Revista APDA #19 - 4º trimestre 2020

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REVISTA

EDIçãO 19 4º TRIMESTRE

2020 ASSOCIAÇÃO PORTUGUESA DE DISTRIBUIÇÃO E DRENAGEM DE ÁGUAS

ASSOCIAÇÃO PORTUGUESA DE DISTRIBUIÇÃO E DRENAGEM DE ÁGUAS

RECUPERAÇÃO?


Edição APDA

Projeto Gráfico OTNovesete Comunicação

Diretor Sérgio Hora Lopes

Diretora Criativa Sandra Souza

Conselho Editorial Arnaldo Pêgo Paulo Nico Pedro Béraud Pedro Laginha

ONDE ESTAMOS SITE www.apda.pt SOCIAL facebook.com/apda.pt linkedin.com/company/apda.pt twitter.com/APDA_PT

Coordenação Ana Antão Colaboração Especial Eduardo Paulino

ÓRGÃOS SOCIAIS DA APDA ASSEMBLEIA GERAL Presidente: Francisco Oliveira Secretário: Francisco Marques Secretário: Gertrudes Rodrigues CONSELHO DIRETIVO Presidente: Rui Godinho Vice-Presidente: Frederico Fernandes Vice-Presidente: J. Henrique Salgado Zenha Vice-Presidente: Rui Marreiros

IN MEMORIAM

# FICHA TÉCNICA

CONSELHO FISCAL Presidente: Carlos Pinto de Sá Secretário: Jorge Nemésio Secretário: Vitor Lemos

Todos os direitos reservados. Nenhuma parte pode ser reproduzida, no todo ou em parte, por qualquer meio, sem indicação da respetiva fonte. Revista APDA é uma publicação trimestral. Para mais informações sobre publicidade ou informações gerais, Tel.: (+351) 218 551 359 ou E-mail: geral@apda.pt APDA - Associação Portuguesa de Distribuição e Drenagem de Águas Av. de Berlim, 15 - 1800-031 Lisboa - Portugal • Tel.: (+351) 218 551 359 • E-mail: geral@apda.pt


Era um amante do belo, da elegância, da distinção. Um verdadeiro gentleman, só que sem preencher um dos requisitos que normalmente associamos a esse qualificativo: não eram característicos dele os típicos traços de grande recato, reserva e mesmo ocultação das emoções. Pelo contrário, dizia o que lhe ia na alma, às vezes a ponto de se tornar desconcertante, mas sempre na condição de não ferir ninguém de forma grátis. Nunca se coibiu de confessar fraquezas ou dificuldades. Talvez passasse também por aí a forte empatia que muitos sentiam em relação a ele. Não haverá muitas pessoas que deixem um tão grande número de sinceros amigos.

ARNALDO PÊGO 1946 - 2020 O Eng.º Arnaldo Pêgo deixou-nos no passado dia 15 de dezembro, a poucos dias de completar 74 anos. A Revista ADPA contou com ele desde o primeiro momento, enquanto membro do Conselho Editorial, sempre muito interessado e atuante, sempre ponderado, sempre analítico. Vai fazer-nos muita falta. A última reunião em que contámos com a sua presença (sempre por videoconferência, desde março) ocorreu no dia 9 de novembro, última vez que o vimos com vida. Estava perfeitamente bem, ninguém poderia adivinhar o que aí vinha. Concluídos os trabalhos trocámos algumas impressões em ambiente de descontração, como é habitual, e ele confessou-nos que, mesmo que estivesse sozinho em casa, punha sempre a mesa completa para o almoço, incluindo os talheres de sobremesa, mesmo que não fosse comer sobremesa. Explicou-nos que o fazia por uma questão de dignidade.

Foi uma das referências da sua geração no setor da água em Portugal. Foi um engenheiro competente, um projetista experiente, um marcante alto quadro de empresas privadas e públicas e um gestor capaz e envolvente. Soube projetar e planear e soube também administrar e executar, sempre com base na sua grande preparação, mas também com uma perspetiva pragmática e uma capacidade de apreensão das circunstâncias que o tornavam, por si só, um fator de crescimento dos trabalhos em que participava ou que liderava. Licenciou-se em engenharia químicoindustrial pela Faculdade de Engenharia da Universidade do Porto, em 1971. Foi um dos primeiros diplomados com o curso pós-graduado de engenharia sanitária da Universidade Nova de Lisboa, em 1977. Viveu, por assim dizer, duas vidas profissionais em sequência. Iniciou a sua atividade profissional em 1972 como técnico-investigador da Faculdade


de Engenharia da Faculdade do Porto, ingressando em 1977 na Hidroprojecto (à época uma grande “escola” na área da hidráulica) como engenheiro projetista. Foi diretor técnico da divisão de fluídos da Efacec, responsável pela delegação do Porto do grupo de empresas da Hidroprojecto, membro do conselho de gerência da Hidrocontrato, vogal dos conselhos de administração da Indaqua Fafe, Indaqua Santo Tirso e Indaqua Feira. Quando tinha já 53 anos de idade decidiu vender a parte que detinha na Hidrocontrato, fechar a porta e partir para uma nova vida. Não é de todo uma idade habitual para semelhante passo. Muitos dos que o conheceram sabem deste episódio, mas nem todos terão noção de que foi uma decisão tomada sem rede. Não se tratava aqui de não ter um “plano B”, na verdade não tinha plano nenhum. Mas tinha, naturalmente, a sua vasta experiência, o seu prestígio, o reconhecimento dos seus pares. Veio a ingressar no Grupo AdP em 2000, no qual viveu uma “segunda carreira” até à sua aposentação, ocorrida em 2012. Durante este período assumiu a administração executiva e não-executiva de muitas das empresas do Grupo AdP, como sejam a Águas do Minho e Lima, Águas do Oeste, Águas do Douro e Paiva, Sanest, Simarsul, Simtejo, AdP Serviços, Aquasis e AdP Internacional. Após a aposentação, com a energia de sempre e sem qualquer vontade de se afastar do mundo da engenharia, envolveu-se de forma crescente nas atividades da Ordem dos Engenheiros, em cujo âmbito foi muito recentemente reeleito para o Conselho Diretivo da Região Sul. A sua ligação à APDA não se resumiu aos cinco anos de intensa participação no Conselho Editorial da revista,

devendo salientar-se a sua integração nas comissões organizadoras de quatro ENEG diferentes, tendo sido presidente respetivo na edição de 2013. Arnaldo Pêgo foi um homem de clara afirmação da sua opinião. Mas soube sempre fazê-lo com gentileza e correção inexcedíveis, imensa abertura para todos, valorização constante das qualidades alheias e predisposição para ouvir e aceitar opiniões que o convencessem. Viveu uma vida plena, ao longo da qual colecionou histórias que contava com graça imensa. Ninguém se esquecerá da sua bonomia, da sua alegria de viver e, acima de tudo, do prazer de conviver, pessoal e profissionalmente, bem como da sua disponibilidade para os outros. Era uma daquelas raras pessoas junto de quem todos se sentem sempre bem. Sem querermos parecer despropositados, ele foi também uma prova viva de que é possível atravessar-se uma vida inteira sempre com intensa atividade, mas comendo sempre pouquíssimo. Também isso fazia parte da sua elegância e da sua aura. Deixa-nos imensas saudades a todos. Que a sua memória nos inspire e nos guie.


# in memoriam


EDITORIAL EDITORIAL

A estratégia expansionista da UE: iremos aproveitar as oportunidades? O ano de 2020 e a década que inicia será um dos momentos mais críticos das nossas vidas. A crise pandémica abriu um período novo na nossa história recente já atingida por uma crise económica e social, uma crise climática e uma geopolítica. A década que agora começa vai ser, portanto, um período de dificuldades a vários níveis e não é expectável que teremos retomado os níveis médios de bem-estar geral, pelo menos das sociedades ocidentais, nos próximos tempos. No entanto, existem algumas boas notícias, pelo menos no terreno das políticas públicas, contrariamente ao que aconteceu em 2008. Na grande recessão o que dominou foi a ideia de que existiria uma “austeridade expansionista” e que uma política de contração de rendimentos e investimentos iria garantir simultaneamente défices públicos baixos e recuperação económica. Como sabemos as coisas não se passaram assim e governos e instituições multilaterais, ou mais corretamente, pelo menos a parte delas, advogam hoje uma estratégia bem diferente, assente na garantia de rendimentos e de investimento que alimente a procura, a produção e o emprego. A União Europeia advoga esta estratégia de expansão assente no investimento público dirigido a contribuir para ultrapassar a tripla crise económica, social e climática. A aprovação de novos mecanismos de financiamento mostra esta vontade de ir mais além e não assentar a recuperação praticamente só nas políticas monetárias mas também nas orçamentais. E, como depois da tempestade vem a bonança, vamos ser otimistas e admitir que a UE vai conseguir pôr em prática o que acordou em Conselho sobre os “remédios” para os males que a fenecem. Para Portugal esta mudança é essencial. Recorrendo ao quadro apresentado no esboço do Plano de Resiliência e Recuperação constata-se que na década 20-30, somando todas as origens comunitárias (PT 2020, Plano de Recuperação Europeu, Quadro Financeiro Plurianual 2021-2027) teremos 57,6 mil M€ de subvenções e podemos ainda recorrer a 15,7 mil M€ de empréstimos. Como sabemos a aprovação deste pacote financeiro não está garantida mas vamos admitir que será o este, ou algo de semelhante, o quadro financeiro comunitário, a que se deve acrescer os fundos nacionais destinados ao investimento. Existirá assim, em princípio, um volume financeiro inédito destinado ao investimento na década 2020-2030. O Plano Nacional de Investimento, “instrumento de planeamento do próximo ciclo de investimentos estratégicos e estruturantes de âmbito nacional” tem previsto 42,9 mil M€ dos quais 26,1 mil M€


# EDITORIAL de investimento público e 16,9 privados. No Ciclo Urbano da Água estão previstos 2 mil M€. Refira-se, por fim que o PNI engloba somente uma parte dos investimentos, considerados estratégicos, previstos no país e os montantes envolvidos estarão por isso muito longe da totalidade. Admitindo que as possibilidades de investimento abertas se concretizam, uma questão se coloca: terão as entidades gestoras de serviços de água e as empresas integradas na respetiva fileira (estudos, projetos e fiscalização, construção civil, equipamentos, serviços, etc.) capacidade para utilizar os fundos financeiros em tempo oportuno e garantindo a qualidade? Já são frequentes as reclamações de entidades gestoras sobre as dificuldades que terão em concretizar os seus investimentos. Referem concursos que ficam sem de concorrentes, períodos de procedimentos contratuais longos e complexos, concursos em que a litigância entre concorrentes adiam meses a fio o arranque de empreitadas, obras que se atrasam, ou param mesmo, por incapacidades várias (financeiras, técnicas, humanas, organização, etc.) das empresas construtoras, recursos humanos insuficientemente qualificados, são algumas das queixas que se fazem já hoje. Ora, com o acréscimo previsto de recursos financeiros que começará em 2011, (e é importantíssimo que mais cedo do que tarde, o investimento se inicie para que a recessão não se prolongue) a nada ser feito, seguramente que a situação se agravará o que pode levar à incapacidade de aproveitar devidamente os fundos disponíveis. Este número da Revista, o último relativo a 2020, trata este assunto através de três artigos que refletem ponto de vista de uma entidade gestora, da associação das empresas de construção e da Ordem dos Engenheiros, além de um artigo do Presidente do CD da APDA. Este tema das condições para conseguir um elevado volume de investimento num período de tempo curto, nomeadamente quando comparado com o passado recente, é crucial para a próxima década. Precisamos de aproveitar as oportunidades que o combate à COVID-19 nos vieram trazer. Para terminar o desejo de um ano de 2021 que nos faça esquecer rapidamente 2020 que nos trouxe tanta infortúnio e fatalidades. Mas sejamos positivos: façamos fé nas palavras do centenário hino religioso norte americano, “We Shall Overcome”.

Sérgio Hora Lopes Diretor da Revista APDA


CONSELHO DIRETIVO

ESPAÇO RUI GODINHO Presidente do Conselho Diretivo da APDA


Políticas Públicas para aplicação dos Fundos Europeus Nos próximos anos o financiamento e outras ajudas aos investimentos relativos às principais áreas decisivas constantes do Programa Nacional de Investimentos - PNI 2030 e de outros planos e programas de concretização de políticas púbicas, assentará num conjunto de instrumentos de apoio financeiro com origem e negociação com a União Europeia, que criaram e já hoje refletem justificadas expetativas no País. Destacaria o Plano de Estabilização Económica e Social, o Quadro Estratégico Plurianual, o Plano de Recuperação e Resiliência (versão definitiva a apresentar no primeiro trimestre de 2021), Fundo de Recuperação (EU Next Generation), que comportam significativos envelopes financeiros a serem disponibilizados aos Estados Membros em condições favoráveis nunca antes verificadas. Acrescem ainda outras fontes de financiamento: REACT-EU (um extra ao Portugal 2020, em agosto 2020, com uma taxa de execução de 52%, que reforçará o apoio financeiro para a recuperação Pós-COVID) e o Fundo de Transição Justa (transição energética de algumas regiões do País). Necessário se torna, assim, estabilizar uma carteira de objetivos, cumprir metas estabelecidas e avaliá-las através de um conjunto de indicadores fiáveis e verificáveis por todas as entidades envolvidas, em Portugal e nas instâncias europeias. Esta situação implica a criação de um “Quadro Estratégico” sólido e de convergência entre os diferentes atores, que estabeleça de forma clara um “nexus” entre as reformas a realizar e os investimentos a alocar ao total dos eixos a considerar e a cada um em particular. Estes poderão agregar-se em quatro “agendas”: 1 1) Dimensão Social, incorporando aspetos de Demografia, Inclusão, Saúde; 2) Inovação, Transformação Digital e Qualificações, com impactos relevantes na economia, empresas, conhecimento, recursos humanos (capacitação); 3) Transição Climática e Sustentabilidade: investimentos em energia, riscos associados às alterações climáticas, sustentabilidade dos recursos da agricultura e do mar; 4) Alargamento da Rede de Infraestruturas, promovendo a competitividade externa e a coesão territorial interna. A versão conhecida do “Plano de Recuperação e Resiliência” assenta em muito nestes quatro grandes vetores e na Visão Estratégica de Recuperação Económica e Social 2020-2030.

José Gomes Mendes, Ex- Secretário de Estado do Planeamento: Entrevista a Ingenium n.º 170, Ordem dos Engenheiros - outubro, novembro e dezembro 2020 1

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# ESPAÇO DO CONSELHO DIRETIVO Relativamente aos meios que têm sido anunciados, se olharmos para os próximos 7 anos (2027), Portugal terá aumentado os seus recursos habituais em cerca de 70%, o que coloca enormes oportunidades e responsabilidades à sua correta aplicação, de modo a potenciar e promover fatores de desenvolvimento raros para o País. A capacidade de utilização, aplicação e governança desses recursos exige competências profissionais, clareza de objetivos, eficiência, transparência e a criação de um ambiente e condições de permanente “accountability” (prestação de contas). Trata-se de implementar uma prática que deverá envolver todo o País, onde se incluem responsáveis a todos os níveis, públicos e privados, instituições e organizações da sociedade civil e os “stakeholders” em geral. O acompanhamento por parte das entidades encarregadas de autenticar a correção dos procedimentos, em termos de legalidade e de controlo de custos e de boa aplicação dos fundos disponibilizados, deverá merecer uma atenção e uma exigência muito fortes. O escrutínio público deverá ser rigoroso e amplo, aplicado a todas as fases dos planos, programas, projetos, obras e outras iniciativas que venham a ser apoiadas. Sublinhar, entretanto, a recente aprovação pela Assembleia da República, por proposta do Governo, de uma nova versão do Código da Contratação Pública (CCP) que esteve longe de congregar amplos apoios, tendo inclusive sido objeto do veto por parte do Senhor Presidente da República, com menção de diversas fragilidades, nomeadamente quando refere que “a necessidade de simplificação e aperfeiçoamento supõe, como contrapartida, uma atenta preocupação com o controlo, mesmo se a posteriori, da legalidade e da regularidade dos contratos, exigido pela transparência administrativa”. Relativamente à “comissão independente para acompanhamento dos fundos europeus” proposta no diploma, e que incluirá representantes designados pela Assembleia da República e pelo Governo, apelou à “previsão do alargamento das incompatibilidades de todos os membros com o desempenho de cargos em parceiros económicos e sociais” e sustentou a necessidade adicional de constarem do papel da comissão os termos de articulação com o Tribunal de Contas”.2 Também a este propósito, o próprio Tribunal de Contas se tinha pronunciado recentemente, recomendando à Assembleia da República e ao Governo que no novo Código se “regule adequadamente o regime jurídico da revisão de projetos”, com vista a exigir um maior rigor nos projetos de obras públicas”, bem como impedir que as decisões dos Tribunais Arbitrais “legitimem despesas efetuadas em violação do Código dos Contratos Públicos, para trabalhos complementares”.3

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“Marcelo veta Lei dos Contratos Públicos”, Expresso Online, 5 dezembro 2020 Tribunal de Contas: “Ação de Fiscalização Concomitante aos Contratos Adicionais”, Jornal Público, 20 novembro 2020

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Relativamente à capacidade que o País dispõe, em matéria de adequados Recursos Humanos terá que metesse em quase todos os setores, uma atenção muito especial. Com efeito, a redução do investimento público, provocado pelas crises de 2008 e 2011, bem a desnatação verificada na Administração Pública e outros setores estratégicos da economia nacional, com a emigração de muitos quadros com elevadas competências provocou fortes carências de que o País ainda não recuperou, com a consequente fragilização das capacidades necessárias a uma resposta adequada aos desafios que se nos colocam, agora ainda mais agravados com a emergência da pandemia de COVID-19 que nos atinge de forma brutal. Assim, o combate à escassez de recursos humanos qualificados em quantidade e equilibradamente distribuídos no território nacional - Continente e Regiões Autónomas - pelos setores chave para o desenvolvimento sustentável do País, onde a Água, a Biodiversidade, os Recursos Naturais assumem um papel vital, a que se associam os “nexus” que estabelecem com as Energias Renováveis, a Agricultura e Alimentação, a Saúde, o Território e a Educação e a Ciência, constitui um dos pilares fundamentais da construção de uma País com futuro, a que temos de prestar uma atenção imediata e estruturada em sólidas políticas públicas. Outro desafio que se nos coloca, com grande evidência é que, com esta previsão de disponibilidade de recursos nos próximos 7 anos, Portugal terá que praticamente duplicar a sua capacidade de absorção de fundos bem como de capacidade de execução.4 Significa que teremos de encontrar projetos, nos vários setores candidatos, como é o caso do setor da água (ciclo urbano da água), que garantam que poderemos aceder e utilizar com sucesso esses fundos. Estaremos a preparar-nos? O Programa Nacional de Investimentos - PNI 2030 - terá que ser revisitado apesar de, após Parecer do Conselho Superior das Obras Públicas se ter aproximado, nomeadamente nos domínios dos Recursos Hídricos e Gestão do Ciclo Urbano da Água das propostas que várias entidades, nomeadamente a APDA, tinham apresentado para constar da sua versão final. Todavia as disrupções que a pandemia de COVID-19 já provocou - e continua a provocar - na economia nacional e em setores essenciais para o aprovisionamento e a segurança nacionais, torna obrigatória tal abordagem. O PENSAARP 2030 ainda está em fase de preparação e, portanto, ainda não são claros os Eixos Fundamentais que integrarão o seu formato final e, portanto, as respetivas alocações de meios para a sua concretização. Porém, é oportuno recordar que a APDA, com elemento da Comissão Consultiva apresentou um documento estruturado em 11 pontos, como contributo para o seu adequado “Enquadramento”,

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# ESPAÇO DO CONSELHO DIRETIVO para além de propostas concretas para a construção de um “Plano Estratégico de Planeamento e Gestão” do Setor para a década, o qual implicará uma ajustada alocação de recursos técnicos e financeiros, alguns, aliás, já considerados no PNI. Este processo, a nosso ver, deverá provocar uma mobilização do Setor da Água e Saneamento, por forma a que se concretizem opções inovadoras, hídrica e energeticamente mais eficientes, mais resilientes, que concorram para a sua sustentabilidade económica, social e ambiental.

