ASSOCIAÇÃO PORTUGUESA DE DISTRIBUIÇÃO E DRENAGEM DE ÁGUAS
# FICHA TÉCNICA
Edição APDA
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Um Caminho para a Circularidade
Dedicamos o presente número à circularidade no domínio da água. Não nos referimos naturalmente à circularidade do milenar ciclo da água, já com a centenária interposição da sua componente urbana, mas a um círculo muito mais pequeno, um curto-circuito que dispensa a passagem pelos céus. Os artigos que dão vida a esta edição abordam a reutilização de águas residuais tratadas em Portugal segundo vertentes diversas, com desenvolvimento e, na nossa opinião, de forma particularmente interessante. Neste editorial procuramos fazer um muito breve e genérico ponto de situação do estado da arte no que respeita à implantação de soluções de produção de ApR (Água para Reutilização) no terreno, no nosso país.
O tema da economia circular aplicado às águas residuais já tem décadas, mesmo que não fosse muito falado e não nos actuais termos, mas só saltou para a ribalta há uns vinte anos, quando se tornou presença assídua em congressos e seminários promovidos no seio do sector da água, bem como no discurso dos políticos ligados ao mesmo. E veio obviamente para ficar: os fenómenos de escassez hídrica associados às alterações climáticas vêm-se fazendo sentir de forma crescente no nosso país, sobretudo no Alentejo, Algarve e Nordeste Transmontano, pelo que esse interesse se afigura perfeitamente expectável. E tudo isto num contexto internacional, e nomeadamente europeu, de grande preocupação com as questões do clima.
Vale a pena lembrar o esforço mais ambicioso, ou pelo menos o seu anúncio, jamais feito a nível do governo português nesta matéria. Em Novembro de 2017 o então Secretário de Estado do Ambiente anunciou no Parlamento
a intenção governamental de avançar para uma medida concreta e de grande impacto, a nível nacional. Estava em causa uma estratégia que incluía a promoção, por parte das entidades gestoras, de planos de acção para as 50 maiores ETAR urbanas com maior potencial de reutilização, com vista a que fossem alcançadas as metas de 10% de taxa de reutilização de águas residuais tratadas em 2025, e de 20% em 2030, no conjunto do país.
Note-se que em 2017, ano desta declaração, tinha-se vivido uma seca severa ou extrema em boa parte do território, o que tornava o assunto mais candente. Por essa altura, a edição então mais recente do RASARP, publicada pela ERSAR e referente aos dados de 2015, referia que apenas 1,2% das águas residuais tratadas em Portugal tinha sido reutilizada, cerca de metade da média de 2,4% então verificada na União Europeia e com a nuance de que o nosso país, localizado no Sul da Europa, deveria como tal situar-se acima da média e não abaixo. O RASARP indicava apenas 23 entidades gestoras que praticavam a reutilização em Portugal.
Vale naturalmente a pena a comparação com a actualidade. Acontece que não é possível fazer uma comparação directa com os dados mais recentes disponibilizados pela ERSAR, mas tão somente com os do RASARP 2022, referentes a 2021. Nesse ano, existiam 30 entidades envolvidas, um pouco mais que em 2015, mas a taxa de reutilização situou-se em 1,2% a nível nacional, exactamente igual à registada em 2015. Em seis anos o crescimento foi nulo!
São números que merecem uma reflexão séria. Mas há outros… que também merecem séria reflexão. É que os referidos dados
mais recentes da ERSAR, do RASARP 2023, referentes ao ano de 2022, apontam para uma taxa nacional ainda muito mais baixa: 0,4%. Já foi dito que este número não é comparável, mas será interessante tentar perceber se o motivo para essa não comparabilidade poderá ter implicações relevantes para a actividade de produção de ApR.
Raramente terá havido um tema tão consensual entre toda a sorte de intervenientes, governantes, decisores, técnicos, políticos, cientistas, comunicação social, e, simultaneamente, com tão escassos resultados práticos no terreno. Há que ressalvar que o PRR do Algarve, que em termos mediáticos tem sido injustamente circunscrito à dessalinização, contempla uma importante medida de produção de ApR em cinco ETAR da Águas do Algarve. Mas não há muito mais a assinalar, no que toca ao universo das soluções efectivas com potencial para uma alteração significativa do panorama nacional.
As razões para esta situação não serão difíceis de identificar e terão que ver com a existência de origens alternativas e com os custos respectivos. Em ilhas como Malta ou Chipre, a falta estrutural de alternativas baratas e suficientemente abundantes está associada ao registo de taxas elevadas de reutilização de águas residuais tratadas. No final do dia, é tudo terrivelmente simples: mesmo que eu seja um agricultor muito preocupado com as alterações climáticas e um forte adepto do uso de ApR, não deixarei por isso de procurar uma água mais barata, assim ela exista. É uma questão de pragmatismo.
Usamos o exemplo da agricultura por ser potencialmente a grande utilizadora de ApR e por estarmos aqui focados em soluções
com dimensão, mas estas considerações são adaptáveis a outras actividades. Os modelos de negócio da agricultura em Portugal assentam em geral em baixos custos da água, quando não nulos. A alteração deste estado de coisas significa uma verdadeira mudança estrutural, de difícil implementação. Afinal, na agricultura, como em qualquer outro ramo de actividade em que impere a concorrência, os custos de produção são determinantes para o desempenho dos actores no mercado.
A má notícia é que a produção de ApR tem custos não despiciendos. E, tal como o empresário agrícola tem obrigatoriamente de estar atento aos aspectos financeiros do seu negócio, o mesmo acontece com o fornecedor de água residual tratada. Nenhum dos dois equaciona ser acusado de gestão danosa da sua empresa ou entidade gestora, quando responder perante os seus accionistas, sócios ou dirigentes. O exemplo mais significativo será a situação em que o utilizador pretende recorrer à ApR exclusivamente nos períodos de escassez, por hipótese minoritários, regressando à origem predominante ao longo de todos os períodos de suficiência hídrica. Este negócio é do interesse do utilizador, mas inaceitável para o fornecedor de ApR, que tem custos de investimento a amortizar e custos de operação e manutenção a cobrir, não podendo aceitar uma situação de consumos ocasionais em regime de pronto-socorro.
Por outro lado, a já referida alteração recente da forma de contabilização da ApR, conduzindo a uma drástica redução da taxa nacional de reutilização, implica que, por exemplo, se uma entidade gestora descarrega água residual tratada destinada a reutilização numa lagoa, e a empresa gestora de um
campo de golfe vai captar a água para rega a essa lagoa, os caudais em causa eram contabilizados como ApR e deixaram de o ser. As soluções de ApR passaram a ter regras de licenciamento apertadas e, no caso vertente, a ApR teria de ser conduzida directamente ao destino, através de um sistema de adução próprio, sem passar pela lagoa. Com estas exigências, taxas de reutilização elevadas como as apresentadas por Espanha, muito baseadas na descarga do efluente tratado em linhas de água e captação para rega mais a jusante, sofrem cortes substanciais.
A redução da taxa nacional traduz assim o impacto associado à legislação de 2019 que estabeleceu as regras do licenciamento dos projectos de ApR e cujas disposições têm inevitáveis implicações em termos de investimento e de custos de operação incluindo de monitorização da qualidade da água. Não se disputa a sua bondade, mas o custo é precisamente o factor principal que tem limitado o crescimento, em número e em dimensão, das soluções de ApR. Os artigos desta edição escalpelizam toda esta problemática e vão muito para além dela, dado estar em causa um assunto vasto e com múltiplas e muito diversas vertentes.
Entretanto, poderá dizer-se que o enquadramento descrito, com substanciais desafios e dificuldades, não parece ser de molde a gerar grandes entusiasmos. Temos a opinião oposta: há todo um novo mundo à nossa frente, está quase tudo ainda por fazer. A fase do pioneirismo está a ser mais longa que o previsto, e isso não tem de ser mau. Aliás, os artigos ressumam esse carácter pioneiro, está no ar o dealbar de uma nova era. De certo modo, faz lembrar aquele período inesquecível, na primeira metade dos anos
noventa, em que se preparavam todas as profundas mudanças que vieram depois e que alteraram por completo o panorama do sector da água em Portugal.
É que não temos dúvida nenhuma que o quadro do recurso à ApR vai mudar muito substancialmente dentro dos próximos dez ou vinte anos. Muita coisa vai acontecer, o horizonte será outro, em múltiplas frentes.
Este número da revista, recheado de valiosos contributos, será um registo precioso de um tempo de preparação e de descoberta, ainda antes da vaga de fundo que irá inevitavelmente acontecer, só não sabemos a partir de quando.
Contribuíram, individual ou colectivamente: David Smith e Marta Oliver Tizón; Marcos Batista; Catarina Freitas; Filipe Araújo; Nuno Brôco; Maria João Rosa, Rita Ribeiro e Rui Viegas; Leonor Amaral, Inês Areosa, Tiago Martins e António Guerreiro de Brito; e a CEAR da APDA.
Boa leitura!
Pedro Laginha Diretor da Revista APDA
Frederico Martins Fernandes Vice-Presidente do Conselho Diretivo da APDA
ESPAÇO CONSELHO DIRETIVO
Os desafios da reutilização de Água
Encarada como uma solução essencial para enfrentar a crescente escassez hídrica, a reutilização de água deve, numa sociedade desenvolvida, ser muito mais do que isso. Deve ser assumida como um princípio, como uma boa prática, e ter um papel central em qualquer modelo de economia circular da comunidade. Esta prática, que envolve o tratamento e o reaproveitamento de águas residuais para usos não potáveis, tem demonstrado ser uma abordagem eficaz para a conservação dos recursos hídricos, reduzindo a dependência de fontes convencionais de água doce. Países como Singapura, Estados Unidos e Espanha têm liderado o caminho ao implementarem sistemas avançados de reutilização de água, criando modelos que aliam viabilidade técnica e económica à gestão eficiente de um recurso essencial.
O exemplo de Singapura é paradigmático do sucesso, já que o seu programa “NEWater” conseguiu transformar a perceção pública da água residual tratada, através de campanhas de sensibilização eficazes e do desenvolvimento de infraestruturas tecnológicas avançadas. Nos Estados Unidos, o Condado de Orange, na Califórnia, é um exemplo de como uma parceria público-privada pode financiar projetos robustos de reutilização de água, ajudando a mitigar a escassez em regiões frequentemente afetadas pela seca. Também em Espanha, a região da Catalunha tem vindo a adotar estratégias de reutilização de água para enfrentar crises de seca prolongadas. Já na China, foram recentemente implementadas centrais de reutilização autónomas, resultantes de investimento privado (Newater House), que recolhem água residual tratada nas ETAR para, depois de a submeter a um processo de nanofiltração direta, a disponibilizar aos parques industriais existentes na envolvente a um custo idêntico ao da água potável.
Em Portugal, o conceito de reutilização de água tem vindo a ganhar força, especialmente à medida que a escassez de água se torna mais premente em várias regiões do país. O quadro legislativo tem-se adaptado lentamente permitindo a expansão desta prática, especialmente em áreas urbanas e industriais. Um dos principais avanços foi a aprovação do Decreto-Lei n.º 119/2019, que estabeleceu o regime jurídico para a produção de Água para Reutilização (ApR) a partir de águas residuais tratadas. Este decreto criou uma base para a implementação de projetos de reutilização de água em Portugal, introduzindo o conceito “fit-for-purpose”, que define a qualidade da água reutilizada com base no seu uso final.
Mas se a legislação tem evoluído, a implementação plena da reutilização de água requer uma maior clareza regulatória e uma adaptação contínua dos normativos existentes. O Plano Estratégico Nacional para o Setor de Abastecimento de Água e de Saneamento de Águas Residuais (PENSAARP 2030), recentemente aprovado, reconhece que a reutilização de água deve ser uma prioridade estratégica para garantir a resiliência hídrica do país, especialmente em regiões com maior vulnerabilidade à seca, como o Alentejo e o Algarve.
Além disso, o PENSAARP 2030 reforça a importância da regulamentação adequada para assegurar a segurança sanitária e a proteção ambiental na reutilização de água. O Decreto-Lei n.º 119/2019 já introduziu um quadro legal robusto para a produção de ApR, mas o plano estratégico propõe
# ESPAÇO DO CONSELHO DIRETIVO
uma revisão e modernização das normas existentes para acelerar a sua implementação em todo o território. Isso envolve simplificar os processos de licenciamento e clarificar os requisitos técnicos para a reutilização de água em diferentes contextos.
O PENSAARP também reconhece que a reutilização de água em Portugal ainda está aquém do seu potencial, com taxas de reutilização muito baixas em comparação com outros países europeus. Um dos desafios identificados é a falta de coordenação entre as diferentes entidades gestoras e os municípios, o que leva a uma fragmentação dos esforços e à ineficiência na alocação de recursos. O plano defende uma maior cooperação entre entidades públicas e privadas, além da necessidade de desenvolver soluções descentralizadas que permitam o uso de ApR em zonas rurais e urbanas.
São já alguns os exemplos de cidades e entidades gestoras que têm desenvolvido projetos com aplicação prática desta legislação.
No Algarve, por exemplo, são vários os projetos desenvolvidos pela Águas do Algarve com vista à reutilização de águas residuais tratadas, tornando-as aptas para diversos usos, nos quais se destacam a irrigação de campos de golfe, infraestruturas com consumo de água expressivo, mas essenciais à economia e riqueza da região.
No Porto, foi implementado um projeto na ETAR do Freixo, onde a água tratada é reutilizada para lavagem de ruas, veículos e rega de espaços públicos. Além de reduzir o consumo de água potável, esta iniciativa alinha-se com os objetivos de economia circular e adaptação às alterações climáticas da cidade.
E em Lisboa, desde 2022 que a rega de espaços verdes do Parque nas Nações Norte é realizada com recurso a água residual tratada da ETAR de Beirolas, sendo o primeiro projeto licenciado de produção de ApR no país.
No entanto, apesar dos avanços e dos casos de sucesso, a implementação de sistemas de reutilização de água enfrenta ainda vários desafios. Um dos maiores obstáculos reside no elevado custo inicial de instalação das infraestruturas, como redes de distribuição separativas e sistemas de tratamento avançado. O financiamento dessas infraestruturas continua a ser uma barreira, especialmente em regiões onde a água potável é acessível a custos relativamente baixos. Para superar esta dificuldade será essencial criar parcerias e incentivos financeiros adequados, mas será sobretudo crítico olhar para o valor da água na perspetiva de um recurso global que será cada vez mais escasso, em detrimento da simples prorrogativa da definição local de tarifas.
A adaptação tecnológica constitui outro aspeto crítico. Embora existam soluções tecnológicas disponíveis para o tratamento da água residual, a implementação de sistemas de tratamento e distribuição de ApR requer a integração de tecnologias avançadas que garantam a qualidade da
água reutilizada para usos específicos. Para isso, será necessário aumentar o investimento em inovação e pesquisa, além de promover a transferência de tecnologia entre a academia e os diversos setores envolvidos na gestão da água.
Por fim, a aceitação pública representa igualmente um desafio significativo. O estigma associado à água residual, mesmo após tratamento avançado, impede que a ApR seja vista como uma alternativa viável e segura. Para superar essa resistência, será necessário investir em campanhas de comunicação e educação pública, que demonstrem a segurança e os benefícios da reutilização de água, acompanhados de exemplos práticos de sucesso.
A reutilização de água é, sem dúvida, uma solução crucial para enfrentar os desafios da escassez hídrica e garantir a sustentabilidade dos recursos hídricos, e Portugal tem demonstrado que é possível avançar na reutilização de água, como provam os projetos pioneiros já desenvolvidos. Contudo, o caminho para a plena adoção da ApR passa por superar obstáculos económicos, técnicos e sociais. A adaptação legislativa, impulsionada pelo PENSAARP 2030, e a criação de modelos de negócio sustentáveis são passos essenciais para promover a reutilização de águas residuais tratadas, tanto em setores industriais e agrícolas, como na expansão do uso urbano.
A título pessoal e pela minha natureza essencialmente otimista, quero acreditar que o princípio da reutilização será, um dia, o padrão em qualquer cidade ou região, fruto do compromisso em relação à inovação, à educação e à cooperação entre os agentes do setor público, do setor privado e da sociedade civil. E gosto de acreditar que, nesse futuro, a simples retrospetiva de outrora termos lavado ruas e regado espaços verdes com água tratada nas ETA, será vista como uma excentricidade de difícil explicação.
