivas”), F4 - Investimento emocional (e.g. “Quando alguém me elogia, trabalho com maior entusiasmo”). Os alfas de Cronbach dos referidos fatores são, respetivamente, de 0,791, 0,874, 0,834 e 0,684.

Análise dos Dados Para a análise dos dados, recorreu-se à estatística descritiva e à estatística analítica ou inferencial. A primeira permitiu calcular as frequências absolutas e percentuais, algumas medidas de tendência central, nomeadamente as médias e as medidas dispersão, como a amplitude de variação, o coeficiente de variação e o desvio padrão, bem como as medidas de forma, como a assimetria e achatamento. Para as variáveis em estudo, utilizou-se a análise univariada e bivariada. Em termos de estatística inferencial, recorreu-se a testes paramétricos e não paramétricos, designadamente aos Testes t de Student ou teste de U Mann Whitney usados para amostras independentes; a Análise de variância a um fator (ANOVA) ou Teste de Kruskall Wallis – usados para a comparação de médias de uma variável quantitativa (variável endógena) em três ou mais grupos de sujeitos diferentes (variável exógena - qualitativa); o Teste de qui quadrado (X2) - para o estudo de relações entre variáveis nominais. Quanto à análise bivariada, aplicou-se o teste da percentagem residual (resíduos ajustados), que nos dá as diferenças percentuais de variável a variável, muitas vezes em detrimento do teste de X2, pois, em muitas das variáveis em estudo, o tamanho das subamostras não possibilitava o uso do referido teste. RESULTADOS Dados da Análise Descritiva Os estudantes frequentam na sua maioria a Escola Superior de Tecnologia de Viseu (36,6%) dos quais 57,0% são do sexo masculino e 27,6% do sexo feminino. Verifica-se também que é expressiva a percentagem de estudantes da Escola Superior de Educação de Viseu (30,5%), onde 22,1% são do sexo masculino e 34,3% do sexo feminino. A quase a totalidade da amostra (91,4%) admite que não goza de qualquer estatuto especial no presente não letivo, apurando-se também que a maioria (50,9%) não possui benefícios sociais, fazendo parte deste grupo 65,7% dos estudantes do sexo masculino e 44,3% do sexo feminino, enquanto 49,1% usufruiu de benefícios sociais (34,3% sexo masculino vs. 55,7% sexo feminino), com diferenças estatisticamente significativas (X2=21,772; p=0,000), cujos residuais revelam que essa diferença reside entre os estudantes do sexo masculino sem benefícios sociais e os estudantes do sexo feminino com benefícios sociais no presente ano letivo. Revista Portuguesa de Enfermagem de Saúde Mental, ESPECIAL 6 (OUT.,2018) | 19


De salientar também o facto de que a maioria dos estudantes (69,5%) estão deslocados da sua residência habitual, entre eles 61,6% são do sexo masculino e 72,9% do feminino, contrariamente a 30,5% que referem que não estão deslocados da sua residência habitual (sexo masculino 38,4% vs. sexo feminino 27,1%). Resulta, daqui diferenças estatisticamente significativas (X2=7,187; p=0,007), situando-se essas diferenças, de acordo com os valores residuais, entre os estudantes do sexo feminino que se encontram deslocados da sua residência habitual e os estudantes do sexo masculino que não estão deslocados. No que concerne à frequência com que os estudantes estudam, verifica-se que há um predomínio de participantes que estudam ocasionalmente (42,7%), sendo 60,5% do sexo masculino e 34,8% do sexo feminino, secundados pelos que estudam frequentemente (34,3%), com o sexo masculino a representar 26,7% e o feminino 37,6%. Importa referir que 23,0% dos participantes estudam diariamente, sobretudo as estudantes do sexo feminino (27,6%), com diferenças estatisticamente significativas (X2=21,772; p=0,000), cujos residuais indicam que essas diferenças se situam entre os estudantes do sexo feminino que estudam diariamente e os do sexo masculino que estudam ocasionalmente. Dados da Análise Inferencial Constata-se que são os estudantes do sexo feminino os que apresentam valores médios mais elevados na escala de motivos de evasão do ensino superior, com diferença estatisticamente significativa no abandono escolar global (p=0,010) (Tabela 1). Tabela 1 - Teste t para diferença de médias entre o sexo e o abandono escolar Sexo Abandono Escolar

Masculino

Feminino Dp

t

p

Quanto à relação entre as habilitações literárias da mãe e o abandono escolar, como exposto na Tabela 2, verifica-se que os estudantes cujas mães possuem o ensino superior revelam valores médios mais elevados em quase todas as dimensões do abandono escolar, excetuando a dimensão profissão/carreira, onde sobressaem os estudantes cujas mães têm menores habilitações académicas, no entanto, não se registam diferenças estatisticamente significativas. Tabela 2 -ANOVA para diferença de médias entre as habilitações literárias da mãe e o abandono escolar Habilitações da mãe

Até ensino básico

Ensino secundário

Abandono Escolar

Média

Dp

Média

Dp

Média

Dp

Dimensão organizacional

33,72

19,94

33,82

19,33

34,45

Dimensão gestão de vida

43,54

21,77

41,88

21,48

Dimensão relacional

22,53

17,02

23,88

Dimensão profissão/ carreira

41,40

18,06

Abandono escolar (global)

35,76

16,1 5

t

p

19,75

0,067

0,935

41,99

21,59

0,366

0,694

18,97

25,00

19,36

0,815

0,443

40,55

17,67

40,65

19,09

0,130

0,878

35,4 5

16,4 4

35,9 2

17,1 5

0,03 6

0,96 5

A profissão da mãe teve influência no abandono escolar, sendo os estudantes cujas mães se encontras ativas profissionalmente aqueles que manifestam valores médios mais elevados em quase todas as dimensões do abandono escolar, com exceção da dimensão gestão de vida, onde sobressaem os estudantes cujas mães não estão no ativo em termos profissionais, verificando-se que há diferença estatisticamente significativa em relação à dimensão profissão/carreira (p=0,035) (Tabela 3). Tabela 3 - Teste Mann-Whitney para a relação entre a profissão da mãe e o abandono escolar

Média

Dp

Média

Dimensão organizacional

32,51

20,50

34,66

19,14 -1,199 0,231

Abandono Escolar

Dimensão gestão de vida

35,99

21,85

45,39

20,77 -4,860 0,000

Dimensão relacional

23,23

19,38

23,79

17,80 -0,334 0,739

Dimensão profissão/carreira

38,50

19,62

41,92

17,37 -2,065 0,039

Abandono escolar (global)

33,00

17,68

36,87

15,74 -2,579 0,010

Revista Portuguesa de Enfermagem de Saúde Mental, ESPECIAL 6 (OUT.,2018) | 20

Ensino superior

Ativa

Não ativa

OM

OM

Dimensão organizacional

285,16

Dimensão gestão de vida

Profissão da mãe

UMW

p

255,51

25193,000

0,062

276,37

283,13

27519,500

0,670

Dimensão relacional

280,30

270,78

27239,500

0,549

Dimensão profissão/ carreira

286,08

252,61

24805,000

0,035

Abandono escolar (global)

283,70

260,08

25805,500

0,137


A primeira dimensão do abandono escolar a ser estudada através da regressão múltipla foi a dimensão organizacional. As correlações obtidas com as diferentes variáveis em análise indicam valores correlacionais positivos, à exceção do sexo (r=-0,051), que estabelece uma relação inversa com a dimensão organizacional. Ressalva-se também que só se encontra relevância estatística na perceção emocional (p=0.001), na expressão emocional (p=0,044) e no investimento emocional (p=0,035). A variável preditora da dimensão organizacional é a perceção emocional, que explica 0,1% da variação, sendo a variância explicada ajustada de 0,1%. O erro padrão de regressão é 19,42 e o teste F (f=10,006; p=0,002) e o valor de t (t=5,609; p=0.000), apresentando significância estatística, o que sugere que a variável que entrou no modelo de regressão tem poder explicativo sobre a dimensão organizacional. Pelos coeficientes padronizados beta, infere-se que a perceção emocional estabelece uma relação direta com a dimensão organizacional, sugerindo que quanto mais perceção emocional os estudantes têm menos percecionam a dimensão organizacional como fator de abandono escolar. A segunda dimensão do abandono escolar a ser estudada através da regressão múltipla foi a dimensão gestão de vida. As correlações obtidas com as diferentes variáveis em análise indicam valores correlacionais positivos, à exceção do sexo (r=-0,202) e idade (r=0,040), que estabelecem uma relação inversa com a dimensão gestão de vida. Regista-se relevância estatística no sexo (p=0.000), na expressão emocional (p=0,0001) e na capacidade de lidar com a emoção (p=0,021). As variáveis preditoras da dimensão gestão de vida são o sexo e a expressão emocional, que explicam 0,6% da variação, sendo a variância explicada ajustada de 0,5%. O erro padrão de regressão é 20,89 e o teste F (f=12,647; p=0,000) e o valor de t (t=12,096; p=0.000), apresentando significância estatística, o que sugere que as variáveis que entraram no modelo de regressão têm poder explicativo sobre a dimensão gestão de vida. Pelos coeficientes padronizados beta, infere-se que a expressão emocional estabelece uma relação direta com a dimensão gestão de vida, sugerindo que quanto mais expressão emocional os estudantes têm menos percecionam a dimensão gestão de vida como fator de abandono escolar, enquanto o sexo estabelece uma relação inversa, indicando que independentemente do sexo os estudantes mais perceção têm da dimensão gestão de

vida como potencial fator de abandono escolar. A terceira dimensão do abandono escolar a ser estudada através da regressão múltipla foi a dimensão relacional. As correlações obtidas com as diferentes variáveis em análise indicam valores correlacionais negativos apenas para a idade (r=0,025) e expressão emocional (r=0,020), que estabelecem uma relação inversa com a dimensão relacional, tendo as restantes variáveis estabelecido uma relação inversa. Regista-se relevância estatística apenas na capacidade de lidar com a emoção (p=0,001). As variáveis preditoras da dimensão relacional são a expressão emocional e a capacidade de lidar com a emoção, que explicam 0,3% da variação, sendo a variância explicada ajustada de 0,2%. O erro padrão de regressão é 18,04 e o teste F (f=7,855; p=0,005) e o valor de t (t=9,151; p=0.000), apresentando significância estatística, o que sugere que as variáveis que entraram no modelo de regressão têm poder explicativo sobre a dimensão relacional. Pelos coeficientes padronizados beta, infere-se que a expressão emocional estabelece uma relação inversa com a dimensão relacional, sugerindo que quanto menos expressão emocional os estudantes têm maior é perceção da dimensão relacional como fator de abandono escolar, enquanto a capacidade de lidar com a emoção estabelece uma relação direta, indicando que quanto menos capacidade de lidar com a vida têm os estudantes mais perceção têm da dimensão relacional como latente fator de abandono escolar. A quarta dimensão do abandono escolar a ser estudada através da regressão múltipla foi a dimensão profissão/carreira. As correlações obtidas com as diferentes variáveis em análise indicam valores correlacionais negativos para todas as variáveis. Regista-se relevância estatística apenas no sexo (p=0,020). A variável preditora da dimensão profissão/carreira é o sexo, que explica 0,8% da variação, sendo a variância explicada ajustada de 0,0%. O erro padrão de regressão é 10,09 e o teste F (f=4,264; p=0,039) e o valor de t (t=45,633; p=0.000), apresentando significância estatística, o que sugere que a variável que entrou no modelo de regressão tem poder explicativo sobre a dimensão profissão/carreira. Pelos coeficientes padronizados beta, infere-se que o sexo estabelece uma relação inversa com a dimensão profissão/carreira, sugerindo que independentemente do sexo maior é perceção da dimensão profissão/carreira como fator de abandono escolar. Revista Portuguesa de Enfermagem de Saúde Mental, ESPECIAL 6 (OUT.,2018) | 21


Na Tabela 4 encontram-se as correlações obtidas com o abandono escolar global e as diferentes variáveis em análise, cujos resultados indicam que valores correlacionais negativos para o sexo (r=-0,109) e para a idade (r=-0,006), estabelecendo uma relação direta com as restantes variáveis. Regista-se relevância estatística apenas no sexo (p=0,005). Tabela 4 - Correlações de Pearson entre variáveis independentes e abandono escolar global

Variáveis

R

P

Sexo_dummy

-0,109

0,005

Idade

-0,006

0,443

Perceção emocional

0,052

0,108

Expressão Emocional

0,067

0,056

Capacidade de lidar com a emoção

0,000

0,496

Investimento Emocional

0,036

0,197

A variável preditora do abandono escolar global é o sexo, que explica 0,1% da variação, sendo a variância explicada ajustada de 0,1 %. O erro padrão de regressão é 16,36 e o teste F (f=6,651; p=0,010) e o valor de t (t=44,386; p=0.000), apresentando significância estatística, o que sugere que a variável que entrou no modelo de regressão tem poder explicativo sobre o abandono escolar global. Pelos coeficientes padronizados beta, infere-se que o sexo estabelece uma relação inversa com o abandono escolar, sugerindo que independentemente do sexo maior é perceção que os estudantes têm do abandono escolar. DISCUSSÃO Os dados apresentados indicam que apenas o sexo se assumiu como variável sociodemográfica que interferiu estatisticamente no abandono escolar dos estudantes do ensino superior, sendo os estudantes do sexo feminino os que revelam mais propensão a evadir-se do curso, ou seja, apresentam mais motivos para o abandono escolar (abandono escolar global p=0,010). Perante este resultado, trabalhar a perspetiva de género nos recursos de ensino e aprendizagem constitui um domínio relevante e um desafio para as instituições de ensino superior. Também Cavaco (2015) no estudo que realizou alerta para a necessidade das políticas públicas de educação e formação incorporarem a dimensão de género nas estratégias de resposta que visam promover o sucesso educativo. Verificou-se que apenas a profissão da mãe está associada ao abandono escolar, sendo os estudantes Revista Portuguesa de Enfermagem de Saúde Mental, ESPECIAL 6 (OUT.,2018) | 22

cujas mães se encontras ativas profissionalmente os que manifestam valores médios mais elevados em quase todas as dimensões do abandono escolar, com exceção da dimensão gestão de vida, onde sobressaem os estudantes em que as mães não estão no ativo em termos profissionais (dimensão profissão/carreira p=0,035). Tal poderá sugerir uma menor disponibilidade das mães para apoiar e comunicar eficazmente com os filhos nesta fase exigente de transição da vida escolar, que poderá refletir-se negativamente na adaptação ao ensino superior. No que se refere aos resultados da relação entre o abandono escolar com as variáveis sociodemográfica e com as competências emocionais, verificou-se que a perceção emocional estabelece uma relação direta com a dimensão organizacional, sugerindo que quanto mais perceção emocional os estudantes têm menos percecionam a dimensão organizacional como fator de abandono escolar. A expressão emocional estabelece uma relação direta com a dimensão gestão de vida, sugerindo que quanto mais expressão emocional os estudantes têm menos percecionam a dimensão gestão de vida como fator de abandono escolar, enquanto o sexo estabelece uma relação inversa, indicando que, independentemente do sexo, os estudantes mais perceção têm da dimensão gestão de vida como potencial fator de abandono escolar. A expressão emocional também estabelece uma relação inversa com a dimensão relacional, sugerindo que quanto menos expressão emocional os estudantes têm maior é perceção da dimensão relacional como fator de abandono escolar, enquanto a capacidade de lidar com a emoção estabelece uma relação direta, indicando que quanto menos capacidade de lidar com a vida têm os estudantes mais perceção têm da dimensão relacional como latente fator de abandono escolar. O sexo estabelece uma relação inversa com a dimensão profissão/carreira e com o abandono escolar global, sugerindo que, independentemente do sexo, maior é perceção da dimensão profissão/carreira como fator de abandono escolar e do abandono escolar na sua globalidade. De igual modo, Silva e Duarte (2012), num estudo realizado com estudantes do curso de licenciatura em Enfermagem da Escola Superior de Saúde de Viseu, verificaram que a inteligência emocional influencia o sucesso escolar. Os autores salientam que saber mobilizar as emoções ao serviço de um objetivo e concentrar a sua atenção para a competência e para a criatividade é essencial para o sucesso na vida.


Num outro estudo com estudantes do ensino superior, Fernandez, Salamonson e Griffiths (2012) referem que as competências emocionais e as estratégias de aprendizagem se relacionam positivamente com o sucesso académico, assumindo-se como um preditor abandono escolar, caso os estudantes não tenham pensamento crítico, uma aprendizagem entre pares e se sintam motivados. O mesmo estudo revela também que o pensamento crítico, uma adequada gestão do tempo e a motivação estão relacionados com o sucesso académico e, consequentemente, com o abandono escolar. CONCLUSÃO O sucesso e o abandono escolar constituem-se como temáticas de relevante interesse para todos os agentes educativos, instituições escolares, estudantes, pais, professores. Assim, torna-se importante compreender os fatores que poderão influenciar o sucesso académico no ensino superior, tendo em conta as competências emocionais e prevenção do abandono. O presente estudo revelou que o sexo o abandono escolar dos estudantes do ensino superior, sendo os estudantes do sexo feminino os que revelam mais propensão a evadir-se do curso, ou seja, apresentam mais motivos para o abandono escolar; de salientar também que a profissão da mãe teve influência no abandono escolar, sendo os estudantes cuja mãe se encontra ativa profissionalmente os que manifestam valores médios mais elevados em quase todas as dimensões do abandono escolar, com exceção da dimensão gestão de vida, onde sobressaem os estudantes que a mãe não está no ativo em termos profissionais. No que se refere aos resultados da relação entre o abandono escolar, variáveis sociodemográfica e competências emocionais, concluiu-se que quanto mais perceção emocional os estudantes têm menos percecionam a dimensão organizacional como fator de abandono escolar; quanto mais expressão emocional os estudantes têm menos percecionam a dimensão gestão de vida como fator de abandono escolar; independentemente do sexo, os estudantes apresentam mais perceção da dimensão gestão de vida como potencial fator de abandono escolar; quanto menos expressão emocional os estudantes têm, maior é a perceção da dimensão relacional como fator de abandono escolar; quanto menos capacidade de lidar com a vida têm os estudantes, mais perceção têm da dimensão relacional como latente fator de abandono escolar;

independentemente do sexo, maior é perceção da dimensão profissão/carreira como fator de abandono escolar e do abandono escolar na sua globalidade. IMPLICAÇÕES PARA A PRÁTICA CLÍNICA Os resultados apontam para a necessidade de serem implementadas medidas suscetíveis de prevenir ou reduzir o abandono escolar dos estudantes do ensino superior, nomeadamente com a inclusão nos programas de intervenção de medidas tendentes a minimizar a influência negativa das variáveis sexo (trabalhar as questões de género), idade e algumas dimensões das competências emocionais. Para isso, é fundamental o esforço por parte de todos os agentes educativos, incluindo os profissionais de enfermagem, assumido de forma transversal e passando por várias vertentes, começando pela sensibilização da sociedade para a questão, fazendo deste combate uma prioridade. Esta deve começar precocemente, ou seja, sugere-se uma maior intervenção em contexto de ensino secundário, sensibilizando os alunos para a escolha racional do curso em que querem ingressar, para que não façam uma escolha errada e que os leve ao consequente abandono escolar aquando do ingresso no ensino superior. O combate ao abandono escolar é indiscutivelmente um dos caminhos mais relevantes a nível do aumento da qualificação dos cidadãos. Este fenómeno implica a necessidade de se consolidarem conhecimentos, metodologias de estudo e estratégias de intervenção, de modo a evitar-se a saída precoce de estudantes do ensino superior. Por isso, este deve continuar a ser alvo de crescente interesse, da elaboração de trabalhos de investigação e alvo de reflexão e debate. As instituições de ensino superior, os representantes dos estudantes, o próprio Governo e outras entidades do setor devem debruçar-se mais sobre esta problemática e sobre as suas múltiplas dimensões, em prol quer do sucesso e bem-estar dos estudantes, quer do desenvolvimento da própria sociedade. REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS Ambiel, R. A. M. (2015). Construção da escala de motivos para evasão do ensino superior. Avaliação Psicológica, 14 (1), 41-52. Disponível em: http://pepsic.bvsalud.org/scielo.php?script=sci_arttext&pid =S1677-04712015000100006 Revista Portuguesa de Enfermagem de Saúde Mental, ESPECIAL 6 (OUT.,2018) | 23


Baptista, J. O. (2015). Indicadores de transferência e de abandono no ensino superior português. Lisboa: Direção-Geral de Estatísticas da Educação e Ciência (DGEEC). Cavaco, C. (Coord.). (2015). Abandono e insucesso escolar: Construir uma perspetiva de género: Relatório final. Universidade de Lisboa. Disponível em https:// conversamos.wordpress.com/2017/02/22/abandonoe-insucesso-escolar-construir-uma-perspetiva-degenero/ Faria, L., & Lima Santos, N. (2006). Competência emocional: Adaptação do emotional skills and competence questionnaire (ESCQ). In C. Machado, L. Almeida, M. A. Guisande, M. Gonçalves, & V. Ramalho (Coords.), Actas das XI Conferência Internacional e Avaliação Psicológica: Formas e contextos (pp. 349356). Braga: Psiquilíbrios Edições. Fernandez, R., Salamonson, Y., & Griffiths, R. (2012). Emotional intelligence as a predictor of academic performance in first-year accelerated graduate entry nursing students. Journal of Clinical Nursing, 21 (23-24), 3485-3492. doi: 10.1111/j.1365-2702.2012.04199.x.

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Ferreira, F., & Fernandes, P. (2015). Fatores que influenciam o abandono no ensino superior e iniciativas para a sua prevenção o olhar de estudantes. Educação, Sociedade & Culturas, 45, 177-197. Disponível em: https://repositorio-aberto.up.pt/bitstream/10216/82680/2/117607.pdf Mayer, J. D., & Salovey, P. (1997). What is emotional intelligence? In P. Salovey, & D. J. Sluyter (Eds.), Emotional development and emotional intelligence: Educational implications (pp. 3-34). New York: Harper Collins. Rabelo, R. (2017). Orientação vocacional é uma das principais causas de abandono no Ensino Superior. Disponível em http://www.utad.pt/vPT/Area2/noticias/Paginas/2017/noticias_fevereiro/orientacao_vocacional.aspx Silva, D. M., & Duarte, J.C. (2012). Sucesso escolar e inteligência emocional. Millenium, 42, 67-84. Disponível em: http://www.ipv.pt/Millenium/Millenium42/6.pdf


Artigo de Investigação

Disponível em http://dx.doi.org/10.19131/rpesm.0209

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ESTRÉS EMOCIONAL EN CUIDADORES MAYORES DE PERSONAS MAYORES | Laura Muñoz Bermejo1; Raul Alberto Cordeiro2; José Carlos Carvalho3; Salvador Postigo Mota4 |

RESUMEN CONTEXTO: Los cuidadores constituyen una población de riesgo de alteraciones psíquicas y físicas. Las alteraciones emocionales, como la depresión y la ansiedad, son enfermedades sub-diagnosticadas en el cuidador. OBJETIVO(S): Conocer las necesidades de apoyo de cuidadores mayores que cuidan de otros mayores así como la asociación al estrés emocional. METODOLOGÍA: Estudio de carácter cuantitativo observacional, transversal y descriptivo de campo. La muestra está constituida por 107 cuidadores mayores de personas mayores, residentes en la zona rural suroeste del Área de Salud de Badajoz de la Comunidad Autónoma de Extremadura (España). La recogida de datos se llevó a cabo mediante un cuestionario estructurado y el procedimiento aplicado fue el de la encuesta. RESULTADOS: La edad media de los adultos mayores que realizan los cuidados es de 76.9 años, ligeramente predominan las mujeres (59.8 %) con respecto a los hombres (40.2 %). El 84,1% de los cuidados se realizan en las relaciones de pareja. El 70,1% de los adultos mayores cuidadores considera que necesita ayuda para realizar las actividades que requieren los cuidados. El 31,8% requiere ayuda de personal especialista por estrés emocional. Existen diferencias estadísticamente significativas (p=.009), entre las personas que necesitan ayuda y el riesgo de alteración emocional del cuidador. CONCLUSIONES: Los cuidadores de edad avanzada demandan ayuda para realizar las labores del cuidado. Además, un tercio de personas que se dedican a los cuidados requieren ayuda de un especialista por estrés emocional, y los cuidadores que necesitan ayuda presentan un mayor riesgo de estrés emocional. PALABRAS CLAVE: Cuidadores; Anciano; Estrés psicológico; Salud mental

RESUMO

ABSTRACT

“Stresse emocional em cuidadores idosos de pessoas idosas”

“Emotional stress in elderly caregivers of the elderly”

CONTEXTO: Os cuidadores constituem uma população em risco de alterações psíquicas e físicas. Distúrbios emocionais, como depressão e ansiedade, são doenças insuficientemente diagnosticadas no cuidador. OBJETIVO(S): Conhecer as necessidades de apoio para cuidadores idosos que cuidam de idosos bem como a sua associação ao stresse emocional. METODOLOGIA: Foi realizado um estudo de campo, quantitativo, observacional, transversal e descritivo. A amostra é constituída por 107 cuidadores idosos de pessoas idosas, moradores da área rural do sudoeste da área de saúde de Badajoz, da Comunidade Autónoma de Extremadura (Espanha). A recolha de dados foi realizada através de um questionário estruturado, aplicado através da realização de uma entrevista. RESULTADOS: A idade média dos idosos participantes é de 76,9 anos, predominam as mulheres (59,8%) em relação aos homens (40,2%). 84,1% dos cuidados ocorrem entre pessoas com relações familiares diretas. 70,1% dos cuidadores idosos consideram que precisam de ajuda para realizar as atividades que requerem cuidados. 31,8% requer ajuda de pessoal especializado devido ao stresse emocional. Existe uma relação estatisticamente significativas (p=0,009) entre as pessoas que precisam de ajuda e o risco de distúrbios emocionais do cuidador. CONCLUSÕES: Os cuidadores idosos exigem assistência para realizar as tarefas de cuidados. Além disso, um terço dos cuidadores requer ajuda de um especialista em stresse emocional, e cuidadores que precisam de ajuda têm maior risco de stresse emocional.

BACKGROUND: Caregivers constitute a population at risk of psychic and physical alterations. Emotional disturbances, such as depression and anxiety, are under-diagnosed diseases in the caregiver. AIM: To know the support needs for elderly caregivers who care for the elderly as well as their association with emotional stress. METHODS: Study of quantitative observational, transversal and descriptive field. The sample is constituted by 107 elderly caregivers of elderly people, residents in the rural southwestern area of Badajoz Health Area of the Autonomous Community of Extremadura (Spain). The data collection was carried out through a structured questionnaire and the procedure applied was that of the survey. RESULTS: The average age of the elderly who perform the care is 76.9 years, slightly women predominate (59.8%) with respect to men (40.2%). 84.1% of care is carried out in marital relationships. 70.1% of elderly caregivers consider that they need help to perform the activities that require care. 31.8% requires help from specialized personnel due to emotional stress. There are statistically significant differences (p = .009) between people who need help and the risk of emotional disturbance of the caregiver. CONCLUSIONS: Elderly caregivers demand assistance to carry out the tasks of care. In addition, one third of caregivers require help from a specialist for emotional stress, and caregivers in need of help have a greater risk of emotional stress.

PALAVRAS-CHAVE: Cuidadores; Idosos, Stresse psicológico; Saúde mental

KEYWORDS: Caregivers; Aged; Psychological stress; Mental health Submetido em 30-12-2017 Aceite em 03-05-2018

1 Doctora por la Universidad de Sevilla; Profesora Colaboradora en la Universidad de Extremadura, Calle Santa Teresa de Jornet, Mérida, Espanha, lauramunoz@unex.es 2 Doutor em Ciências e Tecnologias da Saúde pela Universidade de Lisboa; Professor Adjunto no Instituto Politécnico de Portalegre, Escola Superior de Saúde, 7300 Portalegre, Portugal, raulcordeiro@essp.pt 3 Doutor em Ciências de Enfermagem; Investigador no Center for Health Technology and Services Research (CINTESIS); Professor Adjunto na Escola Superior de Enfermagem do Porto, 4200-072 Porto, Portugal, zecarlos@esenf.pt 4 Doctor por la Universidad de Sevilla; Profesor Titular en la Universidad de Extremadura, 06006 Badajoz, Espanha info@salvadorpostigo.com Citação: Muñoz Bermejo, L., Cordeiro, R. A., Carvalho, J. C., & Postigo Mota, S. (2018). Estrés emocional en cuidadores mayores de personas mayores. Revista Portuguesa de Enfermagem de Saúde Mental (Spe. 6), 25-30. doi: 10.19131/rpesm.0209 Revista Portuguesa de Enfermagem de Saúde Mental, ESPECIAL 6 (OUT.,2018) | 25


INTRODUCCIÓN La tarea de cuidar a un enfermo comprende a menudo la aparición de una amplia variedad de problemas de orden físico, psíquico y sociofamiliar, que componen un auténtico síndrome que es necesario conocer y diagnosticar tempranamente para prevenir su agravamiento. De igual manera hay otros factores que pueden influir en la salud del cuidador y que pueden afectarlo; habrá de considerar edad, género, parentesco, tiempo de dedicación y otras cargas familiares, elementos que han demostrado influir en la aparición del síndrome del cuidador (Guedes, 2013). El cuidador principal de personas mayores asume una serie de tareas y responsabilidades que repercuten en el ámbito físico y psicológico. Entre las funciones del cuidador principal se incluyen la mayoría de las tareas de cuidado para la satisfacción de las necesidades básicas, manejo del dolor, la gestión médica y control de la medicación (Wittenberg-Lyles, Demiris, Parker Oliver, Washington, Burt, & Shaunfield, 2012). Diversos estudios demuestran las consecuencias que la situación de cuidado genera en el cuidador (Cerquera Córdoba & Galvis Aparicio, 2014; Mesa-Gresa, Ramos-Campos & Redolat, 2017). Se describen repercusiones psíquicas y físicas como ansiedad y depresión, sobrecarga o cansancio en el desempeño del rol de cuidador, dolores musculares relacionados con el esfuerzo, percepción negativa de su estado de salud y en general una pérdida de la calidad de vida (Dueñas, Martínez, Morales, Muñoz, Viáfara & Herrera, 2006; Guedea, García & Sander, 2013). Esta situación, constituye un estado estresante con peligro de desbordar y agotar los recursos y repercutir en su estado de ánimo y en la modificación de los umbrales de percepción del sufrimiento y del dolor del enfermo a su cuidado (Dueñas et al., 2006). Cuanto más exigente es la responsabilidad del cuidador, mayor será la cantidad de estrés emocional y el sufrimiento en las experiencias del cuidador (Lau, Kasper, Hauser, Berdes, Chang, Berman & Emanuel, 2009). El desempeño de un adulto mayor en funciones de cuidador exige de este una entrega para la cual sus capacidades también están envejecidas, y están presentes en él enfermedades o limitaciones que tienden a incrementarse al ofrecer cuidados, y hacen que se sumen a la ya existente sobrecarga del cuidador (Baster Moro, 2012).

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Por lo tanto, es una realidad que en nuestra sociedad se encuentran personas mayores que a su vez están cuidando a otras personas mayores y es necesario valorar, por parte de los profesionales de enfermería, el estado emocional de los adultos mayores que realizan labores de cuidado así como la demanda de ayuda para realizar las actividades necesarias. METODOLOGIA Tipo de estudio: Se trata de un estudio de carácter cuantitativo observacional, transversal y descriptivo de campo, donde la población muestral está compuesta por personas mayores que ejercen como cuidadores principales de otras personas mayores. Participantes: La muestra está constituida por 107 cuidadores mayores de personas mayores, residentes en la zona rural suroeste del Área de Salud de Badajoz de la Comunidad Autónoma de Extremadura (España). Los municipios seleccionados para la obtener la muestra se corresponden con las zonas de salud de Olivenza, Alconchel y Villanueva del Fresno, ubicadas en La Raya (zona limítrofe con Portugal), donde residen 2899 personas mayores de 65 años. Como criterio de inclusión se ha marcado la selección de personas de edad igual o superior a 65 años, cuidadoras principales de personas mayores y residentes en los municipios rurales de la zona rural Suroeste del Área de Salud de Badajoz. Consideramos “cuidadores principales” como cuidadores no remunerados (familiares, amigos, miembros de la comunidad o voluntarios) que cuidan tanto en instituciones como en el hogar. Aunque es recomendable el uso de test neuropsicológicos e instrumentos de cribado, como el MMSE (Mini Mental State Examination) para detectar y seguir la evolución del deterioro cognitivo, es cierto que la interpretación de sus resultados depende de factores como la edad y el nivel educativo. En nuestro estudio no se llevó a cabo este cribado puesto que el objetivo era valorar al cuidador mayor de personas mayores independientemente de su capacidad funcional y cognitiva. Para la selección de los sujetos que formaron parte de la muestra se utilizó el censo poblacional de cuidadores mayores de personas mayores elaborado por el Servicio de asuntos Sociales de los municipios.


La población total al inicio del estudio era de 151 sujetos cuidares mayores y para la planificación y realización de la entrevista a las personas censadas se contó con el trabajador social de cada municipio, que actuó de intermediario entre la persona mayor a entrevistar y el investigador Graduado en Enfermería. El trabajador social concertó una entrevista individualizada en el domicilio de la persona mayor, informándole de la finalidad de la entrevista para evitar confusiones y atenuar los prejuicios a contestar a personas desconocidas. La labor del trabajador social finaliza una vez concertada la entrevista, de tal forma que es el profesional de enfermería el que realiza la entrevista y recoge los datos. El procedimiento aplicado para la recogida de datos ha sido la encuesta. Instrumentos: La recogida de datos se ha realizado mediante un cuestionario estructurado. Para la elaboración del cuestionario se ha tenido como referencia el Cuestionario de Cuidadores/as principales, incluido en la Encuesta de Discapacidad, Autonomía personal y situaciones de Dependencia del Instituto Nacional de Estadística de España. Esta encuesta es una investigación a nivel estatal, diseñada con la finalidad de obtener datos sobre las características y situación de las personas con discapacidad, que residen en hogares privado y forma parte del Plan Estadístico Nacional. Entre los ítems, se incluyen cuestiones sobre el perfil socioeconómico del cuidador y el rol del cuidador. El Cuestionario de Salud General de Goldberg GHQ-12 evaluará el estado emocional del cuidador, y está formado por doce ítems, siendo seis de ellos sentencias positivas y seis sentencias negativas. Los ítems son contestados a través de una escala tipo Likert de cuatro puntos (0-1-2-3), que puede ser transformada en una puntuación dicotómica (0- 0-1-1), llamada puntuación GHQ. El cuestionario presenta adecuada consistencia interna en los diferentes estudios realizados con alfas de Cronbach que varían entre .82 y .86. Para dar cumplimiento a los supuestos éticos, se obtuvo el consentimiento informado de los cuidadores. A todos los participantes se les garantizó el anonimato y la confidencialidad de la información proporcionada, y pudieron retirarse del estudio en cualquier momento. Como consecuencia de la obtención del consentimiento informado de cada participante, no fue necesario la evaluación mediante un comité de ética. Análisis de Resultados: Los datos recogidos se han registrado en el programa SPSS (Statistical Package for the Social Sciences), IBM SPSS, versión 19.

Para obtener los resultados deseados se ha realizado un análisis descriptivo univariable a través de cálculos de frecuencias, acompañado de análisis descriptivo bivarible con tablas de contingencia. También, con la finalidad de indagar en las relaciones significativas entre las variables consideradas, se ha realizado análisis inferencial. Finalmente, dado que son variables nominales, se realizó la prueba de Chi Cuadrado y Coeficiente de Contingencia. RESULTADOS En el estudio participaron 107 personas mayores cuidadoras principales de personas mayores (70,86%) de una población de 151. En la tabla 1 se presentan los datos pertenecientes a las características generales del cuidador mayor. Predomina ligeramente el sexo femenino (59,8%, n = 64), sin embargo el porcentaje de hombres alcanza un 40,2%. La edad media de los adultos mayores que realizan los cuidados es de 76,9 años. Así mismo, la edad mínima de la persona mayor cuidadora es de 65 años y la máxima de 92. Los tramos de edad donde hay mayor representatividad se encuentran en los intervalos de 75 – 79 y 80 – 84 años, registrando un 29,0% y 27,1% respectivamente, lo que supone que el 56,1% de las personas cuidadoras tienen edades comprendidas entre 75 y 84 años, siendo concretamente los 80 años la edad de mayor frecuencia registrada. Tabla 1 - Características del cuidador mayor de personas mayores Características del cuidador mayor

TOTAL N=107

Sexo: n (%) Masculino Femenino

43 (40,2%) 64 (59,8%)

Edad media (años)

76,9

65-69 años 70-74 años 75-79 años 80-84 años 85-89 años Más de 90 años

16 (15%) 19 (17,8%) 31 (29%) 29 (27,1%) 11 (10,3%) 1 (0,9%)

Parentesco del cuidador con la persona cuidada: n (%) Hijo/a Madre/Padre Marido /Mujer Hermano/hermana

1 (0,9%) 6 (5,6%) 90 (84,1%) 10 (9,3%)

Horas que dedica a cuidar: n (%) 2-4 horas 4-8 horas 8-12 horas 24 horas

5 (4,7%) 8 (7,5%) 19 (17,8%) 75 (70,1%)

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De los participantes, y en cuanto al parentesco entre el cuidador y la persona cuidada, el 48,6% de las mujeres encuestadas cuidan a sus respectivos maridos y el 35,5% de los casos son hombres los que cuidan a sus esposas. En este sentido podemos observar que el 84,1% de los cuidados se realizan en las relaciones de pareja. En referencia a las horas dedicadas a los cuidados por parte de los adultos mayores, en el 70,1% de los casos se dedican las 24 horas del día a los cuidados, un 17,8% dedica entre 8 y 12 horas a los cuidados y el 12,2% restante se reparte entre 4 -8 horas (7,5%) y de 2 a 4 horas (4,7%). En la tabla 2 se presentan los aspectos relativos a la necesidad de ayuda del cuidador mayor para realizar las labores del cuidado, así, el 70,1% de los adultos mayores cuidadores considera que necesita ayuda para realizar las actividades que requieren los cuidados, mientras que 29,9% señala que por el momento no la necesita. Tabla 2 - Necesidad de ayuda del cuidador mayor de personas mayores

Características del cuidador mayor

TOTAL N=107

Necesidad de ayuda: n(%) Si No

75 (70,1%) 32 (29,9%)

Ayudas que requiere: n (%) Cuidado de sí mismo Ayuda en desplazamientos Utilización de brazos y manos Ayuda sensorial visual y auditiva Actividades de la casa Toma de medicación Administración de bienes Relación y comunicación Desplazamientos fuera del hogar Situaciones conflictivas

57 (53,3%) 24 (22,4%) 6 (5,6%) 7 (6,5%) 71 (66,4%) 18 (16,8%) 11 (10,3%) 9 (8,4%) 22 (20,6%) 8 (7,5%)

En la tabla que a continuación se presenta, se detallan las ayudas que requieren las personas que realizan los cuidados; como se puede observar, principalmente, más del 50% de las personas encuestadas indican que para realizar los cuidados necesitan ayuda relacionadas con las actividades de la casa (66,4%), seguido, generalmente, de la necesidad de contar con apoyo para cuidar de sí mismo/a, en términos de baños y aseo (53,3%). En menor medida, menos del 25% de las personas cuidadoras (aproximadamente 1 de cada 4), requieren otras ayudas: en los desplazamientos dentro del hogar (22,4%), en los desplazamientos fuera del hogar (20,6%), en la toma de medicación (16,8%), Revista Portuguesa de Enfermagem de Saúde Mental, ESPECIAL 6 (OUT.,2018) | 28

en la administración de bienes (10,3%), relaciones y comunicación con las demás personas (8,4%), ayuda en situaciones conflictivas (7,5%), ayuda sensorial y auditiva (6,5%) y ayuda en la utilización de brazos y manos (5,6%). En lo que respecta al riesgo emocional de los cuidadores mayores (Tabla 3), según los datos obtenidos mediante el cuestionario de salud general de Goldberg, un 68,2% de las personas cuidadoras no requiere consulta del especialista frente a un 31,8% que sí requiere ayuda de personal especialista para tratar alteraciones emocionales. Tabla 3 - Estado emocional del cuidador mayor de personas mayores Estado emocional del cuidador

TOTAL N=107

Cuestionario de Goldberg: n (%) Necesita ayuda de un especialista No necesita ayuda de un especialista

34 (31,8%) 73 (68,2%)

Se han encontrado diferencias estadísticamente significativas en las medias en relación al número de horas dedicadas a los cuidados; en este sentido cabe indicar que la prueba de la Anova para un factor calcula una significación de (p=.011). Además, la prueba de Games-Howell especifica que, estas diferencias se encuentran, en concreto, en el grupo de personas que realizan 24 horas de cuidado con respecto a las personas que se dedican a los cuidados entre 2-4 horas y 8-12 horas. Por lo tanto, las personas que realizan los cuidados durante 24 horas presentan mayor estrés emocional en comparación con las personas que realizan los cuidados entre 2-4 horas y 8-12 horas. También se han observado diferencias estadísticamente significativas (p=.009) entre las personas que necesitan ayuda, ya que presentan una media más elevada en la escala de Goldberg, y quienes señalan que no necesitan ayuda. Por lo tanto, las personas que necesitan ayuda presentan un mayor riesgo emocional en comparación con las personas que no la necesitan. DISCUSIÓN Las repercusiones en la salud física que se derivan de desarrollar las labores del cuidado a un familiar hacen que ésta dimensión tenga un gran peso en la sobrecarga (Delgado, Suárez, de Dios, Valdespino & Sousa, 2014; Roth, Fredman & Haley, 2015) y repercute en la aparición de alteraciones emocionales afectando a la salud mental del cuidador.