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ÁGUA, ONDE A VIDA SE MULTIPLICA

A VALORIZAR A ÁGUA E A VIDA

APDA - Associação Portuguesa de Distribuição e Drenagem de Águas Avenida de Berlim, 15 | 1800-031 Lisboa - Portugal Tel.: (+351) 218 551 359 | geral@apda.pt | www.apda.pt

ASSOCIAÇÃO PORTUGUESA DE DISTRIBUIÇÃO E DRENAGEM DE ÁGUAS

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# Destaque

CARLOS MINEIRO AIRES

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Código dos Contratos Públicos: de mal a pior JOÃO PINTASSILGO

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Investimentos prioritários nos serviços de Águas e Saneamento RICARDO PEDROSA GOMES

# ATUALIDADE

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A capacidade de resposta da construção civil portuguesa J. Henrique Salgado Zenha

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Por um Regulamento da Qualidade do Serviço exequível, generalizável e progressivo Paulo Nico E SILVANA VITORINO

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A seca hidrológica, análise conjuntural e visão expectável por via das alterações climáticas PAULA LOPES

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A gestão pluvial nas zonas urbanas e o controlo das inundações

# CIÊNCIA ABERTA # QUADRO LEGAL

Vítor Cardoso, Andreia Videira e Maria João Benoliel

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PFAS na água de consumo humano

LEGISLAÇÃO PORTUGUESA

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LEGISLAÇÃO COMUNITÁRIA

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# EVENTOS

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# INFOGRAFIA

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DESTAQUE


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DESTAQUE Carlos Mineiro Aires Bastonรกrio da Ordem dos Engenheiros


Carlos Mineiro Aires Engenheiro Civil (IST). Bastonário da Ordem dos Engenheiros. Presidente do CNOP - Conselho Nacional das Ordens Profissionais (2020-2023). Membro do Conselho Económico e Social. Membro do Conselho Económico e Social Europeu (2020-2025). Presidente do World Council of Civil Engineers (2018-2021). Presidente da Comissão Executiva da Simarsul. Presidente do Instituto da Água. Presidente do Metropolitano de Lisboa. Presidente do Conselho de Administração da Simtejo. Diretor do Gabinete de Saneamento Básico da Costa do Estoril. Por inerência: Membro do Conselho Superior de Obras Públicas. Membro do Conselho Nacional da Água. Membro do Conselho de Escola do Instituto Superior Técnico. Membro do Conselho Geral do Instituto Politécnico de Lisboa. Membro do Conselho Estratégico da Proforum.


# DESTAQUE

Código dos Contratos Públicos:: de mal a pior “... a dificuldade de compreensão do CCP deu origem a um negócio de ações de

formação a que os utilizadores são forçados a recorrer para lidarem com um documento confuso...”

Carlos Mineiro Aires Bastonário da Ordem dos Engenheiros

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Código dos Contratos Públicos: de mal a pior

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screvo este artigo com a tarefa facilitada, porquanto o texto replica, embora sinteticamente, o documento que entreguei a todos os Grupos Parlamentares, aquando da audição pública para que fui convocado pela Assembleia da República, e que é público, tendo finalizado a minha intervenção a sugerir que fosse criado um Grupo de Trabalho com parlamentares e entidades externas para revisitar e corrigir o CCP.

Na verdade, foi esse o pedido que me foi dirigido e foi nessa condição que o aceitei. Estamos perante a 12ª (!) alteração ao CCP, desta vez focada na simplificação dos procedimentos administrativos de contratação pública, sendo claro o objetivo de contribuir para a aceleração da execução de projetos cofinanciados pelo enorme afluxo de fundos previstos para a década 2030, no âmbito do PRR e do PNI 2030.

Virtuosamente, a Proposta de Lei assume que a contratação pública pode ter um papel significativo na aceleração da transição para uma economia circular e na promoção de objetivos sociais, tais como a sustentabilidade, a promoção da contratação de proximidade, a inclusão social e a inovação, além da estrita relação qualidade-preço, embora não corrija os problemas de base. Continuaremos a ter um CCP deficiente, que não dá resposta

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# DESTAQUE a todos os problemas e situações, confuso, de difícil aplicação, altamente penalizador para os que são obrigados a lidar com ele (recorde-se que uma parte significativa são engenheiros) e que, em muitos aspetos, não é amigo dos utilizadores, cidadãos e empresas. Em suma, um documento de difícil utilização, que não acautela todas as situações e casos de obra, indutor de quezília, promotor de dumping salarial e de práticas de preços desajustados, pelo que, em boa verdade, não serve adequadamente os interesses de qualquer das partes interessadas, nem do país, e nunca conseguirá ser um documento direcionado e de fácil utilização. A prova disso é que, numa atitude louvável, até o IMPIC sentiu necessidade de produzir uma série de Orientações Técnicas (infelizmente interrompidas) para ajudar a interpretar o que devia ser intuitivo num Código que se reveste de forma de Lei. A par, a dificuldade de compreensão do CCP deu origem a um negócio de ações de formação a que os

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utilizadores são forçados a recorrer para lidarem com um documento confuso e, sobretudo, perceber onde podem errar, o que só por si diz tudo. Sem sermos exaustivos, chamámos a atenção para situações que devem ser corrigidas, a bem da simplificação dos processos, da fluidez da contratação pública e da boa-fé, nomeadamente: - Simplificar a interpretação de um Código que é um documento fundamental, mas extremamente complexo, difícil de utilizar e potencial punidor dos que não o conhecem, nem dominam em detalhe; - Explicitar o que são competências inalienáveis dos Donos de obra, quer no caso dos concursos em que a entidade adjudicante opta por incluir um projeto de execução no caderno de encargos (modelo tradicional), quer no caso em que a entidade adjudicante opta pelo lançamento de concursos de conceção-construção sem incluir um projeto de execução. Neste caso, estão os

trabalhos preparatórios e informação de base (topografia, sondagens, estudos geotécnicos, identificação de ocupações de subsolo, licenciamentos, etc.) que devem constituir uma obrigação do Dono de obra (DO) e não podem ser remetidas para uma adjudicação tipo “all in one”, o que põe em causa a isenção e separação do que são competências próprias. Não se nos afigura, pois, curial que se faça recair sobre o adjudicatário toda a responsabilização dos diversos quesitos e fases de um investimento, o que decorre do facto de se tornarem nos únicos agentes da cadeia de responsabilização; - Num contexto de revisão que visa o recurso a modelos de conceção/ execução, torna-se fundamental definir as regras do jogo e dar força à figura do “Gestor de Projeto “; - A formação dos preços base deve ser exaustiva, transparente e demonstrar que o Estado (contratante público) pretende pagar o preço justo e remunerar condignamente as diversas profissões que atuam na


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cadeia. Voltámos a sugerir a obrigatoriedade de publicitação conexa da lista de salários que o DO entende que são justos e adequados e em que se fundamentou para a fixação do Preço Base (PB), o que não desvirtua, nem põe em causa a concorrência, mas demonstrará a boa fé social do contratante público; - Os critérios de adjudicação e as definições dos limites de preços abaixo e acima do PB devem garantir de forma explícita e inequívoca que o Estado não está a ser conivente com a promoção de práticas salariais indevidas (dumping), nem de práticas distorcedoras do mercado (preços exageradamente baixos); - Novos critérios preferenciais, agora introduzidos, tais como a valorização da economia local e regional, a promoção da economia circular e dos circuitos curtos de distribuição, a promoção da sustentabilidade ambiental, a valorização de processos, produtos ou materiais inovadores e a promoção de atividades culturais e a

dinamização de património cultural, correm o risco de não serem facilmente mensuráveis; - Importa que o CCP incorpore a progressiva obrigatoriedade de modelos BIM em todas as obras públicas, sobretudo numa época em que o Governo aposta na transição digital, pelo que lamentamos a sua ausência; - Importa que o CCP proíba explicitamente a adoção de qualquer metodologia de avaliação de propostas que conduza a que, na prática, o preço seja o único parâmetro de avaliação, salvo ponderosas e justificadas razões, como sejam as aquisições de bens exatos e pré-determinados; - As adjudicações devem pautar-se pela maior transparência e distanciamento em relação a qualquer forma de pressão, permitindo que os Júris possam atuar em consciência e decidindo de acordo com o que entendem ser os melhores critérios. - A revisão do diploma deve inequivocamente fazer

prevalecer a componente qualitativa das propostas em detrimento do elemento financeiro, (cfr. critério da proposta economicamente mais vantajosa); - Para efeitos de uma avaliação técnica isenta e adequada, os Cadernos de Encargos deverão impor critérios objetivos que permitam uma seleção fundamentada por parte dos júris; - Em adjudicações mais complexas e com valores elevados, quer de serviços, quer de empreitadas, o CCP deve acautelar procedimentos que salvaguardem a isenção e transparência; - Reiterámos e voltámos a defender que esta Lei consagre a possibilidade de apresentação das propostas, por via eletrónica, em dois ficheiros (“envelopes”) separados: um relativo à parte técnica e outro relativo à valoração financeira da proposta, o que permitirá a “abertura”, por parte dos júris, em fases e tempos distintos. Assim, a avaliação financeira apenas poderia ter lugar em momento REVISTA APDA_ APDA _ 2020

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# DESTAQUE posterior à avaliação técnica e qualitativa das propostas, pelo que, consequentemente, apenas as propostas mais bem classificadas na fase de avaliação técnica passariam à fase seguinte, sendo que, deste modo, a natural vencedora seria a de mais baixo valor entre as de melhor valia técnica. Trata-se do único procedimento recomendável, quer na contratação de serviços, quer na contratação de obras públicas, e que em todos os aspetos só beneficiaria o DO, livrando-o do risco de ter de contratar inexperiência, más soluções técnicas, equipamentos desadequados e de baixa qualidade, etc., só porque o preço prevalece; - Quer durante a fase de contratação, quer durante a fase de execução do contrato, deverão ser contempladas ações inspetivas técnicas e administrativas da boa aplicação do CCP; - À semelhança do que sucede com os alvarás das empresas de construção, seria salutar que as empresas de prestações de serviços (projetos,

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fiscalizações, etc.) também fossem enquadradas por um mecanismo semelhante, recordando, a este nível, a existência da “marca LNEC” que tem vindo a ser descartada. A contratação de Obras Geotécnicas Complexas (OGC), é outro tema particularmente importante que esta revisão do CCP continua a não contemplar. A Ordem dos Engenheiros, em conjunto com a Comissão Portuguesa de Túneis (CPT) e a Associação Portuguesa de Projetistas e Consultores (APPC), oportunamente elaboraram e tornaram público um “Guia de Boas Práticas para a Contratação de Obras Geotécnicas Complexas (OGC)”. Esta revisão não contempla a situação diferenciada para a contratação de OGC, habitualmente relativas à construção de túneis, fundações especiais profundas, fundações de barragens, fundações de obras portuárias, obras de escavação com profundidade significativa e outras obras geotécnicas com elevada incerteza associada, que

devem ter um tratamento especial no âmbito do CCP, sobretudo quando estão anunciados diversos investimentos desta natureza. Embora sendo um tema que extravase a matéria em apreço, não deixámos de referir a questão dos jovens no contexto da contratação pública. Os Cadernos de Encargos de concursos de prestações de serviço e empreitadas exigem demonstrada experiência profissional, o que é compreensível mas, no entanto, a par, uma vez que a última década foi fatal para as empresas e profissionais do sector da construção civil, é nosso entendimento que deve ser dada uma oportunidade aos jovens, para que os recém-formados possam ganhar experiência. Assim, seria recomendável que o Estado transmitisse orientações aos promotores de obras públicas para que haja lugar a uma quota de integração de jovens de todas as categorias profissionais (por exemplo 20%), para que possam adquirir experiência e tornarem-se quadros habilitados num país onde a mão-de-obra escasseia e


Código dos Contratos Públicos: de mal a pior

onde as poucas empresas nacionais que hoje restam não têm condições para competir com os grupos estrangeiros. O resultado desta proposta, conjugado com a melhoria de salários e a forma de abertura faseada (técnica + financeira) que constam de anteriores propostas, teriam impactos virtuosos em diversas vertentes: mais transparência, mais riqueza, mais impostos, melhores salários, maior atratividade para estas profissões, mais jovens a exercer a profissão e impacto no crescimento demográfico. O Estado, que reconhecidamente se deixou enfraquecer, encontra-se numa situação em que os donos de obra pública hoje não dispõem de quadros em número suficiente e com habilitações e experiência adequada para, na maior parte dos casos, poderem dar resposta a um volume tão grande de investimentos. Por outro lado, o acesso e disponibilização de informação por parte dos DO, no que se refere ao planeamento dos planos de investimento e grau

de realização de cada investimento é um dever de transparência para quem gere dinheiros públicos e são matérias que o CCP não aborda, nem refere. Alertámos, ainda, para a necessidade dos DO disporem e publicitarem atempadamente a programação dos concursos que irão lançar, a fim de permitirem que as empresas nacionais se dimensionem e preparem para dar resposta às solicitações, visando a proteção dos interesses económicos nacionais, como sucede em qualquer outro país.

Nota Final Entretanto, no dia 5 de dezembro, o Senhor Presidente da República vetou e devolveu o diploma ao Parlamento, que o tinha aprovado, para que pondere os efeitos quanto ao adjudicante e ao adjudicatário do controlo a posteriori de ilegalidades e de irregularidades detetadas pelo Tribunal de Contas e, bem assim, a garantia da presidência da comissão independente de acompanhamento e fiscalização por membro

designado pela Assembleia da República, a previsão do alargamento da incompatibilidade de todos os membros com o desempenho de cargos em parceiros económicos e sociais, e a substanciação adicional do papel da comissão, em termos de articulação com o Tribunal de Contas e de conhecimento público da sua atividade. Tal decisão constitui, pois, uma nova oportunidade para a sua retificação, muito embora a nossa intervenção nunca tenha estado focada nas questões das irregularidades e aproveitamentos a que esta revisão pode dar abertura, porquanto continuamos a acreditar na ética e boa fé de quem contrata.

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DESTAQUE João Pintassilgo Vice-Presidente da Câmara Municipal do Barreiro


João Pintassilgo Vice-Presidente da Câmara Municipal do Barreiro. Engenheiro Maquinista da Marinha Mercante, pela Escola Superior Náutica Infante D. Henrique. Oficial da Marinha Mercante 1969/1975. Conclui com Mérito o XIX (2000) Programa Direção de Empresas da AESE. Quadro Superior da EDP 1976/2005. Vogal da Administração Transtejo e Soflusa 2005/2008. Presidente do Conselho de Administração Transtejo e Soflusa 2008/2015. Nomeado Melhor Gestor Categoria Transportes Marítimos - Amadeus Brighter Awards 2014. Vice-Presidente da Câmara Municipal do Barreiro desde 2018.


# DESTAQUE Investimentos prioritários nos serviços de Águas e Saneamento face ao reforço dos fundos da União Europeia como resposta à crise económica/sanitária económica sanitária “Porém, o

município do Barreiro

sente, como outras entidades públicas e municípios, dificuldades na concretização de investimentos, seja pela complexidade do atual edifício legal, que se reflete desde a contratação de recursos humanos, materiais, serviços e obras, à complexidade do acesso a fundos e à gestão das operações cofinanciadas.”

