APDA - Serviços de Águas Os próximos 30 anos_Versão Portuguesa

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Os prรณximos 30 anos APDA

Cenรกrios para o mundo em 2050

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João Pedro Matos Fernandes Ministro do Ambiente

Tal como inscrito no Programa do Governo que tenho a honra de integrar como responsável pela pasta do Ambiente, os serviços urbanos de águas constituem um setor de relevante interesse público, indissociáveis da qualidade de vida dos cidadãos. Como é sobejamente conhecido, Portugal fez uma trajetória notável neste domínio nos últimos 30 anos, importando continuar a garantir a sustentabilidade social, ambiental, económica e financeira associada à prestação destes serviços. Neste enquadramento, considero que as políticas públicas deverão continuar a influenciar positivamente o setor promovendo a adopção de modelos inovadores de gestão que potenciem a eficiência, para que Portugal siga alinhado na dianteira. Mas, não menos importante, é decidir numa base planeada e sustentada. É, por isto, que não posso deixar de me congratular com a iniciativa da APDA em promover o exercício prospetivo com o foco nos serviços de águas cujos resultados aqui se apresentam. Este projeto, sendo o primeiro estudo desta natureza elaborado em Portugal, vem corroborar a maturidade dos profissionais do setor, em especial daqueles que integram associações como a APDA e sem os quais os sucessos alcançados não poderiam

ter seguramente sido concretizados. Vem também mostrar aos nossos parceiros nacionais e internacionais que o setor tem massa crítica e capacidade de mobilização, que permitem, através de um processo com ampla participação e divulgação, apresentar cenários para o setor, devidamente enquadrados globalmente e à escala nacional, criativos, mas igualmente lógicos. Estou certo de que as visões a 30 anos aqui materializadas permitirão ao setor dos serviços urbanos de águas dispor de uma ferramenta estratégica para que, perante um mundo em mudança, aproveite as melhores oportunidades para beneficiar todos os que utilizam diariamente os serviços de águas.


Nelson Geada Presidente do Conselho Diretivo APDA

A Publicação “Serviços de Águas – Os Próximos 30 anos” é um trabalho notável desenvolvido por uma equipa alargada, coordenada magistralmente pelo Dr. Sérgio Hora Lopes. É com muito orgulho que verifico que a APDA conseguiu mobilizar tantas instituições e tantos especialistas para uma reflexão sobre os serviços de águas nos próximos 30 anos, significando isto que o poderá voltar a fazer para trabalhos futuros, de natureza similar ou distinta. Sendo um exercício de prospetiva sobre o futuro dos serviços de águas, é interessante verificar que é possível, tomando como base o próprio texto, dissertar e analisar quase todos os aspetos que constituem as preocupações relativas ao futuro da humanidade e do planeta. De facto, a Associação e as suas iniciativas, como os seminários e outras, poderão incluir reflexões sobre temas tão variados como a globalização, a geoestratégia ou o modelo de desenvolvimento, demonstrando como os assuntos do setor se correlacionam com todos os aspetos da vida e sociedade.

Sérgio Hora Lopes Coordenador da Equipa de Coordenação Executiva APDA

Em nome de todos os associados da APDA – Associação Portuguesa de Distribuição e Drenagem de Águas, saúdo todos os que direta ou indiretamente tornaram possível a construção desta publicação e a ti Sérgio Hora Lopes um grande abraço coletivo, pelo muito que até agora deste à APDA com um verdadeiro espírito de serviço público.

O estudo apresentado nesta publicação resulta de um processo de reflexão muito pouco frequente no âmbito dos serviços de águas e, especialmente, em Portugal. O trabalho pretende responder a uma iniciativa da APDA, que resolveu assinalar os seus trinta anos de atividade olhando, não para o passado, mas para o que o futuro anuncia. Ainda bem que o fez e a equipa responsável pelo projeto está-lhe grata por esta iniciativa. A elaboração deste trabalho envolveu a inteligência, dedicação e esforço de muitas pessoas. Quase três centenas de técnicos e investigadores, de variada proveniência científica (antropólogos, economistas, geógrafos, biólogos, engenheiros informáticos, de ambiente, hidráulicos, etc.) e institucional (universidades, institutos de investigação, “utilities”, municípios, etc.) em seminários, inquéritos, workshops e reuniões mais restritas ajudaram a equipa de coordenação do projeto na descoberta das inúmeras possibilidades com que o mundo, Portugal e os serviços de águas poderão evoluir nas próximas décadas. A todos os nossos agradecimentos pois, sem eles, o trabalho desenvolvido durante dois anos não teria a complexidade e alcançado a profundidade que este ensaio prospetivo tem. Ressalve-se o facto de que o documento

agora apresentado reflete a visão da equipa de coordenação e, por isso, não responsabiliza as pessoas que connosco colaboraram. Toda a equipa de coordenação está de parabéns pelo trabalho desenvolvido mas não posso deixar de realçar o contributo especial da Dra. Fátima Azevedo. Muito obrigado. Sendo um trabalho de prospetiva, não pode ser visto como propostas de futuros, mais ou menos desejáveis, mas somente como futuros plausíveis. Esperamos que tenhamos sido capazes de captar os contraditórios sinais dos tempos, cuja plausibilidade só dentro de décadas será possível aferir. A partir do momento em que um trabalho se torna público, deixa de ser de quem o elaborou e passa a ser dos seus leitores. A nossa expectativa é que seja um trabalho útil para a alargada comunidade associada aos serviços de águas (poderes públicos, reguladores, empresas, universidades e institutos de investigação, consultores, etc.) e que a ajude a definir as melhores estratégias para um futuro melhor para todos os que beneficiam dos serviços de águas: o planeta e quem nele vive.


Porquê “os próximos 30 anos: sobre o futuro dos Serviços de Águas”?

Cenários para o mundo em 2050

Implicações para Portugal

Cenários Serviços Urbanos de Águas

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12 A Motivação

26 Infográfico

38 Entre Muros

49 Elementos pré-determinados

15 A Opção Metodológica

28 Entre Muros

40 Lego War

50 Entre Muros

19 Elementos pré-determinados

30 Lego War

42 Governos, S.A

54 Lego War

20 Tendências e Incertezas

32 Governos, S.A

44 Paz Perpétua

58 Governos, S.A

34 Paz Perpétua

62 Paz Perpétua 67 Conclusão


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Os próximos 30 anos APDA

Porquê “os próximos 30 anos: sobre o futuro dos Serviços de Águas”?

A Motivação

Alguns dos drivers contraditórios da era em que vivemos são as alterações climáticas, a escassez de recursos naturais, a crescente interdependência, a globalização e o nacionalismo, as inovações tecnológicas disruptivas, a divergência demográfica e o alargamento da classe média, mas também das desigualdades. Esses drivers irão certamente influenciar o futuro do mundo e do país. Os serviços de águas irão também ser diferentes dentro de três décadas, na viragem para a segunda metade deste século. Mas em que medida? E em que direção evoluirão? Não é possível, seguramente, responder a estas questões de um modo preciso, pois ninguém tem capacidade de prever o que irá ocorrer. Podemos é pensar em futuros possíveis e, a partir daí, tentar responder às questões que se podem vir a colocar.

Foi com este objetivo e com o foco em tentar compreender “Como Irão os Serviços de Águas Cumprir a sua Missão em 2050” que a APDA - Associação Portuguesa de Distribuição e Drenagem de Águas decidiu levar a cabo o exercício de prospetiva que agora apresentamos. Um exercício que resultou de um processo de interação com stakeholders de várias áreas de atividade, das esferas pública e privada e da academia. Este forte envolvimento com outros profissionais e decisores permitiu-nos uma ampla e discutida reflexão exploratória sobre o futuro do nosso admirável mundo, sempre novo, tendo por base fatores multidimensionais e a consciência da lógica de nexo que tanto contribui para caracterizar este contexto V.I.C.A. (volátil, incerto, complexo e ambíguo; acrónimo VUCA em inglês). A partir da reflexão sobre os cenários globais,

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2018

Julho 1º Reunião da Equipa de Coordenação Executiva (ECE).

Fevereiro 1º Reunião da Comissão de Acompanhamento.

Janeiro Seminário “O Mundo em 2050. A nova revolução Industrial: implicações no sector da água” GT3.

4ª e 5ª Reuniões da Comissão de Acompanhamento;

Abril Seminário “O Mundo em 2050 Tendências, Riscos e Impacto no Território” GT1.

