7 minute read

dão aos profissionais - Rostos da Pandemia

Rostos da Pandemia

tados por SARS-CoV-2. A 13 de março, entraram os primeiros doentes COVID-19 na Medicina I do Hospital Padre Américo, em Penafiel. Alexandrino Coelho, assistente operacional, não esquece a data, é aqui que trabalha, o primeiro serviço de internamento do CHTS a receber infe-

Advertisement

Alexandrino conta já com 18 anos de casa, passou pelo Serviço de Urgência e, desde 2005, está no Serviço de Medicina Interna, mais propriamente no internamento Medicina I.

Há 10 meses na linha da frente, fala do que sentiu inicialmente, na primeira vaga da pandemia, em março, “uma experiência nova”, uma doença sobre a qual ainda se sabia pouco, “não sabíamos o que iríamos enfrentar”.

Pesa-lhe a ausência de visitas aos doentes internados porque muitos, principalmente os mais idosos, não compreendiam a razão e “achavam que tinham sido abandonados pela família”. “Viam-se fora do seu contexto familiar, entre quatro paredes, numa enfermaria”, tendo como único contacto os profissionais de saúde, “nós, completamente equipados e a só poderem ver-nos os olhos”, com uma palavra de conforto, a tentar explicar porque não era possível receber visitas e que as famílias esperavam por eles.

A maioria da população reconhece o trabalho dos profissionais de saúde, considera, embora “uma pequena percentagem não conheça a realidade do dia-a-dia de um hospital”.

O alerta que deixa é: “cumpram as normas e as restrições. Este Natal é diferente, mas há Natal todos os anos e vida só temos uma!”

Paula Aires é enfermeira, em Amarante, há 25 anos e já passou pela Obstetrícia, Bloco Operatório e Psiquiatria até chegar ao internamento de Medicina Interna, Ala B, onde se encontra atualmente.

Depois de uma primeira vaga mais calma, pois nessa altura o Hospital de São Gonçalo não teve doentes COVID-19, na segunda vaga, diz, “mudou tudo, foi muito diferente”. O grande número de doentes que recorriam ao Centro Hospitalar ditou que fosse criada uma Unidade de Internamento COVID-19 em Amarante. Foi necessário, rapidamente, preparar espaços e equipa “com o apoio da Infeciologia, GCL-PPCIRA e de algumas colegas do Hospital Padre Américo que tinham já estado em internamentos COVID-19 e que vieram cá. Depois, foi o nosso esforço pessoal, a nossa capacidade de adaptação para dar resposta a estes doentes que precisam de nós diariamente”.

Quanto a momentos marcantes, refere, de uma forma geral, o momento de sair do hospital e chegar a casa. “Temos a noção de que estamos a fazer tudo direitinho e revemos muitas vezes as indicações, mas depois saímos e temos a família em casa e a grande preocupação é essa: será que fizemos tudo bem, será que podemos entrar em casa? O meu maior medo é contaminar a minha família.”

Acredita que, nesta fase, “a comunidade já começa a reconhecer o trabalho dos profissionais de saúde”. Na primeira vaga “as pessoas não cumpriam as regras. A segunda vaga foi muito pesada para nós e muito por causa disso. Neste momento, estão mais conscientes, já cumprem mais e também já nos respeitam mais pelo nosso trabalho”.

“É muito difícil estar aqui a recebê-los, sobretudo as pessoas mais idosas e perceber que foi alguém da família que, ainda que sem intenção, os infetou. É importante que os familiares se protejam a si próprios para assim protegerem os idosos que têm em casa, mais debilitados e com um risco maior de coisas não correrem bem”.

Técnico coordenador do Serviço de Imagiologia, Luís Ramalho, com 30 anos de casa, foi o primeiro a radiografar utentes nas áreas COVID-19 do Serviço de Urgência do Hospital Padre Américo.

Estar na linha da frente, diz, “foi como estar na linha da frente de outras situações, quem opta por este tipo de profissões, sabe que estas coisas podem acontecer, talvez não todas com a gravidade desta e com as implicações que está a ter, mas não é muito diferente do que lidar com outras coisas”.

“Foi preciso adotar alguns cuidados, não tão poucos quanto isso, mas é apenas mais uma situação que a nossa profissão implica”, acrescenta.

“São doentes com patologias pulmonares, avaliados também pela Imagiologia com a realização de raios-X e TAC torácicos”, explica, “o TAC não podia deslocar-se para as áreas COVID-19, mas reorganizamos os circuitos e colocamos nessas áreas equipamentos que evitam que ambas as tipologias de doentes - suspeitos e confir-

mados - tenham que circular pelo hospital para realizarem os exames”.

“Houve claramente um esforço, quer em termos de equipamentos, quer em termos de recursos humanos para conseguirmos responder a todas essas solicitações”, salienta.

