Teste 68

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Unidade 3

O SIGNIFICADO DO TRABALHO E RELAÇÕES HUMANAS Ana Céli Pavão

Objetivos de aprendizagem: Nesta Unidade, você será levado a refletir temas relevantes sobre o significado do trabalho para o homem, enquanto ser singular e social, bem como as transformações ocorridas no mundo do trabalho, que estão diretamente relacionadas à construção da subjetividade humana. Além disso, você conhecerá os aspectos do desenvolvimento humano, compreendendo a importância do estabelecimento das relações humanas para a constituição do homem em sociedade. Por fim, você será estimulado a refletir sobre as contribuições da Psicologia Social enquanto importante área do conhecimento.

Secão 1 | O Significado do Trabalho para o ser humano em sua individualidade e coletividade Esta seção traz a importância do trabalho no processo de criação do próprio homem e da constituição de sua história, sendo este fenômeno considerado fonte de significados e papel fundamental na constituição da identidade, bem como na produção da subjetividade humana. Perceba o quanto as transformações sociais e culturais e o novo formato de sociedade baseada no consumo impactaram na concepção, organização e gestão do trabalho.


Secão 2 | Relações Humanas, aspectos do desenvolvimento humano e interação Nesta seção, verificaremos que a compreensão do desenvolvimento humano pode contribuir para entender o comportamento das pessoas, por isso, conheceremos alguns aspectos do desenvolvimento humano e os fatores que interferem neste processo. Logo após, analisaremos a complexidade e dinamicidade das relações humanas, refletindo sobre algumas das aptidões necessárias para viver com os outros e, ainda, as táticas de influência social. Ao final da seção, discutiremos a ciência Psicologia e as contribuições valiosas da Psicologia Social, que nos ajuda a compreender o homem em sua dimensão social e histórica.

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Introdução à unidade

Olhe para você! Provavelmente, um aluno do curso de Sociologia que tem uma história de vida, que viveu experiências passadas que marcaram seu desenvolvimento, que estabeleceu relações ao longo de sua existência, enfim, um ser humano! Certamente, você sabe que a experiência humana só pode ser realizada através dos nossos semelhantes, em contato com as outras pessoas; apenas na interação com o outro é possível nos construirmos como humanos de fato. E há muitos fenômenos próprios da condição humana que precisam ser compreendidos para que se possa refletir a respeito do próprio humano, como o trabalho, as relações humanas e o processo de interação. Também há meios adequados para se adquirir este conhecimento, como os diferentes campos da ciência, destacando-se a Psicologia. Convido você a refletir sobre essas questões a partir de agora. Iniciaremos essa unidade, portanto, com a Seção 1, intitulada “O significado do trabalho para o ser humano em sua individualidade e coletividade”, por meio da qual refletiremos a busca do significado do trabalho e sua relevância na construção da subjetividade humana, bem como os impactos individuais e sociais das transformações no mundo do trabalho e da nova configuração de sociedade, a qual estamos vivendo nos dias atuais. Na Seção 2, “Relações Humanas, aspectos do desenvolvimento humano e interação”, por sua vez, conheceremos brevemente os aspectos do desenvolvimento humano e também os fatores que interferem neste processo. Em seguida, analisaremos a importância das relações humanas e as aptidões necessárias para compreender o outro e conviver com ele. Além disso, refletiremos a respeito do fenômeno da influência social e, por fim, discutiremos as contribuições da Psicologia Social e seu olhar sobre o humano em sua individualidade e coletividade. Ao final da unidade, você poderá validar seu aprendizado através das atividades disponíveis. Espero que goste do conteúdo que será apresentado!

Boa leitura!

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Seção 1 O significado do trabalho para o ser humano em sua individualidade e coletividade Certamente, você está lendo este livro com o objetivo de aprofundar seu conhecimento para aplicá-lo em seu trabalho, seja ele qual for. O trabalho está presente em nossa vida desde a tenra idade, no cotidiano de nossa família e amigos, nas instituições as quais fazemos parte e/ou conhecemos, nos meios de comunicação, enfim, em todo lugar. Isso nos leva a refletir que a constituição da humanidade se deu, em grande parte, pela existência do trabalho.

Você já parou para pensar sobre a importância que o trabalho exerce na sua vida e na sociedade como um todo?

Antunes (2004), ao citar um texto de Friedrich Engels (um importante teórico colaborador de Karl Marx), publicado em 1896, relata que o trabalho foi responsável por criar o próprio homem. Para entendermos melhor esta relação entre humanidade e trabalho, não podemos negar a extraordinária contribuição dos pensamentos de Karl Marx (18181883). Sant' Anna (1997), organizador de um livro sobre a vida e obra de Marx, contanos que o núcleo de seus pensamentos é sua interpretação do homem, cujo início é marcado pela necessidade humana. A história da humanidade, portanto, começa com o próprio homem que luta com a natureza para buscar satisfazer suas necessidades e, nesse movimento, descobre-se como ser ativo e produtivo, passando a ter consciência de si mesmo e do mundo à sua volta. Assim, “a história é o processo de criação do homem pelo trabalho humano” (p. 26, grifo nosso).

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Vamos conhecer um pouco a respeito deste grande pensador: Heinrich Karl Marx nasceu em Tréveris, no Renânia alemã, no dia 5 de maio de 1818. Ele era o mais velho dos filhos varões e o segundo nascido na numerosa família. Já na juventude foi possível reconhecer seus extraordinários dotes mentais, que os pais procuraram estimular. Na fase adulta, Marx conheceu, em Paris, Friedrich Engels que, dois anos mais jovem do que ele, se converteu em discípulo, colaborador e, mais tarde, em editor de sua obra póstuma (SANT’ANNA, 1997).