Outubro 3º Reunião da Comissão de Acompanhamento.

Maio Inquérito GT4: Governança e Modelos de Gestão dos Serviços de Águas.

Construção de Cenários Caracterização dos fatores-chave e dos cenários globais.

Julho Inquérito GT3: Evolução e futuro das tecnologias d e tratamento e informação.

Maio Workshop final “Cenários Globais e as Implicações para Portugal e para os Serviços Urbanos de Águas”

Outubro Sessões temáticas GT2: Ambiente e Recursos Hídricos. Novembro 2ª Reunião da Comissão de Acompanhamento.

Construção de cenários e draft das narrativas.

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Cenários Finais; Edição e Publicação.


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Seminários

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Inquéritos

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Reuniões

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Workshops

A Opção Metodológica Equipa de Coordenação (C) identificou o foco, envolveu e convidou stakeholders (S) relevantes para a Comissão de Acompanhamento (CA). 4 grupos de trabalho (GT) para analisar tendências (STTEEP), construir matriz e identificar incertezas críticas.

Para apoiar a ECE foi instituída uma Comissão de Acompanhamento (CA), que integra personalidades representantes de vários stakeholders do setor parceiros do projeto. Durante mais de dois anos a ECE coordenou um alargado trabalho de reflexão que envolveu perto de 300 especialistas de várias áreas (economistas, sociólogos, historiadores, antropólogos, tecnólogos, ambientalistas, gestores, geógrafos, demógrafos, além de especialistas de recursos hídricos e de gestão de operadores) e com origens diferentes (investigadores universitários, consultores, outros profissionais do setor, técnicos de empresas de fornecedoras de tecnologias, ativistas). Foram elaborados dois inquéritos, um sobre “A evolução e o tratamento das tecnologias de tratamento e informação” e outro sobre “Governança - Modelos de Gestão dos

Para desenvolver o projeto foi criada a Equipa de Coordenação Executiva (ECE), que integra técnicos que cobrem as várias valências (prospetiva, gestão de projetos, governança, económica/financeira, ambiental, empresarial, tecnológica, social, etc.). Os membros da ECE coordenam os 4 Grupos de Trabalho:

procurámos determinar as implicações de cada um desses futuros possíveis para Portugal e, finalmente, para os serviços de águas. Sendo os serviços de águas uma atividade essencial ao desenvolvimento humano, a forma como evoluem depende largamente do que se passa na sua envolvente. Assim, neste trabalho, parte-se das visões dos mundos possíveis para avaliar como elas interagem com os serviços de águas. Queremos ver estes serviços numa perspetiva integrada nas suas envolventes política, económica, social, tecnológica e ambiental e, por isso, partimos do “desenho” dos cenários macro para os cenários dos serviços de águas. Consideramos que é esta a melhor forma de pensar o futuro para o setor e ajudar as entidades gestoras na definição das estratégias mais adequadas de resposta a tantos e tão complexos desafios com que se irão confrontar.

GT1  Demografia, Território, Economia, Sociedade; GT2  Ambiente e Recursos Hídricos; GT3  Evolução e Futuro das Tecnologias de Tratamento e Informação; GT4  Governança e Modelos de Gestão dos Serviços de Águas.

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O Processo Metodológico

Serviços de Águas”. Foram promovidos dois seminários, um sobre “O Mundo em 2050: Tendências, Riscos e Impacto no Território” e um segundo, internacional, sobre “O Mundo em 2050: A nova revolução industrial: implicações no setor da água”. Igualmente foram levados a cabo dois workshops, um sobre “Ambiente e Recursos Hídricos” e outro sobre “Cenários Globais e as Implicações para Portugal e para os Serviços Urbanos de Águas”, para discutir como os cenários globais (ambiental, político, económico, social e tecnológico), previamente elaborados, impactavam em Portugal e, principalmente, nos serviços de águas. O resultado deste trabalho é agora apresentado para discussão de todas as entidades interessadas na gestão do ciclo urbano da água: municípios, operadores, administração pública, empresas fornecedoras,

investigadores e técnicos. Pretendemos, durante o ano de 2018, levar a cabo reuniões de reflexão sobre o trabalho com os vários interessados. Por último, uma nota de agradecimento ao Conselho Diretivo da APDA pela iniciativa, a todos os que participaram nas ações levadas a cabo durante a elaboração do projeto, aos patrocinadores, Águas de Portugal, Águas do Ribatejo e Navia, à ERSAR, pelo apoio à publicação e divulgação, e ao Ministério do Ambiente, pelo suporte institucional. Sem eles este trabalho não existiria.

1 ORIENTAR Stakeholders; Foco 3 SINTETIZAR Cenários Globais

3 SINTETIZAR Cenários Serviços Urbanos de Águas

2 EXPLORAR Incertezas Críticas; Elementos Pré-determinados

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4 ATUAR Implicações; Agenda Estratégica.

5 MONITORIZAR Indicadores de Evolução, Sistema de Monitorização

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Foco: Como irão os Serviços de Águas cumprir a sua missão em 2050

Elementos pré-determinados Não existirão eventos globais disruptivos que possam pôr em causa a ordem mundial e o planeta (guerra nuclear, pandemia global, etc).

Os 3 I’s Importância

Incerteza

Independência

Tendências Chave/ Significativas

Incertezas Cruciais

Elevado Impacto / Reduzida incerteza

Crescimento lento

Divergência demográfica

Menor intensidade energética

Menor intensidade carbónica

Opções tecnológicas de baixo custo

Mais renováveis num paradigma fóssil

Alterações climáticas com reflexo em elevado stress hídrico

Primado da eficiência de recursos

Impacto

Elevado Impacto / Elevada incerteza

Reduzido Impacto / Reduzida incerteza

Elementos de Contexto

Incerteza

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Porquê “os próximos 30 anos: sobre o futuro dos Serviços de Águas”?

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Os próximos 30 anos APDA

Porquê “os próximos 30 anos: sobre o futuro dos Serviços de Águas”?

Incertezas Globais

Incertezas Críticas Dinâmica interna (solidez do sistema político e das instituições; geração de capital social proativo ou adaptativo; capacity building ou descredibilização) Trade-off curto e longo prazo e globalização (volatilidade, complexidade e exigências de resposta rápida a processos globais como alterações climáticas, demográficas e tecnológicas (+ ou – disruptivas)

Modelo político preponderante

Fontes de poder?

Democracia Representativa versus Sistemas autoritários

Cultural versus Economia hi-tech

Economia e Inovação

Cidades

Sociedade

Norte/Sul

Tecnologia resolve versus Tecnologia não basta

Liderança versus Adaptação

Fragmentada versus Global

Cooperação versus Domínio

Fundamentalismos Religiosos

Modelo de crescimento

Localizados e centrados versus Generalizados e anárquicos

Linear versus Circular

Globalização

Pessoas

Superpotências versus Mundo Flat

Exclusão versus Inclusão

Impactos ambientais Limitadores versus Aceleradores

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Evolução Ser humano

Divergência/ instabilidade de regime nos principais atores

Dinâmica interna

Convergência/ renovação de regime nos principais atores

Capitalismo popular/ protecionismo com foco no longo prazo

Dinâmica internacional

Globalização/ cooperação com foco no longo prazo

Incremental versus Disruptiva

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Cená rios pa ra o

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A combinação destas duas incertezas permitiu construir quatro cenários com narrativas distintas para o mundo em 2050. “Entre Muros” e “Lego War” são os dois cenários de um mundo marcado por opções de curto prazo e que se distinguem pela capacidade ou não de renovação dos sistemas políticos e económicos dos principais atores; “Governos S.A” e “Paz Perpétua” são cenários marcados pela globalização, mas que se distinguem nas lógicas e modelos de funcionamento e governança das principais potências mundiais.