Parques e Jardins de Lisboa… o mesmo verde, a água é outra
A experiência do município do Porto como utilizador de ApR
força de uma marca no conceito ApR
Reutilização de água: um pilar da economia circular da água e da resiliência hídrica e climática das cidades Maria João Rosa, Rita Ribeiro e Rui Viegas
Leonor Amaral, Inês Areosa, Tiago Martins E António G. Brito
Contributo para alargar a reutilização de águas residuais em Portugal: avaliação técnica e económica de potencial em contexto urbano e agrícola
Água para reutilização: perspetiva das entidades gestoras Comissão Especializada DE ÁGUAS
ATUALIDADE
Unlocking the Economic Potential of Water Reuse
David J. Smith
Director, Water, Environment and Beyond, Sant Cugat del Valles, Catalonia, Spain
He holds a Bachelor’s degree in Botany and Zoology (2000), an Honors Degree in Limnology (2001) from the University of Cape Town, a Masters in Water and Environmental Management from Loughborough University (2015), and a PhD from the Autonomous University of Barcelona in Environmental Science and Technology.
He has managed over 30 environmental projects globally for clients such as the European Commission, World Bank, and United Nations. His expertise spans environmental management, water resource management, climate change adaptation, stakeholder engagement, and capacity development. He also leads the expert group on international cooperation for Water Europe and has held roles with Thames Water Utilities.
Marta Oliver Tizón
Sustainability and Environment Technician of the Urban Quality Department of Sant Cugat City Council, Catalonia, Spain
Climate change and environmental awareness specialist.
I am greening the economy in my everyday life to benefit all people, communities, and the planet. I act locally while thinking globally. As an expert in sustainable management, I promote active transformation in a city of 98,000 inhabitants. My tasks include managing environmental vectors, applying circular economy and drought emergency plans, supporting renewable energy implementation for sustainable construction, and reducing environmental impacts. I also oversee green purchasing in public tenders, sustainability plans (SECAP/ISO 14001/EMAS), and collaborate in European projects like CESBA MED, SUNHORIZON and SAVE THE HOMES. Co-author of ‘Reuse and use of greywater and rainwater in buildings’ (2020).
Degree in Biology (UAB), Microbiology specialist (1994-1999); Master in Environmental Management and Sustainability, Vic University (2013-2015); Global Sustainable Energy: past, present and future, University of Florida (2013); Greening the economy: lessons from Scandinavia, Lund University (2016).
Unlocking the Economic Potential of Water Reuse
Water scarcity is a pressing global issue, exacerbated by the Anthropocene that is accelerating climate change and environmental degradation (Smith 20231). As water scarcity intensifies across Europe and the world, the need for innovative
and sustainable water management solutions is becoming ever more urgent. We know that water reuse presents a promising solution to reduce the pressure on freshwater resources. Indeed, according to the European Commission2, water reuse offers significant environmental
and economic benefits over other methods such as desalination. However, for water reuse to be truly effective and sustainable, it must be economically viable, ensuring that systems are financially feasible over the long term. Economic sustainability in water reuse involves not only
1 Smith, D.J., 2023. Integrated Environmental System Management Approaches and Stakeholder Chosen Visualizations for Coastal Management in the Global South. http://hdl.handle.net/10803/688591
2 https://environment.ec.europa.eu/topics/water/water-reuse_en
# atualidade
recovering costs but also creating value streams that encourage adoption across sectors. In this article, we attempt to explore some of the challenges to achieving economic sustainability of water reuse and provide a few examples, to illustrate how environmental and economic benefits can be achieved.
Challenges in Achieving Economic Sustainability
Technological solutions are available – and are continually improving - to reach the necessary quality standards for reuse in urban, industrial or agricultural settings. However, achieving economic sustainability for those reuse options remains one of the key, and potentially more complex challenges. Often, the financial burden falls on municipal budgets or large water consumers, without clear mechanisms for cost recovery. While technological solutions exist for treating wastewater, the implementation often requires significant initial infrastructure or retrofitting, such as dual piping systems, to transport treated wastewater to its point of
use. This need is especially pronounced in urban areas, particularly for centralised wastewater treatment plants.
In addition, many countries face legislative uncertainty surrounding water reuse, deterring long-term investment. The water sector is highly regulated, and without a stable regulatory framework, private investors are hesitant to fund largescale projects. Furthermore, while subsidies are common in many regions, they often distort the market, making it harder to determine the true economic viability of water reuse systems.
Pathways to Economic Sustainability in Water Reuse
Interestingly, water reuse presents what is called a “dual value proposition”, it provides a continuous reliable water resource, together with the potential to recover nutrients, and energy from the treated wastewater. This “double value” is crucial for making water reuse economically attractive, especially when compared to alternatives such as desalination, which typically have higher costs
and energy requirements and a significant challenge in managing the waste brine.
Examples of successful double value Business Models
Robust and sustainable business models have demonstrated how water reuse can be economically viable. There are several successful examples illustrating how municipalities and businesses around the world have implemented water reuse systems with cost recovery as a central pillar to their reuse schemes.
´ Singapore’s National Water Agency, the Public Utilities Board (PUB), implemented the NEWater program for water reuse. A significant portion of operational costs for the water reuse program were recovered through correct tariff structures. Key to achieving full cost recovery was public buy-in, which enabled PUB to set the appropriate pricing for NEWater, used in both industrial and indirect potable applications. By fostering trust through extensive education
campaigns, PUB continues to ensure the financial sustainability of water reuse in Singapore.
´ Orange County’s Water Reclamation Scheme in California3 has long been a pioneer in water reuse. The high-quality recycled water is supplied to both municipal and industrial users, with public-private partnerships playing a key role in funding infrastructure investments and covering the operational costs.
´ Rose Hall in Montego Bay, Saint James Parish, Jamaica has achieved economic sustainability in water reuse by centralising wastewater treatment for the surrounding hotel complexes. This innovative approach has allowed for a more efficient and cost-effective operation compared to individual systems. The treated wastewater was sold to hotels at 20% cheaper than the commercial rate
Unlocking the Economic Potential of Water Reuse
for potable water, offering an economic advantage while reducing installation and pumping costs4. To compensate for selling the water “cheaper”, Rose Hall optimised their revenue streams by reusing sludge from the wastewater treatment as compost for its golf courses, further contributing to cost recovery and profitability.
´ Chile’s biofactories, particularly at the La Farfana and El Trebal wastewater treatment plants4 have achieved economic sustainability through a circular economy model that integrates energy recovery and nutrient recycling. Both facilities convert sludge from wastewater into biogas, which is used to generate electricity, significantly lowering the energy costs of the utilities. The treatment plants also produce biosolids that are reused as fertilizers in agriculture, creating an additional revenue stream
while reducing waste disposal expenses. Finally, the biofactories finance their operations through a regulated tariff system, which ensures that water reuse is economically balanced for both operators and consumers.
These models share a common focus on financial sustainability, ensuring that water reuse systems are economically viable and future proof.
Drought Management in Catalonia, the Case Study of Sant Cugat del Vallès
Returning our focus to Europe, the new EU regulation on minimum requirements for water reuse5 took effect in June 2023, providing a clear legal framework for water reuse. The purpose behind this regulation was to stimulate investment and innovation in the sector, making it easier for municipalities and
3 https://www.ocwd.com/what-we-do/water-reuse/#:~:text=OCWD’s%20Green%20Acres%20Project%20 (GAP,Learn%20more%20about%20the%20GAP.
4 https://publications.iadb.org/es/publications/spanish/viewer/El-reuso-de-agua-residual-tratada-en-America-Latinay-el-Caribe.pdf
5 https://eur-lex.europa.eu/EN/legal-content/summary/minimum-requirements-for-water-reuse.html
# atualidade
businesses to adopt water reuse practices. However, the regulation focusses on the requirements for water reuse for irrigation and does not extend to other urban uses such as industrial use, toilets, cleaning etc. Scope and therefore uncertainty remains for regulation to cover other water reuse applications beyond agricultural uses.
Nevertheless, this regulatory push has become especially relevant in Catalonia, Spain, where a severe, prolonged 4 year pluviometry drought, which intensified in 2023/2024, has drastically impacted the water resources of the region. This prolonged crisis underscored the urgent need to implement innovative water reuse strategies that address the technical, social, and administrative challenges while equally prioritising economic actions, to alleviate the pressures on the freshwater resources.
Sant Cugat del Vallès, a municipality in the Catalan region, is implementing effective measures in response to this prolonged drought. Given that Catalonia, a Mediterranean region, within which the municipality of Sant Cugat del Vallès resides, is known to be
affected by water scarcity, a water-saving Ordinance was developed some 22 years ago. This Ordinance has allowed for the introduction and requirement of shared installations for rainwater, greywater, and swimming pools in new constructions or building renovations, making buildings more resilient to drought. This ordinance affects one-third of the population, who indeed are already accustomed to using these systems. Meanwhile, Spain’s national Royal Decree 1620/2007 regulates the urban reuse of water from wastewater treatment plants, serving as a reference framework for the physical-chemical and microbiological requirements to ensure water safety in urban reuse applications.
As part of that Ordinance, an Emergency Drought Plan (PEM) was developed. This has allowed for several initiatives to be brought in to reduce water consumption while ensuring economic sustainability. For instance, some of these initiatives have included:
´Businesses or activities consuming over 5,000 m³/year of potable
water are required to submit detailed water management plans, which outline strategies for reducing water consumption. These large consumers, including industries and commercial enterprises, account for nearly 20% of Sant Cugat’s total water use.
´The city worked closely with private sector stakeholders, including Sorea, the local water supply company, to implement these changes. The involvement of businesses was critical, as it ensured that economic incentives, such as reduced water bills, encouraged compliance with the new water reuse regulations. Due to this initiative, the municipality consistently met its monthly maximum potable water consumption allocation in all the different drought scenarios. Furthermore, the municipality plans to change from analogue water meters to digital remote management meters to reach 100% of the municipality’s water consumption. Additionally, control alarms can be configured
to detect excessive water consumption in any building of the city.
´All private and public rainwater tanks and wells in the city have been geolocated in case they have to be used in extreme drought to store water.
´The municipality is also moving ahead with the construction of a large regenerated water pipeline from the city of Sabadell (with inhabitants of over 200,000) that will serve the large water users in Sant Cugat for industrial purposes as well as watering public and private gardens.
Cost Recovery
Strategies in Sant Cugat
One of the key aspects of Sant Cugat’s approach was its focus on cost recovery. Municipalities often struggle to recover the full costs associated with operating water reuse systems, especially when the initial capital investment is high. In Sant Cugat, the municipality works in a public-private partnership with the water
Unlocking the Economic Potential of Water Reuse
treatment company Sorea. The 3 tiered tariffs for water use (regulated by the Metropolitan Area of Barcelona) is implemented so that large consumers are charged higher rates for municipal water use if they exceeded a certain threshold. This has encouraged these users to adopt water reuse technologies and reduce their overall consumption.
By further mandating greywater reuse systems in new constructions, the city effectively reduced the demand on municipal water supplies. The savings in water are thus borne by the private entities that manage their own installations. Finally, the municipality also provided financial incentives for households and businesses to adopt water reuse systems. These included subsidies for the installation of greywater recycling systems. In the future they plan to provide discounts on water bills for properties that met specific reuse targets. By implementing these measures, Sant Cugat was able to ensure that the economic burden of water reuse was distributed equitably between public and private sector actors. This
cost recovery model not only made water reuse financially sustainable for the city but also incentivised businesses to adopt long-term water-saving practices with many businesses choosing to implement decentralised water reuse technologies.
Future Growth in Water Reuse
The future for water reuse looks promising, not only due to necessity but also through the potential flow of new financial investments. This is particularly the case with the rise of green financing and the growing role of Environmental, Social, and Governance (ESG) criteria in investment decisions. Investors are increasingly drawn to water reuse projects that demonstrate both environmental impact and financial returns, making these projects attractive propositions for long-term capital. This in turn can further drive the economic sustainability for water reuse programs. Where cities and businesses adopt innovative business models and invest in technologies that make water reuse financially viable, the long-term economic
# atualidade
sustainability of water reuse is not only possible but beneficial. The case of Sant Cugat del Vallès in Catalonia demonstrates that with the right strategies, collaborations and planning, water reuse can be a key component of a sustainable future-proof water strategy.
Looking into the future, it will be vital to maintain, strengthen, and upscale partnerships from civil
society, research, private and public sectors. Through these partnerships legislation can be co-designed to make the implementation of water reuse systems mandatory within the national Building Code and in so doing, create new jobs and industries related to efficient water management. It will be important to continually invest (economic resources and time) to build sustainable water reuse infrastructures
together with these innovative regulatory and financial conditions that can provide long-term success. By doing so, we can ensure that water reuse not only helps alleviate water scarcity but also becomes an economically sustainable solution for future generations, the examples in this article show how this is possible, now we just need to make this common practice.
ÁGUA, ONDE A VIDA
SE MULTIPLICA
# atualidade
O Marketing da Água
Marcos Batista Diretor de Comunicação e Desenvolvimento da Águas do Tejo Atlântico
Perto de atingir os 30 anos ao serviço do setor da água, com algumas incursões intercaladas em outros serviços de utilidade pública é, na Águas do Tejo Atlântico, empresa do Grupo Águas de Portugal, responsável pelo tratamento de águas residuais da Grande Lisboa e Oeste, que desempenha atualmente funções desde a sua constituição. A definição inicial da estratégia empresarial, com um dos epicentros na valorização dos recursos e eficiência climática, conduziu ao desenvolvimento de conceitos e ações de envolvimento, passando pelo planeamento de produtos circulares com origem nos ciclos de tratamento de água nas agora denominadas “Fábricas de Água”. Suportando-se na “Comunicação e Educação Ambiental” como ferramenta essencial para a informação, valorização e criação de expectativas, bem como para o consequente desenvolvimento empresarial sustentado na introdução da inovação, é sua responsabilidade promover a notoriedade da empresa e fortalecer a relação sustentável com todos os stakeholders… e com o Planeta.
“O ritmo das alterações relacionais adensou-se vertiginosamente e o que outrora fora resolvido pela própria natureza, e acelerado nas tradicionais Estações de Tratamento, está longe de resolver a já visível degradação da relação...“
Para um produto essencial e abrangente como a água, o “plano de marketing” exige uma análise detalhada do contexto histórico e comportamental das populações. Essa abordagem é crucial para garantir que a estratégia responda, de forma eficaz, aos objetivos estabelecidos para o público-alvo, considerando as variáveis “espaço” e “tempo” para a sua implementação.
Desde o início da sua existência, os humanos relacionam-se com a água de acordo com a sua necessidade e consciência.
A água, presente no planeta muito antes de qualquer forma de vida, foi inicialmente descoberta e utilizada pelos primatas para satisfazer as suas necessidades básicas. Essa relação de “descoberta e uso” perdurou por séculos, até
que a consciência humana evoluiu, acompanhada da sedentarização, crescimento populacional e da capacidade de produção.
Passados mais alguns séculos (não tantos como na fase anterior), o passo seguinte nesta relação durou apenas “décadas” e centrou-se no seu consumo (excessivo), conduzindo à crescente rejeição das
# atualidade
matérias residuais, em escala superior às capacidades do próprio Planeta. Nesta fase relacional surgem as “Estações” (de tratamento) que, à semelhança das linhas férreas e seus apeadeiros, respondem à consciência consumista que se perpetua para além das épocas, rumo ao chamado “desenvolvimento”. Alguns “anos” depois a relação altera-se com as transformações do Planeta, já degradada pelos factos passados (como em tantas outras relações) que não conseguimos, ou não estamos ainda prontos, para inverter. Afinal, se o nosso bem-estar se mantém num bom nível de conforto, porquê mudar?
A Nova Abordagem (aos dias de hoje) para o Marketing da Água
O ritmo das alterações relacionais adensou-se vertiginosamente e o que outrora fora resolvido pela própria natureza, e acelerado nas tradicionais Estações de Tratamento, está longe de resolver a já visível degradação da relação. Hoje debatemo-nos entre fases relacionais, desejando estar
na fase posterior, mas, de forma egoísta, não fazendo tudo o que é necessário para que a relação tenha futuro!
Qual seria a sugestão mais óbvia que um Conselheiro experiente daria para que esta relação evoluísse e estabilizasse num novo ponto de bem-estar, no menor tempo possível? Comunicar! Para transformar essa relação e estabilizar num novo ponto de equilíbrio, a comunicação desempenha um papel central. O marketing da água deve ser projetado para consciencializar e criar um relacionamento duradouro e sustentável com este “produto”. De uma forma percetível e acessível para todos, precisa, não só, de estimular o valor da água, mas também de fazer reconhecer o seu valor incremental derivado da sua circularidade e sustentabilidade.