Segundo Antunes (2004), a transição do macaco em homem, dentre tantos processos graduais de evolução, consistiu na adaptação das mãos, cujas funções, durante os milhares e milhares de anos, só puderam ser, a princípio, funções sumamente simples.

Mas já havia sido dado o passo decisivo: a mão era livre e podia agora adquirir cada vez mais destreza e habilidade; e essa maior flexibilidade adquirida transmitia-se por herança e aumentava de geração em geração. Vemos, pois, que a mão não é apenas o órgão do trabalho; é também produto dele. Unicamente pelo trabalho, pela adaptação a novas e novas funções, pela transmissão hereditária do aperfeiçoamento especial assim adquirido pelos músculos e ligamentos e, num período mais amplo, também pelos ossos; unicamente pela aplicação sempre renovada dessas habilidades transmitidas a funções novas e cada vez mais complexas foi que a mão do homem atingiu esse grau de perfeição que pôde dar vida, como por artes de magia, aos quadros de Rafael, às estátuas de Thorwaldsen e à música de Paganini (ANTUNES, 2004, p. 13-14).

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Para conferir o encanto de uma das obras de Rafael, acesse o link: <http://virusdaarte.net/rafael-sanzio-madona-sistina/> (acesso em: 07 nov. 2014). Você verá a “Madona Sistina” e conhecerá um pouco da história desta bela obra de arte, concebida no ato do trabalho.

É claro que as mãos não são parte isolada do corpo humano e todas as funções do nosso corpo apresentam uma conectividade e formam um organismo extremamente complexo; em todos esses processos de evolução, o homem foi se transformando e se desenvolvendo de forma constante. Por meio do trabalho, conforme Antunes (2004), o homem foi capaz de ampliar seus horizontes, o que o levou a descobrir continuamente em cada objeto que manuseava novos elementos que, até aquele momento, eram desconhecidos, estimulando assim sua capacidade de criar, produzir, simbolizar. Diante disso, um dos fatores que diferencia o homem dos outros animais é que ele é dotado de consciência, uma vez que concebe de forma simbólica o desenho e a forma que quer dar ao objeto de seu trabalho. O autor traz uma ilustração de Marx para explicar o quão relevante e admirável é essa constatação:

Uma aranha executa operações semelhantes às do tecelão, e a abelha envergonha mais de um arquiteto humano com a construção dos favos de sua colmeia. Mas o que distingue, de antemão, o pior arquiteto da melhor abelha é que ele construiu o favo em sua cabeça, antes de construí-lo em cera. No fim do processo de trabalho, obtém-se um resultado que já no início deste existiu na imaginação do trabalhador e, portanto, idealmente (ANTUNES, 2004, p. 30).

É possível perceber, a partir destas reflexões, que o trabalho é uma atividade essencialmente humana. O trabalho não proporcionou apenas a criação de instrumentos que visavam satisfazer as necessidades dos homens e, num grau mais elevado, proporcionar o estímulo dos sentidos por meio da arte; o trabalho produziu relações humanas!

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U3 Pense, neste momento, nas pessoas que estão ao seu redor e o quanto elas contribuem todos os dias para o seu desenvolvimento enquanto pessoa e para o seu aprendizado. Para Antunes (2004), o trabalho é essencial na vida humana, pois é condição para sua existência social e, ao refletir Marx, afirma que:

[…] ao mesmo tempo em que os indivíduos transformam a natureza externa, tem também alterada sua própria natureza humana, num processo de transformação recíproca que converte o trabalho social num elemento central do desenvolvimento da sociabilidade humana (ANTUNES, 2004, p. 08).

Também Netto (1994), ao contribuir para o esclarecimento de alguns pressupostos do marxismo, aponta este mesmo pensamento de que, para Marx, o ser humano é um ser social, que produz a si mesmo através das suas objetivações, sendo o trabalho a mais privilegiada delas, ao passo que organiza as suas relações com os outros homens e com a natureza, reproduzindo-se a si mesmo. Sendo assim, no processo de evolução, o desenvolvimento das ações de trabalho culminou na ajuda mútua entre os seres humanos, revelando as vantagens destas ações realizadas no coletivo, o que contribuiu para agrupá-los ainda mais. E todo esse processo proporcionou o desenvolvimento de uma das ferramentas mais importantes para a vida humana: a linguagem (ANTUNES, 2004; BOCK; FURTADO; TEIXEIRA, 2008).

Conheça um pouco mais a respeito da concepção de trabalho na perspectiva filosófica, em especial em Marx. Acesse o link abaixo: <http://filosofia.uol.com.br/filosofia/ideologia-sabedoria/42/trabalhocomo-conceito-filosofico-nas-paginas-dos-manuscritos-economicofilosoficos-290788-1.asp>. Acesso em: 07 nov. 2014.

Confira, por meio da explicação de Antunes (2004), o avanço que o aparecimento da palavra, vinculada ao trabalho, promoveu para o nosso desenvolvimento:

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Primeiro o trabalho e, depois dele e com ele, a palavra articulada, foram os dois estímulos principais sob cuja influência o cérebro do macaco foi se transformando gradualmente em cérebro humano – que, apesar de toda sua semelhança, supera-o consideravelmente em tamanho e em perfeição. E à medida que se desenvolvia o cérebro, desenvolviam-se também seus instrumentos mais imediatos: os órgãos dos sentidos. Da mesma maneira que o desenvolvimento gradual da linguagem está necessariamente acompanhado do correspondente aperfeiçoamento do órgão do ouvido, assim também o desenvolvimento geral do cérebro está ligado ao aperfeiçoamento de todos os órgãos dos sentidos (ANTUNES, 2004, p. 16). Continua o autor sobre o desenvolvimento humano:

O desenvolvimento do cérebro e dos sentidos a seu serviço, a crescente clareza de consciência, a capacidade de abstração e de discernimento cada vez maiores, reagiram por sua vez sobre o trabalho e a palavra, estimulando mais e mais o seu desenvolvimento (ANTUNES, 2004, p. 17, grifos nossos).