Los resultados presentados apuntan a una demanda intensa de ayuda por parte del cuidador mayor que desempeña el rol del cuidador principal de otra persona mayor. Además, entre las ayudas que requieren destacan dos: ayuda para el cuidado de sí mismo/a, en términos de baño y aseo, y ayuda para las actividades de la casa. En el mismo sentido, las estrategias de afrontamiento del estrés que utilizan los cuidadores son la búsqueda de ayuda por parte de familiares, seguida de la búsqueda de ayuda de otras personas y por último, la búsqueda de información en el 28,0 %, aunque no se especifica si el apoyo familiar ayuda en labores domésticas o exclusivamente en el cuidado (Espín Andrade, 2008). Esta necesidad de ayuda que manifiestan los cuidadores puede influir en el estado emocional del cuidador, ya que es posible que la soledad y la sobrecarga de cuidados influyan en el estrés y la necesidad de acudir a un especialista. Aún así, los niveles de estrés emocional hacen que un 31,8% de los cuidadores mayores necesiten ayuda de un especialista para solventar los problemas de ansiedad y depresión que se presentan. Sin embargo, más allá de la percepción subjetiva del cuidador, se constata, que un 21,7% de los cuidadores tienen algún trastorno psicopatológico, y lo que es más importante, que a un 13,9% se les diagnosticó ese trastorno siendo ya cuidadores (López, 2007). Además, la aparición de sobrecarga emocional es más probable a medida que aumenta el grado de dependencia del enfermo (Peña-Longobardo & OlivaMoreno, 2015). Sin embargo, los datos aportados en este estudio, relacionan la necesidad de ayuda del cuidador con el nivel de dependencia de la persona a la que cuida. Como factores asociados al estrés emocional se encuentran las horas diarias dedicadas al cuidado y la necesidad de ayuda que manifiesta el cuidador. Además, también se han asociado las horas diarias dedicadas al cuidado, estado de salud y abandono o disminución de actividad por el cuidado (Cardona, Segura, Berbesí Fernández & Agudelo, 2013). CONCLUSIÓN Los cuidadores de edad avanzada y cuidadores de otras personas mayores destinan sus cuidados a la pareja y demandan ayuda para realizar las labores del cuidado. Además, un tercio de personas que se dedican a los cuidados requieren ayuda de un especialista por estrés emocional. Finalmente se puede concluir que las personas que necesitan ayuda presentan un mayor riesgo de estrés emocional.

IMPLICACIONES PARA LA PRÁCTICA CLÍNICA Los Profesionales de Enfermería en Salud Mental deben conocer el nivel de estrés emocional que sufre el cuidador de edad avanzada para poder anticiparse a las necesidades que presentan este grupo de población y así poder realizar acciones de prevención y promoción de la salud. Para ello, resulta muy útil realizar entrevistas a los cuidadores, donde se constate la salud emocional así como el apoyo social que reciben, y si fuese necesario, emplear las estrategias de enfermería necesarias para crear espacios de respiro del cuidador y cubrir las necesidades de autocuidado. REFERENCIAS BIBLIOGRÁFICAS Baster Moro, J. C. (2012). Adultos mayores en funciones de cuidadores de ancianos. Revista Cubana de Salud Pública, 38 (1), 168-173. Disponível em: http://scielo.sld.cu/scielo.php?script=sci_arttext&pid =S0864-34662012000100016 Cardona, D., Segura, A. M., Berbesí Fernández, D. Y., & Agudelo, M. A. (2013). Prevalencia y factores asociados al síndrome de sobrecarga del cuidador primario de ancianos. Revista Facultad Nacional de Salud Pública, 31(1), 30-39. Disponível em: http:// aprendeenlinea.udea.edu.co/revistas/index.php/ fnsp/article/view/12411/13305 Cerquera Córdoba, A. M., & Galvis Aparicio, M. J. (2014). Efectos de cuidar personas con Alzheimer: un estudio sobre cuidadores formales e informales. Pensamiento psicológico,12 (1), 149-167. Disponível em: http://www.scielo.org.co/scielo.php?script=sci_ arttext&pid=S1657-89612014000100011 Delgado, O., Suárez, R., de Dios, I, Valdespino, Y., & Sousa, G. (2014) Características y factores relacionados con sobrecarga en una muestra de cuidadores principales de pacientes ancianos con demencia. Revista Española de Medicina de Familia, 40 (2), 57-64. Dueñas, E., Martínez, M. A., Morales, B., Muñoz, C., Viáfara, A. S., & Herrera, J. A. (2006). Síndrome del cuidador de adultos mayores discapacitados y sus implicaciones psicosociales. Colombia Médica, 37 (2), 31-38. Disponível em: http://www.scielo.org.co/pdf/ cm/v37n2s1/v37n2s1a05.pdf Revista Portuguesa de Enfermagem de Saúde Mental, ESPECIAL 6 (OUT.,2018) | 29


Espín Andrade, A. M. (2008). Caracterización psicosocial de cuidadores informales de adultos mayores con demencia. Revista Cubana de Salud Pública, 34 (3), 1-12. Disponível em: http:// scielo.sld.cu/scielo.php?script=sci_arttext&pid =S0864-34662008000300008 Guedea, M. T. D., García, A. O., & Sander, M. A. R. (2013). Bienestar, apoyo social y contexto familiar de cuidadores de adultos mayores. Acta de investigación psicológica, 3 (1), 1018-1030. Disponível em: http:// www.scielo.org.mx/scielo.php?script=sci_arttext&pid =S2007-48322013000100009 Guedes, A. C. (2013). Sobrecarga, enfrentamiento, síntomas físicos y morbilidad psicológica en cuidadores de familiares dependientes funcionales. Revista Latino-Americana de Enfermagem, 21 (4), 935-940. Disponível em: http://www.scielo.br/pdf/rlae/v21n4/ es_0104-1169-rlae-21-04-0935.pdf Lau, D. T., Kasper, J. D., Hauser, J. M., Berdes, C., Chang, C. H., Berman, R. L., & Emanuel, L. (2009). Family caregiver skills in medication management for hospice patients: a qualitative study to define a construct. Journals of Gerontology Series B: Psychological Sciences and Social Sciences, 64 (6), 799-807. Doi: 10.1093/geronb/gbp033

Revista Portuguesa de Enfermagem de Saúde Mental, ESPECIAL 6 (OUT.,2018) | 30

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Artigo de Investigação

5

Disponível em http://dx.doi.org/10.19131/rpesm.0210

LITERACIA EM SAÚDE MENTAL SOBRE ABUSO DE ÁLCOOL: UM ESTUDO COM ADOLESCENTES PORTUGUESES | Amorim Rosa1; Luís Loureiro2; Carlos Sequeira3 |

RESUMO CONTEXTO: A adolescência configura um período conturbado em torno da busca da identidade, indiciando um processo de vulnerabilidade em relação ao início das perturbações mentais, mas também ao abuso de álcool. A esta vulnerabilidade associa-se uma forte relutância e atrasos na procura de ajuda profissional que, para além de agravar o problema, poderão comprometer o potencial de desenvolvimento dos adolescentes. Por outro lado, o uso precoce de álcool implica um maior risco de dependência na idade adulta. OBJETIVO: Caraterizar a literacia em saúde mental sobre abuso de álcool em adolescentes. METODOLOGIA: Estudo exploratório descritivo. Foi aplicada a MentaHLiS-AA a uma amostra de 255 adolescentes (159 raparigas e 96 rapazes), com idades entre os 10 e os 18 anos (M=14.38, DP=2.20), estudantes do 2º e 3º ciclos e secundário, em escolas públicas do distrito de Coimbra. Calcularam-se as estatísticas resumidas apropriadas e as frequências absolutas e percentuais.RESULTADOS: Verificou-se que 25,5% dos participantes não reconheceram o problema apresentado na vinheta. Nos outros componentes, os níveis de literacia são modestos, verificando-se a preferência por fontes informais de ajuda e a opção por estratégias de apoio social e encaminhamento passivo para ajudar os pares com problemas de saúde mental. CONCLUSÃO: Verificaram-se défices em alguns aspetos da literacia sobre o abuso de álcool em adolescentes, sendo necessária uma intervenção nesta área, sobretudo através do desenvolvimento e implementação de programas de promoção da literacia nas escolas. PALAVRAS-CHAVE: Literacia; Saúde mental; Adolescentes; Abuso de álcool

RESUMEN

ABSTRACT

“Alfabetización en salud mental sobre abuso de alcohol: Un estudio con adolescentes portugueses”

“Mental health literacy on alcohol abuse: A study with Portuguese adolescents”

CONTEXTO: La adolescencia configura un período conturbado en torno a la búsqueda de la identidad, indiciando un proceso de vulnerabilidad en relación al inicio de las perturbaciones mentales, pero también al abuso de alcohol. A esta vulnerabilidad se asocia una fuerte reticencia y retrasos en la demanda de ayuda profesional que, además de agravar el problema, podrán comprometer el potencial de desarrollo de los adolescentes. Por otro lado, el uso precoz de alcohol implica un mayor riesgo de dependencia en la edad adulta. OBJETIVO: Caracterizar la alfabetización en salud mental sobre abuso de alcohol en adolescentes. METODOLOGÍA: Estudio exploratorio descriptivo. Se aplicó la MentaHLiS-AA a una muestra de 255 adolescentes (159 niñas y 96 niños), con edades entre los 10 y los 18 años (M = 14.38, DE = 2.20), estudiantes de 2º y 3º ciclos y secundario en escuelas públicas del distrito de Coimbra. Se calcularon las estadísticas resumidas apropiadas y las frecuencias absolutas y porcentuales. RESULTADOS: Se verificó que el 25,5% de los participantes no reconoció el problema presentado en la viñeta. En los otros componentes, los niveles de alfabetización son modestos, verificándose la preferencia por fuentes informales de ayuda y la opción por estrategias de apoyo social y encaminamiento pasivo para ayudar a los pares con problemas de salud mental. CONCLUSIONES: Se verificaron déficit en algunos aspectos de la alfabetización sobre el abuso de alcohol en los adolescentes portugueses, siendo necesaria una intervención en esta área, sobre todo a través del desarrollo e implementación de programas de promoción de la alfabetización en las escuelas.

BACKGROUND: Adolescence is a troubled period around the search for identity, indicating a process of vulnerability to the onset of mental disorders, but also to alcohol abuse. This vulnerability is associated with a strong reluctance and delays in professional help seeking, which, in addition to worsening the problem, could compromise the adolescents’ potential for development. On the other hand, the early use of alcohol implies a greater risk of dependence in adulthood. AIM: Characterize mental health literacy on alcohol abuse in adolescents. METHODS: Exploratory descriptive study. The MentaHLiS-AA was applied to a sample of 255 adolescents (159 girls and 96 boys), aged between 10 and 18 years (M = 14.38, SD = 2.20), attending schools in the 2nd and 3rd cycle and secondary education in Coimbra. The appropriate summary statistics and the absolute and percentage frequencies were calculated. RESULTS: We found that 25.5% of participants did not recognize the problem presented in the vignette. In the other components, literacy levels are modest, with preference for informal sources of help and choice for social support and passive referral strategies to help peers with mental health problems. CONCLUSIONS: There are deficits in literacy on alcohol abuse among adolescents, requiring intervention in this area, especially through the development and implementation of programs to promote mental health literacy in schools.

DESCRIPTORES: Alfabetización; Salud mental; Adolescentes; Abuso de alcohol

Submetido em 18-12-2016 Aceite em 20-04-2017

KEYWORDS: Literacy; Mental health; Adolescents; Alcohol abuse

1 Doutor; Professor Adjunto na Escola Superior de Enfermagem de Coimbra, Rua 5 de Outubro, Apartado 7001, 3046-851 Coimbra, Portugal, amorim@esenfc.pt 2 Doutor; Professor Adjunto na Escola Superior de Enfermagem de Coimbra, 3046-851 Coimbra, Portugal, lloureiro@esenfc.pt 3 Doutor; Professor Coordenador na Escola Superior de Enfermagem do Porto, 4200-072 Porto, Portugal, carlossequeira@esenf.pt Citação: Rosa, A., Loureiro, L., & Sequeira, C. (2018). Literacia em saúde mental sobre abuso de álcool: Um estudo com adolescentes portugueses. Revista Portuguesa de Enfermagem de Saúde Mental (Spe. 6), 31-38. Revista Portuguesa de Enfermagem de Saúde Mental, ESPECIAL 6 (OUT.,2018) | 31


INTRODUÇÃO A adolescência pode configurar um período conturbado em torno da busca da identidade. As transições, definições e experiências que ocorrem nesta fase, em alguns casos, tornam-se particularmente desestabilizadoras, causando sofrimento psíquico e determinando uma vulnerabilidade acrescida para a exposição ao abuso de substâncias, como é o caso do álcool (Rosa, Loureiro e Sequeira, 2016). Neste período, é comum ocorrerem oscilações no estado emocional, envolvendo sentimentos de tristeza, revolta e depressão, podendo o adolescente procurar no consumo de álcool, uma forma de ‘mascarar’ as situações conflituantes, internas ou sociais (Tavares, Reinaldo, Villa, Henriques e Pereira, 2017). Por outro lado, a necessidade de se sentir aceite pelos pares e de definir a sua identidade, podem também ser fatores determinantes da experimentação (Ribeiro, Pereira, Wiesl, Silva e Saldanha, 2017). Estudos epidemiológicos demonstram que o consumo de álcool é uma das principais preocupações de saúde pública, particularmente em relação aos adolescentes, porque é nesta fase que geralmente ocorrem as primeiras experiências de consumo (Atanázio, Santos, Dionísio, Silva e Saldanha, 2013), e porque constitui o maior fator de risco para a saúde dos adolescentes (Ferreira e Torgal, 2010 citados por Faria e Martins, 2016). Os estudos indicam que quanto mais precoce é a fase de experimentação, maior o risco de abuso e dependência na idade adulta (Wandekoken, Vicente e Siqueira, 2011). Neste sentido, atendendo a que o uso precoce de álcool é altamente prevalente entre os adolescentes e que o seu consumo tem sido associado a alterações na estrutura cerebral, função e neuro cognição, além de inúmeras repercussões negativas no campo social (Tavares et al., 2017), têm sido desenvolvidas intervenções no âmbito da educação para a saúde, visando a prevenção do consumo precoce e do seu uso inadequado, alertando para os riscos, consequências e efeitos individuais e coletivos. Estas intervenções, se ancoradas no conceito de literacia em saúde mental (LSM), tendem a ser eficazes, pois implicam um conhecimento voltado para a ação (Jorm, 2012; Loureiro et al., 2013a), traduzido em comportamentos de procura de ajuda, que estão relacionados de forma direta com os níveis de LSM (Chong et al., 2016; Jorm, 2012). Revista Portuguesa de Enfermagem de Saúde Mental, ESPECIAL 6 (OUT.,2018) | 32

A LSM, definida como os conhecimentos e crenças acerca das perturbações mentais que facilitam o seu reconhecimento, prevenção e/ou gestão, engloba um conjunto de componentes interligadas: a) conhecimento de como prevenir as perturbações mentais; b) reconhecimento do despoletar da doença; c) conhecimento das opções de ajuda e tratamentos disponíveis; d) conhecimento de estratégias de autoajuda para os problemas menos graves; e e) competências para prestar a primeira ajuda, a outras pessoas em situação de crise ou em desenvolvimento de uma perturbação mental (Jorm, 2012). Assim, apesar de alguns estudos mostrarem que o abuso de álcool é uma das perturbações mais frequentemente reconhecidas (Chong et al., 2016; Picco et al., 2017), de um modo geral os níveis de LSM são modestos pelo que é imperativo que os profissionais de saúde, sobretudo os enfermeiros, concebam e implementem programas de educação e sensibilização para a saúde mental, empoderando os adolescentes com as habilidades e conhecimentos necessários para identificar os sinais e sintomas do problema, promovendo comportamentos de procura de ajuda precoces, o que poderá reduzir a carga de doença associada (Bor, 2015). Este estudo tem como objetivo caraterizar a LSM sobre abuso de álcool em adolescentes. METODOLOGIA Participantes Estudo de natureza quantitativa, nível exploratório descritivo, realizado com uma amostra de 255 adolescentes, com idades compreendidas entre os 10 e os 18 anos, a frequentar o 2º e 3º ciclos e secundário, em 11 escolas do distrito de Coimbra, selecionadas aleatoriamente através do software Random Integer Generator. Em cada escola foi selecionada uma turma correspondente a cada um dos ciclos de estudos. A amostra foi constituída pelos adolescentes que acederam participar no estudo após informação dos seus objetivos e autorização dos pais ou encarregados de educação. Instrumento de Colheita de Dados O instrumento utilizado (MentaHLiS-AA) é constituído por cinco subescalas que avaliam os componentes da LSM, utilizando diferentes formatos de resposta. A 1ª parte inclui instruções de preenchimento e questões de caraterização sociodemográfica (género, idade e escolaridade dos participantes e habilitações literárias dos pais).


A 2ª parte compreende as subescalas relativas aos componentes da LSM, sendo as questões ancoradas numa vinheta clínica, retratando o caso de um/a adolescente (Pedro/Francisca) com critérios para abuso de álcool, segundo o DSM-IV-TR, adaptada a partir da versão original do Survey of Mental Health Literacy in Young People – Interview Version (Jorm, 2000). Das cinco subescalas que compõem a MentaHLiSAA, três avaliam componentes específicos relacionados com o problema apresentado na vinheta: I - ‘Reconhecimento do problema’; II - ‘Recursos e opções de ajuda’; e III - ‘Crenças e intenções para prestar a primeira ajuda’, enquanto as restantes duas avaliam dimensões e atributos genéricos: IV - ‘Barreiras e facilitadores na procura de ajuda’; e V - ‘Estilos de vida e comportamentos de saúde’. Neste estudo, tendo em conta o seu objetivo, foram utilizados unicamente os resultados das subescalas I, II e III que avaliam os componentes específicos relacionadas com o “Abuso de álcool”. A subescala ‘I’ avalia a capacidade dos adolescentes para reconhecer o problema, selecionando as respostas numa escala de escolha múltipla, composta por 10 rótulos com diferentes níveis de adequação à situação apresentada. Os valores do alfa de Cronbach mostram um bom ajustamento do modelo: dimensão 1 (.670); dimensão 2 (.369); média com base no autovalor médio (.558). A subescala ‘II’ (α=.789) é composta por nove opções de resposta à questão “Como consideras que cada uma das seguintes pessoas poderia ajudar o/a Pedro/Francisca?” É solicitado aos participantes que pontuem as diferentes opções apresentadas numa escala de 1 (prejudicaria muito) a 5 (ajudaria muito). Por fim, a subescala ‘III’ (α=.756) inclui 7 opções de resposta à questão “O que farias para ajudar o/a Pedro/Francisca?” É pedido aos participantes que assinalem numa escala de 1 (discordo muito) a 5 (concordo muito), em que medida concordam com cada ação apresentada. O conteúdo da totalidade dos itens e a vinheta utilizada apresentam-se em detalhe no estudo de construção e validação do instrumento (Rosa et al., 2016).

Aprovação Ética O estudo e o instrumento foram aprovados pela Direcção-Geral de Educação – Gabinete de Projetos Educativos do Ministério da Educação do Governo Português (n.º 0404700001) e pela Comissão de Ética da Unidade de Investigação em Ciências da Saúde – Enfermagem (UICISA-E) da Escola Superior de Enfermagem de Coimbra (P187-10-2013). Dadas as caraterísticas da amostra, todos os participantes e encarregados de educação assinaram um termo de consentimento informado, após serem informados sobre os objetivos do estudo. Análise Estatística Os dados foram analisados com o software IBM SPSS22. Como se trata de um estudo exploratório descritivo, foram calculadas as estatísticas resumo adequadas e as frequências absolutas e percentuais de modo a responder ao objetivo do estudo, utilizando-se tabelas de frequência simples e compostas.

Procedimento Os dados foram recolhidos nos meses de abril e maio de 2014. Os questionários foram aplicados pelos professores diretores de turma, em sala de aula, em sessões coletivas, num período especificamente disponibilizado para o efeito. O tempo de resposta do questionário situou-se entre os 15 e os 20 minutos. Revista Portuguesa de Enfermagem de Saúde Mental, ESPECIAL 6 (OUT.,2018) | 33


RESULTADOS Participaram no estudo 255 adolescentes, sendo 37,6% do género masculino e 62,4% do género feminino. As idades variam entre os 10 e os 18 anos, sendo a média de 14,38 anos e o desvio padrão de 2,2. A classe modal é a dos 13-15 anos com 122 indivíduos, correspondendo a uma percentagem de 47,8%. A maioria dos adolescentes frequenta o 3º ciclo (55,3%), 32,2% frequentam o ensino secundário e 12,5%, o 2º ciclo. Os pais têm níveis de escolaridade entre o 1º ciclo e o mestrado, verificando-se uma distribuição semelhante, na sua maioria nos quatro primeiros níveis de ensino (1º ciclo; 2º ciclo; 3º ciclo, e ensino secundário), correspondendo a 86,3% dos pais e 72,9% das mães (Tabela 1). Tabela 1 - Distribuição das frequências absolutas e percentagens dos participantes em função das variáveis de caraterização sócio demográfica (N=255) Variáveis

N

%

Masculino

96

37,6

Feminino

159

62,4

Sexo:

Idade:

Reconhecimento do Problema (Abuso de Álcool) No componente ‘Reconhecimento do problema’, a opção mais assinalada foi “Tem problemas com a bebida” com 74,5%, seguida de “Vício” (61,6%), “Dificuldades em se controlar” (49,8%), e “Falta de responsabilidade” com 41,6%. Todas as outras opções de resposta tiveram percentagens relativamente baixas. Contudo, é de realçar também que 25,5% dos participantes não foram capazes de identificar o problema, mesmo perante os critérios claros apresentados na vinheta (Tabela 2). Tabela 2 - Distribuição das frequências absolutas e percentuais para as categorias do componente ‘Reconhecimento do problema’ (N = 255) Reconhecimento do problema

Sim

Não

N

%

N

%

Anda nervoso e triste

59

23,1

196

76,9

Tem problemas afetivos

52

20,4

203

79,6

Tem falta de confiança

72

28,2

183

71,8

Está revoltado

88

34,5

167

65,5

Está a reagir a uma perda

31

12,2

224

87,8

Tem baixa autoestima

67

26,3

188

73,7

Tem dificuldades em se controlar

127

49,8

128

50,2

Tem um vício

157

61,6

98

38,4

10 - 12

52

20,4

13 - 15

122

47,8

16 - 18

81

31,8

Tem falta de responsabilidade

106

41,6

149

58,4

2º Ciclo

32

12,5

Tem problemas com a bebida

190

74,5

65

25,5

3º Ciclo

141

55,3

Secundário

82

32,2

1º Ciclo

40

15,7

2º Ciclo

51

20,0

3º Ciclo

67

26,3

Secundário

62

24,3

Bacharelato/Licenciatura

27

10,6

Outro

8

3,1

1º Ciclo

20

7,8

2º Ciclo

34

13,3

3º Ciclo

62

24,3

Secundário

70

27,5

Bacharelato/Licenciatura

60

23,5

Outro

9

3,6

Escolaridade:

Escolaridade pai:

Escolaridade mãe:

Sendo a MentaHLiS-AA um instrumento que avalia diversos componentes da LSM, os resultados serão apresentados de forma independente para cada componente. Revista Portuguesa de Enfermagem de Saúde Mental, ESPECIAL 6 (OUT.,2018) | 34

Recursos e Opções de Ajuda Quanto aos diferentes recursos e opções de ajuda para a situação apresentada na vinheta (Tabela 3), verificase que os adolescentes consideram como ajudas mais úteis, os amigos de confiança (95,3%) e os familiares (92,5%), mas também alguns profissionais de saúde, destacando-se o psicólogo (85,5%), o psiquiatra (72,5%) e o enfermeiro especialista de saúde mental e psiquiatria (60,8%). Salienta-se também a ambivalência relativa à capacidade de ajuda de alguns profissionais, sendo esta mais significativa relativamente ao médico de família e aos professores, sendo até considerados prejudiciais por 6,7% e 11,4% dos adolescentes, respetivamente (Tabela 3).


Tabela 3 - Distribuição das frequências absolutas e percentuais para as categorias do componente ‘Recursos e opções de ajuda’ (N = 255) Recursos e opções de ajuda

Prejudica Não ajuda nem Ajuda Prejudica muito prejudica Ajuda muito N

%

N

%

N

%

Amigos de confiança

1

0,4

0,4

4,3

243

95,3

Familiares

2

0,8

0,8

6,7

236

92,5

Grupos de autoajuda

12

4,7

4,7

10,6

216

84,7

Psicólogo

6

2,4

2,4

12,2

218

85,5

Psiquiatra

10

3,9

3,9

23,5

185

72,5

Enfermeiro especialista

12

4,7

4,7

34,5

155

60,8

Médico de família

17

6,7

6,7

33,7

152

59,6

Professores

29

11,4

11,4

34,9

137

53,7

Ao nível das crenças e intenções para prestar a primeira ajuda (Tabela 4), verifica-se que os participantes concordam mais com estratégias de apoio social e encaminhamento passivo, considerando mais útil ouvir e compreender (95,7%); apoiar e animar (94,1%); e acompanhar/não abandonar (92,5%), desvalorizando o encaminhamento ativo com envolvimento de adultos, verificando-se que apesar de 87,1% dos participantes concordarem com o encaminhamento para um profissional de saúde especializado, só cerca de metade concordam com o encaminhamento para o médico de família (53,3%) ou para um professor de confiança (52,5%), verificando-se ainda que 12,2% dos participantes discordam do encaminhamento para estes profissionais. Tabela 4 - Distribuição das frequências absolutas e percentuais para as categorias do componente ‘Crenças e intenções para prestar a primeira ajuda’ (N = 255)

Crenças e intenções para prestar a primeira ajuda

Discordo Discordo muito

Não conConcordo cordo Concordo nem discordo muito

N

%

N

%

N

%

Dar-lhe apoio e animá-lo/a 5

2,0

10

3,9

240

94,1

Ouvi-lo/a e tentar compreendê-lo/a

2

0,8

9

3,5

244

95,7

Encaminhá-lo/a para um prof. saúde especializado

6

2,4

27

10,6

222

87,1

Acompanhá-lo/a à consulta, não o/a abandonar

5

2,0

14

5,5

236

92,5

Falar com os familiares (…) estejam mais atentos

11

4,3

26

10,2

218

85,5

Encaminhá-lo/a para um professor de confiança

31

12,2

90

35,2

134

52,5

Encaminhá-lo/a para o médico de família

31

12,2

88

34,5

136

53,3

DISCUSSÃO No presente estudo os autores pretenderam caraterizar a LSM sobre abuso de álcool em adolescentes, incidindo sobre os componentes: reconhecimento da perturbação; recursos e opções de ajuda; e crenças e intenções para prestar a primeira ajuda. De um modo geral a literatura aponta a adolescência como um período crítico durante o qual ocorrem as primeiras experiências de consumo de substâncias, existindo múltiplos fatores relacionados com esta fase desenvolvimental que indiciam um processo de vulnerabilidade do adolescente em relação ao uso e abuso de álcool. É, pois, fundamental que se realize um trabalho específico de promoção da LSM dos adolescentes, fator determinante para a minimização dos riscos associados à falta de informação, que é um dos maiores obstáculos para a intervenção precoce (Tomé, Matos, Gomes, Camacho e Gaspar, 2017). Dos vários componentes da LSM, o reconhecimento do problema emerge como um fator inicial importante, pois é o primeiro passo para a procura de ajuda profissional (Gulliver, Griffiths & Christensen, 2010). Um reconhecimento precoce reduz de forma significativa o intervalo de tempo que medeia entre o surgimento dos sintomas e o acesso aos cuidados de saúde, melhorando a qualidade de vida e os resultados em saúde, tanto do indivíduo como da comunidade (Jorm, 2012; Loureiro et al., 2013b). Depreende-se, então, que défices de LSM, traduzidos na incapacidade de reconhecer os diferentes transtornos e as fontes de ajuda disponíveis, bem como crenças erradas sobre como ajudar os outros, conduzirão ao consequente adiamento da procura de ajuda. Os resultados deste estudo mostram a complexidade do fenómeno do uso e abuso de álcool e do seu reconhecimento como ‘perturbação’, configurando predominantemente um desconhecimento ou visão difusa do problema (Rosa et al., 2016). Por um lado, a maioria dos adolescentes reconhece a situação apresentada na vinheta como um problema de abuso de álcool, contudo, uma percentagem semelhante classifica a situação como um “Vício”. Esta diferença não deve ser entendida como uma mera questão semântica, isto porque o termo ‘vício’ poderá traduzir uma perceção ou visão estereotipada, que no caso do abuso de álcool está muito enraizada na sociedade, podendo dificultar ou impedir que o problema seja percecionado como doença mental (Loureiro, 2013a). Revista Portuguesa de Enfermagem de Saúde Mental, ESPECIAL 6 (OUT.,2018) | 35


Por outro lado, a associação do abuso de álcool com outros fatores como falta de responsabilidade e dificuldades de controlo, caraterísticas de um período de transição crítica ou crise própria da adolescência, é também uma ideia partilhada na sociedade, podendo conduzir a uma desvalorização do problema e constituir uma barreira aos comportamentos de procura e oferta de ajuda (Reavley & Jorm, 2011), bem como à implementação de programas de prevenção (Rickwood, Deane, Wilson & Ciarrochi, 2005). Relativamente ao componente ‘Recursos e opções de ajuda’, verifica-se uma clara preferência dos adolescentes por fontes de ajuda informais. Este facto releva pela perceção de que os adolescentes tendem a desvalorizar as ajudas profissionais, preferindo apoiar-se nos pares e noutras fontes informais como a família, o que poderá retardar de forma significativa o acesso a ajuda especializada. No entanto, a valorização das fontes informais é importante, tanto pelo apoio prestado, como pelo facto de que, muitas vezes, é pela sugestão de amigos e familiares que os adolescentes procuram ajuda (Loureiro et al., 2013b). Porém, salienta-se a sua importância no apoio, mas também a sua insuficiência na ajuda, podendo mesmo ser prejudiciais se a informação prestada for imprecisa e sem utilidade, tendo como consequência o agravamento dos sintomas e o atraso na procura de ajuda especializada (Power, Eiraldi, Clarke, Mazzuca & Krain, 2005; Jorm, 2012, citados por Loureiro, 2013b). Numa segunda linha de importância, surge o psicólogo, o psiquiatra e o médico de família, que enquanto recurso de ajuda próximo e acessível, são a “porta de entrada” nos serviços de saúde, cabendo-lhe a responsabilidade de referenciação das situações para níveis mais diferenciados de cuidados. No entanto, alguns estudos (e.g. Jorm, Wright & Morgan, 2007) têm mostrado que as pessoas com problemas de saúde mental, sobretudo os adolescentes, desvalorizam o papel do médico relativamente a outros profissionais de saúde, ainda que, particularmente o médico de família, seja considerado uma das principais fontes de ajuda profissional útil, conjuntamente com o psicólogo (Loureiro et al., 2013b). Contudo, os profissionais dos cuidados de saúde primários, onde se incluem o médico e o enfermeiro de família, não têm formação adequada pelo que os problemas de saúde mental geralmente não são diagnosticados ou não são detetados (Bor, 2015). Revista Portuguesa de Enfermagem de Saúde Mental, ESPECIAL 6 (OUT.,2018) | 36

Só cerca de metade dos adolescentes reconhecem o professor como uma ajuda útil ou muito útil, e mais de 10% consideram-no prejudicial. Este dado é preocupante, no entanto, poderá ser justificado pelo facto de os adolescentes considerarem que a partilha de problemas pessoais com os professores pode comprometer o seu desempenho e aproveitamento escolar, podendo também estar em causa questões de confidencialidade (Rickwood et al., 2005). Finalmente, no componente ‘Crenças e intenções para prestar a primeira ajuda’, os adolescentes consideram as estratégias de apoio social e encaminhamento passivo como as mais importantes (e.g. ouvir, apoiar, compreender e acompanhar), mas também o encaminhamento ativo com envolvimento de adultos (e.g. encaminhar para ajuda profissional), o que está claramente de acordo com as principais linhas orientadoras dos procedimentos de primeira ajuda em saúde mental (Loureiro, et al., 2013b). De realçar que, também nesta dimensão, o encaminhamento para um professor de confiança é, em simultâneo, a opção com a qual menos adolescentes concordam (52,5%) e aquela com que mais discordam (12,2%). CONCLUSÕES E IMPLICAÇÕES PARA A PRÁTICA Os resultados deste estudo, o primeiro realizado com recurso a este instrumento, revelam que o nível de LSM dos adolescentes é modesto na generalidade dos componentes analisados, pelo que a literacia pode e deve ser melhorada, sobretudo tendo em conta que o abuso/dependência de álcool é uma das perturbações mentais mais graves e de maior prevalência, e que as primeiras experiências de consumo de álcool ocorrem geralmente no início da adolescência, observando-se simultaneamente um consumo excessivo ou abusivo antes dos 18 anos. A estes fatores acresce ainda o facto de a adolescência configurar um período durante o qual as experiências vivenciadas se podem tornar particularmente desestabilizadoras, causando sofrimento psíquico e determinando uma vulnerabilidade acrescida para a exposição ao abuso de álcool. Assim, tendo em vista uma participação mais ativa dos adolescentes nos comportamentos de saúde, compete aos enfermeiros desenvolver e implementar ações educativas integradas num contexto mais vasto de promoção da saúde, incidindo sobre os diversos componentes da LSM e desenvolvidas nos contextos educativos e escolares.


Para tal, devem socorrer-se de ações específicas de informação e treino de competências, capazes de promover a LSM e empoderar os adolescentes para a tomada de decisão e adoção de comportamentos de saúde, sobretudo de procura de ajuda profissional para os problemas de saúde mental. Pelo exposto, torna-se clara a importância deste estudo e a sua relevância para a prática de Enfermagem, visando a promoção de uma saúde mental positiva nos adolescentes. Baixos níveis de LSM implicam dificuldades significativas em aspetos como por exemplo, a compreensão das doenças mentais e dos seus sintomas, a procura de ajuda adequada, a capacidade de ajudar os pares com problemas de saúde mental, e a identificação dos recursos disponíveis ao nível da comunidade, tendo como consequência, entre outros aspetos, um maior número de hospitalizações, aumento dos custos com cuidados de saúde mental e global, e pior estado geral de saúde. REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS Atanázio, E. A., Santos, J. M., Dionísio, L. R., Silva, J. & Saldanha, A. W. (2013). Vulnerability to alcohol use: a study with adolescents from the public and private school systems. SMAD - Revista Eletrónica de Saúde Mental, Álcool e Drogas, 9 (1), 11-17. Disponível em: http://bases.bireme.br/cgi-bin/wxislind.exe/iah/ online/?IsisScript=iah/iah.xis&src=google&base=LIL ACS&lang=p&nextAction=lnk&exprSearch=702002 &indexSearch=ID

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Revista Portuguesa de Enfermagem de Saúde Mental, ESPECIAL 6 (OUT.,2018) | 38

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Artigo de Investigação

6

Disponível em http://dx.doi.org/10.19131/rpesm.0211

PERSPETIVA DOS PAIS SOBRE AS PERTURBAÇÕES DO SONO DAS CRIANÇAS EM IDADE PRÉ-ESCOLAR | Ernestina Silva1; Mónica Macedo2; Paula Simões3; João Duarte4; Daniel Silva5; Manuela Ferreira6 |

RESUMO CONTEXTO: O sono tem um papel determinante no desenvolvimento infantil e quando é perturbado assume um impacto social e na saúde das crianças e pais. OBJETIVO(S): Identificar as perturbações do sono percebidas pelos pais das crianças em idade pré-escolar. METODOLOGIA: Estudo quantitativo, descritivo e correlacional. Amostra não probabilística com 642 pais de crianças. As crianças frequentam o ensino pré-escolar dos concelhos de Albergaria-a-Velha (64,2%) e Águeda (35,8), têm idade média de 4,55 (±0,93) anos e 51,7% são do sexo feminino. O instrumento incluiu um questionário de caracterização sociodemográfica e estilos de vida e o Questionário de Hábitos de Sono das Crianças (CSHQ-PT). RESULTADOS: Apurámos que 82,4% das crianças apresentam perturbação do sono (Global) sendo 43,3% do sexo feminino e com idades de 5-6 anos. A Resistência em ir para a cama é classificada como intermédia para 41% das crianças. Em 40,2% o Início do sono é adequado (demora até 20 minutos) e a Duração do sono é adequada para 45,3%. A Ansiedade associada ao sono e Parassonias apresentam valores semelhantes nos três níveis de classificação. Manifestam Despertares noturnos muito frequentes 38,8%. A maioria (74,3%) apresenta reduzida Perturbação respiratória do sono. Um terço das crianças tem Sonolência diurna elevada. CONCLUSÕES: Os dados revelam a necessidade de dotar os enfermeiros de competências para detetar as alterações no sono e desenvolver programas estruturados de empowerment parental para melhorar os hábitos e higiene do sono das crianças. PALAVRAS-CHAVE: Pré-escolar; Transtornos do sono-vigília; Enfermagem

RESUMEN

ABSTRACT

“Perspectiva de los padres sobre los trastornos del sueño de los niños en edad prescolar”

“Parents’ perspective on sleep disorders in pre-school children”

CONTEXTO: El sueño tiene un papel determinante en el desarrollo infantil y cuando es perturbado asume un impacto social y en la salud de los niños y padres. OBJETIVO(S): Identificar las perturbaciones del sueño percibidas por los padres de los niños en edad preescolar. METODOLOGÍA: Estudio cuantitativo, descriptivo y correlacional. Muestra no probabilística con 642 padres de niños. Los niños asisten a la enseñanza preescolar de los municipios de Albergaria-a-Velha (64,2%) y Águeda (35,8), tienen una edad media de 4,55 (± 0,93) años y el 51,7% son del sexo femenino. El instrumento incluyó un cuestionario de caracterización sociodemográfica y estilos de vida y el Cuestionario de Hábitos de Sueño de los Niños (CSHQ-PT). RESULTADOS: En el 82,4% de los niños presentan Alteración Global del sueño siendo 43,3% del sexo femenino y con edades de 5-6 años. La Resistencia en ir a la cama se clasifica como intermedia para el 41%. En el 40,2% el Inicio del sueño es adecuado (tarda hasta 20 minutos) e la Duración del sueño es adecuada para el 45,3%. La Ansiedad asociada al sueño y Parassonias presentan valores similares en los tres niveles de clasificación. Manifiestan Despertares nocturnos muy frecuentes 38,8%. La mayoría (74,3%) presenta reducida Trastorno respiratorio del sueño. Un tercio de los niños tiene Somnolencia diurna elevada. CONCLUSIONES: Los datos revelan la necesidad de dotar a los enfermeros de competencias para detectar los cambios en el sueño y desarrollar programas estructurados de empowerment parental para mejorar los hábitos del sueño de los niños.

DESCRIPTORES: Prescolar; Trastornos del sueño-vigilia; Enfermería

BACKGROUND: Sleep has a determining role in child development and when it is disturbed, has a social and an health impact on children and parents. AIM: Identify the sleep disturbances perceived by pre-school children’s parents. METHODS: Quantitative, descriptive and correlational study. Non-probabilistic sample with 642 children’s parents. Children attend pre-school education in Albergaria-a-Velha (64.2%) and Águeda (35.8), mean age 4.55 (±0.93) years and 51.7% are female. The instrument included a sociodemographic characterization and lifestyle questionnaire and the Children’s Sleep Habits Questionnaire. RESULTS: We found that 82.4% of the children presented Global sleep disturbance, being 43.3% female and 5-6 years old. The Resistance to go to bed is classified as intermediate for 41% of the children. In 40.2% the Onset of sleep is adequate (it takes up to 20 minutes) and Sleep duration is adequate for 45.3%. The Anxiety associated with sleep and Parasomnias feature similar values in the three levels of classification. Manifest very frequent Nocturnal awakenings 38.8%. The majority (74.3%) presents reduced respiratory Sleep Disturbance. A third of children have high daytime sleepiness. CONCLUSIONS: Outcomes reveal the need to provide nurses with skills to detect changes in sleep and develop structured programs of parental empowerment to improve children’s sleep habits.

KEYWORDS: Child; Preschool; Sleep wake disorders; Nursing Submetido em 30-12-2017 Aceite em 03-04-2018

1 Mestre em Ciências de Enfermagem; Doutora em Bioética; Membro do CI&DETS; Professora coordenadora no Instituto Politécnico de Viseu, Escola Superior de Saúde de Viseu, R. Dom João Crisóstomo Gomes de Almeida 102, 3500-843 Viseu, Portugal, ernestinabatoca@sapo.pt 2 Mestre em Enfermagem de Saúde Infantil e Pediatria; Enfermeira no ACeS Baixo Vouga, UCC de Albergaria-a-velha, Albergaria-a-velha, Portugal. toomonica@gmail.com 3 Mestre em Enfermagem de Saúde Infantil e Pediatria; Enfermeira no ACeS Baixo Vouga, UCSP Águeda III, 3750-868 Borralha, Portugal, padsimoes27@gmail.com 4 Mestre em Ciências de Enfermagem; Doutor em Saúde Mental; Membro do CI&DETS; Professor coordenador no Instituto Politécnico de Viseu, duarte.johnny@gmail.com 5 Mestre em Ciências de Enfermagem; Doutor em Ciências da Educação; Membro do CI&DETS; Professor coordenador no Instituto Politécnico de Viseu, Escola Superior de Saúde de Viseu, 3500-843 Viseu, Portugal, dsilva.essv@gmail.com 6 Mestre em Ciências de Enfermagem; Doutor em Ciências da Educação; Membro do CI&DETS; Professor coordenador no Instituto Politécnico de Viseu, Portugal. Citação: Silva, E., Macedo, M., Simões, P., Duarte, J., Silva, D., & Ferreira, M. (2018). Perspetiva dos pais sobre as perturbações do sono das crianças em idade pré-escolar. Revista Portuguesa de Enfermagem de Saúde Mental (Spe. 6), 39-45. doi: 10.19131/rpesm.0211 Revista Portuguesa de Enfermagem de Saúde Mental, ESPECIAL 6 (OUT.,2018) | 39


INTRODUÇÃO O sono processa-se em ciclos, os quais não são iguais ao longo da vida. Vão desde uma fase policíclica no lactente, a uma bicíclica na criança, até se converterem em monocíclica, no adulto. O sono modifica-se também na sua duração, reduzindo progressivamente ao longo do ciclo vital. O tipo de sono que apresenta um recém-nascido é diferente de uma criança em idade escolar ou um adolescente. Mesmo durante a vida adulta, tanto a duração como o tipo de sono modificam-se à medida que se envelhece (Barclay & Gregory, 2014). O sono tem um papel fundamental no desenvolvimento e plasticidade cerebral (Paavonen et al., 2010). As suas funções prendem-se com o papel reparador e com os processos de aprendizagem e consolidação da memória, duas funções absolutamente vitais para o organismo (Vaughn, Elmore-Staton, Shin, & El-Sheikh, 2014). Assim, sono insuficiente ou de má qualidade, numa fase precoce da vida, pode comprometer a capacidade de aprendizagem e, por outro lado, uma quantidade adequada de sono de boa qualidade é importante para uma saúde e desempenho adequado ao longo da vida (Kelly, Kelly, & Sacker, 2013; Turnbull, Reid, & Morton, 2013). Os padrões de sono da criança também influenciam o bem-estar familiar (Blunden, 2011). Os pais enfrentam inúmeros desafios em relação ao sono da criança, pois com o seu crescimento e desenvolvimento, o comportamento da criança vai-se alterando relativamente ao sono e podem surgir perturbações do mesmo. Ensinar a criança a dormir, enfrentar períodos de vigília durante a noite e a sua própria perda de sono, é stressante para muitos pais e, independentemente das alterações serem temporárias ou duradouras, influenciam a dinâmica familiar podendo afetar o desenvolvimento da criança. Com base no exposto, é fácil perceber por que razão as preocupações dos pais com o sono das crianças são frequentes. A Direção Geral da Saúde (DGS) reconhecendo a sua importância nesta fase do ciclo de vida, no Programa Nacional de Saúde Infantil e Juvenil (Portugal, Ministério da Saúde (MS), DGS, 2013) coloca os hábitos de sono como ponto a abordar nos cuidados antecipatórios das consultas a partir do primeiro mês de vida e, a partir dos nove meses, considera o sono como um estilo de vida saudável. Assim, o sono infantil constitui-se, por força do normativo, uma área de atenção (e intervenção) do enfermeiro, nas consultas de saúde infantil dos Cuidados de Saúde Primários. Revista Portuguesa de Enfermagem de Saúde Mental, ESPECIAL 6 (OUT.,2018) | 40

Também na elaboração do Programa Nacional de Saúde Escolar (Portugal, MS, DGS, 2015), é legitimada a relevância do sono, sendo uma das áreas de intervenção do eixo estratégico capacitação. Apesar de hoje parecer existir um declínio do tempo destinado a dormir (Matriacciani, Olds & Petkov, 2012) e nas crianças portuguesas haver um agravamento da tendência para dormir menos (Crispim, Boto, Melo, e Ferreira, 2011), há que distinguir as crianças que sentem menos necessidade de dormir das que, por reflexo da cultura, hábitos específicos da população portuguesa ou ainda por outras condicionantes, apresentam privação do sono. As perturbações do sono estão presentes em 30 a 40% das crianças em idade pré-escolar e apesar de em algumas fases da vida poder ser normal ter dificuldade em adormecer e em dormir, quando é frequente ou prolongado, torna-se disruptivo para a criança e para a família (Waters, Suresh, & Nixon, 2013). Apesar de serem demasiado importantes para que se possam descurar e uma grande parte ocorrer na idade préescolar e ter resolução com mudanças comportamentais de fácil implementação (Halal e Nunes, 2014), a literatura evidencia que os profissionais de saúde continuam a não conhecer os comportamentos de sono das crianças e a não detetar precocemente as suas alterações (Erichsen et al., 2012; Meltzer, Johnson, Corsette, Ramos, & Mindell, 2010). Pela dimensão do impacto, a curto e longo prazo, que as perturbações do sono representam para a criança e família, é importante continuar a estudar o sono. Assim, delineámos este estudo com o objetivo de identificar as perturbações do sono percebidas pelos pais das crianças em idade pré-escolar. É nossa finalidade sensibilizar para a implementação de estratégias que visem a capacitação dos pais e comunidade educativa para os hábitos e higiene do sono das crianças em idade pré-escolar. METODOLOGIA Estudo quantitativo, descritivo correlacional e transversal. A amostra é não probabilística constituída por 642 pais de crianças (97,2% mães e 2,8% pais). A maioria das crianças frequentava o ensino público (51,2%), dos concelhos de Albergaria-a-Velha (64,2%) e de Águeda (35,8%), no ano letivo 2015/2016.


O instrumento utilizado foi o Questionário de Hábitos de Sono das Crianças (CSHQ-PT), versão portuguesa do Children’s Sleep Habits Questionnaire (CSHQ) (Silva et al., 2014) constituído por 33 itens e um questionário (Ad hoc) com questões de caracterização sociodemográficas, clínica e estilos de vida da criança, preenchido pelos pais das crianças e de âmbito retrospetivo. As perguntas estão agrupadas em oito dimensões: Resistência em ir para a cama; Início do sono; Duração do sono; Ansiedade associada ao sono; Despertares nocturnos; Parassonias; Perturbação respiratória do sono e Sonolência. O resultado final do CSHQ-PT traduz o Índice de Perturbação do Sono que corresponde à soma das pontuações dos 33 itens e não à soma das cotações das dimensões, uma vez que os itens 5 e 8 aparecem em duas subescalas (Resistência em ir para a cama e Ansiedade associada ao sono). A pontuação dos itens é feita de forma a que um score total mais elevado corresponda a uma maior probabilidade de existência de uma Perturbação do sono ou comportamentos problemáticos mais frequentes (Owens, Spirito, & McGuinn, 2000; Silva et al., 2014). No estudo de validade e fiabilidade do instrumento obtivemos uma consistência interna razoável (Pestana e Gageiro, 2014), com os valores de α de Cronbach a oscilar entre 0,723 e 0,754. O valor total α foi de 0,737 e o α baseado em itens estandardizados foi de 0,751. No que respeita aos coeficientes de correlação entre o Índice de Perturbação do Sono (IPS) e as dimensões apurou-se que estas são maioritariamente moderadas, mas estatisticamente significativas (p<0,01), situandose entre r=0,481 com a Perturbação respiratória do sono e r=0,695 Ansiedade associada ao sono. Verificou-se uma correlação muito baixa e sem significância estatística (p>0,05) do IPS com Início do sono (r=0,021) e baixa mas estatisticamente significativa (p<0,01), com o Duração do sono (r=0,371). Podemos afirmar que o aumento ou diminuição dos índices do Índice de Perturbação do Sono numa das subescalas produz um efeito em sentido direto nas restantes subescalas, com exceção do Início do sono. O tratamento dos dados foi realizado pelo SPSS (Statistical Package for the Social Sciences) versão 23 e AMOS (Analysis of Moments Strutctures) versão 23 de 2012 para Windows. O nível de significância estabelecido foi de 5% (p=0,05). Foi solicitada autorização aos diretores dos agrupamentos de escolas do concelho de Águeda e de Albergaria-a-Velha, à Comissão Nacional de Proteção de Dados e à Comissão de Ética da Escola Superior de Saúde de Viseu.

Foi obtido o consentimento informado por escrito dos pais das crianças e, nas escolas, foi explicado às crianças o porquê da sua avaliação antropométrica e obtido o seu assentimento. Os investigadores marcaram antecipadamente o dia e hora em cada uma das escolas, entregaram pessoalmente os questionários aos pais das crianças. Após o preenchimento, cada questionário foi colocado num envelope fechado e sem identificação, sendo devolvido ao professor responsável pelo grupo de crianças que o entregou às investigadoras. A recolha de dados ocorreu entre janeiro e abril de 2016. RESULTADOS Caraterização Sociodemográfica Apuramos que 55,9% das crianças têm idades entre os 5 e 6 anos (com uma média de 4,55±0,93), 51,7% são do sexo feminino e na sua maioria (58,1%) são o primeiro filho do casal. A dimensão familiar é a nuclear para 71,23% das crianças e 88,8% vivem com a mãe e o pai e são estes os cuidadores habituais (68,1%). Caraterização Clínica O peso das crianças oscila entre os 11 e 30 quilos, com média 18,38±3.6. O índice de massa corporal tem o valor mínimo de 10,57 e máximo de 24,01 (média de 15,57±1,79). A maioria das crianças (84,1%) não têm problemas de saúde e 91,60% não usam qualquer tipo de medicação. Estilos de Vida Verificamos que 44,3% das crianças consomem bebidas que contêm teínas (café, chá ou refrigerantes) com muita frequência. O consumo muito frequente de doces e chocolates foi referido por 58,6% das crianças. A maioria (57,7%) apresenta hábitos sedentários. A hora de ir para a cama durante a semana foi entre as 21 e 22 horas para 63,7% e ao fim de semana após as 22 horas para 72,6%. Durante a semana 56,3% das crianças acorda antes das 8 horas e ao fim de semana 89,9% depois das 8 horas. O tempo total de sono diário oscila entre 10 e 13 horas para a maioria (74,1%). O tempo de uso diário de pequenos ecrãs (tablets ou smartphones) durante a semana é menor que 60 minutos para 83,8% das crianças e ao fim de semana entre 60 e 120 minutos (54,8%). Apurámos que 64,8% dormem sozinhas. A transição do quarto dos pais para o seu quarto foi fácil para 47,7%, inicialmente difícil para 22,3% e muito difícil para 30,1% das crianças. Revista Portuguesa de Enfermagem de Saúde Mental, ESPECIAL 6 (OUT.,2018) | 41


Perturbações do Sono De modo a podermos fazer uma comparação entre os valores atingidos nas dimensões do CSHQ-PT, calculámos o score percentual de cada uma. Na Tabela 1 apurámos que os scores oscilam entre 0,0% e 100,0% em todas as dimensões, com exceção das “Parassonias” (Max 85,71%) e da “Sonolência diurna” (Max 87,50%) e do “Índice de perturbação do sono” (Global) que varia entre 3,03% e 65,15%. Os valores percentuais médios situaram-se entre 15,08±21,85dp (Perturbação respiratória do sono) e 46,03±42,40dp (Início do sono). Os coeficientes de variação (CV) indiciam dispersões elevadas dos dados e os valores do enviesamento revelam curvas assimétricas positivas em todos os itens, com exceção do “Início do sono”, em que a mesma é simétrica. Tabela 1 - Estatísticas relativas ao índice de Perturbação do sono percebido pelos pais das crianças

Índice de perturbação do sono (Global)

Min

Max

M

DP

CV (%)

3.03

65.15

26.15 26.15 42.14

Sk/ erro

K/ erro

6.83

1.66

Dimensões: 100.00 31.63 23.72 74.98

2.80

-4.70

Estas variáveis não mostram diferenças estatística significativa (sexo: X2=0,846 e p=0,358; grupo etário: X2=2,022 e p=0,155), podendo dizer que são independentes. Tabela 2 - Qualidade do sono percebido pelos pais das crianças N Perturbação do sono (Global)

Sem perturbação

Com perturbação

113

529

263

Intermédio (2)

Inadequado (3)

258

177

207

Duração do sono

Adequado (3)

Intermédia (4)

Inadequada (5-7)

291

185

166

Ansiedade associada ao sono Despertares noturnos

Parassonias

Duração do sono

0.00

100.00 16.90 20.79 122.98 14.34 7.82

Ansiedade 0.00 associada ao sono

100.00 32.65 25.01 76.60

5.29

-2.71

Sonolência diurna

Despertares noturnos

0.00

100.00 21.26 20.80 97.82

8.94

1.63

Parassonias

0,00

85,71

10,53 6,47

Perturbação respiratória do sono

0,000

100,00 15,08 21,85 144,83 18,25 15,94

Sonolência diurna

0,000

87,50

O CSHQ-PT discrimina as crianças com ou sem perturbação do sono, respetivamente se o valor for superior ou igual a 44 ou se for inferior a 44. Pela Tabela 2 apurámos que 82,4% da amostra apresenta perturbação do sono, com maior prevalência nas crianças do sexo feminino (43,3%) e nos de 5-6 anos (45.0%). Revista Portuguesa de Enfermagem de Saúde Mental, ESPECIAL 6 (OUT.,2018) | 42

%

642

180

Perturbação respiratória do sono

Nota: Min = mínimo; Max = máximo; M = média; DP = desvio padrão; CV = coeficiente de variação; Sk/erro = skewness/erro; K/erro = kurtosis/erro

82,4

Adequado (1)

100.00 46.03 42.40 92.12

-2,29

N

Total

Início do sono

0.00

2,17

%

Intermédia (8-11)

Início do sono

35,59 18,85 52,96

17,6

N

Reduzida (6-7) 28,0

40,2

45,3

41,0

27,6

28,8

Reduzida (4-5)

Intermédia (6-7)

291

228

33,0

35,5

Elevada (12-15) 199

31,0

32,2

25,9

Elevada (8-10) 202

31,5

Esporádicos (3)

Frequentes (4)

Muito frequentes (5-7)

223

170

249

34,7

26,5

Reduzidas Intermé(7-8) dias (9-10) 219

19,44 15,25 78,45

%

Resistência em ir para a cama

0.00

-8.26

N

100.0

Dimensões:

Resistência em ir para a cama

1.58

%

32,7

227

35,4

Reduzida (3-4)

Intermédia (5-7)

477

165

74,3

Reduzida (8-12) 243

37,9

Elevadas (11-14) 205

31,9

33,6

642

100.0

Total 642

100,0

Total 642

100,0

Total 642

100,0

Total 642

100,0

Total 642

100,0

Total

25,7

Intermédia (13-15) 216

38,8

Total

642 Elevada (16-19) 183

28,5

100,0

Total 642

100,0

Nas dimensões do CSHQ-PT verificamos que os pais percecionam que os filhos têm uma Resistência em ir para a cama classificada como intermédia (41,0%), sendo mais prevalente nas crianças do sexo feminino (22,6%) e nas crianças entre os 5-6 anos (21,8%) não se verificando diferenças estatisticamente significativas quer para o sexo (X2=3,405 e p=0,182), quer para a idade (X2 =6,489 e p=0,039). Quanto ao Início do sono apurámos que 40,2% das crianças demora até 20 minutos a adormecer (adequado), sendo mais prevalente no sexo masculino (20,9%). No que respeita ao sexo, não encontrámos diferenças significativas entre os grupos (X2=3,405 e p=0,182), mas, relativamente ao grupo etário essas diferenças existem e são significativas (X2=6,131 e p=0,047).


A Duração do sono foi considerada adequada para 45,3% das crianças, não apurando diferenças significativas entre os grupos (sexo: X2=0,774 e p=0,679; grupo etário: X2=5,510 e p=0,064). A Ansiedade associada ao sono aparece em níveis intermédios e níveis elevados em cerca de um terço das crianças, não se verificando diferenças significativas entre os grupos (sexo: X2=2,347 e p=0,309; grupo etário: X2=0,698 e p=0,705). Os Despertares noturnos são muito frequentes em 38,8% das crianças e acontecem em 20,7% das crianças dos 5-6 anos e em 20,1% das meninas. Efetuámos teste de X2 para perceber a relação entre as variáveis e verificamos não haver relação (sexo: X2=0,605 e p=0,739; grupo etário: X2=2,958 e p=0,228). As Parassonias apresentam valores semelhantes nos três níveis de classificação. Não se verificaram diferenças estatísticas significativas (sexo: X2=0,128 e p=0,938; grupo etário: X2=1,351 e p=0,509). A dimensão Perturbação respiratória do sono é reduzida na maioria das crianças (74,3%) sendo sobretudo nas meninas (38,9%) e nas crianças mais velhas (42.5%). Não se verificaram significância estatística para o sexo (X2=0,362 e p=0,548) e grupo etário (X2=1,299 e p=0,254). Em 37,9% das crianças a Sonolência diurna é reduzida, sobretudo as crianças com idade entre 5-6 anos (22,1%) e do sexo masculino (20,4%). Apurámos que existe significância estatística para o sexo (X2=6,987 e p=0,030) mas para o grupo etário, não encontrámos diferenças significativas (X2=1,825 e p=0,402). DISCUSSÃO Dormir é uma necessidade básica que requer um processo evolutivo de adaptação, dependente de aspetos intrínsecos e extrínsecos à criança. A existência de períodos de sono possibilita a ocorrência de vastas e complexas interações que permitem um adequado desempenho, nos períodos de vigília, o que ressalta as várias funções do sono: protetora, de manutenção da homeostasia e reguladora de todas as funções do cérebro e do organismo em geral. A linha divisória entre o que é um sono normal e o que são Perturbações do sono é ténue, influenciada por fatores culturais, ambientais e sociais, muito dependente das caraterísticas da criança, das cognições e expetativas dos pais e das rotinas familiares.

Apurámos como valor médio 50,26 (±7,27dp) que todas as crianças exibem pelo menos uma Perturbação do sono, dado que nenhuma registou a pontuação mínima no CSHQ-PT, no entanto, é conveniente referir que a idade média da nossa amostra é inferior à da maioria das que encontrámos em estudos com este instrumento e verificarmos que a Perturbação global do sono tem uma associação negativa com a idade da criança (Silva, Silva, Braga, e Neto, 2013). Owens et al. (2000) obtiveram um índice de perturbação do sono médio de 56,2 (±8,9dp) e em outros estudos portugueses obtiveram-se valores inferiores (Silva et al., 2013; Loureiro, Pinto, Pinto, Pinto e Paiva, 2013; Silva et al., 2014). Verificámos que a Sonolência diurna se associava ao sexo feminino. No estudo de Silva et al. (2013) também denotaram uma relação entre o sexo feminino e a Ansiedade associada ao sono e a Perturbação global do Sono e, por outro lado, verificaram que a Perturbação respiratória do sono se correlacionava com o sexo masculino, achados que também suportam os nossos. É importante referir que não foram reportados, em nenhuma dimensão, os valores máximos da pontuação, o que é positivo e indicativo que nenhuma criança apresenta uma perturbação do sono extrema. Não foi possível saber a amplitude de variação das subescalas, nos autores consultados mas, verificámos que os nossos índices médios foram semelhantes aos dos autores consultados (Owens et al., 2000; Silva et al., 2013; Loureiro et al., 2013; Silva et al., 2014). A Resistência em ir para a cama apresenta valores mais elevados (41,0%) no nível intermédio, seguido do nível elevado com 21,0%. Um Início do sono adequado é a situação mais frequente (40,2%), e a Duração do sono adequada é referida em 45,3% das crianças. Constatámos que uma Ansiedade associada ao sono classificada como intermédia estava presente em 35,5% das crianças e que um nível elevado aparece em 31,5% das crianças. Os Despertares noturnos são muito frequentes em 38,8% e os esporádicos em 34,7% das crianças. Ghalebandi et al. (2011) referem que é importante estabelecer o nível das Parassonias uma vez que a sua ocorrência regular pode ser indicativa de stress. Na nossa amostra, 35,4% revela nível intermédio de Parassonias, 32,7% apresenta um nível reduzido e 31,9% exibe um nível elevado. A Perturbação respiratória do sono é considerada reduzida em 74,3% e a Sonolência diurna apresenta níveis reduzidos em 37,9% e intermédios em 33,6% das crianças. Revista Portuguesa de Enfermagem de Saúde Mental, ESPECIAL 6 (OUT.,2018) | 43


CONCLUSÃO

IMPLICAÇÕES PARA A PRÁTICA CLÍNICA

Estudamos uma amostra de 642 crianças do ensino pré-escolar dos concelhos de Águeda e Albergaria e foi possível cateterizar sociodemograficamente que a maioria são crianças do sexo feminino, com média de idades quatro anos e meio, residentes em Águeda, são o primeiro filho do casal e vivem com a mãe e o pai. Em termos clínicos, globalmente as crianças não têm patologia associada, mas nutricionalmente apresentam excesso de peso. Sobre os estilos de vida a maioria consomem bebidas que contêm teínas (café, chá ou refrigerantes) e comem doces e chocolates com muita frequência e têm hábitos sedentários. A quase totalidade utiliza dispositivos eletrónicos diariamente num período de tempo considerado aceitável. Durante a semana a generalidade das crianças vai dormir entre as 21 e as 22 horas e ao fim de semana deitam-se mais tarde; no global as crianças apresentam a quantidade total de sono diário recomendada para a sua idade; a maioria dorme sozinha e para quase metade a transição para o quarto foi fácil e cerca de um terço foi muito difícil. Os nossos dados permitem-nos considerar a possibilidade de que todas as crianças apresentam pelo menos uma Perturbação do sono, pois que nenhuma obteve a pontuação mínima no CSHQ-PT. Nas dimensões das perturbações do sono, verificámos que a Resistência em ir para a cama classificada como intermédia é a mais frequente; o Início do sono é adequado para mais de um terço das crianças; a Duração do sono revelou-se adequada em quase metade da amostra; aproximadamente um terço das crianças exibe níveis intermédios ou elevados de Ansiedade associada ao sono; os Despertares noturnos são muito frequentes em mais de um terço da amostra; as Parassonias são semelhantes nos três níveis de classificação; a Perturbação respiratória do sono é reduzida na grande maioria das crianças e a Sonolência diurna elevada aparece em quase um terço das crianças.

Estes resultados preocupam-nos e impelem a sugerir algumas estratégias e medidas que poderão ser objeto de reflexão no contexto das equipas dos cuidados de saúde primários: Rastreio das Perturbações do sono de forma estruturada e consistente nas consultas de saúde infantil dos Cuidados de Saúde Primários, com instrumentos validados para a população portuguesa e, se possível, o registo nas bases de dados em utilização nos serviços; Promover ações educativas que envolvam os pais e a comunidade educativa préescolar sobre e higiene do sono e implicações no desenvolvimento infantil; Realizar estudos longitudinais que permitam aferir o impacto dos estilos educativos parentais nas perturbações do sono e a sua evolução ao longo da infância e adolescência.

Revista Portuguesa de Enfermagem de Saúde Mental, ESPECIAL 6 (OUT.,2018) | 44

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Artigo de Investigação

7

Disponível em http://dx.doi.org/10.19131/rpesm.0212

O EFEITO MODERADOR DA SATISFAÇÃO COM A VIDA NA ASSOCIAÇÃO ENTRE A QUALIDADE DA RELAÇÃO PAIS/FILHOS(AS) E DEPRESSÃO NA ADOLESCÊNCIA1 | Bárbara Salgado Costa2; Ana Paula Matos3; José Joaquim Costa4 |

RESUMO CONTEXTO: A depressão apresenta um caráter duradouro e relaciona-se com perdas funcionais significativas e com uma redução da qualidade de vida a longo prazo. Existem vários fatores que vulnerabilizam o ser humano ao seu desenvolvimento, nos quais se incluem os relacionamentos familiares de baixa qualidade caraterizados por elevados níveis de conflito e a baixa satisfação com a vida. OBJETIVO(S): Estudar como preditores da depressão na adolescência a qualidade da relação pais/filhos(as) e a satisfação com a vida e explorar o efeito moderador da satisfação com a vida, na associação entre a qualidade da relação entre pais/filhos(as) avaliadas num primeiro momento e a depressão na adolescência avaliada no segundo momento (seis meses depois). METODOLOGIA: Numa amostra comunitária de 534 adolescentes, com idades entre os 13 e 17 anos foram aplicados questionários e uma entrevista em dois momentos de avaliação, com um intervalo de 6 meses. RESULTADOS: Os adolescentes que avaliaram a sua satisfação com a vida como boa, revelaram menos sintomatologia depressiva do que aqueles que avaliaram como razoável ou baixa, mesmo existindo perceção de conflito mais elevada no relacionamento com a mãe. CONCLUSÕES: A satisfação com a vida avaliada como boa pode funcionar como fator de proteção no desenvolvimento de sintomas depressivos, perante níveis altos de conflito no relacionamento com a mãe. Enfatiza-se, assim, a inclusão e avaliação de construtos oriundos da psicologia positiva em programas preventivos da depressão na adolescência. PALAVRAS-CHAVE: Depressão; Adolescente; Relações familiares; Satisfação pessoal

RESUMEN

ABSTRACT

“El efecto moderador de la satisfacción con la vida en la asociación entre la calidad de la relación padres/hijos(as) y depresión en la adolescencia1”

“The moderating effect of life satisfaction in the association between the quality of the parents/children relationship and depression in adolescence1”

ANTECEDENTES: La depresión tiene un carácter a largo plazo y está relacionada con importantes pérdidas funcionales y una reducción en la calidad de vida a largo plazo. Hay varios factores que hacen que el ser humano sea vulnerable a la depresión, incluidas las relaciones familiares de baja calidad caracterizadas por altos niveles de conflicto y baja satisfacción con la vida. OBJETIVO: Estudiar la calidad de la relación padres/hijos y la satisfacción con la vida como predictores de la depresión en la adolescencia y explorar el efecto moderador de la satisfacción vital en la asociación entre la calidad de la relación entre padres/hijos evaluados en el primer momento y la depresión en la adolescencia evaluada en el segundo momento (seis meses después). METODOLOGIA: En una muestra comunitaria de 534 adolescentes, de entre 13 y 17 años, se aplicaron cuestionarios y se realizó una entrevista en dos momentos de evaluación, con un intervalo de 6 meses. RESULTADOS: Los adolescentes que evaluaron su satisfacción con la vida como buena mostraron menos sintomatología depresiva que aquellos que calificaron como razonable o baja, incluso existiendo una percepción de un mayor conflicto en la relación con la madre. CONCLUSIONES: La satisfacción con la vida evaluada como buena puede actuar como un factor protector en el desarrollo de síntomas depresivos, ante niveles altos de conflicto en la relación con la madre. Se enfatiza la inclusión y evaluación de conceptos de la psicología positiva en los programas preventivos para la depresión en la adolescencia.

BACKGROUND: Depression has a long-term character and is related to significant functional losses and a reduction in the long-term quality of life. There are several factors that make the human being vulnerable to depression, including low quality family relationships characterized by high levels of conflict and low life satisfaction. AIM: To study the quality of the parents/children relationship and life satisfaction as predictors of depression in adolescence and to explore the moderating effect of life satisfaction in the association between the quality of the relationship between the parents/children evaluated in the first moment and the depression in the adolescence evaluated in the second moment (six months later). METHODS: In a community sample of 534 adolescents, aged 13 to 17 years, questionnaires were applied and an interview was carried out in two evaluation moments, with an interval of 6 months. RESULTS: Adolescents who evaluated their life satisfaction as good showed less depressive symptomatology than those who assessed as reasonable or low, even though there was a perception of a higher conflict in the relationship with the mother. CONCLUSIONS: Life satisfaction evaluated as good may act as a protective factor in the development of depressive symptoms, when facing high levels of conflict in the relationship with mother. Emphasis is thus given to the inclusion and evaluation of constructs from positive psychology in preventive programs for depression in adolescence.

DESCRIPTORES: Depresión; Adolescente; Relaciones familiares; Satisfacción personal

KEYWORDS: Depression; Adolescent; Family relations; Personal satisfaction Submetido em 30-12-2017 Aceite em 21-03-2018

1 Este artigo foi extraído da Dissertação de Mestrado da primeira autora, sobre o tema: “Um Estudo Longitudinal sobre o Efeito Moderador da Satisfação com a vida na associação entre a Qualidade da Relação Pais/Filhos(as) e Depressão na Adolescência” (2017) – apresentada na Faculdade de Psicologia e Ciências da Educação da Universidade de Coimbra. 2 Mestre em Psicologia, barbaracostapsi@hotmail.com 3 Doutorada em Psicologia; Investigadora do Centro de Investigação do Núcleo de Estudos e Intervenção Cognitivo-Comportamental; Professora Associada na Faculdade de Psicologia e de Ciências da Educação da Universidade de Coimbra, Rua Colégio Novo, 3000-115 Coimbra, Portugal, apmatos@fpce.uc.pt 4 Doutorado em Psicologia; Investigador do Centro de Investigação do Núcleo de Estudos e Intervenção Cognitivo-Comportamental; Professor Auxiliar na Faculdade de Psicologia e de Ciências da Educação da Universidade de Coimbra, 3000-115 Coimbra, Portugal, jjcosta@fpce.uc.pt Citação: Costa, B. S., Matos, A. P., & Costa, J. J. (2018). O efeito moderador da satisfação com a vida na associação entre a qualidade da relação pais/filhos(as) e depressão na adolescência. Revista Portuguesa de Enfermagem de Saúde Mental (Spe. 6), 46-51. doi: 10.19131/rpesm.0212 Revista Portuguesa de Enfermagem de Saúde Mental, ESPECIAL 6 (OUT.,2018) | 46


INTRODUÇÃO Durante a adolescência ocorrem intensas mudanças desenvolvimentais, que marcam a transição entre a infância e a idade adulta. Assim, esta etapa é muito importante para construir a identidade do indivíduo e para a busca da sua independência tão desejada (Cicchetti & Toth, 2009). A qualidade da relação que os adultos (e.g., pais e professores) estabelecem com o adolescente, a atenção que lhe dão, são decisivas para a edificação da sua identidade. O adolescente vai enfrentar a necessidade de se redefinir em relação ao seu corpo sexuado, à sua identidade psíquica e ao seu meio, e particularmente em relação aos seus pais (Brito, 2011). A depressão na adolescência nem sempre foi reconhecida como uma perturbação psiquiátrica, mas atualmente sabe-se que as perturbações de humor (perturbação depressiva major e perturbação distimica), em especial a depressão, são das mais prevalentes nos adolescentes (Arnarson & Craighead, 2009). As perturbações de humor, das quais a depressão faz parte, caracterizam-se por mudanças acentuadas nos estados de alegria e tristeza, bem como na motivação para realizar a maior parte das atividades quotidianas e na energia necessária para as fazer (American Psychiatric Association, 2013). Embora a adolescência seja uma época em que os jovens se autonomizam dos progenitores, a relação com eles é essencial para a saúde psicológica (Kenny, Dooley & Fitzgerald, 2013). Fatores como o controlo psicológico, o grau de conflito com os pais, e a rejeição dos progenitores estão associados à depressão. A má qualidade do ambiente familiar, os altos níveis de conflito familiar e os baixos níveis de apoio familiar podem predizer o surgimento e desenvolvimento de episódios depressivos nos adolescentes (Queen, Stewart, Ehrenreich-May & Pincus, 2012). Num estudo transversal com uma amostra de adolescentes portugueses, verificou-se que níveis altos de conflito são preditores de mais sintomas depressivos (Brito, Matos, Pinheiro e Monteiro, 2015). A satisfação com a vida assim como os afetos positivos, componentes do bem-estar subjetivo, predizem saúde e longevidade. O bem-estar subjetivo refere-se a avaliações que os indivíduos fazem sobre as suas vidas, que podem ser um julgamento cognitivo, como a satisfação com a vida, ou avaliações baseadas em sentimentos e emoções (Diener & Chan, 2011). Assim, o bem-estar subjetivo é uma categoria heterogénea, que integra emoções agradáveis e emoções negativas e uma dimensão cognitiva (satisfação com a vida).

No que se refere ao bem-estar psicológico e à satisfação com a vida, a boa comunicação com os pais e com os amigos surge evidenciada no bem-estar dos adolescentes portugueses. A satisfação com a vida revela ser uma variável importante durante a adolescência (Çivitci & Çivitci, 2009). Gledhill & Garralda (2011) destacaram o papel de acontecimentos de vida positivos na redução da depressão, mencionando a importância de programar atividades agradáveis ou gratificantes. Em Portugal, numa investigação com uma amostra de 400 sujeitos, encontrou-se que os adolescentes que percecionam melhor ambiente familiar e que têm uma vinculação mais segura aos pais reportam maior satisfação com a vida (Machado e Fonseca, 2009). Em 2008, Antaramian, Huebner & Valois constataram que a satisfação com a vida é menor entre os jovens que experimentam níveis mais elevados de conflito e de desacordo com os pais. Num estudo transversal (Brito et al., 2015) verificou-se que pontuações baixas no fator conflito com o pai, interagindo com níveis altos de satisfação com a vida, podem funcionar como fatores de proteção da sintomatologia depressiva. METODOLOGIA Este estudo longitudinal insere-se no projeto de investigação “Prevenção da Depressão em Adolescentes Portugueses: Estudo da Eficácia de uma Intervenção com Adolescentes e Pais” (projeto com a referência: PTDC/MHC-PC L/4824/2012), financiado pela Fundação para a Ciência e Tecnologia (FCT) e pela Realan Foundation (Estados Unidos da América). O presente estudo pretendeu estudar a qualidade da relação pais/filhos e a satisfação com a vida dos adolescentes, enquanto preditores de depressão no adolescente e, analisar o efeito moderador da satisfação com a vida na associação entre a qualidade da relação pais e filhos(as) e a sintomatologia depressiva. A amostra deste estudo foi constituída por 534 adolescentes. A média de idade da amostra é de 14,45 anos (DP=.89). A maioria são raparigas (61%). Os inquiridos pertencem predominantemente a um nível socioeconómico baixo (51.5%). Os restantes participantes pertencem a um nível socioeconómico médio (35.4%) e elevado (13.1%). A maioria tem os pais casados (74.3%). Recorreu-se a uma amostra comunitária, recolhida em escolas públicas e privadas, da região Centro de Portugal. Revista Portuguesa de Enfermagem de Saúde Mental, ESPECIAL 6 (OUT.,2018) | 47


Os adolescentes e respetivos encarregados de educação preencheram um consentimento informado. E o estudo foi autorizado pela Comissão Nacional de Proteção de Dados (CNPD) e pela Direção Geral de Inovação e Desenvolvimento Curricular (DGIDC). Para a colheita de dados foram utilizados os seguintes instrumentos: Children Depression Inventory (CDI) (versão portuguesa: Marujo, 1994) para medir a sintomatologia depressiva, Inventory of the Quality of Interpersonal Relations (IQRI) (versão portuguesa para adolescentes: Marques, Matos, e Pinheiro, 2014; Marques, Pinheiro, Matos, e Marques, 2015), para avaliar a qualidade das relações interpessoais, e a Adolescent - Longitudinal Interval Follow-up Evalution (A-LIFE) (versão portuguesa: Matos e Costa, 2011). O CDI é composto por 27 itens, divididos em cinco fatores: anedonia, autoestima negativa, humor negativo, ineficácia e problemas interpessoais. A resposta a cada item tem três alternativas numa escala de 0 (ausência de sintoma) a 2 pontos (sintoma grave). É solicitado que selecione o valor que melhor descreve os seus sentimentos durante as “duas últimas semanas”. A pontuação total varia entre 0 e 54 pontos. Considerou-se apenas a pontuação total da escala, tendo em conta a estrutura unifatorial encontrada para a população portuguesa. O valor de alfa de Cronbach para a pontuação do CDI total foi de .90, revelando boa consistência interna. O IQRI é constituído por 25 itens, organizados em três subescalas, (perceção de suporte, de profundidade e de conflito), avaliadas pelo sujeito no relacionamento com a mãe e o pai. No presente estudo analisámos apenas a dimensão conflito. Os itens são cotados numa escala tipo Likert de 1 a 4 e quanto maior for a pontuação obtida, mais presente está essa dimensão. Na presente investigação o IQRI mostrou boa consistência interna para todos os fatores (valores de alfa de Cronbach entre .80 e .91). A A-LIFE dividese em três secções gerais, Psicopatologia, Funcionamento Psicossocial e Gravidade Geral da doença. Para além disso, avalia também a Satisfação Global com a Vida, isto é, o contentamento da pessoa com a relação com a família, com os amigos, atividades que desenvolve, trabalho, situação económica e atividades sexuais. É solicitado ao adolescente que tenha em conta a “pior semana de cada mês para os últimos seis meses”. A pontuação é analisada numa escala tipo Likert de 1 a 5, sendo 1) ” muito bom” e 5) “muito pobre”. Previamente à realização das análises estatísticas, a variável satisfação com a vida foi agrupada em três níveis (muito bom, bom e razoável ou baixo). Revista Portuguesa de Enfermagem de Saúde Mental, ESPECIAL 6 (OUT.,2018) | 48

Como as classes correspondentes à baixa satisfação com a vida (satisfação pobre e muito pobre), tinham apenas no seu total nove adolescentes, optou-se por agrupá-las na classe da satisfação razoável, passando a ser designada por classe de satisfação “razoável ou baixa”. A variável moderadora, sendo categorial foi considerada variável dummy. Criaram-se dois termos de interação, para as variáveis conflito com pai e mãe. Primeiramente selecionou-se a variável preditora (fatores do IQRI), de seguida colocou-se a variável moderadora (variáveis dummy da satisfação com a vida), e, para finalizar, a interação entre as duas. RESULTADOS Uma análise de regressão múltipla hierárquica foi conduzida com vista a explorar a possibilidade de existir um efeito moderador da satisfação com a vida, na associação entre a qualidade da relação pais/filhos(as) avaliada no primeiro momento e a sintomatologia depressiva, avaliada no segundo momento, após seis meses. Apenas a interação com a variável conflito no relacionamento com a mãe foi significativa, pelo que apresentamos apenas os resultados relativos à mesma. Constatou-se, através dos coeficientes de regressão (β), que a dimensão conflito na relação com a mãe produziu um efeito moderador significativo quando em interação com o nível bom da satisfação com a vida (β= -.113, p= .015) (Tabela 1). Tabela 1 - Coeficientes de regressão das três etapas produzidas por uma regressão múltipla hierárquica com o conflito da mãe, satisfação com a vida e o termo de interação na predição de sintomatologia depressiva na amostra total (N=534) Mod.