Sistemas políticos instáveis nos principais atores

Capitalismo popular/ protecionismo focado no curto prazo

Cooperação global de longo prazo

Reforma dos sistemas políticos nos principais atores

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A incerteza é a matéria-prima de qualquer exercício de construção de cenários com o objetivo de explorar futuros alternativos para a questão central em estudo – o foco – que é, no nosso caso, como irão os serviços de águas realizar a sua missão em 2050. Como já mencionámos, a opção metodológica envolveu três etapas: a construção de cenários globais, suas implicações para Portugal e, finalmente, para os serviços de águas. A partir de um conjunto de seis dezenas de tendências (pp.20/21) – processos em curso, com impacto e incerteza variáveis – tipificadas e analisadas de acordo com o modelo STTEEP (acrónimo em inglês – sociedade, tecnologia, território, economia, ambiente e política), construímos uma matriz com o objetivo de identificar as que comungavam três características - elevado impacto, incerteza e independência (pp.18). Tal permitiu-nos reduzir o universo de análise a 12 incertezas globais (pp.22), atendendo a um conjunto de elementos pré-determinados (pp.19) que se manterão ao longo do período analisado e optar pela exploração de quatro cenários globais resultantes da dinâmica de duas incertezas críticas (pp.23) – uma de natureza doméstica – em que medida os regimes dos protagonistas mundiais se renovam ou não num contexto de erosão do conceito de Estado-Nação; e outra – de natureza externa – que evolui entre o capitalismo popular, protecionismo económico e centrado no curto prazo ou para uma nova vaga de globalização vocacionada para a cooperação e planeamento a longo prazo.

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Divergência demográfica conduz a um reforço dos fluxos migratórios com destino aos países mais desenvolvidos que, apesar de em processo de estagnação/redução da população, tendem a (re)erguer restrições a imigrantes num contexto de maior tensão social interna provocada pela incapacidade de criar emprego. Crescimento lento com reduzida criação de emprego e com foco em atividades de maior conteúdo tecnológico tende a agravar desigualdades sociais e territoriais à escala nacional e global. Os “perdedores da globalização” tendem a defender um regresso ao protecionismo, conferindo um novo élan aos movimentos nacionalistas e à disseminação do capitalismo popular. Decréscimo da cooperação global no âmbito de desafios como as alterações

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climáticas ou a Agenda 2030, fragilizando e conferindo maior instabilidade às instituições multilaterais, nomeadamente as Nações Unidas e dificuldade em gerir a Organização Mundial de Comércio com sucessivas medidas de retaliação entre países no que respeita à proteção de atividades líderes. Regresso à economia fóssil, adiando por tempo indeterminado novas opções tecnológicas no âmbito da energia, por força de opções de menor custo, com consequências na degradação ambiental e na agudização dos efeitos combinados de eventos extremos, carência económica e escassez de recursos, nomeadamente em África e Ásia, ainda em fase de expansão demográfica. Negligência da componente ambiental, invertendo a tendência de mitigação às

alterações climáticas, com aumento global das emissões de gases com efeito estufa (GEE) e com uma residual componente de adaptação e legislação heterogénea. Num mundo com maior população e reduzida capacidade de aumentar a geração de riqueza, os riscos globais associados à segurança hídrica, energética e alimentar são muito elevados. Exacerbação do individualismo e agravamento dos conflitos entre gerações, entre os empregados e desempregados, dificultando sobrevivência de modelos de segurança, proteção e solidariedade social, o que induz maior risco sistémico.

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“Entre Muros” retrata um mundo não cooperativo, com as principais potências refugiadas no protecionismo e incapazes de reformar os seus modelos de governação num contexto de crescimento muito lento. A expansão demográfica torna as pressões migratórias num rastilho de conflitos e os riscos globais associados à segurança hídrica, energética e alimentar são muito elevados.


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O ajustamento dos modelos nacionais faz-se com um recuo da globalização, produzindo uma Lego War entre “campeões regionais”. O crescimento económico mundial é lento e heterogéneo, com a China a projetar a sua influência do Pacífico para o Atlântico, a Europa de “clubes” com velocidade variada e os EUA a rentabilizarem a capacidade de inovação.

Divergência demográfica mas com um fluxo migratório inferior ao do cenário “entre-muros”, dada a tendência para uma intensificação da cooperação regional, nomeadamente entre o mundo menos desenvolvido, procurando aumentar poder negocial ancorado em soft skills e do ascendente das economias do Pacífico (excedentes correntes a financiar desenvolvidos “velhos” e incapazes de acelerar crescimento e emprego) e do Atlântico Sul (energia); aumento das receitas de exportações a Sul conduz à explosão da classe média e alguns ganhos na redução da pobreza. Divergência de ritmos de crescimento Norte-Sul com emergentes a criar bolsas de inovação e acesso a matérias-primas determinantes para atividades inovadoras;

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Menor cooperação global face ao cenário business as usual (BaU), mas capacidade para avançar com Acordo de Paris por ser fator para o reforço e ambição de liderança chinesa em termos de transição para uma economia mais verde que lhe permite aumentar área de influência regional, diversificar opções energéticas e desenvolver estratégia de internacionalização pela nova rota da seda, com solidariedade sul-sul no nexo água-energia-alimentação. O crescimento económico mundial é lento e heterogéneo entre blocos, com os EUA a procurar aproveitar capacidade de inovação na área das tecnologias energéticas não convencionais e na liderança relativamente a atividades estratégicas de elevado conteúdo

tecnológico para impor uma “economia do gás natural” negligenciando a componente ambiental e beneficiando dos recursos endógenos para criar riqueza e emprego; a União Europeia regressa primeiramente a uma lógica de Mercado Interno, com cooperação limitada na zona euro e privilégio de soluções bilaterais e evoluindo, mais para o final do período, para um contexto de “Clubes”, instituindo várias velocidades de integração em troca da segurança de fronteiras.

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Divergência demográfica com crescente reforço da urbanização cria uma vaga de globalização liderada por cidades globais, que geram novas formas de governança independentes da letargia do poder público e veiculadas pelas oportunidades de acumulação de capital das empresas multinacionais. A incapacidade de renovação dos sistemas políticos nas economias mais desenvolvidas, espelhadas por um crescente afastamento do interesse “comum” e a crise endémica do “estado nação” dão azo ao aparecimento de uma lógica capitalista a partir das cidades e das oportunidades geradas pelos grandes desafios globais, nomeadamente na construção de infraestruturas verdes que permitam a adaptação aos efeitos das alterações climáticas, na exploração do potencial

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dos recursos oceânicos, da conetividade digital ou da mobilidade sustentável, sem esquecer a descentralização da eletricidade ou de novos bens e serviços gerados numa lógica de circularidade, técnica e biológica. Enquanto financiadores do Acordo de Paris e criadores de inovação, Mayors e Magnatas são legitimados pelas populações à medida que se cria emprego numa lógica de gestão “empresarial” do “interesse comum”, desde a privatização das funções sociais do Estado à disrupção tecnológica que gera riqueza. A competição/cooperação entre as grandes multinacionais permite que a produtividade dos recursos aumente significativamente em várias regiões do planeta. A distribuição dos resultados obtidos é tema que gera conflitos entre grupos sociais e geografias.

A governança vai exigir uma cuidada clarificação das fronteiras entre objetivos empresariais e políticos. Questões de compatibilização das ética corporativa e social irão colocar-se.

A crise endémica do “estado nação” faz emergir uma lógica capitalista ancorada na aliança entre autarcas e empresários, reiterando um cenário de “Governos S.A”, onde as cidades lideram e competem sob a égide da ética corporativa.

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Os próximos 30 anos APDA

Contenção gradual do crescimento demográfico mundial, à medida que os países em desenvolvimento reduzem a taxa de natalidade com os investimentos realizados no âmbito da Agenda 2030 no que respeita à saúde, educação, redução da pobreza e diversificação das estruturas produtivas. Contenção das assimetrias de desenvolvimento Norte-Sul, com ganhos crescentes de catching up do Sul, fruto da intensificação das cooperação com emergentes asiáticos, dos instrumentos de financiamento de índole multilateral e do investimento direto estrangeiro em setores-âncora para o nexus alimentação-água-energia-clima. A convergência de interesses dos principais atores em torno de uma maior eficiência de recursos aliada à proteção e conservação

A convergência de interesses dos principais atores em torno de uma maior eficiência de recursos favorece o reforço da globalização centrada na sustentabilidade e a adequação dos modelos nacionais a uma prosperidade potenciadora da inovação, da aproximação Norte-Sul e, sobretudo, não refém do crescimento económico.

As sociedades mais desenvolvidas estabelecem Acordo de S. Petesburgo, fomentado pela Rússia que, refém de uma estratégia centrada nos seus recursos fósseis, acaba por evoluir para uma parceria com a União Europeia, EUA e China. Convergência tecnológica a par de uma valorização das “tecnologias apropriadas” nos países em desenvolvimento permite concretizar projetos-piloto de gestão otimizada de recursos hídricos para posterior disseminação.