Para garantir que a mensagem seja compreensível e eficaz, o marketing da água deve basear-se na simplicidade, transparência e no uso de conceitos já integrados socialmente. Como Einstein afirmou: “Não podemos resolver os problemas com
o mesmo pensamento que usámos quando os criámos” . Precisamos encontrar uma nova forma de comunicar, também esta sustentada em alguns princípios:
1. Difundir e Envolver: A palavra “água” deve ser o centro de todas as ações e comunicações no setor, reforçando o valor desse ativo essencial em cada momento ou iniciativa. Associando-a a todos os atos, multiplicando as suas referências, ampliamos o seu alcance.
2. Educar e Sensibilizar: A água é “O” Ciclo que nos Une. Em vez de dividir este ciclo em natural e urbano, devemos reconhecê-lo como um ciclo único, em que todos, incluindo os humanos, são sua parte integrante. Essa abordagem ajuda a comunicar que todos têm um papel na preservação da qualidade e quantidade de água disponível.
3. Enraizar para Comprometer: Água é só uma!
Independentemente da sua origem, a água deve ser gerida para que tenha a qualidade adequada a cada uso, seja
para consumo humano ou atividades urbanas. Isso implica eficiência e responsabilidade na gestão dos diferentes usos. Não a devemos distinguir pela sua origem, mas, sim, pela sua qualidade e utilidade (valor).
4. Coerência para não confundir e acomodar: Acabar com os “R”s que não servem a relação atual. Palavras como “resíduo” ou “residual” podem dificultar a aceitação de práticas sustentáveis. Se ambicionamos reduzir ou acabar com os resíduos porque perpetuamos “residual” como característica da nossa água? Transformar o conceito de “resíduo” em “recurso” é fundamental para fomentar uma visão de reutilização e reciclagem da água como uma matéria-prima valiosa e insubstituível em processos sociais e económicos.
5. Concertar para Ampliar: O léxico utilizado deve promover comportamentos sustentáveis e ser baseado em conceitos
universalmente reconhecidos. A reciclagem, por exemplo, é um conceito amplamente aceite e entendido pela população, e a sua associação com a água pode reforçar a perceção de valor sustentável e de circularidade. A própria definição de reciclagem traduz uma ação industrial transformativa com valor acrescentado. Já a “reutilização”, por definição, está associada ao uso contínuo de um item, sem o submeter a um processo industrial de transformação (como exemplo, usar repetidamente uma garrafa na sua forma original, prolongando a sua vida útil), não traduzindo valor acrescentado no processo.
Antecipar crises hídricas, como o “Dia Zero” em Cape Town (2017)1, exige uma nova forma de comunicar e envolver a população, tornando o marketing da água não apenas uma ferramenta, mas um agente de mudança. Como disse Sabine Stuvier, CMO da Hidraloop: “We have to
address them with another narrative!”
Porque o intervalo temporal se reduz vertiginosamente entre cada fase relacional, aos dias de hoje o marketing da água, ao construir um discurso claro, sustentável e alinhado com o entendimento coletivo, pode impulsionar e acelerar uma mudança comportamental em direção a uma relação mais consciente e responsável com este produto essencial.
“Facilitador” para a Sustentabilidade e Consciencialização
Envolver a sociedade nesta relação é uma tarefa desafiadora, mas indispensável. O marketing da água deve atuar como um facilitador e “tradutor”, tornando acessível a todos o contributo do setor da água, presente e futuro, nomeadamente gerando ambição para além das práticas e serviços já assegurados, com qualidade e segurança, às
1 Conheça mais sobre este assunto na Reportagem divulgada pela RTP, disponível em: https://www.rtp.pt/programa/tv/p40589
# atualidade
comunidades servidas. É sabido que as pessoas só se comprometem com aquilo que compreendem, reconhecem e em que acreditam. Afinal, já vimos alguém debater um tema pelo qual não se interessa?
A comunicação eficaz pode até gerar discussões e indignações, o que é positivo, pois a expressão de opinião é vital para a democracia, sustentando e fomentando decisões políticas e regulatórias.
Para envolver todos neste caminho de mudanças necessárias, precisamos não apenas de comunicar, mas de reescrever a nossa abordagem. Precisamos de terminologias acessíveis, marcas transparentes e valor associado percetível, evitando anacronismos que possam gerar múltiplas interpretações. É hora de “falar para as pessoas”, em vez de falar “com elas” como se fôssemos uma entidade à parte. Isso requer humildade para interpretar o mundo como ele é, em vez de como gostaríamos que fosse. A escolha entre “manter ou
evoluir” é uma decisão crucial para o futuro dessa relação e dá-se em diversos níveis.
Há algumas semanas, um gestor financeiro americano comentou a sua dificuldade em planear investimentos de longo prazo, devido à incerteza trazida pelas transformações socioambientais com que convivemos, correndo riscos de ineficiência se o processo não se tornar flexível e transformativo. Esse ponto de vista é realista, pois enfatiza a necessidade de sair da zona de conforto e procurar novas perspetivas num mundo repleto de incertezas (vide: guerras, pandemias, alterações climáticas…). A setorização do pensamento leva-nos a ver sempre pelo mesmo ângulo, enquanto os desafios climáticos e ambientais exigem flexibilidade e capacidade adaptativa.
No setor da água, a dificuldade já não é transformar água residual em potável, pois essa tecnologia existe há décadas, mas sim integrar esse processo no ciclo eficiente de
gestão da água. E o tempo urge. É fundamental que os trabalhadores do setor e as comunidades se adaptem a essa nova realidade, e que os cidadãos exerçam a sua cidadania, demonstrando uma ambição progressiva e sustentável na gestão de um “bem”, essencial, é certo, mas que deve ser visto como “produto” (que na realidade o é), caso contrário não aportará o valor necessário neste processo de evolução relacional. Aumentar o valor atribuído à água, inclusive o que se está disposto a pagar por ela, é chave para avançar rumo aos Objetivos de Desenvolvimento Sustentável (ODS).
“A comunicação emerge como instrumento chave para angariar o consentimento dos cidadãos”2 É uma conclusão do “Estudo de Atitudes” realizado para a Lisboa E-Nova no âmbito de um projeto Interreg Sudoe. Para isso, temos de nos fazer entender!
Existem três dimensões que influenciam o processo de formulação de opinião e canalizam a aceitação e
2 CN.º 8 do Sumário Executivo do “Estudo de Atitudes e Comportamentos Face à Reutilização de Água Residual Tratada em Lisboa”, realizado pela Lisboa E-NOVA, Interreg Sudoe (FEDER), setembro 2020. Disponível em: https:// lisboaenova.org/images/stories/Publicacoes_LEN/Estudo_Atitudes_Agua/RelatorioatitudescomportamentosARTFINAL.pdf
rejeição de conceitos. De acordo com o Estudo de Mercado realizado para a Águas de Portugal pelo IMR3, em 2021, se nas dimensões cognitiva e atitudinal a água está razoavelmente enraizada nas comunidades, a dimensão comportamental é aquela onde mais podemos influenciar, através de processos de informação e perceção que projetem o ângulo atual da realidade e as soluções que o setor da água tem para um futuro sustentável. Não agir nesta dimensão pode perpetuar o desgaste relacional provocado pelas realidades emergentes.
Ao longo deste artigo tenho repetidamente abordado a transformação industrial que operamos no setor, sobre a matéria-prima “água”, independentemente da sua origem. Não foi de forma inocente. Na minha opinião, não devemos continuar a considerar a linearidade do serviço em estações de água e saneamento, onde a água “residual” é tratada e é “rejeitada” (apesar de já termos visto que estes “R”s
são desprezíveis). É aqui que “nascem” as novas “Fábricas” e desaparecem os acrónimos das boas ETA e ETAR. Nascem produtos com marcas apelativas e socialmente conscientes e “percetíveis”, para serem assumidos com o devido valor (incutido pelo processo industrial transformativo) no dia-a-dia das comunidades e no ciclo produtivo da sociedade.
Numa fábrica de roupa entra algodão e saem T-shirts, cujo preço de mercado depende da sua qualidade e dos valores da “marca” que lhes são associados. Explicar este processo é simples, e, mais importante ainda, é fácil de ser entendido. Simplificando, e mantendo como base o conhecimento científico e a garantia de segurança nos processos, através do valor de “marca” e da qualidade do serviço prestado, podemos chegar ao envolvimento geral da comunidade: comunicando através de sua mesma “língua” e usando analogias já incorporadas na sociedade.
A fácil compreensão de processos, léxicos comuns,
O Marketing da Água
“casos de sucesso” (entre outros), encoraja os destinatários deste “Marketing” a criar uma ambição envolvente para a comunidade, desde os decisores aos consumidores, incentivando o investimento e o desenvolvimento sustentável. Reconhecer este “valor” é essencial para uma fase relacional que exija a captação e validação pública de novos investimentos sustentáveis. Todos sabemos como é rígida a variação dos preços da água e de novos investimentos, o que dificulta novos processos e novos racionais circulares e sustentáveis, nomeadamente por ainda estarmos a atravessar um ciclo de investimento de infraestruturação que Portugal realizou nas últimas décadas (desde os anos 90) e que nos permitiram ser reconhecidos como “milagre europeu” pela universalidade, rápida abrangência e qualidade do serviço de água em praticamente todo o território.
Evoluindo, o marketing da água pode continuar a
3 Estudo “Atitudes e Comportamentos dos Portugueses face à Água”, relatório quali-quantitativo, 2018 e 2021, realizado pelo IMR - Instituto de Marketing Research para a AdP. Disponível em: https://www.adp.pt/pt/comunicacao/publicacoes/?id=42
# atualidade
contribuir para a evolução do setor, apoiando a transição de uma fase de infraestruturação para a implantação de uma economia circular e sustentável, tratando a água como um produto valioso e essencial, e estabelecendo as bases para um novo modelo de negócio.
Este processo científico assume que o nosso serviço está focado nas pessoas, nas comunidades e no território. Uma abordagem comunicacional inclusiva contribui para combater o uso excessivo dos recursos naturais escassos, salvaguardando o Capital Natural do nosso território, nomeadamente a água para os seus usos prioritários (agora definidos pela lei), onde no topo estão: as pessoas!
Em que fase deste relacionamento se encontra?
Na atual realidade tecnológica e social, emergem, cada vez com maior recorrência, novas ferramentas de comunicação, como é o caso da “gamificação”. Para terminar este artigo recorro
a este novo instrumento que permitirá, de forma não representativa, analisar em que fase do “relacionamento” se encontra o leitor, face ao setor da água. Responda Sim/Não/Talvez às questões abaixo. Se a maioria das suas respostas for “SIM”, então acredite que pode ser um agente de marketing de mudança, qualificado para transmitir, na sua proximidade, que o setor da água poderá contribuir e inspirar um futuro mais sustentável.
A Água, para além de ser um bem essencial, é uma matéria-prima para todos os setores de atividade?
Independentemente da sua fonte/origem, o setor consegue produzir água segura, com diversas qualidades, que servem diferentes necessidades?
Uma água para ser “boa” pode ter uma qualidade adequada à sua utilização, mesmo que não seja “potável”?
Podemos anunciar que, da água usada (descartada) podem ser produzidos vários produtos úteis para a economia circular de
proximidade, como por exemplo, água, energia e biolamas?
Ao reciclar a água estamos, através de um processo industrial, a transformar um material “descartado” num novo produto?
“Reciclar” água induz mais valor ao nosso produto do que “reutilizar”?
Devemos parar de utilizar termos como “rejeição” e “residual” associados à Água, pois isso retira valor ao nosso produto?
A frase “Água é só uma” é mais do que um conceito com o qual concorda; é algo que aplica nas suas ações e no seu vocabulário?
Parabéns! Se chegou até aqui e até respondeu a estas questões, já somos ambos uns vencedores!
ÁGUA, ONDE A VIDA
SE MULTIPLICA
Parques e Jardins de Lisboa… o mesmo verde, a água é outra # atualidade
Catarina Freitas
Diretora Municipal do Ambiente, Estrutura Verde, Clima e Energia da Câmara Municipal de Lisboa
É M.Sc em Engenharia Química e possui estudos de doutoramento em tecnologias ambientais.
Atualmente é Diretora Municipal do Ambiente, Estrutura Verde, Clima e Energia da Câmara Municipal de Lisboa e Vogal do Conselho de Administração da Lisboa E-Nova, Agência Local de Gestão de Energia. Nos últimos anos coordenou o desenvolvimento de planos, projetos e medidas em vários domínios de ação local, destacando-se a transição energética, neutralidade carbónica, valorização da biodiversidade e da estrutura ecológica, mobilidade urbana sustentável, planeamento territorial resiliente, cidades inteligentes, criação de territórios circulares, entre outros. No âmbito das suas atuais funções, coordena o projeto Mission Cities, na sequência da seleção de Lisboa como uma das 100 cidades climaticamente neutras e inteligentes até 2030. Lisboa já obteve o Mission Label do seu Contrato Climático de Cidade 2030, que tem como medida transversal a criação de um fundo climático.
“O plano prevê, entre outros, a reutilização de cerca de 3 milhões m3 de ApR por ano, até 2030. Este valor representa um incremento significativo face à atual capacidade de reutilização, refletindo o compromisso de Lisboa com a transição para uma economia circular no setor da água.”
Parques e Jardins de Lisboa… o mesmo verde, a água é outra!
O novo Plano Estratégico para a Reutilização de Água em Lisboa – PERAL 2.0
As cidades enfrentam hoje desafios ambientais, muitos dos quais serão amplificados pelas alterações climáticas, que tornam mais complexa a gestão e o planeamento dos seus territórios e sistemas urbanos.
A escassez e falta de disponibilidade de água, como resultado das mudanças dos padrões de pluviosidade, é um desses problemas, já vivenciado em muitas cidades europeias, de sul a norte. Neste contexto, torna-se essencial promover a eficiência hídrica e reduzir o consumo global de água potável em meio urbano.
Lisboa elegeu a sustentabilidade hídrica como
um dos objetivos estratégicos do município, assente na diversificação das origens de água e na promoção do consumo eficiente de água nos diversos setores de consumo.
Atualmente os diferentes serviços da Câmara Municipal de Lisboa consomem cerca de 4 milhões m³/ano de água potável, que percorre mais de 100 km para chegar até à nossa
# atualidade
Trata-se de um plano integrado de utilização de água não potável em Lisboa, que prevê o recurso à água residual tratada, Água para Reutilização (ApR), proveniente das ETARs de cidade, tendo associada uma pegada energética para seu transporte de 2.120 MWh. Trata-se de água potável, adequada para o consumo humano, grande parte da qual é utilizada para regar parques e jardins, lavar ruas, entre outros fins não potáveis.
da EPAL. O PERAL 2.0, que constitui uma evolução do PERAL de 2019, visa redefinir o uso sustentável da água na capital, transformando águas residuais tratadas e águas não potáveis do Aqueduto das Águas Livres num recurso valioso para usos não potáveis.
Beirolas, Chelas e Alcântara, em zonas a cotas mais baixas, e à Água bruta do Aqueduto das Águas Livres de Lisboa, a cotas mais altas.
Enquanto cidade pioneira na reutilização de água, Lisboa lançou em 2022 o PERAL 2.0, Plano Estratégico para a Reutilização de Água 2.0, com a colaboração da Águas do Tejo Atlântico e
Um dos principais objetivos do PERAL 2.0 é reduzir o consumo de água potável em Lisboa, especialmente em atividades que podem ser supridas com água não potável.
O plano prevê, entre outros, a reutilização de cerca de 3 milhões m3 de ApR por ano, até 2030. Este valor
representa um incremento significativo face à atual capacidade de reutilização, refletindo o compromisso de Lisboa com a transição para uma economia circular no setor da água.
Entre as metas mais importantes estão a criação de redes dedicadas para distribuição de ApR, com a ampliação da infraestrutura existente, e o aumento do número de locais onde a reutilização de água pode ser implementada. Para a distribuição da água do Aqueduto das Águas Livres de Lisboa, serão reativados antigos ramais e galerias subterrâneas desativadas da EPAL.
Projetos no rumo da circularidade da água
Para garantir a eficácia do PERAL 2.0, foram já lançados projetos-piloto em diferentes áreas de Lisboa, com o apoio técnico e logístico da Águas do Tejo Atlântico.