João Pintassilgo Vice-Presidente da Câmara Municipal do Barreiro

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Investimentos prioritários nos serviços de Águas e Saneamento

O

município do Barreiro, entidade gestora municipal com gestão direta dos serviços de abastecimento de água (alta e baixa), saneamento (baixa) e drenagem de águas pluviais, pauta-se por uma ação focada no aumento da eficiência e da diminuição de custos, suportada num sistema de planeamento, especialmente no âmbito da gestão e diminuição

de perdas e afluências indevidas, assim como na necessidade de reabilitação de infraestruturas.

para a redução de perdas (onde estão incluídas obras de reabilitação e tecnologia de controlo).

É ainda estratégia do município aceder aos fundos comunitários disponíveis para estes sectores, como é o exemplo das candidaturas em conclusão para resolução de problemas de falta de cobertura e de tratamento de esgotos (já exígua, mas cada vez menor e mais controlada), ou mais recentemente na candidatura

O objetivo é oferecer um melhor serviço aos munícipes. Uma cidade melhor. Nesta perspetiva surge o recentíssimo novo regulamento tarifário, onde de forma pioneira se configura a atribuição do “tão desejado” tarifário social automático, favorecendo REVISTA APDA_ APDA _ 2020

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# DESTAQUE quase 40 vezes mais utilizadores com tarifas acessíveis (cerca de 7.000, em vez de 180), mas sempre com a preocupação de não promover o desperdício. Isto num tarifário onde o primeiro escalão geral já confere uma fatura bastante acessível. É assim, suportado numa política social, ambiental e económica que o Barreiro pretende fazer parte das soluções sociais, técnicas e económicas que hão de se erguer face a esta situação pandémica tão crítica que atravessamos. Uma coisa é certa: a água é o suporte de tudo! E a água corre e chega a todos os Barreirenses com excelente qualidade, garantindo a saúde, o confinamento, o desconfinamento, … e mais o que por aí tiver de vir. A Estratégia global do município é e continua a ser, mesmo em tempos de pandemia, o desenvolvimento de um território seguro, competitivo, atrativo, dinâmico, que constitua uma referência no quadro da região e das cidades nacionais. Um concelho da Área Metropolitana de Lisboa com elevada qualidade

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de vida, onde se aposta na melhoria contínua, na eficiência do uso da água, na boa governança dos recursos naturais, investindo na infraestruturação e manutenção, enfatizando a economia circular, contribuindo para contrariar as alterações climáticas e mitigar os seus efeitos. É assim que no sector da água o município do Barreiro aposta num conjunto de tipologias de investimento estratégico, porque fazem sentido para a região, para a nossa cidade, para os nossos munícipes e para o ambiente: • (Re)utilização de água tratada nas ETAR (BarreiroMoita) para fins compatíveis; • Sistema Intermunicipal de Abastecimento de Água em Alta à Península de Setúbal (em parceria com os municípios de Alcochete, Almada, Palmela, Moita, Seixal, Sesimbra e Setúbal); • Construção dos corredores verdes e azuis, incluindo monitorização de caudais e/para avaliação da possibilidade de reutilização da água da chuva: Construção das Bacias de Retenção da Penalva/ intermunicipal Barreiro - Palmela - Rio da Moita; Construção da Bacia de

retenção da Quinta da Mina; Construção da Bacia de retenção de Sete Portais; Projeto das Bacias de Retenção de Vale Trabuco Vale da Amoreira e Migalha e Vale de Grou (Barreiro/ Moita); • Reabilitação de redes Pluviais/unitárias em sistemas prioritários (incluindo monitorização em tempo real de caudais); • Modelação, análise e mitigação dos impactes da subida do nível médio das águas do mar nas infraestruturas hidráulicas que são/podem ser diretamente influenciadas pelo nível de água do mar Pluviais e redes unitárias; • Construção de novas captações o mais afastado possível do leito do Tejo/ Coina, para evitar a intrusão salina. Ainda, para sermos mais resilientes temos de suportar a manutenção de infraestruturas robustas, por isso, sendo uma necessidade é sempre uma mais valia investir na reabilitação e instrumentação de infraestruturas - para uma melhor qualidade de vida e eficiência do serviço, do que são exemplo as seguintes obras e projetos:


Investimentos prioritários nos serviços de Águas e Saneamento

• Reabilitação e aumento da instrumentação de infraestruturas de abastecimento de água para aumento de eficiência, redução perdas e controlo da qualidade em tempo real; • Reabilitação e instrumentação de infraestruturas de saneamento, para aumento de eficiência e redução de afluências indevidas; • Redes de infraestruturas inteligentes (contadores inteligentes - em redes de água já bem controladas por telegestão); • Investimentos em energias renováveis disponíveis nas cidades (turbinas, micro hídricas; painéis solares).

desde a contratação de recursos humanos, materiais, serviços e obras, à complexidade do acesso a fundos e à gestão das operações cofinanciadas.

É por aqui que estrategicamente estamos a seguir e, portanto, a intensificação de investimentos passará por conseguimos concretizar e alcançar mais cedo os objetivos de projetos já em marcha.

Nesse âmbito considero o município do Barreiro mais preparado para avançar sem sobressaltos e com confiança. Trata-se de intensificar e acelerar um pouco o passo no caminho que já vamos trilhando. Um caminho que passa pela qualificação, capacidade de adaptação e inovação em prioridades de investimento que garantam a preservação e melhoria da qualidade ambiental, o aumento da eficiência, a poupança de recursos.

Porém, o município do Barreiro sente, como outras entidades públicas e municípios, dificuldades na concretização de investimentos, seja pela complexidade do atual edifício legal, que se reflete

“Somos portugueses” e todos temos um caminho por fazer em prol da desburocratização e simplificação equilibradas e sustentadas, da eficácia e eficiência. Fazer mais com menos. A possibilidade de acelerar o passo do investimento traz compreensíveis incertezas. Por isso a pertinência desta reflexão. Temos de ter visão, coragem, capacidade temos, e arregaçar mangas!

Nos serviços da água no município do Barreiro a digitalização é palavra de ordem. Não só como suporte de informação, mas como suporte da gestão, da operação e da decisão. Ferramentas como a telegestão “intensificada” da rede e dos sistemas de captação e adução, a análise on-line, as ordens de trabalho georreferenciadas, são plataformas para uma ação resiliente, resistente, mas evolutiva face à mudança. As práticas de análise económica incorporadas na ação e decisão são outro fator que nos traz confiança. É na crise que surge a mudança, que se prevê, se acredita e se constrói. Não são desejáveis, não precisamos nem queremos recessões nem pandemias, mas heis nos lá. Então peguemos nas nossas forças e avancemos. Porque a Água sendo um Bem Público, indispensável à Vida, trata-se de um recurso natural finito que deverá ser gerido como tal. Merece e precisa de todo o nosso esforço e atenção.

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# DESTAQUE O futuro começa “hoje” e “aqui”. O que pode a Câmara Municipal do Barreiro fazer, que papel pode ter para contribuir para a concretização de bons investimentos, com futuro? Avançar, dar o exemplo, partilhar, participar e promover o bom desenvolvimento do sector (e corrigir, quando tiver de ser). Como temos por exemplo feito em colaboração com a APDA. Vários técnicos municipais têm participado ativamente com esta associação numa atitude de mútuo benefício. Promover a discussão sobre a forma de atribuição e gestão dos fundos comunitários. Promover a partilha de conhecimento sobre tecnologias digitais e a sua incorporação nos processos de negócio das nossas entidades gestoras. Promover uma ação regional e intersectorial coordenada. O sector da água é exemplar. Mesmo na esfera pública, em Portugal, em poucas décadas atingiu um patamar de qualidade apreciável e é um serviço acessível.

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Agora é tempo de melhorar e economizar. É tempo de pensar nas estratégias de futuro face as alterações climáticas. Precisamos todos de “sobreviver” hoje e preparar o curto prazo, para garantir o futuro. Não me parece muito diferente do que são os normais problemas com que nos deparamos no diaa-dia. A intensidade marca a diferença. Planeamento - Ação - Conhecimento Participação. Capacitemo-nos, discutamos sem arrogâncias nem constrangimentos: grandes municípios e pequenos, grandes entidades gestoras e pequenas, grandes e pequenos agentes. Público e privado. No imediato, e para concretizarmos os apoios que se anunciam, ao nível da gestão da água, nas nossas vilas e cidades, devemos centrar-nos em garantir uma infraestrutura robusta, eficiente e resiliente - mais reabilitação e remodelação de redes e ramais; equipamentos de bombagem mais eficientes; energias limpas; tecnologias de informação; telegestão/

análise e gestão em tempo real da infraestrutura e do consumo; modelação; planeamento; gestão económica e generalização de formação certificada para as profissões da água (dos operacionais aos técnicos) - quadros adequados em quantidade e qualidade é fundamental. Ao nível dos programas de gestão dos fundos, as regras de formalização e avaliação das candidaturas devem ser simplificadas e deve haver uma parte substancial de suporte e verbas para distribuir pelos que mais precisam de melhorar o serviço. É no serviço público municipal que se devem centrar as prioridades. São a maior fatia da realidade. São os que, apesar de todas as dificuldades privilegiam e garantem democraticamente o bem-estar das populações e o acesso aos serviços da água. Também o acompanhamento das candidaturas deve ser simplificado. Não faz sentido transformarmos os serviços de gestão de fundos em fiscalizadores do cumprimento do código da contratação pública. Entidades e programas operacionais perdem,


Investimentos prioritários nos serviços de Águas e Saneamento

desperdiçam tempos infinitos a apresentar, ver, rever, e tornar a apresentar documentação que legalmente tem de existir e ser cumprida. Não faz sentido a apresentação de declarações e mais declarações de compromisso. Se é lei ou regulamento - é para cumprir. Fiscalize-se. Também o código de contratação pública deveria ser

revisto - mas isso talvez já não vá a tempo desta “bazuca”. Precisamos de proteger a natureza e os seus recursos e colocar o dinheiro mais perto das populações, das suas necessidades e do seu bem-estar e continuarmos a colaborar numa forte educação ambiental sobre o ciclo (urbano) da água e da sua relação com os outros ciclos da natureza - a nossa casa.

Deixo uma última afirmação de confiança, na capacidade das Entidades Gestoras das Redes de Água e Saneamento Públicas e Privadas, na utilização dos fundos financeiros em tempo e qualidade. Portugal não pode perder esta oportunidade. Pelo nosso futuro e dos nossos netos.

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DESTAQUE RICARDO PEDROSA GOMES Presidente da Direção da AECOPS


RICARDO PEDROSA GOMES Licenciado em Engenharia Civil pelo Instituto Superior de Engenharia de Lisboa. Programa Avançado de Gestão para a Construção, da Faculdade de Ciências Económicas e Empresariais da Universidade Católica Portuguesa. Quadro superior da SETH - Sociedade de Empreitadas e Trabalhos Hidráulicos, sendo, desde 2007, Presidente do Conselho de Administração. Desde 1999 que integra a Direção da AECOPS - Associação de Empresas de Construção, Obras Públicas e Serviços, tendo assumido a Presidência em 2008. Integra a AICCOPN - Associação dos Industriais da Construção Civil e Obras Públicas, tendo assumido as funções de Vice-Presidente em 2020. Presidente da FEPICOP - Federação Portuguesa da Indústria da Construção e Obras Públicas. Vice-Presidente da CPCI - Confederação Portuguesa da Construção e do Imobiliário. A nível internacional desempenhou o cargo de Vice-Presidente da FIEC - Federação da Indústria Europeia da Construção em 2008/2009, 2010/2012 e 2014/2016.


# DESTAQUE A capacidade de resposta da construção civil portuguesa face ao grande aumento de investimentos previstos para os próximos anos “Mas o futuro não depende exclusivamente das construtoras… a atuação

reguladora do Estado e o comportamento dos donos de obra são fundamentais para que as empresas de construção nacionais possam atuar de forma competitiva nos próximos dez anos.“

RICARDO PEDROSA GOMES Presidente da Direção da AECOPS

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A capacidade de resposta da construção civil portuguesa

1. Introdução A APDA - Associação Portuguesa de Distribuição e Drenagem de Águas lançou-me o desafio de escrever um artigo sobre a capacidade de resposta da construção civil portuguesa face ao grande aumento de investimentos previstos para os próximos anos. Agradeço o convite e, de forma direta e clara, afirmo que as empresas portuguesas

e o setor da Construção têm competências e capacidade produtiva instalada para responderem, de forma eficaz, a um ciclo longo de investimento nas obras públicas e no imobiliário. De facto, mesmo admitindo que todos os projetos e obras públicas já anunciados venham a concretizar-se nos prazos previstos, ainda assim, o setor da Construção tem capacidade para o executar atempadamente e com qualidade.

Por outro lado, como, possivelmente, nem todos os investimentos previstos se irão concretizar dentro do prazo, o Setor conta com uma “margem de segurança” para poder realizar todas as obras contratadas nos prazos e com a qualidade exigidos pelos donos de obra, o que reforça a convicção com que afirmamos que as empresas portuguesas estão preparadas para os desafios dos próximos anos.

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# DESTAQUE Neste artigo procuraremos explicitar os argumentos que sustentam a nossa tese.

2. O setor da Construção em 2020 De forma telegráfica, vamos começar por apresentar como é hoje o setor da Construção em Portugal. Existem 42 mil empresas de construção habilitadas, com alvará e títulos de registo, trabalham cerca de 305 mil pessoas na Construção (6.2% do total do emprego) o valor da produção ascende a 14 mil milhões de euros, o investimento em construção (FBCF em construção) representa cerca de 57% do total do investimento nacional (FBCF total), o valor acrescentado da construção ascende a 8 mil milhões de euros, correspondendo a 4.4% do PIB português. Em 2020, no contexto da grande crise gerada pela paralisação da economia nacional devido à COVID-19, o setor da Construção surge como a atividade económica mais dinâmica em Portugal, com um crescimento a rondar os 3% no acumulado dos três primeiros trimestres

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do ano, em contraste com a queda do PIB, que ronda os -8.1%. Por outro lado, este comportamento da Construção no País também é único no espaço europeu, onde a atividade decresceu significativamente, no contexto da pandemia. O melhor desempenho das empresas portuguesas de construção nesta crise, em contraponto com a média do desempenho das empresas portuguesas e da generalidade das construtoras europeias, deve ser entendido como um sinal da resiliência do setor da Construção em Portugal, o que pode indiciar a sua capacidade para responder de forma favorável aos desafios do futuro. A resiliência atual do Setor é fruto da crise devastadora que afetou a Construção entre 2002 e 2015, com quedas no emprego e na produção a rondarem os 50%. Esta crise muito prolongada deixou uma herança pesada e, simultaneamente, uma luz ténue ao fundo do túnel. No lado da herança pesada, temos empresas debilitadas e endividadas, um setor enfraquecido e descapitalizado, um mercado

distorcido pela concorrência, com adjudicações a propostas de preços anormalmente baixos. A luz ténue ao fundo do túnel está associada ao núcleo empresarial de empresas portuguesas muito resiliente, também elas enfraquecidas, mas que sobreviveram à crise no País, com o reforço da atividade nos mercados internacionais. Este núcleo duro, numa conjuntura favorável, pode funcionar como alavanca para a recuperação e reanimação de um setor adormecido, que pode renascer com o novo ciclo de fundos comunitários e de investimentos em infraestruturas. Entretanto, importa referir que os investimentos previstos para a próxima década continuam abaixo dos que já foram executados pelas empresas portuguesa de construção no final do século XX. De facto, a dimensão dos investimentos previstos para os próximos anos, que traduzem uma forte recuperação em relação à crise e à estagnação do investimento público dos últimos 20 anos, continua abaixo dos tempos áureos da Construção em Portugal, e,


A capacidade de resposta da construção civil portuguesa

na realidade, correspondem a valores médios para um mercado a funcionar em ritmo normal, por analogia ao que acontece na União Europeia. Neste sentido, percebe-se que a capacidade de resposta que as empresas de construção têm de dar nos próximos anos é, de alguma forma, um retorno à normalidade. Mas, não obstante esta constatação, convém perceber se as empresas portuguesas enfraquecidas pela crise estão em condições de responder ao esforço de produção que lhes é exigido.