Preditores

1 2

3

F

β

t

p

Mãe conflito

.173

110.981

.415

10.535

.000

Mãe conflito

.279

68.220

.323

*8.403

.000

Muito boa satisfação com a vida

-.379

-7.915

.000

Boa satisfação com a vida

-.379

-7.987

.000 .000

Mãe conflito

.313

*8.151

Muito boa satisfação com a vida

.287

42.487

-.350

-7.062

Boa satisfação com a vida

-.341

-6.863

.000

Mãe conflito* muito boa satisfação com a vida

-.080

-1.747

.081

Mãe conflito* boa satisfação com a vida

-.113

-2.437

.015

.000


Quando consideramos como preditor o fator conflito na relação com a mãe, obtêm-se modelos estatisticamente significativos em todos os passos. A interação entre as variáveis preditora e moderadora produziu um coeficiente de determinação de 28.7%. Os dados indicam que o declive que se prevê nos sintomas depressivos de acordo com o conflito percecionado pelos adolescentes no relacionamento com a mãe difere significativamente de acordo com os valores altos ou baixos da satisfação com a vida. Com o intuito de interpretar e compreender melhor a interação significativa, elaborou-se um gráfico (Gráfico 1). Gráfico 1 - O efeito moderador da satisfação com a vida na perceção de conflito na relação com a mãe

Observa-se que níveis mais elevados de conflito na relação com a mãe e níveis mais baixos na satisfação com a vida estão associados a maior sintomatologia depressiva. No que toca ao termo de interação, verifica-se que quando a perceção de conflito com a mãe é alta no primeiro momento de avaliação, o nível bom da satisfação com a vida, comparativamente ao nível razoável ou baixo, no primeiro momento de avaliação, funciona como fator protetor do desenvolvimento de sintomatologia depressiva no segundo momento de avaliação, reportando estes adolescentes menos depressão. Já quando a perceção de conflito com a mãe é alta, são os adolescentes que têm muito boa satisfação com a vida que apresentam menos sintomatologia depressiva. DISCUSSÃO A perceção de elevados níveis de conflito no relacionamento com a mãe, avaliada no primeiro momento, revelou-se preditora de desenvolvimento de sintomatologia depressiva nos adolescentes, avaliada no segundo momento.

Este dado é congruente com os resultados encontrados por Queen, Stewart, Ehrenreich-May & Pincus, 2012. No presente estudo, verificou-se uma interação significativa entre a satisfação com a vida avaliada como boa e a perceção de conflito no relacionamento com a mãe na predição de sintomatologia depressiva. Os nossos dados mostram assim, que o conflito com a mãe funciona como um fator de risco para o desenvolvimento de sintomas depressivos e que, diante de uma satisfação com a vida avaliada como boa, estes sintomas tendem a ser menores. Estes resultados divergem do estudo transversal de Brito et al. (2015), no qual se encontrou uma interação significativa, mas entre a perceção de conflito com o pai e a satisfação com a vida na predição de sintomatologia depressiva. O presente estudo apresenta algumas limitações. Os resultados foram obtidos com base numa amostra comunitária, não abrangendo níveis elevados de sintomatologia depressiva nem níveis muito baixos de satisfação com a vida. Numa amostra clínica poderse-ão obter resultados diferentes. Algumas variáveis não foram controladas, como a desejabilidade social, desmotivação e negação/minimização, o que pode ter influenciado as respostas dos participantes. Futuramente, deverá recorrer-se a amostras clínicas e também a amostras mais representativas da população geral portuguesa, para possibilitar uma melhor compreensão sobre o desenvolvimento psicológico adaptativo e mal adaptativo durante a adolescência. CONCLUSÃO Este estudo longitudinal mostrou que um nível bom de satisfação com a vida pode funcionar como fator de proteção no desenvolvimento de sintomas depressivos sobretudo em adolescentes com uma relação conflituosa com a mãe. Seligman (2011) tem salientado também que componentes do bem-estar, como a satisfação com a vida, previnem a depressão. Assim, encontrou-se que mesmo perante relações familiares de baixa qualidade, existem fatores que promovem a saúde mental, nomeadamente a satisfação com a vida, revelando-se importante olhar para a saúde mental como, não só a ausência de sintomas negativos, mas, também a presença de aspetos positivos. Este estudo vem contribuir para dar suporte à importância da satisfação com vida num desenvolvimento de saúde mental. Revista Portuguesa de Enfermagem de Saúde Mental, ESPECIAL 6 (OUT.,2018) | 49


Comprovou-se ainda, neste estudo, que a qualidade da relação pais/filhos(as) continua a ser importante para prevenir sintomatologia depressiva na fase da adolescência, pelo que a manutenção de uma relação com qualidade não deve ser descurada pelos progenitores.

Brito, J., Matos, A. P., Pinheiro, M. R., & Monteiro, S. (2015). Quality of interpersonal relationships and depression in adolescence: Psychosocial functioning moderating effect. The European Proceedings of Social & Behavioural Sciences, 81-94. Doi: 10.15405/ epsbs.2015.0.8.8

IMPLICAÇÕES PARA A PRÁTICA CLÍNICA

Cicchetti, D., & Toth, S. (2009). A developmental psychopathology perspective on adolescent depression. In S. Nolen-Hoeksema, & L. Hilt (Eds.), Handbook of Depression in Adolescents (pp. 3-32). New York, NY: Routledge.

A investigação traz contribuições para a prática clínica, pois evidencia a necessidade de intervir, junto dos adolescentes e dos seus pais, no sentido de melhorar relações que se estabelecem entre ambos. O que pode funcionar como prevenção do aparecimento de depressão nesta etapa da vida, conhecida pelos desafios particulares que acarreta. A integração nos programas de prevenção da depressão na adolescência da avaliação da qualidade da relação com os pais e da satisfação com a vida, de forma a aprofundar o conhecimento sobre os fatores de vulnerabilidade e de proteção ao desenvolvimento da sintomatologia depressiva, permitirá uma maior eficácia na prevenção e tratamento da depressão. Realça-se também a importância da inclusão de componentes associadas à satisfação com a vida nos programas de prevenção da depressão na adolescência, tal como já foi efetuado em alguns programas (Reiter & Wilz, 2015). No entanto, a revisão da literatura efetuada mostra que ainda são poucas as intervenções dirigidas para a prevenção de depressão que tenham em conta construtos oriundos da psicologia positiva (Singhal, Manjula & Sagar, 2015; McCarty, Violette & McCauley, 2010). REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS American Psychiatric Association. (2013). Diagnostic and statistical manual of mental disorders: DSM-5 (5ª ed.). Washington, D.C: APA. Antaramian, S. P., Huebner, E. S., & Valois, R. F. (2008). Adolescent life satisfaction. Applied Psychology, 57 (s1), 112-126. Doi: 10.1111/j.1464-0597.2008. 00357.x Arnarson, E., & Craighead, W. (2009). Prevention of depression among Icelandic adolescents. Behavior Research and Therapy, 47 (7), 577-585. Doi: 10.1016/j. brat.2009.03.011. Brito, I. (2011). Ansiedade e depressão na adolescência. Revista Portuguesa Clínica Geral, 27, 208-214. Revista Portuguesa de Enfermagem de Saúde Mental, ESPECIAL 6 (OUT.,2018) | 50

Çivitci, N., & Çivitci, A. (2009). Self-esteem as mediator and moderator of the relationship between loneliness and life satisfaction in adolescents. Personality and Individual Differences, 47 (8), 954-958. Disponível em: https://www.sciencedirect.com/science/article/ pii/S0191886909003419 Diener, E., & Chan, M. Y. (2011). Happy people live longer: Subjective well-being contributes to health and longevity. Applied Psychology: Health and Well-Being, 3 (1), 1-43. Disponível em: https://onlinelibrary. wiley.com/doi/abs/10.1111/j.1758-0854.2010.01045.x Gledhill, J., & Garralda, M. E. (2011). The short-term outcome of depressive disorder in adolescents attending primary care: a cohort study. Social Psychiatry and Psychiatric Epidemiology, 46 (10), 993-1002. Doi: 10.1007/s00127-0100271-6. Kenny, R., Dooley, B., & Fitzgerald, A. (2013). Interpersonal relationships and emotional distress in adolescence. Journal of Adolescence, 36 (2), 351-360. Doi: 10.1016/j.adolescence.2012.12.005. Machado, T. S., & Fonseca, A. C. (2009). Desenvolvimento adaptativo em jovens portugueses: será significativa a relação com os pais. INFAD Revista de Psicologia, 1 (3), 461-468. Disponível em: http://www. redalyc.org/articulo.oa?id=349832322051 Marques, D., Matos, A. P., & Pinheiro, M. D. R. (2014). Estudo da estrutura fatorial da versão mãe do IQRI para adolescentes. Psicologia, Saúde & Doenças, 15 (1), 233-243. Disponível em: http://www. scielo.mec.pt/scielo.php?script=sci_arttext&pid =S1645-00862014000100019


Marques, D., Pinheiro, M. R., Matos, A. P., & Marques, C. (2015). Confimatory Factor Analysis of the QRI Father’s Version in a Portuguese Sample of Adolescents. Procedia – Social and Behavioral Sciences, 165, 267274. Disponível em: https://www.sciencedirect.com/ science/article/pii/S1877042814067706 Marujo, H. (1994). Síndromas depressivos na infância e na adolescência (Tese de Doutoramento não publicada). Faculdade de Psicologia e de Ciências da Educação da Universidade de Lisboa, Portugal. Matos, A. P. & Costa, A. (2011). Estudo das propriedades psicométricas da entrevista Adolescents Longitudinal Interval Follow-up Evaluation (A-LIFE). [Study of Psychometric properties of the interview Adolescents Longitudinal Interval Follow-up Evaluation (A-LIFE)] (manuscrito não publicado). McCarty, C. A., Violette, H. D., & McCauley, E. (2010). Feasibility of the positive thoughts and actions prevention program for middle schoolers at risk for depression. Depression Research and Treatment, 2011, 1-9. Doi:10.1155/2011/241386.

Queen, A. H., Stewart, L. M., Ehrenreich-May, J., & Pincus, D. B. (2013). Mothers’ and Fathers’ Ratings of Family Relationship Quality: Associations with Preadolescent and Adolescent Anxiety and Depressive Symptoms in a Clinical Sample. Child Psychiatry & Human Development, 44 (3), 351-360. Doi:10.1007/ s10578-0120329-7. Reiter, C., & Wilz, G. (2015). Resource diary: A positive writing intervention for promoting well-being and preventing depression in adolescence. The Journal of Positive Psychology, 11 (1), 99-108. Doi: 10.1080/17439760.2015.1025423. Seligman, M. E. (2011). Learned optimism: How to change your mind and your life. New York: Vintage Books. Singhal, M., Manjula, M., & Sagar, J. V. (2015). Adolescent Depression Prevention Programs-A Review. Journal of Depression and Anxiety, 4 (197), 21671044. Doi: 10.4172/2167-1044.1000197.

Revista Portuguesa de Enfermagem de Saúde Mental, ESPECIAL 6 (OUT.,2018) | 51


Artigo de Investigação

8

Disponível em http://dx.doi.org/10.19131/rpesm.0213

REGULAÇÃO EMOCIONAL E QUALIDADE DO RELACIONAMENTO COM OS PAIS COMO PREDITORAS DE SINTOMATOLOGIA DEPRESSIVA EM ADOLESCENTES1 | Joana Antunes2; Ana Paula Matos3; José Joaquim Costa4 |

RESUMO CONTEXTO: A adolescência é um período de risco para o desenvolvimento da sintomatologia depressiva, com a regulação emocional e a qualidade do relacionamento com os pais a desempenharem um papel importante no desenvolvimento da Depressão. OBJETIVO(S): Analisar longitudinalmente os efeitos preditores das estratégias de regulação emocional e da qualidade do relacionamento com os pais na sintomatologia depressiva. METODOLOGIA Um total de 566 adolescentes com 13-17 anos de idade preencheram questionários em dois momentos de avaliação, com um intervalo de 6 meses. RESULTADOS: Após o controlo dos efeitos do género, as estratégias de regulação emocional e a qualidade do relacionamento com os pais (T1) explicaram 36% e 21,9% da variância da sintomatologia depressiva (T2), respetivamente. A autocrítica, a catastrofização e a ruminação foram preditoras positivas e significativas, e a reavaliação positiva e o replaneamento foram preditoras negativas significativas. Uma maior perceção de conflito nos relacionamentos com os pais e uma menor perceção de suporte no relacionamento com a mãe previu níveis mais elevados de sintomatologia depressiva. CONCLUSÕES: Os resultados apresentam implicações na prevenção e no tratamento da Depressão na adolescência, tais como abordar o uso de estratégias maladaptativas de regulação emocional e a existência de conflito no relacionamento com os pais, e aumentar os efeitos protetores associados às estratégias adaptativas de regulação emocional e à perceção de qualidades positivas nos relacionamentos. PALAVRAS-CHAVE: Depressão; Emoções; Relações familiares; Adolescente

RESUMEN

ABSTRACT

“Regulación emocional y calidad de la relación con padres como predictores de sintomatología depresiva en adolescentes1”

“Emotional regulation and quality of the relationship with parents as predictors of depressive symptomatology in adolescents”

CONTEXTO: La adolescencia es un período de riesgo para el desarrollo de la sintomatología depresiva, con la regulación emocional y la calidad de la relación con los padres a desempeñar un importante papel en el desarrollo de la Depresión. OBJETIVO(S): Analizar longitudinalmente los efectos predictores de las estrategias de regulación emocional y de la calidad de la relación con los padres en la sintomatología depresiva. METODOLOGÍA: Un total de 566 adolescentes con 13-17 años de edad llenaron cuestionarios en dos momentos de evaluación, con un intervalo de 6 meses. RESULTADOS: Después del control de los efectos del género, las estrategias de regulación emocional y la calidad de la relación con los padres (T1) explicaron el 36% y el 21,9% de la varianza de la sintomatología depresiva (T2), respectivamente. La autocrítica, la catastrofización y la rumiación fueron predictoras positivas y significativas, y la reevaluación positiva y el replanteamiento fueron predictores negativos significativos. Una mayor percepción de conflicto en las relaciones con los padres y una menor percepción de soporte en la relación con la madre predijo niveles más elevados de sintomatología depresiva. CONCLUSIONES: Los resultados presentan implicaciones en la prevención y el tratamiento de la depresión en la adolescencia, tales como abordar el uso de estrategias maladaptativas de regulación emocional y la existencia de conflicto en la relación con los padres, y aumentar los efectos protectores asociados a las estrategias adaptativas de regulación emocional y a la percepción de cualidades positivas en las relaciones.

BACKGROUND: Adolescence is a time of risk for the development of depressive symptomatology, with emotional regulation and the quality of the relationship with the parents playing an important role in the development of Depression. AIM: To analyze longitudinally the predictive effects of the emotional regulation strategies and the quality of the relationship with the parents in the depressive symptomatology. METHODS: A total of 566 adolescents with 13-17 years old completed questionnaires at two moments of evaluation, with a 6-month interval. RESULTS: After controlling gender effects, emotional regulation strategies and the quality of the relationship with the parents (T1) explained 36% and 21.9% of the variance of the depressive symptomatology (T2), respectively. Self-blame, catastrophizing, and rumination were positive significant predictors, and positive reappraisal and refocus on planning were negative significant predictors. A greater perception of conflict in the relationships with the parents and a lower perception of support in the relationship with the mother predicted higher levels of depressive symptomatology. CONCLUSIONS: The results have implications for the prevention and treatment of depression in adolescence, such as addressing the use of maladaptive emotional regulation strategies and the existence of conflict in the relationship with parents, and increasing the protective effects associated with adaptive emotional regulation strategies and the perception of positive qualities in the relationships.

DESCRIPTORES: Depresión; Emociones; Relaciones familiares; Adolescente

KEYWORDS: Depression; Emotions; Family relations; Adolescent

Submetido em 30-12-2017 Aceite em 30-03-2018

1 Este artigo foi extraído da Dissertação de Mestrado da primeira autora, sobre o tema: “Estudo longitudinal do efeito moderador da qualidade do relacionamento com os pais na relação entre regulação emocional e sintomatologia depressiva nos adolescentes” (2017) – apresentada na Faculdade de Psicologia e Ciências da Educação da Universidade de Coimbra. 2 Mestre em Psicologia, joana.simoes.antunes@gmail.com 3 Doutorada em Psicologia; Investigadora do Centro de Investigação do Núcleo de Estudos e Intervenção Cognitivo-Comportamental; Professora Associada na Faculdade de Psicologia e Ciências da Educação da Universidade de Coimbra, Rua do Colégio Novo, 3000-115, Coimbra, Portugal, apmatos@fpce.uc.pt 4 Doutorado em Psicologia; Investigador no Centro de Investigação do Núcleo de Estudos e Intervenção Cognitivo-Comportamental; Professor Auxiliar na Faculdade de Psicologia e Ciências da Educação da Universidade de Coimbra, 3000-115, Coimbra, Portugal, jjcosta@fpce.uc.pt Citação: Antunes, J., Matos, A. P., & Costa, J. J. (2018). Regulação emocional e qualidade do relacionamento com os pais como preditoras de sintomatologia depressiva em adolescentes. Revista Portuguesa de Enfermagem de Saúde Mental (Spe. 6), 52-58. doi: 10.19131/rpesm.0213 Revista Portuguesa de Enfermagem de Saúde Mental, ESPECIAL 6 (OUT.,2018) | 52


INTRODUÇÃO

METODOLOGIA

A depressão tem sido apontada como uma das maiores causas de incapacidade no mundo, com a adolescência a revelar-se como um período de elevadas taxas de prevalência de sintomatologia depressiva, principalmente nas raparigas (Erse et al., 2016; Brito, Matos, Pinheiro e Monteiro, 2015; Ferreira, 2016). Quando o início da depressão ocorre na adolescência, a perturbação apresenta um curso relativamente estável e mais severo ao longo do tempo, com um maior risco de recorrência (Arnarson et al., 2015). A depressão envolve dificuldades ao nível da regulação emocional, com os indivíduos a revelarem dificuldades em experienciar as emoções (Arnarson et al., 2015; Duarte, 2014; Ferreira, 2016; Garnefski, Boon & Kraaij, 2003; Garnefski & Kraaij, 2006; Stikkelbroek, Bodden, Kleinjan, Reijnders & Baar, 2016). É importante notar que só na fase final da adolescência é que se verifica uma aquisição completa das competências associadas à regulação emocional, o que pode levar a dificuldades na regulação cognitiva das emoções e a maior vulnerabilidade ao desenvolvimento de psicopatologia perante acontecimentos de vida negativos (Garnefski et al., 2003), principalmente ao considerar que as exigências desenvolvimentais (e.g. procura de maior autonomia, aumento do conflito com os pais e o desafio emocional de experiências românticas e sexuais) podem exceder as capacidades regulatórias dos mais vulneráveis (Yap, Allen & Sheeber, 2007). Entre as tarefas desenvolvimentais associadas à adolescência encontra-se a individualização, que se caracteriza pela diminuição da dependência em relação a pessoas significativas e o aumento da autonomia (Levpušček, 2006). No entanto, os pais permanecem como figuras de vinculação importantes, sendo que a satisfação de necessidades relacionais na família, combinada com uma autonomia não excessiva, encontra-se associada a melhor ajustamento psicossocial (Levpušček, 2006). Estas relações de vinculação são influenciadas pela qualidade do funcionamento familiar que inclui fatores como a disponibilidade de suporte, coesão, comunicação e níveis de conflito (Rawatlal, Kliewer & Pillay, 2015). No âmbito da revisão de literatura, o presente estudo teve como objetivo estudar os efeitos preditores das estratégias de regulação emocional e da qualidade do relacionamento com os pais no desenvolvimento de sintomatologia depressiva em adolescentes portugueses.

O presente estudo longitudinal foi autorizado pela Comissão Nacional de Proteção de Dados (CNPD) e pela Direção Geral de Inovação e Desenvolvimento Curricular (DGIDC), inserindo-se no projeto de investigação “Prevenção da Depressão em Adolescentes Portugueses: Estudo de eficácia de uma intervenção com adolescentes e pais” (PTDC/MHCPCL/4824/2012), financiado pela Fundação para a Ciência e Tecnologia (FCT) e pela Realan Foundation. A amostra comunitária foi constituída por 566 adolescentes (60.25% do sexo feminino) com idades entre os 13 e os 17 anos (M = 14.43; DP = 867), distribuindose pelos níveis socioeconómicos baixo (48.4%), médio (36.6%) e elevado (15%). Não se verificaram diferenças estatisticamente significativas entre os géneros em termos da idade [t (429.398) = .404, p = .686] e do nível socioeconómico [X2 (2) = .195, p = .907]. A amostra foi recolhida em escolas públicas e privadas da região centro de Portugal através do preenchimento de questionários em dois momentos de avaliação, com um intervalo de seis meses. Foi assegurada a confidencialidade a todos os estudantes que participaram voluntariamente, tendo sido requerido o consentimento informado do estudante e do seu responsável legal. No primeiro momento de avaliação (T1) foi recolhida informação sociodemográfica e foi aplicado o Inventory of the Quality of Interpersonal Relations – IQRI (versão portuguesa para adolescentes: Marques, Matos e Pinheiro, 2014; Marques, Pinheiro, Matos e Marques, 2015) e o Cognitive Emotion Regulation Questionnaire – CERQ (versão portuguesa: Matos, Cherpe e Serra, 2012). O IQRI analisa a perceção do adolescente em relação à qualidade do seu relacionamento com a mãe e com o pai ao nível de três dimensões: suporte (disponibilidade de ajuda perante determinadas situações); profundidade (estima e comprometimento com a relação); e conflito (experienciar sentimentos negativos ou ambivalentes na relação). O CERQ avalia as estratégias cognitivas de regulação emocional usadas perante um acontecimento de vida negativo ou traumático, sendo composto por nove subescalas: autocrítica; ruminação; catastrofização; culpar o outro; aceitação; reavaliação positiva; replaneamento; reorganização positiva; e reperspetivar.

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No segundo momento de avaliação (T2) foi aplicado o Children Depression Inventory – CDI (versão portuguesa: Marujo, 1994), que permite avaliar a sintomatologia depressiva em crianças e adolescentes. No presente estudo recorreu-se ao valor da escala total. O tratamento estatístico dos dados foi efetuado através do programa Statistical Package for Social Sciences (SPSS), versão 22.0.0.2 para Windows. RESULTADOS Estatísticas Descritivas e Diferenças de Acordo com o Género De forma a verificar a necessidade de controlar o efeito do género, foi analisada a possível existência de diferenças recorrendo a testes t-Student para amostras independentes e calculado o Eta Quadrado para examinar a magnitude do efeito. Os resultados (Quadro 1) revelaram diferenças estatisticamente significativas, mas com uma magnitude de efeito baixa. As raparigas apresentaram níveis superiores de sintomatologia depressiva, recorreram mais à autocrítica, ruminação e aceitação, e apresentaram níveis superiores de suporte, profundidade e conflito no relacionamento com a mãe, e níveis superiores de profundidade no relacionamento com o pai. Os rapazes mostraram recorrer mais do que as raparigas à estratégia de regulação emocional de culpar o outro. Quadro 1 - Consistência interna (α), estatísticas descritivas (M e DP), e análise das diferenças de acordo com o género (t de Student) e da magnitude do efeito (η²) Amostra total (n=566)

Grupo Masculino (n=225)

Grupo Feminino (n=341)

Medidas

α

M

DP

M

DP

M

DP

t

p

η²

CDI (T2)

.905

9.747

7.353

7.877

6.131

10.981

7.826

-5.272

.000

.047

F1

.776

9.140

3.212

8.609

2.889

9.490

3.367

-3.324

.001

.019

F2

.819

10.734

3.744

9.759

3.338

11.377

3.862

-5.296

.000

.047

F3

.815

8.406

3.567

8.237

3.324

8.517

3.719

-.914

.361

.001

F4

.737

7.058

2.549

7.360

2.498

6.858

2.566

2.300

.022

.009

F5

.706

11.423

3.430

10.982

3.224

11.713

3.534

-2.543

.011

.011

F6

.849

11.494

4.032

11.679

3.747

11.372

4.210

.910

.363

.001

F7

.791

12.489

3.590

12.438

3.498

12.523

3.654

-.278

.781

.000

F8

.825

12.327

3.802

12.284

3.472

12.356

4.009

-.227

.820

.000

F9

.785

10.971

3.704

10.655

3.621

11.180

3.748

-1.653

.099

.005

CERQ (T1)

IQRI – Mãe (T1) F1

.862

3.257

.720

3.140

.747

3.334

.691

-3.163

.002

.017

F2

.867

2.069

.688

1.991

.656

2.120

.705

-2.182

.030

.008

F3

.876

3.424

.611

3.286

.677

3.514

.545

-4.217

.000

.031

IQRI – Pai (T1) F1

.907

3.000

.795

3.001

.782

3.000

.804

.009

.992

.000

F2

.873

2.041

.668

2.051

.656

2.035

.676

.277

.782

.000

F3

.911

3.243

.747

3.163

.723

3.297

.758

-2.069

.039

.008

Nota 1. CERQ: F1 = Autocrítica; F2 = Ruminação; F3 = Catastrofização; F4 = Culpar o outro; F5 = Aceitação; Reavaliação Positiva; F9 = Reperspetivar Nota 2. IQRI: F1 = Suporte; F2 = Conflito; F3 = Profundidade

F6 = Reorganização Positiva; F7 = Replaneamento; F8 =

Estratégias de Regulação Emocional como Preditoras da Sintomatologia Depressiva Foram realizadas análises preliminares que garantiram a adequação dos dados a análises de Regressão Múltipla Hierárquica (Quadro 2).

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Quadro 2 - Análise de Regressão Múltipla com as estratégias cognitivas de regulação emocional (CERQ) como preditoras de sintomatologia depressiva (CDI) para amostra total (controlando o género) Mod- Preditores elo

R2

1

Género

2

Género

F

β

Quadro 3 - Análise de Regressão Múltipla com a qualidade do relacionamento com os pais (IQRI) como preditora de sintomatologia depressiva (CDI) para amostra total (controlando o género)

t

p

Mod- Preditores elo

R2

.043 25.192*** .207

5.019

.000

1

Género

.403 37.426*** .132

3.829

.000

2

Género

CERQ (dimensões)

F

β

t

p

.043 24.388*** .207

4.938

.000

.261 27.300*** .215

5.580

.000

IQRI (dimensões)

Autocrítica

.382

8.183

.000

Suporte mãe

-.226 -3.575 .000

Ruminação

.128

2.440

.015

Catastrofização

.131

2.671

.008

Conflito mãe

.158

2.951

.003

Culpar o outro

.043

1.128

.260

Profundidade - mãe

-.005 -.087

.931

Aceitação

-.035 -.751

.453

Suporte - pai

-.116 -1.687 .092

Reorganização positiva

.032

.506

Conflito pai

.197

3.835

.000

Replaneamento

-.138 -2.589 .010

Profundidade - pai

.117

1.736

.083

Reavaliação positiva

-.208 -3.696 .000

*** p ≤ 0.001

Reperspetivar

.059

Para controlar o seu efeito, a variável género foi inserida em primeiro lugar, tendo sido gerado um modelo estatisticamente significativo, com este a explicar 4.3% da variância de sintomatologia depressiva. O segundo modelo gerado, constituído pelas dimensões do IQRI (T1), revelou-se estatisticamente significativo, explicando 21.9% da variância da sintomatologia depressiva em T2 [∆R2 = .219; F (6, 540) = 26.640, p < .001]. Os resultados obtidos sugerem que uma maior perceção de conflito nos relacionamentos com os pais e uma menor perceção de suporte no relacionamento com a mãe, no primeiro momento de avaliação, predizem níveis mais elevados de sintomatologia depressiva no segundo momento de avaliação.

.666

1.273

.203

*** p ≤ 0.001

Inseriu-se a variável género em primeiro lugar, tendo sido gerado um modelo estatisticamente significativo, em que este explicou 4.3% da variância de sintomatologia depressiva. O segundo modelo, onde constam as estratégias de regulação emocional (T1), foi estatisticamente significativo, explicando 36% da variância da sintomatologia depressiva em T2 [∆R2 = .360; F (9, 555) = 37.170, p < .001]. As estratégias de regulação emocional de autocrítica, catastrofização e ruminação foram preditoras positivas e significativas de sintomatologia depressiva no segundo momento de avaliação. A reavaliação positiva e o replaneamento apresentaram-se como preditoras negativas e significativas de sintomatologia depressiva. Qualidade do Relacionamento com os Pais como Preditora da Sintomatologia Depressiva Análises preliminares garantiram a adequação dos dados a análises de Regressão Múltipla Hierárquica (Quadro 3).

DISCUSSÃO A literatura sugere que a regulação emocional (Arnarson et al., 2015; Duarte, 2014; Ferreira, 2016; Garnefski et al., 2003; Garnefski & Kraaij, 2006; Stikkelbroek et al., 2016) e a qualidade do relacionamento com os pais (Brito, Matos, Pinheiro e Monteiro, 2015; Sheeber, Davis, Leve, Hops & Tildesley, 2007; Yap, Pilkington, Ryan & Jorm, 2014) podem desempenhar um papel importante no desenvolvimento da depressão, pelo que o presente estudo longitudinal teve como principal objetivo examinar os efeitos preditores destas variáveis na sintomatologia depressiva em adolescentes portugueses. Revista Portuguesa de Enfermagem de Saúde Mental, ESPECIAL 6 (OUT.,2018) | 55


No que diz respeito aos efeitos preditores da regulação emocional, após se controlar os efeitos do género, o modelo em que se encontram as estratégias de regulação emocional apresentou-se como estatisticamente significativo, com as estratégias avaliadas em T1 a explicarem 36% da variância da sintomatologia depressiva em T2. Estes resultados vão ao encontro do que foi observado por Garnefski & Kraaij (2006) num estudo transversal, em que as estratégias de regulação emocional avaliadas pelo CERQ explicaram 37.9% e 32.1% da variância da sintomatologia depressiva no início (12-15 anos) e no final (16-18 anos) da adolescência, respetivamente. As estratégias de autocrítica, catastrofização e ruminação foram preditoras positivas e significativas de sintomatologia depressiva em T2, revelando-se como estratégias maladaptativas de regulação emocional. O mesmo se verificou noutros estudos transversais (Duarte, 2014; Garnefski et al., 2003; Garnefski & Kraaij, 2006; Stikkelbroek et al., 2016) e longitudinais (Arnarson et al., 2015; Ferreira, 2016). As estratégias de reavaliação positiva e replaneamento foram preditoras negativas e significativas de sintomatologia depressiva em T2. Outros estudos também apontaram como estratégias adaptativas a reavaliação positiva (Ferreira, 2016; Garnefski et al., 2003; Garnefski & Kraaij, 2006; Stikkelbroek et al., 2016) e o replaneamento (Duarte, 2014; Ferreira, 2016; Stikkelbroek et al., 2016). O modelo gerado com as dimensões do IQRI apresentou-se estatisticamente significativo, com as várias dimensões avaliadas em T1 a explicarem 21.9% da variância da sintomatologia depressiva em T2. Tal vai ao encontro dos resultados do estudo transversal realizado por Brito, Matos, Pinheiro e Monteiro (2015), em que a qualidade do relacionamento com os pais avaliada pelo IQRI explicou 17.1% da variância da sintomatologia depressiva nos adolescentes. Os resultados obtidos sugerem que uma maior perceção de conflito nos relacionamentos com os pais em T1 prediz níveis mais elevados de sintomatologia depressiva em T2. Apesar de ser considerado normativo na adolescência a existência de algum grau de conflito no relacionamento com os pais, situações em que os níveis de conflito são prolongados, intensos e repetidos têm sido associadas a dificuldades no ajustamento psicológico e a maior sintomatologia depressiva (Sheeber et al., 2007; Yap et al., 2014).

Revista Portuguesa de Enfermagem de Saúde Mental, ESPECIAL 6 (OUT.,2018) | 56

Os resultados sugeriram igualmente que uma menor perceção de suporte no relacionamento com a mãe em T1 prediz níveis mais elevados de sintomatologia depressiva em T2, corroborando os resultados de outros estudos (Sheeber et al., 2007; Yap et al., 2014). Contudo, no presente estudo, o suporte no relacionamento com o pai não se revelou como um preditor significativo de sintomatologia depressiva, o que poderá ser explicado por a mãe poder exercer um maior impacto enquanto fonte de suporte na presente amostra ou por existirem possíveis diferenças de acordo com o género. A este respeito, é importante notar que no estudo longitudinal realizado por Branje, Hale, Frijns & Meeus (2010), a qualidade do relacionamento com a mãe relacionou-se com a sintomatologia depressiva apresentada pelas raparigas e pelos rapazes um ou dois anos depois, enquanto no relacionamento com o pai, esta relação só se verificou nos rapazes. CONCLUSÃO Os resultados encontrados no presente estudo possibilitam uma melhor compreensão sobre os fatores de proteção e de risco no desenvolvimento de sintomatologia depressiva. É importante notar que um relacionamento positivo entre pais e filhos tem sido associado a vários indicadores de desenvolvimento positivos que funcionam como fatores de proteção do desenvolvimento de sintomatologia depressiva (Branje, Hale, Frijns & Meeus, 2010; Ewing, Diamond & Levy, 2015). Segundo o modelo transacional, fatores ambientais interagem com fatores individuais, influenciando uma trajetória mais ou menos adaptativa e o possível desenvolvimento de sintomatologia depressiva (Ewing et al., 2015). Os resultados do presente estudo apontam para a importância de investigarmos, no futuro, as relações que se estabelecem entre a regulação emocional e a qualidade do relacionamento com os pais na predição da depressão, até porque são escassos os dados sobre a influência da interação entre o contexto e a regulação emocional no desenvolvimento de sintomatologia depressiva (Naragon-Gainey, McMahon & Chacko, 2017). Apesar da relevância dos resultados encontrados, existem algumas fragilidades no presente estudo. Os dados apresentados foram recolhidos a partir de uma amostra comunitária, pelo que seria do nosso interesse replicar este estudo em amostra clínica. É igualmente importante notar que não foram analisadas as possíveis diferenças de acordo com a idade nas variáveis de estudo, sendo pertinente estudar no futuro o contributo destas diferenças no desenvolvimento da sintomatologia depressiva.


IMPLICAÇÕES PARA A PRÁTICA CLÍNICA Ao possibilitar uma melhor compreensão sobre os fatores de proteção e de risco no desenvolvimento de sintomatologia depressiva, o presente estudo permitiu igualmente um melhor conhecimento sobre os possíveis alvos de intervenção no tratamento e na prevenção da depressão na adolescência. Os resultados evidenciam o recurso a estratégias de regulação emocional maladaptativas como um fator de risco para o desenvolvimento de sintomatologia depressiva na adolescência. De acordo com Garnefski, Boon & Kraaij (2003), a associação entre estratégias maladaptativas e sintomatologia depressiva na adolescência ocorre independentemente do tipo de acontecimento de vida que leva ao recurso a estas estratégias. Desta forma, trabalhar aspetos como a psicoeducação sobre estratégias de regulação emocional e incentivar o uso adequado de estratégias adaptativas revela-se fundamental, permitindo a prevenção de um estilo de coping maladaptativo e a promoção do recurso a estratégias adaptativas que podem ser implementadas em vários tipos de acontecimentos negativos. Para além da importância de aumentar a perceção de qualidades positivas e incentivar a existência de suporte e envolvimento por parte dos pais nos relacionamentos com os seus filhos, especialmente o suporte por parte da mãe, os resultados obtidos dão igualmente uma maior relevância a trabalhar questões associadas ao conflito no relacionamento entre pais e filhos. REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS Arnarson, E. Ö, Matos, A. P., Salvador, C., Ribeiro, C., Sousa, B., & Craighead, W. E. (2015). Longitudinal Study of Life Events, Well-Being, Emotional Regulation and Depressive Symptomatology. Journal of Psychopathology and Behavioral Assessment, 38 (2), 159171. Doi: 10.1007/s10862-015-9524-8. Branje, S. J. T., Hale, W. W., Frijns, T., & Meeus, W. H. J. (2010). Longitudinal Associations Between Perceived Parent-Child Relationship Quality and Depressive Symptoms in Adolescence. Journal of Abnormal Child Psychology, 38 (6), 751-763. Doi: 10.1007/ s10802-010-9401-6

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Artigo de Investigação

9

Disponível em http://dx.doi.org/10.19131/rpesm.0214

STRESS E ENGAGEMENT NA PROFISSÃO DE ENFERMAGEM: ANÁLISE DE DOIS CONTEXTOS INTERNACIONAIS | Ana Rita Gonçalves1; Ana Galvão2; Susana Escanciano3; Marco Pinheiro4; Maria José Gomes5 |

RESUMO CONTEXTO: As mudanças constantes nas condições de trabalho, têm conduzido ao aparecimento de riscos psicossociais que conjugados com alterações organizacionais, de gestão de recursos humanos e das cargas horárias, podem levar ao aumento dos níveis de stress e ao comprometimento da saúde física e mental dos trabalhadores. OBJETIVO(S): Objetivou-se caraterizar duas amostras de enfermeiros (espanhóis e portugueses) e analisar as dimensões do stress e engagement. METODOLOGIA: Estudo comparativo e correlacional. Amostra não probabilística por conveniência, 504 enfermeiros portugueses (65.8%) e 363 espanhóis (34.2%) inscritos nas respetivas Ordens. Utilizou-se um questionário online, composto pela escala de stress, a “Nursing Stress Scale”, medindo sete dimensões de stress, e a escala de motivação, a “Utrecht Work Engagement Scale” (UWES), medindo três dimensões de motivação. RESULTADOS: Os enfermeiros portugueses apresentam pontuações médias superiores no Stress Total (2.2962±.43731) do que os espanhóis (2.2518±.46651) e nas dimensões “Morte e Morrer” e “Falta de Apoio”, essas diferenças são estatisticamente significativas (p=.015 e p<.001 respetivamente), sendo que no engagement os espanhóis apresentam resultados consistentemente superiores e estatisticamente significativos (p<.001) nas três dimensões. A variável profissional que mais dimensões do stress e do engagement influencia, é o tipo de horário, sendo o horário rotativo mais indutor de stress e menos motivador do que o horário fixo, sendo essas diferenças estatisticamente significativas (p≤.001) para o Stress Total e as três dimensões da UWES. CONCLUSÕES: Existem diferenças a nível do stress e motivação entre os enfermeiros portugueses e espanhóis.

PALAVRAS-CHAVE: Saúde mental; Cuidados de enfermagem; Estresse psicológico; Motivação

RESUMEN

ABSTRACT

“Estrés y engagement en la profesión de enfermería: Análisis de dos contextos internacionales”

“Stress and engagement in the nursing profession: Analysis of two international contexts”

CONTEXTO: Los cambios constantes en las condiciones de trabajo, han conducido a la aparición de riesgos psicosociales que, conjugados con alteraciones organizacionales, de gestión de recursos humanos y de las cargas horarias, pueden conducir al aumento de los niveles de estrés y al comprometimiento de la salud física y mental trabajadores. OBJETIVO(S): El objetivo fue caracterizar dos muestras de enfermeras (España y Portugal) y el análisis de las dimensiones de estrés y de compromiso. METODOLOGÍA: Estudio comparativo y correlacional. La muestra no probabilística de conveniencia, portugués 504 enfermeras (65,8%) y 363 españoles (34,2%) inscritos en los respectivos Órdenes. Se utilizó un cuestionario online, compuesto por la escala de estrés, la “Nursing Stress Scale”, midiendo siete dimensiones de estrés, y la escala de motivación, la “Utrecht Work Engagement Scale” (UWES), midiendo tres dimensiones de motivación. RESULTADOS: Las enfermeras portuguesas tienen mayores puntuaciones medias en estrés total (2,2962 ± 0,43731) que la española (2,2518 ± 0,46651) y dimensiones “muerte y el morir” y “falta de apoyo”, estas diferencias son estadísticamente significativas (p=.015 e p<.001 respetivamente) y en el compromiso los españoles presentan resultados consistentemente superiores y estadísticamente significativos (p <.001) en las tres dimensiones. La variable profesional que más dimensiones del estrés y del compromiso influye, es el tipo de horario, siendo el horario rotativo más inductor de estrés y menos motivador que el horario fijo, siendo esas diferencias estadísticamente significativas (p≤.001) para el Estrés Total y las tres dimensiones de la UWES. CONCLUSIONES: Existen diferencias en el estrés y la motivación entre los enfermeros de Portugal y España.

BACKGROUND: Constant changes in working conditions have led to the emergence of psychosocial risks that, combined with organizational changes, human resources management and working hours, can lead to an increase in stress levels and compromise the physical and mental health of workers. AIM: To characterize two samples of nurses (Spanish and Portuguese) and analyse the dimensions of stress and engagement. METHODS: Comparative and correlational study. Non-probabilistic sample for convenience, 504 Portuguese nurses (65.8%) and 363 Spaniards (34.2%) enrolled in the respective Nurses Associations. An online questionnaire was used, consisting of the stress scale, the Nursing Stress Scale, measuring seven dimensions of stress, and the Utrecht Work Engagement Scale (UWES), measuring three dimensions of motivation. RESULTS: Portuguese nurses have higher mean scores in Total Stress (2.2962 ± .43731) than the Spanish (2.2518 ± .46651) and in the “Death and Dying” and “Lack of Support” dimensions, those differences are statistically significant (p =. 015 and p <.001 respectively), and in engagement, the Spaniards presented consistently higher and statistically significant scores (p <.001) in the three dimensions. The professional variable that more dimensions of stress and engagement influences, is the type of schedule, with rotating hours inducing more stress and less motivating than fixed hours, these differences being statistically significant (p≤.001) for Total Stress and the three dimensions of UWES. CONCLUSIONS: There are differences in stress and motivation among Portuguese and Spanish nurses.