A Águas do Tejo Atlântico, enquanto responsável pela gestão das Fábricas de Água (ETAR) de Alcântara, Chelas e Beirolas, tem capacidade para tratar grandes volumes de águas residuais e para
Parques e Jardins de Lisboa… o mesmo verde, a água é outra
produzir ApR. Através de investimentos em novas tecnologias de filtração avançada e desinfeção com radiação ultravioleta, que garantem a eliminação de agentes patogénicos e contaminantes, a Águas do Tejo Atlântico tem hoje capacidade para produzir água residual de elevada qualidade, adequada a uma gama ampla de utilizações não potáveis, numa lógica de fit-for-purpose
O PERAL 2.0 contempla uma rede de ApR com 55 km de condutas, 16 estações elevatórias e 12 reservatórios.
Um dos passos importantes para a reutilização de água em Lisboa foi dado em março de 2022, quando a Câmara Municipal passou a regar o Parque Tejo, uma das maiores áreas verdes da cidade, com ApR proveniente da ETAR de Beirolas.
Com 295.000 m2, a área verde do Parque Tejo tem necessidades de rega anuais de 300.000 m3/ano, valor que poderá aumentar em contexto de seca.
Este projeto demonstrou resultados muito positivos, permitindo poupar milhares
de m3 de água potável por ano.
Todas as questões de segurança e prevenção de riscos foram salvaguardadas, através de um rigoroso “Plano de monitorização da qualidade da água reutilizada”, composto por mais de 9 estações de monitorização em contínuo, como previsto na “Licença de Utilização” de Água para Reutilização emitida pela APA em março de 2022. Na avaliação de risco e no desenho do plano de monitorização, a Câmara Municipal de Lisboa contou com o apoio técnico e científico do Núcleo de Engenharia Sanitária do LNEC.
O sucesso deste projeto abriu portas para a expansão da rega com ApR da área verde mais a norte, a zona Tejo-Trancão, que acolheu a Jornada Mundial da Juventude em 2023 e mais recentemente o festival Rock in Rio 2024.
Para além disso, foi integrado no Laboratório Vivo de Lisboa do projeto B-Water Smart, financiado pelo programa Horizonte 2020, integrando já um catálogo de soluções
# atualidade
eficazes para acelerar a gestão inteligente da água em meio urbano.
Benefícios ambientais e económicos
Os benefícios do PERAL 2.0 são múltiplos e vão além da simples poupança de água.
Do ponto de vista ambiental, a reutilização de águas residuais tratadas contribui significativamente para a redução da pressão sobre os recursos hídricos naturais, especialmente em tempos de escassez e de redução da disponibilidade.
A utilização de ApR pode reduzir a necessidade de extração de água subterrânea e de rios, preservando assim os ecossistemas aquáticos.
Adicionalmente, o uso de ApR permite a redução da energia necessária para tratar e transportar água potável, gerando poupanças consideráveis tanto para a cidade quanto para os consumidores, e a utilização de recursos hídricos disponíveis na própria cidade tem impactos muito positivos no nexus água-energia.
Por outro lado, prevendo-se que as necessidades de rega venham a aumentar em Lisboa, por via do reforço da infraestrutura verde e da arborização da cidade, fundamentais para a resiliência climática, é importante dispor de ApR em abundância para assegurar uma rega sustentável com um recurso não potável.
O futuro da água é circular
O PERAL 2.0 representa um avanço significativo na sustentabilidade hídrica de Lisboa. A longo prazo, coloca Lisboa na vanguarda da gestão hídrica sustentável,
alinhando-se com os objetivos da Estratégia Nacional para a Reutilização de Água e com as diretrizes da União Europeia para a economia circular.
Com um planeamento estratégico robusto e o envolvimento ativo de instituições como a Águas do Tejo Atlântico e da EPAL, Lisboa está bem posicionada para enfrentar os desafios da escassez e falta de disponibilidade de água e contribuir para um futuro mais sustentável e climaticamente resiliente.
É ainda importante sensibilizar a população para aumentar a aceitação do uso
de ApR, um fator crítico para o sucesso do plano. Para tal, campanhas de informação e educação são essenciais, de modo a garantir que os cidadãos compreendam os benefícios e segurança da ApR.
A ferramenta tecnológica para análise de risco, desenvolvida no âmbito do projeto B-Water Smart, poderá dar um importante contributo na avaliação expedita e robusta das condições de utilização de ApR e na salvaguarda da saúde pública. Foi já utilizada com sucesso na instrução das duas licenças de utilização de ApR para rega, já emitidas pela APA/ARH Tejo-Oeste.
A própria estratégia de comunicação da Águas do Tejo Atlântico está a ajudar a mudar o paradigma, ao transformar o tratamento linear de águas residuais –onde o resultado é a rejeição de um “resíduo” tratado no meio ambiente – num processo industrial nas Fábricas de Água onde o “resíduo” é encarado como matéria-prima, valorizado em novos produtos essenciais (água+, bio lamas/ fertilizantes, energia, bio nutrientes, entre outros).
Parques e Jardins de Lisboa… o mesmo verde, a água é outra
Em conclusão, o PERAL 2.0 responde não só às necessidades imediatas de adaptação às alterações climáticas de Lisboa, como também constitui um exemplo de inovação ambiental que poderá servir de inspiração para outras cidades em Portugal e no mundo.
A experiência do município do Porto como utilizador de ApR # atualidade
Filipe Araújo
Vice-Presidente da Câmara Municipal do Porto
É Vice-Presidente e Vereador dos Pelouros do Ambiente e Transição Climática e da Inovação e Transição Digital da Câmara Municipal do Porto (2013 - presente). Preside aos Conselhos de Administração das empresas municipais Porto Ambiente e da Águas e Energia do Porto, bem como da Agência de Energia do Porto e da Associação Porto Digital. É membro do Conselho de Administração da LIPOR. Atualmente, é Vice-Presidente da rede de cidades Energy Cities, sendo ainda membro do Grupo Consultivo de Presidentes de Câmara da Missão Cidades, no âmbito da Missão Europeia 100 cidades inteligentes e climaticamente neutras. Desde 2013, ao longo da sua carreira de serviço público, desenvolveu e implementou ativamente uma visão estratégica para as áreas do Ambiente, da Ação Climática e da Inovação no Porto, impulsionando um progresso substancial da cidade nos últimos anos. Licenciado em Engenharia Eletrotécnica pela Faculdade de Engenharia da U.Porto, tem um MSc em Telecomunicações com distinção pela University of Manchester Institute of Science and Technology. Entre 1999 e 2013 desenvolveu a sua atividade profissional como quadro superior de uma empresa multinacional de telecomunicações.
“... o Porto decidiu avançar com um projeto de produção de água para reutilização (ApR), a partir da água residual tratada na ETAR do Freixo, para ser utilizada em diversos fins urbanos. ”
A experiência do município do Porto como utilizador de ApR
O Enquadramento
A escassez de água constitui uma das grandes preocupações globais, o que justifica a motivação crescente para a necessidade do uso sustentável deste recurso. As alterações climáticas continuarão a exercer uma grande pressão na gestão da água, intensificando tanto os períodos de seca quanto
os de precipitação intensa e com repercussões na qualidade e quantidade de água disponível. Para garantir o acesso a este recurso essencial, temos de ser capazes de o gerir melhor e encontrar origens alternativas, como é o caso da água tratada nas ETAR.
A reutilização de água, numa perspetiva de economia circular, constitui uma importante oportunidade
para promover o uso sustentável dos recursos hídricos e a adaptação das cidades aos efeitos das alterações climáticas.
Um projeto de reutilização de água exige uma abordagem específica, habitualmente designada por fit-for-purpose que preconize, para além do cumprimento das normas de qualidade da água, a adoção de medidas individualizadas de gestão
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do risco, que contemplem medidas de controlo, ou barreiras e respetivos planos de monitorização, a fim de minimizar os riscos na sua implementação.
O Projeto Porto
Produção
Com o agravamento das alterações climáticas e antecipando um potencial cenário de maior stress hídrico, o Porto decidiu avançar com um projeto de produção de água para reutilização (ApR), a partir da água residual tratada na ETAR do Freixo, para ser utilizada em diversos fins urbanos.
Com esse objetivo, foi instalada na ETAR do Freixo uma unidade de tratamento complementar, constituída por um bioreator modular de membranas (MBR –membrane bioreactor), dotado de membranas de ultrafiltração com poro de 0,04 µm. Com a instalação desta unidade, parte do licor misto do reator de lamas ativadas passou a ser encaminhado para o reator de membranas, onde se dá a filtração da água residual, permitindo a produção de
um permeado de elevada qualidade.
Após um período experimental de 6 meses, no qual se monitorizou a qualidade da água produzida e se otimizou as condições de operação do sistema, pudemos comprovar que o sistema instalado permite a produção de até 40 m³/h de ApR, com qualidade classe A, de acordo com o estabelecido no DecretoLei n.º 11/2023, de 10 de fevereiro. A água produzida é adequada para múltiplos fins como rega sem restrição de acesso e diversos usos urbanos como sejam a lavagem de ruas e de veículos e o combate a incêndios.
A unidade de produção de ApR instalada na ETAR do Freixo encontra-se licenciada pela Agência Portuguesa do Ambiente (APA) desde 07 de julho de 2023 e a água produzida segue um rigoroso programa de monitorização para verificação do cumprimento do normativo de qualidade exigido, garantindo a total segurança na sua utilização. Da mesma forma é monitorizada a implementação dos procedimentos e medidas resultantes da avaliação do
risco realizada ao nosso sistema e que é parte integrante da referida licença.
Utilização
Esta água está a ser utilizada desde setembro de 2023 para a limpeza do espaço público na cidade do Porto, assegurada pela empresa municipal Porto Ambiente, utilização esta também licenciada pela APA. Os veículos de limpeza das vias da cidade são abastecidos com ApR na ETAR do Freixo e utilizam esta água para a lavagem de ruas e espaço público, assim como para a limpeza de veículos e contentores de resíduos sólidos urbanos. Esta água é ainda usada pela Águas e Energia do Porto para operações de desobstrução de coletores de saneamento, assim como para usos próprios na ETAR.
A implementação deste projeto piloto permitiu ao Porto reduzir o consumo de água potável em atividades que não exigiam essa qualidade e consolidar o conhecimento tanto na produção como na aplicação de ApR. Esta experiência é fundamental para o desenvolvimento de futuros
projetos de reutilização de água alinhados com os objetivos de economia circular da cidade.
Os Desafios
Não obstante os bons resultados alcançados neste projeto, há ainda um longo caminho a percorrer para potenciar esta prática. Desde logo é essencial que ela seja economicamente sustentável e que a ApR obtenha uma boa aceitação da opinião pública. Uma política de reutilização deve incluir mecanismos que aproximem a oferta e a procura.
A experiência do município do Porto como utilizador de ApR
Atualmente, os níveis de reutilização de água são limitados por uma série de desafios, como a disponibilidade de água de origens convencionais e a competitividade dessa água relativamente a origens alternativas, especialmente em regiões onde as fontes convencionais são acessíveis e de baixo custo. Além disso, há a questão da distância entre os locais de produção e a localização dos potenciais utilizadores, que implica investimentos significativos, assim como a baixa perceção do valor da ApR, o que resulta numa disposição limitada do público para pagar
pelo verdadeiro custo de tratamento e fornecimento dessa água.
Para promover a reutilização é fundamental estabelecer uma política de comunicação eficaz, que contribua para aumentar a confiança do consumidor, assim como criar instrumentos políticos e legais que favoreçam a implementação e sucesso destes projetos. Esses instrumentos devem assegurar uma estratégia clara, regulamentações ambientais e económicas, e uma política integrada de incentivos adequados. Dessa forma, a reutilização
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da água poderá crescer de maneira sustentável, através da implementação de planos concretos que envolvam a responsabilidade compartilhada entre os diferentes atores envolvidos.
Os Projetos Futuros
Os objetivos futuros do Município do Porto passam por alargar a reutilização de águas residuais tratadas na cidade. Diferentes entidades do universo municipal, assim como utilizadores privados, poderão vir a adotar a utilização desta água, nomeadamente para a rega de jardins, usos recreativos e de enquadramento paisagístico, água para lavagens diversas, uso industrial e combate a incêndios.
Este projeto, ainda em fase de estudo, implica a criação de uma rede separativa de distribuição de água residual tratada, incluindo respetivos reservatórios e centrais elevatórias.
A estratégia passa por aumentar a produção e a disponibilização de ApR de forma gradual, em função da real procura, assegurando
a sustentabilidade dos investimentos. Isso requer a celebração prévia de protocolos com potenciais utilizadores, de forma a obter uma expectativa sobre o futuro universo de aplicações a considerar, designadamente o seu número, qualidade pretendida e previsão de volumes requeridos. Além disso, é importante desenhar projetos que possam ser implementados de forma faseada, possibilitando, a médio e longo prazo, a redução do consumo de água potável para estes fins.
O Balanço final
Este projeto possibilitou a validação de uma solução técnica para a produção de Água para Reutilização (ApR) e representou um passo concreto rumo à reutilização de água na cidade. Além disso, permitiu identificar os principais desafios associados a essa iniciativa e delinear um roadmap para a implementação da reutilização de água em escala urbana.
Estamos confiantes de que a continuidade deste projeto, alinhada com os objetivos do Porto na transição para uma economia circular, permitirá
ÁGUA, ONDE A VIDA
SE MULTIPLICA
# atualidade
A força de uma marca no conceito ApR
Nuno Brôco
Presidente do Conselho de Administração da Águas do Tejo Atlântico
Tem mais de 20 anos de experiência em gestão de empresas privadas e públicas. Formado em Engenharia
Química e Mestre em Biotecnologia, atualmente é Presidente da Águas do Tejo Atlântico, a maior empresa do Grupo AdP na gestão de águas residuais. É também membro do conselho da Water Europe. Anteriormente, foi Presidente da AdP VALOR, a empresa do Grupo AdP responsável por promover a inovação, a transição digital e a economia circular. Durante 11 anos desempenhou vários cargos, entre eles, foi responsável pelo Departamento de Engenharia da Empresa de Serviços Partilhados do Grupo Águas de Portugal, membro do Conselho de Administração da Águas do Tejo Atlântico e responsável pela Inovação Corporativa no Grupo AdP, promovendo parcerias com a academia, serviços públicos e setor privado, candidaturas a instrumentos de financiamento nacionais e internacionais e coordenador de vários projetos de I&D. Começou a sua carreira no Grupo SUEZ, como especialista em processos de tratamento de água e águas residuais, depois como responsável pelo Departamento de Produção da Degrémont Portugal e finalmente como Country Manager da Degrémont Ibéria para Portugal.
“As dimensões legal, regulatória e institucional afiguram-se atualmente como aquelas onde o esforço tem de ser reforçado, numa altura em que os desafios tecnológicos para garantir uma ApR de qualidade compatível com o fim a que se destina se encontram completamente ultrapassados.”
Acircularidade da água tem origens ancestrais, sendo intrínseca ao próprio recurso pelo cariz renovável que possui, mas também pelo seu papel de vetor de outros recursos essenciais à agricultura, e consequentemente à produção de alimentos, noutros setores industriais. As entidades gestoras de serviços de águas, enquanto administradoras deste
recurso, têm intrínseco à sua missão um importante papel nessa circularidade, através do tratamento das águas que já foram utilizadas e sua devolução ao ambiente em condições para integrar outros usos, contribuindo para a circularidade e sustentabilidade da própria água, proporcionando outras utilizações de recursos nela existentes , valorizando a matéria orgânica, recuperando
e utilizando elementos essenciais como azoto e fósforo ou produzindo energia verde a partir dos recursos endógenos. Contudo, essa circularidade intrínseca é atualmente insuficiente face aos desafios atuais e futuros, sendo necessária uma transição para uma visão e operacionalização verdadeiramente circular e assente em modelos sustentáveis.
# atualidade
A evolução a que assistimos, cada vez mais acelerada, ao nível das alterações climáticas, da escassez de recursos renováveis, da necessidade de incrementar resiliência e autonomia de recursos, mas também as alterações legais, regulatórias e a atual turbulência geopolítica remetem-nos para a necessidade de uma estratégia coordenada relativamente às abordagens relacionadas com a economia circular, nas suas várias dimensões e na sua articulação com os demais vetores estratégicos que enquadram a atividade das entidades gestoras.
A aceleração da implementação de modelos de economia circular é atualmente um imperativo das entidades gestoras dos serviços de águas que têm responsabilidade perante os vários stakeholders face à urgência da ação climática, a resiliência e eficiência das próprias operações, mas também, e extravasando os limites do próprio setor, a segurança alimentar e autonomia nacional.
É neste contexto que trabalhamos desde há vários anos diversos pilares
da economia circular, com especial enfoque na reutilização de água, onde desenvolvemos alguns projetos relevantes, mas que ainda se afiguram insuficientes face à situação de recursos hídricos a nível nacional. E é nesta conjuntura que criámos a marca e os instrumentos de comunicação conscientes que desempenham um papel crucial no desenvolvimento de uma atividade económica, servindo como um elo de confiança entre a empresa, os consumidores e a sociedade em geral. Uma marca forte diferencia positivamente produtos e serviços no mercado, mas também cria identidade e fomenta uma relação de afetividade com os consumidores.
Além disso, uma marca bem posicionada abre inevitavelmente portas para parcerias estratégicas e oportunidades de expansão, uma vez que empresas reconhecidas tendem a ser vistas como mais confiáveis, situação essencial à reutilização de água.
Na Águas do Tejo Atlântico, vários dos nossos produtos resultantes dos processos circulares têm uma marca
associada, com vista à sua promoção, à sua divulgação, num momento em que pretendemos que ganhem uma afinidade com o cidadão e com outros setores de atividade, mas também que criem impacto junto de quem pode puxar pela economia circular. São exemplos dessas marcas, a água+, a Cerveja VIRA, a Biolamas+, Caminho da Inovação, ISea.
No que à ApR diz respeito, duas das nossas marcas, verdadeiramente complementares entre si, pretendem percorrer um caminho de valorização do recurso, afinidade para com a causa e desbloqueio de preconceitos.
A água+ apresenta uma mensagem implícita de que ao fornecermos água reutilizada, disponibilizamos muito mais do que esse recurso. De facto, quando fornecemos um metro cúbico de água+, reservamos igual volume de água nas nossas origens para fins mais nobres como o consumo humano, mas incluímos nesse mesmo metro cúbico de água+ outros valores, como sejam o azoto, o fósforo e os micronutrientes, essenciais ao crescimento das plantas,
que caso não lhes sejam aportados dessa forma, terão de ser aportados através de fertilizantes sintéticos, com enorme impacto do ponto de vista de exaustão de recursos naturais.
A água+ é assim um contributo da Águas do Tejo Atlântico para aumentar a recetividade do público geral e dos nossos utilizadores industriais relativamente a um recurso que, no passado, foi visto com reservas por parte de vários stakeholders. A utilização de uma marca passa por um processo de descodificação das mensagens em que se pretende comunicar e simplificar um conceito, criando uma relação emocional, melhorando a afinidade e recetividade e, em alguns casos mesmo, o sentido de posse da marca por parte do utilizador.
Outra marca criada há vários anos na Tejo Atlântico foi a cerveja VIRA, num momento em que os receios de uso da reutilização em Portugal ainda alimentavam sessões de debate em diversos congressos, artigos sobre o futuro da reutilização ou mesmo posições de rejeição deste recurso. Nessa altura, a
A força de uma marca no conceito ApR
Tejo Atlântico, consciente da necessidade de comunicação disruptiva para quebrar um ciclo de inércia relativamente ao tema da reutilização no nosso país, decidiu afirmar a sua confiança na água+ que produzia, bebendo-a, da forma mais agradável que conseguíamos, ou seja, na forma de Cerveja. E a cerveja foi batizada com um nome que, uma vez mais, pretendeu transmitir o conceito de mudança de mentalidade, de viragem no caminho que seguíamos à data, o da alteração do paradigma.
A integração deste conceito na marca VIRA foi à data, e mantém atualmente, um enorme sucesso de comunicação, sendo o pretexto perfeito para, entre
dois goles de cerveja, discutir o tema da reutilização e da segurança no ato de utilizar água+ em diferentes contextos. A criação do ambiente propício para a comunicação é igualmente fator de sucesso para a transmissão da mensagem, e neste caso, a descontração, boa disposição e o brinde passaram a fazer parte de uma estratégia responsável de comunicação da Tejo Atlântico. Aliás, atualmente deixámos para trás a necessidade de convidar, com alguma insistência, alguém a provar a nossa VIRA, para sermos abordados por diversas pessoas com vista a experimentarem o conceito da cerveja produzida com água+ (reutilizada).
# atualidade
Também durante as Jornadas Mundiais da Juventude 2023, que decorreram em Lisboa, num magnifico espaço relvado à beira Tejo, com utilização da água+ para rega, optámos por dirigir a nossa ação de comunicação no sentido de valorizar o impacto da reutilização da água em prol dos utilizadores do espaço.
Num contexto em que reutilizamos em Portugal menos de 2% do total da água residual tratada, necessitamos de continuar a desenvolver esforços concertados
nos vários pilares da sustentabilidade desta prática, hoje reconhecida como vantajosa a vários níveis, mas infelizmente muito pouco praticada face ao potencial disponível.
As dimensões legal, regulatória e institucional afiguram-se atualmente como aquelas onde o esforço tem de ser reforçado, numa altura em que os desafios tecnológicos para garantir uma ApR de qualidade compatível com o fim a que se destina se encontram completamente ultrapassados.
Neste contexto, e em súmula, a utilização de um processo de comunicação apoiado em marcas fortes, de fácil perceção e que criem uma afinidade junto do utilizador afigura-se como elemento de coesão de uma estratégia que tem como objetivo o aumento da taxa de utilização de ApR no país, que ano após ano discute e continuará a discutir os temas da escassez hídrica.
# atualidade
Reutilização de água: um pilar da economia circular da água e da resiliência hídrica e climática das cidades
Maria João Rosa
Investigadora Coordenadora, Chefe do Núcleo de Engenharia Sanitária do LNEC - Laboratório Nacional de Engenharia Civil Rita Ribeiro e Rui Viegas Investigadores Auxiliares no Núcleo de Engenharia Sanitária do LNEC
Os autores são doutorados em Engenharia Química, investigadores do LNEC, com vasta obra publicada e atividade de normalização internacional em qualidade, tratamento e reutilização de água, mentores científicos do LV Lisboa no projeto B-WaterSmart e responsáveis pelas soluções (co)desenvolvidas pelo LNEC.
“A gestão inteligente da oferta e da procura de água, centrada na eficiência hídrica e na utilização da qualidade adequada ao fim a que se destina (abordagem fit-for-purpose), é assim essencial para reforçar a resiliência das cidades à escassez de água e às alterações climáticas.“
Reutilização de água: um pilar da economia circular da água e da resiliência hídrica e climática das cidades
ocrescimento populacional, a urbanização e o desenvolvimento económico, associados às alterações climáticas, têm vindo a agravar a falta de água doce para satisfazer a procura de água em meio urbano. Esta situação de escassez de água constitui uma ameaça para a saúde e bem-estar de mais de metade da população mundial, para a qualidade
ambiental nas cidades e no meio envolvente e, também, para o desenvolvimento socioeconómico. A preservação das reservas (atuais e futuras) de água doce é assim essencial para a sustentabilidade e a resiliência urbanas.
A utilização racional e responsável dos recursos hídricos está intimamente associada à economia
circular. A economia circular preconiza a obtenção de benefícios positivos para toda a sociedade através da recuperação e reutilização de recursos, de modo a promover um ciclo fechado na utilização de materiais que preserve as reservas dos recursos naturais para as gerações futuras. Como exemplo desta mudança de paradigma refere-se a abordagem One Water
# atualidade
definida na primeira década de 2000 nos Estados Unidos da América [1]. “Uma Água” é o reconhecimento de que toda a água tem valor, independentemente da sua origem. A obtenção dos benefícios ecológicos e económicos resultantes da utilização de água depende assim da gestão integrada, inclusiva e sustentável deste recurso.
Neste contexto, assiste-se a uma evolução no planeamento do abastecimento de água aos sectores urbano, agrícola e industrial, passando de uma dependência exclusiva dos recursos convencionais de água doce, i.e., águas subterrâneas e águas superficiais dos rios e lagos, para a utilização de um portfolio mais alargado de origens de água, que incluem água para reutilização (ApR) e água dessalinizada [1]. As origens de água convencionais são assim balanceadas com alternativas de abastecimento de água mais fiáveis em cenários de alterações climáticas e, acompanhando a expansão do mercado, tendencialmente mais competitivas economicamente.
A reutilização da água é uma importante medida de adaptação às alterações climáticas, ajudando a combater a escassez de água, enquanto contribui eficazmente para a conservação e preservação da qualidade e quantidade das reservas de água doce. Por um lado, é uma origem de água resiliente à seca – enquanto houver água para consumo humano, existirá água que poderá ser reutilizada em usos compatíveis. Por outro lado, reduz a descarga de contaminantes no meio hídrico, incluindo nutrientes associados a fenómenos de eutrofização, ou seja, fósforo e azoto. Embora a reutilização da água na indústria e na rega agrícola seja reconhecida, desde há muito, como uma alternativa viável para o abastecimento de água, a integração da água para reutilização no abastecimento urbano está longe de atingir o seu potencial. A escassez de água tem sido um catalisador para a reutilização da água em todo o mundo, mas, nos locais onde não existe uma escassez grave, há poucos projetos municipais de reutilização de água com dimensão significativa. Esta
situação está a tornar-se cada vez menos sustentável no contexto da emergência climática. Por conseguinte, é necessário dar prioridade à reutilização da água à escala urbana, concretizando-se o seu valor enquanto elo fundamental da cadeia da economia circular da água.
O desenvolvimento bem-sucedido da reutilização de água depende de uma estreita coordenação entre as políticas e a regulamentação no domínio da água, o planeamento de infraestruturas de produção e de distribuição de água para reutilização e a gestão do risco para a saúde humana e o ambiente. A evolução prevista da legislação relativa ao tratamento de águas residuais urbanas (proposta de nova DARU) favorece, direta e indiretamente, a reutilização de água. Diretamente, estabelece que os Estados-Membros devem promover de forma sistemática a reutilização de água a partir de todas as estações de tratamento de águas residuais urbanas onde for apropriado, especialmente em zonas de escassez de água, e para todos os usos apropriados, e que devem considerar a reutilização nas
Reutilização de água: um pilar da economia circular da água e da resiliência hídrica e climática das cidades
suas estratégias de resiliência hídrica. Indiretamente, ao aumentar a exigência de tratamento terciário e quaternário, a nova DARU cria condições para um menor tratamento de afinação da qualidade da ApR, com vantagens para o custo-eficácia da reutilização. A melhoria do nexo água-energia e a recuperação de nutrientes críticos com a reutilização de água, como por exemplo, o fósforo, através da utilização da ApR na rega, são outros fatores a capitalizar no planeamento estratégico dos serviços urbanos de água.
A gestão do risco é um aspeto crítico da reutilização de água, que envolve a adequação e fiabilidade dos processos de tratamento de águas residuais e a gestão da qualidade da água na distribuição, e que apresenta desafios especiais na reutilização de água em usos urbanos. Por exemplo, em comparação com os habituais projetos de reutilização de água na agricultura ou na indústria, os sistemas municipais de ApR (maioritariamente usados para rega de áreas verdes) envolvem redes potencialmente mais longas e ramificadas, com
maior potencial de ligações cruzadas entre sistemas de abastecimento de água distintos, maior sazonalidade no uso da água (rega nos meses quentes e secos), potenciais recetores (por exemplo, a população que usufrui de uma área verde urbana) menos informados, com maior risco de contacto direto com a ApR e cujas atividades/comportamentos determinam os cenários de exposição ao risco.
A gestão inteligente da oferta e da procura de água, centrada na eficiência hídrica e na utilização da qualidade adequada ao fim a que se destina (abordagem fit-forpurpose), é assim essencial para reforçar a resiliência das cidades à escassez de água e às alterações climáticas. Neste sentido, o projeto B-WaterSmart (concluído em agosto de 2024) visou acelerar a transformação para economias e sociedades mais inteligentes no uso da água nas zonas costeiras da Europa, através de seis Laboratórios Vivos, desenvolvendo um vasto conjunto de abordagens, processos, tecnologias e ferramentas informáticas. O Laboratório Vivo de Lisboa (LV Lisboa) foi estabelecido com
a preocupação de melhorar a resiliência climática e hídrica da cidade. Fortemente dependente de origens de água distantes e com cerca de 75% do consumo próprio em usos não potáveis, em especial na rega de espaços verdes (ca. 3 Mm3/ano em 2023; previsivelmente 10 Mm3 em 2025, para satisfazer as crescentes dotações de água das áreas verdes que devem continuar a aumentar em prol da resiliência climática e da qualidade de vida na cidade), o município de Lisboa (promotor/anfitrião do LV Lisboa) decidiu tirar o máximo partido de origens locais de água não potável para suprir a procura compatível, em alternativa ao atual uso de água para consumo humano.
O LV Lisboa foi estabelecido com sete parceiros: Câmara Municipal de Lisboa (promotor/anfitrião), LNEC (mentor científico), Águas do Tejo Atlântico (AdTA), ADENE, Lisboa E-nova, Baseform e ICS-UL. Foram desenvolvida/os e testada/os seis ferramentas digitais, uma tecnologia avançada de tratamento de água e dois instrumentos de planeamento, ilustrados na Figura 1 e descritos em [2]:
# atualidade
• um conjunto inovador de aplicações informáticas para a alocação inteligente de água numa cidade ou região (#17,#24,#25,#27; Baseform, LNEC), que implementa uma abordagem integrada para seleção e priorização (#17) das alternativas que melhor satisfazem em desempenho técnico, ambiental e económico (#25) e com segurança (#27 e #24, para avaliação [3] e gestão [4,5] do risco associado à reutilização de água) a procura de água (em quantidade e qualidade), atual e planeada/prevista numa cidade ou região;
• dois parques urbanos municipais (Nações Norte e Tejo-Trancão; CML), 68 ha de área regada com ApR (água+; AdTA) de elevada qualidade (classe A DL 119/2019), compatível com rega de espaços verdes sem restrição de acesso, onde se demonstrou a valia das ferramentas #27 e #24 (LNEC/Baseform), que implementam, respetivamente: i) uma metodologia de avaliação do risco da reutilização de água em usos urbanos não potáveis baseada nas normas ISO, no regulamento europeu e
na legislação nacional (DL 119/2019) e que guia de forma racional a identificação dos cenários de exposição, um desafio recorrente para as entidades gestoras e reguladoras [3]; um algoritmo inovador que, sobre o modelo hidráulico do sistema de distribuição de ApR, modela o decaimento do cloro, crucial para a gestão do risco e para a operação e manutenção do sistema [4,5];
• um observatório do ciclo urbano da água, para informar e sensibilizar para o uso eficiente da água na cidade (#20; LEN);
• um esquema de certificação Climate Readiness do edificado, que avalia a eficiência hídrica, o nexo água-energia e a adaptação climática, e 33 certificados climate-ready atribuídos (30 fogos, 3 edifícios) (#33; ADENE);
• uma demonstração piloto de tratamento avançado de água para reutilização potável na produção de cerveja (#1; AdTA, LNEC, Moinhos Ambiente), para promover a confiança pública na segurança da reutilização de água;
• duas oportunidades de novos negócios no setor
da água – produção e distribuição de água para reutilização; certificação climate-readiness – e resultados que despertam/ suportam um interesse crescente pela reutilização potável direta, três possibilidades que auguram desenvolvimentos significativos no setor da água;
• uma comunidade de prática (CoP; CML, ICS, LNEC), uma agenda e um plano estratégico para Lisboa (CML, apoio LNEC) desenvolvido no âmbito da Aliança de Inovação estabelecida entre os 6 laboratórios vivos do projeto, com coprodução do quadro de avaliação da gestão inteligente da água (#34, codesenvolvido pelo LNEC).
Reutilização de água: um pilar da economia circular da água e da resiliência hídrica e climática das cidades
Figura 1 - Objetivos estratégicos, soluções e instrumentos desenvolvidos no LV Lisboa no projeto B-WaterSmart
O número, a inovação, o impacto no território (Lisboa) e a replicabilidade das soluções desenvolvidas, bem como a vantagem competitiva que estas
soluções oferecem aos parceiros que as desenvolveram e que colocam Portugal na vanguarda do conhecimento e competência na gestão
inteligente da água, em especial na reutilização segura de água, permitiu que o LV Lisboa do projeto B-WaterSmart evoluísse para um dos 21 “Water-Oriented
# atualidade
Living Labs” (WOLL) que integram o “Atlas of WaterOriented Living Labs” da parceria Europeia Water4All. É objetivo do “Lisbon Water Smart Living Lab” continuar a impulsionar a melhoria contínua da eficiência hídrica e da resiliência climática da cidade, constituindo-se como um palco de ensaio e uma montra de conhecimento científico e tecnológico e de boas práticas de engenharia, política, regulação e envolvimento social e uma fonte de inspiração para outras cidades e regiões.
Agradecimentos
Os autores agradecem o valioso contributo de todos os parceiros do LV Lisboa –CML, Águas do Tejo Atlântico, ADENE, Lisboa E-nova, Baseform e ICS-UL – e dos colegas da equipa do LNEC, bem como o financiamento do programa H2020 da União Europeia, através do contrato 869171 (B-WaterSmart).