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ambiental permite avançar no investimento de tecnologias disruptivas na área energética, apoiados em parcerias público-privadas e em experiências-piloto em países em desenvolvimento. Cooperação global permite maior ambição nas metas do Acordo de Paris, propiciando a contenção de efeitos das alterações climáticas, nomeadamente na otimização de gestão de recursos hídricos e na exploração de fontes de energias alternativas em mar profundo (deep-sea) e no espaço. O forte avanço na conetividade digital é acompanhado por investimento na área de educação e formação, facilitando a mobilidade social e a transição para um modelo económico mais eficiente na utilização de recursos naturais.

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Os próximos 30 anos APDA

Clara redução da população, com acentuado envelhecimento face a um crescimento natural negativo, reforçado pelo saldo migratório negativo, marcado por um fluxo de emigração fundamentalmente de jovens e confirmando o cenário mais pessimista das projeções realizadas há 30 anos. A fragmentação da União Europeia com abandono de uma lógica de construção de uma união política salda-se pela criação de “clubes” de acordo com a capacidade de um restrito número de países em celebrar acordos setoriais, nomeadamente no que respeita à segurança e defesa, segurança energética e informática. A significativa redução do orçamento comunitário penaliza a já frágil política de coesão, com efeitos muito penalizadores do financiamento dos países mais vulneráveis, entre os quais Portugal.

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Com muitas dificuldades no financiamento externo, a estagnação económica ganha fôlego e o país aprofunda ainda mais o dualismo de décadas, com elevadas perdas na coesão social e territorial – a população concentra-se nas cidades do litoral, que, devido aos fluxos migratórios, mantêm, no global, o nível de residentes; no interior, a população é residual. Esta letargia sócio-económica mitiga rapidamente os passos ténues dados em anos anteriores no sentido de maior eficiência de recursos, com a adoção de princípios de circularidade, verificando-se uma “travagem” na economia verde e um regresso a opções energéticas de menor custo, nomeadamente o carvão para a geração de eletricidade, impossibilitando o cumprimento das metas assumidas para um aumento máximo da temperatura global em 2°C; algumas empresas,

capitalizando parcerias anteriores com a Chi- carenciado de quadros qualificados que perna para a produção e exportação de soluções mitam a diversificação e aproveitamento do energéticas renováveis, conseguem manter al- capital natural e histórico. gum dinamismo, nomeadamente no seio dos países africanos de língua portuguesa. A vulnerabilidade já existente relativamente às alterações climáticas acentua-se, especialmente em regiões mais desfavorecidas, com secas prolongadas e interrupção de serviços de abastecimento nos aglomerados do interior do país. A maior pressão das va- Em Portugal, o cenário riáveis ambientais evidencia a escassez de re“Entre Muros” traduz-se cursos e a fragilidade do setor agrícola. Ainda assim, o baixo risco de segurança em elevadas perdas na permite continuar a atrair serviços de back- coesão e territorial, além office de algumas multinacionais na área da de acentuar a vulnerabilidade telecomunicações e tecnologias de informação, com o turismo a manter o estatuto de nacional aos efeitos pilar-mor na especialização produtiva, mas das alterações climáticas.

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Os próximos 30 anos APDA

Implicações para Portugal

Numa guerra de blocos, Portugal procura capitalizar o alargamento de influência da China no Atlântico e integrar o clube de países da União Europeia que avançam no combate às alterações climáticas e transição energética como forma de estancar maiores perdas de coesão social.

Num mundo em que a lógica de cooperação se centra na esfera regional, com um catching-up do Sul relativamente ao Norte ancorado no dinamismo inovador das emergentes do Pacífico, as pressões migratórias na Europa são inferiores às de um cenário “entre-muros”. Num contexto de crescimento muito lento nas economias mais desenvolvidas, o foco da União Europeia é salvaguardar o mercado comum, com privilégio de soluções bilaterais e cooperação limitada no seio da zona euro. Numa Europa a várias velocidades, Portugal mantem a população por via da imigração, mas com muitas dificuldades em recuperar um crescimento natural. A taxa de natalidade melhora, mas não o suficiente para impedir o continuado envelhecimento da população.

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Com um dualismo reforçado, a perda de centros de decisão nacionais em setores estratégicos é a solução para procurar evitar maiores perdas de coesão social. A baixa dos padrões europeus no contexto das pressões ambientais salda-se por fraca inovação e renovação de infraestruturas, enquanto as oportunidades na energia são o maior potencial no contexto do reforço da cooperação chinesa em África, no âmbito da nova rota da Seda; da mesma forma, no Atlântico sul, num contexto de subida do preço do petróleo, as parcerias para a exploração conferem algum fulgor às empresas portuguesas, que ambicionam a integração com a água e telecomunicações.

O baixo risco de segurança permite que Portugal se mantenha entre os principais destinos turísticos europeus, conseguindo diversificar e ganhar eficiência com a desmaterialização e virtualização das plataformas de trading.

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Implicações para Portugal

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Este cenário resulta de uma nova vaga de globalização ancorada não na competição tradicional entre estados-nação, mais ou menos colaborativos, mas na emergência de um novo modelo de governação, em que líderes de cidades e de empresas (mayors e majors) estabelecem parcerias para acelerar a eficiência de recursos e a transição de paradigma energético como forma de potenciar o crescimento através de forte impulso de investimento em tecnologias, tendencialmente disruptivas, infraestruturas e economia circular. Os produtos industriais passam a ser concebidos como serviços e otimiza-se a gestão de resíduos, reduzindo a sua produção e valorizando a sua reciclagem, numa simbiose da indústria 4.0, capacitada pelo binómio energia-clima, com a circularidade, que acelera a

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eficiência dos recursos naturais. Neste quadro, algumas das cidades europeias ganham protagonismo, a par de asiáticas, africanas e do médio oriente, num contexto global de urbanização de ⅔ da população mundial, o que atrai líderes empresariais globais. O crescente peso dos serviços em Portugal, as soft skills da população mais qualificada combinadas com um custo mais baixo que outros parceiros europeus e as boas condições de conetividade digital e internacional funcionam como fator de atração para as majors no âmbito de um sistema que já se tinha regionalizado e em que o poder dos autarcas se tornou mais assertivo que o poder central, em queda abissal face a perdas de coesão social e territorial.

Assim, o investimento estrangeiro acelera o crescimento das start-up, nomeadamente na área das utilities e das tecnologias ambientais, transformando as cidades-líder em laboratórios vivos para soluções de inteligência artificial, conversão e transformação tecnológica e dispositivos médicos. As cidades ganhadoras estendem a sua área de influência gerando maior fragmentação social e setorial, com a perda das atividades industriais tradicionais e intensivas em trabalho menos qualificado em prol de atividades de maior conteúdo tecnológico e de serviços de excelência na área do turismo, moda e náutica. Em contraste a este dinamismo, as pressões subjacentes a bolsas de desemprego geram maiores desigualdades num quadro em

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que os direitos associados ao anterior contrato social são reequacionados para uma lógica de flexisegurança, provocando alterações profundas na estrutura de funcionamento do mercado de trabalho.

Num futuro marcado por um ritmo de globalização ditado pelas cidades, o dualismo histórico de Portugal conduz a uma agudização das tensões no mercado de trabalho.


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afluxo de imigrantes jovens qualificados, do Pacífico e do Atlântico sul. As estruturas flexíveis das empresas da vanguarda tecnológica, resultantes de um modelo de cooperação virtuosa entre a academia, as empresas e as prioridades de política pública em termos de inovação, permitem aceder ao pelotão da frente em termos de conetividade digital e a fixação de vários centros de investigação fundamental internacionais em território nacional. Mas o mercado de emprego a várias velocidades, a par do elevado peso das necessidades de financiamento público, provoca crescentes preocupações com o pilar social, que se torna, assim, no maior desafio para evitar um exército de excluídos e garantir a sustentabilidade das gerações subsequentes.

A opção estratégica de integrar os países pioneiros na mudança de paradigma económico no sentido da neutralidade carbónica e circularidade permite a Portugal mitigar riscos de coesão territorial, social e ambiental.