DESCRIPTORES: Salud mental; Atención de enfermería; Estrés psicológico; Motivación

KEYWORDS: Mental health; Nursing care; Psychological stress; Motivation Submetido em 30-12-2017 Aceite em 30-03-2018

1 Doutora; Especialista em Enfermagem Médico-Cirúrgica; Enfermeira Especialista na Unidade Local de Saúde do Nordeste, Bragança, velosogoncalves@hotmail.com 2 Doutora; Psicóloga; Professora Coordenadora na Escola Superior de Saúde do Instituto Politécnico de Bragança, 5300-121 Bragança, Portugal, anagalvao@ipb.pt 3 Doutora; Advogada; Professora Catedrática na Universidad de León, Campus de Vegazana, 24071 León, Espanha, srode@unileon.es 4 Licenciado; Especialista em Gestão Empresarial; Docente Convidado na Escola Superior de Tecnologia e Gestão do Instituto Politécnico de Bragança, mpinheiro@ipb.pt 5 Doutora; Especialista em Enfermagem de Reabilitação; Professora Adjunta na Escola Superior de Saúde do Instituto Politécnico de Bragança, Portugal, mgomes@ipb.pt Citação: Gonçalves, A. R., Galvão, A., Escanciano, S., Pinheiro, M., & Gomes, M. J. (2018). Stress e engagement na profissão de enfermagem: Análise de dois contextos internacionais. Revista Portuguesa de Enfermagem de Saúde Mental (Spe. 6), 59-64. doi: 10.19131/rpesm.0214 Revista Portuguesa de Enfermagem de Saúde Mental, ESPECIAL 6 (OUT.,2018) | 59


INTRODUÇÃO As mudanças constantes nas condições de trabalho, têm conduzido inevitavelmente ao aparecimento de riscos psicossociais (Agência Europeia para a Segurança e Saúde no Trabalho, 2015b). Estes riscos, conjugados com alterações organizacionais, de gestão de recursos humanos e das cargas horárias, podem levar ao aumento dos níveis de stress e, consequentemente, a um comprometimento da saúde física e mental dos trabalhadores. O estudo das condições organizacionais e psicossociais relacionadas com a saúde dos trabalhadores, foi adquirindo grande importância nos últimos anos, chegando-se à conclusão, que o stress é o segundo problema relacionado com o trabalho mais frequente na Europa (depois das perturbações músculo-esqueléticas), já que 51% dos trabalhadores referem ser comum o stress laboral na sua organização e 4 em cada 10, referem que o problema não é gerido da melhor forma (Agência Europeia para a Segurança e Saúde no Trabalho, 2015a). Tanto na União Europeia como nos Estados Unidos, o stress laboral é considerado na atualidade como um dos principais problemas de saúde laboral, com grandes custos económicos e sociais. No que respeita à componente financeira do problema, a Agência Europeia para a Segurança e Saúde no Trabalho, estima que na Europa os custos totais com perturbações de saúde mental (relacionadas ou não com o trabalho) ascendam a 240 mil milhões de Euros por ano, sendo 136 mil milhões de Euros imputáveis à perda de produtividade, incluindo o absentismo por baixa médica. O engagement no trabalho é definido como: “um estado positivo da mente, realizador e relacionado ao trabalho que é caracterizado pelo vigor, dedicação e absorção” (Schaufeli, Salanova, González-Romá, & Bakker, 2002, p. 74). Este conceito pode ser considerado como indicativo de uma vida saudável, em relação ao trabalho. Os trabalhadores que obtêm resultados elevados nas escalas que avaliam o engagement evidenciam uma energia muito positiva e estão perfeitamente integrados e motivados com a profissão que desempenham, sentindo-se competentes para resolverem problemas que podem surgir no âmbito do seu trabalho (Rodrigues e Barroso, 2008). Schaufeli e Salanova (2007) caraterizam os trabalhadores engaged como portadores de um sentido de energia e eficácia associadas às suas atividades no trabalho, percecionando-se capazes de lidar com as exigências do trabalho. Revista Portuguesa de Enfermagem de Saúde Mental, ESPECIAL 6 (OUT.,2018) | 60

São considerados agentes ativos que tomam a iniciativa no trabalho, tentam observar novas mudanças no trabalho, e quando não sentem a mudança preferem mudar de trabalho, adaptando-se rapidamente a novas situações; são indivíduos cujo envolvimento no trabalho se traduz por um elevado nível de qualidade, o qual é normalmente provocado pelo feedback positivo dos supervisores e da organização através de promoções, salários atrativos, e satisfação profissional, e também pelos clientes; são indivíduos que utilizam estratégias de coping eficazes e que trabalham arduamente pois consideram o trabalho agradável, valorizam os aspetos interpessoais e intrínsecos do trabalho e os recursos do mesmo (Salanova & Schaufeli, 2008). METODOLOGIA Procedeu-se a um estudo comparativo e quantitativo de carater descritivo e correlacional, num plano transversal. O instrumento de recolha de dados foi disponibilizado online a todos os enfermeiros inscritos nas respetivas Ordens Profissionais (portuguesa e espanhola), obtendo-se uma amostra não probabilística por conveniência de 504 enfermeiros portugueses (65.8%) e 363 enfermeiros espanhóis (34.2%). Como instrumento de recolha de dados utilizou-se um questionário, composto por três partes: - A primeira parte por um questionário sociodemográfico e profissional; - A segunda parte pela Nursing Stress Scale de GrayToft e Anderson (1981), traduzida e adaptada para a população portuguesa (Santos & Teixeira, 2008) - Escala de Stresse Profissional dos Enfermeiros (ESPE) e a versão castelhana, traduzida e adaptada para a população espanhola (López Fernández, 2002) - Escala de Estrés de Enfermería, que mede sete dimensões de stress, sendo elas: A morte e o morrer; Conflitos com os médicos; Preparação inadequada para lidar com as necessidades emocionais dos doentes e dos seus familiares; Falta de apoio dos colegas; Conflitos com outros enfermeiros e com os chefes; Carga de trabalho; e Incerteza quanto aos tratamentos. - A terceira parte pela Utrecht Work Engagement Scale, versão traduzida para a população portuguesa (Schaufeli, Martinez, Pinto, Salanova, & Bakker, 2002) - Escala de Engagement no Trabalho de Utrecht (UWES) e a Encuesta de Bienestar y Trabajo, versão espanhola da escala original (Schaufeli, Bakker, & Salanova, 2006), medindo três dimensões: Vigor; Dedicação; e Absorção.


A caraterização socioprofissional é apresentada na Tabela 1, verificando-se uma amostra composta maioritariamente por respondentes do sexo feminino (83.6%), com horário rotativo (55.0%) e uma carga horária de 40 horas (61.4%). Tabela 1 - Caraterização Socioprofissional da Amostra Portugal n

%

n

%

n

%

78.6%

329

90.6%

725

83.6%

Masculino

108

21.4%

34

9.4%

142

16.4%

Total

504

100.0%

363

100.0%

867

100.0%

290

57.5%

187

51.5%

477

55.0%

Fixo

144

28.6%

133

36.6%

277

31.9%

Misto

64

12.7%

41

11.3%

105

12.1%

Tipo Horário horário rotativo

Tabela 3 - Relações Entre o Stress e o Engagement e o País

Dimensão

País

M

ESPE Total

Portugal

2.30

Espanha

2.25

Portugal

3.97

Espanha

4.34

Portugal

4.20

Espanha

4.51

Portugal

3.90

Espanha

4.34

Total

396

Género Feminino

Carga horária

Espanha

pontuações medidas para as 3 dimensões do engagement são estatisticamente significativas (p < .001), não se verificando tal para as diferenças medidas nos níveis de stress.

Outro

6

1.2%

2

0.6%

8

0.9%

Total

504

100.0%

363

100.0%

867

100.0%

35 horas

86

17.1%

91

25.1%

177

20.4%

40 horas

389

77.2%

143

39.4%

532

61.4%

outro

29

5.8%

129

35.5%

158

18.2%

UWES-Vigor UWES-Dedicação UWES-Absorção

p .166 .000 .000 .000

Contudo, conforme poderá ser observado na Tabela 4, verificou-se que em termos de stress, em duas das sete dimensões, “Morte e Morrer” e “Falta de Apoio”, os valores superiores verificados nos enfermeiros portugueses são estatisticamente significativos (p = .015 e p < .001 respetivamente) Tabela 4 - Relações entre Stress Provocado pelo Medo da Morte e Morrer e Falta de Apoio e o País

RESULTADOS Os resultados, entre os enfermeiros dos dois países, nas sete dimensões de stress medidas, são bastante similares, sendo que no stress total os enfermeiros portugueses têm uma média superior (2.30 ± .437) do que os espanhóis (2.25 ± .467), conforme pode ser observado na Tabela 2. Tabela 2 - Pontuações Médias do Stress Total e Três Dimensões do Engagement Portugal

Espanha

Total

M

DP

M

DP

M

DP

ESPE Total

2.30

.437

2.25

.467

2.28

.45

UWES_Vigor

3.97

1.23

4.34

1.33

4.13

1.29

UWES_Dedic

4.20

1.40

4.51

1.51

4.33

1.45

UWES_Absor

3.90

1.27

4.34

1.29

4.08

1.30

Contudo, conforme apresentado na Tabela 2, em termos de engagement, os enfermeiros espanhóis apresentam resultados consistentemente superiores nas três dimensões. Na Tabela 3 apresentam-se as pontuações médias dos enfermeiros portugueses e espanhóis para as 4 dimensões sob análise (Stress total; Vigor; Dedicação; e Absorção), bem como os valores de teste de significância obtidos através dos testes de Mann-Whitney efetuados, concluindo-se que as diferenças entre as

Dimensão

País

M

p

ESPE Morte e Morrer

Portugal

2.37

.015

Espanha

2.28

Portugal

2.23

Espanha

2.03

ESPE Falta de Apoio

.000

Verifica-se igualmente que a variável profissional que apresenta relação estatisticamente significativa com um maior número de dimensões do stress e do engagement é o tipo de horário, em que o horário rotativo é mais indutor de stress e menos motivador do que um horário fixo, sendo que essas diferenças são estatisticamente significativas (p ≤ .001) nas quatro dimensões medidas, conforme apresentado na Tabela 5. Tabela 5 - Relações entre as 4 Dimensões Estudadas e o Tipo de Horário Tipo horário

País

M

ESPE Total

Fixo

2.17

Rotativo

2.35

Fixo

4.34

Rotativo

3.98

Fixo

4.53

Rotativo

4.20

Fixo

4.34

Rotativo

3.90

UWES_Vigor UWES_Dedic UWES_Absor

p .000 .000 .001 .000

Revista Portuguesa de Enfermagem de Saúde Mental, ESPECIAL 6 (OUT.,2018) | 61


Observa-se, igualmente, uma relação estatisticamente significativa entre as 4 dimensões estudadas, conforme apresentado na Tabela 6. Tabela 6 - Correlações de Spearman (rho) entre as 4 Dimensões Estudadas

ESPE Total UWES_Vigor UWES_Dedic

ESPE Total

UWES_ Vigor

UWES_ Dedic

UWES_ Absor

1.000

-.190**

-.122**

-.089**

1.000

.834**

.847**

1.000

.791**

UWES_Absor

1.000

**. A correlação é significativa no nível 0,01 (bilateral).

De acordo com os dados apresentados na Tabela 6, existe uma relação significativa entre o stress e as 3 dimensões do engagement. DISCUSSÃO Vários estudos concluem haver uma relação entre a profissão de enfermagem e, entre outros, o stress, sendo que concluem igualmente que os níveis de stress em enfermeiros estão relacionados com nomeadamente o tipo de horário de trabalho (Bakker, Schaufeli, Leiter, & Taris, 2008; Gerber, Hartmann, Brand, HolsboerTrachsler, & Pühse, 2010). Outros estudos concluíram que o apoio, em especial das chefias, potencia o engagement e a redução de stress (Cardoso, 2009; Reeve, Shumaker, Yearwood, Crowell, & Riley, 2013), o que vai ao encontro dos resultados do nosso estudo em que a diferença em níveis de stress provocados pela falta de apoio eram superiores nos enfermeiros portugueses, sendo que estes apresentam níveis de engagement mais baixos. Vários fatores contribuem para o stress nos enfermeiros, contudo, estudos apontam para uma maior influencia das condições de trabalho do que das vivências da profissão como, por exemplo, o contato com a morte, ou outros fatores que eventualmente podem à primeira vista ser considerados mais stressantes (Galdikiene, Asikainen, Balciunas, & Suominen, 2016). Estudos concluem que os fatores indutores de stress mencionados com mais frequência pelos enfermeiros são a falta de recursos, a pressão do tempo e a sobrecarga de trabalho (Rainho, Pimenta, Antunes, & Monteiro, 2015) e que o conceito de engagement parece funcionar como um fator protetor de stress.

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Verifica-se, também, no presente estudo uma relação inversamente correlacional entre o stress e o engagement, este último nas suas três dimensões sob análise, corroborando, assim, os resultados de outros estudos realizados a este nível (Bakker et al., 2008; García-Sierra, Fernández-Castro, & Martínez-Zaragoza, 2016). CONCLUSÃO Do estudo realizado, verifica-se que o horário é a variável profissional que mais relações estatisticamente significativas apresenta com as várias dimensões estudadas, podendo ser um dos fatores que explica a diferença encontrada entre os enfermeiros dos dois países, já que no caso português somente 28.6% dos enfermeiros tem um horário fixo, comparando com os 36.6% dos enfermeiros espanhóis com esse tipo de horário. Está em análise a proposta de incluir a depressão e o burnout entre as doenças profissionais. A Ordem dos Psicólogos propõe vigilância psicossocial periódica nos locais de trabalho, à semelhança da vigilância regular das doenças físicas, com o objetivo de garantir o bem estar das pessoas e das organizações (Mateus & Arreigoso, 2017). A saúde mental de qualquer trabalhador e consequentemente dos enfermeiros, tem um impacto direto no desempenho das suas funções e deverá ser alvo de estudos aprofundados que possam ajudar a minimizar o stress numa profissão que dadas as suas caraterísticas já é por si indutora de stress. Este estudo pretendeu contribuir para o tema da saúde mental, através do conhecimento dos níveis de engagement e stress em enfermeiros de dois contextos internacionais. IMPLICAÇÕES PARA A PRÁTICA CLÍNICA As organizações na atualidade têm demonstrado uma preocupação crescente em proporcionar condições de trabalho no sentido de melhorar a performance dos seus colaboradores e consequentemente a qualidade dos serviços prestados. O presente estudo, que compara a prática de enfermagem em duas realidades distintas, contribui para melhor entender possíveis causas do aumento de stress e diminuição de engagement no local de trabalho por parte dos enfermeiros.


Pretende-se, através deste estudo, promover a consciencialização junto dos gestores das unidades de saúde, para uma melhor adequação das condições de trabalho, nomeadamente no que concerne o tipo de horário e a carga horária, por forma a melhorar o desempenho das equipas de enfermagem e consequentemente a qualidade de serviço prestado aos utentes, sem que tal tenha implicações orçamentais, mas somente organizacionais. Vários são os estudos nos últimos anos que apresentam vários modelos e técnicas para melhor gerir o stress (Adriaenssens, De Gucht, & Maes, 2015; Nowrouzi et al., 2015), sendo nossa opinião que tanto as técnicas de gestão de stress bem como suporte profissional através do coaching psicológico, podem trazer benefícios tanto para a qualidade de vida e bem-estar dos enfermeiros, para a melhoria da produtividade das organizações onde prestam serviço e, em última instância, a qualidade dos cuidados de saúde prestados aos utentes. Assim, o Coaching Psicológico visa aumentar o nível de satisfação e de bem-estar, o desempenho na vida pessoal e profissional e reduzir o stress no trabalho, conduzindo a melhores resultados e ao sucesso.

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Artigo de Investigação

Disponível em http://dx.doi.org/ 10.19131/rpesm.0215

10 SOCIAL MEDIA DISORDER SCALE – SHORT FORM (SMDS-SF):

ESTUDO DE ALGUMAS PROPRIEDADES JOVENS ADULTOS PORTUGUESES1

PSICOMÉTRICAS

EM

| Liliana Costa1; Ana Paula Matos2; José Joaquim Costa3 |

RESUMO CONTEXTO: A Social Media Disorder Scale - Short Form (SMDS-SF) (Eijnden, Lemmens & Valkenburg, 2016) é um instrumento originalmente desenvolvido para avaliar a dependência das redes sociais virtuais em adolescentes. OBJETIVOS: O objetivo deste estudo foi adaptar a SMDS-SF para os jovens adultos portugueses e estudar algumas propriedades psicométricas, nomeadamente, a sua estrutura fatorial. METODOLOGIA: Neste estudo participaram 131 indivíduos com idades compreendidas entre os 20 e 30 anos, que eram utilizadores de redes sociais. RESULTADOS: Uma Análise Fatorial Exploratória (AFE) revelou uma estrutura unifatorial para a SDMS-SF, à semelhança do que encontraram os autores originais. Os valores do alfa de Cronbach (α=.87) e das correlações item-total revelaram-se adequados. Não foram encontradas diferenças estatisticamente significativas entre géneros nos sintomas de dependência das redes sociais. Os sujeitos que revelaram dependência demonstraram utilizar as redes sociais virtuais como forma de se abstraírem de pensamentos, negando a existência de conflitos ou de problemas familiares e/ou interpessoais consequência de uma utilização excessiva e compulsiva das redes socias. CONCLUSÕES: O presente estudo revelou que a SMDS-SF é um instrumento válido para ser utilizado em futuras investigações que visem analisar a dependência das redes sociais virtuais em jovens adultos. PALAVRAS-CHAVE: Dependência de rede social; Psicometria; Adulto jovem

RESUMEN

ABSTRACT

“Social Media Disorder Scale – Short Form (SMDS-SF): Estudio de algunas propiedades psicométricas en jóvenes adultos portugueses1”

“Social Media Disorder Scale – Short Form (SMDS-SF): Study of some psychometric properties in young Portuguese adults1”

CONTEXTO: La Social Media Disorder Scale-Short Form (SMDS-SF) (Eijnden, Lemmens & Valkenburg, 2016) es un instrumento originalmente desarrollado para evaluar la dependencia de las redes sociales virtuales en adolescentes. OBJETIVOS: El objetivo de este estudio fue adaptar la SMDS-SF para los jóvenes adultos portugueses y estudiar algunas propiedades psicométricas, en particular su estructura factorial. METODOLOGÍA: En este estudio participaron 131 individuos con edades comprendidas entre los 20 y 30 años, que eran usuarios de redes sociales. RESULTADOS: Un análisis factorial exploratorio (AFE) reveló una estructura unifactorial para la SDMS-SF, al igual que los autores originales de la escala. Los valores del alfa de Cronbach (α=.87) y de las correlaciones punto-total se revelaron adecuados. No se encontraron diferencias estadísticamente significativas entre los géneros en los síntomas de dependencia de las redes sociales. Los sujetos que revelaron dependencia demostraron utilizar las redes sociales virtuales como forma de evadir los pensamientos negativos, negando la existencia de conflictos o de problemas familiares y/o interpersonal consecuencia de una utilización excesiva y compulsiva de las redes sociales. CONCLUSIONES: El presente estudio reveló que la SMDS-SF es un instrumento válido para ser utilizado en futuras investigaciones para analizar la dependencia de las redes sociales virtuales en jóvenes adultos.

DESCRIPTORES: Dependencia de red social; Psicometría; Adulto joven

BACKGROUND: The Social Media Disorder Scale - Short Form (SMDSSF) (Eijnden, Lemmens & Valkenburg, 2016) is an instrument developed to assess the dependence of virtual social networks on adolescents. AIM: The objective of this study was to adapt the SMDS-SF to the young Portuguese adults and to study some psychometric properties, namely the factorial structure. METHODS: Participants were 131 individuals between the ages of 20 and 30 who used social networks. RESULTS: An Exploratory Factor Analysis (AFE) revealed a unifatorial structure for SDMS-SF, similar to the original. Cronbach’s alpha values (α=.87) and item-total correlations were adequate. No statistically significant differences were found between genders in the symptoms of social network dependence. Subjects who have shown dependence have demonstrated that they use virtual social networks as a way of escaping from negative thoughts, denying the existence of conflicts or family and / or interpersonal problems due to excessive and compulsive use of social networks. CONCLUSIONS: The present study revealed that SMDS-SF is a measure suitable for future research about the dependence of virtual social networks on young adults.

KEYWORDS: Social networking dependence; Psychometrics; Young adult Submetido em 30-12-2017 Aceite em 15-04-2018

1 Este artigo foi extraído da Dissertação de Mestrado da primeira autora, sobre o tema: “Tecnologias de Informação e Comunicação (TIC), redes sociais e solidão nos adultos portugueses” (2017) – apresentada na Faculdade de Psicologia e Ciências da Educação da Universidade de Coimbra. 2 Mestre em Psicologia, lilianasmcosta@gmail.com 3 Doutorada em Psicologia; Investigadora no Centro de Investigação do Núcleo de Estudos e Intervenção Cognitivo-Comportamental; Professora Associada na Faculdade de Psicologia e de Ciências da Educação da Universidade de Coimbra, Rua Colégio Novo, 3000-115 Coimbra, Portugal, apmatos@fpce.uc.pt 4 Doutorado em Psicologia; Investigador no Centro de Investigação do Núcleo de Estudos e Intervenção Cognitivo-Comportamental; Professor Auxiliar na Faculdade de Psicologia e de Ciências da Educação da Universidade de Coimbra, 3000-115 Coimbra, Portugal, jjcosta@fpce.uc.pt Citação: Costa, L., Matos, A. P., & Costa, J. J. (2018). Social Media Disorder Scale – Short Form (SMDS-SF): Estudo de algumas propriedades psicométricas em jovens adultos portugueses. Revista Portuguesa de Enfermagem de Saúde Mental (Spe. 6), 65-70. doi: 10.19131/rpesm.0215 Revista Portuguesa de Enfermagem de Saúde Mental, ESPECIAL 6 (OUT.,2018) | 65


INTRODUÇÃO Nas sociedades atuais a utilização da internet tem vindo a assumir um papel cada vez mais preponderante. O uso das plataformas digitais fazia parte das rotinas de 96% dos mais de 10000 inquiridos de 20 países (The Internet Society, 2012 cit in Griffiths & Szabo, 2014), para partilha de vivências, enquanto instrumento de trabalho, para lazer e como forma de promover o relacionamento interpessoal (Kietzmann, Hermkens, McCarthy & Silvestre, 2011). Os jovens com idades compreendidas entre os 16 e 24 anos são, comprovadamente, a faixa etária com maior taxa de utilização da Internet (PORDATA, 2016), até porque são o grupo que tem vindo a acompanhar de perto a evolução tecnológica galopante dos últimos anos. Com o tempo, tem aumentado muito o número e tipo de sítios a que se pode aceder. Entre estes destacam-se as redes sociais virtuais, como é o caso do Facebook, que, desde a sua criação em 2004, passou a ser uma ferramenta que faz parte da vida de muitos sujeitos. No primeiro semestre de 2017, havia 2,05 bilhões de usuários ativos por mês no mundo (The Statistics Portal, 2017). Todavia, o Facebook não é a única rede social virtual existente. A sua elevada popularidade e utilização contribuiu para o crescente desenvolvimento de sites com funcionalidades similares. Instagram, YouTube e Twitter, são exemplos de sites sociais igualmente conhecidos e muito utilizados (Kallas, 2017). A vasta gama de sites sociais alterou profundamente a forma como, hoje em dia, os indivíduos comunicam e interagem (Pantic, 2014). A possibilidade de conexão e partilha com qualquer pessoa, em qualquer lugar, em qualquer momento e com muito poucos constrangimentos torna estas redes virtuais atraentes, úteis e, ao mesmo tempo, significativas para o desenvolvimento da reputação e identidade individual (Notley, 2009; Barbera, Paglia & Valsavoia, 2009; Kietzmann et al., 2011). Com a utilização generalizada das redes sociais, aumenta a taxa de uso excessivo. Este tipo de utilização provoca efeitos nocivos não só para o próprio, mas também para a sociedade em geral. Perda de produtividade, sentimentos de isolamento, diminuição da autoestima, ansiedade ou depressão são alguns dos riscos que as investigações têm vindo a revelar (Pantic, 2014; Wang, Lee & Hua, 2015; Guedes, Sancassiani, Carta, Campos, Machado, King & Nardi, 2016). Porém, apesar dos efeitos prejudiciais de uma utilização excessiva, o desejo de utilização tende a permanecer (Guedes et al., 2016). Revista Portuguesa de Enfermagem de Saúde Mental, ESPECIAL 6 (OUT.,2018) | 66

Por este mesmo facto a investigação tem vindo a interessar-se cada vez mais pelas variáveis que possam estar relacionadas com a dependência da Internet (Griffiths & Szabo, 2014; Eijnden et al., 2016; Pantic, 2014; Wang et al., 2015). No entanto, mais do que dependência da internet, parece haver uma dependência daquilo que a Internet oferece. Com isto, pretende-se ilustrar que existe uma diferença entre um estado de necessidade constante de estar a navegar na rede e uma persistência na utilização de algumas das funcionalidades que a mesma tem a oferecer (i.e., por exemplo, sites sociais) (Griffiths, 2000; Griffiths & Szabo, 2014). Para dar resposta à necessidade de avaliar a dependências das redes sociais virtuais, Eijnden et al. (2016) procederam ao desenvolvimento e validação da Social Media Disorder Scale com uma forma longa (SMDS) e uma versão curta (SMDS-SF). O objetivo da presente investigação foi estudar algumas propriedades psicométricas e adaptar, para os adultos portugueses, a versão curta da Social Media Disorder Scale (SMDS-SF) (Eijnden et al., 2016), através da análise fatorial exploratória (AFE), da análise de validade do constructo e da fiabilidade. Teve-se também como objetivo a caracterização do nível de dependência das redes sociais virtuais em adultos portugueses. METODOLOGIA Instrumento A Social Media Disorder Scale-Short Form (SMDS-SF) (Eijnden et al., 2016), foi originalmente desenvolvida com objetivo de medir a dependência das redes sociais virtuais em adolescentes, tendo por base os critérios de diagnóstico do jogo patológico e/ou de dependência de substâncias da DSM-V. A versão curta desta escala (SMDS-SF) engloba 9 itens, que correspondem às 9 dimensões de dependência propostas na DSM-V, respondidos através de uma escala tipo Likert de 6 pontos (0 Nunca – 5 Todos os dias ou quase todos os dias) em relação ao último ano. A pontuação máxima possível é de 45 pontos. No estudo original a SMDS-SF obteve bons valores de alfa de Cronbach (Amostra 1: α=.81; Amostra 2: α=.76; Amostra 3: α=.82) revelando uma boa fiabilidade.


Estratégia Analítica Numa primeira fase averiguou-se se os dados podiam ser submetidos ao processo de análise fatorial exploratória (Pasquali, 1999 cit in Damásio, 2012), através da utilização de dois métodos de avaliação: testes de Kaiser-Meyer-Olkin (KMO) e de Esfericidade de Bartlett (Dziuban & Shirkey, 1974 cit in Damásio, 2012). A análise exploratória multivariada realizou-se através do método dos principais eixos fatoriais. O número mínimo de fatores a reter foi averiguado por um conjunto de procedimentos e critérios: critério de Kaiser, análise do scree plot e o método da Análise Paralela (AP), através do procedimento estatístico de simulação Monte-Carlo Parallel Analysis (Watkins, 2000). A interpretação da solução encontrada foi melhorada através da rotação ortogonal varimax. A homogeneidade dos itens foi analisada através da média, do desvio-padrão e das correlações item-total e a consistência interna da escala foi avaliada com o alfa de Cronbach (Pasquali, 2003; Muñiz, Fidalgo, GarcíaCueto, Martínez & Moreno, 2005). As respostas aos itens da escala foram ainda utilizadas como critério de classificação clínica de dependência seguindo as opções, estratégias e critérios de Eijnden et al. (2016). As respostas foram dicotomizadas de forma a que para cada situação o sujeito fosse classificado com zero (nunca aconteceu) ou um (aconteceu em algum grau), com a pontuação máxima possível de 9. Foi adotado, seguindo a sugestão do estudo original, como critério de dependência das redes sociais obter uma pontuação total na escala ≥ 5. RESULTADOS Análise Fatorial Exploratória O presente estudo englobou uma amostra de 131 sujeitos com idades compreendidas entre os 20 e 30 anos (M= 22.57; DP= 2.63) que afirmaram ter página no Facebook. Destes 65% eram do sexo feminino, sendo a diferença de participantes por género estatisticamente significativa (x2((1))= 11.61, p=.00). Os valores do teste de Kaiser-Meyer-Olkin (KMO = .88) e do Teste de Esfericidade de Bartlett (x2((36))= 531.94, p=.00) garantiram a adequação dos dados à AFE. A partir do estudo da distribuição dos valores dos itens através do Kolmogorov-Smirnov (p < .01) que aponta para a violação do pressuposto da normalidade foi escolhido o método dos principais eixos fatoriais (Principal Axis Factoring) (Fabrigar, Wegener, MacCallum & Strahan, 1999).

A observação do critério de Kaiser e a análise do scree plot sugeriram uma solução de dois fatores. Todavia, ao analisar os valores do método da Análise Paralela (AP) (Watkins, 2000), a solução sugerida detinha apenas um fator. Os dados alcançados, conjuntamente com a informação do artigo original levaram à realização de uma análise fatorial forçada a um fator. A saturação fatorial revelou-se adequada em todos os itens à exceção do item 9 (λ ≥ 0.5). A análise dos valores das comunalidades sugeriu a eliminação do item 5, 6, 8 e 9, devido ao seu valor inferior .40 (Field, 2009) (Tabela 1). Porém, a relevância teórica destes itens justificou a sua manutenção. As análises efetuadas indicaram que o valor próprio do fator 1 era de 4.60 explicando 51.10% da variância total (Tabela 1). Tabela 1 -Pesos fatorais dos itens e respetivo valor de comunalidade (h^2) Itens

F1

h^2

Durante o ano passado: 1. apercebeu-se regularmente que não con.66 seguia pensar noutra coisa que não fosse o momento em que poderia usar de novo as redes sociais?

.43

2. sentiu-se com frequência insatisfeito porque queria passar mais tempo nas redes sociais?

.85

.72

3. sentiu-se frequentemente mal porque não podia usar as redes sociais?

.84

.70

4. tentou passar menos tempo nas redes sociais, mas não conseguiu?

.72

.52

5. negligenciou regularmente outras atividades (como hobbies ou desporto) porque preferiu usar as redes sociais?

.60

.36

6. teve frequentemente discussões com outras pessoas devido ao seu uso das redes sociais?

.60

.36

7. mentiu regularmente aos pais ou amigos sobre a quantidade de tempo que passava nas redes sociais?

.63

.41

8. usou frequentemente as redes sociais para evitar pensar em coisas desagradáveis?

.61

.37

9. teve conflitos graves com os pais e irmãos por .47 causa da utilização que fazia das redes sociais?

.22

Valor próprio= 4.60 Variância explicada= 51.10

As estatísticas descritivas incluíram a média (M), o desvio-padrão (DP) e os valores máximos e mínimos. No que respeita à média da pontuação na escala obteve-se um valor de 5.15 (DP = 6.73), com uma pontuação máxima de 39. Revista Portuguesa de Enfermagem de Saúde Mental, ESPECIAL 6 (OUT.,2018) | 67


A análise da frequência das várias opções de resposta (Nunca – Todos os dias ou quase todos os dias), evidenciou a elevada percentagem de sujeito que elegeram Nunca como resposta aos diversos itens. As análises das diferenças entre género relativamente à pontuação total na escala foram averiguadas através do teste não paramétrico Wilcoxon-Mann-Whitney, por se ter verificado através do teste Kolmogorov-Smirnov que a sua distribuição diferia significativamente da distribuição normal. Os valores obtidos apontaram para a inexistência de diferenças estatisticamente significativas (U = 1947.50, p=.97). A pertinência do cálculo da homogeneidade dos itens através da correlação corrigida e do próprio alfa de Cronbach em situação de desvio da distribuição à normalidade, foi ponderada. Os eventuais enviesamentos derivados do não cumprimento deste pressuposto são negligenciáveis por se tratar de uma amostra grande (n>100) como referem Murteira, Silva, Pimenta e Ribeiro (2001). Os valores de alfa de Cronbach quando se exclui o item variaram entre .84 e .87 o que significa que todos os itens contribuem adequadamente para a medida. O valor do alfa de Cronbach de .87 para a escala é considerado pela generalidade dos autores como muito bom (DeVellis, 1991; Anastasi, 1990). Dado que os valores de alfa de Cronbach não aumentam com a retirada de cada um dos itens, e as correlações dos itens com o total da escala são altas podemos afirmar que a SMDS-SF tem uma adequada fiabilidade (Tabela 2). Tabela 2 - Correlações item-total (r), alfa de Cronbach se o item for retirado (α) e alfa de Cronbach do fator Fator/Itens

r

α

1. apercebeu-se regularmente que não conseguia pensar noutra coisa que não fosse o momento em que poderia usar de novo as redes sociais?

.60

.86

2. sentiu-se com frequência insatisfeito porque queria passar mais tempo nas redes sociais?

.79

.84

3. sentiu-se frequentemente mal porque não podia usar as redes sociais?

.78

.84

4. tentou passar menos tempo nas redes sociais, mas não conseguiu?

.68

.85

5. negligenciou regularmente outras atividades (como hobbies ou desporto) porque preferiu usar as redes sociais?

.56

.86

6. teve frequentemente discussões com outras pessoas devido ao seu uso das redes sociais?

.55

.86

7. mentiu regularmente aos pais ou amigos sobre a quantidade de tempo que passava nas redes sociais?

.61

.86

8. usou frequentemente as redes sociais para evitar pensar em coisas desagradáveis?

.57

.86

9. teve conflitos graves com os pais e irmãos por causa da utilização que fazia das redes sociais?

.42

.87

Sujeitos Dependentes das Redes Sociais Com intuito de analisar a percentagem de sujeitos que preenchiam o critério de diagnóstico de dependência das redes sociais virtuais, precedeu-se à transformação da escala tipo Likert de 6 pontos numa escala dicotómica. Para tal, o Nunca assumiu o valor 0 e as restantes opções de resposta o 1. A análise das respostas a partir da escala dicotómica permitiu identificar 31 sujeitos (24%) dependentes das redes sociais. Destes, 18 (58%) eram do género feminino e 13 (42%) do masculino, não existindo diferenças estatisticamente significativas no que respeita ao número de sujeitos dependentes por género (x_((1))^2= .81, p= .37). A frequência das respostas dadas pelos sujeitos que evidenciaram comportamentos de dependência permitiu averiguar que os itens que obtiveram maior percentagem de respostas positivas foram o 1 (Durante o ano passado apercebeu-se regularmente que não conseguia pensar noutra coisa que não fosse o momento em que poderia usar de novo as redes sociais?) (87.1%), o 4 (Durante o ano passado tentou passar menos tempo nas redes sociais, mas não conseguiu?) (93.5%) e o 8 (Durante o ano passado usou frequentemente as redes sociais para evitar pensar em coisas desagradáveis?) (87.1%). Por outro lado, o item 7 (Durante o ano passado mentiu regularmente aos pais ou amigos sobre a quantidade de tempo que passava nas redes sociais?) (41.9%) e o 9 (Durante o ano passado teve conflitos graves com os pais e irmãos por causa da utilização que fazia das redes sociais?) (22.6%) tiveram menor percentagem de respostas positivas.

Fator 1 (α=.87) Durante o ano passado:

Revista Portuguesa de Enfermagem de Saúde Mental, ESPECIAL 6 (OUT.,2018) | 68

DISCUSSÃO Estudos têm evidenciado que a utilização compulsiva das redes sociais virtuais constitui um problema de saúde mental (Pantic, 2014) podendo originar alterações graves no comportamento, isolamento em relação à família e/ou amigos (Silva, 2016), alterações de humor e agitação extrema perante a impossibilidade de utilização (Silva, 2014). A inexistência de um instrumento de medida que possibilitasse a avaliação da dependência destes sites, de modo a ser possível fazer uma distinção entre utilizadores dependentes e não dependentes, levou ao desenvolvimento da Social Media Disorder Scale (Eijnden et al., 2016).


O estudo descritivo das respostas dadas demonstrou que uma percentagem elevada de sujeitos selecionou Nunca como resposta aos diferentes itens. Estes dados são esperados já que se tratou de um estudo que investigou uma patologia (i.e., dependência das redes sociais virtuais), numa amostra obtida na população dita normal. Todavia, foi identificada a existência de 31 (24%) participantes com comportamentos de dependência, sendo que 18 (58%) eram do género feminino e 13 (42%) do masculino, não existindo diferenças estatisticamente significativas entre sexos. Comparativamente ao artigo original (Eijnden et al., 2016), a presente investigação evidenciou uma percentagem superior de sujeitos dependentes, já que nesse estudo apenas 9.8% do total dos participantes (n= 2198) demonstraram deter sintomas que podem ser entendidos como dependência das redes sociais virtuais. A análise das repostas sugeriu que os adultos dependentes preferem utilizar as redes sociais como forma de evitamento, provavelmente para se abstraírem de pensamentos, mas também de sentimentos e memórias desagradáveis (cf., item 8: Durante o ano passado usou frequentemente as redes sociais para evitar pensar em coisas desagradáveis?) – i.e., evitamento experiencial (Hayes et al., cit in Chawla & Ostafin, 2007). Negam ainda a influência negativa da utilização excessiva destes sites nas relações familiares e/ou interpessoais (item 7: Durante o ano passado mentiu regularmente aos pais ou amigos sobre a quantidade de tempo que passava nas redes sociais?; item 9: Durante o ano passado teve conflitos graves com os pais e irmãos por causa da utilização que fazia das redes sociais?). Esta não interferência nas relações pode ser consequência da formulação dos itens não englobar a/o companheira(o) como um dos elementos centrais às discussões. O estudo comporta limitações que devem de ser tidas em consideração. Uma das mais importantes é que os itens têm na base da sua elaboração critérios de diagnósticos usados originalmente para descrever jogo patológico e/ou dependência de substâncias que podem necessitar de ser reformulados de modo a englobarem características especificas da utilização excessiva das redes sociais virtuais (Eijnden, et al., 2016). Acresce que os dados foram conseguidos através de um instrumento de autorresposta, não tendo havido um cruzamento da informação com outros métodos ou fontes (i.e., por exemplo, familiares e amigos/as ou informações comportamentais diretas).

A estrutura fatorial da SMDS-SF deverá continuar a ser estudada de modo a confirmar a sua adequação à população adulta portuguesa. Em estudos futuros é sugerida a inserção da questão “Utiliza alguma rede social virtual?” complementada com “Se sim, refira qual ou a utilização de sujeitos previamente selecionados por usarem as redes sociais virtuais”. A replicação do presente estudo em adolescentes e em sujeitos com mais de 30 anos é outra das sugestões sendo essencial prestar atenção à formulação dos itens. CONCLUSÃO O presente estudo contribui para o enriquecimento da investigação referente à utilização das redes sociais virtuais, permitindo uma visão mais clara da sua utilização abusiva pela população adulta portuguesa. A SMDS-SF revelou ser um instrumento válido para ser utilizado em futuras investigações assim como para distinguir sujeitos dependentes dos não dependentes. Finalmente, foi possível apurar que a percentagem de sujeitos dependentes das redes sociais virtuais nos adultos portugueses desta amostra é de 24%, sendo que estes referiram pensar com muita frequência na utilização destes sites para evitar pensamentos desagradáveis e relataram dificuldades em reduzir o tempo despendido a usá-los. No entanto, mencionaram a existência de poucos conflitos com familiares e/ou amigos e que raramente mentiam sobre a utilização das redes socias virtuais. IMPLICAÇÕES PARA A PRÁTICA CLÍNICA A presente investigação possibilita a avaliação da forma como as redes sociais virtuais são utilizadas pelos adultos portugueses, bem como os problemas associados a um uso excessivo. Este estudo constitui uma maisvalia uma vez que auxilia os profissionais a definir um padrão problemático associado ao uso destes sites e a desenvolver planos de prevenção e intervenção. REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS Anastasi, A. (1990). Psychological testing. 6th Ed. New York: Mc Millan. Barbera, D., Paglia, F. & Valsavoia, R. (2009). Social Network and Addiction. Annual Review of Cybertherapy and Telemedicine, 7, 33-36. Doi: 10.3233/978-160750-017-9-33 Revista Portuguesa de Enfermagem de Saúde Mental, ESPECIAL 6 (OUT.,2018) | 69


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Artigo de Investigação

Disponível em http://dx.doi.org/10.19131/rpesm.0216

11 A

SATISFAÇÃO COM A VIDA ACADÉMICA. BEM-ESTAR E DISTRESS PSICOLÓGICO

RELAÇÃO

COM

| Maria José Nogueira1; Carlos Sequeira2 |

RESUMO CONTEXTO: A satisfação com a vida académica (SVA) abrange um conceito multifatorial, que engloba todas as experiências dos estudantes relativas à sua vida no ambiente académico, evidenciando a qualidade da sua adaptação ao mesmo. Além disso, é um indicador importante de bem-estar psicológico dos estudantes e, os estudos evidenciam uma relação positiva entre a SVA o bem-estar e a saúde mental e uma relação negativa com o distress. Contudo, em Portugal, pouco se conhece sobre esta relação, por conseguinte, considerou-se relevante estudar esta temática. OBJETIVO: (1) caracterizar a SVA dos estudantes do ensino superior; (2) estudar a relação entre a SVA e o Bem-estar e distress psicológico. METODOLOGIA: Trata-se de um estudo descritivo, transversal e correlacional. A amostra não probabilística é composta por estudantes do ensino superior do Distrito de Lisboa do 1º e 2º ano, inscritos no 1º ciclo de estudos. Os participantes deram consentimento informado escrito e preencheram voluntariamente um inquérito online, que lhe foi enviado para o correio eletrónico do campus, entre outubro e novembro de 2015. Para recolher informação sociodemográfica, SVA e a saúde mental dos estudantes foram utilizados um questionário, com as variáveis em estudo, Escala de Satisfação com a Vida Académica (ESVA) e o Inventário de Saúde Mental (ISM). Foram garantidos todos os princípios e aspetos éticos. RESULTADOS: Os resultados indicam que os participantes têm elevada satisfação com a vida académica e níveis de saúde mental satisfatórios. As análises correlacionais mostram que a ESVA se correlaciona de forma positiva e significativamente com o Bem-Estar Psicológico e negativamente com o Distress Psicológico. Verifica-se que a valores mais elevados de SVA estão associados valores mais elevados de Bem-Estar Psicológico e a valores mais baixos de Distress Psicológico. CONCLUSÕES: Conclui-se que a SVA está associada positivamente ao Bem-Estar Psicológico e negativamente ao Distress Psicológico e, é um preditor de Bem-Estar Psicológico. Esta informação é relevante para intervenção necessária na lógica dos contextos promotores de saúde.