Referências bibliográficas
1. Lazarova V. (2022). Water reuse: A pillar of the circular water economy. In Resource Recovery from Water: Principles and Application, Eds Pikaar I., Guest J., Ganigué R., Jensen P., Rabaey K., Seviour T., Trimmer J., van der Kolk O., Vaneeckhaute C., Verstraete W. IWA Publishing, London, UK, ISBN 9781780409566 (eBook), 61–98
2. Rosa M.J., Ribeiro R., Viegas R., Oliveira M., Teixeira P., Figueiredo D., Lourinho R., Mendes R., Fernandes J., Alpalhão J., Coelho S.T., Vitorino D., Andrade D. (2024). B-WaterSmart solutions for Lisbon - Summary report. B-WaterSmart D2.15. August
3. Ribeiro R., Rosa M.J. (2024). The role of scenario-building in risk assessment and decision-making on urban water reuse. Water 16, 2674. https://doi.org/10.3390/w16182674
4. Costa J.R., Mesquita E., Ferreira F., Rosa M.J., Viegas R.M.C. (2021). Identification and modelling of chlorine decay mechanisms in reclaimed water containing ammonia. Sustainability 13(24), 13548. https://doi.org/10.3390/su132413548
5. Costa J., Mesquita E., Ferreira F., Figueiredo D., Rosa M.J., Viegas R.M.C. (2023). Modelling chlorine decay in reclaimed water distribution systems – a Lisbon area case study. Sustainability 15, 16211. https://doi.org/10.3390/su152316211
Reutilização de água: um pilar da economia circular da água e da resiliência hídrica e climática das cidades
# atualidade
Contributo para alargar a reutilização de águas residuais em Portugal: avaliação técnica e económica de potencial em contexto urbano e agrícola
Engenheira do Ambiente; Mestre e Doutorada em Engenharia Sanitária. Professora Associada da Universidade NOVA de Lisboa. Membro integrado do Center for Sustainability and Environmental Research. Diretora da revista Indústria & Ambiente.
Mestre em Engenharia do Ambiente, perfil Engenharia Sanitária, pela Universidade NOVA de Lisboa. Investigador na NOVA FCT. Atualmente investiga a remoção de metais pesados das lamas de ETAR como parte do seu MSCA PhD na KU Leuven.
Inês Areosa
Mestre em Engenharia Aeroespacial pelo Instituto Superior Técnico, e atua como cientista de dados. Com experiência em investigação aplicada, trabalhou em projetos nos setores ambiental e humanitário.
Professor Catedrático em Engenharia do Ambiente da Universidade de Lisboa, Instituto Superior de Agronomia, do qual é Presidente desde 2018. Anteriormente, foi Presidente da ARH do Norte, I.P. (2007) e Diretor de Recursos Hídricos e Ordenamento do Território - Açores (2000).
Contributo para alargar a reutilização de águas residuais em Portugal: avaliação técnica e económica de potencial em contexto urbano e agrícola
Enquadramento
No contexto de crescente escassez de água e desafios climáticos, a reutilização de águas residuais tratadas (ART) é reconhecida como uma origem alternativa vital para assegurar a resiliência e sustentabilidade da gestão integrada de recursos hídricos. A Água para Reutilização (ApR) é uma realidade em vários
países da União Europeia na região do Mediterrâneo, como seja Chipre, com 95% (WaterEurope, 2021) e Malta com 60% (Ramm e Smol, 2023). Em Portugal, de forma confrangedora e apesar das medidas de reutilização de água consagradas na Estratégia Setorial de Adaptação aos Impactos das Alterações Climáticas relacionados com os Recursos Hídricos (APA, 2013), a reutilização de águas
residuais urbanas aproxima-se apenas dos 1,2%, (ERSAR, 2022), longe das metas governamentais preconizadas de 10% em 2025 e 20% em 2030. No domínio agrícola, a Visão para o Regadio 2030 identifica, também, as ART como potencial origem de água, sendo de notar que se estima que as necessidades de rega possam ser supridas em cerca de 23% com ApR (Pistocchi et al., 2017), o que permitiria poupar 660 hm3/ano
de água proveniente de outras fontes.
É neste cenário que a Águas do Tejo Atlântico, S.A. (AdTA) desenvolve projetos para um maior uso de água reciclada, designada pela AdTA por “Água+”, tendo lançado o desafio à Universidade NOVA de Lisboa (NOVA FCT) e ao Instituto Superior de Agronomia (ISA) da Universidade de Lisboa para desenvolver um extenso “Estudo de Diagnóstico e Implementação de Ações para o Aumento de Consumo de Água+”. Para este primeiro horizonte de desenvolvimento, o principal enfoque consistiu nos setores agrícola e recreativo e esta comunicação apresenta uma breve síntese do estudo após ter sido concluído, o qual já está, em parte, publicado (Martins et al., 2024, Areosa et al., 2024a, Areosa et al., 2024).
Desenvolvimento metodológico
A reutilização de águas residuais deve considerar critérios múltiplos, nomeadamente a proximidade da área deficitária e as suas
necessidades de água, a qualidade dos efluentes, a necessidade de nutrientes das culturas, os volumes de água disponíveis e as condições climáticas, associando ainda uma análise de riscos ambientais e os ligados à saúde humana. As considerações económicas são também críticas, uma vez que a viabilidade dos projetos de recuperação de água depende fortemente dos custos associados e da vontade dos utilizadores finais em pagar pela água recuperada. Neste quadro, o projeto desenvolvido visou conceber uma primeira metodologia que integre avaliações técnicas, de custos e de risco para colmatar a lacuna de reutilização de águas residuais em Portugal, utilizando o caso das bacias do Rio Tejo e das Ribeiras do Oeste, permitindo uma avaliação precisa e prática da viabilidade dos projetos de reutilização de águas residuais, identificando as principais fábricas de água (FA) capazes de apoiar a irrigação em grande escala, tendo sido estruturado em quatro etapas específicas.
Para cada FA selecionada foram avaliados múltiplos sistemas de tratamento e
redes de distribuição onde se consideraram fatores como o investimento, o custo operacional e energético, a robustez da qualidade, a prontidão técnica, a qualidade microbiológica e o risco de formação de subprodutos orgânicos. Em cada caso foram determinadas as necessidades de consumo de água do potencial utilizador em função dos diferentes usos: agricultura ou espaços de recreio e as necessidades de transporte e armazenamento, de acordo com as metodologias próprias desenvolvidas. A avaliação de possíveis sistemas de distribuição envolveu a realização de uma análise hidráulica de potenciais percursos de condutas, considerando perfis de elevação e distâncias para determinar o layout mais eficiente; seleção dos diâmetros dos tubos com base nos caudais exigidos e bombas que cumpram as condições exigidas de pressão e caudal e, ao mesmo tempo, minimizem o consumo de energia; e execução de simulações iterativas para testar diferentes cenários, ajustando o design para alcançar o melhor compromisso entre custo e desempenho. Os
Contributo para alargar a reutilização de águas residuais em Portugal: avaliação técnica e económica de potencial em contexto urbano e agrícola
custos de investimento e operação são um elemento essencial para definir a viabilidade de sistemas de tratamento (Nogueira et al., 2007) e, nesse quadro, estimaram-se os custos de capital (CAPEX) compreendendo o investimento tanto nos sistemas de tratamento como na rede de abastecimento, incluindo os custos de construção civil e de conceção de projetos. As estimativas de custos OPEX incluíram os custos de energia, reagentes, pessoal e monitorização da qualidade, determinados com base em valores internos da AdTA. Após processos de tratamento secundário ou terciário é necessária, pelo menos, uma etapa de desinfeção para cumprir os parâmetros microbiológicos estipulados na regulamentação europeia. As tecnologias consideradas mais viáveis foram selecionadas e dimensionadas de acordo com as necessidades de cada caso de estudo. A análise de risco seguiu uma versão adaptada da metodologia recomendada pela Organização Mundial de Saúde para a segurança das águas residuais (Feewtrell & Bartram, 2001).
Síntese de resultados
O diagnóstico efetuado permitiu estimar que, desde 2019, o caudal de ApR é cerca de 1,3% do caudal afluente das FA da AdTA, sendo que a maioria da água+ apenas é utilizada em consumos internos para suprir necessidades de operação, o que é claramente insuficiente para as ambições da AdTA. Neste contexto, considerando o objetivo de aumentar a reutilização de águas residuais e a necessidade de potenciar a utilização de ApR por consumidores externos à AdTA, o trabalho efetuado permitiu constatar que existe uma necessidade de readaptação dos sistemas de tratamento de águas residuais, na generalidade das FA, para poder considerar a sua adequação como ApR (87% considerando o mínimo requerido – equivalente a Classe D), havendo no entanto, algumas exceções já com qualidade equiparada a Classe B, a Classe C e a classe D. Constatou-se também que existe uma elevada capacidade de produção de ApR de classe B ou até mesmo A, para o que bastaria a adição de uma etapa de
tratamento com o intuito de reduzir a contaminação microbiológica. A maioria das FA (94%) encontra-se próxima de zonas agrícolas, apresentando uma disponibilidade total média de 0,165 hm3 diários (1/3 do caudal tratado pela Tejo Atlântico), o que pode potenciar o uso de ApR para este fim. No entanto, em muitos casos a topografia pode ser desfavorável e os terrenos são parcelados ou de pequenas dimensões, o que dificulta a rendibilidade do sistema.
Note-se que cerca de 8% das FA descarrega a ART no estuário do rio Tejo e no Oceano Atlântico, num total de 72% do caudal tratado pela AdTA, dificultando o seu reaproveitamento para ApR. Para além disso, uma parte significativa das FA apresenta uma acentuada sazonalidade, com menor afluência no período estival. Este padrão de disponibilidade é, naturalmente, contrário às necessidades de água para rega agrícola e turística (golfe). Depois desta etapa e num esforço para alinhar a oferta potencial com a procura, as FA com maiores taxas de produção potencial, localizadas perto dos
# atualidade
principais consumidores de água (distâncias às FA menores do que 5 km) foram selecionadas oito FA prioritárias (Alverca, Atouguia da Baleia, Charneca, Fervença, Nazaré, Rio Maior, Turcifal, Vila Franca de Xira), que se constituíram em estudos de casos individuais.
No seu conjunto, as FA contempladas apresentam perfis significativamente diversos, com variações significativas de caudais (1 175 m3/d – 16 575 m3/d), dos sistemas de tratamento e da qualidade dos seus efluentes, o que realça a necessidade de abordagens personalizadas para otimizar a ApR. Os potenciais utilizadores associados a estas FA necessitam predominantemente de água de classe de qualidade B, de acordo com o Regulamento (UE) 2020/741. A diferença nas necessidades de irrigação e relativamente à proximidade às FA são igualmente grandes, especialmente quando se compara a agricultura com os utilizadores do golfe. A reutilização de águas residuais das oito FA selecionadas permitiria a reutilização anual de 8 hm3, quadruplicando as taxas de reutilização regionais e
duplicando a taxa nacional para 2,4%, o que poderia mitigar as necessidades de água para mais de 2.000 ha de terrenos agrícolas e campos de golfe, o que representa uma oportunidade para aliviar a pressão sobre os recursos hídricos locais e aumentar a resiliência dos sectores do turismo e da agricultura. Adicionalmente, em 17 cenários de utilizadores potenciais foram avaliadas 56 propostas, predominantemente (82%) centradas na qualidade da água recuperada de classe B. As percentagens mais elevadas de reutilização de água nas ETAR (58% em Atouguia e 100% na Charneca) corresponderiam a cenários onde existem infraestruturas de armazenamento disponíveis, realçando a importância destas instalações para alcançar taxas de reutilização mais elevadas e garantir uma disponibilidade consistente de água. Em contrapartida, os valores de reutilização mais comuns (entre 31% e 53%) refletem situações sem armazenamento, onde os desequilíbrios entre a oferta e a procura inibem a satisfação de todas as necessidades dos utilizadores. Em termos gerais, as necessidades de
irrigação dos campos de golfe parecem ser mais fáceis de satisfazer devido às suas menores necessidades de água, enquanto a irrigação agrícola está mais dependente da área de cultivo e da capacidade da FA. Verificou-se ainda que o CAPEX se manteve relativamente estável em diferentes sistemas de tratamento, enquanto o OPEX e os custos unitários variaram, especialmente para tecnologias como a desinfeção UV e o dióxido de cloro. Estas tecnologias, embora eficazes e mais seguras do ponto de vista ecotoxicológico, aumentam os custos operacionais devido ao maior consumo de energia e aos custos dos reagentes.
Nesta base, este estudo permitiu estimar os custos associados aos projetos de reutilização de água para estas FA e, para a qualidade da classe B, o custo estimado varia entre 0,02€/m3 e 0,83€/m3, com uma média de 0,31€/m3, englobando o tratamento terciário e a distribuição. No entanto, deve-se ter cuidado, pois em Portugal o custo insignificante da captação de águas subterrâneas poderá
Contributo para alargar a reutilização de águas residuais em Portugal: avaliação técnica e económica de potencial em contexto urbano e agrícola
dificultar a adoção deste tipo de projetos (APA, 2023). É ainda de notar que estes valores não têm em conta as externalidades ambientais, que comprovadamente compensam as tarifas e podem tornar os projetos de reutilização economicamente viáveis (Molinos-Senante et al., 2011). Os valores calculados para os utilizadores agrícolas contrastam com as tarifas de água de rega praticadas entre as associações de utilizadores de água, em que a tarifa volumétrica é em média de 0,02€/m3 (Rodrigues et al., 2021; OCDE, 2010). Assim, a viabilidade da tarifa está ligada à capacidade do utilizador aceder a outras fontes de água convencionais ou não convencionais, à sua adaptabilidade em contextos de stress hídrico e à possibilidade de aceder a fontes de financiamento externas.
Tal como previsto, os requisitos de distância e volume de água foram identificados como os principais determinantes dos custos, tendo os investimentos na rede de distribuição desempenhado um papel fundamental. Estima-se que a distribuição
represente em média 79% do investimento inicial e 41% dos custos operacionais. Estas conclusões são cruciais para o importantíssimo debate em curso sobre a estratégia ideal para a localização de FA no sentido de as transformar em verdadeiras unidades para a reutilização de água. Com efeito, os custos de transporte da água+, em alguns casos, ultrapassam os potenciais custos de tratamento complementar. Este aspeto é um fator que foi já evidenciado em outros estudos, em parte associado ao tema dos sistemas centralizados versus sistemas descentralizados, algo que deverá ser refletido estrategicamente quanto aos aspetos a considerar para novas infraestruturas de tratamento de águas residuais ou para reabilitação das existentes. Este facto contribui também para que, em grande parte, os custos unitários calculados sejam significativamente superiores à atual disponibilidade de pagamento dos utilizadores. Deste modo, a viabilidade do custo unitário a praticar vincula-se à capacidade de o utilizador aceder a outras origens de água convencionais ou não e da sua adaptabilidade em
contextos de stress hídrico, questões que exigiriam considerações adicionais fora do âmbito desta comunicação.
O estudo também identificou que, em alguns casos, os sistemas de tratamento principal não cumprem, ocasionalmente, as normas de emissão, o que reduz a fiabilidade da ART e exige sistemas de afinação resilientes, ou seja, mais dispendiosos. É, por isso, crucial continuar a implementar melhorias no processo e garantir a redução das afluências industriais sem pré-tratamento, conforme é plano da AdTA. Um outro fator importante é o quadro normativo comunitário, o qual irá, por si, obrigar a um aumento dos níveis de tratamento em termos de nutrientes e substâncias prioritárias, não só em termos de eficiência como, sobretudo, relativamente aos parâmetros abrangidos. Este facto pode ser visto como uma ameaça ou como uma oportunidade, pois poderá ser positivo para tornar as ART como efetivas origens alternativas de água com uma perspetiva de economia circular.
# atualidade
Em face dos investimentos que será preciso realizar, impõe-se uma posição convergente e proactiva do legislador, do regulador, das entidades gestoras e de todos os utilizadores no processo que possa levar à fixação de tarifas e eventual partilha de encargos. Encontraram-se, aliás, casos com utilizadores em competição pelo recurso (escasso), sendo necessário definir estratégias de priorização, pois essa decisão ultrapassa os meros aspetos técnicos. Por outro lado, a capacidade de reinvenção para novos modelos de recolha e tratamento de águas residuais (Rodrigues et al., 2023) e/ou inovação em planeamento e gestão da água serão, igualmente, decisivos para as entidades gestoras lidarem com os desafios que hoje se colocam (Martins et al., 2013).