3. Potencial e flexibilidade do Setor e das empresas de construção portuguesas na próxima década A avaliação da capacidade de resposta das empresas de construção portuguesas ao aumento previsto do investimento público nos próximos anos pode ser feita nos planos qualitativo e quantitativo. Nesse sentido, importa apreciar: - Por um lado, no plano qualitativo, qual o potencial das empresas portuguesas de construção para

responder aos novos desafios, nomeadamente, se têm experiência, estruturas organizativas, competências técnicas, recursos humanos qualificados e capacidade financeira para concretizarem mais obras, obras mais complexas e de maior dimensão, como as previstas para os próximos anos; - Por outro lado, no plano quantitativo, qual a flexibilidade produtiva das empresas de construção e a elasticidade da oferta no Setor, ou seja, a sua capacidade para, no curto/ médio prazo, aumentar significativamente a produção sem aumentar de forma mais que proporcional os custos fixos e, simultaneamente, sem reduzir a qualidade. Dito de outra forma, importa avaliar se as empresas de construção têm capacidade operacional para melhorar a sua competitividade interna, para, dessa forma, responderem a um aumento significativo da procura, se conseguem aumentar o volume da atividade sem fazer disparar os preços de produção. Nesta perspetiva, as empresas de construção necessitam de melhorar a produtividade, a gestão dos

estaleiros e dos recursos e a capacidade de empregar mais trabalhadores, mantendo a eficiência produtiva. De forma sintética, gostaríamos de explicitar que: Em primeiro lugar, as empresas portuguesas de construção apresentam um elevado potencial de crescimento, que resulta: a) Das competências e da excelência da engenharia portuguesa e da arquitetura, que permitem ao setor inovar, adaptar-se e reinventar-se nas diferentes conjunturas; b) Da experiência e tradição acumulada no Setor e nas empresas portuguesas, que fazem parte do código genético desta atividade e de muitas das empresas que sobreviveram à crise. Importa recordar que as empresas de construção portuguesas executaram, num passado relativamente recente, um conjunto notável e muito significativo de infraestruturas. Obras que foram executadas por técnicos e trabalhadores que ainda fazem parte dos quadros das empresas nacionais, o que constitui uma mais-valia estratégica no presente e para o futuro; REVISTA APDA_ APDA _ 2020

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# DESTAQUE c) Do nível de experiência e qualificação, adquirida dentro e fora de Portugal, dos trabalhadores portugueses, que constituem o suporte para um crescimento sustentado e para o enquadramento dos outros trabalhadores que a Construção precisa de ir buscar ao exterior para crescer nos próximos anos; d) A possibilidade de, na sequência da pandemia, atrair e fazer regressar para as empresas nacionais trabalhadores portugueses expatriados, com mundo e experiência internacional, e, dessa forma, reforçar o seu quadro de competências. Em segundo lugar, as empresas de construção são eficientes. Elas evidenciaram e desenvolveram uma grande flexibilidade de gestão das suas estruturas produtivas ao longo da crise, o que constitui uma vantagem competitiva relevante no período da recuperação, nomeadamente: a) Na gestão dos estaleiros, integrando de forma eficiente um número crescente de subempreiteiros, o que permite conciliar flexibilidade com crescimento, aumento da produção sem acréscimo de custos fixos, gestão integrada com especialização;

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b) Na exploração da cooperação entre empresas, com a criação de consórcios e ACE’s que proporcionem sinergias entre empresas com diferentes tipos de especialização.

com qualidade, dentro dos prazos e de acordo com os preços contratualizados, e, simultaneamente, querem aproveitar esta oportunidade histórica para voltarem a crescer de forma sustentada.

Modernização do Setor

Mas o futuro não depende exclusivamente das construtoras… a atuação reguladora do Estado e o comportamento dos donos de obra são fundamentais para que as empresas de construção nacionais possam atuar de forma competitiva nos próximos dez anos.

Uma breve nota para enfatizar que, para terem sucesso, as empresas de construção necessitam de utilizar o próximo ciclo de investimento público e de crescimento da atividade para se modernizarem e inovarem, para caminharem no sentido da digitalização e da robotização que, nalguns casos, já poderão ser utilizadas com sucesso na execução das obras dos próximos 10 anos.

4. Conclusão Ao longo deste texto procurámos demonstrar que, durante a próxima década, as empresas portuguesas de construção têm condições para responder a um aumento acentuado do investimento público em infraestruturas com financiamento comunitário. As construtoras nacionais podem responder ao aumento do investimento público construindo bem,

A título de exemplo, se os projetos não tiverem qualidade, se os donos de obras forem coniventes com práticas de concorrência desleal e alimentarem práticas de adjudicação a propostas de preços anormalmente baixos, em detrimento da qualidade, se compactuarem com estratégias de dumping de construtoras estrangeiras, se… as empresas nacionais não conseguirão responder aos desafios da próxima década. Ao invés, se o Estado e os donos de obras passarem a lançar obras com preços base realistas e adequados, se não continuarem a adiar o lançamento dos investimentos


A capacidade de resposta da construção civil portuguesa

públicos já anunciados e se cumprirem os calendários previstos, se apostarem na inovação, na qualidade e sustentabilidade das infraestruturas ao longo de todo o seu ciclo de vida, então, estarão reunidas as condições objetivas e subjetivas para que as empresas portuguesas tenham sucesso. O País fica a ganhar com o sucesso das empresas

portuguesas, com infraestruturas de melhor qualidade. O rendimento e as competências gerados pela execução das infraestruturas ficam em Portugal e podem contribuir para o reforço da competitividade da engenharia portuguesa no Mundo, a Construção pode voltar a crescer de forma sustentada, assegurando o emprego e contribuindo para a recuperação económica do País.

Acabamos como começámos: reafirmamos a capacidade de resposta da construção civil portuguesa face ao grande aumento de investimentos previstos para os próximos anos, e esperamos ter demonstrado que aproveitar essa capacidade é o melhor para as empresas portuguesas, para o Setor e para o País.

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ATUALIDADE


E


# atualidade

Por UM Regulamento da Qualidade do Serviço exequível, generalizável e progressivo

J. Henrique Salgado Zenha Vice-Presidente do Conselho Diretivo da APDA

Licenciado em Direito pela Faculdade de Direito de Lisboa, é atualmente vice-presidente do Conselho Diretivo e membro da Comissão Especializada de Legislação e Economia da APDA. Foi: advogado e membro do Conselho Geral da Ordem dos Advogados; consultor jurídico do Banco Português do Atlântico; consultor jurídico e diretor dos serviços jurídicos da EPAL; administrador da Águas de Portugal; presidente do conselho de administração, presidente da comissão executiva, administrador-delegado e administrador da SANEST, Águas do Cávado, Águas do Oeste e SIMTEJO; membro do Conselho Consultivo do Instituto Regulador de Águas e Resíduos. Fez consultoria internacional.

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“... sendo o Projeto de Regulamento um documento juridicamente bem estruturado, que resulta de uma obrigação estatutária da ERSAR e responde a um objetivo de proteção dos utilizadores, é, porém, pouco realista.”


Por um Regulamento da Qualidade do Serviço exequível, generalizável e progressivo

T

erminou em 30 de novembro de 2020 o prazo de consulta pública do Projeto de Regulamento da Qualidade do Serviço da ERSAR, tendo a APDA dado o seu contributo através de pronúncia que consta no sítio da Associação (www.apda.pt). A posição da APDA resume-se em poucas palavras: sendo o Projeto de Regulamento um documento juridicamente bem

estruturado, que resulta de uma obrigação estatutária da ERSAR e responde a um objetivo de proteção dos utilizadores, é, porém, pouco realista.

mais estruturadas, desafios técnicos sérios.

Pouco realista, antes de mais, porque a situação de grande parte das entidades gestoras não é compatível com o grau de exigência do Projeto.

Também, porque prevê compensações pesadas aos utilizadores para os incumprimentos e expõe os serviços a outras - e acrescidas - indemnizações decorrentes dos mesmos factos.

Depois, porque cria, mesmo para as entidades gestoras

Ainda, porque confirma um regime de prova REVISTA APDA_ APDA _ 2020

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# atualidade extremamente gravoso para as entidades gestoras, que, aliado às lineares exigências e compensações previstas, poderá ser um detonador de significativa litigância. Ainda mais, porque não tem em conta os custos da sua aplicação. Finalmente, porque não prevê uma aplicação progressiva, que permita às entidades gestoras a sua adaptação às novas exigências. Dito isto, antecipa-se a objeção: lá estão eles - as entidades gestoras e a sua Associação - a não querer sair do seu comodismo e a tentar evitar a aplicação de regras de proteção dos utilizadores… Não é o caso! O que a APDA preconiza é um Regulamento da Qualidade do Serviço que seja exequível para todas as entidades gestoras. O Setor não pode conviver permanentemente com regras que não são aplicadas a todos os serviços, como acontece com a recuperação de gastos, e acontecerá também com a aplicação deste Projeto, porque as pequenas entidades gestoras não têm,

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evidentemente, meios para responder em prazos de poucas horas ou poucos dias às obrigações previstas. Nem têm condições económicas para investir em sistemas de informação, formação de pessoal e serviços de comunicação para cumprir esses prazos. Mas, pequenas ou maiores, terão também, por exemplo, condições para cumprir, quando se lhes exige que aprovem um orçamento individualizado em oito dias úteis? Poderá uma câmara municipal fazê-lo? E deverá uma empresa aprovar orçamentos em correria, tendo em conta a, ou as, visitas ao local, a preparação do orçamento, a sua validação financeira e a aprovação pela sua gestão? Se apresentar o orçamento no nono dia útil, a entidade gestora terá de pagar ao seu futuro utilizador uma compensação correspondente a 180 dias de tarifa de disponibilidade… E, mesmo que as entidades gestoras que servem mais de 20.000 clientes (apenas uma quarta parte de todas) tivessem capacidade para cumprir uma boa parte do Projeto, ignoram-se os custos

da repentina exposição a compensações tão lineares e os custos de implementação do Projeto? Não se está perante abstrações. Se é compreensível que a compensação por incumprimento de uma disposição regulamentar não possa ser repercutida nas tarifas, não é aceitável que deixe de ser considerada a previsão da exposição global a esses custos, decorrente de inevitáveis atrasos em relação aos novos prazos rígidos previstos. Como também não é aceitável que os gastos resultantes da própria implementação do Regulamento - sistemas de informação, formação de pessoal, resposta técnica afinada pelo relógio, maior articulação entre os serviços - deixem de ser considerados para fins de eventual repercussão tarifária. Dir-se-á que a qualidade do serviço é uma obrigação das entidades gestoras e não deve ter custos acrescidos. Contudo, se o Projeto ficar como está, com as suas novas e rígidas obrigações, responder-se-á, como o espanhol: mas que os há, há… E um regulamento muito


Por um Regulamento da Qualidade do Serviço exequível, generalizável e progressivo

perfeito, aplicado a uma realidade imperfeita, tem uma de três consequências: ou não é aplicável, ou pior, porque cava mais as distinções dentro do setor - é aplicado apenas por alguns, ou ainda é aplicado por todos com custos significativos e sem cobertura de receitas. Ou seja, a realidade fica ainda mais imperfeita. Lembremo-nos de que uma parte muito significativa das entidades gestoras, especialmente no saneamento de águas

residuais, não alcança a cobertura dos gastos. E que o Projeto impõe, por exemplo, compensações do valor correspondente a 30 m3 de água (a faturação de seis meses, ou mais, de muitos clientes) por atraso no cumprimento de prazo máximo de dez dias para a limpeza de fossas séticas… de quem pode não ser sequer cliente. Ou prevê, em várias hipóteses de interrupção do abastecimento de água, a obrigação de «providenciar uma alternativa de água para consumo humano»,

sem especificar o meio, a quantidade, a frequência e a distribuição doméstica exigíveis, o que pode induzir a interpretação de que essa obrigação é equiparável a um fornecimento corrente: será o caso? Mesmo que todas as entidades gestoras pudessem cumprir o Projeto - o que só se considera como hipótese teórica - o agravamento dos custos teria repercussões muito incómodas para o Setor, porque, não sendo tais custos aceitáveis para REVISTA APDA_ APDA _ 2020

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# atualidade fins tarifários, acentuariam as tensões em todos os tipos de entidades gestoras: nas concessões e nas empresas delegadas, porque distorceriam o equilíbrio económico dos seus contratos fundacionais; nos serviços municipalizados, porque prejudicariam também a sua autonomia financeira; nas câmaras municipais sem serviços autónomos, porque as afastariam ainda mais da já tão distante recuperação de gastos. E as consequências na relação com os utilizadores? Mais de quatro milhões de clientes ficam com um manual de litigância de aplicação imediata e, porque bem redigido, de mais fácil compreensão do que os manuais das máquinas de lavar. É bom? Sim, certamente, se os fabricantes destas outras máquinas, as de águas, tiverem capacidade compatível: meios técnicos, suporte económico e dinamismo de informação e resposta. Mas, para isso, são precisos três elementos: moderação, adaptação económica e tempo. Crê-se que o crescimento da qualidade do serviço tem de ser iterativa. Não se atinge

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com um súbito salto, como o representado pelo Projeto. E, por isso, o Regulamento da Qualidade do Serviço precisa de uma correção de moderação, tanto nos prazos gerais previstos para as obrigações dos serviços, como nas compensações fixadas para os casos de incumprimento. Precisa também de uma reflexão moderadora no plano da litigância que pode gerar. O ónus da prova recai, nos casos de reclamações e litígios, quase exclusivamente nas entidades gestoras, o que agrava muito as consequências das obrigações previstas e das compensações correspondentes aos seus incumprimentos: seria, por isso, preferível deixar à lei geral a regra da prova e evitar a desnecessária repetição processional, em múltiplos artigos, de que o incumprimento aí previsto confere ao utilizador o direito a compensação. Acima de tudo, essa reflexão sobre a litigância tem de conformar uma releitura do Projeto à luz das suas prováveis consequências para os serviços. Se, como se teme, os abusos forem

facilitados pela soma das obrigações rígidas com as compensações previstas e pela ausência de riscos para os reclamantes em geral, ou até para um reclamante contumaz, quando o forem sem razão, o equilíbrio contratual pode ser posto em causa. A possibilidade de criação de uma prática de reclamação sistemática, com base num Regulamento tão exigente e transparente, pode levar a que escape a todos os stakeholders dos serviços da água a estabilidade do sistema. Não se perca de vista que se está perante uma equação, que, além de mais de 4 milhões de consumidores, tem duas incógnitas: os efeitos da tendencial evolução da afirmação dos consumidores e a atitude das instâncias arbitrais e judiciais. Por isso, a APDA preconiza uma abordagem do Regulamento da Qualidade do Serviço inserida, não numa análise exclusiva do próprio Regulamento, mas no seu enquadramento nas prioridades para o Setor. Para o desenvolvimento deste são urgentes a superação do dualismo entre grandes ou médias entidades gestoras


Por um Regulamento da Qualidade do Serviço exequível, generalizável e progressivo

e as pequenas, estas sem meios e sem equilíbrio, a recuperação dos gastos ou, ao menos, a evidência dos subsídios através de princípios simples de transparência contabilística, a solução dos grandes problemas subsistentes como as perdas de água, o destino final das lamas ou as carências de cobertura e reabilitação. Estes fins são mais urgentes do que um refinamento das exigências regulamentares que, sem esses desenvolvimentos anteriores e sem consideração dos custos relevantes, não são aplicáveis e muito menos generalizáveis a todos os serviços. Todos podemos concluir, crê-se, que uma abordagem geral das prioridades também é, objetivamente e a final, mais útil para os utilizadores. Para além de moderado (mais maleável nos prazos de cumprimento, mais contido nas compensações), um Regulamento da Qualidade do Serviço operacional exige também, como já referido, que se não varra para debaixo do tapete a questão dos seus custos; mais vale ser realista do que impor tensões acrescidas a serviços que, muitas vezes, não recuperam

os custos ou que têm curtos os equilíbrios económicos dos respetivos contratos. Sendo assim, é preciso tempo para o Regulamento, ou melhor, são precisos vários tempos para o Regulamento. Primeiro, seria desejável que houvesse um tempo de análise partilhada da ERSAR com entidades gestoras representativas de várias dimensões e naturezas do setor, ficando também a APDA disponível para o efeito. O interregno correspondente à impossibilidade de interrupção do serviço recentemente decretado para o primeiro semestre de 2021 é uma boa oportunidade, até por ser impensável a aplicação do Regulamento num contexto de tão grande desequilíbrio contratual entre entidade gestora e utilizadores. Um segundo tempo poderia corresponder a um fracionamento do Regulamento que permitisse às entidades gestoras uma adaptação, ficando para um momento posterior a publicação de um Regulamento complementar com a previsão de compensações.

Seria, assim possível que os prazos de cumprimento mais moderados - fixados na primeira fase fossem testados pelos serviços e pelo Regulador. Finalmente, também em função do que resultasse do nível de aceitação das propostas anteriores, dever-se-iam considerar períodos de vacatio relevantes, entre a publicação e a entrada em vigor do, ou dos, Regulamentos. Um bom Regulamento da Qualidade do Serviço - mas não ainda este - é desejável. Tem de ser bem enquadrado nos problemas gerais do Setor, precisa de ter presente a capacidade real das entidades gestoras, deve permitir fases de adaptação e tem de evitar tornar-se num vetor de litigância e de desequilíbrio acrescido para os serviços. Só assim pode ser exequível e generalizável a todas as entidades gestoras, contribuindo para um crescimento, efetivo e progressivo, da qualidade do serviço.

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# atualidade

A seca hidrológica,, análise conjuntural e visão expectável por via das alterações climáticas Paulo Nico Coordenador da Comissão Especializada de Qualidade da Água da APDA. Diretor do Departamento de Gestão de Redes de Água, Drenagem e Logística dos SMAS de Almada.

Silvana Vitorino Coordenadora da Comissão Especializada de Adaptação às Alterações Climáticas da APDA. Chefe de Divisão de Controlo da Qualidade da Água dos SMAS de Almada.

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“Haverá necessidade de criar mais reservatórios de armazenamento, tendo em conta o regime hidrológico, preparar novas origens subterrâneas em função da disponibilidade hidrogeológica e estudar outras origens alternativas como água residual tratada e a dessalinização.”


A seca hidrológica, análise conjuntural e visão expectável

A gestão das secas O grande Vale do Nilo nunca mais foi o mesmo depois da barragem de Assuão, foco de grandes discórdias e até de tensão política após a Segunda Grande Guerra, em tempos de Guerra Fria. O começo da sua construção pela engenharia britânica deu-se no início do século XX, mas já antes tinha sido pensada para gerir a água na bacia do grande rio em solo egípcio.