Desse modo, Bock, Furtado e Teixeira (2008), guiados pela perspectiva da Psicologia sócio-histórica, asseguram que a linguagem facilitou muito a vida coletiva do ser humano, o que contribuiu sobremaneira para o surgimento da sociedade, este conjunto de relações do qual fazemos parte hoje. Em conformidade com esta perspectiva, o trabalho só pode acontecer em sociedade, caracterizando-se como um processo pelo qual o homem estabelece relação com a natureza e, ao mesmo tempo, com outros homens, sendo a linguagem o instrumento básico para que essa relação aconteça. Isso nos leva a crer que “(…) o trabalho só pode ser entendido dentro de relações sociais determinadas” (BOCK; FURTADO; TEIXEIRA, 2008, p. 79). Estes mesmos autores nos fazem pensar que, com o passar do tempo, o trabalho foi sendo constituído como fator preponderante para o desenvolvimento intelectual e emocional dos seres humanos, sendo considerado extremamente relevante na vida das pessoas e de fundamental importância na formação da identidade. No que diz respeito ao conceito de identidade, podemos reconhecêlo quando uma pessoa se aproxima de outra e, ao buscar saber mais a respeito dela, possivelmente pergunte o nome, a formação, a profissão e a atividade laboral

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U3 que desenvolve. O que se busca é a identificação do outro, ou seja, diferenciá-lo dos demais, personalizá-lo. Assim, entendemos que a identidade é formada por um conjunto de características próprias e exclusivas, um único exemplar de um determinado indivíduo, o que o torna um ser ímpar. Além disso, o que identifica a pessoa em nossa sociedade, geralmente está ligado às atividades que desempenha ao longo de sua história de vida (BOCK; FURTADO; TEIXEIRA, 2008). A identidade permite tomar consciência de si mesmo e diferenciar-se do outro, possibilitando que o indivíduo se perceba como ser único. “Assim, o termo identidade aplica-se à delimitação que permite a distinção de uma unidade e a relação com os outros, propiciando o reconhecimento de si” (BOCK; FURTADO; TEIXEIRA, 2008, p. 208). Trata-se, portanto, da denominação dada às representações e sentimentos que o indivíduo desenvolve a respeito de si mesmo, a partir do conjunto de suas vivências e experiências. Neste sentido, a relação do indivíduo com o seu trabalho e o papel que exerce em sua atividade profissional também é considerado fator essencial na constituição da identidade, uma vez que o trabalho ocupa posição central na vida de qualquer ser humano, além de ser um instrumento de sobrevivência pessoal, é uma atividade que se compõe no substrato da identidade pessoal e que vai contribuindo para modelar um jeito próprio de ser (ONESTI; MARCHI, 2001). A partir de uma ótica social, é possível dizer que o trabalho é o principal regulador da vida humana, pois ele orienta os horários, os hábitos, os grupos ao qual o indivíduo pertence e, até mesmo, as atividades pessoais. Isso fica ainda mais evidente quando pensamos nas pessoas que perderam seus empregos; quantas delas se viram numa situação de desorientação, sentindo-se inúteis, potencializando, dessa forma, o adoecimento, ou ainda o enfrentamento, fazendo com que passem a procurar outras coisas para preencher o espaço antes ocupado pelo trabalho. Codo (apud JACQUES, 2003, p. 108) afirma que o trabalho “[…] constitui-se como principal fonte de significados na constituição na vida de todos. As pessoas articulam-se ao redor das atividades laborativas” e, apesar das dificuldades e barreiras que todos os profissionais encontram no cotidiano do trabalho, seja qual for a área de atuação, segmento ou posição hierárquica, é notório que o trabalho tem um valor de construção social na vida do indivíduo.

Pense no trabalho que você realiza todos os dias (não precisa ser um trabalho formal, pode ser uma atividade que você desempenhe com regularidade): qual o significado que este trabalho representa na sua vida?