Conclusões
Este projeto representou uma etapa importante na compreensão e exploração do potencial de reutilização de água no contexto da empresa Águas do Tejo Atlântico (AdTA) e a nível nacional. Com efeito, o paradigma da escassez da
água obriga a repensar o ciclo urbano da água, as suas abordagens, a capacidade de inovação e de investimento e, nesse sentido, este projeto forneceu uma base para análise e planeamento de projetos de reutilização de água tratada, particularmente no contexto da rega agrícola ou recreativa. Estes resultados poderão ser replicados, com as devidas ressalvas, a toda a área de abrangência da AdTA, favorecendo a definição de um programa nacional para a produção e consumo de ApR em Portugal.
Agradecimentos
Cumpre-nos agradecer a valiosa colaboração dos colegas da AdTA, nomeadamente as equipas de Investigação, Desenvolvimento e Inovação, Gestão de Ativos e Comunicação e Desenvolvimento, permitindo-nos nomear, em especial, o acompanhamento e encorajamento da Eng.ª Rita Lourinho e do Dr. Marcos Batista.
Referencias bibliográficas
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ÁGUA PARA REUTILIZAÇÃO: PERSPETIVA DAS ENTIDADES
GESTORAS
Comissão Especializada de Águas Residuais da APDA
“... apenas sete entidades gestoras (duas em alta e cinco em baixa) produziram ApR em 2022, correspondendo a 2,9 M m3 e cerca de 0,4% da água residual tratada. Desta, cerca de 26% foi ApR cedida a terceiros e 74% teve a finalidade de uso próprio”.
ÁGUA PARA REUTILIZAÇÃO: PERSPETIVA DAS ENTIDADES GESTORAS
1. ENQUADRAMENTO
Na definição de economia circular está sempre presente a ideia-chave de uma utilização mais racional e sustentável dos recursos disponíveis, sendo a água um dos mais críticos. A gestão eficiente deste recurso não se limita apenas à sua utilização, mas também à sua preservação e recuperação, promovendo a reutilização como uma prática essencial.
A água, como elemento vital para a vida e para diversas atividades económicas, enfrenta pressões crescentes devido à escassez e à poluição.
O efeito das alterações climáticas é uma delas. Nos últimos anos regista-se um aumento de 10% na temperatura média anual, relativamente ao período de 1980 a 2015. Aliado à alteração dos padrões de pluviosidade, que apresentam
uma tendência significativa de redução em volume, mas um aumento em eventos extremos que provocam danos nas infraestruturas e equipamentos, verifica-se um impacto relevante na escassez hídrica sob as fontes tradicionais de água, bem como na procura de soluções de contingência por parte das entidades gestoras [1] [2].
A pressão sobre os recursos hídricos e a incerteza associada à disponibilidade
# atualidade
de água conduzem à necessidade de procura de fontes alternativas para garantia de resposta aos requisitos de produção, quer para consumo humano, quer para outras utilizações, onde se incluem os usos agrícolas, industriais e hidroelétricos. Naturalmente, impõe-se, também, uma utilização mais eficiente da água em todos os setores de atividade, bem como a gestão das diversas origens da água e respetiva qualidade, em função dos usos a que se destina, não descurando a segurança e a saúde pública.
Por outro lado, o valor (custo) da água não reflete, em múltiplas situações, todos os custos de utilização dos recursos disponíveis, sendo necessário e crucial assegurar o pagamento do preço real da água, em prol da sustentabilidade económica, ambiental e social. Esta é uma oportunidade e simultaneamente um desafio (muito) atual do setor [3].
A utilização de águas residuais tratadas, águas pluviais ou águas remanescentes/excedentes de rega de culturas fora do solo poderão, assim, fornecer uma alternativa eficaz para
dar resposta às necessidades de água, nomeadamente para usos não potáveis.
Para tal, a abordagem Fit-for-Purpose prevista no Decreto-Lei n.º 119/2019, de 21 de agosto, que estabelece o regime jurídico de produção de água para reutilização obtida a partir do tratamento de águas residuais, bem como a sua utilização, assegura a definição de classes de qualidade da água, permitindo adequar as barreiras múltiplas e os tratamentos de afinação em função do uso a que se destina.
Este normativo incorpora a preocupação com os potenciais efeitos adversos sobre a saúde e o meio ambiente e estabelece igualmente um conjunto de regras a aplicar à prática da reutilização, bem como o desenvolvimento de metodologias para a respetiva avaliação do risco.
A emissão de licenças de produção de água para reutilização (ApR) representa o instrumento que permite a gestão da reutilização em função das especificidades das águas residuais tratadas, dos recetores e dos usos
previstos e deve contemplar todas as obrigações referentes à produção e à utilização, nomeadamente as normas de qualidade aplicáveis, o respetivo programa de autocontrolo e, ainda, as regras de verificação do respetivo cumprimento.
O potencial de reutilização deve ser sempre avaliado através de uma análise custobenefício entre a oferta, o potencial de produção, a avaliação do risco e a procura, conduzindo à necessidade de definição clara de um ponto de entrega e de condições associadas à transação entre produtores e utilizadores finais.
Ainda no que diz respeito à produção de ApR, o Decreto-lei n.º 16/2021, de 24 de fevereiro, confere responsabilidades no desenvolvimento desta atividade aos Sistemas Multimunicipais de recolha, tratamento e rejeição dos efluentes, integrando-a no âmbito da sua atividade.
Por fim, em março de 2023, foi aprovada por deliberação do Conselho de Administração da ERSAR, a Recomendação n.º 03/2023 sobre Águas
para Reutilização [4], tendo em conta os objetivos nacionais associados à conservação dos recursos naturais e ao uso eficiente da água, inscritos nos planos estratégicos do setor. Esta recomendação pretendeu atualizar e substituir a informação emitida em 2007 (Recomendação IRAR n.º 02/2007 [5]), de forma a incorporar atividades como a avaliação prévia da viabilidade de projetos, construção e implementação de um regime tarifário, desenvolvimento de procedimentos de contratação e metodologias de faturação.
Também a nova Diretiva das Águas Residuais Urbanas, a publicar brevemente, pretende dar resposta às crescentes pressões sobre os recursos hídricos, através da promoção de uma maior reutilização das águas residuais urbanas tratadas, por forma a limitar a captação de água doce nas massas de água de superfície e subterrâneas. O reforço dos requisitos de tratamento das águas residuais e as medidas para melhorar a monitorização, o rastreio e a redução da poluição na fonte, através do controlo
ÁGUA PARA REUTILIZAÇÃO: PERSPETIVA DAS ENTIDADES GESTORAS
da poluição não-doméstica, terão repercussões na qualidade das águas residuais urbanas tratadas e, por conseguinte, favorecerão a reutilização da água.
2. VISÃO DAS ENTIDADES GESTORAS
2.1. Introdução
As infraestruturas de tratamento de águas residuais urbanas em Portugal são caracterizadas por um conjunto de soluções distintas devido à heterogeneidade e flutuações sazonais que se fazem sentir ao longo do país, tanto a nível de densidade populacional, como de orografia e também de pluviosidade. Segundo o RASARP 2023 [6], existem 4353 instalações de tratamento de águas residuais em Portugal continental, das quais cerca de 65% correspondem a ETAR e 35% a fossas séticas coletivas.
Tendo em conta a evolução negativa que se tem registado a nível de disponibilidade hídrica em contexto nacional e o consequente aumento de pressão sobre as massas de água, a implementação de soluções de produção
de ApR deverá assumir uma relevância cada vez maior. De acordo com o RASARP 2023, os sistemas de produção de ApR em Portugal são escassos, devendo notar-se que em 2022, e na sequência da revisão da 4.ª geração de indicadores de Avaliação da Qualidade do Serviço e alteração do indicador AR18 (Produção de ApR), foram contabilizadas apenas as utilizações que dispunham de licença de produção ou de utilização válida. Como tal, apenas sete entidades gestoras (duas em alta e cinco em baixa) produziram ApR em 2022, correspondendo a 2,9 M m3 e cerca de 0,4% da água residual tratada. Desta, cerca de 26% foi ApR cedida a terceiros e 74% teve a finalidade de uso próprio [6].
No âmbito dos trabalhos da Comissão Especializada de Águas Residuais (CEAR) da APDA tentou compreender-se junto de Entidades Gestoras que já possuem um papel ativo na produção de ApR, qual a sua experiência neste processo, desde a obtenção da licença de produção, passando pelos processos de tratamento a implementar, até aos desafios a que o setor tem de dar resposta,
# atualidade
nomeadamente a aplicação de tarifa e o combate à escassez.
Contactaram-se seis
Entidades Gestoras com atividade desenvolvida no âmbito de projetos de água para reutilização, para partilhar a sua experiência. Todas as Entidades aceitaram o convite e participaram, proporcionando assim falar sobre o tema com maior conhecimento da realidade.
As entidades gestoras consultadas encontram-se em diferentes níveis de maturidade relativamente a este processo, tendo não só sido consultadas algumas que já produzem ApR há vários anos, como outras que iniciaram recentemente projetos piloto com o objetivo de avaliar a viabilidade do investimento necessário.
2.2. Implementação de sistemas de produção de APR
Tendo por base a recolha dos testemunhos das entidades gestoras envolvidas e o contributo dos membros da CEAR, destacam-se, de seguida, aqueles que foram identificados como os maiores desafios no processo
de implementação de sistema de produção de ApR.
´ Legislação e licenciamento
Embora a legislação aplicável esteja em vigor há alguns anos e a entidade licenciadora tenha desenvolvido esforços na divulgação, esclarecimento e acompanhamento da metodologia de licenciamento de um sistema de ApR, este processo carece ainda de uma maior maturidade. A abordagem Fit-for-Purpose, que incorpora critérios de licenciamento individualizados em cada projeto, pode gerar alguma incerteza. A análise pormenorizada de cada entidade envolvida no licenciamento pode fazer estender os prazos de resposta aos pedidos de licenciamento e obrigar a um esforço orçamental e de planeamento de execução de projeto por parte da EG.
A restrição sazonal de utilização de ApR para salvaguarda dos caudais ecológicos ou para prevenção de poluição, de uma forma pouco flexível limita, em alguns
casos, a viabilidade dos projetos, quer por falta de possibilidade de responder às necessidades do utilizador, quer por restrição do potencial económico do projeto.
Outra dificuldade referida na implementação de sistemas de ApR é a falta de clarificação do disposto na legislação, no que respeita à necessidade ou não de licenciamento para a produção de ApR, tendo por base a diversidade de utilizações possíveis no interior das entidades gestoras. Não é perfeitamente claro se a produção de ApR para usos próprios se encontra excluída da necessidade de licenciamento para produção, mesmo que exista certificação ambiental e de gestão de segurança e saúde, que salvaguarde os potenciais riscos associados à sua utilização. Esta dúvida surge no seguimento da publicação do SIMPLEX do licenciamento (Decreto-Lei n.º11/2023, de 10 de Fevereiro), que procede à reforma e simplificação dos licenciamentos ambientais, através da eliminação de
licenças, autorizações, atos e procedimentos dispensáveis ou redundantes face à tutela dos recursos ambientais, simplificando as atividades das empresas sem comprometer a proteção do ambiente e a aceleração da concretização das transformações necessárias a realizar no contexto atual de crise energética, de seca e de luta contra as alterações climáticas.
O processo de licenciamento para consumo por terceiros obriga à realização de avaliações de risco, que são mais ou menos complexas consoante o uso a que se destina a ApR. Tendo em conta o nível de maturidade da realidade portuguesa em implementação destes projetos, o apoio externo na realização da avaliação de risco foi referido como algo que pode ser melhorado. Em qualquer dos casos, foi unânime a opinião de que a APA se tem demonstrado acessível e disponível para apoiar as entidades gestoras no desenrolar de todo o processo.
ÁGUA PARA REUTILIZAÇÃO: PERSPETIVA DAS ENTIDADES GESTORAS
Foi também referido que, por vezes, as exigências que são impostas, especialmente no que concerne a questões de saúde pública, poderão colocar em causa a aceitação social da utilização deste recurso (por exemplo, o uso obrigatório de máscara dos trabalhadores em operações de limpeza urbana com recurso a ApR).
Convém também salientar que um processo de licenciamento menos “amigável” pode afastar os possíveis utilizadores da participação em projetos ApR. A integração de um utilizador nestes projetos é garantia de cumprimento de um conjunto de regras e procedimentos de segurança com o envolvimento de um corpo técnico robusto, em contraponto à utilização de origens de água pouco controladas e sem monitorização quantitativa e qualitativa, o que pode contribuir para um maior desequilíbrio da sua gestão. Um exemplo destes pode ser a utilização direta da linha de água com contribuição
maioritária de água residual tratada em comparação com a utilização de ApR, em projeto agrícola.
´ Caraterísticas específicas de cada região
A escassez hídrica e a necessidade de gestão das origens de água e da sua utilização é uma realidade do território português. No entanto, existe alguma assimetria na capacidade de resposta às necessidades de água inerentes a cada região. As zonas do Algarve, Alentejo e do Nordeste transmontano são zonas onde a necessidade de encontrar novas origens de água é já uma prioridade.
A produção de ApR reveste-se de uma importância extrema no sul do país, onde o cenário de escassez hídrica atual obriga já à utilização de fontes de água alternativas como solução de redução da pressão sobre as origens ativas. Esta situação faz com que a produção de ApR a partir das águas residuais tratadas nas ETAR seja extremamente importante e seja o foco da maioria
# atualidade
das instalações localizadas precisamente nessa região.
Note-se, no entanto, que, nas regiões de maior escassez, a produção de ApR poderá conduzir à redução de caudal nos rios e ribeiras, já que a descarga dos efluentes tratados das ETAR é muitas vezes a única contribuição de água destes cursos hídricos, em especial nos períodos de verão. Deverá, nestes casos, ser feita uma adequada ponderação da mais-valia de produção de ApR atendendo: (i) aos potenciais impactos sobre os ecossistemas, mas sem descurar o regime natural dos cursos de água antes da existência da ETAR; (ii) ao alívio conseguido nas disponibilidades de outras origens de água; (iii) à disponibilidade de uma fonte fiável de água; (iv) às mais valias económicas e sociais obtidas pela utilização de ApR. No que toca à zona norte do País, existem, todavia, dois cenários distintos: a zona litoral onde ainda não se verificam cenários de escassez hídrica, demonstrando-se um entrave à utilização de ApR pelos stakeholders, ou o
nordeste transmontano que já sofre com a escassez hídrica, e onde a utilização de ApR começa a ser uma necessidade, especialmente no que respeita à rega agrícola.
Outra dificuldade, também enunciada, prende-se com a localização geográfica das grandes ETAR com capacidade para produzir ApR. Em ETAR que estão maioritariamente localizadas em perímetro urbano, a viabilidade de implementação de soluções de produção de ApR está limitada do ponto de vista económico, uma vez que não existe agricultura, nem indústria, nas áreas limítrofes.
A implementação de sistemas de distribuição de ApR em meio urbano é condicionada pela necessidade de investimento na construção de uma nova rede de distribuição em área já densamente infraestruturada. Já no caso da existência de uma orografia com declives acentuados, o recurso a ApR é considerado mais viável para cotas próximas ou inferiores às da ETAR,
face ao custo energético de elevação.
Quando o ponto de produção fica próximo de explorações agrícolas existe uma sinergia natural na utilização de ApR, identificando-se como maior entrave a sazonalidade da necessidade do utilizador e da possível alternância de culturas, que levarão a uma necessidade de adaptação ao produtor.
´ Adaptação tecnológica
A implementação de sistemas de tratamento de águas para reutilização apresenta uma série de desafios tecnológicos que são cruciais para garantir a qualidade da água tratada e a sua adequação a diferentes usos. As características das águas a tratar, que variam em composição química, carga poluente e presença de contaminantes emergentes, exigem a adoção de tecnologias avançadas e adaptáveis. Existe, todavia, no mercado, disponibilidade de tecnologia adequada aos desafios impostos pela reutilização.
ÁGUA
PARA REUTILIZAÇÃO:
PERSPETIVA DAS ENTIDADES GESTORAS
Na perspetiva do utilizador de ApR será também necessária alguma adaptação à especificidade das caraterísticas desta água. Um dos problemas identificados é a presença de obstruções pontuais em gotejadores para rega, por exemplo, que podem ser causadas por partículas ou sedimentos presentes na água residual tratada. Essas obstruções podem levar a uma distribuição irregular da água, afetando a irrigação das culturas. Embora o sistema esteja bem equipado, a manutenção regular e a gestão de obstruções são essenciais para garantir a eficácia do sistema de rega e a saúde das culturas irrigadas.