O terreno fértil que ladeava o leito do rio beneficiava de épocas de grandes cheias, que transportavam nutrientes desde as nascentes do Rio Nilo, mas também sofriam de enorme escassez nos períodos de seca hidrológica, mais ou menos prolongada. Com a construção da Barragem, passou a ser possível garantir um caudal de subsistência regular, impedindo as catástrofes causadas pelas inundações, em bens materiais e humanos, numa escala

inadmissível em tempos modernos. Atualmente está em construção uma barragem no Nilo Azul, na Etiópia, muito deficitária em capacidade hídrica, que poderá vir a reduzir consideravelmente os caudais para jusante e deste modo causando grande sobressalto no Sudão e Egipto. Este assunto, pela importância estratégica que tem, foi tema de debate na recente campanha eleitoral para as presidenciais americanas. REVISTA APDA_ APDA _ 2020

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# atualidade Esta “guerra” pela água é sem dúvida um dos principais focos de disputa entre nações, sejam elas subdesenvolvidas ou até do centro europeu. A natureza tem formas distintas de reter grandes massas de água doce, sólida nos polos e montanhas, líquida em lagos e aquíferos subterrâneos, e até gasosa na atmosfera terrestre. A disponibilidade nem sempre é a mais favorável à procura, agora que o Homem espera que as boas condições hidrológicas sejam criadas nos locais onde se fixa, ao contrário dos ancestrais que iam ao encontro dos locais onde a natureza as proporcionava. Também é necessário considerar que a população mundial cresce a uma taxa elevadíssima e geograficamente desequilibrada, e com isso consumindo meios naturais mais que nunca, numa tendência que vem criar cidades-estado com dimensão superior em habitantes à que existia na maioria das nações do século passado. Com o consumo direto e indireto da água, deixou de ser possível usar apenas as

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formas naturais de reserva e disponibilização, de onde resulta que, pese embora alguns impactes negativos, o recurso a barragens é uma forma comprovada de reter os caudais excessivos de algumas épocas e permitir que estejam disponíveis noutras. A quantidade global de água no planeta não tem variações relevantes, mesmo que se venha a usar o Hidrogénio como principal fonte de energia “quase” primária, mas uma parte está contaminada por atividades humanas e naturais, e outra está salgada, o que as torna complexas e

dispendiosas para colocar em uso. Como contraponto das dificuldades já referidas, devemos recordar que o ciclo natural da água permite que em poucos milhares de anos a água existente no planeta, em estado líquido, passe por um processo de depuração natural, e que regresse à superfície terrestre, toda ela, ao contrário do que por vezes se diz em discursos catastrofistas que anunciam o desaparecimento da água. Também há uma tendência crescente para correntes negacionistas que para


A seca hidrológica, análise conjuntural e visão expectável

justificar a não construção, ou em casos mais extremos a demolição de barragens, referem a insuficiência de pluviosidade média nas bacias hídricas, adiando a construção de infraestruturas críticas, que são naturalmente dispendiosas e necessitam de consenso alargado para permitir o seu financiamento. Períodos de seca hidrológica são estatisticamente normais desde o início do século XX, com base em registos meteorológicos. Antes disso, através de relatos históricos de períodos de fome por falta de produção de alimentos, é possível inferir que sempre ocorreram. De acordo com os dados conhecidos, o que é diferente na atualidade, em comparação com o passado recente, é a crescente dimensão temporal de ciclos de seca extrema, a que se junta um consumo intenso das reservas naturais e artificiais, possibilitada pela capacidade técnica de ir buscar água onde antes era impossível.

Secas mais recentes Neste século, no passado recente nacional, temos pelo menos três anos distintos

com secas hidrológicas extremas, 2005, 2012 e 2017, todos eles com repercussões intensas na produção agrícola, na disponibilidade para uso urbano, industrial, turístico e recreativo. A acompanhar estes agravamentos sucedeu sempre um aumento da procura em aquíferos subterrâneos, cada vez mais profundos, com a construção de furos de captação que são muitas vezes abandonados no fim de vida e que constituem um agravamento muito apreciável da qualidade da água nesses depósitos naturais.

Um caso paradigmático é a construção do empreendimento da EDIA no Alqueva, que demorou várias décadas de acesa discussão até ser construído, cuja evidência de viabilidade está totalmente comprovada, e ainda assim não chega como argumento de benchmarking para várias outras situações similares, especialmente nas bacias do Sado e do Tejo, e mesmo com a devida diferença na do Mondego. Todos os anos se adiam investimentos que permitiriam assegurar alguns excessos invernais para usar em seguida.

Em todos estes anos de seca hidrológica, no território nacional, foram pensadas medidas de mitigação, para atenuar efeitos e dar maior margem de gestão, que invariavelmente são muito apoiadas durante a fase de planeamento, mas logo que começam as primeiras chuvas são escalonadas para prioridades baixas, e quase nunca chegam a ser implementadas. As mais recentes, se comparadas com as primeiras, são boa prova disso, com a repetição regular do que já antes tinha sido proposto.

Com a tendência de migrações nacionais para as regiões costeiras atlânticas, surge a oportunidade de recorrer à dessalinização como forma de aumentar a disponibilidade de água doce, com custos energéticos apreciáveis, impactes ainda pouco conhecidos do uso de água totalmente desmineralizada, mas ainda assim uma alternativa viável. Mais complicado é levar essa água para zonas interiores, pelo custo de transporte, e para locais onde a necessidade de grandes quantidades é fundamental para permitir a REVISTA APDA_ APDA _ 2020

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# atualidade produção agrícola, a fixação das populações, e evitar a desertificação desses territórios, que a não ser invertida estará em espiral negativa.

Secas e as Alterações Climáticas As previsões apontam que as alterações climáticas terão impactos significativos na distribuição dos recursos hídricos, na qualidade da água, no aumento da frequência e severidade de períodos de seca e escassez de água, na maior concentração de precipitação nos meses de inverno e no aumento de temperatura média, entre outros. A ÁGUA, como condição essencial à existência da vida na Terra, como a conhecemos, não é o único tema que merece especial reflexão, mas é o centro das preocupações quando falamos em alterações climáticas. O acesso à água e ao saneamento foi reconhecido como um Direito Humano pelas Nações Unidas após a Resolução da Assembleia Geral das Nações Unidas (AGNU) de 2010. Este reconhecimento foi um marco muito importante,

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uma vez que as Nações Unidas desempenham um papel essencial na luta pelo respeito dos direitos humanos e na pressão política que exerce junto dos Estados para que desenvolvam políticas sustentáveis, respeitando a garantia dos Direitos Humanos. Catarina de Albuquerque, em On the Right Track, Good Practices in realising the Rights to Water and Sanitation, identifica os princípios deste direito, os quais iremos enumerar da mesma forma: • Disponibilidade; • Qualidade e Segurança da Água; • Aceitabilidade; • Acessibilidade. Para além de ser um Direito Humano para assegurar a qualidade de vida, o acesso a água de boa qualidade e em quantidade suficiente é igualmente essencial para assegurar o funcionamento de diferentes setores socioeconómicos. A escassez de água e as secas têm assim um impacto significativo em múltiplos setores da atividade humana tal como o abastecimento público, agricultura, indústria, saúde, turismo, energia, entre outros.

A escassez de água e as secas têm sido uma preocupação crescente com particular relevância nas regiões onde a sua duração, frequência e severidade são cada vez maiores. A ciência prevê, através de vários modelos climáticos utilizados pelos cientistas, que nas próximas décadas 2030, 2040, 2050… 2100 ocorrerão drásticas alterações a nível global, sendo o clima cada vez mais imprevisível. As alterações climáticas têm vindo a ser identificadas como uma das maiores ameaças ambientais, sociais e económicas que o Planeta e a Humanidade enfrentam na atualidade. Para fazer face a esta problemática, existem essencialmente duas linhas de atuação: a da mitigação e a da adaptação. A mitigação visa sobretudo a redução das emissões de gases com efeitos de estufa (GEE), com vista à desaceleração das dinâmicas que estão a levar ao fenómeno do aquecimento global. A adaptação tem como objetivo central preparar as estruturas para resistirem aos impactos das alterações, que


A seca hidrológica, análise conjuntural e visão expectável

se prevê virem a ocorrer até ao final do século, reduzindo o risco e tornando-as mais resilientes, ou seja, com maior capacidade de recuperação após a ocorrência de situações que afetem o seu normal funcionamento.

Cimeira de Ação Climática As consequências das alterações climáticas potenciam efeitos que afetam todo o Planeta. Representam um grave desequilíbrio ecológico, levarão a uma extinção em massa de espécies e colocam grandes desafios à sociedade a nível mundial em termos económicos, políticos e sociais. Os impactos adversos das alterações climáticas sobre a economia não incidem apenas sobre as gerações futuras, estão já a ocorrer e a intensificar-se muito rapidamente e a resolução só será possível se for a nível global. É essencial dotar o país e o mundo de instrumentos que regulem a preparação para futuras ocorrências de eventos extremos que se estão a verificar cada vez

mais severos e com maior frequência. Efetivamente isso só será possível se o recurso água tiver um planeamento e gestão integrada. O Secretário-Geral das Nações Unidas, António Guterres, convocou a Cimeira de Ação Climática para incentivar os países a apresentarem planos de mitigação mais ambiciosos do que aqueles que propuseram quando o Acordo de Paris foi aprovado em 2015. No quadro do Acordo de Paris cada país fixou os seus próprios objetivos de redução das emissões de gases com efeito de estufa. Contudo, os objetivos planeados revelaram-se insuficientes para evitar o aquecimento do planeta em 1,5ºC. António Guterres afirmou na Cimeira de Ação Climática: “Estamos em plena emergência climática e não há tempo a perder e a resposta é uma ação rápida, decisiva e, mais importante, uma solidariedade entre países”. Em setembro último, o Secretário-Geral das Nações Unidas voltou a abordar o assunto do contínuo

aquecimento do planeta, bem como das consequências climáticas que daí advêm, no decurso de um encontro com representantes do setor privado e de diversos líderes políticos mundiais. Numa altura em que as medidas de combate à pandemia provocada pela COVID-19 se revelaram devastadoras para a economia mundial e que se torna necessário elaborar os planos de recuperação económica, António Guterres defendeu que se deve dar prioridade às pessoas e comunidades mais vulneráveis e que será necessário investir em “empregos verdes”, em detrimento de empregos poluentes, acrescentando que será necessário “ter em conta os riscos climáticos em decisões financeiras e políticas”. O Secretário-Geral da ONU lembrou também que o próximo dia 12 de dezembro assinalará o 5º aniversário do Acordo de Paris e que o momento será determinante para “aumentar a ambição climática”, devendo os governos mundiais desenvolver pacotes de recuperação COVID-19 que acelerem a descarbonização da economia global. REVISTA APDA_ APDA _ 2020

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# atualidade Recordando que as soluções para as alterações climáticas devem ser orientadas pelo conhecimento científico, António Guterres voltou a alertar: “se continuarmos no nosso caminho atual, a escala de sofrimento em todo o mundo irá além da nossa imaginação”.

economia limpa e circular, restaurar a biodiversidade e reduzir a poluição. A UE pretende que em 2050 o seu impacto no clima seja neutro.

“Green Deal": o novo Pacto Ecológico Europeu No final de 2019, a Comissão Europeia apresentou o “Green Deal”: o novo Pacto Ecológico Europeu. O Pacto Ecológico Europeu prevê um plano de ação para impulsionar a utilização eficiente dos recursos através da transição para uma

Este pacto redefine o compromisso da Comissão de enfrentar os desafios climáticos e ambientais. Todos os anos o aumento dos gases com efeito de estufa na atmosfera provoca o aumento da temperatura média e, consequentemente,

Mobilizar a investigação e promover a inovação Aumentar a ambição da UE em matéria de clima para 2030 e 2050

Transformar a economia da UE para um futuro sustentável

Fornecer energia limpa, segura e a preços acessíveis Mobilizar a indústria para a economia circular e limpa

Preservar e recuperar ecossistemas e a biodiversidade

Pacto Ecológico Europeu

Construir e renovar de forma eficiente em termos de utilização de energia e recursos Financiar a transição A UE como líder mundial

Fonte: Pacto Ecológico Europeu (CE; Bruxelas 11.12.2019)

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Adotaruma umaambição ambição poluAdotar dede poluição ição zero ambiente livre zero porpor umum ambiente livre de de substâncias substâncias tóxicas

“Do prado ao prato”: conceber um sistema alimentar justo, saudável e amigo do ambiente Acelerar a transição para a mobilidade sustentável e inteligente

Não deixar ninguém para trás (transição justa) Pacto Europeu para o Clima


A seca hidrológica, análise conjuntural e visão expectável

alterações climáticas assinaláveis. O Pacto Ecológico Europeu consiste numa nova estratégia de crescimento que visa transformar a UE numa sociedade equitativa e próspera, dotada de uma economia moderna, eficiente na utilização dos recursos e competitiva, que, em 2050, tenha zero emissões líquidas de gases com efeito de estufa e em que o crescimento económico esteja dissociado da utilização dos recursos. O objetivo é que a União Europeia assuma a liderança mundial no combate às alterações climáticas e fixe os padrões globais para uma transição energética justa e inclusiva. Tal como mencionou no seu discurso de tomada de posse, a Presidente da Comissão Europeia, Ursula Gertrud von der Leyen, “quanto mais depressa nos mexermos, melhor será para os nossos cidadãos e para as nossas empresas (…); o Pacto Ecológico Europeu vai permitir reduzir emissões e criar empregos, iniciar e desenvolver novas tecnologias e abrir novos mercados”.

Pacto Ecológico Europeu - Medidas para todos os setores da nossa economia • Investir em tecnologias não prejudiciais para o ambiente; • Apoiar a inovação industrial; • Implantar formas de transporte público e privado mais limpas, mais baratas e mais saudáveis; • Descarbonizar o setor da energia; • Assegurar o aumento da eficiência energética dos edifícios; • Cooperar com parceiros internacionais no sentido de melhorar as normas ambientais globais.

Pacto Ecológico Europeu - Políticas transformadoras • Aumentar a ambição da UE em matéria de clima para 2030 e 2050; • Fornecer energia limpa, segura e a preços acessíveis; • Mobilizar a indústria para a economia circular e limpa; • Construir e renovar de forma eficiente em termos de utilização de energia e recursos; • Acelerar a transição para

a mobilidade sustentável e inteligente; • «Do prado ao prato»: conceber um sistema alimentar justo, saudável e amigo do ambiente; • Preservar e recuperar ecossistemas e a biodiversidade; • Adotar uma ambição de poluição zero por um ambiente livre de substâncias tóxicas; • Caminhar para o financiamento e o investimento ecológico e garantir uma transição justa; • Ecologizar os orçamentos nacionais e enviar sinais corretos em matéria de preços; • Mobilizar a investigação e promover a inovação; • Apoiar a educação e a formação; • Um juramento ecológico: «não prejudicar».

Gestão futura das secas As alterações climáticas afetarão o padrão de disponibilidade e qualidade do recurso água que atingirá as atividades de diversos setores económicos. Na grande maioria dos casos, o consumo mais elevado da

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# atualidade água ocorre em contraciclo com períodos de chuva, o que constitui sempre um enorme desafio para todos os stakeholders envolvidos na gestão e utilização da água. Na procura de águas subterrâneas, com os aquíferos mais ricos próximos de zonas costeiras, há o risco acrescido de intrusão salina sempre que se entra em sobre-exploração, com danos irrecuperáveis. Uma vertente fundamental para combater os efeitos da seca é a racionalização do uso da água, por todas as ferramentas ao nosso alcance. Não é compreensível que em períodos de escassez o valor da água1 suba imenso e a tarifa ao consumidor se mantenha inalterada, deixando de dar um sinal forte de necessidade de poupança, até nos usos urbanos em que temos consumos diários próximos de 200L/habitante.dia, que nas secas extremas recentes registaram subidas significativas nos períodos mais críticos. Existem de facto alguns incentivos para o uso

criterioso da água, por exemplo no apoio à agricultura de precisão, mas ainda com resultados muito limitados para a magnitude do problema existente. Na gestão corrente dos vários utilizadores da água, há uma taxa efetiva de perda de água muito superior ao desejável, que importa reduzir, através de mecanismos mais eficazes do que os utilizados até ao passado recente, não apenas de incentivo, mas também de penalização pelo mau desempenho. A proposta inicial de revisão da Diretiva da Qualidade da Água de Consumo Humano veio procurar dar um sinal nesse sentido, mas após ampla discussão entre os membros da União Europeia, o resultado de compromisso será ainda pouco ambicioso. As entidades gestoras deverão conhecer a vulnerabilidade atual e futura face às alterações climáticas e adotar um planeamento integrado com uma gestão criteriosa e eficaz dos recursos hídricos. É urgente ter atitudes pró-ativas e não reativas com opções

sustentáveis e eficientes na utilização do recurso, potencializando uma oportunidade de melhoria da sustentabilidade económica e ambiental, adaptando as atividades às alterações climáticas e aumentando a capacidade de resistência a catástrofes. Haverá necessidade de criar mais reservatórios de armazenamento, tendo em conta o regime hidrológico, preparar novas origens subterrâneas em função da disponibilidade hidrogeológica e estudar outras origens alternativas como água residual tratada e a dessalinização. A gestão da água no futuro será com toda a certeza um fator crítico no planeamento e consolidação da qualidade de vida da população, pelo que deve ser encarada como um pilar fundamental da boa governação, exigindo-se do poder político que crie as condições de capacitação científica, técnica e de governança adequadas.

Valor nas dimensões ambiental, social, económica, de prestação de serviços, e até para a obtenção do objetivo de desenvolvimento sustentável 6 da OMS. 1

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A seca hidrolรณgica, anรกlise conjuntural e visรฃo expectรกvel

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# atualidade

A GESTÃO PLUVIAL NAS ZONAS URBANAS E O CONTROLO DAS INUNDAÇÕES

Paula Lopes Membro da Comissão Especializada de Legislação e Economia da APDA. Dirigente nos SMAS de Sintra.

Licenciada em Economia pela Lisbon School of Economics & Mangement (ISEG/UL). Pós-graduada em Direito e Prática da Contratação Pública pela FD/UCP e Direito da Água pelo ICJP da FDUL. Curso intensivo Reforma do Código dos Contratos Públicos: o impacto das novas Diretivas pela FD/UCP. Dirigente nos SMAS de Sintra desde 2000 na área Financeira e Contratação. Membro da Comissão Especializada de Legislação e Economia da APDA.