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Caso a globalização retome a trajetória de cooperação global, galvanizada pelo imperativo de combate às alterações climáticas de 2030, Portugal tem a vantagem competitiva de ter integrado, no seio da União Europeia, o “clube” de países que acordaram em acelerar a economia circular e a transformação da produção e consumo numa lógica de resiliência e sustentabilidade. Esses ganhos permitem chegar a meados do século com um crescimento mais robusto, favorecido pela maior eficiência de recursos e a opção por um modelo territorial mais policêntrico, centrado na distribuição mais equitativa dos rendimentos da globalização. A evolução demográfica permite ligeira redução do índice de dependência, através do aumento da taxa de natalidade e de um

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Cenรกr ios Se rvi รงo s

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Cenários Serviços Urbanos de Águas

Elementos pré-determinados Não existirão eventos ou inovações disruptivos que possam alterar o paradigma histórico do modelo de prestação de serviços de águas.

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Intensificação de eventos extremos

Escassez dos recursos hídricos

Envelhecimento da população

Fraca coesão territorial

Heterogeneidade do território

Indústria de rede com tendência monopolista

Elevadas necessidades de financiamento

Primado da eficiência de recursos

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Eficiência de Recursos Os recursos hídricos estão pressionados, fundamentalmente devido à escassez, ao aumento da procura do setor agrícola e à fragilidade dos processos de planeamento das bacias hidrográficas. Esta situação deriva do colapso do processo de construção da União Europeia, levando ao isolamento dos países e, por outro lado, da escassez decorrente das alterações climáticas (cujos impactes se tornaram cada vez mais gravosos devido ao colapso do Acordo de Paris). As barreiras ao comércio implicam uma maior dependência dos recursos alimentares nacionais, pelo que o setor agrícola intensifica a procura de água, não conseguindo acompanhá-la com medidas de eficiência. A diminuição de importância da regulação ambiental reflete-se no empobrecimento do

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processo de planeamento das bacias hidrográficas, que não consegue resolver conflitos de utilização dos recursos e não garante o bom estado de todas as massas de água. Ao nível do ciclo urbano da água, a escassez é assunto da agenda, mas com consequências práticas limitadas. As dificuldades financeiras, associadas à débil regulação, pesam mais que a qualidade, a fiabilidade e a sustentabilidade do serviço. A gestão das infraestruturas e os níveis de serviço têm assimetrias altamente determinadas pela concentração da população e de grande parte da atividade económica em centros urbanos do litoral. Estas assimetrias refletem-se igualmente a nível dos custos do serviço, superiores nas pequenas Entidades Gestoras (EG), o que é agravado por carências de financiamento, bem como por

fragilidades na gestão das infraestruturas e na Operação e Manutenção (O&M). A eficiência na utilização de recursos, como forma de mitigar ou resolver os problemas existentes, é condicionada pelas dificuldades de importação de tecnologia e de financiamento, bem como pela involução do nível de exigência que o setor coloca a si próprio. Como o volume de investimento é muito baixo, os projetos de reabilitação e/ou de construção de infraestruturas ficam condicionados.

financeira das EG. Esta situação é mais grave no interior, onde predominam sistemas de pequena dimensão. A assimetria interior/litoral origina drivers diferenciados para a evolução do papel dos municípios: i tendência para EG regionais no litoral e locais no interior (centradas nas cidades de pequena ou média dimensão); ii caráter urbano da população do litoral, favorecendo EG regionais e profissionais, sobretudo onde existe tradição de associativismo municipal; iii possível acentuação, no interior, de uma gestão essenModelos de Negócio e Governança cialmente reativa e menos profissional. Na / Âmbito Territorial maior parte dos casos as EG integram o setor As dificuldades financeiras e a escassez de público. As entidades do setor privado com quadros qualificados, além de limitarem a intervenção relevante no setor são dinamieficiência e a sustentabilidade, têm fortes im- zadas por grupos económicos nacionais com plicações ao nível da gestão e da autonomia competências em domínios específicos, como

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a construção ou a O&M. As EG são encaradas estritamente como prestadoras de serviços básicos à população, com importância acrescida decorrente da escassez de recursos hídricos, recaindo sobre aquelas algumas funções sociais em termos de garantia de acesso à água (tarifas sociais). Portanto, os instrumentos de gestão do lado da procura não têm expressão significativa. A escassez de recursos hídricos, agravada nas bacias hidrográficas internacionais (v.g., novos desafios na gestão de acordos com Espanha), leva a aproveitamentos hidráulicos de âmbito regional, cuja execução é limitada pelas dificuldades de financiamento. O serviço de saneamento regressa à fórmula do “desembaraço de águas residuais”. A prossecução de ganhos de escala está ausente da agenda dos decisores locais, permanecendo importante para o poder central. O efeito prático desta última perspetiva é limitado pela reduzida importância da regulação dos serviços. No entanto, o percurso já feito com a implementação dos sistemas multimunicipais constitui entrave ao regresso à atomização que caracterizou os sistemas nas primeiras décadas do poder local democrático.

O isolamento do País conduz à resignação perante os problemas da escassez e das ineficiências.

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Interface com a população Apesar da preocupação em manter um serviço de qualidade, as pressões associadas ao insuficiente cash flow para investimentos necessários na manutenção/renovação da rede saldam-se por uma redução global do nível de qualidade do serviço prestado, nomeadamente nas EG mais pequenas. Assim, há uma clara diferenciação do nível de qualidade do serviço das EG nas dicotomias litoral/interior e grande/pequena dimensão. Este processo ganha escala pela extinção das obrigações subjacentes à transposição das Diretivas Europeias, nomeadamente no que respeita aos padrões de qualidade das origens, valores-limite de emissão das descargas de águas residuais, qualidade da água para consumo humano, continuidade e pressão do abastecimento, implicando uma ausência de progresso, ou mesmo um retrocesso, face aos patamares alcançados nas primeiras duas décadas do século XXI. Esta situação tem ainda consequências na qualidade da água para outros usos diretamente relevantes para a população, como por exemplo o balnear. A degradação do nível global de qualidade de vida da população, interior e mais envelhecida, dita uma menor disponibilidade (e possibilidade) de pagar os serviços de águas. Há uma menor valorização coletiva do recurso água enquanto fator de preservação ambiental e uma maior valorização individual. Esta menor valorização coletiva, acentuada pelos custos acrescidos nos serviços de águas, principalmente nas EG de menor dimensão, põe em causa a possibilidade de financiamento das EG, potenciando situações de conflitualidade social e política.

Cenários Serviços Urbanos de Águas

Tecnologia e Inovação O isolamento do País condiciona a inovação essencialmente por duas vias: i as barreiras comerciais funcionam como entrave à difusão de tecnologias e à inovação; ii a ausência de estímulos na sociedade leva ao conformismo perante os problemas da escassez e das ineficiências. No que respeita ao tratamento de águas residuais, a maior preocupação consiste em restringir os custos. A economia circular é marginal e apenas implementada em alguns núcleos urbanos, em resultado da falta de água e da pressão de grupos sociais com expressão eleitoral. Verifica-se ainda preocupação com a segurança da informação, dada a ocorrência de problemas que chegam a pôr em causa o funcionamento de sistemas. Neste contexto de inércia tecnológica, não se verificam alterações de monta no tipo e nos processos de gestão das infraestruturas, o que se traduz numa lógica de tratamento convencional dos ativos e de menor incentivo à eficiência na utilização de recursos como, por exemplo, no controlo das perdas de água. Financiamento O financiamento da atividade é muito condicionado pelo contexto macroeconómico desfavorável, fruto da estagnação do rendimento disponível das famílias numa economia com crescimento muito escasso. O aumento do custo do serviço, principalmente nas EG de pequena dimensão e a fraca disponibilidade para pagar são resultantes dessa estagnação. A inexistência de fundos comunitários vem agravar os problemas de insuficiência de recursos. A baixa recuperação de custos pelas

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O volume muito baixo de investimento condiciona a reabilitação ou construção de infraestruturas.

tarifas obriga a um acréscimo do financiamento pelo contribuinte. O envolvimento por parte do setor privado tem por obstáculo a baixa rendibilidade do capital investido (Return over Investment ROI), decorrente da redução de população, bem como da obsolescência e de um crescente sobredimensionamento dos sistemas (por via da diminuição da procura agregada urbana). Face ao elevado risco, o setor privado mantém-se como prestador de serviços e só marginalmente surge como financiador. A debilidade dos meios de financiamento traduz-se em défices estruturais e/ou em redução de custos, que envolvem a degradação do serviço. Regulação A regulação, de qualidade do serviço e económica, desempenha um papel secundário e influencia debilmente o desempenho dos serviços da águas. A gestão pública, predominante, as dificuldades de financiamento, a menor valorização coletiva e a maior conflitualidade pelo recurso-água, bem como a legislação menos assertiva são, entre outros, fatores que limitam a força do poder regulatório. No entanto, com a “nacionalização” do setor, o regulador poderá alargar a esfera de intervenção na componente de supervisão de investimentos e do financiamento, assumindo responsabilidades de natureza administrativa em projetos estratégicos.