Outro caso específico diz respeito à adaptação de equipamentos já existentes para utilização de ApR, como por exemplo, os veículos de limpezas de ruas. Nestes, deverá ser garantido que, caso seja necessário um reabastecimento a partir do sistema de distribuição de água potável, não haja qualquer ponto de contato com a ApR ou de eventual contaminação da água potável.
´ Custos associados
A implementação de sistemas de ApR enfrenta vários entraves económicos que podem dificultar a sua adoção. Entre os principais desafios estão os investimentos iniciais elevados, pois envolvem a aquisição de tecnologia adequada, a construção de infraestruturas e a implementação de sistemas de tratamento eficientes. Esses custos podem ser um obstáculo, especialmente para entidades gestoras com orçamentos limitados ou que já enfrentam desafios financeiros. Sem o suporte financeiro necessário (por exemplo com a existência de fundos de financiamento), a implementação de tecnologias avançadas de tratamento poderá tornarse um desafio, limitando a capacidade de algumas entidades em manter os projetos.
Além disso, os custos operacionais, que incluem a manutenção dos sistemas, o consumo de energia e/ou produtos químicos, a monitorização
da qualidade da água, a formação de pessoal qualificado, assim como a necessidade de garantia da conformidade com regulamentos ambientais e de saúde pública podem constituir uma preocupação adicional. Tais fatores económicos, combinados com a necessidade de garantir a segurança e a eficácia dos sistemas de ApR, tornam a sua implementação um desafio complexo que requer uma análise cuidada e, muitas vezes, apoio financeiro ou incentivos governamentais para facilitar a transição.
Em termos de estudo de viabilidade económicofinanceira, todas estas questões podem tornar a tarifa pouco apelativa, pois a mesma tem de ser inferior à tarifa de água potável de modo a promover a adesão. Acresce, em algumas situações, que o prazo de amortização de investimentos imposto (ex. por falta de enquadramento em contratos de concessão), pode tornar a tarifa inviável.
# atualidade
Nesse sentido, alguns testemunhos apontam que o abastecimento feito nas próprias estações de tratamento pode ser uma boa solução (ex. com recurso a autotanques), enquanto se analisam outras opções para transporte da água até ao utilizador final.
Aumentar a escala do projeto, procurando ativamente utilizadores, pode contribuir para viabilizar o investimento e otimizar a infraestrutura concebida com o propósito de produção ApR, sendo uma solução prática para facilitar a transição para a utilização de água para fins não potáveis, sem onerar excessivamente os utilizadores.
Importa salientar que a maioria dos projetos implementados ainda não tem associada uma tarifa, pese embora algumas das entidades gestoras já se encontrem em fase de definição do valor desta tarifa segundo as recomendações da entidade reguladora.
´ Operacionalização
A operacionalização de sistemas de ApR enfrenta, igualmente, desafios significativos, especialmente no que diz respeito à monitorização da qualidade da água e aos potenciais impactos ambientais e de saúde pública. A monitorização a longo prazo da qualidade da água reutilizada é crucial e envolve desafios técnicos, operacionais e financeiros uma vez que a diversidade de contaminantes — incluindo patogénicos, produtos químicos e poluentes emergentes — exige tecnologia e métodos de monitorização avançados e uma vigilância contínua (idealmente em tempo real) para assegurar a conformidade com os padrões estabelecidos.
Além disso, as variações na qualidade da água ao longo do tempo, influenciadas por fatores sazonais e alterações na origem de água, complicam ainda mais a tarefa de garantir a segurança da água tratada. Os custos associados à implementação de
sistemas de monitorização eficazes podem ser um obstáculo, especialmente para entidades gestoras de menor dimensão.
Nas entidades gestoras consultadas, verifica-se a adoção de diversos níveis de complexidade de monitorização, dependendo da qualidade pretendida para a água reutilizada e da tipologia de projeto que cada uma das entidades integra. Considerando os novos normativos em desenvolvimento, é expectável uma crescente necessidade de monitorização de componentes com métodos analíticos mais complexos e de limites de deteção mais baixos.
A adoção de um sistema de produção ApR não pode ser visto apenas na vertente da proteção do recurso hídrico, mas sim de uma forma holística relativa a todos os aspetos ambientais, onde se inclui o aumento do consumo de energia e de produtos químicos, alteração dos ecossistemas aquáticos e ripícolas.
ÁGUA PARA REUTILIZAÇÃO: PERSPETIVA DAS ENTIDADES GESTORAS
´ Aceitação social
A aceitação social da ApR representa um desafio significativo para as entidades gestoras, refletindo a necessidade de uma abordagem proativa na sensibilização da população. A perceção pública sobre a reutilização da água pode ser moldada por fatores como conhecimento, comunicação e confiança transmitida. Embora algumas entidades relatem que a aceitação social não tem sido um problema, a realidade é que o fraco envolvimento da população nestes projetos pode influenciar a opinião da comunidade. Para superar esses desafios, é crucial implementar atividades de sensibilização que destaquem os benefícios da reutilização da água, como a preservação de recursos hídricos e a contribuição para a sustentabilidade ambiental, enfatizando sempre a salvaguarda da saúde pública. A comunicação clara e transparente é fundamental para construir confiança e credibilidade junto da população.
Algumas entidades têm promovido a ApR como um produto de valor acrescentado, nomeadamente para a agricultura, enfatizando a circularidade e a importância da água reutilizada no combate à escassez hídrica.
Além disso, a colaboração com municípios, freguesias e associações ambientais tem mostrado resultados positivos, reforçando a aceitação dos projetos em curso. A cooperação com a comunidade científica para garantir a segurança e fiabilidade da água tratada também é um passo importante. Através de fóruns, reuniões e planos de comunicação, as entidades podem envolver as partes interessadas e fomentar uma maior compreensão e aceitação das soluções de ApR.
Quando os projetos se encontram em fase piloto não existe grande preocupação com a realização de campanhas de sensibilização robustas, o que resulta num menor feedback pelo cidadão comum, uma vez que não existe perceção de que a
origem da água utilizada foi alterada.
Estas experiências sublinham a importância da comunicação e do envolvimento da comunidade na aceitação social das soluções de ApR, assim como a necessidade de estratégias de sensibilização adaptadas às especificidades de cada contexto.
2.3. Projetos de ApR implementados
As diversas entidades gestoras consultadas têm desenvolvido iniciativas significativas, no âmbito da implementação de projetos de água para reutilização (ApR), refletindo a crescente importância da reutilização de recursos hídricos, nomeadamente ao nível de:
• Limpeza urbana
• Lavagem de viaturas municipais
• Rega de espaços verdes
• Uso agrícola para diferentes culturas nomeadamente vinha, olival e amendoal
• Uso industrial, por exemplo em circuitos de arrefecimento
Em qualquer um dos projetos realizados foi realçada a
# atualidade
articulação positiva entre as diferentes entidades envolvidas, havendo ainda um longo caminho a percorrer na sua implementação estruturada e no aumento de escala. Também a evolução contínua das tecnologias e a gestão de riscos se demonstra fundamental para garantir a sustentabilidade e a eficácia destes projetos.
A implementação de sistemas de água para reutilização (ApR) tem gerado resultados positivos nas entidades gestoras, refletindo não apenas a eficiência dos projetos, mas também os benefícios ambientais e económicos associados, destacando-se a redução da pressão sobre os recursos hídricos e a melhoria da qualidade das águas subterrâneas e superficiais, contribuindo assim para o aumento da resiliência dos sistemas de abastecimento de água face a eventos extremos, como secas e alterações climáticas.
2.4. Visão sobre o futuro
A implementação de sistemas de água para reutilização (ApR) em Portugal enfrenta desafios significativos, mas também apresenta um vasto potencial para o futuro.
A implementação de sistemas ApR tem promovido a inovação tecnológica no setor da água através da utilização de novas tecnologias de tratamento, soluções de monitorização e automação, integração de energias renováveis, e a criação de novos modelos de negócio e serviços. Além disso, a colaboração com instituições de investigação tem sido crucial para impulsionar esta inovação, tornando o setor da água mais eficiente, sustentável e resiliente face à escassez hídrica.
As entidades gestoras contactadas expressaram preocupações sobre a escala atual da implementação, que consideram insuficiente para responder às necessidades hídricas do país. A falta de licenciamento ágil e a necessidade de adaptações infraestruturais significativas são obstáculos que dificultam a expansão. Com a atualização das tarifas e a criação de incentivos adequados, será possível aumentar a utilização de ApR, especialmente em zonas com maior escassez hídrica. A evolução das exigências de tratamento e a possibilidade de tornar a utilização de ApR
obrigatória em certas regiões, como no Sul, poderão impulsionar a adoção desta prática.
É importante destacar que, além da ApR, outras medidas são cruciais para enfrentar a escassez de água. A garantia da eficiência na gestão dos serviços de água, através da gestão de perdas e da otimização do consumo, gestão de afluências indevidas em paralelo com medidas de controlo da poluição na origem em sistemas de saneamento é fundamental. A adoção de tecnologias mais eficientes em diversas operações pode contribuir significativamente para a redução do desperdício e para a maximização do uso da água disponível.
A cooperação internacional surge, também, como uma oportunidade valiosa. Projetos como o I-Rewater ou MARCLAIMED, que envolvem parcerias com entidades de outros países, demonstram como a troca de conhecimentos pode enriquecer a experiência de Portugal na implementação de ApR. A colaboração com a comunidade científica é crucial para entender os
impactos e maximizar os benefícios da reutilização de água.
Como Comissão Especializada da APDA mantemos o compromisso de estar atentos ao tema e trabalhar no sentido de fomentar a divulgação e a partilha das experiências bem sucedidas.
ÁGUA PARA REUTILIZAÇÃO: PERSPETIVA DAS ENTIDADES GESTORAS
REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS
[1] IPMA, “ipma.pt (FAQ’s - Climatologia)”, Instituto Português do Mar e da Atmosfera, [Online]. Available: https://www. ipma.pt/pt/educativa/faq/climatologia/faqdetail.html?f=/ pt/educativa/faq/climatologia/faq_0004.html. [Acedido em 11 09 2024].
[2 APA (Agência Portuguesa do Ambiente), Estratégia Nacional de Adaptação às Alterações Climáticas (ENAAC 2020), Agência Portuguesa do AMbiente, maio de 2015.
[3] M. Gouveia, O valor económico da água em Portugal, Lisboa, Católica Lisbon School of Business & Economics, junho de 2024.
[4] ERSAR (Entidade Reguladora dos Serviços de Águas e Resíduos), “Recomendação n.º 3/2023 - Recomendação sobre Águas para Reutilização”, ERSAR, Lisboa, março de 2023.
[5] IRAR (Instituto Regulador de Águas e Resíduos), “Recomendação IRAR n.º 02/2007 - Utilização de Águas Residuais Tratadas”, IRAR, Lisboa, 2007.
[6] ERSAR (Entidade Reguladora dos Serviços de Águas e Resíduos), Relatório Anual dos Serviços de Águas e Resíduos em Portugal (RASARP 2023), Lisboa: ERSAR, ISBN: 978-989-8360-46-5, fevereiro de 2024.
[7] República Portuguesa, “Portal da Agricultura - “Uso Eficiente da Água”, 11 janeiro 2022. [Online]. Available: https://agricultura.gov.pt/pt/uso-eficiente-da-agua. [Acedido em 11 setembro 2024].
[8] IPCC (Intergovernmental Panel on Climate Cheange), Climate Change 2023 - Synthesis Report, Summary for Policymakers, Genebra, Suiça, 2023.
[9] A. M. e. Silva, J. M. Baptista, M. d. C. Almeida, P. Vieira e R. Ribeiro, “Uso Eficiente da Água para Fins Industriais”, 6º congresso da água, APRH - Associação Portuguesa dos Recursos Hídricos, vol. Poster 36, pp. 82-83, 2002.
[10] APA (Agência Portuguesa do Ambiente), “Boletim semanal de albufeiras”, Agência Portuguesa do Ambiente, 23 setembro 2024. [Online]. Available: https:// apambiente.pt/sites/default/files/_SNIAMB_Agua/DRH/ MonitorizacaoAvaliacao/BoletimAlbufeiras/Semanal.pdf
EVENTOS
# EVENTOS
Eventos APDA
Colóquio “A Economia do Setor da Água –Realidade e Planeamento”
Comissão Especializada de Legislação e Economia
Local: Forte de Santiago da Barra, Viana do Castelo
Data: 7 novembro
Informações aqui
Encontro “Nova Diretiva das Águas Residuais
Urbanas – Os desafios para a minha Entidade
Gestora”
Comissão Especializada de Águas Residuais
Local: Teatro Sá da Bandeira, Santarém
Data: 29 novembro
Informações aqui
Eventos nacionais
21.º ENaSB - Encontro de Engenharia
Sanitária Ambiental
APESB | Município de Braga | AGERE
Local: Forum Braga
Data: 20-23 novembro
Informações aqui
14.º Seminário sobre Águas Subterrâneas
APRH
Local: Universidade Lusófona, Lisboa
Data: 5-6 dezembro
Informações aqui
APDA, NACIONAIS E INTERNACIONAIS
Eventos INTERnacionais
17th IWA Conference on Small Water and Wastewater Systems | 9th IWA Conference on Resource Oriented Sanitation
IWA
Local: Curitiba, Brasil
Data: 10-14 novembro
Informações aqui
16.º SILUSBA - Simpósio de Hidráulica e Recursos Hídricos dos Países de Língua Portuguesa | XI CPGZC - Congresso sobre Planeamento e Gestão das Zonas Costeiras dos Países de Expressão Portuguesa APRH | ABRH | ACRH | AQUASHARE
Moçambique | AMAIA
Local: Maputo, Moçambique
Data: 17-22 novembro
Informações aqui
Water Knowledge Europe 2024
Water Europe online
Data: 10-12 dezembro
Informações aqui
CIRCULARIDADE DA ÁGUA
ÁGUA NA ECONOMIA CIRCULAR E RESILIÊNCIA (WICER)
UMA INICIATIVA DO BANCO MUNDIAL
Repensar a água através das lentes da economia circular e da resiliência oferece uma oportunidade para enfrentar os novos desafios, proporcionando uma abordagem sistémica e transformadora para fornecer serviços de abastecimento de água e saneamento de uma forma mais sustentável, inclusiva, eficiente e resiliente.
RESILIENTESEINCLUSIVOS
Figura: Water in Circular Economy and Resilience (WICER) Framework
Fonte: https://openknowledge.worldbank.org/bitstream/handle/10986/36254/163924.pdf
CIRCUL ARIDADE DA ÁGUA
Enquanto o modelo linear envolve a captação, o uso e a descarga da água, o modelo circular remete para um ciclo fechado onde a água é reutilizada. O ciclo fechado considera a água como um recurso finito, vital e com valor associado, além de sugerir a redução na captação, a eficiência no uso, a redução de perdas na produção e na distribuição e a restauração e recuperação dos recursos hídricos.
Reciclagem e reutilização (interna e ex terna) e na redução de perdas
Restauração e recuperação de recursos hídricos
Redução na captação
Eficiência na utilização
Redução e controlo de qualidade da descarga
Norte da Europa
Fonte: https://cebds.org/publicacoes/factsheet-esg-e-circularidade-de-agua
39% Agricultura
250 sistemas 537 sistemas
Sul da Europa + 437 sistemas desde 2006
787
Sistemas
Ambiente 11% Misto
Outros usos
... MAS AINDA ATRÁS DE OUTROS PAÍSES, APESAR DE UM VASTO POTENCIAL
Apenas 2% das águas residuais tratadas são reutilizadas na Europa
População ligada a ETAR
Potencial de reutilização 6 000 Mm3/ano
Fonte: https://suwanu-europe.eu/wp-content/uploads/2021/06/01_MarieRa n-WRE-SuwanuEurope-FINAL.pdf
Fonte: https://suwanu-europe.eu/wp-content/uploads/2021/06/01_MarieRaffin-WRE-SuwanuEurope-FINAL.pdf
Fonte: https://suwanu-europe.eu/wp-content/uploads/2021/06/01_MarieRaffin-WRE-SuwanuEurope-FINAL.pdf
A ÁGUA NA EUROPA
Pelo menos 11% dos europeus são afetados pela escassez de água
1 000 000 de m3 das águas residuais urbanas tratadas são reutilizadas anualmente
6 vezes mais a água tratada poderia ser reutilizada (do que os níveis atuais)
Fonte: https://environment.ec.europa.eu/topics/water/water-reuse_en