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U3 Em uma tentativa de definir o que é trabalho, o psicólogo Wanderley Codo (2006) busca na filosofia e na economia a ajuda de importantes teóricos, como Henri Bergson, que traz a seguinte definição: “O trabalho humano consiste em criar utilidade” (FRIEDMAN et al., 1962 apud CODO, 2006, p. 80), e também Karl Marx, cujo conceito de trabalho já refletimos. Por meio de suas pesquisas, Codo (2006) faz uma análise da dimensão do trabalho e chega à seguinte conclusão: “Trabalho é uma relação de dupla transformação entre o homem e a natureza, geradora de significado” (p. 80, grifo nosso). Perceba que esta definição vem ao encontro da linha de pensamento de Marx de que não só o homem transforma a natureza à sua volta por meio do trabalho, mas ele também é transformado nesta ação. E não para por aí! Para que esta ação seja considerada trabalho, deve se abrir para uma nova perspectiva: a de gerar significado. Gerar significado é transcender, é algo que se torna eterno, é levar a ação para além de si, uma vez que o trabalho a imortaliza. Assim, podemos pensar em tantos exemplos, como no caso do professor que ensina um novo tema ao seu aluno, fazendo-o refletir e aprender; ou, até mesmo, o marceneiro que produz um novo móvel para um jovem casal que acabara de se mudar para sua nova casa; são ações que geram significado, transcendem àquele que produz e permanece mesmo que o produtor não esteja mais presente. Retomamos a reflexão: qual o significado que o seu trabalho gera? Você já parou para pensar sobre isto? Qual o sentido que a atividade que você realiza todos os dias produz na sua vida e na vida das pessoas que estão à sua volta? Ao relacionar trabalho e o conceito de identidade, o mesmo autor afirma que o trabalho é uma atividade humana por excelência, agora entendida como o modo pelo qual transmitimos significado à natureza; a identidade demanda significados para se estabelecer, comparecendo o trabalho, então, como um dos elementos essenciais na constituição da identidade, embora não seja o único. De acordo com essa lógica, o processo de gerar significado torna o trabalho um ato de prazer e, consequentemente, quando esse processo é quebrado, ou seja, quando o circuito que gera significado é rompido, o resultado pode ser o oposto: gerar sofrimento, que pode acarretar em adoecimento e consequências negativas para o indivíduo. Para tornarmos nossa reflexão mais completa, vamos acrescentar um tema bastante importante, que é considerado o objeto de estudo da ciência Psicologia: a Subjetividade. Você já ouviu falar a respeito deste conceito? Para começar a decifrá-lo, utilizaremos o pensamento de Faye (1991), citado por Davel e Vergara (2001 apud RAMPAZZO; RICIERI, 2009), que afirma ser a subjetividade a interioridade das pessoas, a espontaneidade do eu, ou seja, tudo aquilo que constitui a singularidade humana e que sedimenta todo e qualquer conhecimento possível.

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U3 Assim, a Subjetividade diz respeito ao homem em todas as suas manifestações e expressões, tanto as visíveis, que é o próprio comportamento, quanto as invisíveis, como os pensamentos, os sentimentos, as emoções e os afetos; também se refere às expressões singulares, o porquê de sermos quem somos (incluindo a identidade), e as genéricas, o porquê das semelhanças entre os indivíduos. O termo subjetividade, portanto, sintetiza o todo do ser humano, inclusive sua relação com o trabalho (BOCK; FURTADO; TEIXEIRA, 2008). Os autores explicam a subjetividade como sendo,

[…] a síntese singular e individual que cada um de nós vai constituindo conforme vamos nos desenvolvendo e vivenciando as experiências da vida social e cultural; é uma síntese que de um lado nos identifica, por ser única; e de outro nos iguala, na medida em que os elementos que a constituem são experienciados no campo comum da objetividade social (BOCK; FURTADO; TEIXEIRA, 2008, p. 22-23).

Utilizando ainda as reflexões dos mesmos autores, podemos definir a subjetividade como a maneira de sentir, amar, fantasiar, pensar, comportar-se, sonhar de cada um de nós, constituindo o nosso jeito de ser. É o mundo de ideias, sentidos, significados e emoções que é construído internamente pelo ser humano a partir de suas vivências, relações sociais e também de sua constituição biológica; é a fonte de suas expressões e manifestações, tanto afetivas quanto comportamentais. Neste sentido, é por meio do mundo social e cultural, experienciado por cada um de nós, que se torna possível a construção de um mundo muito pessoal e particular. Essas experiências vão fazendo sentido para nossas vidas e, assim, vamos nos constituindo a cada dia. Estas definições nos levam a entender que a subjetividade é constantemente construída e essa construção depende da relação que estabelecemos com os outros. Assim, há um ponto fundamental neste conceito: a subjetividade é instituída socialmente, ou seja, é constituída na sociedade, da mesma forma que a linguagem, as regras de parentesco, os valores ou os métodos de trabalho. Toda sociedade, para sobreviver, necessita produzir modos de aculturação eficazes, capazes de transformar os homens em membros daquele grupo, aptos a funcionar segundo suas regras e, posteriormente, transmiti-las às gerações seguintes, institucionalizando-as e mantendo a sociedade em funcionamento. Assim sendo, o homem constrói a subjetividade aos poucos, na medida em se apropria do material

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U3 do mundo social e cultural, sendo ativo em sua construção (MEZAN, 2002; BOCK; FURTADO; TEIXEIRA, 2008). Neste sentido, a subjetividade não é inata, ou seja, não nasce com o indivíduo, mas é construída aos poucos, conforme o indivíduo vai se apropriando dos dados do mundo social e cultural. Esse movimento é dinâmico, pois, ao mesmo tempo em que o indivíduo recebe informações do mundo externo, ele também contribui e transforma esse mundo, e assim, ele constrói e transforma a sua subjetividade. Além disso, estudiosos do tema, como Codo (2006), mostram que a subjetividade não se reconhece somente como um “eu” singular, mas também em um “nós” e em uma intersubjetividade, entendendo que é somente por meio das relações que estabelecemos ao longo da vida que a subjetividade pode se constituir. González Rey (2005) traz uma definição de subjetividade que completa todas as nossas reflexões. Segundo ele, a subjetividade é um processo em constante desenvolvimento, plurideterminado e sensível à qualidade de seus momentos atuais, sendo que a subjetividade individual é determinada no social, por meio de um processo de constituição que integra, simultaneamente, as subjetividades individual e social. Seguindo esta linha de pensamento, podemos dizer que buscar desvendar a subjetividade nos tempos de hoje é tentar compreender a produção de novos modos de ser, não esquecendo que a produção dessas subjetividades é social, cultural e histórica. Entender essas novas subjetividades é revelar “[...] as relações do cultural, do político, do econômico e do histórico na produção do mais íntimo e do mais observável no ser humano – aquilo que o captura, submete ou mobiliza para pensar e agir sobre os efeitos das formas de submissão da subjetividade” (BOCK; FURTADO; TEIXEIRA, 2008, p. 23). Por fim, compreendendo que o trabalho exerce papel fundamental na vida do ser humano, conforme discutimos no início desta seção, podemos afirmar que este fenômeno influencia significativamente na construção da subjetividade, ao mesmo tempo que ela é constituída pelas relações que são criadas no interior do espaço de trabalho.