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“Se não dispusermos de um sistema de drenagem eficiente que permita exercer sobre as águas a devida seleção

e tratamento em função das suas origens, chegaremos a uma situação de evidente rutura podendo, no limite, pôr em causa o uso sustentável, para os diferentes usos, deste recurso escasso - a água.”


A GESTÃO PLUVIAL NAS ZONAS URBANAS E O CONTROLO DAS INUNDAÇÕES

INTRODUÇÃO Os recursos hídricos constituem o principal meio de transmissão dos impactos das alterações climáticas sobre a vida e as atividades humanas. O regime de ocorrência e disponibilidade dos recursos hídricos e o regime de cheias e secas são dependentes diretos do clima e condicionam uma multiplicidade de setores da atividade económica e social.

As características e o modo como é feita a gestão da rede de drenagem de águas pluviais nomeadamente as ações de manutenção da rede, operações de limpeza e conservação, o redimensionamento dos sumidouros e das condutas, que raramente se encontram ajustadas aos caudais que ocorrem em situações extremas, são um fator determinante para o controlo das inundações, em especial para as populações

que habitam as grandes cidades na medida em que nelas se concentram os efeitos negativos das chuvas intensas. A desorganização na ocupação dos solos nas áreas urbanas e a cobertura de grandes áreas, tornando-as impermeáveis, levam à redução da capacidade de infiltrações dos solos e fazem com que o escoamento das águas pluviais seja essencialmente feito à REVISTA APDA_ APDA _ 2020

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# atualidade superfície, o que causa prejuízos e inconvenientes à população e às infraestruturas existentes nas cidades. As águas que escorrem nas superfícies urbanizadas, sobretudo pela acumulação de resíduos que transportam, levam a um aumento de cargas poluentes nos rios e lagos, e a acumulação de águas estagnadas e lamaçais sobretudo no interior das cidades, constituindo um importante veículo de transporte e propagação de doenças entre as populações.

A gestão sustentável das águas pluviais assume assim uma importância vital para o desenvolvimento sustentável das cidades e para a qualidade de vida das suas populações.

A importância de uma boa drenagem pluvial no controlo das inundações Atualmente vivemos num mundo com mais de 7 mil milhões de pessoas. Trata-se de um número que todos os anos aumenta, trazendo

consigo um conjunto significativo de vantagens, mas também um vasto leque de problemas sobre os quais a sociedade se deve debruçar, na procura de soluções viáveis e duradouras. Se não dispusermos de um sistema de drenagem eficiente que permita exercer sobre as águas a devida seleção e tratamento em função das suas origens, chegaremos a uma situação de evidente rutura podendo, no limite, pôr em causa o uso sustentável, para os diferentes usos, deste recurso escasso - a água.

6,000

Population in millions

5,000

4,000

4,712 4,185

4,165

3,000

2,000 1,031

1,000

740

639

394

467

347

513

0 Asia

Africa

Europe

South America 2010

North America

161

228

Central America

37

70

Oceania

2100

Figura 1 - População de cada continente em 2010 e projeção para o ano 2100 (Adaptada de Statista - The Statistics Portal)

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A GESTÃO PLUVIAL NAS ZONAS URBANAS E O CONTROLO DAS INUNDAÇÕES

A par do aumento significativo do nível de impermeabilização das cidades, as redes de drenagem de águas pluviais, por razões económicas e de dificuldades de financiamento, não podem estar constantemente a ser redimensionadas para atender às necessidades de ajustamento aos caudais produzidos o que leva a que, de uma forma gradual, todos os anos, a quantidade de água pluvial necessária para inundar uma determinada região seja menor em resultado da sobrecarga dos sistemas de drenagem existentes. É assim importante existir uma rede de drenagem de águas pluviais que garanta, por um lado, a prevenção de inundações, e por outro, que se trate de forma económica e adequada as águas em causa, eliminando os agentes poluidores mais significativos e reduzindo o seu impacto nas linhas de água envolventes. No que se refere às águas residuais, hoje em dia, na maior parte dos países desenvolvidos, já se verifica a existência de adequados sistemas de drenagem, dando

resposta às necessidades sentidas pelas populações.

plano, existindo ainda um longo caminho a percorrer.

Apesar disso, existem ainda algumas situações de ineficiência destes sistemas, nomeadamente em resultado da existência de fossas séticas, quando ocorrem descargas das águas residuais diretamente para as linhas de água que, ao serem arrastadas pelas águas de escorrência em superfície, transportam uma grande variedade de agentes poluentes para os rios e efluentes mais próximos contaminando habitats e seres vivos neles existentes.

As soluções a adotar no sentido de prevenir e evitar a ocorrência de inundações deverão ser ajustadas a cada uma das situações definidas ao nível das bacias hidrográficas existentes. É assim importante que: 1. se atenda ao total da área impermeabilizada de modo a que o escoamento das águas se processe da forma mais eficaz mesmo nas situações de caudais acima do esperado;

Assiste-se hoje a uma nova dinâmica em termos estratégicos para abordar a questão da necessidade de reaproveitamento das potencialidades dos recursos hídricos em termos de recuperação de materiais e energia - o conceito de economia circular em torno do ciclo urbano da água. Pese embora as suas potencialidades nos mais diversos aspetos do diaa-dia das populações, em particular na ocorrência de inundações, a importância das águas pluviais continua a ser relegada para segundo

2. nas zonas urbanas que se desenvolvem nas margens de grandes cursos de água deveria dispor-se, preferencialmente, de espaços livres de edificações. Não sendo possível, por questões urbanísticas ou outras, terão de ser desenvolvidas soluções de defesa contra as cheias, bombagem de caudais, e medidas de retenção de caudais pluviais provenientes de áreas urbanas com cotas mais elevadas, quando perante uma maior intensidade da precipitação não seja possível o escoamento gravítico nos coletores;

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# atualidade 3. em regiões que incluem a montante grandes áreas não urbanizadas, é fundamental atender à capacidade de infiltração dos solos, em momentos de elevada precipitação quer momentânea quer prolongada; 4. no caso das cidades situadas em terrenos com grandes desníveis ou em encostas ou terrenos arenosos devem instalar-se dispositivos que desviem as águas pluviais de forma a evitar a invasão da cidade e consequentes inundações e evitar o risco de derrocada. As soluções ao nível das infraestruturas que se revelam atualmente mais eficientes em termos de custos, já adotadas nalguns países mais desenvolvidos da Europa, constam da conjugação da utilização das denominadas Infraestruturas cinzentas, soluções tradicionais de proteção contra inundações (construção de barragens, diques, canais, defesas contra tempestades frequentemente construídas em betão), com as Infraestruturas Verdes (planícies aluviais, criação de zonas húmidas ou o desvio do curso de rios) que podem reduzir o impacto das inundações.

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Para além das infraestruturas cinzentas e verdes, de caráter estrutural, existem outras medidas não infraestruturais como é o caso do planeamento da utilização do solo, o desenvolvimento de atividades de sensibilização das populações e a constituição de seguros contra inundações, os quais asseguram essencialmente a cobertura de danos materiais.

Enquadramento legal É vasto o conjunto de documentos que contemplam matérias relevantes para o risco de inundação e que têm vindo a ser publicados ao longo dos anos, incluindo os diplomas legais que procuraram enquadrar o risco de cheias e de inundações no contexto jurídico-legal português. Decreto-Lei n.º 468/71, de 5 de novembro - estabelece o regime jurídico dos terrenos do domínio público hídrico. Decreto-Lei n.º 89/87, de 26 de fevereiro - estabelece medidas de proteção às zonas ameaçadas pelas cheias, introduzindo alterações ao DL n.º 468/71, de 5 de novembro.

Decreto-Lei n.º 364/98, de 21 de novembro - estabelece as condições para elaboração de carta de zonas inundáveis no interior dos perímetros urbanos. Lei n.º 54/2005, de 15 de novembro - estabelece a titularidade dos recursos hídricos. Lei n.º 58/2005, de 29 de dezembro - aprova a Lei da Água, transpondo para a ordem jurídica nacional a Diretiva n.º 2000/60/CE. Programa Nacional da Política de Ordenamento do Território - aprovado pela Lei n.º 58/2007, de 4 de setembro. Decreto-Lei n.º 115/2010, de 22 de outubro - estabelece um quadro para a avaliação e gestão dos riscos de inundações, transpondo para a ordem jurídica interna o disposto na Diretiva n.º 2007/60/CE. Estratégia Nacional de Adaptação às Alterações Climáticas (APA, 2015). Estratégia Nacional de Desenvolvimento Sustentável (ENDS 2015) - aprovada pela Resolução de Conselho de


A GESTÃO PLUVIAL NAS ZONAS URBANAS E O CONTROLO DAS INUNDAÇÕES

Ministros n.º 109/2007, de 20 de agosto. Em suma: 1. é reconhecida a importância do risco de inundação e a necessidade de integrar a avaliação e gestão desse risco no processo de planeamento e ordenamento do território no sentido de concretizar uma política que garanta minimizar o seu impacto; 2. a política a desenvolver inclui a avaliação do risco, previsão e alerta precoce de eventos de inundação, sistemas de resposta a emergência e outros projetos de engenharia hidráulica; 3. um planeamento adequado em contexto de desenvolvimento sustentável pode requerer modificações incrementais em áreas de risco, desde que o mesmo seja gerido adequadamente; 4. as implicações para a biodiversidade devem ser consideradas em todas as fases da avaliação e gestão do risco de inundação;

1

5. as alterações climáticas são um processo dinâmico que requer uma abordagem preventiva e flexível no sentido de assegurar uma intervenção adequada, promovendo a adaptação para minimizar as suas consequências potenciais.

os países a responder às situações de inundações, permitindo fazer avaliações de impacto de forma a que as autoridades nacionais, em colaboração com o Centro de Coordenação de Resposta de Emergência da Comissão Europeia, preparem os recursos necessários para prevenir estes fenómenos.

Em contexto europeu Desde a Convenção-Quadro das Nações Unidas sobre as Alterações Climáticas têm vindo a ser desenvolvidos vários estudos e adotadas várias medidas com o objetivo de identificar e quantificar os impactos futuros das alterações climáticas no âmbito da sua estratégia europeia de Adaptação às Alterações Climáticas. A série de projetos PESETA (PESETA I, II e III) desenvolvidos pelo “Joint Research Centre”1 (JRC) é disso um exemplo, contribuindo para melhorar significativamente o conhecimento sobre os impactos das futuras alterações climáticas na Europa. O JRC criou uma ferramenta de previsão para ajudar

Os estudos que desenvolve têm já suporte nos instrumentos que foram desenvolvidos nos vários países na sequência da necessidade de transposição, para a legislação nacional, da Diretiva n.º 2007/60/CE, relativa à Avaliação e Gestão dos Riscos de Inundações, nomeadamente os previstos nos seus artigos 4.º, 6.º e 7.º. O software desenvolvido permite calcular o risco de inundação, prever a ocorrência desses fenómenos e tomar medidas de precaução, a tempo de mitigar os seus efeitos. O sistema disponibiliza informação relativa a toda a infraestrutura vulnerável à inundação, uma lista das áreas urbanas potencialmente

European Commission’s science and knowledge service

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# atualidade

afetadas, avaliação dos possíveis danos económicos, bem como a estimativa do número de vítimas que sofrerão o impacto, permitindo tomar decisões orientadas para o reforço da capacidade de resposta dos meios disponíveis para defesa de vidas humanas e meios de subsistência. No relatório de auditoria n.º 25 (2018) sobre “Diretiva Inundações: houve progressos na avaliação dos riscos, mas é necessário melhorar o planeamento e a aplicação”, o Tribunal de Contas Europeu (TCE) constatou “que a Diretiva

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Inundações teve, no geral, efeitos positivos, mas que a aplicação de ações relacionadas com inundações foi afetada por insuficiências na afetação de fundos. Todos os Estados-Membros começaram a aplicar os seus Planos de Gestão dos Riscos de Inundações (PGRI), mas são necessárias melhorias.”. Relativamente às fontes de financiamento dos projetos constantes dos PGRI, o TCE constatou que “foram apenas parcialmente indicadas e garantidas, tendo os fundos para investimentos transfronteiras sido limitados.

… os procedimentos de classificação para a distribuição desses recursos limitados apresentaram geralmente insuficiências, não tendo os fundos sido afetados segundo as prioridades definidas.”. Relativamente aos projetos relacionados com inundações, alguns Estados-Membros (EM) ainda necessitam de desenvolver esforços para cumprir com a Diretiva-Quadro da Água no que diz respeito à utilização de projetos infraestruturais mais eficientes em termos de custos para reduzir os riscos


A GESTÃO PLUVIAL NAS ZONAS URBANAS E O CONTROLO DAS INUNDAÇÕES

de ocorrência de inundações, como é o caso dos projetos de infraestruturas verdes que ainda não são opção em muitos países da Europa. Em termos de desafios para o futuro, o TCE concluiu que alguns EM ainda não conseguiram estabelecer “uma relação entre o impacto das alterações climáticas e a dimensão, frequência e localização das inundações. Existia regulamentação em matéria de utilização do solo e ordenamento do território para atenuar os riscos de inundações, mas os EstadosMembros tinham muito a fazer para a melhorarem.” Do relatório constam igualmente um conjunto de recomendações para a Comissão Europeia e para os EM adotarem num horizonte 2019 a 2022, de forma a ajustar os PGRI às Diretivas comunitárias em matéria de inundações: 1. Melhorar a prestação de contas; 2. Melhorar a indicação de recursos financeiros, incluindo para ações transfronteiras; 3. Melhorar os procedimentos

de definição de prioridades e garantir a otimização dos recursos; 4. Assegurar o cumprimento da Diretiva-Quadro da Água pelos EM; 5. Verificar se os EM analisaram a viabilidade da aplicação de medidas verdes em combinação com infraestruturas cinzentas, quando adequado; 6. Integrar melhor os efeitos das alterações climáticas na gestão dos riscos de inundações; 7. Sensibilizar o público para os benefícios dos seguros contra inundações e procurar aumentar a cobertura; 8. Avaliar a conformidade dos PGRI com as regras relativas ao planeamento da utilização do solo.

das suas políticas nacionais, estando ainda por concretizar cerca de 8.800 projetos até ao final de 2027, no âmbito dos programas operacionais.

Conclusão

Ao nível das águas pluviais ainda muito terá de ser feito nomeadamente aprofundar o estudo de novos sistemas de gestão de quantidades de caudais e seu tratamento com o objetivo de melhorar a eficiência dos sistemas já existentes, bem como descobrir novos mecanismos e/ou materiais que permitam

De acordo com um artigo publicado pela Global Water Intelligence2 relativamente à Diretiva de Tratamento de Águas Residuais Urbanas (UWWTD) e à Diretiva Quadro da Água, os EM estão ainda longe de atingir a sua conformidade com a aplicação

A UWWTD tem sido fundamental para o desenvolvimento e preocupação na UE em encontrar novas formas de reutilização da água e recuperação de recursos, temas que se têm vindo a revelar fundamentais para a preservação da Água. Tem constituído igualmente particular preocupação a utilização de formas de tratamento inovadoras que permitam a reutilização das águas residuais urbanas para fontes alternativas de energia e reaproveitamento para fins compatíveis, agrícolas e industriais.

“Getting the ‘ew’ out of the UE - The Urban Waste Water Treatment Directive is shifting up a gear. David Lloyd Owen takes a look at the implications”

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# atualidade aumentar a taxa de sucesso no controlo dos caudais e da carga poluente associada. Uma boa gestão das águas pluviais constitui assim um elemento importante a ter em conta na prossecução dos objetivos de sustentabilidade económica, social e ambiental dos recursos hídricos. A sua gestão e tratamento se não for adequada pode vir a comprometer, no futuro, o abastecimento de água para consumo humano, em quantidade suficiente com qualidade e com segurança. É importante dispor de legislação adequada que obrigue as entidades intervenientes na gestão dos sistemas de águas pluviais a procurar soluções integradas com incidência a jusante das áreas mais críticas ao nível das cheias e inundações, prevenindo o seu aparecimento. É fundamental posicionar, em lugares estratégicos, sistemas de retenção e tratamento das águas na origem, salvaguardando a qualidade da água e o seu uso eficiente. Considerando que a melhoria das condições de saúde e bem-estar das populações depende da

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boa gestão dos sistemas de águas de abastecimento, águas residuais e águas pluviais é fundamental que a legislação imponha a adoção de medidas para o desenvolvimento e melhoria dos três sistemas, de forma concertada e integrada, garantindo o desenvolvimento sustentável das várias regiões, proporcionando um futuro saudável e sustentável às gerações presentes e futuras.


ameaça terrorista ao setor do abastecimento de água em Portugal

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A VALORIZAR A ÁGUA E A VIDA

APDA - Associação Portuguesa de Distribuição e Drenagem de Águas Avenida de Berlim, 15 | 1800-031 Lisboa - Portugal Tel.: (+351) 218 551 359 | geral@apda.pt | www.apda.pt

ASSOCIAÇÃO PORTUGUESA DE DISTRIBUIÇÃO E DRENAGEM DE ÁGUAS

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CIÊNCIA ABERTA


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# CIÊNCIA ABERTA

Perfluoroalquilo e Polifluoroalquilo (PFAS) na Água de Consumo Humano “Pretende-se, com este artigo, alertar Vitor Cardoso Supervisor do Laboratório de Química Orgânica da Direção Laboratórios e de Controlo de Qualidade da Água da EPAL

Andreia Videira Técnica de Laboratório no Laboratório de Química Orgânica da Direção Laboratórios e de Controlo de Qualidade da Água da EPAL

Maria João Benoliel Membro da Comissão Especializada de Qualidade da Água da APDA

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as entidades gestoras de sistemas de abastecimento de água para os riscos destas substâncias para a saúde humana, quando presentes na água destinada ao consumo humano, metodologias de análise disponíveis e possíveis processos de tratamento de água.”