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Eficiência de Recursos A intensificação da pressão sobre os recursos hídricos é controlada, dada a importância que continua a ser conferida aos processos de planeamento das bacias hidrográficas, nos quais a sustentabilidade permanece um objetivo. Esta situação decorre da continuidade do processo de construção da União Europeia, mesmo que a várias velocidades. Por idênticas razões, a economia circular da água continua na agenda e a eficiência mantém-se como uma das exigências associadas a todo o ciclo urbano da água. O setor agrícola tem um balanço tendencialmente neutro na procura, conjugando o incremento da produção e a melhoria da eficiência. A eficiência é ainda incentivada pela escassez originada pelas alterações climáticas (mitigadas pela implementação

Cenários Serviços Urbanos de Águas

parcial das medidas previstas no Acordo de Paris). Muitas EG têm capacidade financeira, decorrente de uma recuperação de custos tendencialmente integral nas zonas urbanas e com alguma relevância em outras áreas, o que possibilita a execução de investimentos para melhoria da sustentabilidade e da eficiência. Estes investimentos são ainda determinados por objetivos setoriais, fixados no âmbito de políticas de ambiente nacionais e comunitárias. Todavia, a capacidade de investimento é limitada devido ao quadro de crescimento, económico e demográfico, muito lento. Mesmo assim, o setor continua a ter alguma capacidade de mobilização de profissionais qualificados e de acesso a incentivos. As exigências das novas tecnologias com forte componente digital acentuam as assimetrias entre EG, em

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função da sua capacidade de recuperação de custos e/ou da obtenção de subsídios.

tendencialmente integral, nas zonas urbanas e com alguma relevância em outras áreas), atenua a assimetria interior/litoral e esbate a diferenciação de drivers para a evolução do papel dos municípios nos diferentes territórios. Efetivamente, se no litoral existe uma forte tendência para empresas regionais, essa tendência também existe, ainda que de forma mais moderada, no interior (centrada nas cidades de pequena ou média dimensão). O conceito de multiutilities é equacionado ou objeto de casos-piloto em algumas áreas de concentração urbana. A gestão pública dos sistemas coexiste com a gestão privada e/ou mista. Os players incluem grupos económicos europeus, eventualmente associados a grupos económicos nacionais. O setor privado alarga a sua atuação à gestão integral de sistemas,

Modelos de Negócio e Governança / Âmbito Territorial A relevância para as EG da eficiência e da sustentabilidade condiciona muitas decisões de investimento e tem fortes implicações na gestão técnica e financeira, apoiada em quadros qualificados que o setor consegue mobilizar. O setor reforça, assim, a sua capacidade de associação e, consequentemente, a capacidade de inovar em termos de modelos de negócio e de governança, sendo reforçado pela existência de quadros qualificados, principalmente nos centros urbanos e científicos. Esta situação, conjugada com a autonomia financeira de muitas EG (recuperação de custos,

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nomeadamente com soluções patenteadas/ proprietárias. Reconhece-se a necessidade de tarifa social, potencialmente financiada por instrumentos de política social, não constituindo por isso um encargo para as EG. Pode ser necessário desenhar soluções para sistemas de titularidade estatal ou de parcerias Estado/municípios em áreas com perda acentuada de população e atividade económica.

de evolução do setor, bem como das tensões sociais e políticas, que tornam incerto o desfecho da evolução. Tecnologia e Inovação A tecnologia e a inovação desenvolvem-se no sentido de suportar os objetivos das políticas comunitárias de qualidade do serviço, sustentabilidade e circularidade económica. Todavia, a implementação de soluções avançadas e inovadoras ocorre sobretudo nos centros urbanos do litoral e, mesmo assim, de forma limitada pela frágil capacidade de investimento e pela lentidão do crescimento económico e demográfico. Tais limitações ao investimento conferem importância à gestão de ativos, com adaptação de soluções tecnológicas, especialmente nos aglomerados urbanos. Outra área com implementação menos condicionada é a das energias renováveis, em consequência dos objetivos nacionais e comunitários relacionados com o Acordo de Paris. Acresce que, numa UE a várias velocidades, a dinâmica tecnológica e de inovação dos países mais avançados pode ter efeitos induzidos, acelerando e aprofundando a mudança, neste setor, também nos países periféricos. O contexto geopolítico de tensão permanente implica preocupações com a segurança física do produto e a segurança informática da gestão de dados, nomeadamente em termos de capacidade de alarme e de controlo de intrusão.

Interface com a população A qualidade do serviço mantém-se uma prioridade, apesar das limitações financeiras, o que se verifica nas EG do litoral e, dadas as exigências comunitárias, igualmente em outras áreas do território, embora com níveis diferenciados. Há grupos sociais, maioritariamente localizados em centros urbanos do litoral, que valorizam os serviços de águas, incluindo numa perspetiva ambiental. Esta situação implica uma tendência de assimetria quanto às perceções dos consumidores no que respeita à valorização do recurso, ampliada pelas diferenças em termos de disponibilidade para pagar. Constata-se, portanto, uma dificuldade para algumas EG do interior em atingir os patamares desejados de qualidade do serviço, nomeadamente decorrentes das exigências comunitárias, dados os níveis de subfinanciamento. No âmbito do abastecimento de água, a garantia da segurança do produto é uma questão relevante para o cliente, o mesmo se aplicando à gestão de dados pessoais. Quanto ao saneamento, conseguem manter-se níveis de recolha e tratamento que continuam a assegurar bons padrões de qualidade das águas balneares. Em síntese, verifica-se a continuação das atuais tendências

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Cenários Serviços Urbanos de Águas

Financiamento O financiamento é preferencialmente assegurado por via das tarifas e, suplementarmente, pelos orçamentos nacionais e locais. Devem continuar a existir alguns financiamentos provenientes da União Europeia, como forma de dar resposta às regras e orientações comunitárias, embora o volume destes instrumentos financeiros seja muito menor em comparação com o passado. Mesmo assim, estes financiamentos podem ser importantes com vista à mitigação dos impactos das assimetrias interior/litoral, permitindo, ainda que limitadamente, “amortecer” as dificuldades sentidas pelas EG do interior. As questões relativas à acessibilidade económica condicionam a recuperação integral de custos, com reflexos na gestão dos ativos das EG. Sempre na dependência da ROI, há maior participação privada, que procura posicionar-se em toda a cadeia de valor da indústria da água e contribui, assim, para aumentar a capacidade do financiamento do serviço.

Regulação A regulação tem influência na forma como os serviços desempenham o seu papel. A capacidade financeira é diferenciada entre regiões, o que tem repercussão na atividade dos serviços prestados à população, criando dificuldades ainda maiores ao regulador. A confirmar-se que o regulador terá uma forte dependência do Governo, pode assumir um papel relevante na estruturação do setor, assim uma como influência sobre a atividade dos players, em que se incluem grandes grupos económicos europeus. A integração de Portugal no grupo de países que, após 2030, prosseguiu o caminho desenhado no Acordo de Paris pode potenciar um reforço da regulação. Esse reforço pode ocorrer no seio de um conjunto de países com regulação especifica do setor, em condições para comparar a sua performance com os demais e para adquirir o poder inerente à totalidade do grupo constituído pelo conjunto de reguladores.

Algumas Entidades Gestoras do interior apresentam dificuldades em atingir os níveis de qualidade de serviço desejados, devido ao subfinanciamento.

A integração de Portugal no grupo de países que, após 2030, prosseguiu o caminho desenhado no Acordo de Paris potencia um reforço da regulação.