1.1 Trabalho e sociedade no cenário atual Ao responder à pergunta “o que é trabalho?”, Codo (2006) apresenta um exemplo interessante que nos faz refletir sobre o trabalho e o contexto que o envolve:

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Imaginem uma dona de casa, daquelas que orgulhavam nossas avós e humilham nossos coetâneos. Levanta-se da cama muito cedo, prepara o café da manhã para os filhos e o marido; assim que eles saem trata do almoço, da roupa, da limpeza, das compras. É uma usina inteira concentrada em uma pessoa só, cada milímetro do seu corpo, do seu cérebro, do seu afeto realiza funções que ocupariam toda uma empresa com vários especialistas; caso algum aluno de um curso de administração resolvesse planejá-la, pobre da suposta empresa, dificilmente conseguiria os níveis de competência da “dona Maria”, esposa de fulano e mãe de dois ou três sicraninhos. Nossa dona de casa trabalha. E muito. Se alguém perguntar a Dona Maria qual é sua profissão, provavelmente a resposta seria: “eu não trabalho”. Se perguntarmos ao seu marido, a resposta certamente será a mesma (CODO, 2006, p. 76, grifo do autor).

E você, também acredita que a Dona Maria, personagem do exemplo do autor, não trabalha? E por que a tendência é considerarmos que esta dona de casa, como qualquer outra dona de casa que conhecemos, que realiza tantas atividades durante o seu dia, não é considerada trabalhadora? O próprio autor nos explica: “Nossa ‘dona Maria’ não é considerada trabalhadora porque não produz nenhuma mercadoria vendável no mercado, não recebe salário, não contribui com a previdência, não assina carteira” (CODO, 2006, p. 76). Certamente, como nos orienta o autor, é preciso compreender a existência do homem, em toda sua historicidade, ou seja, em todas as épocas, nações, sistemas sociais e culturais para definir e diferenciar o que é trabalho em cada um desses momentos. Para analisarmos a concepção do trabalho nos dias de hoje, faz-se necessário recorrermos a alguns aspectos da história, sendo um dos marcos na história do desenvolvimento do trabalho o surgimento e consolidação do sistema capitalista; sistema que rege nossa economia até hoje. Segundo Bock, Furtado e Teixeira (2008, p. 249), “o sistema capitalista revolucionou as relações de trabalho, quando comparado aos modos de produção anteriores, porque transformou o próprio trabalho em mercadoria”.

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O Capitalismo é um sistema econômico, cujo objetivo maior é a obtenção do lucro e no qual os meios de produção e distribuição são de propriedade privada. Este sistema é dominante no mundo ocidental desde o fim do sistema feudalista. A lógica do capitalismo é a de que seu pleno funcionamento se dá quando há meios sociais e tecnológicos para garantir o consumo das pessoas e acumular cada vez mais capital.

Com o advento do capitalismo, surgiu uma nova relação de trabalho: o dono do capital (a burguesia) versus o trabalhador (o proletariado); este último, detentor de um único bem, sua força de trabalho. Assim, “o trabalhador vende sua força de trabalho a um proprietário dos bens de produção” (BOCK; FURTADO; TEIXEIRA, 2008, p. 249). A teoria social de Marx traz uma análise profunda dos efeitos de um mundo novo que despontava, como nos explica Netto (1994, p. 11):

Um mundo absolutamente novo: ele engendra uma cultura inédita e uma arte peculiar; confere ao conhecimento científico da natureza funções outrora desconhecidas, relacionando-o estreitamente à produção. Sobretudo, nele a economia e a sociedade são organizadas de modo particular, submetidas ambas a uma estratégia global (a da burguesia) e a uma lógica específica (a da valorização do capital). Configura-se assim um novo padrão de vida social, aquele centralizado na civilização urbano-industrial.

Marx (apud BORGES; YAMAMOTO, 2004) entendia a lógica do sistema capitalista como favorecedora da exploração do trabalhador em prol dos rendimentos do detentor do capital. “Assim, a exploração, antes de ser uma distorção do capitalismo, é uma característica inerente a ele” (BORGES; YAMAMOTO, 2004, p. 33). Estes autores, Borges e Yamamoto (2004), importantes nomes da Psicologia Social e dos temas relacionados ao trabalho, lembram-nos que o século XIX é marcado por um conjunto de fatos socioeconômicos e políticos que acaba por favorecer novas formas de gerenciar o trabalho e as organizações pautadas na sustentação científica. Daí advém o modelo conhecido como taylorismo, criado por Frederick Taylor (1856-1915), cujo objetivo era obter dos trabalhadores a máxima eficiência e produtividade. Os próprios autores explicam:

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Taylor propõe assim a substituição dos métodos tradicionais […] pelos científicos, com a adoção do método dos tempos e movimentos para eliminar movimentos desnecessários e substituir os movimentos lentos e ineficientes por rápidos. Acredita que há sempre um método mais rápido e um instrumento melhor. Para tanto, é necessária a máxima decomposição de cada tarefa em suas operações mínimas e a cronometragem de cada movimento do operário na execução das operações (BORGES; YAMAMOTO, 2004, p. 35).

Com este pensamento, Taylor propôs a separação entre o planejamento do trabalho e a sua execução, deixando a cargo dos gerentes a concepção do trabalho e eximindo o trabalhador de qualquer necessidade de pensar para que pudesse executar o trabalho de forma cada vez mais veloz. Assim, a visão taylorista levava em consideração os objetivos da produção e o ser humano era concebido como uma peça da engrenagem industrial. Seus princípios estavam organizados no planejamento, preparação dos trabalhadores, controle e execução (BOCK; FURTADO; TEIXEIRA, 2008, p. 250). Outro movimento que surgiu de forma paralela e independente da administração de Taylor, mas que manteve a mesma linha de pensamento, foi o fordismo, liderado por Henry Ford (1863-1947). Neste modelo, considerou-se que houve um avanço ao ser inserida no processo de produção a linha de montagem, estabelecendo o controle do ritmo do trabalho pelo compasso da máquina. Para Neto (1989), o fordismo deve ser entendido como desenvolvimento da proposta taylorista, pois busca o auxílio de elementos objetivos do processo de trabalho, no caso a esteira rolante, para objetivar e padronizar cada vez mais o trabalho humano.

Um filme clássico, que ilustra de forma magnífica e bem humorada o movimento repetitivo das máquinas e a consequência deste modelo de gestão e organização do trabalho para o trabalhador, é Tempos Modernos, de Charles Chaplin. Vale a pena assistir uma de suas cenas. Acesse o link: <https://www.youtube.com/watch?v=XFXg7nEa7vQ>

Numa reflexão mais profunda sobre estes modelos de administração do trabalho, segundo Borges e Yamamoto (2004), seus pressupostos acabam por

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U3 favorecer e até intensificar o processo de exploração do trabalhador, pois, entre outros fatores, radicaliza a monotonia e a cisão entre o planejamento (pensamento sobre o trabalho) e a simples execução, reafirmando a concepção capitalista tradicional do trabalho, negando os antagonismos de classe que a análise fundada nas obras de Marx indicava.

E nos dias de hoje? Como está estruturado o trabalho? Quais mudanças percebemos no atual mundo do trabalho?

Com as acentuadas transformações que marcaram o mundo do trabalho, o modelo taylorista-fordista demonstrou esgotamento. Estas transformações evidenciaram-se nas condições materiais e na estruturação social das organizações, além de aspectos da situação socioeconômica que se articularam ao intenso dinamismo do mercado de trabalho. Dentre as mudanças de maior impacto, podemos listar a adoção de novas tecnologias, o surgimento de novos estilos de gestão nas organizações e a revolução nos meios de comunicação (BORGES; YAMAMOTO, 2004). Bock, Furtado e Teixeira (2008) recordam o advento de um novo modelo de gestão do trabalho: o toyotismo, criado por Taiichi Ohno (1912-1990), que se iniciou no Japão, sendo disseminado para o Ocidente na década de 1970. A premissa deste novo modelo é o aumento da produtividade e eficiência, evitando ao máximo o desperdício, como o tempo de espera, a superprodução, os gargalos de transporte etc. O termo just-in-time, que quer dizer “no tempo exato”, referese justamente a este objetivo, cujo controle do sistema de produção se realiza durante o próprio processo e não no final dele. Com esse novo formato, as exigências com relação ao perfil do trabalhador passaram a ser outras. Agora, o trabalhador precisa ser flexível, possuir conhecimentos mais genéricos e também conhecer e saber operar equipamentos mais sofisticados. Vejamos a explicação dos próprios autores com relação ao toyotismo:

O toyotismo se tornou possível pelas características já mencionadas: equipamentos informatizados, trabalhador mais qualificado, flexibilidade na operação do equipamento e possibilidade de mudança rápida do que é produzido. Do ponto de vista da logística da produção, o sistema de fornecimento também foi alterado […]. Essa logística é

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necessária porque, agora, a produção passa a ser feita a partir da demanda do consumidor (just-in-time) evitando a estocagem. O trabalhador utiliza mais sua capacidade criativa, na medida em que não será mais mera extensão da máquina, mas alguém que planeja o que será produzido por ele (BOCK; FURTADO; TEIXEIRA, 2008, p. 255).

O que parece é que o trabalhador agora será mais valorizado e poderá resgatar o sentido do seu trabalho, pois começa a participar do planejamento de suas atividades e não mais apenas de sua execução. No entanto, os mesmos autores alertam que o sistema toyotista, embora tenha sido considerado um grande avanço em relação ao modelo taylorista-fordista, manteve inalterada a tensão entre capital e trabalho, que passou a ser mais complexa e mais diluída. Este novo cenário, segundo os autores, traz novas consequências ao trabalhador. “Do ponto de vista psicológico, a pressão subjetiva exercida pelo novo sistema origina efeito danoso à saúde do trabalhador, e passamos a conviver com termos como Síndrome de Burnout, LER, Dort e assédio moral” (BOCK; FURTADO; TEIXEIRA, 2008, p. 255). Sendo assim, nos dias de hoje, impulsionada pela globalização e pelo avanço cada vez mais crescente de tecnologias, uma nova dinâmica emerge fazendo com que as organizações e as pessoas precisem se adaptar. Na sociedade atual, vemos uma forte competitividade nos negócios, tornando os ambientes mais instáveis e a experiência do trabalho se tornou mais complexa, pois deixa de estar alocada em um ambiente estável e visível, cujo controle era mais presente, para ser transferida para qualquer lugar onde o trabalhador esteja (de preferência, com seu notebook à mão) e no qual o controle passa a ser internalizado, ou seja, o próprio trabalhador passa a se autocontrolar. “Se o controle é exercido pelo próprio trabalhador e pelos seus colegas, isso produzirá consequências para aqueles que se sentirem mais exigidos. O controle deixa de ser objetivo e ganha forma subjetiva” (BOCK; FURTADO; TEIXEIRA, 2008, p. 256). Além disso, exige-se do trabalhador que utilize muito mais seu domínio cognitivo frente às tarefas múltiplas e aos contextos diferenciados. Dessa forma, percebemos que o mundo do trabalho é gerido num ambiente de ambiguidades, imprevisibilidades e incertezas. Um fenômeno que tem contribuído significativamente para o avanço e disseminação de todas estas mudanças no mundo do trabalho é a globalização. Mas você sabe o que ela significa e qual o seu impacto para o trabalho e os trabalhadores?