Perfluoroalquilo e Polifluoroalquilo (PFAS) na Água de Consumo Humano

O

s PFAS são um grupo de contaminantes que vêm ganhando cada vez mais atenção devido ao seu potencial de bioacumulação e toxicidade, persistência no ambiente, e, para muitos deles, elevada solubilidade na água. Estas substâncias têm sido detetadas a nível mundial em águas superficiais, sedimentos, ar e solo, bem como em animais selvagens

e humanos. Também foram detetados PFAS na água potável, em consequência da contaminação das águas subterrâneas ou superficiais. A proposta da nova Diretiva respeitante a qualidade da água destinada ao consumo humano, uma vez adotada oficialmente, estabelece o valor paramétrico para os PFAS na água destinada ao consumo humano de 0,1 µg/l para a “Soma de PFAS” e de 0,5 µg/l para “PFAS Total”.

Pretende-se, com este artigo, alertar as entidades gestoras de sistemas de abastecimento de água para os riscos destas substâncias para a saúde humana, quando presentes na água destinada ao consumo humano, metodologias de análise disponíveis e possíveis processos de tratamento de água.

1. O que são PFAS? As substâncias perfluoroalquilo e polifluoroalquilo, também REVISTA APDA_ APDA _ 2020

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# CIÊNCIA ABERTA conhecidas como “PFAS”, são uma classe de compostos orgânicos sintéticos formados a partir de cadeias de carbono com flúor ligado a um grupo funcional. Devido às fortes ligações carbono-flúor, os PFAS são um grupo de contaminantes ambientais que têm vindo a ganhar cada vez mais atenção devido ao seu potencial de bioacumulação, persistência ambiental, potencial toxicidade e elevada solubilidade. Até recentemente, os PFAS eram um grupo de produtos químicos conhecido como “produtos químicos perfluorados” ou “PFCs”, sendo que a alteração de nome surgiu para evitar confusão com outro grupo de produtos químicos relevantes para a problemática das alterações climáticas, também conhecidos como “PFCs” (perfluorcarbonetos) (OCDE 2013).

nos diferentes setores industriais são o PFOS - Ácido perfluorooctanossulfónico (CAS nº 1763-23-1) e o PFOA - Ácido perfluorooctanóico (CAS nº 335-67-1). F

F F

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PFOS

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SO3H F

PFOA

A família de compostos, designada pela sigla PFAS divide-se em duas classes, as substâncias perfluoroalquilo e as polifluoroalquilo.

Em 2018, a Organização para a Cooperação e Desenvolvimento Económico OCDE 2018) publicou um relatório em que identifica, à data, a existência de cerca de 4730 substâncias, que fazem parte da grande família dos PFAS.

As substâncias perfluoroalquilo são moléculas totalmente fluoradas, em que todos os átomos de hidrogénio ligados a átomos de carbono foram substituídos por átomos de flúor, exceto os que fazem ligação a grupos funcionais. Os grupos funcionais geralmente são ácidos carboxílicos ou sulfónicos. As substâncias PFOS e PFOA fazem parte desta classe de compostos.

Os compostos mais estudados e utilizados

Por outro lado, as substâncias polifluoroalquilo são

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diferenciadas das substâncias perfluoroalquilo por não serem totalmente fluoradas. Em vez disso, os átomos de carbono também fazem ligações, normalmente, com átomos de hidrogénio e oxigénio. Contudo, para as moléculas fazerem parte da classe de substâncias polifluoroalquilo o número de átomos de carbono totalmente ligados a átomos de flúor tem de ser superior a 2 (ITRC, 2017).

2. Origem Os PFAS são um grupo de compostos químicos usados desde a década de 50, na produção de uma variedade de produtos de utilização doméstica e em aplicações específicas, nomeadamente, utensílios de cozinha antiaderentes; aplicações de proteção de tecidos, móveis e manchas de tapetes; embalagens de comida; utilização na polimerização de fluoropolímeros (por exemplo, PVDF e PTFE politetrafluoretileno); em espuma de combate a incêndio, entre outros. As suas propriedades químicas hidrofóbicas e lipofóbicas permitem, assim,


Perfluoroalquilo e Polifluoroalquilo (PFAS) na Água de Consumo Humano

uma vasta utilização nas mais diversas aplicações. O PFOS era a matéria-prima chave na produção de Scotchgard, um repelente utilizado não só em têxteis, mas também noutras superfícies, ideal como impermeabilizante, produzido pela 3M Company. Atendendo às propriedades repelentes de gordura, óleos e água, o PFOS e também o PFOA são utilizados para a produção de embalagens de produtos alimentares. O PFOS é ainda utilizado como aditivo para espumas de combate a incêndio. Entre as marcas conhecidas, que comercializaram produtos que tinham na sua constituição PFOS, destaca-se a já mencionada 3M Company, a Tefal e o Post-it. O PFOA é utilizado também no processo de produção de fluoroelastómeros e fluoropolímeros, nomeadamente o PTFE.

PFOA, no ambiente e na saúde dos seres vivos, o que eventualmente levou a que, no início do ano 2000, um conjunto de países membros da OCDE (Organização para a Cooperação e Desenvolvimento Económico) começasse a realizar estudos, a fim de apurar as consequências para a saúde e meio ambiente da sua utilização. A Agency for Toxic Substances and Disease Registry (ATSDR, 2018), sumarizou os efeitos que alguns PFAS (PFOS, PFOA, PFHxS - Ácido perfluorohexanossulfónico e PFNA - Ácido perfluorononanóico) podem provocar na saúde, nomeadamente: • Causar problemas no crescimento, aprendizagem e o comportamento de bebés e crianças; • Diminuir a fertilidade da mulher;

• Interferir com as hormonas naturais do corpo (tiroide); • Aumentar os níveis de colesterol; • Causar problemas no sistema imunológico; • Aumentar o risco de cancro; • Diminuição da resposta de anticorpos a vacinas; • Aumento do risco de diagnóstico de asma. A International Agency for Research on Cancer (IARC 2017) indicou o PFOA como possível cancerígeno para os seres humanos (Grupo 2B), e além disso, a EPA (Environmental Protection Agency) classificou o PFOA e o PFOS, como tendo evidências prováveis de potencial carcinogénico em humanos. De acordo com os estudos desenvolvidos por diversas entidades ambientais, foram estabelecidos valores de toxicidade para alguns compostos:

3. Toxicidade No final dos anos 90, começaram a surgir questões relacionadas com os efeitos dos compostos perfluorados, em particular do PFOS e REVISTA APDA_ APDA _ 2020

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# CIÊNCIA ABERTA Tabela 11- Valores de toxicidade para diversos PFAS PFAS

PFOS PFOA PFBS PFBA PFHxS PFHxA PFPeA PFHpA PFDS PFNA PFDA PFUnDA PFDoDA PFTrDA

Valores de Referência de Toxicidade1 0,06 μg/kg 0,025 μg/kg 0,08 mg/kg 0,024 mg/kg 0,004 mg/kg 0,32 mg/kg 0,32 mg/kg 0,025 μg/kg

Valores de Referência Toxicidade/hepático (ng/mL de plasma)2 162 142 1335 1780

125 65 190 70 77 84 91

POD “Point of Departure” Toxicidade Hepatica3 0,025 mg/kg pc/dia 0,06 mg/kg pc/dia 100 mg/kg pc/dia 6 mg/kg pc/dia 1 mg/kg pc/dia 20 mg/kg pc/dia

0,083 mg/kg pc/dia 0,3 mg/kg pc/dia

1 - ANSES, l’Agence Nationale de Sécurité Sanitaire de L’alimentation, de L’environnement et du Travail 2 - Fournier K, Glorennec P, Bonvallot N 3 - Swedish Environmental Protection Agency

Com base nestes valores de referência de toxicidade1,3, dentro da classe dos PFAS, os compostos PFOS e PFOA são os que apresentam maiores valores de toxicidade.

4. Regulamentação nacional e internacional Em 2006, o Canadá incluiu o PFOS na lista de substâncias prioritárias (Priority Substances List) de acordo com o

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Canadian Environmental Protection Act. Em maio de 2009, o PFOS foi considerado como composto orgânico persistente e poluente (Persistent Organic Pollutant - POP) pela Convenção de Estocolmo, sobre Poluentes Orgânicos Persistentes, tendo sido incluído no Anexo B - POPs com usos restritos (mas com a perspectiva de serem eliminados). Portugal aprovou através do Decreto nº 15/2004, de 3 de junho, a

Convenção sobre Poluentes Orgânicos Persistentes (POP), adotada em Estocolmo em 22 de maio de 2001. A EPA (Environmental Protection Agency), em maio de 2016, estabeleceu um Valor Recomendado (Health Advisories - HA) de 70 ng/L, para o PFOA e PFOS individualmente ou combinados, em águas de consumo humano. Este nível de HA oferece uma margem de segurança de forma a


Perfluoroalquilo e Polifluoroalquilo (PFAS) na Água de Consumo Humano

evitar efeitos adversos para a saúde resultantes de uma exposição prolongada ao PFOA e PFOS. A EPA elaborou, em fevereiro de 2019, um plano de ação para os PFAS, sendo descritas 4 etapas fundamentais: 1. Avaliar a necessidade de estabelecer um valor de MCL (Maximum Contamination Level) para o PFOA e para o PFOS; 2. Propor o PFOA e o PFOS como “substâncias perigosas”; 3. Estabelecer recomendações para a descontaminação de águas subterrâneas contaminadas com PFOA e PFOS; 4. Estabelecer valores de toxicidade ou doses orais de referência (RfDs) para os produtos químicos GenX (sal de amónio do dímero do ácido oxidohexafluoropropileno (HFPO-DA)) e ácido perfluorobutanossulfónico (PFBs). Além destas quatro ações prioritárias, a EPA definiu ainda outro conjunto de ações a serem desenvolvidas: 1. Desenvolvimento de novos métodos e ferramentas analíticas para conhecer e avaliar os riscos dos PFAS;

2. Promulgar novas regras de uso dos PFAS, de forma a proteger o meio ambiente e a saúde humana, requerendo a notificação da EPA antes da sua utilização; 3. Usar ações de fiscalização para ajudar a monitorizar o risco de PFAS, quando apropriado. No âmbito da revisão da Diretiva 98/83/EC, de 3 de novembro, a OMS (Organização Mundial de Saúde), em cooperação com a Comissão Europeia, preparou um documento de apoio à revisão do ANEXO I, quer no que respeita aos parâmetros a serem incluídos neste Anexo, quer no que respeita à definição dos Valores Paramétricos (Drinking Water Parameter Cooperation Project Support to the revision of Annex I Council Directive 98/83/EC on the Quality of Water Intended for Human Consumption, de 11 de setembro de 2017). Neste documento, a OMS recomenda que os valores paramétricos (PVs) dos PFOS e PFOA sejam os valores guia (GVs) atualmente recomendados pela OMS, calculados com base no valor de TDI (Tolerable Dose Intake)

para o PFOS de 0,15 µg/kg de peso corporal desenvolvido pela EFSA (European Food Safety Authority), para um adulto de 60 kg e admitindo que 10% do TDI é proveniente da água: Valor Guia de 0,4 µg/L para o PFOS, e Valor Guia de 4,0 µg/L para o PFOA. No que se refere à legislação portuguesa, o Decreto-Lei nº 218/2015, de 7 de outubro, define as normas de qualidade ambiental (NQA) no domínio da política da água, estabelecendo um nível máximo de concentração de PFOS nas águas superficiais interiores de 36 µg/L, com o objetivo de proteger o ambiente e a saúde humana. A proposta da nova Diretiva Europeia relativa à qualidade da água destinada ao consumo humano estabelece no ANEXO I, Parte B, um valor paramétrico de 0,5 µg/L para o “total de PFAS”, e um Valor Paramétrico 0,1 µg/L, para a “soma de PFAS”: • Total de PFAS - totalidade das substâncias perfluoroalquiladas e polifluroalquiladas. Este valor só é aplicável quando forem elaboradas orientações técnicas para a monitorização deste parâmetro, em REVISTA APDA_ APDA _ 2020

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# CIÊNCIA ABERTA conformidade com o artigo 13º, nº 7. Os Estados membros podem decidir um ou ambos os parâmetros “Total de PFAS” ou Soma de “PFAS”; • Soma de PFAS - soma das substâncias perfluoroalquiladas e polifluroalquiladas consideradas preocupantes para a água destinada ao consumo humano, enumeradas no Anexo III, Parte B, ponto 3 (Tabela 2). Trata-se de um subconjunto do total de PFAS que contêm uma fração perfluoroalquilada, com três ou mais átomos de carbono (i.e. - CnF2n-, n≥3) ou numa fração de éter perfluoroalquilado com dois ou mais átomos de carbono (i.e. - CnF2nOCmF2M-, n e m ≥1).

De acordo como artigo 13º, nº 7, até três anos após a entrada em vigor da Diretiva, a Comissão elabora, orientações técnicas sobre os métodos de análise para a monitorização do “total de PFAS” e da “soma do PFAS”, nomeadamente os limites de deteção, os valores paramétricos e a frequência de amostragem.

5. Processos de Tratamento Em 2009 foi realizado um estudo, por Quiflones e Snyder, onde foi analisada a eficácia de remoção de alguns PFAS (por exemplo, PFOS, PFOA e PFHxS) recorrendo a diferentes tipos de tratamento de água convencionais, incluindo

os processos de filtração, ozonização, coagulação/ floculação e cloragem. Concluíram que os processos de tratamento convencionais eram ineficazes na redução de PFAS na água. A EPA (Environmental Protection Agency) publicou em agosto de 2018 uma nota informativa sobre “Reducing PFAS in Drinking Water with Treatmente Technologies”, onde referem a utilização de carvão ativado, a troca iónica e a osmose inversa como etapas de tratamento eficazes na remoção de PFAS em água de consumo humano. Das técnicas referidas, o uso de carvão ativado é o mais estudado para a remoção de PFAS. Esta preferência deve-se à sua capacidade de

Tabela 2 - Lista de PFAS definidos na proposta da nova Diretiva UE sobre qualidade da água destinada ao consumo humano (Anexo III, Parte B, ponto 3) para cálculo da “Soma PFAS” Ácido perfluorohexanossulfónico (PFHxS) Ácido perfluoroheptanossulfónico (PFHpS) Ácido perfluorooctanoanossulfónico (PFOS) Ácido perfluorononanossulfónico (PFNS) Ácido perfluorodecanossulfónico (PFDS) Ácido perfluoroundecanossulfónico (PFUnDS) Ácido perfluorododecanossulfónico (PFDoDS) Ácido perfluorotridecanossulfónico (PFTrDS) Ácido perfluorohexanóico (PFHxA) Ácido perfluoroheptanóico (PFHpA)

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Ácido perfluorooctanóico (PFOA) Ácido perfluorononanóico (PFNA) Ácido perfluorodecanóico (PFDA) Ácido perfluoroundecanóico (PFUnDA) Ácido perfluorododecanóico (PFDoDA) Ácido perfluorotridecanóico (PFTrDA) Ácido perfluorobutanóico (PFBA) Ácido perfluorobutanossulfónico (PFBS) Ácido perfluoropentanóico (PFPA) Ácido perfluoropentanossulfónico (PFPS)


Perfluoroalquilo e Polifluoroalquilo (PFAS) na Água de Consumo Humano

adsorção de contaminantes devido a determinadas características específicas, como elevada porosidade e grande área superficial. Além do mais, é um procedimento substancialmente mais económico, especialmente quando comparado com a osmose inversa. Segundo Thomas Speth (membro da EPA) o carvão ativado pode ser 100% eficaz por um determinado intervalo de tempo, dependendo das características intrínsecas ao carvão (tipo e camada do carvão), e das características operacionais (fluxo de água, temperatura, tipo de matéria orgânica, bem como outros contaminantes ou constituintes da água). Contudo, o carvão ativado funciona bem na remoção de PFAS de cadeia mais longa, como PFOA e PFOS, no entanto, para os PFAS de cadeia mais curtas (quatro ou seis carbonos) a adsorção é menos eficiente (Kucharzyk K.H, Dorlington R.,2017). Existe ainda um outro tipo de tratamento com carvão ativado que envolve a utilização de carvão em pó. Devido ao pequeno tamanho de partícula, este

tipo de carvão pode ser adicionado diretamente à água e depois removido com outras partículas naturais na etapa de filtração. No entanto, apresenta menor eficiência de remoção face ao carvão ativado de maior granulometria. Em seguida é apresentada uma listagem das principais vantagens e desvantagens associadas à utilização de carvão ativado (EurEaU, 2020). Vantagens: • Retém PFAS e outros micropoluentes (pesticidas, solventes); • Fácil instalação; • Não requer dispositivos tecnológicos específicos; • Não tem impacto na corrosão ou agressividade da água. Desvantagens: • Pouco eficiente na remoção de PFAS de cadeia curta; • Diferenças consideráveis na capacidade de adsorção dos vários tipos de carvão comercializados (mineral, vegetal); • Necessária pré-filtração; • Saturação rápida (4-8 meses) para PFAS de cadeia curta; • Necessárias análises periódicas para avaliar o

grau de saturação (EurEaU, 2020). Outra opção de tratamento que também já se mostrou eficaz para esta aplicação envolve a utilização de resinas de troca iónica. As resinas de troca aniónica (carga positiva) são eficazes para remover contaminantes com carga negativa, como os PFAS. Estas resinas demonstraram boa capacidade de remoção de muitos PFAS, no entanto, o custo é superior face ao carvão ativado. A taxa de remoção depende de vários fatores, nomeadamente, da concentração inicial do contaminante, da concentração de outros iões na água a tratar, das especificações do tratamento (ou seja, do fluxo e tamanho das esferas de resina) (EurEaU, 2020). Em seguida, apresenta-se novamente uma pequena listagem das vantagens e desvantagens, desta vez associadas à utilização de resinas de troca iónica. Vantagens: • Retém PFAS incluindo os de cadeia curta e outros poluentes (nitratos); • Material pode ser regenerável no local; REVISTA APDA_ APDA _ 2020

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# CIÊNCIA ABERTA • Fácil aplicação em pequena, média e grande escala. Desvantagens: • Necessário pré-tratamento; • Regeneração limitada; • Necessárias soluções regeneradoras; • Remoção de iões competitivos (nitratos, sulfatos); • Custos mais elevados do que o tratamento por carvão ativado; • Necessárias análises periódicas para avaliar o grau de exaustão (EurEaU, 2020); • Possível impacto na corrosão e agressividade da água.