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Eficiência de Recursos Os recursos hídricos confrontam-se com uma pressão mitigada, sendo moderado o risco de escassez. Os contextos europeu e mundial estão alinhados em torno de políticas e objetivos comuns, marcados pela liberalização das trocas, pela eficiência e pela circularidade na utilização dos recursos. Estas linhas estratégicas induzem uma gestão integrada e racional orientada para resultados, tendo como bandeira o Acordo de Paris, pontualmente subalternizado por uma lógica de mercado mais tradicionalista (economia gray & green). Os esforços de contenção na procura manifestam-se quer nos usos urbanos, quer agrícolas, onde são acompanhados por medidas de eficiência. No ciclo urbano da água, a escassez é tema da agenda política, gerando a

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adoção de soluções tecnológicas avançadas num contexto onde prevalece a preocupação com a eficiência. Em simultâneo com aquelas soluções tecnológicas verifica-se a existência de dinamismo no aumento da oferta e da qualidade dos serviços urbanos de águas, suportado pela criação de valor. A qualidade do serviço é altamente determinada pela escala, facilitada pela concentração da população e de grande parte da atividade económica nos centros urbanos. As carências decorrentes da diminuição da população e de um fraco crescimento acentuam assimetrias no desempenho entre EG do litoral e do interior. A ausência de iniciativas públicas suscetíveis de contrariar aquelas assimetrias, dadas as limitações dos orçamentos, pode condicionar o cumprimento das exigências ambientais e

de preservação de infraestruturas (sobretudo em EG no interior). No entanto, é admissível que uma nova relação urbano/rural incentivada pelas metrópoles possa, de algum modo, contrariar aquelas tendências assimétricas. O risco de uma gestão dos serviços urbanos de águas a duas velocidades é real se essa nova relação urbano/rural não acontecer. Modelos de Negócio e Governança / Âmbito Territorial Os objetivos ambientais estão enquadrados numa gestão orientada para resultados, traduzindo um equilíbrio entre a criação de valor e a sustentabilidade, equilíbrio que, naturalmente, influencia as decisões de investimento. O setor integra um leque alargado de quadros qualificados, sendo a gestão dominada

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por elementos com perfil tecnocrático. A tendência para a associação de EG adquire uma dimensão progressivamente empresarial. A inovação nos modelos de negócio e de governança permite melhorar o equilíbrio entre, por um lado, a criação de valor e, por outro, a sustentabilidade e a eficiência dos serviços. Os objetivos de criação de valor impulsionam o setor na diversificação da oferta de serviços, capitalizando os benefícios de uma relação privilegiada com o cliente. Assiste-se a um ambiente propício ao aparecimento das multiutilities. Esta evolução circunscreve-se aos territórios onde as EG conseguem atingir autonomia financeira, nomeadamente nos centros urbanos. A escala das EG com autonomia financeira é ditada por estritos critérios de racionalidade empresarial. Em plano


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complementar, são criados instrumentos de política social local, para financiar as tarifas sociais, libertando as EG do encargo de garantir o acesso ao serviço básico de populações desfavorecidas. A exploração e gestão de EG por entidades privadas é alargada, incluindo em sistemas regionais, sendo também múltiplos os casos de gestão mista, motivando o interesse de players internacionais. Em áreas geográficas de menor concentração populacional, a situação será eventualmente diferente, se não se verificar um novo modelo de relacionamento urbano/rural, podendo levar a uma gestão do ciclo urbano da água a duas velocidades. Nesse contexto, haverá necessidade de iniciativas públicas para melhoria das condições de gestão, nomeadamente em termos de subsídios e de qualificação tecnológica e profissional. Interface com a população A procura de uma relação privilegiada com o cliente conduz as EG dos centros urbanos a uma dinâmica tendente a maior e melhor serviço, beneficiando de privilegiadas ligações internacionais e prática de outras utilities. Nas regiões de menor concentração populacional prevalece a lógica de serviço mínimo, suportada nos parâmetros comunitários, com cíclicas tensões em torno do financiamento do serviço, oscilações da qualidade e assimetria com as EG dos centros urbanos. Esta assimetria pode ser atenuada com um eventual novo modelo de relação urbano/rural. Na ausência deste novo modelo, a qualidade da água distribuída e a qualidade das águas balneares podem igualmente revelar assimetrias. A disponibilidade para pagar, embora assimétrica,

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resulta da evolução dos rendimentos, associada ao reconhecimento do valor económico da água e do contributo das EG para a valorização ambiental. O potencial de instabilidade social e as dificuldades do Estado constituem preocupação recorrente. Tecnologia e Inovação O ambiente de cooperação internacional e o caráter transnacional do capital propiciam sinergias entre EG, no âmbito da tecnologia e da inovação: tais sinergias têm grande importância, dada a relação positiva entre a evolução para a sustentabilidade e as oportunidades de criação de valor. Do lado da oferta, os players tecnológicos competem entre si no desenvolvimento e na comercialização. Do lado da procura tecnológica, os operadores buscam as soluções mais competitivas para aumentar a rentabilidade e a quota de mercado. Este progresso, que pode aproveitar aos players verticais, permite alcançar patamares elevados de qualidade do serviço e gestão de ativos, sustentabilidade e circularidade; no entanto, é circunscrito às áreas urbanas, a menos que surja um novo modelo de relacionamento urbano/rural. A tecnologia e a inovação contribuem para maior eficiência no uso dos recursos e maior qualidade do serviço, bem como para níveis elevados de uso das energias renováveis e de segurança da informação, gerando uma forte componente de criação de valor com base na relação com o cliente.

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As carências decorrentes da diminuição da população e de um fraco crescimento acentuam assimetrias no desempenho entre EG do litoral e do interior. Financiamento A tarifa é o meio “normal” de recuperar custos. Assim, as tarifas financiam em grande parte o setor, concretizando a autonomia financeira e moderando a necessidade de utilização de outros instrumentos financeiros. Aumentam as preocupações com a acessibilidade económica, em especial em períodos de maior tensão política e social, apesar dos esforços de afetação de verbas públicas locais. Nas regiões de menor concentração populacional, a assimetria, em relação a outras regiões, dos serviços mínimos e da qualidade do serviço é utilizada para fomentar tensões e reivindicar maior solidariedade das áreas metropolitanas, com consequente afetação de verbas públicas nacionais. Tendo em conta as expectativas de rendibilidade e a necessidade de assegurar a disponibilidade dos stakeholders, a participação do setor privado, nacional e internacional, é ampliada, passando a abranger o financiamento de investimentos em infraestruturas. Regulação A regulação confronta-se com importantes desafios. Num quadro de grande poder corporativo, a auto-regulação pode tender a substituir a regulação pública. Esta, para conseguir desempenhar a sua missão num ambiente

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liberal, necessitaria de robustecer o suporte legal e os meios de ação, mas tal contrasta com as limitações que atingem os pilares da governação do Estado, existindo o risco da captura do regulador. A sociedade civil está dividida por fortes convicções que periodicamente dirimem argumentos, onde a capacidade de intervenção regulatória e os encargos impostos pela regulação são também tema recorrente. A necessidade de compatibilizar a pressão dos clientes com a contenção de custos, assim como a orientação para os resultados, dominante nas empresas do setor, pode implicar novos desafios aos reguladores.

A participação do setor privado, nacional e internacional, é ampliada.


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Eficiência de Recursos Os recursos hídricos estão pressionados, mas os padrões de utilização são crescentemente eficientes e os riscos de escassez são controlados por mecanismos eficazes e equitativos entre setores utilizadores. Esta situação decorre de uma adesão global à agenda de desenvolvimento sustentável das Nações Unidas e do aprofundamento do Acordo de Paris. Assim, é implementada uma gestão integrada e racional dos recursos hídricos, em que são aplicados os princípios da economia circular e capitalizadas as inovações tecnológicas ao dispor. Ao nível do ciclo urbano da água, a escassez constitui um tema muito relevante na agenda, assumindo-se como um dos principais drivers para a eficiência e para a circularidade, com soluções tecnológicas inovadoras e eficientes,

Modelos de Negócio e Governança / Âmbito Territorial As políticas ambientais prosseguem objetivos setoriais de qualidade e de eficiência do serviço, exigindo mecanismos de incentivo ao investimento e de mobilização de profissionais qualificados, que garantam níveis de excelência de gestão das EG. Verifica-se a coexistência de gestão pública e de gestão privada, com múltiplos casos de gestão mista (pública e privada), mas com atividade subordinada aos objetivos das políticas públicas acima referidos. As entidades do setor privado com intervenção relevante no setor são dinamizadas por grupos económicos nacionais e internacionais, com competências em toda a cadeia de valor da indústria. O conceito de multiutilities é equacionado e implementado.

As EG podem integrar outras componentes de negócio para melhorar o metabolismo urbano, em termos económicos e ambientais. Essa integração decorre de abordagem integrada do território. As EG são valorizadas enquanto organizações que preservam os recursos hídricos, explorando-os numa ótica de sustentabilidade económica, social e ambiental, com uma visão de circularidade. É assegurada a qualidade do serviço, em todo o ciclo urbano da água e da informação disponibilizada aos clientes. As tarifas são por estes reconhecidas como a forma mais adequada para alcançar e manter os níveis desejados de qualidade do serviço e de sustentabilidade do setor, num quadro de autonomia financeira muito forte por parte das EG. A componente social da tarifa é garantida por instrumentos de política

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determinadas por objetivos de sustentabilidade. Embora haja medidas de política tendentes à redução da concentração da população nos centros urbanos, são ainda necessários e aplicados, no âmbito do ciclo urbano da água, mecanismos para assegurar a equidade, bem como a aplicação de soluções e modelos de gestão inovadores. Assim, a gestão das infraestruturas e os níveis de serviço concentram-se na procura ativa da qualidade de serviço e da sustentabilidade, independentemente da área geográfica, implementando-se as melhores práticas disponíveis de O&M, adequadas às especificidades de cada sistema. Há uma preocupação generalizada em garantir níveis de reabilitação de infraestruturas que permitam assegurar a sustentabilidade da prestação de serviços de qualidade, a um custo adequado.

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social, alheios às EG, o que dá a estas maior legitimidade de atuação para a adequação das tarifas aos custos concretos de cada sistema. Para compensar as consequências das assimetrias regionais na eficiência da utilização de recursos, podem ser criados mecanismos de perequação. Igualmente é tida em conta a necessidade de criar soluções institucionais ajustadas às características locais do território, nomeadamente demográficas. Há também lugar ao desenvolvimento de soluções tecnológicas apropriadas. Novas concetualizações de sistemas e de drivers para a eficiência podem ser criadas em consequência da tecnologia e da inovação, bem como da alteração de paradigmas, designadamente no binómio sistemas locais específicos/sistemas geograficamente extensos.

Interface com a população A população é cada vez mais exigente com as EG, nomeadamente em matérias de qualidade de serviço, eficiência e relação com os stakeholders. Esta situação leva as EG a destacarem-se pelos níveis alcançados nas vertentes social, ambiental e económica. Perante a indiferença quanto ao modelo de negócio das EG e quanto à sua dimensão e localização, a ênfase das EG recai nos resultados, que têm de refletir o melhor interesse da população, cada vez mais e melhor informada das obrigações legais, nacionais e comunitárias. O aumento da exigência dos utilizadores é acompanhado por uma maior disponibilidade para pagar o custo dos serviços urbanos de água, resultante do reconhecimento do papel das EG numa lógica de uso eficiente, preservação e proteção dos recursos hídricos. A informação, sensibilização e educação dos stakeholders é encarada pelas EG como fundamental para o incremento do compromisso subjacente à relação tarifa/qualidade de serviço, num contexto em que se encontra garantida a acessibilidade económica.

A inovação é determinante e incentivada pela cooperação. A circularidade da economia é um pilar estratégico, promovendo a eficiência de recursos e a adequação dos serviços de águas à realidade sócio-económica.

Tecnologia e Inovação A inovação e o progresso tecnológico têm um papel determinante, sendo financeiramente incentivados por mecanismos nacionais e internacionais, assentes na cooperação entre EG, indústrias, comunidades científicas e países. A circularidade da economia está presente na definição da estratégia da inovação, seja tecnológica ou outra, promovendo a eficiência dos usos e a maior adequação

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dos sistemas à realidade social, económico e ambiental. Em resultado da capacidade de investimento, a gestão dos ativos sustenta a fiabilidade e a segurança da exploração, com forte orientação para a eficiência da utilização dos recursos hídricos e energéticos. No que respeita ao tratamento de águas, a inovação, integrando a evolução tecnológica das áreas de nanotecnologias, biotecnologias e outras, é determinante para a procura e a eliminação de poluentes emergentes, para o acréscimo de eficiência e para a descarbonização da atividade das EG. O foco da inovação e da tecnologia está, assim, dirigido para a resposta em termos de satisfação de necessidades, qualidade e eficiência dos serviços, bem como para a relação com os clientes, neste caso numa perspetiva de informação, sensibilização, educação ambiental e segurança de dados.

investidores institucionais, interessados na estabilidade e previsibilidade dos retornos proporcionados. Os operadores privados trabalham em toda a cadeia de valor, com princípios e valores determinantes para o sucesso e para o envolvimento dos stakeholders. Uma nova visão de sustentabilidade local e da configuração de sistemas empresariais municipais para pequenos aglomerados tem a tarifa como elemento central: componente principal de suporte do custo do serviço, incentivo à eficiência hídrica e instrumento de sinalização da escassez. Regulação Perante a maior abertura do setor, as dinâmicas de liberalização, de necessidade de ganhos de eficiência e de incentivo à inovação impõem a presença de reguladores fortes, competentes, independentes e robustos nas suas diferentes componentes, politica e técnica. O risco de uma ascensão da influência do setor privado sobre a regulação está sempre latente, impondo políticas e decisões dos poderes públicos, nacionais ou supranacionais, que garantam a transparência da concorrência. Fica assim potenciado o poder da regulação sobre o mercado, induzindo a sustentabilidade do recurso e promovendo o acréscimo dos valores individual e coletivo da água. Nesse âmbito, a componente tarifária é fundamental para incentivar a mudança comportamental dos consumidores sobre o uso eficiente da água, bem como para estruturar a eficiência das EG.

Financiamento Existe uma maior disponibilidade das famílias para suportar o custo de serviços urbanos de águas eficientes e robustos, por sentimento de equidade e de preservação do recurso. A previsibilidade da recuperação de custos a médio e longo prazos por via tarifária cria condições favoráveis à entrada de operadores privados, nacionais e multinacionais, decorrente do maior potencial para a ROI, de uma melhor definição de soluções, designadamente tarifárias, para suportar o custo do capital e da sustentabilidade económica dos sistemas. Esta situação coexiste com a preocupação com a garantia das obrigações ambientais e sociais dos serviços. À semelhança de outras utilities, o setor é igualmente atrativo para o financiamento por parte de

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O cumprimento da missão dos Serviços Urbanos de Águas em 2050 é indissociável da forma como a envolvente externa evolui. A exploração dos quatro cenários evidencia como as questões de financiamento dependem da continuidade da União Europeia e são determinantes para a sobrevivência das Entidades Gestoras, à luz dos elevados padrões de qualidade de serviços alcançados na transição para o século XXI. Nas próximas décadas, a projeção de quaisquer investimentos de reabilitação ou construção de infraestruturas estará condicionada se o mundo evoluir para o isolamento e os modelos de governação poderão sofrer significativas alterações, consoante evolua a valorização social do recurso e a intensidade cooperativa entre os atores. Este exercício prospetivo permite ainda explorar diferentes caminhos de evolução para a economia portuguesa e contribui para identificar quais são as forças motrizes que devem ser equacionadas pelas EG durante um processo de reflexão centrado no ajustamento estratégico no horizonte de 2050.

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A participação é uma mais-valia no exercício prospetivo. Public engagement and participation represent an added value for prospective exercise.

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Workshops e dinâmicas em grupo. Workshops and different collective dynamics.


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Equipa de Coordenação Executiva Executive Coordination Team Sérgio Hora Lopes - Coordenador/Chair (Águas de Portugal · APDA) Ana Margarida Luís (Águas de Portugal · APDA) Carlos Póvoa (Águas de Portugal) David Cabanas (C.M. Barreiro) Fátima Azevedo (Secretaria Geral · Ministério do Ambiente) Francisco Narciso (Águas de Portugal) Hilário Ribeiro (ITRON · APDA) Inês Trindade (Gestora do Projeto, APDA) João Simão Pires (UCP · PPA · APDA) J. Henrique Zenha (APDA) Miguel Carrinho (Águas do Ribatejo · APDA) Nuno Medeiros (Águas de Portugal) Paulo Nico (SMAS de Almada · APDA) Pedro Béraud (AdP Internacional · APDA)

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