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A Síndrome de Burnout refere-se ao esgotamento nervoso, em geral produzido pelo estresse, e que pode levar à depressão. A LER (lesão causada pelo esforço repetitivo) e a Dort (distúrbios osteomusculares relacionados ao trabalho) acarretam uma série de sintomas de que são acometidos trabalhadores obrigados a realizar esforços repetitivos. Já o assédio moral não é considerado uma doença ocupacional, mas é uma forma de pressão que passa a ser exercida, em geral, por aqueles que ocupam cargos de hierarquia mais alta (ex.: um superior que passa a assediar seu funcionário, desautorizando-o publicamente, ridicularizando-o por características físicas ou psicológicas etc.). São inúmeras as formas de desgaste que sofrem os trabalhadores acuados pelo assédio moral e as consequências podem ser devastadoras (BOCK; FURTADO; TEIXEIRA, 2008).

Malvezzi (2000 apud BORGES; YAMAMOTO, 2004) identifica alguns postoschave desse impacto: alta circulação do capital financeiro e tecnológico, aumentando significativamente e ampliando em nível global a competição entre as empresas, e aumento da imprevisibilidade dos acontecimentos tanto políticos quanto sociais e culturais, tornando mais difícil a atividade de planejamento das empresas. O autor destaca, ainda, que o processo de internacionalização das empresas se intensifica e com ele, a diversidade cultural presente nas organizações. A essa nova era globalizada que estamos vivendo alguns autores dão o nome de pós-modernidade; outros ainda mantêm o termo modernidade. Seja um ou outro termo, o fato é que há um novo modelo de sociedade, com novas características, novas condições e até mesmo novos valores, que têm influenciado as organizações e a forma de se conceber o trabalho. A partir de agora, iremos trazer as contribuições de um sociólogo da atualidade que nos faz refletir de forma analítica e bastante crítica a respeito desse novo panorama a que estamos submetidos nos dias de hoje: Zygmunt Bauman.

Zygmunt Bauman é um grande pensador da modernidade e perspicaz analista dos fatos cotidianos. Ele nasceu na Polônia, no ano de 1925, e mora na Inglaterra desde 1971. Atualmente, é professor emérito de sociologia das universidades de Leeds e Varsóvia e tem, aproximadamente, trinta livros publicados no Brasil com grande sucesso de público.

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U3 Para Bauman (1999), a globalização é a bola da vez! É uma palavra que está na moda e que tem acarretado efeitos bastante alarmantes, mas que não conseguimos definir exatamente o que é. O fato é que a globalização é o destino inevitável do mundo e é um processo que afeta a todos nós. O alerta do autor é o de que o fenômeno da globalização traz elementos que, muitas vezes, não conseguimos enxergar a olho nu e, portanto, precisamos de uma análise crítica e cuidadosa para conseguirmos compreender seus resultados no mundo e suas consequências na sociedade. “O significado mais profundo transmitido pela ideia da globalização é o do caráter indeterminado, indisciplinado e de autopropulsão dos assuntos mundiais; a ausência de um centro, de um painel de controle […]” (BAUMAN, 1999, p. 67). De acordo com Bauman (1999), com o fenômeno da globalização, a tarefa do Estado de promover e assegurar o bem-estar da população está cada vez mais enfraquecida, o que favorece a livre circulação do capital, representada pelos mercados mundiais e grandes empresas privadas. Nas palavras do autor:

Devido à total e inexorável disseminação das regras de livre mercado e, sobretudo, ao livre movimento do capital e das finanças, a “economia” é progressivamente isentada do controle político; com efeito, o significado primordial do termo “economia” é o de “área não política”. O que quer que restou da política, espera-se, deve ser tratado pelo Estado […], mas o Estado não deve tocar em coisa alguma relacionada à vida econômica: qualquer tentativa nesse sentido enfrentaria imediata e furiosa punição dos mercados mundiais (BAUMAN, 1999, p. 74).

As palavras que descrevem este atual momento global, para o autor, são: liberalização, desregulamentação, flexibilidade, fluidez. Esta nova condição causa um sentimento de ansiedade provocada pela dolorosa experiência da incerteza. “A incerteza e a angústia […] são produtos básicos da globalização” (BAUMAN, 2005, p. 84). Você já deve ter percebido que a forma de pensar deste autor é bem enérgica e radical, com mensagens éticas fortes, fazendo-nos refletir sobre fatores que, muitas vezes, estão ocultos e camuflados, e por isso não percebemos, mas que induzem nossos pensamentos e ações, e interferem na sociedade e nas condições de trabalho. Em suas obras, Bauman (1999; 2001; 2005) utiliza o termo “líquido” para designar o estado atual da sociedade, no qual tudo é efêmero, temporário, fluido.