• Remoção de sais minerais; • Quantidade de resíduos resultantes do processo (EurEaU, 2020); • Impacto na corrosão e agressividade da água; • Custos mais elevados do que o tratamento por carvão ativado.

6. Metodologia de Análise

Vantagens: • Elevada capacidade de retenção de todos os PFAS e outros poluentes (pesticidas, solventes, metais, iões amónia, arsénio); • Fácil aplicação em pequena e média escala;

Nos últimos anos, têm surgido vários métodos que permitem a monitorização de PFAS na água destinada ao de consumo humano e águas naturais, nomeadamente: • Método EPA 537 (Determination of Selected Perfluorinated alkyl acids in Drinking Water by Solid Phase extraction and Liquid Chromatography/Tandem Mass Spectrometry (LC/MS/ MS)). • Norma ISO/DIN 21675 (Water quality - Determination of polyfluorinated alkyl substances (PFAS) in water - Method using solid phase extraction and liquid chromatography-tandem mass spectrometry (LC-MS/ MS)).

Desvantagens: • Elevado consumo de água; • Pré-tratamento necessário;

A metodologia de análise em desenvolvimento no Laboratório da EPAL terá

A osmose inversa tem sido extremamente eficaz na remoção de uma vasta gama de PFAS, incluindo PFAS de cadeia mais curta. Listam-se seguidamente as vantagens e desvantagens associadas à utilização da osmose inversa.

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como referência os métodos referidos anteriormente, nomeadamente a norma ISO/DIN 21675 que monitoriza a maior parte dos compostos referidos na proposta da nova Diretiva relativa à Qualidade da Água destinada ao Consumo Humano. A preparação de amostra passará pela abordagem mais comum para a extração de PFAS, em matrizes aquosas, a extração em fase sólida (SPE), usando resinas de troca aniónica fraca (WAX weak anion exchange). A tecnologia de análise será a cromatografia líquida com deteção por espectrometria de massa em tandem - LC/ MS/MS. A implementação do método de ensaio envolve a avaliação da sensibilidade instrumental e a otimização de diversos parâmetros instrumentais, como é o caso da resolução cromatográfica, da sensibilidade instrumental e de todos os parâmetros que influenciam a seletividade do método de ensaio, de modo a garantir a identificação inequívoca dos PFAS numa amostra de ensaio, evitando o aparecimento de interferências.


Perfluoroalquilo e Polifluoroalquilo (PFAS) na Água de Consumo Humano

Posteriormente, o processo de validação irá envolver estudos de linearidade do método, definição das gamas de trabalho, determinação dos limites de deteção e de quantificação, estudos de precisão em condições de repetibilidade e de precisão intermédia, ensaios de recuperação e estimativa da incerteza expandida do método de ensaio. A análise de PFAS será um grande desafio para o Laboratório de Análises de Água da EPAL, dado que estes compostos estão disseminados pelo meio ambiente devido a serem parte integrante da formulação de materiais poliméricos à base de plástico. É previsto que a implementação e validação deste método de ensaio possa levar entre 1 a 2 anos, não só devido a problemas de contaminações analíticas, mas devido aos limites de quantificação exigidos pela próxima Diretiva Europeia da água de consumo, que obriga à monitorização destes compostos abaixo de 1,5 ng/L, um valor extremamente baixo e que obriga a um rigor e exigência analítica demasiado elevado.

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# CIÊNCIA ABERTA 7. Bibliografia • OECD (2013), OECD/UNEP Global PFC Group, Synthesis paper on per- and polyfluorinated chemicals (PFCs), Environment, Health and Safety Directorate, OECD. Paris, 2013. • OECD (2018), Toward a new comprehensive global database of per- and polyfluoroalkyl substances (PFASs): summary report on updating the OECD 2007 list of per- and polyfluoroalkyl substances (PFASs), Paris, 2018. • ITRC (2017), Naming Conventions and Physical and Chemical Properties of Per- and Polyfluoroalkyl Substances (PFAS), ITRC, EUA, 2017. • International Agency for Research on Cancer. Some Chemicals Used as Solvents and in Polymer Manufacture IARC Monographs on the Evaluation of Carcinogenic Risks to Humans Volume 110; International Agency for Research on Cancer: Lyon, France, 2016. • ATSDR Agency for Toxic Substances and Disease Registry (June 2018), Toxicological Profile for perfluoroalkyls, draft for public comment. • Environmental Protection Agency. US EPA Cross-Agency Coordination of PFAS Activitie, 2017. • Environmental Protection Agency. Drinking Water Health Advisory for Perfluorooctanoic Acid (PFOA); EPA Document Number: 822-R-16-005; US Environmental Protection Agency Office of Water (4304T) Health and Ecological Criteria Division: Washington, DC, USA, 2016. • Environmental Protection Agency. Drinking Water Health Advisory for Perfluorooctane Sulfonate (PFOS); EPA Document Number: 822-R-16-004; US Environmental Protection Agency Office of Water (4304T) Health and Ecological Criteria Division: Washington, DC, USA, 2016. • Environmental Protection Agency. Human Health Toxicity Values for Hexafluoropropylene Oxide (HFPO) Dimer Acid and Its Ammonium Salt (CASRN 13252-13-6 and CASRN 62037-80-3) Also Known as “GenX Chemicals”; EPA Document Number: 823-P-18-001; US Environmental Protection Agency Office of Water (4304T) Health and Ecological Criteria Division: Washington, DC, USA, 2018. • ANSES Aviso de l’Agence Nationale de Sécurité Sanitaire de L’alimentation, de L’environnement et du Travail nº 2015-SA-0105, 2017. • Fournier K, Glorennec P, Bonvallot N. Construction de valeurs toxicologiques de Référemce adaptées à la e prise en compte des mélanges en évaluation des risques sanitaires: méthodes existantes et applications récentes. Environ Risque Sante 2014; 13: 203-21. • Borg, D. and Hakansson, H. Environmental and Health Risk Assessment of Perfluoroalkylated and Polyfluoroalkylated Substances (PFASs) in Sweden, Swedish Environmental Protection Agency, 2012. • Quinones, O. Snyder, S. A. Occurrence of Perfluoroalkyl Carboxylates and Sulfonates in Drinking Water Utilities and Related Waters from the United States. Environmental Science & Technology, 43, 9089-9095, 2009. • Reducing PFAS in Drinking Water with Treatment Technologies, EPA, 23 agosto, 2018. • European Federation of National Associations of Water Services (EurEaU). Briefing Note PFAS and

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Perfluoroalquilo e Polifluoroalquilo (PFAS) na Água de Consumo Humano

Drinking Water, draft, 2020. • Kucharzyk K.H, Dorlington R., Benatti M. and Deeb R., Novel treatment technologies for PFAS compounds: A critical review; Journal of Environmental Management, 204, Part 2, 757-764, 2017. • EPA 537:2009 (Determination of Selected Perfluorinated alkyl acids in Drinking Water by Solid Phase extraction and Liquid Chromatography/Tandem Mass Spectrometry (LC/MS/MS)). • ISO/DIN 21675:2018 (Water Quality - Determination of polyfluorinated alkyl substances (PFAS) in water - Method using solid phase extraction and liquid chromatography-tandem mass spectrometry (LC-MS/MS)).

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QUADRO LEGAL

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# QUADRO LEGAL

LEGISLAÇÃO PORTUGUESA 86

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LEGISLAÇÃO PORTUGUESA

Resolução do Conselho de Ministros n.º 52/2020, de 1 de julho Determina a fixação de prazos para a conclusão dos procedimentos referentes ao programa de regularização extraordinária dos vínculos precários na Administração Pública. Resolução do Conselho de Ministros n.º 54/2020, de 23 de julho Renova, por um período de três anos, o mandato do Professor Doutor Filipe Duarte Santos como presidente do Conselho Nacional do Ambiente e do Desenvolvimento Sustentável com efeitos a partir de 25 de julho de 2020. Resolução do Conselho de Ministros n.º 55/2020, de 31 de julho Aprova a Estratégia para a Inovação e Modernização do Estado e da Administração Pública 2020 - 2023. Lei n.º 35/2020, de 13 de agosto Altera as regras sobre endividamento das autarquias locais para os anos de 2020 e 2021 e prorroga o prazo do regime excecional de medidas aplicáveis às

autarquias locais, no âmbito da pandemia da doença COVID-19, procedendo à segunda alteração às Leis n.os 4-B/2020, de 6 de abril, e 6/2020, de 10 de abril. Lei n.º 37/2020, de 17 de agosto Primeira alteração, por apreciação parlamentar, ao Decreto-Lei n.º 27/2020, de 17 de junho, que altera a orgânica das comissões de coordenação e desenvolvimento regional.

Resolução do Conselho de Ministros n.º 72/2020, de 16 de setembro Delega no membro do Governo responsável pela área do ambiente a competência para homologação das propostas de delimitação do domínio público hídrico.

Lei n.º 48/2020, de 24 de agosto* Altera o Código do IRS e a Lei n.º 119/2019, de 18 de setembro. (*Retificada pela Declaração de Retificação n.º 34/2020, de 1 de setembro). Decreto-Lei n.º 64/2020, de 10 de setembro Estabelece disposições em matéria de eficiência energética, transpondo a Diretiva (EU) 2018/2002, do Parlamento Europeu e do Conselho, de 11 de dezembro de 2018.

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# QUADRO LEGAL

LEGISLAÇÃO COMUNITÁRIA

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LEGISLAÇÃO comunitária

Decisão de Execução (UE) 2020/1073, da Comissão, de 17 de julho Concede uma derrogação solicitada pelos Países Baixos, nos termos da Diretiva 91/676/ CEE, do Conselho, relativa à proteção das águas contra a poluição causada por nitratos de origem agrícola (JO, L234, de 2020/07/21). Decisão de Execução (UE) 2020/1074, da Comissão, de 17 de julho Concede uma derrogação solicitada pela Dinamarca, nos termos da Diretiva 91/676/ CEE, do Conselho, relativa à proteção das águas contra a poluição causada por nitratos de origem agrícola (JO, L234, de 2020/07/21).

Decisão de Execução (UE) 2020/1161, da Comissão, de 4 de agosto Estabelece uma lista de vigilância das substâncias a monitorizar a nível da União no domínio da água, nos termos da Diretiva 2008/105/ CE, do Parlamento Europeu e do Conselho [notificada com o número C(2020) 5205] (JO, L257, de 2020/08/06). Regulamento de Execução (UE) 2020/1294, da Comissão, de 15 de setembro Relativo ao mecanismo de financiamento da energia renovável da União (JO, L303, de 2020/09/17).

Regulamento (UE) 2020/1054, do Parlamento Europeu e do Conselho, de 15 de julho Altera o Regulamento (CE) n.º 561/2006, no que diz respeito aos requisitos mínimos em matéria de tempos máximos de condução diária e semanal, à duração mínima de pausas e dos períodos de repouso diário e semanal, e o Regulamento (EU) n.º 165/2014, no que diz respeito ao posicionamento por meio de tacógrafos (JO, L249, de 2020/07/31). REVISTA APDA_ APDA _ 2020

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EVENTOS


S

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# EVENTOS Eventos APDA Ciclo de Webinars: Conversas Com Tema - O Setor da Água em Movimento Os Novos Desafios do Saneamento APDA | Comissão Especializada de Águas Residuais Data: 4 de novembro 2020 A Cibersegurança no Setor da Água - Uma responsabilidade de todos APDA | Comissão Especializada de Sistemas de Informação Data: 13 novembro 2020

eventos

A Pandemia COVID-19 e os Serviços de Abastecimento de Água APDA | Comissão Especializada de Qualidade da Água Data: 20 novembro 2020

Para mais informações www.apda.pt

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Vulnerabilidade do Recurso Água em Eventos Extremos APDA | Comissão Especializada de Adaptação às Alterações Climáticas Data: 4 dezembro 2020 Inovar o Setor da Água numa Perspetiva de Economia Circular APDA | Grupo de Trabalho de Economia Circular Data: 11 dezembro 2020 Data: 29 outubro 2020


APDA, NACIONAIS E INTERNACIONAIS

Eventos nacionais Encontro de Operação de Infraestruturas e Manutenção 2020 AQUASIS Formato digital Data: 15 dezembro 2020 Manhãs da APEMETA | Reutilização de Água APEMETA Formato digital Data: janeiro-fevereiro 2021 15.º Congresso da Água APRH Local: Lisboa Data: 22-26 março 2021

Eventos INTERnacionais Pré-Conferências da 2nd International Conference on “Water, Megacities and Global Change” UNESCO Formato digital Data: 7-11 dezembro 2020 2020 Water Knowledge Europe Brokerage Event Water Europe Formato digital Data: 9-15 dezembro 2020 World Water-Tech Innovation Summit Virtual 2021 Rethink Events Ltd Formato digital Data: 23-24 fevereiro 2021 Congresso Smallwat21v - Wastewater in Small Communites Interreg Espanha - Portugal | Fundo Europeu de Desenvolvimento Regional Local: Sevilha, Espanha (com componente digital) Data: 25-26 março 2021

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O Programa Nacional de Investimentos 2030 (PNI 2030) materializa os investimentos estruturantes de promoção pública ou de promoção privada enquadrados em políticas públicas de 2021 a 2030. Trata-se de um programa multissetorial e que tem por base a articulação com outros instrumentos estratégicos e de planeamento. O PNI 2030 tem como desígnios estratégicos a Coesão, a Competitividade e Inovação e a Sustentabilidade e Ação Climática. Inclui, portanto, os principais investimentos em infraestruturas e equipamentos a realizar entre 2021 e 2030, em Portugal Continental, em 4 áreas temáticas: Transportes e Mobilidade, Ambiente, Energia e Regadio.

TRANSPORTES E MOBILIDADE Mobilidade e Transportes Públicos

Número de Projetos e Programas

Investimento

9

5825 M€

Ferrovia

16

10510 M€

Rodovia

8

1980 M€

Aeroportuário

4

1257 M€

Marítimo-Portuário

8

2088 M€

45

21660 M€

TOTAL Investimento Público

17694 M€

Investimento Privado

3966 M€

ENERGIA

Número de Projetos e Programas

Investimento

Redes de Energia

5

1960 M€

Reforço de Produção de Energia

5

9100 M€

Eficiência Energética

2

2000 M€

12

13060 M€

TOTAL Investimento Público

724 M€

Investimento Privado

12336 M€

5 EIXOS ESTRATÉGICOS Acessibilidade equitativa

Conectividade alargada

Mobilidade inteligente Mobilidade sustentável e neutralidade carbónica Infraestruturas e equipamentos resilientes

3 EIXOS ESTRATÉGICOS

Neutralidade carbónica Infraestruturas e equipamentos resilientes Sistemas Inteligentes

INFOGRAFIA Versão apresentada a 22 de outubro de 2020


AMBIENTE

Número de Programas

5 EIXOS ESTRATÉGICOS

Investimento

Ciclo Urbano da Água

5

2000 M€

Gestão de Resíduos

2

758 M€

Proteção do Litoral

3

800 M€

Passivos Ambientais

1

130 M€

Gestão de Recursos Hídricos

3

1310 M€

Gestão de Efl. Agropecuários e Agroindustriais

3

400 M€

Recursos e capital natural

Conservação da Natureza e Biodiversidade

3

320 M€

Florestas

4

1400 M€

Infraestruturas ambientais resilientes

Recursos Marinhos

3

300 M€

27

7418 M€

TOTAL Investimento Público

6901 M€

Investimento Privado

517 M€

Neutralidade carbónica

Adaptação do território

Economia circular

Entidade Promotora

Investimento

AP | SEE

480 M€

2021 - 2030

AP | SEE

724 M€

2021 - 2030

AP | SEE

109 M€

2021 - 2030

CUA4 melhorar a qualidade das massas de água

AP | SEE

483 M€

2021 - 2030

CUA5 Descarbonização do setor da água e de adaptação às alterações

AP | SEE

204 M€

2021 - 2030

AMBIENTE - CICLO URBANO DA ÁGUA CUA1

Promoção da renovação de ativos Aumento da resiliência dos sistemas de abastecimento público

CUA2 de água, de saneamento de águas residuais e de drenagem de

Eixos Estratégicos

Período

águas pluviais

CUA3 Promoção da transição para a economia circular no setor da água

Eficiência da recolha e tratamento de águas residuais para

climáticas

TOTAL

2000 M€

REGADIO TOTAL (Investimento Público)

Número de Projetos e Programas 2

Investimento

750 M€

3 EIXOS ESTRATÉGICOS Adaptação do território

Recursos e capital natural Infraestruturas e equipamentos resilientes Fonte: https://www.portugal.gov.pt/pt/gc22/comunicacao/documento?i=apresentacao-do-programa-nacional-de-investimentos-para-2030


ASSOCIAÇÃO PORTUGUESA DE DISTRIBUIÇÃO E DRENAGEM DE ÁGUAS


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