PALAVRAS-CHAVE: Qualidade de vida; Saúde mental; Estudantes

RESUMEN

ABSTRACT

“La satisfacción con la vida académica. Relación con bienestar y distress psicológico”

“Academic life satisfaction. Relation with well-being and psychological distress”

CONTEXTO: La satisfacción con la vida académica (SVA) abarca un concepto multifactorial, que engloba todas las experiencias de los estudiantes relativas a su vida en el ambiente académico, evidenciando la calidad de su adaptación al mismo. Además, es un importante indicador de éxito académico de bienestar psicológico de los estudiantes e los estudios demuestran que existe una relación positiva entre la SVA, el bienestar y la salud mental, e una relación negativa con el distress. Sin embargo, em Portugal poco se conoce sobre esta relación, por lo tanto, se consideró pertinente estudiar esta temática. OBJETIVO: (1) caracterizar la SVA de los estudiantes de educación superior; (2) estudiar la relación entre la SVA, el Bienestar y distress psicológico. METODOLOGÍA: Se trata de un estudio descriptivo, transversal y correlacional. La muestra no probabilística consiste en estudiantes de educación superior, del 1er ciclo de estudios del Distrito de Lisboa, inscrito en el primero y segundo año. Los participantes dieron consentimiento informado escrito y llenaron voluntariamente una encuesta online, que le fue enviada al correo electrónico del campus, entre octubre y noviembre de 2015. Para recoger información sociodemográfica, SVA y de la salud mental de los estudiantes se utilizó un cuestionario, con las variables en estudio, la Escala de Satisfacción con la Vida Académica (ESVA) y el Inventario de Salud Mental (ISM). Se han garantizado todos los principios y los aspectos éticos. RESULTADOS: Los resultados indican que los participantes tienen una elevada satisfacción con la vida académica y niveles de salud mental satisfactorios. Los análisis correlacionales muestran que la ESVA se correlaciona de forma positiva y significativamente con el Bienestar Psicológico y negativamente con el Distress Psicológico. Se observa que los valores más altos de SVA están asociados a valores más elevados de bienestar psicológico ya valores más bajos de Distress Psicológico. CONCLUSIONES: Se concluye que la SVA está asociada positivamente al Bienestar Psicológico y negativamente al Distress Psicológico y, es un predictor de Bienestar Psicológico. Esta información es relevante para definir la naturaleza y tipo de intervención necesaria en la lógica de los contextos promotores de salud.

CONTEXT: Satisfaction with academic life (SAL) encompasses a multifactorial concept that covers all the students’ experiences related to their life in the academic environment, showing the quality of their adaptation to it. In addition, SAL is an important indicator of student´s well-being. The studies show a positive relationship between SAL, well-being and mental health. However, in Portugal little is known about this relationship. Therefore, we consider relevant to study this theme. OBJECTIVE: (1) to describe the SAL of students of higher education; (2) to study the relationship between SAL and welfare and psychological distress. METHOD: This is a descriptive, cross-sectional and correlational study. The non-probabilistic sample are students of first cycle higher education´s Lisbon District, enrolled in 1st and 2nd year. Participants gave informed written consent and voluntarily completed an online survey, which was sent to campus e-mail, between October and November 2015. A questionnaire was used to collect sociodemographic, SAL and mental health information from the students. Study variables, include Satisfaction with Academic Life Scale (SALE) and the Mental Health Inventory (ISM). All principles and ethical aspects have been guaranteed. RESULTS: The results indicate that participants have high satisfaction with academic life and satisfactory levels of mental health. Correlational analyzes show that SALE correlates positively and significantly with Psychological Well-Being and negatively with Psychological Distress. It is verified that the higher values of SAL are associated with higher values of Psychological Welfare and lower values of Psychological Distress. CONCLUSIONS: We conclude that SAL is positively associated with Psychological Well-Being and negatively on Psychological Distress, and is a predictor of Psychological Well-Being. This information is relevant to define the nature and type of intervention required in the logic of health promotion contexts.

DESCRIPTORES: Calidad de vida; Salud mental; Estudantes

KEYWORDS: Quality of life; Mental health; Students Submetido em 30-12-2017 Aceite em 23-04-2018

1 Enfermeira especialista em Enfermagem de Saúde Mental e Psiquiátrica; Mestre; Doutora; Investigadora no Centro de Pesquisa em Tecnologia e Serviços de Saúde (CINTESIS - NursID); Professora Adjunta na Escola Superior de Saúde Atlântica, Fábrica da Pólvora de Barcarena, 2730-036 Barcarena, Portugal, mjnogueira@uatlantica.pt 2 Enfermeiro especialista em Enfermagem de Saúde Mental e Psiquiátrica; Mestre; Doutor; Investigador no Centro de Pesquisa em Tecnologia e Serviços de Saúde (CINTESIS - NursID); Professor Coordenador na Escola Superior de Enfermagem do Porto, 4200-072 Porto, Portugal, carlossequeira@esenf.pt Citação: Nogueira, M. J., & Sequeira, C. (2018). A satisfação com a vida académica. Relação com bem-estar e distress psicológico. Revista Portuguesa de Enfermagem de Saúde Mental (Spe. 6), 71-76. doi: 10.19131/rpesm.0216 Revista Portuguesa de Enfermagem de Saúde Mental, ESPECIAL 6 (OUT.,2018) | 71


INTRODUÇÃO A SVA traduz uma perceção positiva resultante da ponderação subjetiva entre vivencias positivas vs negativas, que o estudante faz do ambiente académico em que está inserido. Este conceito, multifatorial, agrega todas as experiências dos estudantes relativas à sua vida no ambiente académico, evidenciando a qualidade da sua adaptação ao mesmo (Soares, Almeida, Dinis, & Guisande, 2006). A SVA é um estado emocional positivo que expressa autocontrolo, autonomia e empoderamento, competências que reforçam a capacidade do estudante de resolver problemas e de tomar decisões no quotidiano académico, contribuindo para o seu funcionamento harmonioso (Soares & Almeida, 2011) condicionando o desempenho académico (Martins, Mendes, & Fernandes, 2016). O conceito de SVA contém uma dimensão interna (pessoal) e outra mais externa (elementos organizacionais, estrutura física da instituição de ensino que frequenta) (Bardagi & Hutz, 2012; Santos & Suehiro, 2007). Na dimensão interna incluem-se: as habilidades, competências, vivencias, o interesse e compromissos com o curso, a perceção de desempenho académico e os relacionamentos com colegas e professores (Soares, Almeida, Dinis, & Guisande, 2006). Na dimensão externa incluem-se: o ambiente pedagógico e físico do contexto académico, as condições para o estudo da instituição e as atividades extracurriculares (Eisenberg, Hunt, & Speer, 2013; Santos, Polydoro, Scortegagna, & Linden, 2013; Soares & Almeida, 2011). Os estudos com estudantes do ensino superior, isto é, Universitário, Politécnico e Militar e Policial (EES), têm demonstrado que as vivências académicas positivas são promotoras de bem-estar e de realização, pessoal e/ou interpessoal (Santos & Suehiro, 2007). O bem-estar é, por sua vez, um indicador resultante dos processos positivos de transição, que influenciam o desempenho académico (Chow, 2010; Eisenberg, Golberstein, & Hunt, 2009). Na investigação com EES são referidas associações positivas entre o bem-estar subjetivo e o ambiente académico (Lopes, Milheiro, & Maia, 2013; Nogueira, 2017) e, vários estudos indicam que as vivências de satisfação com a vida académica são preditores de bem-estar (Bardagi & Hutz, 2012). Em Portugal pouco se conhece sobre saúde mental em estudantes de ensino superior, bem como sobre a relação entre a SVA e bem-estar e distress psicológico (Nogueira, Barros, & Sequeira, 2017). Revista Portuguesa de Enfermagem de Saúde Mental, ESPECIAL 6 (OUT.,2018) | 72

Conhecer esta relação é relevante para os enfermeiros, pois fornece dados para planear intervenções mais ajustadas às necessidades dos EES, no âmbito da promoção da saúde mental em contexto académico. Deste modo, o nosso objetivo foi caracterizar a SVA dos estudantes do ensino superior e a sua relação com Bemestar e Distress Psicológico. METODOLOGIA Trata-se de um estudo transversal, descritivo e correlacional e de uma amostra não probabilística de EES do Distrito de Lisboa, que frequentam o primeiro e segundo ano do 1º ciclo de estudos. Os dados foram recolhidos entre outubro e novembro de 2015, enviado questionário online via email (campus) para todos os estudantes inscritos em instituições de Ensino Superior do Distrito de Lisboa, contendo as variáveis em estudo. O estudo obteve parecer positivo da Comissão de Ética da Escola Superior de Enfermagem de Lisboa. Os aspetos formais e Éticos foram garantidos durante os procedimentos de recolha dos dados, em concordância com a Declaração de Helsínquia. Foi obtida a autorização escrita dos autores dos instrumentos usados no estudo e, dos participantes, que completaram voluntariamente o inquérito anónimo online. Os participantes foram informados previamente dos objetivos e implicações do estudo, da confidencialidade das suas respostas e foi reforçado que eram livres de desistir em qualquer altura da recolha dos dados. No final do inquérito, cada participante validou intencionalmente as sua respostas. Instrumentos e Medidas A informação sobre variáveis sociodemográficas foi recolhida usando um questionário com os itens: género, idade, estado civil, ano, tipo de ensino e consumos de substancias (tabaco, álcool, canábis/haxixe) no ultimo mês. Para medir SVA foi usada a Escala de Satisfação com a Vida Académica (ESVA) (Nogueira, 2017), com oito itens de autopreenchimento, cuja resposta é dada numa escala tipo Likert de 5 pontos 1=discordo totalmente; 2=discordo; 3=nem concordo nem discordo; 4=concordo; 5=concordo totalmente. A ESVA demonstrou ser válida e fiável (alfa de Cronbach 0,80) no estudo original (Nogueira, 2017). Neste estudo o alfa de Cronbach foi de 0,82. As pontuações totais da ESVA resultam do somatório dos valores brutos dos itens. Quanto mais alto o valor maior a perceção de satisfação académica do estudante.


Pode ainda ser analisada de acordo com os dois fatores - Satisfação Pessoal e Satisfação com Ambiente Académico, encontrados na análise fatorial. Para medir a variável Bem-estar e distress psicológico dos EES, foi usado Inventário de Saúde Mental (Pais-Ribeiro, 2001). O ISM é um instrumento de autopreenchimento, tem 38 itens distribuídos pela dimensão negativa - Distress Psicológico (3 subescalas: ansiedade, depressão, perda de controlo emocional), e pela positiva - Bem-Estar Psicológico (2 subescalas: afeto positivo e laços emocionais) e, cota numa escala ordinal tipo Likert com 5 e 6 pontos (1=sempre; 2=quase sempre discordo; 3=a maior parte do tempo; 4=durante algum tempo; 5=quase nunca; 6=nunca), sem ponto de corte. A consistência interna foi demonstrada pelo alfa de Cronbach de 0,96 (estudo original de 0,80). Para o tratamento e análise estatística dos dados foi usado o Software IBM® SPSS® Statistic Statistical Package for the Social Sciences for Windows, versão 22.0. Recorreu-se a técnicas de análise estatística descritiva, bivariada e inferencial (Marôco, 2011). Foram usados os testes T de Student para comparar dois grupos e a ANOVA quando se comparou três ou mais grupos. Recorreu-se ao Bonferroni para destacar quais os grupos que diferem entre si, quando o número de comparações era pequeno (Marôco, 2011). Para identificar os preditores significativos de bemestar e distress psicológico utilizou-se o modelo de regressão linear múltipla hierárquica (RLMH). Foi assumido como nível de significância p value ≤ 0,05. RESULTADOS Participaram no estudo 500 estudantes, maioritariamente mulheres (79,6%), com idade compreendida entre os 18 e os 24 anos (M=19,6; DP=1,6), maioritariamente solteiros (99,3%). Frequentam o ensino superior público 79,1%, o privado 17,4% e militar e policial 3,5%, dos quais 48,9% frequenta o 1º ano e 51,1% o 2º ano. 83% não fuma, mas quase 15% fuma mais de 10 cigarros por dia. A maioria (55%) consumiu álcool no último mês, 25% consumiu canábis/haxixe e a 1º experiencia ocorreu entre os 13 e 16 anos (M=17; DP=1,69). Os resultados mostram valores de satisfação com a vida académica quase 10 pontos acima do valor médio possível da escala ESVA, e uma média discretamente superior em Satisfação Pessoal (Tabela 1).

Tabela 1 - Estatísticas descritivas da ESVA na amostra Subescalas ESVA

Mínimo

Máximo

M

DP

Satisfação Pessoal (SP) (a)

10

40

14,61

2,92

Satisfação com Ambiente Académico (SAA) (b)

8

40

14,59

3,19

ESVA Total (c)

10

40

29,20

5,33

(a) 4 Itens [4;20]; (b) 4 itens[4;20]; (c)8 itens[8;40]; n=500

Quanto à saúde mental dos participantes, a média do ISM-Total [48;228] foi de 158,87 (DP=29,49). A média do Distress Psicológico [24;144] foi 107,41 (DP=19,41) e do Bem-Estar [14;84] de 52,46 (DP=11,70). A Tabela 2 mostra relação entre SVA e o ISM. Todas as subescalas da dimensão positiva do ISM se correlacionam positiva e significativamente com a ESVA. A correlação mais robusta verifica-se entre Satisfação Pessoal e a subescala do ISM-Afeto Geral Positivo e a mais baixa entre Laços Emocionais e a Satisfação com Ambiente Académico. Tabela 2 -Correlação Pearson entre saúde mental-ISM e ESVA Subescalas ISM

ESVA SP(a)

SAA(b)

Escala Total

Distress Psicológico

-,45**

-,30**

-,42**

Ansiedade

-,36**

-,24**

-,34**

Depressão

-,46**

-,32**

-,45**

Perda de Controlo Emocional/Comportamental

-,47**

-,30**

-,44**

Bem-Estar Psicológico

,52**

,34**

,49**

Afeto Geral Positivo

,53**

,36**

,51**

Laços Emocionais

,34**

,18**

,29**

ISM Global

,50**

,33**

,47**

**p <0, 01; (a) SP- Satisfação Pessoal; (b) SAA - Satisfação com Ambiente Académico n=500

Relativamente à identificação dos preditores significativos de Bem-Estar Psicológico, as análises baseadas na RLMH, mostraram que os estudantes mais satisfeitos com vida académica (β = 0,33, p =,005) obtêm valores mais elevados de BEP. Enquanto na predição de Distress Psicológico (DP) os mais satisfeitos com a vida académica (β = -0,55, p =,005) obtêm valores mais baixos de Distress Psicológico. A Tabela 3 mostra diferenças significativas entre participantes dos diferentes níveis de SM em todas as subescalas da ESVA. Os participantes com ISM-elevado têm Satisfação Pessoal mais elevada. Revista Portuguesa de Enfermagem de Saúde Mental, ESPECIAL 6 (OUT.,2018) | 73


Tabela 3 - Comparações das médias da ESVA por níveis de ISM Nível de Saúde Mental Subescalas da ESVA

Baixo N=86

Moderado N=337

Elevado N=77

F (2;497

M (DP)

M (DP)

M (DP)

Satisfação Pessoal1

12,60(2,40)

14,55(2,40)

17,09(3,72)

69,57(a) (2;155,171)**

Satisfação com Ambiente Académico2

13,14(2,74)

14,56(2,78)

16,36(3,30)

22,65**

ESVA Total3

25,74(3,71)

29,11(5,44) 33,45(5,82)

51,33**

(a) ANOVA de Welsh por não verificação de homogeneidade de variâncias; **p <0,01; n =500 (1) 4 Itens [4;20]; (2) 4 itens[4;20]; (3)8 itens[8;40]

A perceção de habilidades pessoais, de competências académicas, e de relações positivas com o ambiente pedagógico, espaço físico e as atividades extracurriculares, oferecidas pela instituição, estão associadas positivamente à saúde mental dos estudantes, que por sua vez são indicadores de desenvolvimento psicossocial positivo e sucesso académico (Chow, 2010; Soares & Almeida, 2011). Estes dados são importantes para desenhar intervenções de promoção da saúde mental em contextos académicos, dirigidas às mudanças positivas e saudáveis no ambiente académico, nomeadamente adequadas às suas expetativas e necessidades, visando reduzir níveis de distress psicológico. CONCLUSÃO

DISCUSSÃO Com este estudo pretendeu-se caracterizar a satisfação com a vida académica dos estudantes do ensino superior e analisar a sua relação com o bem-estar e o distress psicológico. A amostra é maioritariamente feminina, de solteiros com uma média de idade próxima de 20 anos. Este perfil é consentâneo com estudos nacionais prévios nesta população - Eurostudent 2012-2015 (Hauschildt, Gwosć, Netz, & Mishra, 2015) e, o consumo de álcool e drogas no último mês são ligeiramente inferiores aos valores reportados pela maioria dos estudos (Bayati, Beigi, & Salehi, 2009; Ridner, Newton, Staten, Crawford, & Hall, 2015). Os resultados mostram valores de satisfação com a vida académica, acima do ponto médio possível e estes valores são idênticos aos reportados no Reino Unido (El Ansari & Stock, 2010) e no Brasil (Santos & Suehiro, 2007; Andrade, Duarte, & Oliveira, 2010). Tal como esperado, verificou-se uma associação positiva significativa entre a saúde mental e a SVA, com maior magnitude entre a Satisfação Pessoal e a subescala Afeto Geral Positivo, importantes dimensões de saúde mental positiva. Verificou-se ainda uma associação negativa estatisticamente significativa entre a SVA e o Distress Psicológico, corroborando os estudos de Verger et al., (2009) e Ferreira (2014) e, verificou-se que a SVA é um preditor positivo de bem-estar psicológico e um preditor negativo de Distress Psicológico. Isto é, os estudantes mais satisfeitos com a sua vida académica têm valores mais baixos de DP.

Revista Portuguesa de Enfermagem de Saúde Mental, ESPECIAL 6 (OUT.,2018) | 74

Conclui-se que a SVA está associada positivamente à SM dos participantes e é um preditor positivo de bem-estar psicológico e negativo de distress. Esta informação é relevante para fundamentar intervenções de promoção de saúde mental na lógica dos contextos académicos promotores de saúde. A evidência aponta várias possibilidades de intervenção no âmbito da saúde mental positiva em ambientes académicos, que incrementem a autoeficácia dos estudantes, que têm demostrado impactos positivos no bem-estar. IMPLICAÇÕES PARA A PRÁTICA CLÍNICA Os resultados deste estudo são um importante contributo para enfermagem de saúde mental. Caracterizar a satisfação com a vida académica dos EES e a sua relação com a saúde mental permite fornecer dados para implementar estratégias de promoção de SM mais ajustadas às particularidades dos EES. Nomeadamente ao nível da literacia em saúde mental e dos contextos promotores de saúde uma vez que os enfermeiros atuam na educação e promoção da saúde. REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS Andrade, A., Duarte, P., & Oliveira, L. (2010). I Levantamento Nacional sobre o Uso de Álcool, Tabaco e Outras Drogas entre Universitários das 27 Capitais Brasileiras. Disponível em: http://www.grea.org.br/ userfiles/GREA-ILevantamentoNacionalUniversitarios.pdf


Bayati, A., Beigi, A., & Salehi, N. (2009). Depression prevalence and related factors in Iranian students. Pakistan Journal of Biological Sciences, 12 (20), 1371– 1375. Doi: 10.3923/pjbs.2009.1371.1375. Bardagi, M., & Hutz, C. (2012). Academic Routine and Relationship with Colleagues and Teachers: Impact on University Evasion. Psico, 43 (2), 174-184. Disponível em: https://dialnet.unirioja.es/servlet/ articulo?codigo=5163217 Chow, H. (2010). Predicting academic success and psychological wellness in a sample of Canadian undergraduate students. Electronic Journal of Research in Educational Psychology, 8 (2), 473–496. Disponível em: https://eric.ed.gov/?id=EJ900897 Eisenberg, D., Golberstein, E., & Hunt, J. (2009). Mental Health and Academic Success in College. The B.E. Journal of Economic Analysis & Policy, 9 (1), 78–88. Doi:10.2202/1935-1682.2191. Eisenberg, D., Hunt, J., & Speer, N. (2013). Mental health in American colleges and universities: variation across student subgroups and across campuses. The Journal of Nervous and Mental Disease, 201 (1), 6067. Doi: 10.1097/NMD.0b013e31827ab077. El Ansari, W., & Stock, C. (2010). Is the health and wellbeing of university students associated with their academic performance? Cross sectional findings from the United Kingdom. International Journal of Environmental Research and Public Health, 7 (2), 509–527. Disponível em: http://www.mdpi.com/16604601/7/2/509 Ferreira, E. (2014). Ansiedade aos exames em estudantes universitários: relação com stresse académico, estratégias de coping e satisfação académica. (Dissertação de Mestrado). Disponível no Repositório Cientifico da Universidade Lusófona. Hauschildt, K., Gwosć, C., Netz, N., & Mishra, S. (2015). Social and Economic Conditions of Student Life in Europe. EUROSTUDENT V 2012–2015. Disponível em: http://www.eurostudent.eu

Lopes, E., Milheiro, I., & Maia, A. (2013). Sleep quality in college students: a study about the contribution of lifestyle, academic performance and general wellbeing. Sleep Medicine, 14 (1), e185. Disponível em: https://www.sciencedirect.com/science/article/pii/ S1389945713016523 Marôco, J. (2011). Análise Estatística com o SPSS statistics. 5ª Ed. Pero Pinheiro: Report Number. Martins, E., Mendes, F., & Fernandes, R. (2016). Processos de estudo, desempenho e satisfação no ensino superior. (Dissertação de Mestrado). Disponível no Repositório Científico do Instituto Politécnico de Viseu. Nogueira, M. J. (2017). Saúde mental em Estudantes do Ensino Superior: Fatores Protetores e Fatores de Vulnerabilidade. (Tese de Doutoramento não publicada). Universidade de Lisboa, Portugal. Disponível em: http://repositorio.ul.pt/bitstream/10451/28877/1/ ulsd730773_td_Maria_Nogueira.pdf Nogueira, M. J., Barros, L., & Sequeira, C. (2017). Psychometric Properties of the Psychological Vulnerability Scale in Higher Education Students. Journal of the American Psychiatric Nurses Association, 23 (3), 215222. Doi: 10.1177/1078390317695261. Pais-Ribeiro, J. (2001). Mental Health Inventory: Um Estudo de Adaptação à População Portuguesa. Psicologia, Saúde & Doenças, 2 (1), 77-99. Disponível em: http://www.scielo.mec.pt/scielo.php?script=sci_arttex t&pid=S1645-00862001000100006 Ridner, S., Newton, K., Staten, R., Crawford, T., & Hall, L. (2015). Predictors of well-being among college students. Journal of American College Health, 64 (2), 116–124. Disponível em: https://www.tandfonline. com/doi/full/10.1080/07448481.2015.1085057 Santos, A., & Suehiro, A. (2007). Instruments for Assessment of Integration and Academic Satisfaction: Validity Study. Revista Galego-Portuguesa de Psicoloxía e Educación, 14 (1), 107-119. Disponível em: http:// www.educacion.udc.es/grupos/gipdae/documentos/ revistas/14%20Revista%20GAL%20PORT%20PS%20 ED%20VOL.%20%2014.pdf

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Santos, A., Polydoro, S., Scortegagna, S., & Linden, M. (2013). Integration to Higher Education and Academic Satisfaction in University Students. Psychology: science and profession, 33 (4), 781-793. Disponível em: http://www.scielo.br/scielo.php?script=sci_arttext&pi d=S1414-98932013000400002 Soares, A., & Almeida, L. (2011). Academic Satisfaction Questionnaire. In C. Machado, M. Gonçalves, L. Almeida, & M. Simões (Eds.), Instruments and Contexts of Psychological Evaluation (pp.103-124). Coimbra: Almedina.

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Artigo de Investigação

Disponível em http://dx.doi.org/10.19131/rpesm.0217

12 PREDITORES DO MOBBING NOS ENFERMEIROS EM CONTEXTO HOSPITALAR1

| Andrea Silva Santos Pinto2; António João Santos Nunes3 |

RESUMO CONTEXTO: O mobbing é um fenómeno mundial caraterístico de ambientes de trabalho inseguros, competitivos e individualistas. Constitui um grave problema psicossocial na gestão das organizações de saúde. OBJETIVOS: Avaliar a existência de condutas de mobbing nos enfermeiros e identificar as variáveis preditoras do mobbing nos enfermeiros num Hospital da Cova da Beira, em Portugal. METODOLOGIA: Estudo quantitativo, descritivo, correlacional e transversal. A amostra não probabilística acidental de 218 enfermeiros. Utilizou-se uma Escala de Avaliação de Condutas de Mobbing (EACM). RESULTADOS: Verificou-se que 92,2% dos enfermeiros inquiridos experimentaram pelo menos uma conduta de mobbing, sendo que em média os enfermeiros sofrem 12 condutas de mobbing, com um efeito quase nulo e uma intensidade fraca. CONCLUSÕES: As variáveis preditoras do mobbing são a satisfação profissional e os superiores valorizam o desempenho. Pode-se afirmar que quanto maior a satisfação profissional e quanto mais os superiores valorizam o desempenho menor a presença de mobbing no local de trabalho. PALAVRAS-CHAVE: Assédio, não sexual; Enfermeiros; Prevenção primária

RESUMEN

ABSTRACT

“Predicción del mobbing en los enfermeiros en contexto hospitalario1”

“Mobbing predictors in nurses in hospital context1”

CONTEXTO: El mobbing es un fenómeno mundial característico de ambientes de trabajos inseguros, competitivos e individualistas. Es un grave problema psicosocial en la gestión de las organizaciones de salud. OBJETIVOS: Evaluar la existencia de conductas de mobbing en los enfermeros e identificar las variables predictoras del mobbing en los enfermeros en el Hospital de Cova da Beira, en Portugal. METODOLOGÍA: Estudio cuantitativo, descriptivo, correlacional y transversal. La muestra es no probabilística accidental de 218 enfermeros. Se utilizó una escala de evaluación de conductos de Mobbing (EACM). RESULTADOS: Se verificó que el 92,2% de los enfermeros encuestados experimentaron al menos una conducta de mobbing, siendo que en promedio los enfermeros sufren 12 conductas de mobbing, con un efecto casi nulo y una intensidad débil. CONCLUSIONES: Las variables predictoras del mobbing son la satisfacción profesional y los superiores valoran el rendimiento. Se puede afirmar que cuanto mayor sea la satisfacción profesional y cuanto más los superiores valoran el desempeño menor la presencia de mobbing en el lugar de trabajo.

DESCRIPTORES: Acoso, non sexual; Enfermeros; Prevención primaria

BACKGROUND: Mobbing is a worldwide phenomenon, characteristic of insecure, competitive and individualistic work environments. It is a serious psychosocial problem in the management of healthcare organizations. AIM: Evaluate the existence of mobbing behaviors on nurses and identify the variables which allow us to predict mobbing on nurses in the Cova da Beira hospital, in Portugal. METHODS: A quantitative research, descriptive, correlational and cross-section in nature. The sample was not probabilistic and accidental, consisting of 218 nurses. A questionnaire was used containing the Mobbing Ducts Rating Scale (EACM), validated for the Portuguese population. RESULTS: It was found that 92.2% of nurses surveyed experienced at least one mobbing behavior, and on average nurses suffer 12 mobbing behaviors, with almost no effect and a low intensity. CONCLUSIONS: The predictor variables of mobbing are professional satisfaction and performance valuation by superiors. We can say that the higher job satisfaction and the more superiors value performance, the lower the presence of mobbing in the workplace.

KEYWORDS: Harassment, non-sexual; Nurses; Primary prevention Submetido em 30-12-2017 Aceite em 27-03-2018

1 Extraído de Dissertação de Mestrado Mobbing em Ambiente Hospitalar, 2015, Universidade da Beira Interior. 2 Mestre em Gestão de Unidades de Saúde; Título Profissional; Enfermeira no Centro Hospitalar Cova da Beira, Serviço de Especialidades Médicas, andreass.enf@gmail.com 3 Doutor em Gestão; Professor Auxiliar na Universidade da Beira Interior, Departamento de Gestão e Economia, Centro de Investigação NECE-UBI, Covilhã, anunes@ubi.pt Citação: Pinto, A. S. S., & Nunes, A. J. S. (2018). Preditores do mobbing nos enfermeiros em contexto hospitalar. Revista Portuguesa de Enfermagem de Saúde Mental (Spe. 6), 77-84. doi: 10.19131/rpesm.0217 Revista Portuguesa de Enfermagem de Saúde Mental, ESPECIAL 6 (OUT.,2018) | 77


INTRODUÇÃO Vivemos numa época em que as condições de trabalho são marcadas pela insegurança e pela ambição desmedida de progressão na carreira. Estes fatores geram condutas antiéticas, condutas de assédio moral/psicológico ou mobbing para com os outros, com o objetivo de destrui-los, visto estes constituírem potenciais ameaças à concretização dos objetivos (Tekin & Bulut, 2014; João, 2013). O mobbing é um fenómeno antigo, porém a sua discussão mundial é recente. Em Portugal, o mobbing é caraterizado por uma ou várias condutas humilhantes, degradantes e hostis, efetuadas intencionalmente por um ou mais trabalhadores contra outro que possa ser percebido como potencial ameaça. Estas condutas de agressão são efetuadas de forma repetida e sistemática, causando lentamente a destruição da vítima, afetando a sua saúde física e mental (João, 2013). O mobbing é um fenómeno cuja incidência tem tendência a aumentar progressivamente e cerca de 8,1% da população ativa na Europa é vítima de mobbing (Luongo, Freitas & Fernandes, 2011). Em Portugal existem poucos estudos sobre este fenómeno, o que torna necessário a abordagem deste fenómeno psicossocial. Por representar um fenómeno multicausal, não é possível individualizar uma causa, como única, no processo de mobbing. Vários investigadores têm procurado identificar as variáveis determinantes para a ocorrência do mobbing, como as caraterísticas sociais e organizacionais, caraterísticas demográficas, caraterísticas pessoais da vítima, do agressor e dos espetadores. Segundo João (João, 2013) as caraterísticas do mobbing dependem de cada situação, tendo em conta o tipo de trabalho, as normas da organização, os intervenientes e a cultura organizacional. Segundo Amazarrary (2010) a satisfação com a chefia, com os colegas, comprometimento organizacional afetivo e a satisfação com a natureza do trabalho, são variáveis preditoras de mobbing. A satisfação tem relação inversa com o mobbing, ao seja quanto mais insatisfeitos estiverem os sujeitos, maior o mobbing. Também os estudos de López-Cabarcos, Vázquez-Rodríguez & Montes-Piñeiro (2010) corroboram com os anteriores, pois segundo estes o número de comportamentos mobbing está relacionado de forma negativa com a satisfação no trabalho.

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Desta forma, a perceção do ambiente de trabalho, a satisfação com a profissão e a valorização do desempenho pelos superiores quando percecionados negativamente indiciam comportamentos favoráveis à prática de condutas hostis e desprovidas de ética (Carvalho, 2010). Este fenómeno, tem consequências a curto e a longo prazo, que podem ser devastadoras a nível individual (pode causar problemas de saúde físicos e psíquicos na vítima), organizacional, social e financeiro (Tuckey & Neall, 2014). Embora existam várias profissões de risco, mas os enfermeiros representam uma profissão de risco acrescido, pelas caraterísticas peculiares da profissão como o stress relacionado com: o trabalho por longos períodos, a excessiva carga de trabalho, períodos de descanso inadequados entre outros (Luongo et al., 2011; Tekin & Bulut, 2014). Este estudo tem como objetivos: i) avaliar a existência de condutas de mobbing nos enfermeiros num Hospital da Cova da beira, em Portugal; ii) identificar as variáveis que podem ser preditoras do mobbing nos enfermeiros num hospital da Cova da Beira, em Portugal. Hipóteses As variáveis satisfação profissional e valorização do desempenho são preditoras da presença de mobbing nos enfermeiros. METODOLOGIA De acordo com os objetivos definidos, optou-se por um estudo metodológico com as seguintes caraterísticas: investigação não experimental (Freixo, 2009). A análise é quantitativa (Prodanov & Freitas, 2013). É um estudo descritivo (Gil, 2009; Prodanov & Freitas, 2013); analítico e correlacional, pois descreve as caraterísticas de determinada população ou fenómeno e estabelece relações entre as variáveis em estudo (Gil, 2009). De acordo com o período e sequência, é um estudo do tipo retrospetivo e transversal, uma vez que a recolha de dados irá estabelecer um corte com o passado e o futuro (Freixo, 2009). A população alvo do estudo foi constituída por 395 enfermeiros num hospital da Cova da Beira. A técnica de amostragem foi não probabilística, acidental. De todos os participantes recolheram-se 218 questionários totalmente preenchidos, constituindo este o número final da amostra.


Os dados foram recolhidos através da aplicação de um questionário com a EACM (João, 2012), validada para a população portuguesa por João (2012). O questionário é constituído por uma parte que caracteriza a amostra e, outra parte, que caracteriza o mobbing nos enfermeiros, através da Escala de Avaliação de Condutas de Mobbing (EACM). A EACM é constituída por 55 itens, agrupados em seis dimensões, compostos de enunciados, cada um acompanhado de uma escala tipo likert com scores de 0 a 6, onde 1 significa nunca e 6 todos os dias. As respostas obtidas, ao serem agrupadas permitem a obtenção de informações que permitem caraterizar o mobbing, denominados índices globais de mobbing (João, 2012), sendo estes: o Número Total das Estratégias de Assédio Psicológico (NEAP), o Índice Global de Assédio Psicológico (IGAP) e o Índice Médio de Assédio Psicológico (IMAP). A recolha de dados ocorreu de 6 de setembro a 7 de novembro de 2014, mediante a aplicação de um pré-teste. Terminada a fase de recolha de dados, procedeu-se ao seu tratamento estatístico, através do programa Statistical Package for Social Sciences (SPSS), versão 22.0. O instrumento de recolha de dados, demonstrou uma consistência excelente (α=0,965; n=55 itens), tal como também foi obtido pela autora da escala João (2012). Os valores de alfa Cronbach obtidos (a variar entre 0,783 e 0,926) demonstram uma boa fiabilidade para cada uma das dimensões. Antes de se iniciar a investigação foram seguidos os procedimentos éticos/legais, solicitada e obtida autorização ao Conselho de Administração, Conselho de Ética do Hospital em estudo (CAAE 56/2014) e obtida autorização da autora da escala. RESULTADOS E DISCUSSÃO Em termos sociodemográficos 73% dos enfermeiros pertencem ao género feminino. A maioria dos inquiridos possui idades entre os 25 e 59 anos, sendo a média de idades 39 anos. A grande maioria é casado (66,1%) e tem filhos (73,9%). Os enfermeiros estão distribuídos por vinte e oito serviços, maioritariamente exercem as suas funções nos serviços de: Bloco Operatório (8,7%) e Urgência Geral (7,3%). 54,6% pertencem aos quadros da função pública e 80,3% trabalham em regime de turnos, são assíduos (98,1%), maioritariamente exercem a profissão de enfermagem entre 2-10 anos, sendo que 73,9% possui a licenciatura.

Em relação à valorização do desempenho pelos superiores, 57,3% afirmaram que os superiores valorizam o seu trabalho e 52,3% referem mesmo estar satisfeitos com a sua profissão. Enquanto que 82,1% dos enfermeiros mencionam que não existem circunstâncias não profissionais a afetar o seu desempenho. Em relação à temática do mobbing, a maioria (71,6%) refere que já ouviu falar sobre o tema, sendo que 92,2% dos respondentes experimentaram, pelo menos, uma conduta de mobbing. Em média os enfermeiros sofrem 12 condutas de mobbing no local de trabalho, com um efeito quase nulo (IGAP= 0,5) e uma intensidade fraca (IMAP=1,8). O facto de os enfermeiros viverem condutas de intensidade fraca, não quer dizer que a longo prazo as consequências sejam as mesmas, pois, no nível individual, a duração excessiva ou a magnitude das condutas de mobbing podem conduzir a patologias graves, ou agravar problemas já existentes (Gil-Monte, 2014). Estes resultados apresentam valores sensivelmente superiores aos evidenciados nos estudos de Carvalho (2010), João (2013) e Saraiva & Pinto (2011) em que cada enfermeiro experimenta em média 11 condutas de mobbing, com um efeito e uma intensidade reduzida. Dos métodos utilizados pelo agressor as condutas mais experimentadas pelos enfermeiros correspondem às dimensões Bloqueio à Comunicação e ao Progresso (BCP) (média=0,7), Difamação Pessoal (DP) (média=0,3) e Sobrecarga e Desprestígio Laboral (SDL) (média=0,3). Sendo na dimensão BCP as condutas mais frequentes, “algumas vezes por semana” ou “todos os dias”: “quando falo interrompem o meu discurso“ (11,9%), “os meus superiores não me deixam falar ou expressar” (3,7%) e “controlam excessivamente o meu horário” (2,8%). Na dimensão DP as condutas sofridas com maior frequência, “algumas vezes por semana” ou “todos os dias”, foram: “fazem circular rumores ou boatos falsos sobre a minha vida privada”, “criticam a minha vida privada” e “gozam e/ou criticam as minhas convicções políticas e/ou religiosas”, apresentando igual percentagem de 0,5%. Em relação à dimensão SDL as condutas mais sofridas “algumas vezes por semana” ou “todos os dias”, foram: “atribuem-me mais trabalho do que aquele que posso efetivamente realizar” e “sou forçado(a) a realizar tarefas que vão contra os meus princípios éticos”, todas com iguais valores percentuais (1,4%).

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Todas as expressões de vivência de condutas de mobbing supracitadas demonstram estratégias utilizadas pelo agressor com o objetivo de desconsiderar e destabilizar a vítima a ponto de comprometer a comunicação, limitando ou negando o direito a fazer-se ouvir, assim como, desacreditar ou desprestigiar a vítima no seu local de trabalho (João, 2012). A vítima é desvalorizada através de críticas e/ou falsos rumores sobre a sua vida pessoal, da atribuição de tarefas abusivas ou difíceis de realizar, que agem contra os seus princípios éticos. As condutas de BCP, DP e SDL representam agressões dissimuladas e não deixam provas físicas, reforçando a ideia de que o mobbing se carateriza por um conjunto de condutas de caráter psicológico. O mobbing representa uma realidade presente nos profissionais de enfermagem, pois 5 em cada 100 enfermeiros inquiridos têm consciência que são vítimas de mobbing no seu local de trabalho. Contudo, mais de metade da amostra refere sofrer pelo menos uma conduta de agressão, não se assumindo como vítima. Dos enfermeiros que têm consciência de ser vítimas de mobbing, a maioria (2,3%) sofre de mobbing desde há 6 meses e todas as vítimas tiveram necessidade de denunciar/compartilhar a situação recorrendo a apoio de familiares e colegas (1,4%). O mobbing vivido pelos enfermeiros é principalmente do tipo descendente, pois a maior parte dos agressores é o “enfermeiro chefe ou superior hierárquico” (1,8%). As consequências na saúde física e psíquica da vítima têm um potencial efeito devastador, destacando-se os problemas “psíquicos, comportamentais, cardíacos e respiratórios”. Estes resultados também são apoiados por outras investigações (Gil-Monte, 2014; Luongo et al., 2011; Tekin & Bulut, 2014). No que concerne às medidas preventivas descritas pelos enfermeiros para prevenção do mobbing foram mencionadas várias estratégias, as quais foram agrupadas, em medidas direcionadas para a organização (65), para o indivíduo (41) e para a sociedade (3). Relativamente às medidas direcionadas para a organização foi sugerido com maior frequência: uma “comunicação eficaz” (15), “formação sobre a temática” e “chefias com capacidade de liderança, valores de justiça e imparcialidade” (com igual frequência 9), “gestão de conflitos e trabalho em equipa” (com igual frequência 5). No que diz respeito às medidas direcionadas para o indivíduo, foi sugerido: “respeitar e saber ouvir” (18), “denunciar a autoridades competentes” (12), “bom relacionamento do indivíduo com a equipa multidisciplinar” (11). Revista Portuguesa de Enfermagem de Saúde Mental, ESPECIAL 6 (OUT.,2018) | 80

Nas medidas direcionadas para a sociedade os enfermeiros sugeriram a “realização de campanhas de sensibilização da sociedade em geral” (3). Recorreu-se à estatística inferencial, verificando-se as relações formuladas na hipótese de investigação, aceitando-se ou rejeitando-se a hipótese. Numa primeira fase analisaram-se as correlações existentes, através da Correlação de Pearson, entre as variáveis independentes (sociodemográficas, socioprofissionais e pessoais) e a variável dependente mobbing, nos três índices globais. Verificou-se a existência de correlações positivas e negativas. O objetivo foi verificar se existem outras variáveis estatisticamente significativas para além das variáveis que entram na hipótese. As únicas variáveis estatisticamente bastante significativas, nos três índices IGAP, NEAP e IMAP são a satisfação profissional e superiores valorizam o desempenho. Constatou-se que as variáveis satisfação profissional (IGAP, NEAP e IMAP; r=-0,241, r=-0,257, r=-0,221) e a valorização do desempenho (IGAP, NEAP e IMAP; r=-0,301, r=-0,350, r=-0,263), estão negativamente correlacionadas com o mobbing nos três índices globais (IGAP, NEAP e IMAP; P=0,000, P=0,000, P=0,001 e IGAP, NEAP e IMAP; P=0,000, P=0,000, P=0,000). Assim, as variáveis a incluir nos modelos de regressão para o IGAP (Tabela 1), NEAP (Tabela 2) e IMAP (Tabela 3) foram: satisfação profissional e superiores valorizam o desempenho. Efetuou-se a análise de regressões lineares múltiplas para testar o valor preditivo das variáveis independentes (satisfação profissional e superiores valorizam o desempenho) em relação à variável dependente (mobbing). O método de estimação foi o “enter”, o qual obriga à inclusão de todas as variáveis independentes no modelo de regressão, quer sejam ou não significativas (Pestana & Gajeiro, 2008). Conforme se pode visualizar na Tabela 1 o modelo de regressão ajustado é altamente significativo (F=13,173; p=0,000). De acordo com as estimativas dos parâmetros de regressão é possível constatar que as variáveis satisfação profissional (β=-0,248; p=0,001) e superiores valorizam o desempenho (β=-0,148; p=0,036), são variáveis preditoras da intensidade global do mobbing.


Tabela 1 -Regressão linear múltipla entre as variáveis independentes e o IGAP

Tabela 2 -Regressão linear múltipla entre as variáveis independentes e o NEAP (formatar título e centrar tabela)

Variável dependente: IGAP

Variável dependente: NEAP

R=0,330

R=0,375

R2=0,109

R2=0,141

R2 ajustado=0,101

R2 ajustado=0,133

Erro padrão de estimativa=0,477

Erro padrão de estimativa=9,037

Pesos de Regressão Variáveis Independentes

Coeficiente β

(Constante)

0,587

Superiores Valorizam o Desempenho

-0,248

Satisfação Profissional

-0,148

Coeficiente Padronizado

Pesos de Regressão t

p

Variáveis Independentes

Coeficiente β

10,921

0,000***

(Constante)

16,292

-0,245

-3,510

0,001***

Superiores Valorizam o Desempenho

-5,779

-0,295

-4,314 0,000***

-0,147

-2,115

0,036*

Satisfação Profissional

-2,792

-0,144

-2,105 0,036*

Análise de Variância

Coeficiente Padronizado

t

p

15,993 0,000***

Análise de Variância

Efeito

Soma GL Quadrados

Média F Quadrados

p

Efeito

Soma Quadrados

GL

Média F Quadrados

Regressão

5,992

2

2,996

0,000***

Regressão

2870,935

2

1435,467 17,576 0,000***

Resíduos

48,898

215 0,227

Resíduos

17559,492 215

Total

54,890

217

Total

20430,427 217

13,173

p

81,672

***p<0,001 - diferença estatística altamente significativa

*p<0,05 estatisticamente significativo;*** p<.001diferença estatística altamente significativa

Como se pode analisar no Tabela 2 o modelo de regressão ajustado para o NEAP é altamente significativo (F=17,576; p=0,000). Em conformidade com as estimativas dos parâmetros de regressão é possível constatar que as variáveis superiores valorizam o desempenho (β=-5,779; p=0,000) e satisfação profissional (β=-2,792; p=0,036), são estatisticamente significativas, logo constituem-se como variáveis preditoras do número de condutas do mobbing. Verifica-se que quanto mais os indivíduos estiverem profissionalmente satisfeitos e quanto mais os superiores valorizam o desempenho menor é o número de condutas do mobbing.

Na Tabela 3 encontra-se o modelo de regressão ajustado para o IMAP, sendo altamente significativo (F=9,556; p=0,000), apesar de apresentar uma qualidade fraca (r2=0,086). De acordo com as estimativas dos parâmetros de regressão é possível constatar-se que as variáveis superiores valorizam o desempenho (β=-0,257; p=0,004) e satisfação profissional (β=0,173; p=0,052) são variáveis preditoras da intensidade média do mobbing. Deste modo, quanto mais os indivíduos estiverem profissionalmente satisfeitos e quanto mais os superiores valorizam o desempenho, menor é a intensidade média do mobbing.

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Tabela 3 -Regressão linear múltipla entre as variáveis independentes e o IMAP Formatar título e centrar tabela) Variável dependente: IMAP R=0,294 R2=0,086 R2 ajustado=0,077 Erro padrão de estimativa=0,58745 Pesos de Regressão Variáveis Independentes

Coeficiente β

(Constante)

1,793

Superiores Valorizam o Desempenho

-0,257

Satisfação Profissional

-0,173

Coeficiente Padronizado

t

p

26,765

0,000***

-0,209

-2,881

0,004**

-0,142

-1,955

0,052*

Análise de Variância Efeito

Soma GL Quadrados

Média F Quadrados

p

Regressão

6,596

2

3,298

0,000***

Resíduos

69,710

202

0,345

Total

76,306

204

9,556

*p<0,05 estatisticamente significativo;**p<0,01 diferença estatística bastante significativa; ***p<0,001 diferença estatística altamente significativa

Assim, após análise dos três modelos de regressão, aceita-se a hipótese formulada para as variáveis em estudo. Pode dizer-se que as variáveis independentes preditoras de mobbing nomeadamentea satisfação profissional e a valorização do desempenho pelos superiores hierárquicos, apresentam uma relação inversa com o mobbing. Verifica-se que, quanto maior a satisfação profissional e quanto mais os superiores valorizam o desempenho, menor será a presença de mobbing. Estes resultados estão em consonância com os estudos de López-Cabarcos et al. (2010), pois a satisfação profissional é uma variável preditora do mobbing. A satisfação assume uma relação inversa com o mobbing, ou seja, quanto mais insatisfeitos estiverem os sujeitos, maior será o mobbing. Também o estudo de Carvalho (2010) é semelhante, pois a perceção do ambiente de trabalho, a satisfação com a profissão e a valorização pelos superiores, quando percecionados negativamente, indiciam comportamentos favoráveis à prática de condutas de mobbing.

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IMPLICAÇÕES PARA A PRÁTICA CLÍNICA Uma vez que os sintomas do mobbing evoluem a nível clínico, é importante o diagnóstico precoce, para uma prevenção e intervenção atempada. Segundo a Comissão para a Igualdade no Trabalho e no Emprego - CITE (2013) a avaliação pode ser feita através dos serviços de Higiene e Segurança no Trabalho internos ou externos. Estes serviços devem ter consultas de avaliação de riscos psicossociais, e uma equipa multidisciplinar com enfermeiro, médico e psicólogo. É papel destes profissionais trabalhar articuladamente de forma a prevenir, diagnosticar e minimizar os efeitos do mobbing no trabalhador. Também podem existir serviços de psicologia internos (Gil-Monte, 2014). Podendo em casos extremos ser necessário um acompanhamento por parte de um psiquiatra. Os estudos realizados por Moroni & Dabos (2014) mencionam que as organizações podem influenciar positivamente o ambiente laboral vivenciado pelos trabalhadores por melhorar a comunicação interna, fomentar uma cultura de transparência e prestação de contas, selecionando e treinando líderes capazes de fazerem uma gestão correta de emoções e de conflitos. Neste contexto, o psicólogo pode intervir através de formação e capacitação destes agentes, através do desenvolvimento de programas de coaching (Saam, 2010). CONCLUSÃO O mobbing envolve condutas destruidoras, agressivas, violentas, manipuladoras e de perseguição por parte do agressor. Estas ocorrem de maneira intencional e frequente no trabalho por um ou mais agressores, com o objetivo de destruírem e excluírem socialmente a vítima. A caraterização da amostra refere que 92,2% já experimentaram pelo menos uma conduta de mobbing. Verificando-se que em média os enfermeiros sofrem 12 condutas de mobbing no local de trabalho, com um efeito quase nulo e uma intensidade fraca. Dos métodos utilizados pelo agressor as condutas mais experimentadas pelos enfermeiros correspondem às dimensões BCP (média=0,7), DP (média=0,3) e SDL (média=0,3). Através do teste da hipótese concluiu-se que o mobbing está relacionado com a satisfação profissional e com o facto dos superiores valorizarem o desempenho dos enfermeiros.


Os resultados demonstram que a satisfação profissional e os superiores valorizam o desempenho relacionamse inversamente com a presença de mobbing, ou seja, quanto maior a satisfação profissional e quanto mais os superiores hierárquicos valorizarem o desempenho profissional dos trabalhadores menor será a presença de mobbing. Por tudo o referido, torna-se prioritário a organização investir na prevenção do mobbing, sendo que os enfermeiros inquiridos propõem algumas medidas para prevenção do mobbing aos níveis: organizacional, pessoal e social. A defesa da dignidade humana exige a erradicação de toda e qualquer prática de mobbing nos locais de trabalho, as organizações, começando pelas chefias devem sinalizar a sua forma de atuação através da punição dos agressores e do apoio aos verdadeiramente agredidos. Cada sociedade deve enquadrar inequivocamente no seu normativo jurídico a punição do agressor, só dessa forma se podem garantir os direitos de plena cidadania aos trabalhadores que possuem no seu trabalho uma forma de satisfação profissional e de realização pessoal. Como limitações deste estudo realça-se a utilização do método de amostragem não probabilístico, apesar de ser fácil e rápido, os resultados apenas dizem respeito à amostra utilizada, não podendo ser extrapolados com confiança para a restante população. REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS Amazarray, R. M. (2010). Violência psicológica e assédio moral no trabalho enquanto expressões de estratégias de gestão. (Tese de Doutoramento não publicada). Universidade Federal do Rio Grande do Sul, Brasil. Carvalho, G. (2010). Mobbing: assédio moral em contexto de enfermagem. Revista de Enfermagem Referência, 21, 28-42. Disponível em: https://bibliotecadigital.ipb.pt/bitstream/10198/5327/1/Mobbing%20 Ass%C3%A9dio%20Moral%202010.PDF Comissão para a Igualdade no Trabalho e no Emprego. (2013). Prevenção e combate de situações de assédio no local de trabalho: um instrumento de apoio à autorregulação. Disponível em: http://cite.gov.pt/pt/destaques/noticia225.html

Freixo, M. (2009). Metodologia científica - fundamentos, métodos e técnicas. Lisboa: Instituto Piaget, Epistemologia e Sociedade. Gil, A. C. (2009). Métodos e técnicas de pesquisa social. 5.ª Ed. São Paulo: Editora Atlas. Gil-Monte, P. R. (2014). Assédio moral no trabalho. In: S. P. Gonçalves (Eds.), Psicossociologia do trabalho e das organizações, princípios e práticas. Lisboa: Ed. Pactor. João, A. L. (2012). Relatório de mestrado em sociopsicologia da saúde. (Relatório de Mestrado não publicado). Instituto Miguel Torga, Portugal. João, A. L. (2013). Mobbing/agressão psicológica na profissão de enfermagem. Loures: Lusociência. López-Cabarcos, M. A.; Vázquez-Rodríguez, P. M. & Montes-Piñeiro C. (2010). Bullying at work: Psychological antecedents and consequences on job satisfaction. Revista Latinoamericana de Psicologia, 42 (2), 214-224. Disponível em: http://www. scielo.org.co/scielo.php?script=sci_arttext&pid =S0120-05342010000200005 Luongo, J.; Freitas, G. F. & Fernandes, M. F. P. (2011). Caraterização do assédio moral nas relações de trabalho: uma revisão da literatura. Cultura de los Cuidados, 15 (30), 71-78. Disponível em: https://rua.ua.es/ dspace/bitstream/10045/18698/1/cultura_cuidados_30_10.pdf Moroni, L. & Dabos, G. E. (2014). Comportamientos abusivos de baja intensidad en las organizaciones: una revisión de la literatura y de sus implicâncias. Estudios Gerenciales, 30, 384–396. Disponível em: https://www.sciencedirect.com/science/article/pii/ S012359231400134X Pestana, M. H. & Gajeiro, J. N. (2008). Análise de dados para as ciências sociais, a complementaridade do SPSS. 5.ª Ed. Lisboa: Edições Silabo. Prodanov, C. C. & Freitas, E. C. (2013). Metodologia do trabalho científico, métodos e técnicas da pesquisa e do trabalho académico. 2.ª Ed. Rio Grande Sul: Feevale. Revista Portuguesa de Enfermagem de Saúde Mental, ESPECIAL 6 (OUT.,2018) | 83


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Tekin, Y. E & Bulut, H. (2014). Verbal, physical and sexual abuse status against operating room nurses in Turkey. Sexuality Disability, 32 (1), 85-97. Disponível em: https://link.springer.com/article/10.1007/s11195014-9339-7

Saraiva, D. M. R. F. & Pinto, A. S. S. (2011). Mobbing em contexto de enfermagem. Revista de Enfermagem Referência, 3(5), 83-93. Disponível em: http:// www.scielo.mec.pt/scielo.php?script=sci_arttext&pid =S0874-02832011000300009

Tuckey, M. R. & Neall, A. M. (2014). A methodological review of research on the antecedents and consequences of workplace harassment. Journal of Occupational and Organizational Psychology, 87 (2), 225–257. Disponível em: https://onlinelibrary.wiley.com/doi/ abs/10.1111/joop.12059

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Artigo de Investigação

Disponível em http://dx.doi.org/10.19131/rpesm.0218

13 EXPLORAÇÃO

DA AUTOCOMPAIXÃO NO CONTEXTO DE PROGRAMA DE MINDFULNESS-BASED COGNITIVE THERAPY

UM

| Carla Serrão1; Sílvia Alves2 |

RESUMO CONTEXTO: Os profissionais de saúde e da área social estão diariamente expostos a situações de sofrimento que podem gerar stresse e burnout e afetar a tarefa de cuidar. Desenvolvidos sobretudo em populações clínicas, os programas de intervenção baseados em Mindfulness – especificamente o Mindfulness-Based Cognitive Therapy (MBCT) – têm demonstrado resultados promissores na redução da depressão, do stresse e da ansiedade. OBJETIVO(S): Avaliar o efeito do MBCT, desenvolvido junto de profissionais de saúde e da área social, nos níveis de Mindfulness, autocompaixão, stresse, ansiedade e depressão e explorar a relação entre a autocompaixão e as restantes variáveis em estudo. METODOLOGIA: 26 profissionais/futuros profissionais de saúde e da área social que participaram no programa MBCT completaram a avaliação pré e pós-intervenção; Instrumentos: Escala de Autocompaixão, Questionário Cinco Facetas Mindfulness, Escala de Stresse Percebido, Inventário de Depressão de Beck e Inventário de Ansiedade de Beck. RESULTADOS: Os participantes aumentaram nos níveis de Mindfulness e de autocompaixão e reduziram nos sintomas de depressão e de ansiedade. Os resultados indicam ainda uma associação, entre moderada e forte, entre as diferentes componentes da autocompaixão e o Mindfulness e o stresse antes e após o programa. CONCLUSÕES: Os resultados positivos do programa de MBCT sugerem o seu potencial para desenvolver nos profissionais competências essenciais à intervenção terapêutica, designadamente uma maior compreensão e aceitação da pessoa e do seu sofrimento. PALAVRAS-CHAVE: Atenção plena; Meditação; Empatia

RESUMEN

ABSTRACT

“Exploración de la autocompasión en el contexto de un programa de mindfulness-based cognitive therapy”

“Exploration of self-compassion in the context of a mindfulness-based cognitive therapy”

CONTEXTO: Los profesionales de salud y del área social están diariamente expuestos a situaciones de sufrimiento que pueden generar estrés y burnout y afectar la tarea de cuidar. Desarrollados sobre todo en las poblaciones clínicas, los programas de intervención basados en Mindfulness, especialmente el Mindfulness-Based Cognitive Therapy (MBCT), han demostrado resultados prometedores en la reducción de la depresión, el estrés y la ansiedad. OBJETIVO(S): Evaluar el efecto del MBCT, desarrollado junto a profesionales de la salud y del área social, en los niveles de Mindfulness, autocompasión, estrés, ansiedad y depresión y explorar la relación entre la autocompasión y las restantes variables en estudio. MÉTODOLOGÍA: 26 profesionales/futuros profesionales de salud y del área social que participaron en el programa MBCT completaron la evaluación pre y post-intervención. Instrumentos: Self-compasión Scale, Cinco Facet Mindfulness Cuestionario, Perceived Stress Scale, Beck Depression Inventory, y Beck Anxiety Inventory. RESULTADOS: Participantes aumentaron en los niveles de Mindfulness y de autocompasión y redujeron en los síntomas de depresión y de ansiedad. Hay una asociación, entre moderado y fuerte, entre los componentes de la autocompasión y el Mindfulness y el estrés antes y después del programa. CONCLUSIONES: Los resultados positivos obtenidos con el MBCT sugieren su potencial para desarrollar en los profesionales competencias esenciales para la intervención terapéutica, en particular una mayor comprensión y aceptación de la persona y de su sufrimiento.

KEYWORDS: Mindfulness; Meditation; Empathy

DESCRIPTORES: Atención plena; Meditación; Empatía

BACKGROUND: Health and social workers are daily exposed to suffering situations that can generate stress and burnout and affect the task of caring. Developed primarily in clinical settings, Mindfulness-Based intervention programs - specifically Mindfulness-Based Cognitive Therapy (MBCT) have shown promising results in reducing depression, stress, and anxiety. AIM: To evaluate the effect of MBCT on health and social professionals in the Mindfulness, self-compassion, stress, anxiety and depression levels, and explore the relationship between self-compassion and the remaining variables under study. METHODOLOGY: 26 professionals/future health and social workers who participated in the MBCT program completed the pre and post-intervention evaluation; Instruments: Self-compassion Scale, Five Facet Mindfulness Questionnaire, Perceived Stress Scale, Beck Depression Inventory, and Beck Anxiety Inventory. RESULTS: Participants increased levels of Mindfulness and self-compassion and reduced symptoms of depression and anxiety. Results also indicate an association, between moderate and strong, between the components of self-compassion and Mindfulness and stress before and after the program. CONCLUSIONS: The positive effects of the MBCT program suggest its potential to foster in professionals the development of essential skills for therapeutic intervention, namely a greater understanding and acceptance of the person and the suffering experience.

Submetido em 30-12-2017 Aceite em 02-04-2018

1 Doutora; Professora Adjunta no Instituto Politécnico do Porto, Escola Superior de Educação, Unidade Técnico-Científica de Psicologia, Porto, carlaserrao@ese.ipp.pt 2 Doutora; Assistente de Investigação no Instituto Politécnico do Porto, Escola Superior de Educação, Centro de Inovação & Investigação em Educação - inED, Porto, Portugal, silviaalves@ese.ipp.pt Citação: Serrão, C., & Alves, S. (2018). Exploração da autocompaixão no contexto de um programa de mindfulness-based cognitive therapy. Revista Portuguesa de Enfermagem de Saúde Mental (Spe. 6), 85-91. doi: 10.19131/rpesm.0218 Revista Portuguesa de Enfermagem de Saúde Mental, ESPECIAL 6 (OUT.,2018) | 85


INTRODUÇÃO O conceito de mindfulness tem sido descrito como a qualidade da consciência para prestar atenção, de forma intencional e com uma atitude de não julgamento, às experiências (pensamentos, sensações e emoções) do momento presente (Kabat-Zinn, 2003). Muitas vezes traduzido para português como “atenção plena”, o mindfulness inclui uma “qualidade afetuosa e compassiva no ato de estar presente e atento, um sentido de abertura, presença amigável e interesse” (Kabat-Zinn, 2003, p. 145). Embora a sua origem remonte a mais de 2000 anos, foi durante a década de 90 do século passado que o mindfulness ganhou atenção enquanto instrumento de intervenção terapêutica para tratar problemas psicológicos comuns como o stresse, a ansiedade e a depressão (Keng, Smoski, & Robins, 2011). Neste contexto, Teasdale, Segal e Williams (1995) desenvolveram o Mindfulness-Based Cognitive Therapy (MBCT) com o objetivo, inicial, de intervir em pacientes com depressão major. O MBCT habilitava os pacientes a tornarem-se mais conscientes dos seus padrões automáticos de pensamentos, sentimentos e sensações corporais e através de práticas de mindfulness, os mesmos estariam em condições de reconhecer os pensamentos intrusivos e ruminativos associados a estes quadros clínicos (Teasdale et al., 1995). De facto, o MBCT promove o treino de atitudes de atenção plena, de não julgamento, de compaixão e de curiosidade (Segal, Williams, & Teasdale, 2002), possibilitando aos sujeitos a ampliação da capacidade de relação com os seus pensamentos e sentimentos como meros eventos mentais transitórios e não como elementos fixos e inalteráveis da mente. Os participantes aprendem a estar conscientes das reações cognitivas automáticas ao stresse ou humor negativo e a observar essas reações com curiosidade e gentileza (Raab, 2014; Segal et al., 2002). Este reconhecimento dos padrões da mente é possibilitado pela aceitação de tudo o que emerge na mente, agradável ou desagradável, sem a necessidade de fugir ou de lutar. Embora o MBCT tenha sido originalmente utilizado em populações clínicas, existem evidências do sucesso da sua aplicação junto de profissionais de saúde na redução de stresse e de burnout (Luberto et al., 2017; Shapiro, Brown, & Biegel, 2007; Sinclair, Kondejewski, Raffin-Bouchal, King-Shier, & Singh, 2017). Surpreendentemente, são poucos os estudos que analisam o efeito destes programas em variáveis positivas, como a autocompaixão. Revista Portuguesa de Enfermagem de Saúde Mental, ESPECIAL 6 (OUT.,2018) | 86

A autocompaixão é uma atitude que envolve sentimentos de bondade, de compreensão e de autoaceitação de si próprio, assim como o reconhecimento do seu próprio sofrimento/dor e a aceitação das falhas e erros enquanto parte da condição humana (Neff, 2003). Compreende três componentes interligadas: calor/ compreensão (ser amável e compreensivo em relação a si mesmo, em vez de se culpabilizar ou criticar); condição humana (reconhecer que as experiências dolorosas fazem parte da vida, em vez de se sentir isolado e desconectado de outras pessoas ou do mundo); mindfulness (tomar consciência e estar atento às emoções e pensamentos dolorosos, em vez de os evitar, suprimir ou reagir emocionalmente aos mesmos). A capacidade de mindfulness integra assim a autocompaixão, distinguindo-se do conceito geral de mindfulness (Neff & Germer, 2013), pelo foco no sofrimento e nas experiências negativas. Em contraste, o mindfulness enfatiza a atenção a todas as experiências (incluindo o alerta aos estímulos sensoriais e a consciência dos sentimentos e sofrimento), independentemente de serem positivas ou negativas. Este estudo teve como objetivo avaliar o efeito do MBCT, desenvolvido junto de profissionais de saúde e da área social, nos níveis de mindfulness, autocompaixão, stresse, ansiedade e depressão. Para além disso, pretendemos explorar a relação entre a autocompaixão e as restantes variáveis em estudo. METODOLOGIA Participantes Participaram no programa MBCT 41 estudantes portugueses do Curso de Pós-graduação Internacional em Terapias Cognitivo-comportamentais de Terceira Geração - Mindfulness. Contudo, apenas 26 estudantes completaram a avaliação pré (T1) e pós-intervenção (T2). A amostra incluiu psicólogos e futuros psicólogos (84.6%, n = 22), médicos (7.7%, n=2) e assistentes sociais (7.7%, n=22), com idades entre os 23 anos e 54 anos (M = 34.5; DP = 9.1). Vinte e cinco estudantes eram mulheres e a maioria era solteira (n = 18; 69.2%).


Programa Mindfulness-Based Cognitive Therapy (MBCT) Foi desenvolvido o programa MBCT de Segal et al. (2002), em regime de retiro e com a duração de 5 dias, 10 sessões de cerca de 2h30 cada, na Universidade de Bangor (País de Gales, Reino Unido) e teve como objetivo desenvolver nos estudantes a capacidade para analisar os padrões da mente, independentemente do seu conteúdo e carga emocional. Para o efeito foram utilizadas técnicas de body scan, meditação sentado, deitado e em movimento, hatha yoga. Instrumentos Escala de Autocompaixão [EAC] (Self-Compassion Scale, Neff, 2003; versão portuguesa de Castilho & Pinto-Gouveia, 2011), constituída por 26 itens pontuados numa escala tipo Likert (1=“nunca” a 5=“quase sempre”). Os itens distribuem-se por 6 subescalas: calor/compreensão (capacidade para ser amável e compreensível para consigo próprio); autocrítica (tendência para ser intolerante e autocrítico com as suas experiências difíceis ou erros); condição humana (entendimento das próprias experiências como parte de uma experiência humana maior); isolamento (sentimentos de desconexão e de separação em momentos desafiantes); mindfulness (consciência equilibrada e aceitação dos próprios sentimentos, sem uma excessiva sobre identificação com os mesmos); e sobre identificação (tendência para estar excessivamente imerso e consumido por sentimentos negativos). Obtiveramse os seguintes alphas de Cronbach: .93 para o calor/ compreensão, .79 para autocrítica, .85 para condição humana, .83 para isolamento, .71 para mindfulness e .78 para sobre identificação. No que se refere à escala global, obtivemos um alpha de Cronbach de .94. Questionário Cinco Facetas Mindfulness [QCFM] (Five Facet Mindfulness Questionnaire; Baer, Smith, Hopkins, Krietemeyer, & Toney, 2006; versão portuguesa Gregório & Gouveia, 2011), constituído por 39 itens organizados em cinco subescalas: observar (capacidade de observar experiências e reações internas); descrever (habilidade de colocar palavras em sentimentos); agir com consciência (capacidade de fazer ações conscientes e deliberadas); não julgar (aceitação do estado interior, ao invés de julgar pensamentos ou emoções como boas ou más); e não Reagir (processamento de estímulos emocionais sem reagir). A escala é de tipo Likert (entre 1= “nunca ou muito raramente verdadeiro”) e 5 pontos (“muito frequentemente ou sempre verdadeiro”).

Os valores da consistência interna foram os seguintes: Observar, α = .70; Descrever, α =.92; Agir com Consciência, α = .89; Não Julgar, α = .96; Não Reagir, α = .76; e um alpha da escala total de .85. Escala de Stresse Percebido [ESP] (Perceived Stress Scale; Cohen, Kamarch, & Mermelstein, 1983; versão portuguesa de Moreira, 2002), constituída por 10 itens, avaliados numa escala tipo Likert com 5 pontos (0=“nunca” a 4=”muito frequentemente”). O coeficiente alpha de Cronbach, evidenciou uma fiabilidade adequada de .90. Inventário de Ansiedade de Beck [IAB] (Beck Anxiety Inventory; Beck, Epstein, Brown, & Steer, 1988; versão portuguesa de Ponciano, Cardoso, & Pereira, 2005), constituída por 21 itens permite medir a intensidade da ansiedade auto reportada pelos indivíduos, consistindo em afirmações descritivas de sintomas de ansiedade classificados numa escala de 4 pontos (0=“nunca”; 1=“suavemente, mas não me incomodou”; 2=“moderadamente, por vezes foi desagradável”; 3=“severamente, aborreceu-me muito”). O valor alpha de Cronbach foi de .88. Inventário da Depressão de Beck [IDB] (Beck Depression Inventory; Beck,Ward, Mendelson, Mock, & Erbaugh, 1961; versão portuguesa de Vaz Serra & Pio Abreu, 1973), instrumento de autorresposta com 21 itens, que avalia a intensidade de sintomas depressivos numa escala de 0 (ausência de sintomatologia) a 3 pontos (sintomatologia severa). No presente estudo, o valor de alpha de Cronbach foi de .90. Foi ainda ministrado um questionário sociodemográfico (e.g., idade, profissão, género). Procedimento Aos participantes foram apresentados os objetivos do estudo, garantida a confidencialidade dos dados e pedido o seu consentimento informado. A primeira fase de recolha de dados (T1) ocorreu no dia anterior ao início do programa MBCT (26 de fevereiro) e a segunda fase de recolha (T2) foi realizada no final do programa MBCT (5 de março). Os dados recolhidos foram introduzidos e tratados estatisticamente com recurso ao SPSS. Utilizaram-se análises descritivas (média, desvio-padrão) para proceder à caracterização das variáveis em análise antes (T1) e após (T2) a intervenção MBCT. Recorremos ao teste não-paramétrico de Wilcoxon para avaliar os efeitos do programa MBCT e ao Coeficiente de Correlação de Spearman para analisar as correlações entre as variáveis em estudo. Revista Portuguesa de Enfermagem de Saúde Mental, ESPECIAL 6 (OUT.,2018) | 87


RESULTADOS A comparação das médias entre o momento pré (T1) e pós-intervenção (T2) MBCT encontra-se na Tabela 1 e evidencia uma redução da perceção de stresse, dos sintomas de depressão e de ansiedade e um aumento da autocompaixão e do mindfulness no momento T2. Com efeito, verificaram-se diferenças estatisticamente significativas entre T1 e T2, ao nível global da autocompaixão (Z = -1.969, p = .049), dos sintomas de ansiedade (Z = 2.042, p = .041), dos sintomas de depressão (Z = 3.350, p = .001) e do mindfulness (Z = -2.832, p = .005). Os valores de r indicaram efeitos modestos a moderados. Foram também analisadas as diferenças entre T1 e T2, ao nível dos diferentes constructos avaliados na EAC e no QCFM. Os resultados do teste de Wilcoxon evidenciaram diferenças estatisticamente significativas ao nível da capacidade de observar (Z = -3.612, p < .001), da capacidade de não reagir (Z = -2.106, p = .035), e da capacidade de descrever (Z = -2.178, p = .029). Relativamente às diferentes subescalas da EAC, foi apenas na subescala isolamento que se verificaram alterações próximas da significância estatística, com um efeito modesto. Tabela 1 - Comparação entre os momentos T1 e T2 MBCT Variáveis

T1

T2

N

M

DP

M

DP

Teste de Wilcoxon (Z)

Nível de Signif. (p)

Tamanho efeito (|r|)

26

21.72

4.13

22.76

4.33

-1.969

.049

0.273

Calor/compreensão

26

3.54

0.89

3.68

0.84

-1.184

.236

0.164

Condição humana

26

3.72

0.85

3.83

0.94

-0.735

.462

0.102

Mindfulness

26

3.77

0.66

3.91

0.66

-0.985

.324

0.137

Autocrítica

26

2.44

0.81

2.30

0.90

1.259

.208

0.175

Sobre identificação

26

2.54

0.74

2.33

0.70

1.501

.133

0.208

Isolamento

26

2.33

1.00

2.06

0.86

1.842

.065

0.255

26

17.84

2.16

19.06

1.96

-2.832

.005

0.393

Não julgar

26

3.99

0.90

4.20

0.74

-1.779

.075

0.247

Observar

26

3.26

0.46

3.74

0.54

-3.612

<.001

0.501

Agir c/consciência

26

3.33

0.71

3.47

0.65

-1.093

.274

0.152

Descrever

26

4.03

0.64

4.20

0.61

-2.178

.029

0.302

Não reagir

26

3.23

0.58

3.45

0.54

-2.106

.035

0.292

ESP

26

1.57

0.65

1.46

0.52

1.890

.059

0.262

IAB

26

10.73

8.69

8.38

7.33

2.042

.041

0.283

IDB

26

5.35

6.51

1.46

4.20

3.350

.001

0.465

EAC

QCFM

EAC = Escala de Autocompaixão; QCFM = Questionário Cinco Facetas Mindfulness; EPS = Escala de Perceção do Stresse; IAB = Inventário de Ansiedade de Beck; IDB = Inventário de Depressão de Beck

As correlações entre as variáveis em estudo nos momentos pré (T1) e pós (T2) MBCT encontram-se na Tabela 2. Os níveis iniciais de autocompaixão estão positivamente correlacionados com os níveis de mindfulness (QCFM) (rho = .819, p < .001) e negativamente correlacionados com os níveis de stresse (rho = -.764, p < .001) e sintomas de depressão (rho = -.636, p < .001). Após a participação no MBCT, verificamos que os níveis de autocompaixão estão significativa e positivamente corelacionados com o mindfulness (QCFM) (rho =.655, p < .001) e negativamente correlacionados com a perceção de stress (rho = -.644, p < .001) e com os sintomas de ansiedade (rho = -.411, p < .005). Estes resultados indicam que os indivíduos com maior autocompaixão tendem a exibir níveis mais elevados de mindfulness e níveis mais reduzidos de stresse. A par disto verificou-se que todas as componentes da autocompaixão apresentam uma correlação, moderada a forte, com o mindfulness em T1 e T2.

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Tabela 2 - Correlações entre as medidas de autocompaixão, mindfulness, stresse, ansiedade e depressão nos momentos T1 e T2 EAC

AuSobre tocrítica ident.

Isolamento

Condição Calor/com- Mindful- QCFM ESP humana preensão ness

IAB

IDB

T1 EAC Autocrítica

-.868***

Sobre identificação

-.783*** .836***

Isolamento

-.791*** .710***

.618**

Condição humana .698***

-.443*

Calor/compreensão

.888***

-.752*** -.646***

-.651*** .580**

Mindfulness

.831***

-.653*** -.560**

-.528**

QCFM

.819***

-.837*** -.680***

-.746*** .406*

.705***

.645***

ESP

-.764*** .779***

.656***

.462*

-.501*

-.685***

-.673***

-.622**

IAB

-.387

.292

.420*

-.359

.381

-.296

-.328

.448*

IDB

-.636*** .537**

.361

.509**

-.656***

-.612**

-.460*

-.432*

.635**

.274

-.316

-.381

.662***

.738***

.635***

T2 EAC Autocrítica

-.836***

Sobre identificação

-.699*** .654***

Isolamento

-.838*** .797***

.680***

Condição humana -.920*** -.652*** -.581**

-.679***

Calor/compreensão

.915***

-.658*** -.550**

-.762*** .878***

Mindfulness

.891***

-.632**

-.479*

-.652*** .843***

.845***

QCFM

.655***

-.588**

-.625**

-.421*

.612**

.604**

.559**

ESP

-.644*** .677***

.507**

.578**

-.635***

-.568***

-.461*

-.488*

IAB

-.411*

.392*

.303

.427*

-.341

-.474*

-.367

-.292

.631**

IDB

-.205

.106

.040

.134

-.223

-.359

-.135

-.242

.418*

.425*

*p < .05. **p < .01. ***p < .001.

DISCUSSÃO Este estudo revelou benefícios do treino MBCT. Os participantes aumentaram nos níveis de mindfulness e de autocompaixão e reduziram nos sintomas de depressão e de ansiedade. A ausência de efeitos nas subescalas da autocompaixão poderá explicar-se pelo facto dos participantes apresentarem, antes da frequência do MBCT, um elevado grau de autoaceitação face às suas falhas (calor/compreensão), reconhecendo que os sentimentos de dor e de falha constituem experiências universais (condição humana), assim como uma elevada consciência das suas experiências dolorosas (mindfulness). Os resultados obtidos corroboram estudos prévios que descrevem uma associação entre a autocompaixão e o mindfulness (Baer, Lykins, & Peters, 2012; Shapiro et al., 2007). Especificamente, os dados sugerem que o aumento de mindfulness ao longo do programa está relacionado com o aumento da autocompaixão, na pontuação global e em todas as subescalas, apoiando investigações onde foi reportado o papel essencial do mindfulness na efetivação das mudanças provocadas pelo MBCT, bem como o argumento de Neff (2003) de que o mindfulness é um pré-requisito da autocompaixão.

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O conceito de mindfulness foi neste estudo tratado como uma experiência abrangente que envolve a consciência do corpo, dos estímulos envolventes (i.e., som, luz,…), bem com dos pensamentos e emoções que ocorrem a cada momento. Neste sentido, os resultados obtidos sugerem que intervenções baseadas em mindfulness, enquanto conceito geral, afetam também a capacidade de mindfulness enquanto componente da autocompaixão que remete para a forma como os sujeitos experienciam e aceitam as suas experiências de sofrimento. A compaixão face às experiências internas é descrita como um aspeto essencial ao desenvolvimento de compaixão em relação a outras pessoas (Birnie, Speca, & Carlson, 2010; Neff, 2003; Raab, 2014). Os profissionais com níveis mais baixos de autocompaixão e mais elevados de autocrítica e sobre identificação, tendem a ser mais críticos na relação de ajuda com os sujeitos com quem intervém e a obter resultados menos positivos da sua intervenção (Rimes & Wingrove, 2011; Shapiro et al., 2007; Sinclair et al., 2017). CONCLUSÃO Face aos resultados deste estudo verificamos que a participação no programa de MBCT resultou em efeitos positivos no desenvolvimento das capacidades de mindfulness e de autocompaixão em profissionais/futuros profissionais de saúde e da área social. Estes profissionais, por estarem particularmente vulneráveis a desenvolverem estados de stresse e de burnout, fruto da constante exposição a situações de sofrimento e dificuldades emocionais, beneficiariam com a participação em programas de MBCT, especificamente com o desenvolvimento de competências essenciais inerentes à relação de ajuda. Este estudo de carácter essencialmente exploratório apresenta como limitações o número reduzido de participantes, o facto de não ter um grupo de controlo e de a intervenção ter sido implementada de forma intensiva em cinco dias. Investigações futuras deverão utilizar um método de recrutamento e distribuição aleatória de sujeitos pelos grupos experimental e de controlo. Para além disso, a reprodução deste estudo com amostras mais alargadas possibilitará um estudo mais aprofundado da influência das variáveis sociodemográficas na autocompaixão e no mindfulness.

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IMPLICAÇÕES PARA A PRÁTICA CLÍNICA Os efeitos positivos do programa MBCT obtidos neste estudo sugerem a sua relevância no desenvolvimento de uma maior compreensão e aceitação da pessoa e do seu sofrimento. Neste sentido, a implementação deste tipo de programas junto de profissionais de saúde e da área social poderá auxiliar no desenvolvimento de mecanismos de autorregulação emocional e de autocompaixão, imprescindíveis à intervenção terapêutica. REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS Baer, R. A., Lykins, E. L. B., & Peters, J. R. (2012). Mindfulness and self-compassion as predictors of psychological wellbeing in long-term meditators and matched nonmeditators. The Journal of Positive Psychology: Dedicated to furthering research and promoting good practice, 7 (3), 230-238. Doi: 10.1080/17439760.2012.674548. Baer, R. A., Smith, G. T., Hopkins, J., Krietemeyer, J., & Toney, L. (2006). Using self-report assessment methods to explore facets of mindfulness. Assessment, 13, 27–45. Doi: 10.1177/1073191105283504. Birnie, K., Speca, M., & Carlson, L. E. (2010). Exploring self-compassion and empathy in the context of mindfulness-based stress reduction (MBSR). Stress and Health, 26, 359-371. Doi: 10.1002/smi.1305. Castilho, P. & Pinto-Gouveia, J. (2006). Auto-Compaixão: Estudo da validação da versão portuguesa da escala da auto-compaixão e da sua relação com as experiências adversas na infância, a comparação social e a psicopatologia. Psychologica, 54, 203-230. Disponível em: http://impactum-journals.uc.pt/psychologica/article/view/1106 Gregório, S. & Pinto-Gouveia, J. (2011). Facetas de Mindfulness: Características psicométricas de um instrumento de avaliação. Psychologica, 54, 259-280. Disponível em: http://impactum-journals.uc.pt/psychologica/article/view/1108


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Revista Portuguesa de Enfermagem de Saúde Mental, ESPECIAL 6 (OUT.,2018) | 91


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Artigo de Investigação

Disponível em http://dx.doi.org/10.19131/rpesm.0219

14 EVOLUÇÃO TEMPORAL DO SUICÍDIO NA PENÍNSULA IBÉRICA: 1971-2013

| Celeste Antão1; Cristina Teixeira2; Filomena Sousa3; Maria Augusta Veiga Branco4; Eugénia Maria Anes5 |

RESUMO CONTEXTO: O suicídio é um problema de saúde pública, associado a muito sofrimento e milhares de mortes em todo mundo. OBJETIVO: Avaliar tendências da taxa de suicídio (TS) na Península Ibérica nas últimas quatro décadas. METODOLOGIA: Estudo descritivo de tendências. A TS anual foi obtida através da OCDE. Modelos de regressão segmentada estimaram a variação anual percentual (%VA) e respetivo intervalo de confiança a 95% (IC95%), estratificando por país e género. RESULTADOS: Em homens portugueses, a TS reduziu significativamente 1,3% ao ano (IC95%:-1,8;-0,7) para 1971-1993 e de 10,3% ao ano (IC95%:-16,0;-4,5) para 1993-1999 e, após tendência crescente (%VA=30,2;IC95%: -2,9;74,9) até 2002, reduziu significativamente (%VA=1,7:IC95%:-3,2;-0,2) atingindo 13,1/100.000 em 2013. Em homens espanhóis, houve aumento significativo de 14% ao ano (IC95%:0,5;29,3) para 1981-1984 e de 0,9% ao ano (IC95%:0,3;1,6) para 1984-1997, inverteu a tendência (%VA=-1,7;IC95%:-2,3;-1,2) entre 1997 e 2011, mostrando depois tendência crescente até 2013 quando atingiu 10,8/100.000. Nas mulheres portuguesas, houve aumento significativo de 2,8% ao ano (IC95%:1,1;4,5) até1984, reverteu a tendência (%VA=-5,7: IC95%:-7,0;-4,2) entre 1984 e 2000 e, após tendência crescente, houve decréscimo significativo (%VA=-3,5; IC95%:-5,9;-1,1) até 2013 quando atingiu 3,4/100.000. Em Espanha a TS em mulheres aumentou significativamente 7,7% ao ano (IC95%:5,5;9,8) para 1979-1987, reverteu até 1992 (%VA=-4,4; IC95%:-8,2;-0,4), após uma tendência crescente até 1996, diminuiu 2,1% ao ano (IC95%:-8,2; -0,4) para1996-2011, apresentando tendência crescente (%VA=13,2;IC95%:-0,29;28,5) para 2011-2013 quando atingiu 3,4/100.000. CONCLUSÃO: Em Portugal a TS observada nos últimos anos mostra uma tendência decrescente, este trabalho salienta a magnitude da problemática que não deve ser ignorada. PALAVRAS-CHAVE: Suicídio; Tendências; Taxas; Portugal; Espanha

RESUMEN

ABSTRACT

“Evolución temporal del suicidio en la Península Ibérica: 19712013”

“Suicide trends in Iberian Peninsula: 1971-2013”

CONTEXTO: El suicidio es un problema de salud pública, asociado a mucho sufrimiento y miles de muertes en todo el mundo. OBJECTIVO: Evaluar tendencias de la tasa de suicidio (TS) en la Península Ibérica en las últimas cuatro décadas. METODOLOGÍA: Estudio descriptivo de tendencias. La TS anual fue obtenida a través de la OCDE. Los modelos de regresión segmentada estimaron la variación anual porcentual (% VA) y su intervalo de confianza al 95% (IC95%), estratificando por país y género. RESULTADOS: En los hombres portugueses, TS reduce significativamente el 1,3% (IC del 95%: - 1,8; -0,7) para 1971-1993 y el 10,3% por año (95% intervalo de confianza: - 16,0, - (4,5) para 1993-1999 y, tras una tendencia creciente (% VA = 30,2, IC95%: - 2,9; 74,9) hasta 2002, se redujo significativamente (% VA = -1,7: IC95%: En los hombres españoles, hubo un aumento significativo del 14% al año (IC95%: 0,5, 29,3) para 1981-1984 y de 0,3 , El 9% al año (IC95%: 0,3, 1,6) para 1984-1997, se ha invertido la tendencia (% VA = -1,7, IC95%: - 2,3, -1,2) entre 1997 y En el año 2011, mostrando una tendencia creciente hasta 2013 cuando alcanzó los 10,8 / 100.000. En mujeres portuguesas, un aumento significativo de 2,8% por año (95% CI: 1,1; 4,5) hasta 1984, la tendencia se invirtió (VA = -5,7%: 95%:- 7,0,-(4) entre 1984 y 2000 y, tras una tendencia creciente, hubo un descenso significativo (% VA = -3,5, IC95%: - 5,9, -1,1) hasta 2013 cuando alcanzó 3,4 / 100.000. En España, la TS en mujeres aumentó significativamente un 7,7% al año (IC95%:5,5; 9,8) para 19791987, se volvió a 1992 (% VA=-4,4; IC95%: - 8,2 (0,4), después de una tendencia creciente hasta 1996, disminuyó un 2,1% al año (IC95%: - 8,2, -0,4) para el año 1996, con tendencia creciente (% VA = 13,2; IC95%: - 0,29, 28,5) para 2011-2013 cuando alcanzó 3,4 / 100.000. CONCLUSIÓN: A pesar de que en Portugal TS observa en los últimos años muestran una tendencia decreciente, este trabajo pone de manifiesto la magnitud de los problemas no debe ser ignorada.

DESCRIPTORES: Suicidio; Tendencias; Tasas; Portugal; España

BACKGROUND: Suicide is a public health problem, associated with much suffering and thousands of deaths worldwide). AIM: To evaluate time-trends in suicide rates (SR) in Iberian Peninsula over four decades. METHODOLOGY: Descriptive study of trends. The SR (1971-2013) was obtained from OECD database. Annual percent change (APC) in SR and respective 95% confidence interval (95%CI) were obtained by using joinpoint regression models, stratified by gender and country. RESULTS: Among Portuguese males, SR reduced by 1.3% (95%CI: -1.8; -0.7) and by 10.3% (CI95 %: -16.0; -4.5) per year for time-periods 1971-1993 and 19931999, respectively. After an increasing trend (%VA=30.2; CI95%:-2.9;74.9) between 1999 and 2002, SR decreased (%VA=-1.7; IC95%:-3.2;-0.2) up to 2013 and reached 13.1/100,000. Among Spanish men there was an increase in SR by 14% (95%CI:0.5;29.3) and 0.9% (95%CI:0.3;1.6) per year, for time-periods 1981-1984 and 1984-1997, respectively, which reverted up to 2011 (%VA=-1.7;95%CI:-2.3;-1.2). An increasing trend was observed up to 2013 when SR reached 10.8/100,000. Among Portuguese women, SR significantly increased (%VA=2.8;95%CI:1.1;4.5) up to 1984 which reverted (%VA=-5.7;95%CI:-7.0;-4.2) between 1984 and 2000. After an increasing trend up to 2003, SR significantly decreased (%VA=3.5;95%CI:5.9,-1.1), reaching 3.4/100,000 in 2013. Among Spanish women, SR increased (%VA=7.7;95%CI:5.5;9.8) between 1979 and 1987, which reverted up to1992 (%VA=-4.4;95%CI:-8.2;-0.4). After an upward trend between 1992 and 1996, SR decreased by 2.1% per year (95%CI:-8.2;-0.4) up to 2011, however an increasing trend (%VA=13.2 95% CI:-0.29 to 28.5) up to 2013 when SR reached 3.4/100,000. CONCLUSION: Although SR in Portugal presented a decreasing trend, results highlighted the magnitude of SR which should be addressed by stakeholders.

KEYWORDS: Suicide; Trends; Rates; Portugal; Spain Submetido em 30-12-2017 Aceite em 09-04-2019

1 Doutora; Professora Adjunta no Instituto Politécnico de Bragança, Escola Superior de Saúde, Campus de Santa Apolónia, 5300-253 Bragança, Portugal, celeste@ipb.pt 2 Doutora; Membro da Universidade do Porto, Instituto de Saúde Pública, Epidemiology Research Unit; Professora Adjunta no Instituto Politécnico de Bragança, Escola Superior de Saúde, 5300-253 Bragança, Portugal, cistina.teixeira@ipb.pt 3 Mestre; Professora Adjunta no Instituto Politécnico de Bragança, Escola Superior de Saúde, 5300-253 Bragança, Portugal, filomena@ipb.pt 4 Doutora; Professora Coordenadora no Instituto Politécnico de Bragança, Escola Superior de Saúde, 5300-253 Bragança, Portugal, aubra@ipb.pt 5 Doutora; Professora Adjunta no Instituto Politécnico de Bragança, Escola Superior de Saúde, 5300-253 Bragança, Portugal, eugenia@ipb.pt Citação: Antão, C., Teixeira, C., Sousa, F., Branco, M. A. V., & Anes, E. M. (2018). Evolução temporal do suicídio na Península Ibérica: 1971-2013. Revista Portuguesa de Enfermagem de Saúde Mental (Spe. 6), 93-98. doi: 10.19131/rpesm.0219 Revista Portuguesa de Enfermagem de Saúde Mental, ESPECIAL 6 (OUT.,2018) | 93


INTRODUÇÃO O suicídio e a tentativa de suicídio são apontados como importantes problemas de saúde pública em todo o mundo (Purebl et al., 2015). É uma importante causa de morte em muitos países da Europa. Em 2013, registaram-se 60 000 mortes por suicídio nos estados membros da União. O suicídio é um fenómeno complexo, com causas múltiplas, resultante da interação de fatores de natureza filosófica, antropológica, psicológica, biológica e social. Está reconhecidamente subdeclarado na medida em que a morte por suicídio é uma morte fortemente estigmatizada, por um lado e por outro, a atribuição da etiologia suicida nem sempre é evidente (DGS, 2016). De acordo com a Organização para a Cooperação e Desenvolvimento Económico, o risco de suicídio tende a aumentar com idade (OECD, 2016). Além disso, há diferenças na taxa de suicídio (TS) de acordo com o género. Na união europeia a TS é quatro vezes superior nos homens em comparação com as mulheres sendo que estas tendem a usar métodos menos fatais que homens (OECD/EU, 2016). A depressão surge como a entidade que mais contribui para as mortes por suicídio, (Santana, Costa, Cardoso, Loureiro, & Ferrão, 2015; Purebl et al., 2015), no entanto, comportamentos de risco, como consumo excessivo de álcool, uso de drogas ilegais, tabagismo, horas de sono reduzidas e uso elevado da internet podem estar associados (Purebl et al., 2015; OECD, 2014). Embora exista evidência científica a referir os problemas graves de saúde mental na esmagadora maioria das pessoas que se suicidam ou se tentam suicidar, as crises económicas, enquanto geradoras de desemprego, empobrecimento e insegurança, surgem como risco acrescido de suicídio (Wahlbeck & Mcdaid, 2012; DGS, 2016). Além destas componentes, o fenómeno do suicídio, seus contextos e consequências, vertem para a grande área da saúde mental, um conjunto de problemáticas e constrangimentos, com os quais é necessário lidar. Desde os apoios e orientação psico afetiva dos elementos familiares, tentando dar sentido à perda, bem como o acompanhamento dos respetivos lutos, até à gestão da perturbação que se desencadeia no seio da comunidade onde o suicídio ocorre. Este conjunto de consequências, mobiliza técnicos e instituições, que de uma forma ou de outra dizem respeito à saúde mental. Revista Portuguesa de Enfermagem de Saúde Mental, ESPECIAL 6 (OUT.,2018) | 94

Eis porque, a nível global, o suicídio é uma prioridade plasmada no WHO Mental Health Action Plan (20132020), onde os estados membros se comprometem reduzir as taxas de incidência deste fenómeno para os 10% até 2020 (WHO, 2013). Assim, fazer a análise da variação temporal e geográfica deste problema de saúde pública ajuda a compreender o fenómeno, permitindo não só a implementação de estratégias preventivas, mas também prever a necessária disponibilidade de profissionais e serviços de apoio, quer ao conjunto de sentimentos difíceis de gerir, quer ao processo, quase sempre doloroso, do luto. Partindo dos pressupostos atrás assumidos, foi desenvolvido um trabalho com o objetivo de conhecer e avaliar a variação temporal da TS nos dois países da Península Ibérica. METODOLOGIA Trata-se de um estudo descritivo de tendências temporais baseado em dados secundários de vigilância epidemiológica. Recorreu-se à base de dados da OCDE (OCDE, 2017) disponível online ao público e que contém informação sobre indicadores de saúde, recolhidos de forma sistemática em cada ano civil, nos diferentes países membros da OCDE. Desta base de dados obtiveram-se as estimativas (taxas de mortalidade e número de óbitos por suicidio) para cada ano entre 1971 e 2013 reportadas em Portugal e Espanha, estratificando de acordo com o género. Com base nestas estimativas obtiveram-se os valores da população para cada ano, país e género. Para avaliar a tendência do suicídio ao longo do tempo, utilizaram-se modelos de regressão linear segmentada (joinpoint regression models) aplicados a cada grupo (homens e mulheres) e em cada país (Portugal e Espanha). Esta abordagem estatística permite obter segmentos de reta separados por pontos de inflexão (joinpoints) que indicam os anos em que houve mudança significativa na evolução temporal da mortalidade. A partir do declive de cada segmento de reta é possível obter a percentagem de variação anual (%VA) da taxa. Desta forma, obtiveram-se medidas de tendência ao longo do tempo expressas em %VA negativa (se houve diminuição durante o período) ou positiva (se houve aumento durante o período) e respetivo intervalo de confiança a 95% (IC95%). Para esta análise, utilizou-se o programa Joinpoint versão 4.3.1.0.


As taxas de mortalidade observadas e previstas pelo modelo de regressão apresentam-se como sendo o número de óbitos por 100.000 indivíduos do respetivo género. O nível de significância considerado foi de 0,05. Utilizaram-se dados disponibilizados ao público em geral pela OCDE, por isso, não houve necessidade de aprovação pela Comissão de Ética. RESULTADOS Com exceção do período entre 1995-2001 a TS nos homens é mais elevada em Portugal do que em Espanha. Em Portugal a TS nos homens variou de 17,7 a 18,8 entre 1971 e 1979, atingindo o valor mínimo de 7,5 em 2000, e aumentando depois, para atingir 13,1 em 2013. Em Espanha a TS nos homens variou de 7,5 a 10,8 ao longo do período em estudo (Gráfico 1). Gráfico 1 - Evolução temporal da TS em homens, de acordo com o país.

O Quadro 1, mostra a %VA para a tendência temporal de TS em homens de acordo com o país. Em Portugal, observaram-se grandes flutuações na TS mas, de acordo com o modelo de regressão houve descidas estatisticamente significativas de 1,3% ao ano (IC95%: -1,8 a -0,7) entre 1971 e 1993 e de 10,3% ao ano (IC95%: -16,0 a -4,5) entre 1993 e 1999. Um aumento súbito de 30,2% ao ano (IC95%: -2,9 a 74,9) (embora sem significância estatística) observou-se nos três anos subsequentes, verificando-se uma reversão, com descida da TS de 1,6% ao ano (IC95%: -3,2; - 0,15) entre 2002 e 2013. Quadro 1 - Percentagem de variação anual (%VA) e pontos de inflexão para a TS em homens Portugal homens Espanha homens Período

%VA (IC95%)

Período

%VA (IC95%)

1971-1993

-1,3 (-1,8; -0,7) *

1971-1981

-0,4(-1,5; 0,7)

1993-1999

-10,3 (-16,0; -4,5)*

1981-1984

14,0 (0,5; 29,3) *

1999-2002

30,2 (-2,9; 74,9)

1984-1997

0,9 (0,3; 1,6) *

2002-2013

-1,7 (-3,2; - 0,2) *

1997-2011

-1,7(-2,3; -1,2) *

2011-2013

6,7 (-3,7; 18,4)

Legenda: *valores significativos p < 0.05

Em Espanha, e diferentemente do ocorrido em Portugal, foram constatados aumentos significativos da TS em homens de 14% ao ano (IC95%: 0,5 a 29,3) entre 1981 e 1984 e de 0,9% ao ano (IC95%: 0,3 a 1,6) entre 1984 e 1997, depois esta tendência reverteu para descida significativa entre 1997 e 2011 (%VA=-1,7; IC95%: -2,3; -1,2), voltando a observar-se uma tendência crescente embora não significativa nos últimos 3 anos (%VA=6,7; IC95%: -3,7; 18,4). As tendências da TS observadas em mulheres de Portugal e Espanha são muito semelhantes às observadas no grupo de homens do respetivo país, embora com valores notoriamente mais baixos. Em Portugal, a TS em mulheres variou de 3,5 para 6,0 entre 1971 e 1984, atingiu o valor mínimo de 1,6 em 2000 e após algumas flutuações ficou em 3,4 em 2013. Em Espanha, esta taxa variou de 2,3 a 3,8 entre 1971 e 1996 e com várias flutuações atingiu o valor 3,4 em 2013 (Gráfico 2). Gráfico 2 - Evolução temporal da TS em mulheres de acordo com o país.

Analisando as tendências temporais da TS em mulheres (Quadro 2), em Portugal, destaca-se uma tendência decrescente significativa entre 1984 e 2000, (%VA=-5,7 IC95%: -7,0 a -4,2). No período de 2000 a 2003, verifica-se um aumento de 26% ao ano (IC95%: -10,6 a 77,4), embora sem significância estatística. Desde 2003, observou-se em Portugal uma redução significativa da TS de 3,5% ao ano (IC95%: -5,9; -1,1). Quadro 2 - Percentagem de variação anual (%VA) e pontos de inflexão para a TS em mulheres Portugal mulheres

Espanha mulheres

Período

%VA (IC95%)

Período

%VA (IC95%)

1971-1984

2,8(1,1;4,5) *

1971-1979

-1,2 (-3,1; 0,6)

1984-2000

-5,7(-7,0; -4,2) *

1979-1987

7,7 (5,5; 9,8) *

2000-2003

26,0(-10,6;77,5)

1987-1992

-4,4(-8,2; -0,4) *

1992-1996

3,7 (-3,0; 11,0)

1996-2011

-2,1 (-2,7; -1,5) *

2011-2013

13,2(-0,3; 28,5)

2003-2013

-3,5(-5,9; -1,1) *

Legenda: *valores significativos p < 0.05

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Em Espanha, houve um aumento significativo da TS em mulheres (%VA=7,7 IC95%: 5,5 a 9,8) entre 1979 e 1987 que reverteu até 1992 (%VA=-4,4 IC95%: -8,2 a -0,4). Observou-se um novo aumento seguido de redução da TS na população feminina espanhola, respetivamente entre 1992 e 1996 (%VA=3,7 IC95%: 3,0 a 11,0) e entre 1996 e 2011 (%VA=-2,1 IC95%: -2,7 a -1,5). No último período (2011-2013), observou-se uma tendência crescente, embora não estatisticamente significativa (%VA=13,2 IC95%: -0,29 a 28,5). DISCUSSÃO De uma forma geral a TS tanto em homens como em mulheres são mais elevadas em Portugal do que em Espanha. Os pontos de inflexão e a variação da TS são em cada país muito semelhantes entre homens e mulheres, no entanto a TS é mais elevada nos homens que nas mulheres em ambos os países, corroborando o reportado por outros autores (Santana et al., 2015). Embora Portugal apresente valores de TS mais elevados, o decréscimo ocorrido até 1999 em homens e no ano de 2000 em mulheres, esta evidência colocou Portugal numa posição mais favorável em relação a Espanha, mas apenas nos últimos anos da década de 90. A partir de 2002, Portugal volta a apresentar valores de TS mais elevados comparativamente a Espanha, e, embora a tendência temporal da TS observada em Portugal nos últimos anos da série, seja decrescente, para ambos os géneros, em Espanha verifica-se algo diferente: os dados registam uma tendência crescente de 2011a 2013 em homens, e de 2010 a 2013, esta tendência ocorre em mulheres. O desemprego é um fator que tem sido associado ao suicídio pela vulnerabilidade social e económica que gera (Wahlbeck & Mcdaid, 2012; DGS, 2016).Todavia, Espanha apresenta desde 1986, as taxas de desemprego mais elevadas que Portugal, mas curiosamente, os dados relativos a Espanha, apresentam valores de TS mais baixos (INE, 2017). Esta evidência, não só expõe o fenómeno do suicídio como um fenómeno multifatorial, como sugere que, há outros fatores – eventualmente protetores – que de facto podem contrariar a tendência para o suicídio em contextos económicos adversos. Sendo a doença mental o principal fator associado ao suicídio, a maior prevalência de problemas mentais na população portuguesa, em relação a outros países europeus o que pode explicar os valores mais elevados observados em Portugal (Santana et al., 2015). Revista Portuguesa de Enfermagem de Saúde Mental, ESPECIAL 6 (OUT.,2018) | 96

Em Portugal, salienta-se a tendência decrescente de casos de suicídio observada desde 2003. Esta tendência pode ser parcialmente explicada por algumas melhorias, embora aquém do desejado, que se têm observado no contexto português. De facto, em Portugal, ao longo da última década, o número de consultas de saúde mental duplicou (DGS, 2015). A realidade encontrada sugere uma reflexão de toda a comunidade e profissionais no sentido de um maior investimento na Saúde Mental Positiva, integrada numa lógica de Promoção da Saúde Mental que deve ser uma prioridade (Cortez, 2016). A preocupação com os resultados é maior, se considerarmos que por cada suicídio, há muitas mais tentativas que deixam sequelas graves nos indivíduos (DGS, 2015). Estimativas dizem-nos que para cada adulto que morreu de suicídio, podem ter ocorrido mais de 20 outras tentativas de suicídio (Sher, 2004; World Health Organization, 2014). Apesar do suicídio ser mais prevalente em idades mais avançadas, emerge a reflexão e um acutilante esforço na promoção da saúde mental em todos os grupos etários e consequentemente no bem-estar das populações em geral. Com o agravamento das doenças mentais a nível mundial, prevê-se um agravamento da TS, quiçá proporcional ao aumento de incidência, nas respetivas zonas geográficas onde estas patologias se verificarem. Em Portugal, e segundo a DGS (2017), é espectável a ocorrência de um aumento da prevalência de algumas doenças mentais, assim como o aumento da taxa de suicídio em alguns setores da população (DGS, 2017), razão porque faz todo o sentido conhecer com critério as oscilações cronológicas tanto de TS, como de ocorrências de patologia mental. A monitorização deste problema deve ser uma prioridade dos governos, de modo a proporcionar respostas antecipadas e investir na promoção da saúde mental em geral e dos idosos em particular. Cada vez mais, o investimento nesta área deverá passar pelo aumento de competências sociais e emocionais ao longo do ciclo vital para ajudar a lidar com a adversidade. Esta perspetiva, juntamente com outras evidências que vão surgindo a partir de investigações e estudos realizados poderá ser um fator mobilizador de profissionais, de gestores institucionais, e sobretudo de decisores políticos.


A implementação de políticas de apoio à família, permitindo uma maior estabilidade familiar, a promoção da coesão social e do desenvolvimento sustentado das comunidades poderá ser importante na valorização da saúde mental (Alves & Rodrigues, 2010), das mesmas, porque apesar de o comportamento suicida decorrer de uma tragédia pessoal e familiar, acaba por emergir como uma problemática mais alargada, não só da responsabilidade e competência da saúde mental em particular, como também da saúde pública em geral. CONCLUSÃO Embora Portugal apresente uma tendência decrescente para a TS em homens e mulheres nos últimos anos, os seus valores são superiores aos observados no país vizinho. Os resultados encontrados enfatizam o recomendado no Plano Nacional de Prevenção do Suicídio Português (PNPS) 2013-2017, onde a prevenção, é uma necessidade premente, tanto mais que reconhece que a subnotificação dos suicídios, oculta a verdadeira dimensão do fenómeno (DGS, 2016). IMPLICAÇÕES PARA A PRÁTICA CLÍNICA Tendo em conta, que tanto Espanha como Portugal vivenciaram contextos socioeconómicos adversos, a posição desfavorável de Portugal comparativamente a Espanha no que respeita à TS requer uma maior consciência desta realidade por parte dos decisores em matéria de planeamento serviços de saúde em geral, e da saúde mental em particular. Do ponto de vista da práxis clínica, torna-se pertinente a aquisição de uma consciência, baseada na evidência, em matéria da ideação suicida bem como da sua consecução. É essencial que gestores, decisores e especialistas da área da saúde mental, reconheçam a necessidade deste conhecimento e dessa consciência. Não só para promoverem a desaceleração da tendência de suicídio nos contextos onde as suas variáveis promotoras se verificam, mas também e sobretudo, para se organizarem enquanto corpo formativo e cuidativo nesta matéria, para atingir o objetivo prioritário consignado pelo WHO Mental Health Action Plan (2013-2020), na redução das taxas de incidência da TS e, não menos importante, na redução económica em recursos e técnicos, quase sempre de caráter multiprofissional - para tratarem as respetivas consequências.

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Wahlbeck, K. & Mcdaid, D. (2012). Actions to alleviate the mental health impact of the economic 
crisis. World Psychiatry,11 (3), 139-145. Disponível em: https://onlinelibrary.wiley.com/doi/ abs/10.1002/j.2051-5545.2012.tb00114.x World Health Organization. (2013). Mental Health: Action Plan 2013-2020. Disponível em: http://apps.who.int/iris/bitstream/handle/10665/89966/9789241506021_eng.pdf;jsessioni d=72D48E3375811374EF549C63C17FDF94?sequen ce=1

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World Health Organization. (2014). Preventing suicide: a global imperative. Disponível em: http://www. who.int/iris/handle/10665/131056


15 NORMAS

DE PUBLICAÇÃO DA ENFERMAGEM DE SAÚDE MENTAL

REVISTA

PORTUGUESA

DE

A Revista Portuguesa de Enfermagem de Saúde Mental é publicada duas vezes por ano, em junho e dezembro, tratando-se de uma revista indexada em bases de dados nacionais e internacionais. A Revista apresenta, atualmente, as seguintes secções: Artigos de Investigação; Artigos de Revisão (Narrativa, Sistemática e Integrativa) da Literatura; Artigos de Boas Práticas/Reflexão. 1 – Procedimentos de Submissão do Artigo: 1.1 – Submissão eletrónica: os artigos devem ser sempre submetidos eletronicamente no sítio da Sociedade Portuguesa de Enfermagem de Saúde Mental: http://www.aspesm.org/. 1.2 – Para a submissão dos artigos, deverão sempre ser enviados os seguintes documentos: a) Artigo integral, obedecendo às normas da revista; b) Checklist de autoverificação, preenchida na totalidade c) Declaração de Cedência de Direitos de Autor e de Observação dos Princípios Éticos da Investigação, provando que os autores concordam que o artigo, uma vez aceite, fique da propriedade d’ ASPESM, não podendo, por isso, ser publicado noutra fonte, e que foram cumpridos todos os princípios éticos inerentes a um trabalho de investigação. Nota: a Direção da Revista reserva-se o direito de retirar um artigo do processo de revisão ou das bases de dados (no caso dos artigos publicados), sempre que se verifique que os autores publicaram uma versão idêntica noutra Revista. 2 – Processo de Revisão: Os artigos propostos são apreciados num processo Double Blinded (duplamente cego). Neste processo, o artigo é enviado por dois Peer Reviewers (Pares Revisores), os quais o examinam e arbitram sobre a sua qualidade, dando as recomendações que julgarem convenientes. Sempre que não se verifique acordo entre os dois revisores, o Diretor da Revista reserva-se o direito de indicar um terceiro revisor. A Direção da Revista enviará ao autor informação sobre a eventual aceitação definitiva, aceitação com alterações, ou não aceitação. No caso da aceitação com alterações, os autores receberão os pareceres e recomendações sugeridas pelos Peer Reviewers. O autor deve efetuar as alterações e reenviar o documento, via eletrónica, no tempo regulamentado. Nota: caso não se verifique o cumprimento rigoroso do tempo estipulado para correção do artigo, este pode ser excluído do processo de revisão. Cada artigo será, posteriormente, verificado pelo Diretor e Coordenador da Revista, que analisam a primeira versão do artigo e a versão corrigida, em função das recomendações dos Peer Reviewers. O processo de revisão será efetuado online. As fases do processo de revisão e recomendações encontram-se descritos no quadro abaixo: Fase Receção do Artigo Revisão Reformulação do Autor Verificação Redatorial Publicação

Procedimento Após o envio do artigo, este será submetido a um processo de revisão técnica (revisão dos aspetos formais e de normalização, de acordo com as normas de publicação da Revista). O artigo é enviado para 2 Peer Reviewers, que o examinam e arbitram sobre a sua qualidade, dando as recomendações convenientes. A Direção da Revista enviará ao autor informação sobre a aceitação definitiva, aceitação com alterações, ou não aceitação, bem como os pareceres e recomendações dos Peer Reviewers. As alterações a efetuar pelo autor deverão ir, rigorosamente, de acordo com as recomendações dos Peer Reviewers. Cada artigo deverá ser verificado pelo Diretor e pelo Coordenador da Revista, que analisam a primeira versão do artigo e a versão corrigida, em função das recomendações dos Peer Reviewers. A oportunidade de publicação é da inteira responsabilidade da Direção da Revista.

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3 – A decisão final acerca da oportunidade de publicação dos artigos é da responsabilidade do Diretor da Revista. 4 – O artigo: 4.1 – Tipo de artigo: devem ser artigos científicos originais e versarem temas de saúde mental, Enfermagem de saúde mental ou educação em saúde mental. O conteúdo dos artigos é da exclusiva responsabilidade dos seus autores, aos quais compete respeitar os princípios éticos da investigação e cumprir as normas da edição da Revista. A Revista Portuguesa de Enfermagem de Saúde Mental poderá incluir artigos em língua portuguesa, espanhola, inglesa ou francesa, consoante a origem dos artigos. 4.2 – Estrutura do artigo 4.2.1 - Título: o artigo deverá incluir um título informativo (que vá de encontro ao âmbito do trabalho) e sucinto (em português, espanhol e inglês); máximo de 16 palavras, sem abreviaturas e sem a indicação da localização geográfica da investigação. 4.2.2 - Autores: os autores devem estar devidamente identificados, com o nome, habilitações académicas, categoria profissional, instituição onde exercem funções, contactos (morada, e-mail e telefone institucionais) e informação no caso de o artigo ser extraído de Dissertação ou Tese (indicando o título, ano e instituição onde foi apresentada). O nome e afiliação dos autores deve surgir imediatamente após o título em português. As afiliações devem estar por extenso (ex.: Local de Trabalho – Escola Superior de Enfermagem do Porto). Os endereços de correio eletrónico dos autores dos artigos devem estar com hiperligação (com link disponível). 4.2.3 - Resumo: o resumo do trabalho deve ser apresentado em português, espanhol e inglês, e não deve exceder as 250 palavras, devendo incluir a descrição do contexto, objetivo(s), metodologia, resultados e conclusões. 4.2.4 - Palavras-Chave: o artigo deve apresentar, no máximo, 4 palavras-chave, transcritas de acordo com os descritores MeSH (em português, ver DeCS), em português, espanhol e inglês. 4.2.5 - Corpo do artigo: O artigo (tratando-se de um trabalho de investigação) deve ser estruturado em secções, devendo incluir os seguintes capítulos: Introdução, Metodologia, Resultados, Discussão, Conclusão, e Implicações para a Prática Clínica). Os artigos de revisão e de boas práticas/reflexão não têm que obedecer, necessariamente, a esta divisão. 4.3 - Formato: • O texto deve ser apresentado em formato Word, letra Arial, tamanho 11, espaçamento 1,5, páginas em formato A4, em coluna única, evitando negritos e sublinhados, variação do tipo de letra, fundos de cor, etc.; • Todas as margens devem ter 2,5 cm.; • Não devem ser incluídas notas de rodapé. • O artigo não deve ultrapassar as 15 páginas incluindo resumo (em português, espanhol e inglês), referências, tabelas, quadro e figuras. • O artigo não deverá ser paginado. • Os parágrafos não devem ser indentados. • O artigo deve ser redigido de acordo com o Novo Acordo Ortográfico (caso não o seja, a Comissão Editorial reserva-se o direito de realizar a conversão). Nota: caso o(s) autor(es) se recuse(m) a redigir o artigo segundo o Novo Acordo Ortográfico devem, aquando do seu envio, manifestar essa posição de forma clara e inequívoca. • Na primeira utilização de uma sigla esta deve estar, primeiramente, por extenso, por exemplo: Terapia Cognitivo-Comportamental (TCC). • Quando se realizarem citações de três a cinco autores, todos os nomes devem ser mencionados na primeira vez que a citação é feita (ex.: Bradley, Ramirez, & Soo, 1999). Nas vezes seguintes, deve utilizar-se apenas o nome do primeiro autor seguido de “et al.” (ex.: Bradley et al., 1999). Caso a citação seja de seis ou mais autores, logo na primeira vez em que a citação é feita deve utilizar-se apenas o nome do primeiro autor seguido de “et al.”. Revista Portuguesa de Enfermagem de Saúde Mental, ESPECIAL 6 (OUT.,2018) | 100


• No corpo do artigo, ao citar autores coletivos, na primeira vez que a citação é feita, deve ser mencionado o nome por extenso (ex.: National Institute of Mental Health [NIMH], 2003). Nas vezes seguintes, pode ser utilizada a abreviatura (ex.: NIMH, 2003). • Os títulos dos capítulos devem seguir a seguinte estrutura: Nível do Título Formato 1 Centrado, Negrito, com Maiúsculas e Minúsculas 2 Alinhado à Esquerda, Negrito, com Maiúsculas e Minúsculas 3 Indentado, negrito, em minúsculas terminando com ponto final. 4 Indentado, negrito, itálico, em minúsculas terminando com ponto final. 5 Indentado, itálico, em minúsculas terminando com ponto final. 4.3.1 - Tabelas, quadros, gráficos e figuras: devem ser incluídos apenas os que sejam absolutamente essenciais para a compreensão do artigo e numerados por ordem de inclusão no texto, em função de cada tipo. As tabelas e quadros devem apresentar o título em cabeçalho e os gráficos e figuras devem apresentar o título por baixo. Para tabelas e quadros o tamanho da letra pode ser reduzido até um mínimo de 9 e sem espaçamentos. As tabelas, quadros, gráficos e figuras devem surgir imediatamente após o parágrafo em que é feita referência às mesmas. 4.3.2 - Citações: todos os autores citados no artigo devem constar da lista de referências bibliográficas. Exemplo: Sequeira (2006), (Sequeira, 2006), ou “Em 2006, Sequeira (...)”. Deve indicar-se o número de página, no caso de citação textual, tal como nos exemplos: Sequeira (2006, p. 32) ou (Sequeira, 2006, p. 32). Quando citar dois ou mais autores numa mesma paráfrase, deve ordená-los por ordem alfabética, tal como no exemplo: (Miller, 1999; Shafranske & Mahoney, 1998). Nota: utilizar o símbolo “&” apenas nas paráfrases em que os autores citados sejam de países em que o português não é uma língua oficial (ex.: EUA, Reino Unido, etc.). 4.3.3 - Referências Bibliográficas: • As referências selecionadas devem permitir evidenciar as publicações mais representativas do “estado da arte” da problemática em estudo (últimos 5 anos, extensíveis a 10 anos para problemáticas que tenham sido pouco estudadas), resultando da pesquisa de bases de dados de revistas indexadas nacionais e internacionais. • As referências bibliográficas devem estar elaboradas de acordo com as normas da 6ª Edição da American Psychological Association (APA). Todas elas deverão estar citadas no artigo. • Nas referências bibliográficas, independentemente do número de autores, estes devem ser todos referidos, não sendo permitido o uso de “et al.”. • O título das revistas nunca deve ser abreviado nas referências bibliográficas. Por exemplo, não se deve escrever “RPESM”, mas sim “Revista Portuguesa de Enfermagem de Saúde Mental”. • Sempre que se inclua um site nas referências bibliográficas, a sua hiperligação deve estar presente e funcionante. Nota: as fontes devem ser alvo de seleção criteriosa, em função da sua pertinência, e não devem ultrapassar um total de 20 referências, organizadas por apelido do autor e ordenadas por ordem alfabética. APA 6ª Edição (Exemplos – consultar http://www.apastyle.org/) 4.3.3.1 Modelo de referências (indicar o nome de todos os autores – não usar “et al.”): Livros Shotton, M. A. (1989). Computer addiction? A study of computer dependency. London, England: Taylor & Francis. Trabalho académico (Dissertação/Tese) Healey, D. (2005). Attention deficit/hyperactivity disorder and creativity: An investigation into their relationship. Tese de Doutoramento, University of Canterbury, Christchurch, New Zealand. Revista Portuguesa de Enfermagem de Saúde Mental, ESPECIAL 6 (OUT.,2018) | 101


Trabalho académico (Dissertação/Tese) Healey, D. (2005). Attention deficit/hyperactivity disorder and creativity: An investigation into their relationship. Tese de Doutoramento, University of Canterbury, Christchurch, New Zealand. Editor literário Barkley, R. A. (Ed.) (2008). Transtorno de déficit de atenção/hiperatividade: Manual para diagnóstico e tratamento (3ª ed.). Porto Alegre: Artmed. Capítulos de livros Haybron, D. M. (2008). Philosofy and the science of subjective well-being. In M. Eid & R. J. Larsen (Eds.), The Science of subjective well-being (pp. 17-43). New York, NY: Guilford Press. Autor coletivo American Psychological Association. (2010). Publication manual of the American Psychological Association (6ª ed.). Washington, DC: Author. Artigos de publicações periódicas Com DOI Herbst-Damm, K. L. & Kulik, J. A. (2005). Volunteer support, marital status, and the survival times of terminally ill patients. Health Psychology, 24, 225-229. doi: 10.1037/0278-6133.24.2.225 Sem DOI Light, M. A. & Light, I. H. (2008). The geographic expansion of Mexican immigration in the United States and its implications for local law enforcement. Law Enforcement Executive Forum Journal, 8(1), 73-82. Documentos eletrónicos Livros Schiraldi, G. R. (2001). The post-traumatic stress disorder sourcebook: A guide to healing, recovery, and growth [Adobe Digital Editions version]. doi: 10.1036/10071393722 Artigos de publicações periódicas Wheeler, D. P. & Bragin, M. (2007). Bringing it all back home: Social work and the challenge of returning veterans. Health and Social Work, 32(1), 297-300. Acedido em http://www.naswpressonline.org Outros (póster, comunicação livre, etc.) Leclerc, C. M. & Hess, T. M. (2005, agosto). Age diferences in processing of affectively primed information. Póster apresentado na 113ª Annual Convention of the American Psychological Association, Washington, DC. Nota: no caso de os autores serem de países de língua oficial portuguesa, nas referências bibliográficas o “&” deve ser substituído por “e”. 5 – Formato Padrão do Artigo a submeter: Primeira Página • Título (em português, espanhol e inglês) • Nome dos autores (separados por ponto e vírgula); • Afiliações dos autores (uma afiliação por linha); • Indicação caso o artigo seja extraído de Dissertação/Tese. Nota: esta página, posteriormente, é retirada pelo Coordenador da Comissão Editorial, sendo atribuído um número codificado que identifica o artigo junto dos revisores Revista Portuguesa de Enfermagem de Saúde Mental, ESPECIAL 6 (OUT.,2018) | 102


Segunda Página • Titulo (em português); • Resumo (em português); • Palavras-Chave (em português); • Título (em espanhol); • Resumen; • Descriptores; • Titulo (em inglês); • Abstract; • Keywords. Páginas Seguintes: • Introdução; • Metodologia; • Resultados; • Discussão; • Conclusões; • Referências bibliográficas; • Apêndices (se existentes), agradecimentos (se existentes), conflitos de interesses (se existentes), fontes de financiamento (se existentes), e contribuições dos autores (se aplicável).

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