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U3 Vamos entender essa metáfora do autor: convido você a imaginar um recipiente vazio prestes a ser preenchido com líquido. Seja qual for o formato deste recipiente, o líquido toma a sua forma e, ao ser esvaziado, o líquido logo se vai, sem deixar qualquer vestígio. É esta a metáfora que, para o autor, explica a condição da sociedade nesta nova era.

‘Fluidez’ é a qualidade de líquidos e gases. O que os distingue dos sólidos […] é que eles ‘não podem suportar uma força tangencial ou deformante quando imóveis’ e assim ‘sofrem uma constante mudança de forma quando submetidos a tal tensão’ (BAUMAN, 2001, p. 07).

Em uma entrevista com Bauman, Pallares-Burke (2004) relata as mensagens do próprio sociólogo de que, diferente da sociedade moderna de antigamente, chamada por ele de “modernidade sólida”, hoje estamos vivendo uma “modernidade líquida”, na qual tudo está sendo permanentemente desmontado e sem perspectiva de permanência; em que tudo é temporário, comparando-se ao líquido por caracterizar-se pela incapacidade de manter a forma. Nesta lógica, as instituições das quais fazemos parte, os quadros de referência, os estilos de vida, as crenças, os valores e as convicções mudam antes que tenham tempo de se solidificar em costumes, hábitos e verdades. Uma das características marcantes dessa sociedade moderna (ou pós-moderna) é a sua relação com o consumo. Fontenelle (2008) relata que Bauman, ao tentar definir a atual sociedade, explica que se trata de uma sociedade de consumo em um sentido bastante especial, uma vez que esta sociedade molda seus membros para exercerem o papel de consumidores.

Você já parou para pensar quantos shoppings existem na sua região, em seu Estado? Também já analisou a estrutura dos shoppings (lojas, praças de alimentação, áreas de lazer)? Pense em uma experiência que viveu ao ir ao shopping.

De acordo com Santos (1993), o shopping é o templo desta nova sociedade. Perceba que toda estrutura e funcionamento dos shoppings são próprios para o consumo, e as pessoas que lá frequentam são, antes de tudo, consumidores.

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U3 Isso não quer dizer que antigamente não havia consumo. É claro que havia! O consumo de antigamente, do início da era moderna, porém, referia-se à satisfação das necessidades humanas, ou seja, comer para não ter fome, vestir para se proteger do frio e para cumprir as normas da vida em sociedade, os sapatos para não machucar os pés, a casa para dar segurança, entre outros exemplos. Nos dias atuais, segundo Bauman (2001), o consumo é guiado pelo “querer”, pelo desejo de possuir, que se tornaram estimulantes poderosos no ato de comprar. Os produtos que são ofertados hoje atendem os mais variados tipos de públicos e são personalizados. Pense, por exemplo, em quantas marcas diferentes de shampoo encontramos nas prateleiras dos supermercados e estabelecimentos comerciais; uma marca para cada tipo específico de cabelo. Ou ainda, em quantos tipos de sapatos, roupas, acessórios temos à disposição. Os eletroeletrônicos, por sua vez, são destaque em inovação por oferecer funções cada vez mais diversificadas em aparelhos cada vez menores. Automóveis, cujos novos modelos, cada vez mais sofisticados e funcionais, são lançados ano a ano. Para modelar o desejo dos consumidores, estratégias de marketing são criadas, tornando a imagem e a fantasia mais interessantes do que a própria realidade. Com isso, percebemos que “[…] as campanhas de marketing […] reforçam o nível e a intensidade dos ambientes e do comportamento individual de consumo, em qualquer tempo e o tempo todo” (FONTENELLE, 2008, p. 86).

Uma das características marcantes dessa sociedade moderna (ou pós-moderna) é a sua relação com o consumo

Vamos assistir a um comercial de TV, entre tantos outros, cuja finalidade não é apenas a venda de um produto para satisfazer uma necessidade, mas sim transmitir a imagem de beleza, encantamento, felicidade e sonho. Acesso o link: <https://www.youtube.com/watch?v=BAAKj8FtvpQ>

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U3 Assim como analisa Bauman (2001), a vida organizada em torno do consumo é orientada pela sedução, por desejos sempre crescentes e quereres inconstantes, reforçando ainda mais a ideia por ele introduzida de liquidez e fluidez. Estas novas demandas sociais e estes novos estilos de vida na sociedade atual também interferem no significado do trabalho e no seu formato de gestão dentro das organizações. Por isso, o trabalho deve ser compreendido em todo seu entorno, não sendo considerado um fator isolado, mas sim um fenômeno que recebe influências dos aspectos sociais, econômicos e culturais, que também atuam sobre este cenário.

1. Qual a relação do conceito de Subjetividade com o Trabalho, considerando o novo cenário social no qual estamos vivendo?

2. O sociólogo Zygmunt Bauman utiliza em suas obras o termo “líquido” para se referir às condições da sociedade na atualidade. De acordo com as contribuições deste autor, o que quer dizer o termo “líquido”? e culturais, que também atuam sobre este cenário.

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Seção 2 O significado do trabalho para o ser humano em sua individualidade e coletividade Certamente, você está lendo este livro com o objetivo de aprofundar seu conhecimento para aplicá-lo em seu trabalho, seja ele qual for. O trabalho está presente em nossa vida desde a tenra idade, no cotidiano de nossa família e amigos, nas instituições as quais fazemos parte e/ou conhecemos, nos meios de comunicação, enfim, em todo lugar. Isso nos leva a refletir que a constituição da humanidade se deu, em grande parte, pela existência do trabalho.

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