Assume não ter uma situação específica marcante, no entanto, “quando os doentes são imensos, chegamos a pensar se teremos capacidade de resposta, é algo que nos assusta. Não estamos imunes a este tipo de perceção”.

No início, “perante uma infeção que não conhecíamos bem, havia o receio de as coisas correrem mal para o nosso lado. Há sempre algum medo associado”.

Afirma que a comunidade reconhece o trabalho dos profissionais, mas coloca dúvidas em relação aos “serviços de saúde, nomeadamente os nossos governantes”.

A mensagem que pretende deixar à comunidade é só uma: ajudem-nos a ajudar-vos.

“Se a comunidade não tiver algum cuidado, se não restringir alguns comportamentos, corremos o risco de quando cá chegarem, não termos capacidade, em absoluto, para os ajudar”.

Leandra Rodrigues é um dos rostos do balcão de admissão do Serviço de Urgência. Faz parte do Hospital Padre Américo há 19 anos, tendo passado pelo Serviço de Arquivo antes de integrar a equipa da Urgência.

Confessa que o medo maior foi na primeira vaga, “o desconhecimento sobre a doença foi dramático, as pessoas chegavam, sem nenhum cuidado em relação a distanciamentos físicos. Mas fomo-nos adaptando e controlando, conseguimos acalmar um pouco as pessoas e normalizar as admissões dos utentes”.

Na segunda vaga, em novembro, pensou muitas vezes como “era possível ainda estarmos ali a trabalhar, a fazer a admissão de tanta gente, mas conseguimos”.

Pela positiva, marcou-lhe o sorriso de algumas crianças que “entravam e saíam a sorrir, alheados ao que se estava a passar” e o caso de uma conhecida, “grávida e positiva, trazida pelos bombeiros todos equipados. Correu tudo bem, nem o bebé, nem o pai eram positivos. Fiquei feliz”. Aos utentes pede compreensão pelo trabalho que está a ser feito e “que primeiro se dirijam ao Centro de Saúde. Se o SNS 24 lhes diz para não vir ao hospital e manda mensagem para marcarem o teste nos centros de rastreio, façam isso. Deixem a urgência para as situações realmente urgentes”.

Anestesiologista, Sara Jordana Mota trabalha há cerca de 2 anos no CHTS. Confessa que sentiu “um bocadinho de medo pelo desconhecido” e porque, também, “fomos colocados em posições que, normalmente, não estávamos habituados, apesar dos Cuidados Intensivos e a Sala de Emergência fazerem parte do nosso Internato, não é uma coisa que façamos no dia-a-dia, muito menos com doentes COVID-19, numa fase inicial, em março e abril, que ainda ninguém sabia muito bem como abordar”.

Depois, diz, sobre trabalhar na linha da frente, “a seguir à Medicina Intensiva e à Medicina Interna, se calhar, somos as pessoas mais indicadas para o papel e, por isso, é cumprir uma missão e dar o nosso melhor”.

São os episódios na Urgência que tem mais presente, “doentes com infeção grave por SARS-CoV-2 que chegaram à Sala de Emergência bastante debilitados, o que obrigou a uma intubação imediata, marca-nos estar perante a instabilidade de um doente e saber que a nossa resposta pode fazer a diferença entre a vida e a morte”.

Numa fase inicial, acredita, “as pessoas, apesar de haver sempre algumas críticas, reconheceram o trabalho dos profissionais de saúde”. “Cancelaram-se consultas e cirurgias programadas, mas houve mais compreensão e as pessoas estavam todas numa mesma direção”.

“Nesta segunda vaga, houve uma inversão, não é a mesma coisa, apesar de a situação, agora, estar um bocadinho pior, não reconhecem tanto”.

“Por parte dos familiares, com quem contactamos na Unidade de Cuidados Intensivos, existe o reconhecimento e estão agradecidos porque realmente veem o nosso trabalho. Mas quem está de fora, quem não foi diretamente afetado ou quem não teve um familiar com COVID-19, não compreende.”

“Claro que o emprego e a economia e tudo mais sofreram alterações, acredito que haja um cansaço, estamos todos cansados, nós também, mas continuamos a ter doentes”.

Há alturas em que, acredita, a comunidade reconhece o “Eu sei que está a ser difícil para toda a gente, incluíndo trabalho dos profissionais de saúde, “no entanto, no dia- nós, tanto profissionais como familiares, nós também tea-dia, principalmente quando estão aqui na Urgência, mos família em casa, também não temos gozado a vida respeitam pouco, as pessoas estão ansiosas e descar- familiar em pleno. Mas estamos a lutar para levar esta regam em nós. Mas não me sinto frustrada, faço o meu situação a bom porto.” trabalho”. Conheça outros rostos da pandemia, no site do CHTS, em www.chts.min-saude.pt

This article is from: