TCC - Da escrita ao Webtoon

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PROJETO DE CRIAÇÃO DE MUNDO E ESTUDOS DE LINGUAGENS GRÁFICAS

@_beinq STEFANY ARAÚJO DA SILVA


1. “Um ser simbólico” (releitura de DONALDSON, 2008)


"Quem diz história diz, com feito, escrita. Enquanto não existe escrita, enquanto ela permanece indecifrável, somos arqueólogos ou pré-historiadores. Falta-nos aquela circulação de ideias, imagens, narrativas e genealogias por meio das quais [...] (os seres humanos), de uma certa maneira, inventaram a si mesmos" (BOTTÉRO, 2011, p. 16).


Elaborada pelo sistema de geração automática de ficha catalográfica do Centro Universitário Senac São Paulo com dados fornecidos pelo autor(a). da Silva, Stefany Araújo Da Escrita Ao Webtoon / Stefany Araújo da Silva - São Paulo (SP), 2020. 122 f.: il. color. Orientador(a): Professor Dr. Anderson Silva, Professora Ma. Beatriz Blanco Trabalho de Conclusão de Curso (Bacharelado em Design Gráfico) Centro Universitário Senac, São Paulo, 2020. 1. Design 2. Linguagem 3. Escrita 4. Webtoon 5. Narrativa I. Silva, Professor Dr. Anderson (Orient.) II. Blanco, Professora Ma. Beatriz (Orient.) III. Título


PROJETO DE CRIAÇÃO DE MUNDO E ESTUDOS DE LINGUAGENS GRÁFICAS

Trabalho de conclusão de curso apresentado ao Centro Universitário SENAC - Santo Amaro, como exigência parcial para obtenção do grau em Bacharel em Design Gráfico. Orientadores: Prof. Dr. Anderson Silva, Prof. Beatriz Blanco.

Stefany Araújo da Silva.

São Paulo, 2020.


AGRADECIMENTOS


Sou grata, À minha mãe, que propiciou conforto, cedeu tempo e espaço para que eu pudesse me dedicar inteiramente a este trabalho de grande importância. À minha prima, Amanda, por ter me apoiado, me insentivado e estado disponível nas horas boas e nos momentos dificeis. Aos professores Anderson Silva, Tadeu Costa e Beatriz Blanco, pelas orientações valiosas. Ao Centro Universitário Unidas de forma geral.

Senac

Nações


RESUMO


O presente trabalho visa produzir uma webtoon, desde o processo de construção da narrativa até a arte final, utilizando metodologias híbridas de projeto de design, narrativa para quadrinhos e arte para webtoon, onde a proposta para o roteiro é idealizada para ilustrar sociedades e o uso da comunicação visual (escrita e outros símbolos).

PALAVRAS-CHAVE 1. Design 2. Linguagem 3. Escrita 4. Webtoon 5. Narrativa


SUMÁRIO


1. OBJETIVOS

2. JUSTIFICATIVA

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3. PROCEDIMENTOS 14 METODOLÓGICOS

4. FUNDAMENTOS TEÓRICOS

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5. O PROJETO

Introdução

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Abordagem

71

Comunicação Visual

20

Nível 1: Teorização

72

Sistemas de Escrita

25

Nível 2: Problematização 74

Proto-escritas

31

Primeiras Grafias

32

RESULTADOS DE PESQUISA

Mesopotâmia e o Cuneiforme

32

1ª Etapa: Problema e Definição do Problema 74

A Escrita Chinesa

34

2ª Etapa: Componentes 75 do problema

Escritas Egípcias

38

A Escrita Tifinagh

70

74

40

3ª Etapa: Coleta de Dados e 4ª Etapa: Análise dos Dados

75

Escritas Norte-Semíticas

42

Nível 3: Criação

78

Escritas de Creta (Linear A e Linear B)

44

5ª Etapa: Criatividade

78

O Alfabeto Grego

46

Mapa da Narrativa

78

O Alfabeto Latino

48

Construção de Personagens

80

A Escrita Coreana (Hangul)

50

Conteúdo para a bíblia da produção

82

Os Tipos Móveis

52

Sistemas de Escritas Ficcionais

85

Da Escrita Analógica à Digital

53

Jornada/Arco da protagonista

94

Características Estruturais das HQs

55

Script do Ep. Piloto (Prólogo, Protótipo)

95

Estilo e Linguagem Visual das HQs

56

Storyboard

97

O Que É HQs

58

Naming e Logo

98

Quadrinhos Digitais

60

Nível 4: Experimentação 100

Os Webtoons Coreanos

Nível 5: Prototipação

104

6. MEMORIAL DESCRITIVO

108

108

61

Metodologia Narrativa 65 Criação de Personagens

65

A Jornada ou Arco da personagem

66

Repertório e Influências

Estrutura da História

66

O Logo (Conceito, Malha e Aplicações

110

Script: o Formato Narrativo para HQs

68

Paleta Cromática

112

69

Formatação para Webtoon

113

Metodologia de Projeto de Design

7. CONSIDERAÇÕES FINAIS 116

8. REFERÊNCIAS

118

9. LISTA DE IMAGENS

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OBJETIVOS

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1.1. OBJETIVO GERAL Projetar uma webtoon a partir de uma proposta de roteiro idealizado para ilustrar sociedades e o uso ou da falta da comunicação visual através de símbolos e de escrita.

1.2. OBJETIVOS ESPECÍFICOS 1. Identificar as origens da comunicação visual e seus impactos sociais; 2. Explorar e comparar a evolução e o uso da escrita em diferentes sociedades; 3. Estudar estilo e linguagem visual dos quadrinhos buscando relações com linguagens visuais primitivas e com conceitos de sistemas de escrita; 4. Pesquisar sobre a história dos quadrinhos, o surgimento e a estrutura dos webtoons comparado aos quadrinhos tradicionais; 5. Estudar metodologias de criação de quadrinhos, webtoon e projeto de design.

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JUSTIFICATIVA

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Hoje, a criação de imagens acontece a todo momento por várias partes do mundo, graças ao acesso à tecnologia digital. Qualquer pessoa com um smartphone é equipada com infinitas possibilidades de criação de imagem com um grande potencial de alcance de público no mundo todo.

Grande parte das pesquisas acerca da relação do design com história em quadrinhos possuem como base aspectos editoriais para impressão, conceitos e elementos básicos, relativos a composição de peças gráficas do design e das histórias em quadrinhos tradicionais. Apesar de já ter se passado duas décadas de existência da publicação “Reinventando Quadrinhos” de Scott McCould, pouco ainda se discute a respeito dos quadrinhos digitais, menos ainda sobre webtoon, as webcomics que se desvincularam do formato dos tradicionais para se adequar às novas técnologias e hábitos de consumo.

Historicamente, os quadrinhos são uma arte democratizante no sentido de leitura, possibilitado pela junção da escrita com a imagem, e é cada dia mais democratizante no sentido da produção também, graças aos avanços tecnológicos e a maior disponibilidade de computadores e dispositivos móveis, que facilitam na criação de imagens.

Este gênero vem ganhando cada vez mais espaço na mídia, com adaptações sendo feitas para plataformas de streaming como a Netflix (o live action de “Sweet Home” e a série “All of Us Are Dead“), e produtoras de anime como a Crunchyroll (”Tower of God”), até mesmo adaptações para jogos de RPG (“Hero Cantare”), pegando carona também com o fenômeno do K-pop, o sucesso da banda BTS, e ídolos musicais que divulgam parcerias com produtores de webtoons (”Save Me”). A Coréia também vem se destacando na categoria cinema, como demonstra Parasita, o longa-metragem que conquistou o Oscar de melhor filme de 2020, o primeiro de língua não-inglesa a vencer essa categoria (MASSAROLO, 2020).

A importância da imagem se dá na medida em que esta está presente no nosso dia a dia. De acordo com Dondis (1997, p.14 apud Koestler em The Art of Creation) o próprio “[...] pensamento por conceitos surgiu do pensamento por imagens através do lento desenvolvimento dos poderes de abstração e de simbolização […]”. Dondis completa que, a cada novo passo na evolução da criação de imagens deve ter como propósito o avanço para a comunicação cada vez mais eficiente, e que “[...] há inúmeros indícios de que está em curso uma reversão desse processo que se volta mais uma vez para a imagem […]”. As produções gráficas, com o intuito de comunicar algo visualmente, eram basicamente pictogramas, que parecem ter, de certa maneira, retornado para os dias de hoje, com o estilo abstrato dos cartoons e o uso de emojis e memes na Internet, além da linguagem iconográfica de interfaces digitais. O que mostra que conhecer o passado é uma forma de vislumbrar um futuro. E este passado está no surgimento do registro visual da informação (MEGGS, 2012, p. 26).

De acordo com Dondis (1997, p. 2), assim como os meios de produção da escrita e das artes visuais foram evoluindo, o mesmo “[...] deve ocorrer com todas as capacidades humanas envolvidas na pré-visualização, no planejamento, no desenho e na criação de objetos visuais […]”, desde a fabricação de ferramentas e instrumentos, até o surgimento de novas profissões e novos símbolos. A criação de imagens, exclusiva para talentosos artistas no passado, fica cada vez mais democratizada.

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PROCEDIMENTOS METODOLÓGICOS

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3.1. METODOLOGIA DE PESQUISA Pesquisa teórica qualitativa e bibliográfica, de caráter descritivo e natureza aplicada, sobre a história da comunicação visual para a base teórica do projeto de design. Considerando os livros sobre o tema, bem como artigos, materiais multimídia, entre outros, para suas ramificações.

3.2. METODOLOGIA DO PROJETO Tendo em base as metodologias de produção de história em quadrinhos encontradas em Eisner (2010) e Shmidt (2018), juntamente com as novas técnicas utilizadas para criar webtoons disponibilizadas nas plataformas do LINE webtoon e materiais de criadores disponibilizados em redes sociais, busca-se aplicar uma metodologia híbrida de projeto de design, onde o processo escolhido, uma metodologia aberta criada pelo designer e teórico Bruno Munari, possa ser efetivo na concepção de uma webtoon, como um produto de design e uma história em quadrinho digital para web estilo cartoon coreano.

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FUNDAMENTOS TEÓRICOS

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INTRODUÇÃO Apesar da forma dos quadrinhos impressos que conhecemos hoje só ter sido possível após o advento da prensa — tecnologia que ampliou o acesso à informação, dando início ao renascimento e à alfabetização massiva de pessoas — com a criação dos tipos móveis, modificando as formas gráficas da milenar arte caligráfica (MCCLOUD, 1995 e 2006).

Com base em teóricos como Donis Dondis (1997), Philip Meggs (2012), Scott McCloud (1995 e 2006) e Bringhurst (2006), a milhares de anos atrás, surgiram as primeiras escritas, que se originaram da pictografica arte rupestre, desenho que imita a forma do objeto de maneira realista (icônica) ou abstrata (estilizada). Os pictogramas se ramificaram em duas direções generalizadas: a da imagem (desenho figurativo) e a da escrita (simbólica, codificada).

Mas a caligrafia e outros métodos menos automatizados e mais organicamente artísticos ainda encontram maneiras de se fazerem presente no nosso quotidiano. A exemplo, temos, na sociedade urbana, na cultura de rua, o pixo e o graffitti. ambos são dois tipos de expressão da cultura hip-hop. Ao viajar por São Paulo do extremo sul ao centro, é impossível não notar o predomínio das pichações nas paredes das casas, edifícios, comércios, pontes e muros. Elas estão presentes em todas as regiões da cidade e fazem parte da estética e da cultura urbana, juntamente com outras manifestações artísticas como murais e lambe-lambes ou stickers (adesivos).

Os elementos básicos para o design, bem como para os quadrinhos, são, em essência, a escrita e a imagem. Mais uma vez, vivenciamos atualmente um crescente uso das imagens figurativas na comunicação. Conforme Sampson, as escritas semasiográficas — cujos caracteres não representam a língua falada — vêm ganhando aplicações cada vez mais sofisticadas. A exemplo de manuais de instrução, placas de sinalização, a comunicação em redes sociais (uso de memes e emojis), íconografia de interfaces digitais e HQs. A pictografia (iconografia, imagem figurativa), históricamente, representa o princípio de uma tentativa de registro visual de informação e, sobretudo, o surgimento da própria escrita.

Tanto os grafiteiros quanto os pichadores utilizam o suporte mural de forma particular e distinguem-se pelo modo como se servem das vias de comunicação. Têm em comum a ação não-autorizada, a realização em logradouros públicos, a pintura (grafite) e as inscrições (pichação) com tinta aerossol. Como as demais expressões artísticas do hip-hop, o grafite e a pichação unem arte e mensagem, criação e função.

A imagem figurativa em forma de desenho, pintura ou escultura, permitiu que o conhecimento pudesse ser levado aos analfabetos. Já a escrita possibilitou a organização de civilizações inteiras. Os meios visuais mais antigos e eficazes de armazenar informações coletivamente e que vem evoluindo com o tempo, desde a arte rupestres, passando pela prensa com os tipos móveis até recentemente com a internet e seus hiperlinks. Ambas constituem características elementares na construção de peças gráficas em design e em HQs.

— (SAMPAIO, 2009, p. 258)

Os pixos não são feitos para agradar, muito pelo contrário. Os pichadores não estão preocupados com estéticas e padrões vigentes da sociedade, ou melhor dizendo, com o que é do gosto popular ou comercial. Mas eles carregam a sua própria codificação, a sua própria padronização, dentro da sua cultura.

Figuras e palavras são complementares em suas funçoes e utilizadas em conjunto para construir narrativas. Artes sequenciais podem ser encontradas em ruínas de civilizações antigas juntamente com as proto-escritas.

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2. Grafite e pichação (referência em SAMPAIO, 2009, p. 259).

Atualmente, a pichação é uma manifestação de pessoas que, geralmente, vivem em subúrbios e experienciam diariamente a desigualdade e a exclusão social. Essa forma de escrita ou marcação como forma de manifestação urbana ganhou espaço em Paris nos movimentos revolucionários em 1968. O graffiti surge também em Nova Iorque, como marcação de território dos moradores dos guetos a partir dos anos 60, e no Brasil, como forma de protesto contra a ditadura nos anos 60, ganhando formas mais artísticamente variadas a partir do de 1978. Diversas civilizações desenvolveram tecnologias similares em lugares afastados uns dos outros. Mas há indícios de que haviam escritas nos muros de Pompéia, a cidade Italiana soterrada pelo Vesúvio em 79 d.C. onde haviam poesias, manifestações políticas e anúncios de eventos. Mas os exemplos mais antigos são pré-históricos. As pinturas rupestres “representando caçadas e cenas da vida quotidiana nas cavernas, ou com petróglifos com sinais abstratos ou figurativos (SAMPAIO, 2009, p. 258).

ato de registrar visualmente o pensamento em muros. Trouxe a tona questões de como surgiu a escrita, como ela evoluiu ao longo do tempo, quais foram e quais são seus usos e como ela contribui para o conhecimento da humanidade sobre o mundo e sobre si mesma. Desde meados do final do século XX, a era digital vem mudando nossas formas de se comunicar. A forma de fazer HQs e design vem se transformando constantemente. A exemplo do webtoon, formato de HQ digital mais recente e adequado às telas de dispositivos móveis (smartphones). É uma mídia híbrida que se apropriou de métodos da antecessora analógica e, de uma forma ou de outra, do design de interface e experiência do usuário, para se adequar aos novos suportes tecnológicos, novos hábitos e formas de leitura, e vem ganhando cada vez mais espaço globalmente através da Internet (CHO, 2016). Esta pesquisa permitiu identificar e investigar como o domínio de meios de comunicação visual pode significar poder de influência, controle e até de manipulação, implicando em um resgate ou esquecimento de informação. Questões que serviram de base temática na criação da narrativa da webtoon, produto final deste presente trabalho de conclusão de curso.

Para alguns estudiosos, os grafitti são o primeiro ato da hominização e conheceram uma longa história em que se destacam os grafitti de conteúdo: os que trazem uma mensagem política, marca uma insubmissão. Uma típica cultura de rua. — (SAMPAIO, 2009, p. 258) .

A história da escrita nos permite pensar sobre qual é o papel da humanidade e de suas criações. A escrita, como instrumento, serviu como uma extensão do pensar e do fazer, influenciando a jornada da humanidade na história. Esta que só foi possível de ser registrada e conhecida na posteridade graças a escrita. Ela continua a se transformar, e a nos transformar, a cada mensagem trocada, a cada postagem, a cada nova palavra inventada e que também nos reinventa, analógica ou digitalmente.

As pichações contemporâneas possuem traços característicos que lembram letreiros de bandas de rock/metal dos anos 80, que por sua vez remetem às runas. Também apresentam similaridades com outras formas de escritas arcaicas como a fenícia. Além de possuírem uma estética que lembram grafias antigas, também remetem ao mundo antigo o próprio

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COMUNICAÇÃO VISUAL

Comunicação visual é a resposta a uma necessidade humana, tanto prática quanto trivial, ou auto-expressiva. Sua motivação é a transmissão de informação. Segundo Dondis (1997, p. 183), “A maior parte do material visual produzido diz respeito unicamente à necessidade de registrar, preservar, reproduzir e identificar pessoas, lugares, objetos ou classes de dados visuais.” Seja qual for a configuração do meio de comunicação visual, nele está presente algum tipo de informação. Suas maneiras de servir a sociedade são fluidas, mas todas as formas de comunicação visual tem a capacidade de informar “[...] sobre si mesma e seu próprio mundo, ou ainda sobre outros tempos e lugares, distantes e desconhecidos.” Esta é a característica universal dos vários formatos visuais, que variam dos mais acessíveis aos mais específicos, como o gesto, a expressão, a linguagem escrita, a simbolização, as artes e ofícios visuais como o desenho, fotografia, pintura, escultura, arquitetura e o design (DONDIS, 1997, p. 184, 188-189).

Mas por que estudar comunicação? [...] os fenômenos comunicacionais manifestam-se de modo tão impregnante e permanente na vida e sobrevivência do homem que seria perfeitamente legítimo inverter o sentido da indagação: por que não estudar comunicação? De fato a comunicação se coloca no centro da civilização. A história humana só possui um significado porque as nossas experiências são estocadas por processos de acumulação e superação, mas sobretudo porque são comunicáveis. [...] Por conseguinte, É a partir do momento em que (o ser humano) inicia a manipulação simbólica de seu ambiente e de si mesmo, é a partir do instante em que a linguagem e a comunicação — o que implica convivência social e intercâmbio cultural — permitem-lhe a criação de sistemas de ação altamente complexos e variados, é a partir daí que [...] (o ser humano) se torna verdadeiramente humano. Foi, sem dúvida, esse fato que levou o criador da Cibernética a afirmar que ‘o interesse humano pela linguagem parece ser um interesse inato por codificar e decifrar, e parece ser quase tão especificamente humano quanto possa ser qualquer interesse’. [...] Assim, no lento processo de hominização, a espécie desenvolveu pelo menos as três seguintes características que a distinguem das demais: 1) a sua capacidade de raciocínio abstrato, isto é, o desenvolvimento do pensamento hipotético-dedutivo; 2) a sua capacidade técnica, ou seja, a habilidade de confeccionar e usar instrumentos ou artefatos; e 3) a sua capacidade de comunicação através de símbolos, especialmente por meio da linguagem. Além disso, como na humanidade tudo parece girar em torno de sua sobrevivência e de melhores condições de relacionamento entre as pessoas, todos os problemas científicos e tecnológicos, a saber, as questões teóricas e pragmáticas com que nos defrontamos são a muitos respeitos problemas de comunicação.”

Design é a arte de encontrar e propor soluções funcionais para um problema, proposto, que resulta de uma necessidade para melhorar a qualidade de vida, utilizando metodologias de projeto e a criatividade (MUNARI, 2008, p. 29). A prototipação é uma etapa do processo de criação que permite a visualização da ideia antes da concepção final, abrindo caminhos para insights e melhorias. O desenho, também conhecido como esboço, rascunho, croqui, sketch, storyboard, wireframe, variando de termo de acordo com a disciplina projetual que o utiliza, auxilia nessa tarefa de criação. De acordo com Dondis (1997, p. 207), “ O esboço gráfico é auto descritivo; é uma representação em miniatura do produto final. As pequenas dimensões desse esboço, oferecem ao designer ”[…] o controle total do conjunto através desse método de pré-visualização [...]”.

— (SÁ, 1973, p. 10)

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Já o design gráfico, de acordo com Dondis (1997, p. 20- 207), encontra e propõe “[...] resultados sólidos e dinâmicos, tanto em termos de eficácia na comunicação, quanto na criação de um produto mais atraente” e “[...] sua natureza básica se define por sua combinação do verbal e do visual, numa tentativa de transmitir informações.” O design gráfico da maneira que conhecemos hoje, só surgiu durante a Segunda Revolução Industrial do século XIX, “[...] quando a sofisticação das técnicas de impressão e de confecção de papéis permitiu a criação de efeitos decorativos mais criativos na manipulação do texto e das ilustrações.”

O desenvolvimento da escrita e da linguagem visível teve suas primeiras origens em figuras simples. Existe uma estreita conexão entre o desenho de figuras e a marcação de escrita. Ambas são formas de comunicar idéias, e as pessoas, antigamente, usavam imagens como uma maneira elementar de registrar e transmitir informações. — (MEGGS, 2012, p. 26) (Traduzido pela autora).

A mais de cinco mil anos atrás, o ser humano passou a desenhar figuras, e estas se divergiram a dois pontos: a escrita codificada e o desenho figurativo, permitindo armazenar informação, compartilhar ideias e projetar (MCCLOUD, 1995, p. 46-48). Além de marcar o início de uma ordem civilizatória na sociedade e a transição da cultura oral para a escrita. A forma das letras do alfabeto que usamos na língua portuguesa não possui, de maneira intencional, relação com os sons que elas representam e não são dotadas de significado de forma individual. São apenas parte de um quebra-cabeça no qual é preciso juntar as peças de forma coerente para produzir um significado. Para isso, a ortografia e a gramática são indispensáveis na construção lógica e convencional de mensagens (DONALDSON, 2008, p. 13-17).

Na descrição de Meggs (2012, p. 441-442), o design gráfico como conhecemos hoje, teve seus primórdios em meados do século XV, com o desenvolvimento dos tipos móveis e o início da produção em série de materiais impressos. A demanda de manufaturas aumentou conforme o crescimento urbano nas grandes cidades, o que levou a maiores investimentos em máquinas de produção em massa, dando início a Revolução Industrial no século XIX, resultando no aumento da disponibilidade de produtos e na redução dos custos, onde culminou no capitalismo. O maior poder de compra estimulou melhorias tecnológicas, tornando a oferta e procura de produtos em um ciclo onde o marketing se tornou um importante elemento competitivo de venda para os fabricantes. A comunicação gráfica se tornou ainda mais importante durante este período, aumentando a produção de materiais impressos, onde a figura do designer gráfico se fez presente para solucionar problemas de comunicação de produtos vendidos em massa.

Alguns teóricos acreditam que a fala parece ter surgido naturalmente. A biologia humana parece ter desenhado a laringe, o diafragma, cordas vocais, línguas e lábios propriamente para desenvolver a fala. Esse é um dos principais aspectos que diferem o ser humano de outros animais (DONALDSON, 2008, p. 13). Foi através dela que culturas, mitos e lendas foram construídos. [...] para o filósofo alemão (Ernst Cassirer, no seu belíssimo ‘An Essay on Man’ [1944]) desde que [...] (o ser humano) logrou ultrapassar os limites da vida orgânica, já não vive somente num puro universo físico, mas sim num universo simbólico. A linguagem, o mito a arte, a religião, etc. compõem os fios

Algumas profissões possuem relação muito próxima ao design gráfico. São ocupações que estão envolvidas em comunicação através de imagem e escrita. Uma delas é a do quadrinista.

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As proto-escritas, ou o ponta pé inicial para um sistema de escrita, eram essencialmente semasiográficas. Ou seja, pictogramas ou figuras estilizadas de coisas materiais que indicam uma ideia de maneira direta, mas que ainda não representam os sons de uma língua falada (SAMPSON, 1996). Nesse ponto da evolução, tanto o desenho figurativo quanto as proto-escritas eram intimamente relacionadas, podendo ser identificadas como a mesma coisa. Algumas culturas, como a cultura chinesa e árabe, até hoje usam a escrita como uma das principais formas de arte. As formas das letras árabes são bem distintas e esteticamente agradáveis e os chineses consideram a caligrafia como a mais alta arte (MEGGS, 2012, p. 129).

que tecem essa rede simbólica, essa urdidura e experiência humana. ‘Todo progresso, diz ele, em pensamento e experiência afina e reforça essa rede’. Por isso, conclui Cassirer: ‘em lugar de definir [...] (o ser humano) como animal racional, defini-lo-emos como um animal simbólico’. — (SÁ, 1973, p. 15)

[...] (o ser humano) submerso na natureza, tem uma visão mítica-religiosa da natureza. O mito não é fabulo, não é lenda, mas algo que pode tocar a emoção e formar [...] (o ser humano). Embora o mito seja algo pré-lógico, apresenta uma interpretação do mundo e [...] (do ser humano). Encontramos o mito em Homero, como encontramos nos profetas, nos patriarcas bíblicos ou no mundo judaico e mesopotâmico. Daí por que dizem que esta visão (visão mítica) predominou no Oriente, na religião judaica, na religião egípcia, na religião mesopotâmica.

O surgimento da escrita marcou um grande passo em direção à civilização. [...] os dois (sociedade e comunicação) se manifestam de forma nitidamente inseparável e, mais que isso, interdependente: só é possível a comunicação humana porque [...] (o ser humano) vive em sociedade, e esta só se realiza enquanto assenta num sistema de comunicação.

— (SÁ, 1973, p. 245-246).

O mito, expressão favorita de um pensamento especulativo como esse, era precisamente o que lhes permitia materializar suas concepções, infiltrá-las em imagens, cenas, encadeamentos de aventuras, criadas, é claro, por sua imaginação, mas sobretudo para responder a alguma interrogação, para esclarecer algum problema, para ensinar alguma teoria — como os fabulistas constroem suas historietas para inculcar uma moralidade.

— (SÁ, 1973, p. 147)

Segundo Meggs (2012, p. 26), o uso de ferramentas forneceram aos seres humanos a capacidade de organizar uma comunidade e permitiram algum controle sobre o seu destino.

A comunicação entre humanos tem sua gênese coincidindo com a emergência cultural e da sociedade estruturada com base em arranjos mentais fundamentados na transmissão de experiências e não na herança genética. Essa gênese é explicada (pelo menos com os recursos disponíveis em antropologia) como um dos resultados do processo evolutivo dos seres vivos que deu origem ao gênero Homo. Tem uma base anatômica e neurofisiológica, e possibilitou à espécie humana engendrar meios para modificar o ambiente

— (CAMPOS, 2015, p. 20).

Os registros da pré-história representam as primeiras formas conhecidas de comunicação visual (MEGGS, 2012, p. 26). Sobre a arte rupestre no sítio arqueológico reconhecido pela UNESCO como património da humanidade na região da Serra da Capivara, no canal do Itaú Cultural no YouTube, Niède Guidon (2017) defende que "[...] (o ser humano) pré-histórico chegou aqui na região a cerca de 100 mil anos atrás".

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ainda há, atualmente, povos que possuem predominantemente a cultura oral, como os tuaregues, um povo nômade que vivem pelos desertos do Saara desde os tempos antigos (IDJENNADEN, 2012).

geográfico permitindo assim uma grande versatilidade à espécie que domina e povoa todo o planeta. — (SÁ,1973, p. 101)

Numa cultura puramente oral , o pensamento é governado pela capacidade da memória humana. Conhecimento é o que recorda, e o que você recorda é limitado pelo que você guarda na sua mente. Através da pré-literária e milenar história humana, a linguagem evoluiu para auxiliar no armazenamento de informações complexas na memória individual e para facilitar a troca dessas informações com outras pessoas por meio da fala. [...] A dicção e a sintaxe tornaram-se altamente rítmicas, afinadas ao ouvido, e a informação foi codificada em frases comuns — o que hoje chamaríamos de clichês — para auxiliar na memorização. O conhecimento estava embutido na "poesia", como Platão a definiu, e uma classe especializada de poetas-estudiosos tornaram-se dispositivos humanos, tecnologias intelectuais de carne e osso, para armazenamento, recuperação e transmissão de informações. Leis, registros, transações, decisões, tradições — tudo que hoje seria 'documentado' — nas culturas orais tinha que ser, como diz Havelock, 'composto em versos estereotipados' e distribuído 'sendo cantado ou entoado em voz alta.’

“Marcas, símbolos, figuras, letras […] tornaram-se uma contrapartida gráfica da palavra falada ou do pensamento não dito. A fala é limitada a falibilidade da memória humana e um imediatismo de expressão que não pode transcrever tempo e lugar. Conforme Dondis (1997, p. 2), “A linguagem é simplesmente um recurso de comunicação próprio do homem que evoluiu desde sua forma auditiva, pura e primitiva, até a capacidade de ler e escrever.”

[...] a cultura apenas se tornou a proporção em que [...] (o ser humano) elaborou sistemas apropriados de comunicação e, reciprocamente, estes só se efetuaram na medida em que aquela se desenvolvia [...] a ideia de que a cultura não está propriamente na concreção da atividade coletiva, isto é, nos seus produtos materiais, mas sim e sobretudo nas transformações por que passa a mente humana. [...] Sendo parte da cultura, a comunicação simbólica é sempre social. Tem sua expressão mais refinada e abrangente na fala que fornece as categorias simbólicas para interpretação de outros mecanismos não falados para transmitir mensagens.

— (CARR, 2020, p. 56) (Traduzido pela autora)..

— (SÁ, 1973, p. 13).

Na cultura oral, histórias eram contadas em forma de música e passadas de geração em geração. Algumas delas podem ter sido contadas com apoio visual, como as pinturas rupestres nas paredes das cavernas e as artes nas tumbas do Egito antigo (MEGGS, 2012, p. 26 e MCCLOUD, 2006, p. 221).

Até mesmo os gregos, a princípio, valorizavam mais a oralidade a despeito da ortografia mesmo tendo adaptado a escrita semítica fenícia a alguns séculos (MEGGS, 2012, p. 91). Isso ocorreu quando a prática da escrita ainda era novidade em meados do século quatro antes de Cristo. Época em que Platão escreveu um texto/diálogo chamado Fedro. No conto,

A humanidade viveu a maior parte do tempo sem a escrita. E mesmo após o seu surgimento,

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expressão criativa se tornam marcas registradas do modelo mental” de sua era, a era da cultura do livro. “O conflito entre o orador Sócrates e o escritor Platão foi, pelo menos (por enquanto), decidido — a favor de Platão” (CARR, 2020, p. 55-56 e 67) (Traduzido pela autora).

Platão relata que, quando a escrita estava em voga em Atenas, Sócrates, que era contra o uso da escrita para registrar suas palavras, contou a Fedro uma lenda egípcia sobre a origem da escrita. O deus Thoth a levou ao rei Thamus), elogiando as vantagens da nova tecnologia, que milagrosamente tornaria permanentes as palavras fugazes. Escrever melhoraria a memória e seria o caminho para o conhecimento e a sabedoria. Mas o rei egípcio rejeitou a oferta, porque percebeu que a verdade estava justamente em não escrever: as pessoas já não se preocupariam em se lembrar das coisas, prefeririam confiar na nova tecnologia, e a capacidade de pensar se deterioraria. (A ironia é que o Sócrates que conhecemos hoje é o transmitido pelas palavras escritas.).

[...] Como McLuhan sugeriu, as mídias não são apenas canais de informação. Elas fornecem a matéria do pensamento, mas também moldam o processo de pensamento”. [...] Nossas formas de pensar, perceber, e agir, sabemos agora (sobre os avanços nos estudos sobre plasticidade cerebral), não são inteiramente determinadas pelos nossos genes. Nem são inteiramente determinadas pelas nossas experiências na infância. Nós mudamos elas através da maneira que vivemos — e como Nietzche pressentiu, através dos instruentos que usamos. [...] Nossa maturidade como indivíduos pode ser traçada pelo jeito que desenhamos [...] (as coisas ao nosso redor). Começamos com representações primitivas e literais de características da paisagem a nossa volta, e avançamos para representações muito mais acuradas e abstratas [...]. Progredimos, em outras palavras, de desenhar o que vemos para desenhar o que sabemos.

— (PUCHNER, 2019, p 107-109).

Sócrates compartilhava a opinião de Thamus. Disse a Fedro que a palavra gravada na alma do aprendiz através da oratória é muito melhor do que a escrita, e que a dependência na técnologia do alfabeto prejudicaria a mente da pessoa. “[...] Por substituir memórias internas por símbolos externos, a escrita ameaça fazer-nos pensadores rasos, diz ele, nos impedindo de alcançar a profundidade intelectual que leva à sabedoria e felicidade verdadeira.” (CARR, 2020, p. 55) (Traduzido pela autora).

— (CARR, 2020, p. 9, 31 e 40). (Traduzido pela autora)

Com a escrita, nossa mente se individualizou. Estruturas ritmicas para memorização e recitação se tornaram obsoletas. Ganhou mais liberdade de expresão. O que fez dela essencialmente necessária para o desenvolvimento de ciências, artes e filosofias. “Nos tempos de Platão e séculos seguintes, essa consciência ampliada era reservada para as elites.” Para as massas, isso só se tornou viável após o advento de outras tecnologias da informação. (CARR, 2020, p. 57) (Traduzido pela autora).

Mas diferente de Sócrates, Platão era um escritor que reconhecia as vantagens da escrita. A mente oral — tradição cultural da Grécia Antiga, de Homero, o bardo, da poesia recitada e escutada, — era a principal rival de Platão em defesa da escrita e do estado mental que ela implica: “lógico, rigoroso, autossuficiente”. Benefícios que refletiram em sua escrita e filosofia analitica. Com a literatura — que surge graças à escrita — , o “pensamento original e a

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TIPOLOGIA COMPARADA DOS SISTEMAS DE ESCRITA

A tabela a seguir é resultado do estudo comparado neste presente Trabaho de Conclusão de Curso entre as diferentes nomenclaturas em três tipologias: a de Higounet (2003), a de Sampson (1996) e a de Bringhurst (2006). De acordo com Sampson (1996, p. 41), é preciso ressaltar que, as escritas que evoluíram naturalmente e que foram utilizadas comumente por longos períodos são

quase sempre híbridas em sua organização. Todo o sistema de escrita pertence a mais de uma categoria, afirma Bringhurst (2006, p. 63). Segundo Higounet (2003, p. 58), a classificação das escritas na verdade são bem delicadas, pois percebe-se que os elementos dos diferentes tipos de sistema coexistem em algum grau em diversas escritas, principalmente nos sistemas de escrita mais antigos.

HIGOUNET, 2003:

SAMPSON, 1996:

BRINGHURST, 2006:

Sintética

Semasiográfica

Semográfica

Analítica

Logográfica

Morfêmica

Semoprosódico Prosódico Alfaprosódico

Polimorfêmica Silábica Fonética

Consonantal

Glotográfica

Logossilábica Silábica

Alfabética

Fonográfica

Segmental

Silábica Alfassilábica Alfabético

Traçal

LEGENDAS

Nota: Cada termo é detalhadamente definido e exemplificado no texto que se segue nas próximas páginas.

Subcategoria Equivalência

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OS SISTEMAS DE ESCRITA

casos para estabelecer ou reforçar uma demarcação ideológica. Bringhurst (2006, p. 48), afirma que, a escolha de uma determinada escrita também depende sobretudo das filiações políticas e religiosas de uma determinada sociedade.

Um sistema de escrita consiste em um conjunto de símbolos, significados e regras de uso. Os símbolos podem ser entendidos como glifos, ou seja, formas visuais repetitivas limitados pelas capacidades humanas de produzí-los. Uma escrita não é por si só uma linguagem, mas um instrumento, um sistema de representação para tornar visíveis exemplos de uma língua falada. Uma língua pode ser registrada por diversas escritas e uma escrita pode ser usada para registrar várias línguas diferentes (BRINGHURST, 2006, p. 18 e 27).

Sampson (1996, p. 12) também afirma que a escrita segue a religião, pois as religiões fundamentam-se em livros sagrados, e a propagação da cultura escrita foi, com frequência, função das autoridades religiosas. As fronteiras territoriais religiosas e entre diferentes escritas frequentemente se coincidem. Sampson (1996, p. 11) ainda afirma que, “compreensivelmente, as razões pelas quais os Estados procuram eliminar o analfabetismo têm menos a ver com os benefícios da alfabetização para o indivíduo que com o fato de a alfabetização capacitar as pessoas a cumprirem seus deveres como cidadãos.” Além disso, a compatibilidade entre uma língua falada e um sistema de escrita também é um fator de influência para a adoção e alterações em uma ortografia. Portanto, e de acordo com Bringhurst (2006, p. 32), “a maneira pela qual os indivíduos e sociedade usam o sistema de escrita que recebem é o que nos revela quem são eles.”

Já para Higounet (2003, p. 9), “a escrita é mais que um instrumento. Mesmo emudecendo a palavra, ela não apenas a guarda, ela realiza o pensamento que até então permanece em estado de possibilidade.” A escrita é, portanto, uma linguagem em si que sintetiza e organiza o pensamento ao transcrevê-lo. Segundo o teórico, a história da humanidade pode ser dividida em duas grandes eras: antes e a partir da escrita. “A lei escrita substitui a lei oral, o contrato escrito substitui a convenção verbal, a religião escrita se seguiu à tradição lendária”.

Desse modo, a escrita é não apenas um procedimento destinado a fixar a palavra, um meio de expressão permanente, mas também dá acesso direto ao mundo das ideias, reproduz bem a linguagem articulada, permite ainda apreender o pensamento e fazê-lo atravessar o espaço e o tempo. É o fato social que está na própria base de nossa civilização.

Conforme Bringhurst (2006, p. 14 e 15), durante a maior parte do tempo de vida na Terra, os seres humanos não sentiram necessidade de controle gerencial da língua permitido pelo sistema de escrita. A linguagem humana não necessariamente precisa ser escrita para funcionar, desde que seja falada. Contudo, há uma grande variedade de línguas que jamais sobreviveriam ao tempo sem a proteção proporcionada pela escrita. O que difere uma da outra é que as escritas são inventadas e exigem sustentação artificial que Bringhurst descreve como “o treinamento organizado dos mais jovens, em outras palavras, uma escola”. Já as línguas não. Elas se auto-sustentam e florescem em qualquer lugar onde haja seres humanos.

— (HIGOUNET, 2003, p. 10).

Em Bringhurst (2006, p. 26 e 49), os sistemas de escrita são também percebidos como “vetores de autoridades políticas ou religiosas”. É possível constatar em algumas situações que a alternância de poder são rapidamente espelhadas por mudanças na escrita. O propósito da escrita é ampliar e aprimorar a comunicação, mas ela tem sido usada em vários

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Segundo Sampson (1996, p. 24-27), escrever é a comunicação de ideias relativamente específicas da língua falada por meio de marcas permanentes e visíveis de maneira convencional. Porém, existem formas de comunicação que poderiam ser descritas como escrita, mas que não são dependentes da língua falada, onde é preciso conhecer o simbolismo antes de se conseguir decodificar a mensagem.

Escrever é, no sentido literário, um dos ofícios mais solitários do mundo, praticado apenas nas sociedades muito organizadas e centralizadas. A literatura — significado narrativo e poesia — envolve mais o uso da linguagem com propósitos de descoberta do que em ações de controle. [...] A literatura não é o germe da escrita. A literatura, no sentido estrito, representa o triunfo da linguagem sobre a escrita: a subversão da escrita com propósitos que têm pouco ou nada a ver com os controles social e econômico.

A escrita foi iniciada do zero, sem modelo importado, pelo menos por três povos diferentes: “na Mesopotâmia, há cerca de cinco mil e quinhentos anos, no norte da China, há quatro mil e quinhentos anos, na Guatemala e no Sul do México, há cerca de dois mil anos.” Em cada caso, a escrita começou com desenhos que foram tornando-se cada vez mais abstratos na medida em que passaram a representar palavras e depois sílabas. “Ademais, em todos as ocorrências, as sociedades que originaram a escrita eram prévia e altamente organizadas, com pesados investimentos em agricultura, instituições sociais e centralização política.” No início, a escrita era utilizada em administração, economia e religião. Em literatura isso ocorreu numa fase posterior (BRINGHURST, 1996, p. 16 e 17).

— (BRINGHURST, 2006, p. 17).

Conforme J. Février (apud HIGOUNET, 2003, p. 11), para que haja escrita “é preciso inicialmente um conjunto de sinais que possua um sentido estabelecido de antemão por uma comunidade social e que seja por ela utilizado” e “em seguida é preciso que esses sinais permitem gravar e reproduzir uma frase falada.” Existem estágios intermediários entre o desenho e a escrita propriamente dita. Um dos primeiros estágios, e também um tipo de sistema de escrita ainda em uso, é chamado por Sampson (1996, p. 28) de semasiográfico, onde as unidades de significado indicam ideias de maneira direta não dependente de qualquer língua falada. Em Bringhurst (2006, p. 67), este é chamado de semográfico, onde os símbolos representam unidades de significados supralinguísticos. Para Higounet (2003, p. 11-13), estes sistemas são classificados como escritas sintéticas: o estágio mais elementar da escrita, onde um sinal ou um grupo de sinais servem para sugerir uma frase inteira ou as ideias contidas numa frase.

[...] Foi só quando a narração cruzou com a escrita que a literatura nasceu. Antes, o relato das histórias existira em culturas orais, com diferentes regras e objetivos. Mas, depois que a narração se ligou a escrita, a literatura despontou como uma força nova. Tudo o que se seguiu, toda a história da literatura, começou com [...] esse momento de intersecção, o que significa que, para contar a história da literatura [...] teria de tratar tanto da narrativa, quanto da evolução das tecnologias criativas, como o alfabeto, o papel, o livro e a impressão. [...] (O mundo moldado pela literatura) é um mundo no qual esperamos que as religiões se baseiem em livros e que nações se fundem em textos, um mundo em que conversamos rotineiramente com vozes do passado e imaginamos que (podemos nos dirigir aos leitores do futuro.”

Conforme Sampson (1996, p. 29-30), embora os sistemas semasiográficos sejam bastante limitados em termos de alcance, comparando com as línguas faladas, não se deve descartá-los como algo somente associado aos estágios primitivos da civilização. A língua escrita da matemática, por exemplo, é uma amostra altamente sofisticada. Para Bringhurst (2006, p.

— (PUCHNER, 2019, p. 18).

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67), a matemática também representa um exemplo de sistema por ele chamado de semográfico. As aplicações da semasiografia atualmente estão sendo ampliadas e empregadas para mensagens cada vez mais sofisticadas. Sinais de trânsito, instruções de uso, rótulos informativos, são exemplos de expressão semasiográfica por símbolos que não dependem diretamente da língua falada (SAMPSON, 1996, p. 29-30). Outros exemplos mais recentes que possivelmente são semasiográficos/semográficos, mas que não foram necessariamente citados pelos autores, são as histórias em quadrinhos e os memes, este último muito frequente na comunicação em redes sociais. Nenhuma escrita literária é totalmente semográfica. Mas as primeiras escrituras egípcias, maias e chinesas são parcialmente semográficas (BRINGHURST, 2006, p. 67). Invariavelmente se mostra que os sistemas semasiográficos são substituídos por uma escrita glotográfica de determinado tipo (logográfico ou fonográfico). Embora não seja possível afirmar que a escrita sempre tenha se desenvolvido da semasiografia para a glotografia (SAMPSON, 1996, p. 28).

Segundo Bringhurst (2006, p. 64-65), nenhum sistema de escrita conhecido funciona como unidades de significado agrupados em unidades conceituais (palavras), ou como agrupamentos gramaticais (palavras) de morfemas onde cada morfema individualmente teria seu símbolo e significado. Sampson (1996, p. 38), também afirma que desconhece qualquer sistema logográfico baseado em unidades maiores que os morfemas isolados. Os sistemas classificados como glotográficos oferecem representações visíveis de uma determinada língua falada. Ao contrário dos sistemas semasiográficos, os glotográficos são dependentes da língua. Eles podem ser subdivididos em duas partes conforme a dupla articulação da língua, de acordo com o linguista André Martinet. Uma delas é a logográfica, que se baseia nas mínimas unidades significativas da língua falada, o morfema, onde um único símbolo ou grafema de significado denota um conceito concreto ou abstrato da realidade. E representa a primeira articulação da língua; A outra parte é a fonográfica, que se baseia nas unidades fonológicas de pronúncia como sílabas, segmentos fonéticos e traços articulatórios, podendo ser subdividida em silábica, segmental e traçal. E representa a segunda articulação da língua (SAMPSON, 1996, p. 28 e 31).

Quando a escrita se distingue totalmente do desenho, apresenta as seguintes características, descritas detalhadamente em Bringhurst (2006, p. 17-19): 1) A escrita é abstrata e nenhum conteúdo pictórico importante permanece na própria escrita. A frase de Eric Gill que diz que “as letras são coisas e não imagens das coisas” reforça esse conceito; 2) Um sistema de escrita é codificado. Consiste em um conjunto de símbolos periódicos suficientes para armazenar e transmitir informações de uma língua; 3) Estes símbolos são definidos em outros termos, geralmente a fala, mas não necessariamente, podendo servir para qualquer tipo de linguagem; 4) O sistema é estilística e simbolicamente independente. Por serem grafadas, as escritas adquirem uma gramática interna na medida em que amadurecem, podendo se desvincularem parcial ou completamente de suas formas originais.

Em Sampson (1996, p 31 e 37-38), a primeira articulação da língua falada é representada por morfemas como unidades mínimas de significado. Os morfemas são palavras (componentes significativos de sentenças), quando são as unidades mínimas de significado de uma língua, ou são componentes significativos de palavras, quando representam componentes de uma unidade mínima de significado de uma língua. A segunda articulação são unidades fonológicas (consoantes, vogais, sílabas, etc.) que são agrupados para formar um morfema.

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consoantes isoladas e, neste caso, o valor consonantal do grafe era o primeiro som do nome da coisa representada. Muitos grafes hieróglifos permaneceram claramente icônicos ao longo da história da civilização egípcia, embora versões não icônicas da escrita hierática e o demótico tenham se desenvolvido para utilizações menos formais. A escrita hieroglífica conservou sua qualidade pictórica por razões estéticas e culturais, mas o hierático e o demótico perderam toda e qualquer iconicidade (SAMPSON, 1996, p. 81 e 84).

Os sistemas logográficos se baseiam nos morfemas, onde o número de sentenças e palavras potenciais em qualquer língua humana é infinitamente grande. Já os sistemas fonográficos, se baseiam em unidades fonológicas, onde tudo é finito. Segundo Sampson (1996, p. 34) as escritas antigas tendem a ser logográficas. A escrita suméria arcaica, por exemplo, se tornou logográfica depois de ser semasiográfica. Com a mudança para o estilo cuneiforme, a escrita suméria passou de motivada (quando existe uma relação natural entre a forma do grafe e seu significado, pouco abstrato) para arbitrária (quando não existe qualquer relação natural entre a forma do grafe e seu significado, puramente abstrato). Também continha alguns componentes fonéticos como determinantes. No sumério acádio, porém, poderia ser escrita fonográfica ou logograficamente (SAMPSON, 1996, p. 33 e 57).

Em Sampson (1996, p. 155, 157 e 158), o sistema de escrita chinês, o hanzi, é logográfico, ou seja, um grafe do sistema chinês não representa uma unidade de pronúncia, mas um morfema, uma unidade mínima de significado da língua chinesa, onde cada morfema tem o comprimento de uma sílaba, livres para combinarem entre si gramaticalmente. Em chinês moderno, cada sílaba chega a representar, em média, cerca de seis diferentes morfemas da língua viva.

Para Higounet (2003, p. 14), estes sistemas são escritas analíticas: a segunda etapa de evolução da escrita depois da sintética, onde cada sinal representa uma palavra. Segundo o autor, foi exatamente neste estágio que a escrita que representa visualmente a língua falada, propriamente dita, nasceu. As escritas suméria, egípcia e chinesa são as mais antigas conhecidas nessa categoria. A escrita cuneiforme era um sistema complexo que, de maneira um tanto desordenada, combinou vários princípios ortográficos em diferentes proporções durante as diferentes etapas de sua história. Os hieróglifos egípcios que surgiram pouco depois da escrita cuneiforme acádia, e possivelmente tenham sido inventados sob a influência dela, desenvolveram-se principalmente — mas não totalmente — como sistema fonográfico, um tanto similar, em termos de estrutura (embora não na forma de seus grafes) com a versão acádia do cuneiforme (SAMPSON, 1996, p. 64 e 81).

Para Bringhurst (2006, p. 69), os hieróglifos egípcios e maias (em parte) e o hanzi (a escrita chinesa) para o mandarim (a língua chinesa), estão entre o que ele chama de escritas logossilábicas, onde cada sílaba com vários significados diferentes pode ter vários signos, um para cada significado. A escrita chinesa é primariamente logossilábica para o idioma mandarim, porém a mesma escrita é basicamente semográfica quando empregada em japonês. Isso acontece porque os componentes fonéticos do kanji (escrita japonesa derivada da chinêsa) são frequentemente ignorados, restando apenas o seu significado. A escrita chinesa também foi adotada pela Coréia até a invenção da escrita coreana. Bringhurst (2006, p. 71-72) classifica a escrita coreana como alfassilábica, ou seja, apresenta informações alfabéticas mas é essencialmente silábica na sua organização. Na escrita hangul coreana, consoantes e vogais são totalmente

Embora muitos hieróglifos representassem grupos de sons, alguns representavam

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Ela é genuinamente silábica, no sentido de que a forma dos grafes não compartilham da mesma aparência básica, mas são marcas independentes sem qualquer ligação espacial. Não há nada em comum entre as formas de um grafe para o outro.

analisados e cada uma possui seu próprio caractere, mas esses símbolos componentes são recombinados em ideogramas compostos ou em grupos que retratam sílabas. Sampson (1996, p. 131), classifica o hangul como traçal, um subgrupo dos sistemas fonográficos, onde um grafe representa todo um segmento fonográfico, podendo variar de propriedade visual de acordo com o traço fonético. A escrita hangul possui uma estrutura interna extremamente sistemática, muito semelhante, neste sentido, com a estenografia de Pitman e muito diferente de qualquer escrita conhecida empregada comumente em uma sociedade.

Já o alfabeto é classificado por Sampson como um sistema segmental (subcategoria dos sistemas fonográficos), assim como as escritas consonantais. Um sistema segmental ocorre quando há um grafe para cada segmento consonantal ou vocálico (feixes de traços fonéticos). Para Bringhurst (2006, p. 75-76), um sistema alfabético é baseado nos traços fonéticos consonantais e/ou vocálicos, onde a sílaba é invisível. Segundo Sampson (1996, p. 80 e 85), a maioria dos alfabetos derivam do mesmo ancestral, criado durante o segundo milênio antes de Cristo: o alfabeto semítico. Os alfabetos latino, cirílico e grego derivam de uma ramificação cananita da escrita norte-semítica, ou escrita fenícia, enquanto os consonantais hebreu e árabe derivam de uma ramificação aramaica da mesma escrita. O hebreu, o árabe e o próprio fenício apresentam grafes para as consoantes, mas nenhum para vogais (com exceção de uma). Esse tipo de alfabeto é popularmente chamado de abjad, devido às primeiras letras do alfabeto árabe (PATER, 2020, p. 15). Enquanto os alfabetos puros como o latim, o cirílico e o grego possuem grafes tanto para consoantes quanto para vogais.

O hangul pode ser considerado um tipo especial de alfabeto ou silabário. Para Higounet (2003, p. 14), o hangul, assim como qualquer outro sistema de escrita alfabética ou silábica, constituem a classe fonética: o terceiro e último estágio de evolução da escrita, onde os sinais passam a representar os sons elementares da língua falada. A diferença dele para um alfabeto puro é que, em vez de serem escritos em uma sequência linear como as letras do alfabeto latino, os símbolos hangul são escritos agrupados em sílabas em uma matriz quadrada, familiarizando-se esteticamente com o grafe chinês. Com esse sistema de organização, o hangul consegue ter um pequeno número de elementos gráficos básicos, o que torna fácil a aprendizagem, ao mesmo tempo em que torna a leitura eficiente devido ao tamanho grande das unidades perceptíveis (SAMPSON, 1996, p 140).

No entanto, de acordo com Sampson (1996, p. 41), é preciso ressaltar que, as escritas que evoluíram naturalmente e que foram utilizadas comumente por longos períodos são quase sempre híbridas em sua organização. Todo o sistema de escrita pertence a mais de uma categoria, afirma Bringhurst (2006, p. 63). Segundo Higounet (2003, p. 58), a classificação das escritas na verdade são bem delicadas, pois percebe-se que os elementos dos diferentes tipos de sistema coexistem em algum grau em diversas escritas, principalmente nas mais antigas.

Em Bringhurst (2006, p. 69), um sistema silábico puro ocorre quando há um símbolo por sílaba sem base em consoantes e vogais, como o hiragana e o katana, do sistema de escrita japonês. De acordo com Sampson (1996, p. 38, 64 e 68), um sistema silábico (subcategoria dos sistemas fonográficos) se refere a um conjunto de segmentos (feixes de traços fonéticos) de ocorrência simultânea. A escrita Linear B usada em meados de 2000 a.C. em Creta, constitui um exemplo relativamente puro de escrita silábica.

Segundo Pater (2020, p. 12), ao diferenciar grafia

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antiguidade para comunicar ideias. Os desenhos de figuras pré-históricas não representam o início da arte como a conhecemos hoje, pois eram usados por questões de sobrevivência ou ritualísticas, para, de um modo ou de outro, auxiliar na caça. O que as aproximam mais de uma forma de escrita do que uma forma de arte no sentido atual.

de sistema de escrita, afirma que “Uma grafia é um estilo particular de caracteres, como chinês, cirílico ou latim. Dentro de cada uma há diferentes sistemas de escrita. Na latina estão os sistemas francês, eslovaco etc. Na árabe, os sistemas do urdu, pachto, persa, entre vários outros.” As primeiras grafias, incluindo cuneiforme, hieróglifo e a antiga escrita chinesa, eram extremamente complexas em seus sistemas mistos. Usaram rébus, ideogramas, pictogramas e fonogramas silábicos ou consonantais, e uma quantidade enorme de caracteres para memorizar, o que dificultava muito seu domínio, assim como é ainda hoje quanto à escrita chinesa. E quem conseguia, tinha acesso a conhecimentos que a maioria das pessoas não tinham, o que dava poder a quem sabia ler e escrever.

As primeiras imagens evoluíram de duas maneiras: a primeira, foi o início da arte pictórica — os objetos e eventos do mundo foram registrados com crescente fidelidade e exatidão com o passar dos séculos; a segunda, foi a base da escrita. As imagens, independentemente de a forma pictórica original ter sido mantida, acabaram se tornando símbolos dos sons da linguagem falada. O artista paleolítico desenvolveu uma tendência à simplificação e estilização. As figuras tornaram-se cada vez mais abreviadas, eram expressas com um número mínimo de linhas. No final do período paleolítico, alguns petróglifos e pictogramas haviam sido reduzidos a ponto de quase parecerem letras.

O que democratizou rapidamente o conhecimento e a comunicação escrita foi a invenção de sistemas de escrita mais organizados baseados em articulações da língua falada, que se caracterizam por ser um conjunto de símbolos que representam sons elementares de um idioma, podendo ser combinados para criar palavras e sons mais complexos, o que limita o número de símbolos exigidos em uma determinada escrita. Uma contrapartida escrita para a língua falada, assim como são os alfabetos e os silabários (MEGGS, 2012, p. 81).

— (MEGGS, 2012, p. 32) (Traduzido pela autora).

De acordo com Meggs (2012, p. 32), os artistas sumérios misturavam escrita com imagens em relevo. O monumento de Blau de 4000 a.C. talvez seja o artefato mais antigo que combina escrita e figuras na mesma superfície. Pode-se dizer que, pelo menos quatro sistemas de escrita foram desenvolvidos de forma independente em épocas diferentes, por quatro povos distintos, na Mesopotâmia, Egito, China e América Central, e se ramificaram para o surgimento da maioria dos sistemas de escritas espalhados pelo mundo inteiro.

PROTO-ESCRITAS A visão de Meggs sobre a origem da escrita é a mais voltada para o ponto de vista do design e da arte, pois o que ele investiga é a história do próprio design e vai a fundo para encontrar seus vínculos perdidos na história. De acordo com ele, existe uma conexão entre simples desenhos de figuras e marcações de escrita. A segunda surgiu da primeira e ambas foram usadas na

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3. Cuneiforme (Representação ilustrada).

AS PRIMEIRAS GRAFIAS

Mesopotâmia e o cuneiforme Arqueologistas acreditam que a antiga Mesopotâmia foi o berço da civilização. Evidências comprovam que as boas circunstâncias geográficas de terras férteis do lugar forneceram um grande atrativo para uma comunidade antiga. Por volta de 8000 a.C, houve o início da agricultura e da pecuária. Achados arqueológicos a pelo menos 6000 a.C. confirmam o uso de diversas ferramentas e objetos de cobre em uma cultura de vila. E em meados de 3000 a.C. surgiu a Era do Bronze e a invenção da roda. A passagem de uma cultura de vila para uma civilização complexa, ocorreu após a chegada dos Sumérios, um povo misterioso que surgiu na parte inferior do Crescente Fértil (a grosso modo, o atual Iraque) no fim do quarto milénio antes de Cristo.


A escrita desenvolvida pelos sumérios representa um grande avanço para a humanidade. A Mesopotâmia foi alvo de diversas invasões que conquistaram os povos que viviam lá, e em troca, a cultura dos Sumérios conquistaram os invasores. O que contribuiu para o avanço da influência cultural dos povos daquela região para outras partes do continente, inclusive a escrita. A religião, o clero e os escribas tinham muito poder nas cidades-estados da Mesopotâmia, e a necessidade de registrar informações de uma forma mais segura para manter a ordem e a estabilidade talvez tenha sido o motivo de buscarem um sistema de escrita, assim como a necessidade de registrar informações relativamente simples relacionadas a contabilidade e comércio (MEGGS, 2012, p. 28-30).

advérbios e preposições com adaptações de pictogramas. Até que estes passaram a fazer parte de um sistema de escrita rébus, onde os símbolos representavam os sons da figura representada, além da própria figura, formando morfemas, palavras ou sílabas — Um exemplo em Meggs (2012, p. 37), é o famoso logo da IBM feito pelo designer Paul Rand que fez um uso muito inteligente do sistema rébus —. Os pictogramas semasiográficos se tornaram pictogramas logográficos, permitindo ao cuneiforme evoluir para o seu estágio de representar visualmente a língua falada. Mas ainda era uma escrita muito difícil de aprender por completo, mesmo depois de ser simplificada pelos assírios para 560 símbolos, o que tornaram os escribas figuras temidas pelo público geral.

Nos seus primórdios, a escrita suméria registrava pictogramas de objetos, números e nomes pessoais. Materiais usados e adaptações feitas para facilitar e agilizar o processo de escrita foram fatores que influenciaram na aparência dos glifos que evoluíram para uma forma mais abstrata, a forma mais famosa de escrita da Mesopotâmia: a grafia cuneiforme. Uma espécie de estilo com ponta triangular que era prensada na argila úmida deixava uma marca parecida com uma cunha. Ao invés de uma linha contínua, uma série de marcas eram usadas para formar um único caractere (MEGGS, 2012, p. 31).

A explosão do conhecimento possibilitada pela escrita foi notável. Os mesopotâmicos organizaram bibliotecas que continham milhares de tabletes sobre religião, matemática, história, direito, medicina e astronomia. Houve um começo de literatura, já que poesia, mitos, épicos e lendas foram gravados em tábuas de barro. A escrita também promoveu um senso de história; as tabuletas registravam com exatidão meticulosa dos eventos que ocorreram durante o reinado de cada monarca. Milhares de contratos e registros comerciais ainda permanecem. A escrita permitiu que a sociedade se estabilizasse sob o estado de direito. As medidas e pesos foram padronizados e garantidos por inscrição escrita. Códigos de leis, como o Código de Hamurabi, que reinou de 1792 a 1750 a.C., enunciavam crimes e seus castigos, estabelecendo assim a ordem e a justiça social. — (MEGGS, 2012, p. 32) (Traduzido pela autora).

Não foi fácil passar para o estágio seguinte, o de representar sons da língua falada. Mas a escrita como um instrumento funcional, assim como a linguagem, seguia para este objetivo, devido a dificuldade de representar nomes,

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4. Caligrafia chinesa (Representação ilustrada).


A escrita chinesa Hanzi em chinês, hanja em coreano e kanji em japonês, são os nomes dados aos caracteres de origem chinesa. Diferente das escritas egípcia e semítica, o sistema de escrita chinês permanece muito semelhante às suas formas originais, mas com algumas mudanças na estética dos hanzi, ou caracteres. O surgimento da escrita chinesa é desconhecido pela ciência, pertencendo ao território das lendas chinesas. De acordo com elas, a primeira escrita foi criada por Tsang Chieh por volta de 1800 a.C., inspirado pelas formas encontradas na natureza, procurando simplificar em pictogramas ao máximo, o que os tornaram mais abstratos que os hieróglifos, que eram mais realistas. Mas, algumas formas são semelhantes a todas as escritas que surgiram a partir desse elemento chave, que é o pictograma, a passagem do desenho para a escrita. Os achados arqueológicos mais antigos com escritas chinesas datam de mais de mil anos antes de Cristo. A escrita era chamada chiaku-wen, ou “osso-e-casco”, ou ossos oraculares, porque era inscrita em ossos de animais ou em cascos de tartarugas, usada para fins ritualísticos. Essa escrita antiga era pictográfica (semasiográfica ou logográfica), assim como os hieróglifos e o cuneiforme. A fase seguinte da caligrafia chinesa foi a chin-wen, ou “bronze”, inscrita em objetos de bronze, e consistia de formas mais regulares do que a anterior. Além de fins religiosos, era usada para algumas tarefas legais e contratuais (MEGGS, 2012, p. 126-127). A caligrafia se desenvolveu em diferentes estilos por diferentes artistas, de lugares diversos da China continental, até serem unificadas pelo imperador Shih Huang Ti, por volta de 250 a.C., que uniu todos os povos em uma única nação, padronizando também pesos, medidas e leis. Então, um novo estilo caligráfico, chamado hsiao chuan, foi desenhado pelo primeiro ministro Li Ssu. As formas seguiam um estilo mais fluido, gracioso, ainda mais abstrato

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independentes de pronúncia, simbolizadas de maneira independente, [...] para o chinês, não existe uma noção muito clara de palavra como unidade maior que o morfema.” (SAMPSON, 1996, p. 158). Ou seja, a escrita chinesa não agrupa pares de caracteres como ocorre no alfabeto latino, onde a unidade visual de grafiaé a palavra, composta por segmentos de pronúncia agrupados. Na escrita chinesa, cada morfema possui um logograma, o que faz com que o número de caracteres sejam tão grandes quanto o vocabulário da língua.

que os anteriores e se encaixavam de forma equilibrada em seus quadrados imaginários. Em meados de 165 d.C, na dinastia Han, um novo estilo de caligrafia era usado, chamado Li-shu, ou “clerical”, subdividida entre os estilos gráficos Qing e Han, onde as formas arredondadas deram lugar a formas mais angulares, facilitando a escrita, abrindo caminho para a adoção do estilo chen-su. O último passo na evolução dos estilo caligráfico da escrita chinesa é o chen-su, ou estilo “regular”, que é continuamente usado a quase dois mil anos. Nesse estilo, um nível artístico foi atingido com o design minuciosamente projetado. Desde então, a caligrafia na China é considerada uma forma de arte (como no caso da escrita arábica) mais importante que a pintura, pois a pintura chinesa é executada com as técnicas usadas na caligrafia. A escrita chinesa é o elemento unificador da nação até hoje, mais do que o mandarim, que possui diferentes dialetos ao redor da China (MEGGS, 2012, p. 128-129).

Embora haja aproximadamente quarenta e quatro mil caracteres chineses diferentes (MEGGS, 2012, p. 127), sendo a maioria não usada no dia a dia, o sistema em si é relativamente simples, diferente do que se pode dizer sobre o sistema de escrita japonesa (kanji, katakana e hiragana), que combina elementos logográficos e fonográficos (SAMPSON, 1996, p. 177 e 187). Os dois tipos de sistemas de escrita representam diferentes tipos de dificuldade: uma escrita logográfica exige muito mais tempo para memorização dos caracteres, enquanto uma escrita fonográfica exige inteligência analítica para se dividirem as palavras em sons (SAMPSON, 1996, p.175).

Segundo Sampson (1996, p.155), o alfabeto semítico (fenício) e a escrita chinesa são dois grandes sistemas de escrita glotográficos (que oferecem características da língua falada. Diferente da semasiográfica, que indicam ideias de maneira direta como o sumério primitivo, placas de sinalização e manuais de instrução, por exemplo) que propiciaram a maioria das línguas escritas do mundo, e os dois representam as duas categorias tipológicas glotográficas mais importantes da escrita: enquanto a família semítica é fonográfica (tem como base as unidades fonológicas consoantes, vogais, sílabas, em que os símbolos individuais representam segmentos sonoros), o sistema chinês é logográfico (se baseia nas unidades significativas). O que significa que, um caractere do sistema de escrita chinês não representa uma unidade de pronúncia, mas um morfema, uma unidade mínima de significado da língua chinesa. Cada morfema tem o comprimento de uma sílaba (SAMPSON, 1996, p.157). “Como os morfemas chineses constituem unidades

Com cada logograma chegando a representar mais de 6 morfemas diferentes num nível de ambiguidade insatisfatório (SAMPSON, 1996, p.181), os caracteres foram distinguidos pelo acréscimo de outro caractere com a função de um radical, que indica o significado objetivo do morfema, parecido com o uso dos afixos no português ou os determinativos no egípcio. São escritos juntos num quadrado imaginário, de tamanho constante na escrita, em um único todo visual, de forma que os caracteres com muitos traços sejam compactados. Assim, o novo caractere complexo consiste de duas partes: a parte fonética (o morfema ambíguo original) e a parte significativa (o radical. Elemento que mostra a categoria semântica a que pertence o morfema em questão). Hoje, a maioria do inventário de logogramas chineses usados é “complexa” (SAMPSON, 1996, p.164).

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surgiu na antiga China, antes mesmo da invenção de Gutenberg em 1450 d.C. na Europa. Suas formas iniciais, utilizadas durante a dinastia Han no século 300 d.C., era uma forma de carimbo, onde objetos de pedras e outros materiais eram esculpidos para formar uma imagem em relevo, assim, com a tinta, geralmente vermelha, aplicada, a imagem em negativo era transferida em outra superfície, podendo ser reproduzida exatamente do mesmo jeito. Assim eram, e são utilizados até hoje, os selos chineses.

O mandarim é uma língua isolante (SAMPSON, 1996, p.157), o que significa que os morfemas são monossilábicos, quando a sílaba é isolada, e não flexiona as raízes. Diferente das línguas aglutinantes como o japonês, que as palavras são polissilábicas podendo constituir-se de mais de um morfema. Ou das línguas flexionais como as latinas, onde ocorrem variações de gênero, tempo, quantidade e etc., e as palavras são polissilábicas, quando as sílabas se aglutinam para formar uma palavra (SAMPSON, 1996, p.158). Isso justifica o uso da escrita logográfica na China sobreviver até os dias de hoje, o que seria inviável para as línguas latinas.

Na sequência, muitas outras técnicas de impressão parecidas com a xilografia foram usadas e desenvolvidas (MEGGS, 2012, p. 133-135). No século 900 d.C., notas fiscais começaram a ser emitidas e, logo depois de uma crise de escassez de moedas de ferro, o papel-moeda foi projetado pelo governo para substituir outros materiais antes utilizados, e milhões de notas foram impressas, o que permitiu que a China se tornasse a primeira sociedade a conviver diariamente com as imagens impressas, e outras aplicações para a impressão também se seguiram para ampla distribuição, como imagens e textos religiosos.

Embora a imprensa tenha surgido na China, mesmo que a dificuldade advindas da grande quantidade de logograma para cada clichê de tipo móvel tenha impactado nessa escolha na época, os chineses nunca se interessaram na tipografia como forma de arte, assim como os europeus. Já a caligrafia, uma importante forma de arte na China, possuía virtudes que não podiam ser reproduzidas pela imprensa, como a espontaneidade e a irregularidade natural, características valorizadas na cultura chinesa (SAMPSON, 1996, p.178). Tradicionalmente , os caracteres são escritos em colunas de cima para baixo, da direita para esquerda. Em alguns lugares, eles são escritos em linhas da esquerda para a direita e de cima para baixo (SAMPSON, 1996, p.170).

Os pergaminhos utilizados até então como forma de transportar, guardar e proteger o papel, foi substituído por formatos encadernados dobrados e costurados parecidos aos códices romanos. A impressão era feita em blocos de madeira esculpidos como matriz para a transmissão e reprodução das imagens em grandes tiragens, com conteúdos científicos, políticos, artísticos e literários, levando a uma revolução intelectual e cultural no Oriente já em meados do século 1000 d.C. (MEGGS, 2012, p. 136-137).

Os chineses também inventaram o papel, assim como os egípcios, mas com o substrato a base de bambu ou seda. Conforme Meggs (2012, p. 131), essa invenção é atribuída ao Ts’ai Lun, um funcionário governamental em 105 d.C.. A primeira grande melhoria no processo de fabricação do papel foi o uso de cola ou amido para fortalecer e endurecer o papel e aumentar sua capacidade de absorver tinta. A prensa

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5. Escritas Egípcias: Hieroglifica e Hierática cursiva (Representação ilustrada).


Escritas egípcias espécie de paleta de madeira, um porta pincel e um saquinho de tinta, que os identificava como tal. Depois surgiram duas escritas que eram usados como alternativa dos hieróglifos: O hierático, que surgiu em meados de 1500 a.C., desenvolvida por padres, era uma forma cursiva dos hieróglifos, uma escrita simplificada usada em escrituras religiosas devido a agilidade, permitida pelo uso de estilo de ponta fina ao invés de um pincel, produzindo caracteres mais abstratos e concisos; e o demótico, que surgiu por volta de 400 a.C., era uma escrita ainda mais abstrata usada mais popularmente em documentos comerciais e legais (MEGGS, 2012, p. 41).

A escrita egípcia mais antiga encontrada data da primeira dinastia por volta de 3100 a.C., e a mais recente encontrada é de 394 d.C. Graças á Jean-François Champollion, que decifrou a Pedra de Rosetta no século XIX, foi descoberto que havia mais complexidade do que se imaginava na escrita egípcia: alguns sinais eram alfabéticos, alguns eram silábicos, outros eram usados para determinar a categoria ou como o caractere deveria ser interpretado. Os hieróglifos também funcionavam como fonogramas além de pictogramas para coisas materiais (MEGGS, 2012, p. 36). Assim como os sumérios, os egípcios, quando tinham dificuldade de expressar alguma ideia, usavam a escrita rébus, substituindo o significado da figura pelo seu som. Os egípcios também desenvolveram, em parte, um sistema de escrita consonantal, onde os caracteres representavam consoantes, mas não havia nenhum para vogais. Chegaram a mais de setecentos hieróglifos, muitos deles eram apenas pictogramas, mas a maioria se tornaram fonogramas. “[...] Hieróglifos eram usados para documentos históricos e comerciais, poesia, mitologia, épicos, geografia, ciência, astronomia, medicina, farmácia, o conceito de tempo e outros tópicos.” — (MEGGS, 2012, p. 38).

Os egípcios foram os primeiros a produzir manuscritos ilustrados, onde palavras e figuras eram combinados para comunicar alguma informação. Escribas e artistas eram comissionados para preparar papiros funerários chamados popularmente hoje por Livros da Morte (MEGGS, 2012, p. 42). A cultura egípcia antiga sobreviveu por mais de três mil anos. Hieróglifos, papiros e manuscritos ilustrados são seu legado de comunicação visual. Juntamente com as realizações da Mesopotâmia, essas inovações desencadearam o desenvolvimento do alfabeto e das comunicações gráficas na Fenícia e no mundo greco-romano.

No Egito Antigo, conhecimento também era poder. Levava anos para aprender a ler e escrever, e os escribas eram muito respeitados na sociedade egípcia. Eles carregavam uma

— (MEGGS, 2012, p. 46) (Traduzido pela autora).

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6. Tifinagh (Representação ilustrada).

A escrita tifinagh Outra antiga sociedade além do Egito que existiu na África, mas que não é muito discutida ou conhecida, assim como a maioria das civilizações africanas, foi a líbico-berbere. Os berberes ou imazighen (amazigh no singular) são os primeiros habitantes conhecidos do norte da África . Ocupavam o norte africano do oeste do Egito ao Oceano Atlântico, e do Mediterrâneo até o sul do Deserto do Saara na região do Sahel. A antiga escrita líbico-berbere pode ser encontrada em qualquer lugar, como baixo relevo ou como pintura em diversos suportes. Em pedras na região do Saara, muitas ao lado de representação de camelos, em madeira ou


verticalmente. A direção de leitura geralmente é de baixo para cima. Diferente da maioria das escritas antigas que desapareceram, essa forma antiga de escrita é usada até hoje pelo povo tuaregue, os nômades do deserto. Os tuaregues formam um raro grupo matriarcal que existe até hoje. A escrita tifinagh é passada de geração em geração pelas mulheres e mães tuaregues, assim como seu status social (HIRTLE e VILLIERS, 2002).

em túmulos, principalmente no norte da África em regiões que existiu o antigo reino da Numídia. As escritas frequentemente aparecem próximos a representações de animais ou de vegetações que a muito tempo existiam em grande parte de onde é o hoje o extenso e árido deserto do Saara (HIRTLE e VILLIERS, 2002). Até nas Ilhas Canárias foi encontrada essa escrita gravada (PICHLER, 2003), onde os guanches, primeiros habitantes do arquipélago, também falavam uma forma de língua berbere. Os símbolos líbico-berbere tendem a ser geométricos, consistindo de linhas retas, círculos e pontos combinados de várias maneiras.

A escrita nas tribos tuaregue, de cultura majoritariamente oral, tem outro propósito que não é político ou econômico. É usado para entretenimento principalmente entre as crianças em formas de jogos, quebra-cabeças, competições e piadas. Geralmente escrevem na areia ou gravam em pedras. Entre os adultos é ocasionalmente usada para escrever uma carta ou fazer uma nota fiscal. Estes associam a escrita tifinagh com infantilidade devido ao uso frequente que as crianças fazem dessa escrita que acabaram de aprender como forma de brincadeira (E.A., PIOTR e C.B., 2005, p. 60, 61 e 68).

A origem da escrita líbico-berbere ainda permanece em discussão. Há muitas teorias e dois principais pensamentos: aqueles que defendem a ideia de que a escrita berbere descende da escrita fenícia, e a outra argumenta que ela nasceu na África, podendo ter sido influenciada ou ter sido a própria influência para a escrita fenícia. Existem várias semelhanças entre a escrita líbico-berbere e a fenícia (ou sua versão púnica). No entanto, não há provas (até que novas descobertas provem o contrário) no norte da África de pré-escrita que possa explicar o surgimento de um alfabeto local. Embora também não exista uma forma intermediária entre os alfabetos fenício-púnico e líbico-berbere. Ambos os alfabetos coexistem desde o início, totalmente diferenciados […]. Talvez, as semelhanças entre os dois alfabetos se devam a influências mútuas entre dois povos que viveram próximos há séculos.

A cultura não literária depende de uma forte memória humana compartilhada e uma língua oral. Em desertos do oriente médio e próximo, o vento sopra muito forte dia e noite, causando avalanches e tempestades de areia. Animais e mudanças climáticas impedem os povos que vivem em tendas de terem uma vida estável e manter uma cultura literária. A forma que a tribo de cultura oral têm de confirmar a verdade de um fato é se ele é reconhecido por todos. Detalhes pouco práticos ou relevantes consequentemente são esquecidos (E.A., PIOTR e C.B., 2005, p. 51 e 52).

— (IDJENNADEN, 2012) (Traduzido pela autora).

A partir dos anos 1970, a escrita tifinagh se tornou muito popular no norte africano, o que levou ao surgimento de sua versão mais recente, o alfabeto neo-tifinagh, escrito da esquerda para a direita em linhas horizontais. Essa versão modernizada agora é ensinada em escolas e universidades do Marrocos e da Algéria (IDJENNADEN, 2012).

Hoje, a escrita líbico-berbere, que data de pelo menos 4000 d.C. (IDJENNADEN, 2012), é conhecida como a antiga versão do tifinagh, que na língua dos tuaregues, a língua tamashek, significa "nossa descoberta". A versão antiga era consonantal e escrita

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7. Escrita fenícia (Representação ilustrada).


Escritas norte-semíticas presentes na língua (a, e e u), constituindo um alfabeto consonantal. A escrita ugarítica é considerada a primeira escrita a utilizar um sistema alfabético (HIGOUNET, 2003, p. 62 e 64).

Conforme Higounet (2003, p. 59-60), a ideia de representar sons consonantais pelos egípcios, ainda que precariamente, também ocorreu, talvez sob influência egípcia, entre os povos semíticos ocidentais das margens do Mar Vermelho e do Mediterrâneo. A língua falada por essas populações, em que a base das palavras é essencialmente consonantal, facilitaram o processo.

É durante a segunda metade do segundo milênio antes de Cristo que os fenícios elaboraram seu alfabeto com apenas vinte e dois grafes lineares consonantais que davam conta de escrever qualquer palavra da língua. Pode-se pensar que, para criar seus sistema gráfico, os fenícios inspiraram-se no acervo comum das escritas do mundo oriental e Egeu, sem considerar valores fonéticos ou logográficos agregados aos caracteres que foram mais ou menos imitados. Há várias hipóteses a respeito da origem da forma gráfica das letras fenícias. Entre elas estão uma relação com os hieróglifos egípcios ou hieráticos através da escrita de Biblos, os caracteres cuneiformes de Ras Shamra, e até mesmo a escrita linear de Creta (HIGOUNET, 2003, p. 65 e 66).

Uma fonte de influência para o alfabeto latino largamente adepta por teóricos, é o alfabeto norte-semítico, mais popularmente conhecido como alfabeto fenício, de populações como os cananeus, os hebreus e os fenícios. Na tentativa de estabelecer uma genealogia do alfabeto fenício, a escrita pseudo-hieroglífica de Biblos é considerado o elo mais seguro da pré-história do alfabeto, datadas por cerca de 1500 a.C. A língua se trata do mais puro fenício, e seus grafes são fonográficos (HIGOUNET, 2003, p. 60-61). Por volta de 1500 a.C., mineradores semíticos que trabalhavam para o Egito na Península Sinaítica, adaptaram os hieróglifos para um sistema acrofônico, chamado de Escrita Proto-Sinaítica.

Foi sobretudo Tiro que assegurou a propagação do alfabeto fenício, através de seus navegadores e comerciantes. As inscrições fenícias, datadas de Chipre de 900 à 100 a.C., e a escrita da colônia tíria de Cartago na África do Norte, chamada de escrita púnica, datadas de 900 à 146 a.C., transmitiram as formas desse alfabeto, assim como os documentos da própria Fenícia. A escrita fenícia sempre se apresenta horizontalmente da direita para a esquerda (HIGOUNET, 2003, p. 66-68).

Os achados de Ras Shamra na costa da Síria do Norte, assim como os de Biblos, são considerados duas das mais importantes descobertas arqueológicas para a história da escrita. As escritas de Ras Shamra foram descobertas em 1929 pelos franceses, num sítio próximo de Lattaquié, onde era a antiga Ugarit. A escrita de Ugarit chegou ao mecanismo do alfabeto por volta de 1400 a.C. A grafia da escrita ugarítica é cuneiforme de criação artificial e simples com apenas 30 grafes. Cada um faz a notação de apenas uma consoante ou uma das três vogais

Este alfabeto influenciou a criação de múltiplas ramificações posteriores, como a linhagem greco-romana e a do aramaico, este último que ,por sua vez permitiu o surgimento da escrita hebraica e árabe (MEGGS, 2012 p. 81-84).

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8. Linear A e Linear B (Representação ilustrada).


Escritas de Creta (Linear A e Linear B) Muito antes da invenção do alfabeto grego, a escrita Linear B, uma escrita silábica, foi usada para escrever uma forma arcaica do grego durante parte do segundo milênio antes de cristo, pelo serviço civil da civilização micênica, que então florescia no sul da Grécia. Os micênicos derivaram a escrita Linear B adaptada da escrita Linear A utilizada pela civilização minóica, que desenvolvera-se em Creta até serem conquistados pelos micênicos, por volta de 1450 a.C. A Linear B só deixou de ser empregada quando as cidades micênicas foram destruídas por volta de 1250 a.C. (SAMPSON, 1996, p.66). Não se sabe muito sobre essa civilização em consequência do péssimo estado dos materiais encontrados. Devido a sua similaridade gráfica, é considerado um dos possíveis precursores do alfabeto grego e influência para o alfabeto latino. Eles usavam clichês para imprimir cada caractere em argila úmida que não eram queimadas, o que pode ter sido o princípio do uso de tipos móveis já em meados de 2000 a.C. (MEGGS, 2012, p. 82). Acredita-se que a Linear B era usada apenas para propósitos burocráticos muito específicos. A maioria das tabuinhas de argila são registros breves e referentes a assuntos como inventário de mercadorias, listagem ou algo semelhante. É provável que as inscrições fossem usadas em contextos limitados, o que permitia acessar seu significado pela interpretação das circunstâncias, pois a Linear B apresenta ser incompleta, arbitrária e ambígua. Não parece ter sido usada para propósitos gerais de comunicação (SAMPSON, 1996, p. 76). Após o colapso da civilização micênica, os gregos ignoraram a arte da escrita durante séculos, e quando finalmente começaram a empregar o alfabeto, desconheciam o fato de que seus ancestrais haviam inventado uma forma de escrita diferente (SAMPSON, 1996, p. 105).

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9. Escrita grega arcáica (Representação ilustrada).


O alfabeto grego Os fenícios eram grandes comerciantes e navegadores que espalharam sua cultura por grande parte do mediterrâneo, principalmente na Grécia. O alfabeto fenício foi adotado pelos gregos e espalhado por toda a Grécia por volta de 1000 a.C., que alteraram cinco consoantes por vogais. Os gregos aplicaram estrutura geométrica e ordem aos caracteres fenícios que eram todos desiguais, convertendo-os em formas artísticas com harmonia e beleza. Primeiro, usavam o estilo fenício de escrever da direita para a esquerda, depois inventaram o estilo bustrofédon, onde a escrita era feita em zigue-zague conforme a pauta, e por último, adotaram a escrita da esquerda para a direita, usada até os dias de hoje no Ocidente.

começou a ser praticada — embora o sistema fosse baseado na escravidão, para que o povo pudesse praticar atividades públicas —. Mas a comunicação visual ainda tinha um papel secundário na cultura grega. Historiadores e poetas que escreviam, ao invés de discursar, não eram levados muito a sério. Entretanto, o alfabeto teve um papel importante para a prática da democracia, possibilitando votos secretos, assinaturas e carimbos de autoridades. A leitura e a escrita se tornaram essenciais para espalhar informações e conhecimentos por todo o território conquistado, após a derrota do império persa por Alexandre o Grande por volta de 356 a.C.. A cultura helênica foi espalhada pelo mundo antigo, incluindo Egito, Mesopotâmia e Índia. Alexandre fundou a famosa biblioteca de Alexandria, na colônia egípcia, com centenas de milhares de manuscritos. Infelizmente, devido a fragilidade do papiro, a maioria deles foi perdida. Após a morte de Alexandre e a separação do império grego em dois reinos, o alfabeto grego se tornou influência no mundo inteiro, ramificando o etrusco, o latino e o cirílico. Estes foram as bases para o surgimento da maioria dos alfabetos do mundo.

Em 200 d.C., um estilo mais ágil foi inventado, o uncial. As letras eram mais arredondadas, usadas em papiros e em materiais mais macios que a rocha como argila úmida, cera e madeira. A grafia grega demonstra muito bem como os materiais e substratos usados podem influenciar nos formatos dos caracteres (MEGGS, 2012, p. 87-90). Segundo Meggs (2012, p. 90-92), a era de ouro de Atenas em 500 b.C. foi o ponto mais alto da cultura grega, quando a democracia

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10. Capitalis Monumentalis e Capitalis Quadrata (Representação ilustrada).

O Alfabeto latino Depois da conquista da Grécia pelos romanos em 200 a.C., escolas e livrarias foram mudadas para Roma, junto com elas a literatura, a arte e a religião, que foram alteradas para se adequarem às condições sociais romanas e foram espalhadas por todo Império Romano. O alfabeto grego chegou aos romanos através dos etruscos, um povo que vivia na península itálica por volta de 700 a.C (MEGGS, 2012, p. 92).

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Conforme Higounet (2003, p. 101 e 104), o alfabeto latino era apenas um entre as várias escritas da península itálica, que tomaram emprestado, mais ou menos diretamente, o alfabeto grego. Os etruscos possuíam um alfabeto cujo o vínculo com o alfabeto grego é evidente. O abecedário da tabuleta de Marsiliana, de cerca de 700 a.C., assim como outros documentos encontrados, continham as vinte e duas letras do alfabeto fenício e os quatro sinais suplementares do grego (ypsilon, khi, phi, psi), com seus valores ocidentais. Roma teria recebido indiretamente sua escrita através do alfabeto etrusco.

Os romanos também desenvolveram outro tipo de papel para substituir o papiro, devido a um conflito entre o faraó do egito, Ptolomeu V (governou c. 205-180 a.C.), e o rei de Pérgamo, Eumenes II (governou 197-160 a.C.), após o rei grego construir uma grande biblioteca, o que ocasionou medo no faraó de que essa biblioteca pudesse sobrepujar a de Alexandria. Então, a exportação do papiro foi proibida e, por volta de 190 a.C., o pergaminho, feito basicamente de pele de bezerro, entrou em uso. Era maior, mais suave, mais durável e flexível do que o papiro, feito basicamente de uma planta chamada papiros que cresce abundantemente às margens do rio Nilo (MEGGS, 2012, p. 96).

Por sua vez, os romanos adicionaram e removeram letras até a Idade Média, onde atingiu o total de 26 letras. Formas monumentais de escrita arquitetônica foram projetadas pelos romanos para proporcionar grandeza, beleza e permanência, com a intenção de representar suas conquistas e celebrar seus heróis de guerra. Capitalis monumentalis (maiúsculas monumentais) eram estruturais e geométricas, organicamente organizadas para ser uma forma homogênea e não apenas uma soma de suas partes, e os espaços vazios dentro e entre as letras também receberam atenção, fazendo a escrita romana ser uma escrita linear extremamente harmoniosa. A exemplo da tipografia Trajan (MEGGS, 2012, p. 93-94).

Os pergaminhos permitiram a criação do códice, uma espécie de encadernado feito de pergaminhos cortados, dobrados e costurados, o que eliminava a necessidade de desenrolar todo o pergaminho para encontrar alguma informação. Um uso que era impossível de ser feito com o papiro, uma folha muito mais frágil e fina. Ambos os lados do pergaminho podiam ser usados para escrever, o que economizava material. Os códices eram usados para fins religiosos cristãos entre 1 d.C. e 400 d.C., principalmente para estudos comparados. Os rolos de pergaminho e de papiros, usados popularmente, se tornaram uma forma de símbolo da resistência contra o cristianismo. A ascensão cristã elevou os livros a um status muito maior que os outros materiais mais antigos. Mas eram artigos ainda muito raros e somente o clero e os nobres tinham acesso. Por volta de 500 d.C., o ocidente entrou na Idade Média. O legado de Roma inclui arquitetura, engenharia, linguagem, direito e literatura. Seu alfabeto se tornou referência de design para sistemas de escrita por todo o ocidente (MEGGS, 2012, p. 98).

Já os manuscritos tiveram várias formas. As mais importantes foram as Capitalis Quadrata (maiúsculas quadradas), que tinha uma proporção imponente e era bastante legível. Os espaços entre letras eram generosos, mas não havia espaçamento entre palavras. Eram escritas entre duas linhas horizontais de base e as serifas eram adicionadas com a caneta. E as Capitalis Rustica (maiúsculas rústicas), que foram usadas no mesmo período, eram formas de letras condensadas para economizar tempo e espaço (MEGGS, 2012, p. 94-95).

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11. Escrita coreana (Representação ilustrada).


A escrita coreana (hangul) Antes disso, a escrita chinesa (hanzi) era utilizada, sem que a língua coreana tivesse uma forma escrita. Nem mesmo as línguas chinesa e coreana possuem parentesco. Enquanto a chinesa é uma língua “isolante” com palavras monossilábicas, o coreano é uma língua “aglutinante” mais complexa com palavras polissilábicas e sufixos gramaticais (SAMPSON, 1996, p. 129). Ou seja, para ser letrado na Coreia, era preciso estudar a língua e escrita chinesa. A China foi a maior fonte de cultura para a Coréia nos primeiros milênios de sua civilização, e ambas possuem muitas relações culturais até hoje, assim como o Japão e o Vietnã que surgiram muito depois da tão antiga e grande civilização chinesa. Parecido com o que aconteceu na civilização ocidental com a Grécia e Roma antigas como fonte de cultura para outros países europeus e americanos (SAMPSON, 1996, p. 128).

O hangul, que signfica “grande escrita”, ou alfabeto (alfassilábico) coreano, foi introduzido em meados de 1400 d.C, criado pelo imperador Sejong e uma equipe de acadêmicos que adaptaram alguns dos caracteres chineses, inventaram novos caracteres com a estrutura baseada na forma da boca e na posição da língua ao pronunciar o som, e desenvolveram meticulosamente um sistema fonográfico alfabético, ou seja, com consoantes e vogais, para que os mais simples cidadãos coreanos pudessem aprender, assim as normas culturais coreanas poderiam vingar. Com apenas quatorze consoantes divididas em cinco grupos sonoros e dez vogais representadas por linhas retas e pontos em diferentes posições (MEGGS, 2012, p. 98), numa estrutura interna traçal sistemática muito semelhante a estenografia (SAMPSON, 1996, p. 131). Diferente do sistema alfabético greco-romano, o hangul combina os fonogramas dentro de um retângulo imaginário para formar blocos silábicos, chegando a formar duas mil sílabas mais utilizadas no dia a dia (MEGGS, 2012, p. 98). Esse sistema de escrita é considerado por muitos teóricos como o mais científico de uso geral, o mais eficiente ou simplesmente como o melhor alfabeto do mundo (SAMPSON, 1996, p. 128).

A Coréia, em particular, foi tão influenciada pela China que seu objetivo era ser uma pequena China, concretizando as normas culturais chinesas melhor que a própria China. Atualmente, na Coréia do Norte, o hangul é a escrita exclusiva, enquanto na Coréia do Sul uma escrita mista é utilizada, com caracteres chineses, para palavras sino-coreanas e o hangul, para palavras nativas (SAMPSON, 1996, p. 131).

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OS TIPOS MÓVEIS

Meggs (2012, p. 140) define xilografia como termo técnico para impressão de uma superfície em relevo, originada na Ásia. E tipografia é o termo técnico para impressão de tipos (pedaços de madeira ou metal com uma forma esculpida em alto relevo) móveis e reutilizáveis. Segundo Meggs (2012 p. 139), o grande número de caracteres chineses provavelmente dificultavam na hora de organizar e encontrar os caracteres, e o tipo móvel nunca substituiu o processo manual tradicional de xilografia na China. E na Coréia, somente por volta de 1.403 d.C., uma versão de bronze dos tipos móveis foi utilizado.

As tecnologias só de contar e escrever histórias não seguiram um caminho linear. A própria escrita foi inventada pelo menos duas vezes, primeiro na Mesopotâmia e depois nas Américas. Os sacerdotes indianos se recusavam a escrever as histórias sagradas por medo de perder o controle sobre elas. Sentimento compartilhado pelos bardos da África Ocidental, que viveram 2 mil anos depois, quase do outro lado do mundo. Os escribas egípcios adotaram a escrita, mas tentaram mantê-la em segredo, com a esperança de reservar o poder da literatura para si mesmos. Professores carismáticos como Sócrates se recusaram a escrever, rebelando-se contra a ideia de que os textos fundamentais tivessem autoridade e contra as tecnologias da escrita que os tornaram possíveis. Algumas invenções posteriores foram adotadas somente de forma seletiva, como quando os eruditos árabes usaram o papel chinês, mas não demonstraram nenhum interesse por outra invenção chinesa, a impressão.

Em meados de 1400 d.C., por mais que a demanda e velocidade de fabricação de livros na Europa aumentasse a cada dia, nada mudaria se não houvesse papel o suficiente. O papel, feito de substratos caros como pele de carneiro, demandava muito tempo de trabalho para ser produzido, foi a principal barreira contra a produção de grandes quantidades que pudesse satisfazer a demanda de livros para a população. Nesse período, cartas de baralho impressas por um processo similar ao de xilogravura, circulavam pela população analfabeta da Europa, introduzindo as massas o reconhecimento de símbolos, sequenciamento e dedução lógica. Com a mesma técnica de impressão, páginas de livros religiosos ilustrados para instruir analfabetos eram gravadas em blocos separados em unidades de texto e imagem, desenhados num estilo simplificado com padrões dominantes, parecido com o que foi feito com os quadrinhos contemporâneos (MEGGS, 2012, p. 216-221).

— (PUCHNER, 2019, p. 18).

Na China, em 1045 d.C., o alquimista chinês Pi Sheng, aprimorou o processo de impressão de xilogravura desenvolvendo uma mecânica inovadora de tipos móveis feitos com uma mistura de argila e cola cozidos em fogo de palha até endurecerem. Os caractere poderia ser entalhado em matrizes individuais possibilitando a reordenação dos caracteres em uma chapa de ferro revestida com cera para manter os tipos no lugar, utilizando técnicas de alinhamento. Assim, a placa de ferro com os tipos móveis se tornava a grande matriz de impressão, como um bloco de madeira em xilografia, para transmitir a imagem montada ao papel. Depois que a imagem é reproduzida, a cera da placa de ferro era aquecida para afrouxar os tipos móveis, e então eram guardados em gavetas e organizados por rimas, devido às características não fonográficas da escrita chinesa (MEGGS, 2012, p. 138-139).

Assim que novos processos de produção de papel chegou provavelmente da China para a Europa, através do Oriente Médio pelos árabes, a disponibilidade de papel aumentou e novos processos de impressão apareceram para que um, em particular, vingasse, corrigindo problemas técnicos que existiam nos modelos anteriores. A prensa mecânica com tipos de metal misto desenvolvida pelo alemão

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DA ESCRITA ANALÓGICA À DIGITAL

Johannes Gutenberg em 1450 d.C., teve a Bíblia como o primeiro livro impresso e se tornou uma das invenções mais importantes do mundo. Conforme Meggs (2012, p. 224),

Línguas foram padronizadas, fixadas e conservadas pelo texto escrito. A distância entre o oral e o literário tende a aumentar até que se tornem duas linguagens distintas. A longa jornada da evolução das tecnologias da informação “[...] deu notoriedade a muitos e deixou milhares de outros no anonimato, ainda que suas contribuições tenham sido de maior importância.” A imprensa foi a protagonista desde o século XV até a imagem ser reinventada nos séculos XIX, XX e XXI com a televisão, cinema, vídeo, dvd, blu-ray, e as novas janelas abertas pela Internet. Mesmo assim, o livro continua sendo uma das mídias mais utilizadas entre as digitais e a mais usada entre as analógicas. Estamos envolvidos em uma realidade gráfica dupla de constantes e imprevisíveis mudanças. “A escrita não para de se transformar [...]” e a nos transformar. “O manuscrito, o texto real, cede lugar ao texto virtual, que pode ser alterado ad nauseam, ad infinitum.” (SAMPAIO, Adovaldo. 2009, p. 49-50).

O tipo exigia um metal que fosse macio o suficiente para moldar, mas duro o bastante para suportar milhares de impressões, e que não se expandisse e se contraísse quando derretido, derramado no molde de tipo e depois retornasse ao estado sólido enquanto esfriava. Como serralheiro, Gutemberg sabia que o antimônio prateado do metal branco se expande quando esfria do estado líquido para o sólido, em contraste com a maioria dos metais que se contraem quando resfriados. Ele desenvolveu uma liga exclusiva de 80% chumbo, 5% de estanho e 15% de antimônio para manter uma massa constante durante todo o processo de fabricação. (Traduzido pela autora).

O modelo de Gutenberg com antimônio foi utilizado por cerca de quatrocentos anos com melhorias radicais no processo de produção dos tipos. De acordo com Meggs (2012, p. 225), “Essa máquina precisa permitiu tremenda velocidade de impressão de qualidade consistente, em contraste com o método [...] usado no leste da Ásia e pelas primeiras impressoras de bloco da Europa.” (Traduzido pela autora).

Agora o mainstream (convenção, corrente principall) está sendo desviado, de forma rápida e decisiva, para um novo canal. A revolução eletrônica está chegando ao seu ponto culminante à medida que o computador [...] passa a ser nosso companheiro constante e a Internet passa a ser nosso meio de escolha para armazenar, processar e compartilhar informações em todas as formas, incluindo texto (além de imagem e áudio). O novo mundo permanecerá, é claro, um mundo letrado, repleto dos símbolos familiares do alfabeto. Não podemos voltar ao mundo oral perdido, da mesma forma que não podemos voltar o relógio para um tempo anterior à existência do relógio. 'Escrita, impressão e computaçãor', escreve Walter Ong, 'são todas formas de tecnologizar a palavra'; e uma vez tecnologizada, a palavra não pode ser des-tecnologizada. Mas o mundo da tela, como já estamos começando a entender, é um lugar muito diferente do mundo da página. Uma nova ética intelectual está surgindo. Os caminhos em nossos cérebros estão mais uma vez sendo redirecionados.

A palavra escrita transmitida com muito mais alcance pela imprensa foi como um catalisador do mundo antigo e do período medieval que resgatou e espalhou obras clássicas e desconhecidas pela grande massa, culminando na Renascença do conhecimento da Grécia Antiga e no início da era do pensamento científico moderno ocidental. Conforme Dondis (1997, p. 205-206), a partir daí, a história do design gráfico se inicia com a estilização dos tipos móveis e a produção de artes gráficas para materiais impressos fabricados em série. Após o século XIX, na Revolução Industrial, as técnicas de impressão tiveram melhoras exponenciais, levando a uma série de fatores que propiciaram o surgimento de ofícios como designer gráfico e quadrinista (cartunista).

— ((CARR, Nicholas. 2020, p. 77) (Traduzido pela autora).

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CARACTERÍSTICAS ESTRUTURAIS DA LINGUAGEM DAS HQS

símbolos universais ou clichês se fazem necessários para o reconhecimento da mensagem pelo leitor (EISNER, 2010, p. 2). Por mais que uma imagem sempre vai ser mais subjetiva do que uma escrita, os quadrinistas conseguiram desenvolver ao longo do tempo, padrões que podem ser lidos e reconhecidos pelos leitores, com o uso de imagens extraídas das experiências em comum do dia a dia das pessoas e com formas construídas ao longo do tempo numa relação mútua entre quadrinista e leitor. Esses padrões tornaram a arte gráfica dos quadrinhos mais eficiente para comunicar uma ideia. A postura corporal dos personagens, o gesto, a expressão facial, o enquadramento e o ritmo são alguns elementos que funcionam como meio para transmitir uma sensação ou uma mensagem, e cada qual possui a sua linguagem ou formas já estabelecidas no imaginário das pessoas, o que determina o potencial de uma narrativa gráfica ao transmitir uma mensagem.

História em quadrinhos é uma linguagem que se aprende, assim como qualquer outra e que requer uma experiência visual (EISNER, 2010, p. 1). Linguagem é todo e qualquer sistema de signos de um tipo definido, que seve para o fim de comunicação. — (SÁ, Adísia. 1973, p. 211).

Nessa experiência, a imagem e o texto interagem em conjunto, numa dinâmica híbrida. Em uma história em quadrinhos, a imagem é o aspecto primordial, enquanto o texto serve como uma extensão, podendo até mesmo não existir, como em uma pantomima, ou existir em forma de onomatopéias e/ou com tratamento gráfico que intensifica um sentimento que a imagem quer expressar. Na descrição de (EISNER, 2010, p. 2), aprender a ler uma história em quadrinhos é aprender a decodificar símbolos, integrar e organizar informações que chegam a percepção. “As regências da arte (por exemplo, perspectiva, simetria, pincelada) e as regências da literatura (por exemplo, gramática, enredo sintaxe) superpõem-se mutuamente.” É nos quadrinhos que, mais uma vez, a imagem e a escrita se sobrepõe para comunicar uma ideia.

Um elemento estrutural essencial na arte sequencial é a representação do tempo, simulado através dos símbolos gráficos que foram sendo aprimorados. Um desses símbolos é o balão de fala que expressa o som emitido por um personagem e enquadra a mensagem por escrito. Sua posição determina a ordem de leitura com relação a outros balões e pode ser usado para subdividir o texto criando uma ilusão de duração da fala (EISNER, 2012, p. 24). Até mesmo a forma do contorno do balão e a tipografia passaram a ter uma funções de caracterizar o som e o estilo de fala, como simular letras com origem estrangeira, um aspecto mecânico, textura de fumaça e outros recursos visuais que expressam alguma sensação sonora.

O desenvolvimento inexorável da tecnologia das comunicações desde a aurora da história intelectual do homem serviu para universalizar imagens da experiência humana comum. O seu emprego em hieróglifos repetitivos (posteriormente aprimorados até virarem letras) faz deles um código que permite a memorização e a decodificação.

Outro recurso fundamental para a transmissão do tempo é o uso da calha, que delimita a perspectiva e a ação de uma cena e é na sequência das cenas que o tempo é representado. Eisner (2012, p. 30) aponta algumas ações vivenciadas comumente que podem ajudar na percepção do tempo médio

— (EISNER, 2010, p. 103).

É importante um sistema de escrita para a prática da escrita assim como é importante um sistema de construção e leitura dos quadrinhos. Em ambos, a repetição e a disposição de

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são registradas, codificadas e posteriormente transformadas em símbolos e significados que passam a ser os representantes abstratos das imagens e engramas. No processo de abstração as sensações e as percepções passam para a categoria de significados (sinais e símbolos) povoando o universo conceitual de cada um de nós, adquirindo a coloração dos estados afetivos-emocionais e sentimentais de cada instante vivenciado. [...] O indivíduo emissor da mensagem, ao comunicar algo, põe no seu conteúdo muita coisa de si próprio, misturando-se e diluindo-se no próprio fenômeno da comunicação. [...] Os significantes podem manter referência ao significado, três tipos de relação: a) a icônica; b) a indicial; c) a simbólica. Icônica, quando é uma pura retratação. Entre significante e significado existe semelhança. Indicial, quando baseada em critérios de contiguidade e implicação. Simbólica, quando o significante se ligar a significados polivalentes seguindo um critério convencional. [...] A metáfora é um recurso semântico que se liga ao significado por um critério de convenção subjetiva (simbologia semântica); a metonímia e a sinédoque, também são recursos semânticos baseados respectivamente em critérios de contiguidade e implicação, sendo, portanto, índices.

em algumas cenas como “o pingar de uma torneira, o acender de um fósforo, o escovar dos dentes e o tempo que se gasta para percorrer uma escada.” O ritmo ou a duração de uma cena pode ser representado pelo número e tamanho das calhas em uma ação. O uso de calhas menores alude a um tempo mais curto, enquanto as calhas maiores dão a impressão de prolongamento do tempo. A sequência de uma ação depende das associações feitas pelo leitor entre cenas posicionadas de acordo com cada calha previstas pelo artista. Para que o leitor possa completar a lacunas e preencher uma ação completa, depende da experiência em comum entre quadrinista e leitor para que a leitura das cenas sejam reconhecidas. Controlar o olhar do leitor é um desafio para o quadrinista, como descrito por Eisner (2010, p. 40). Não é possível garantir que o leitor olhe para o último quadrinho antes dos primeiros. Mas o virar de páginas é um recurso que, embora não seja absoluto, pode ser explorado para criar suspense e outras sensações. Ele também aponta sobre o benefício dos quadrinhos digitais, onde há maior controle quanto a essa tendência de desviar o olhar devido ao sistema de rolagem da tela que mantém ocultas as cenas seguintes.

— (SÁ, 1973, p. 227-228 e 229)

ESTILO E LINGUAGEM VISUAL DAS HQS

[...] um sinal é considerado como base da inteligência animal. Pode haver sinais naturais — como o aparecimento do sol significa a chegada do dia — e sinais artificiais — como os que se usam para transmitir ordens a animais amestrados ou aqueles usados entre animais para transmitir mensagens de advertência (Langer, 1948:47). Um sinal indica ou estimula a atividade direta. Um símbolo é diferente porque o estímulo necessariamente não evoca diretamente uma reação física para fazer algo, mas sim denota uma concepção de algo na mente do receptor (Bryan, 1963:298). Essa distinção nos sugere relembrar que sendo a fala o fator fundamental que permite também a conceptualização de fenômenos imaginários como são ideados

A princípio, é importante relembrar de alguns conceitos de linguagem visual descritos por Koestler em “The Art of Creation”: “O pensamento por conceitos surgiu do pensamento por imagens através do lento desenvolvimento dos poderes de abstração e de simbolização, assim como a escrita fonética surgiu, por processos similares, dos símbolos pictóricos e dos hieróglifos” (apud DONDIS, 1997, p.14).

Sabemos que os sinais ou símbolos, são produto de um trabalho de elaboração altamente requintado de abstração. As sensações e percepções

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onde todos pudessem entender, embora nem todos pudessem reproduzir. A partir do momento onde as figuras passaram a ser mais abstratas, simplificadas e reduzidas aos seus componentes mais básicos, como os pictogramas, além de serem fáceis de entender, mais pessoas foram capazes de reproduzi-las. E quando elas atingiram o nível simbólico, onde a ligação com o objeto foi perdida e novas informações foram codificadas, como nos caracteres de um sistema de escrita, todos puderam entender e reproduzir, porém, o significado que lhe foi atribuído precisaria ser aprendido e se tornado uma convenção (DONDIS, 1997, p. 166-170).

na magia e na religião, que são fenômenos tidos como exclusivamente humanos. — (SÁ, 1973, p. 85-86)

Dondis completa que, nisso contém um grande ensinamento da comunicação. “A evolução da linguagem (escrita) começou com imagens, avançou rumo aos pictogramas, cartuns autoexplicativos e unidades fonéticas, e chegou finalmente ao alfabeto [...]”, e cada passo representou uma busca por mais eficiência na comunicação. Nesse processo de evolução, a mensagem visual se desdobrou em três níveis que se interligam e se sobrepõem, mas que são possíveis de serem distinguíveis: o representacional — aquilo que vemos e identificamos com base no meio ambiente e na experiência; o abstrato — a qualidade cinestésica de um fator visual reduzido a seus componentes visuais básicos e elementares, enfatizando os meios mais diretos, emocionais e mesmo primitivos da criação de mensagens, e o simbólico — o vasto universo de sistemas de símbolos codificados. (DONDIS, 1997, p. 85) O próprio nível abstrato tem seus subníveis, que parte do semi-abstrato, representação reduzida à mínima informação representacional como pictogramas, até o abstrato puro, desvinculado da forma visual conhecida como as pinturas de Wassily Kandisnky (DONDIS, 1997, p. 94-95). Estes níveis de representação, de forma isolada ou sobreposta, compõem os estilos visuais derivados das cinco grandes categorias gerais que abrangem os demais sub estilos existentes. São eles o primitivo, o expressionista, o clássico, o ornamental e o funcional.

O expressionismo, segundo Dondis (1997, p. 171), está estreitamente ligado ao estilo primitivo na questão do detalhe que é exagerado para que possa ser minimamente identificável. O que muda entre os dois é a intenção. O primitivo tem a tendência a representacionalidade, apesar de ser simples pela falta de técnica ou pela necessidade de ser simples. Já o expressionismo tem o objetivo proposital de distorcer a realidade para intensificar as emoções, este “[...] está presente sempre que o artista ou o designer procura evocar a máxima resposta emocional no observador.” (DONDIS, 1997, p. 173). Ainda de acordo com Dondis (1997, p.170):

A caricatura é um bom exemplo da manipulação da realidade das partes de um rosto humano, que, em conjunto, se assemelha muito mais à pessoa retratada do que um retrato realista. Por quê? Porque os traços específicos da pessoa retratada são exagerados, e o resultado coloca em curto-circuito as informações mais importantes, levando-as diretamente à percepção do observador.

As pinturas rupestres, devido ao momento histórico ao qual pertencem (e não como o sentido pejorativo de inferioridade), costumam ser chamadas de primitivas. Ela variou de nível representacional conforme foi a necessidade do artista. Quando usada para recriar uma situação onde a fidelidade para os detalhes precisou ser mais sofisticada, esteve mais próxima do nível representacional (imagético), produzida por uma pessoa habilidosa para ser uma linguagem

A caricatura é a contrapartida expressionista da simplificação do cartoon. Segundo McCloud (1995, p. 130-131), o cartoon é uma linguagem abstrata semelhante ao que os antigos sumérios faziam no surgimento das proto-escritas (o que ele chama de símbolos caricatos), que grad-

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Se as figuras, dependendo de como são feitas, podem representar coisas invisíveis como emoções, então, a distinção entre figuras e ícones como linguagem, que se especializam no invisível, pode parecer meio confusa. Na verdade, o que estamos vendo nas linhas vivas dessas figuras é a matéria prima da qual uma linguagem pode surgir!

ualmente foram ganhando níveis cada vez mais simbólicos até assumirem as formas da linguagem escrita moderna. Muitos quadrinhos apresentam a linguagem visual no estilo primitivo e/ou expressionista em vários níveis representacionais na composição das imagens, tendo como objetivos a acessibilidade da informação para o maior número de pessoas — as comics surgem nos jornais dos EUA com a intenção de atingir até os analfabetos, e também intensificar as emoções através de recursos gráficos, como no exagero das expressões e gestos, e os grandes olhos nos mangás, por exemplo. O expressionismo influenciou no estilo mangá de Hokusai. Scott McCloud compartilha da mesma visão quando demonstra o uso da caricatura como uma forma de universalizar as características de um personagem, assim todos podem se identificar com ele. De acordo com McCloud (1995, p. 121), “a ideia de que uma figura pode evocar uma resposta emocional ou sensual no espectador é vital nos quadrinhos”. Para evocar os sentidos, cores, texturas e formas eram exploradas no movimento expressionista, entre os séculos XIX e XX, por artistas como Munch, Van Gogh, Wassily Kandinsky e Paul Klee. Linguagem também utilizada em diferentes intensidades por cartunistas como Rory Hayes, Charles Schulz, Crumb, Kirby, Eisner, etc. (MCCLOUD, 1995, p. 122-126).

Quando as figuras expressam uma sensação com metáforas visuais, um símbolo surge, e os símbolos são a base de uma linguagem escrita ou visual. Quando muitos começam a usar um símbolo, ele se torna uma convenção e parte de uma linguagem comum (MCCLOUD 1995, p. 127-129). É assim nos sistemas de escrita e na linguagem estrutural de uma história em quadrinhos, como se pode constatar em Eisner (2012). Ou seja, pode-se traçar um paralelo dos quadrinhos com as artes visuais da antiguidade, não só na intenção de dispor imagens em sequência para uma narrativa visual, mas até mesmo em relação a própria linguagem visual que compõe o estilo das imagens. A linguagem estilística e os símbolos convencionais se desenvolveram de formas diferentes entre os quadrinhos ocidentais e orientais. Mas compartilham de princípios expressionistas e semelhanças estruturais elementares, o que os caracterizam como história em quadrinhos (MCCLOUD, 1995, p. 131 e 133).

Anjos (2015) aponta similaridades entre o trabalho de McKeever e os artistas do movimento expressionista por volta de 1900, tanto das artes plásticas quanto do cinema. Onde suas ilustrações feitas para publicações da DC Comics como “Superman’s Metropolis”, “Batman: Nosferatu” e “Wonder Woman: The Blue Amazon” são vinculados a filmes clássicos do cinema expressionista alemão, como “Metropolis”, de Fritz Lang. McCloud (1997, p. 127) levanta um argumento importante a respeito das figuras primitivas e expressionistas com relação ao surgimento de um sistema de uma linguagem escrita ou de uma linguagem visual:

O QUE É HISTÓRIA EM QUADRINHOS A definição de história em quadrinhos por dois dos grandes teóricos e quadrinistas ocidentais, Eisner (2010) e McCCloud (1995), engloba toda a arte sequencial com imagens justapostas destinadas a comunicar uma ação no tempo ou narrativa. Nessa definição, as artes sequenciais podem ser traçadas desde as pinturas egípcias nas paredes, registro em baixo relevo dos tempos antigos, fábulas da idade média até o formato que conhecemos hoje após o surgimento da prensa, as tiras de jornais, os

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usar uma linguagem de quadrinho moderno na primeira metade do século XIX. Contudo, mesmo este, parece ter sido precedido por outras obras, que, se investigado ainda mais a fundo em busca das origens dos quadrinhos, pode-se retroceder no tempo passando pelas iluminuras medievais, a tapeçaria de Bayeux, a Coluna de Trajano, criações chinesas em épocas remotas, até mesmo o Livro dos Mortos egípcio e as pinturas rupestres, levando a um início cada vez mais distante histórica e geograficamente, vinculando esta com o surgimento da própria escrita “a partir de uma lenta transformação de imagens imitativas do real em signos.” (CAMPOS, 2015, p. 9-10).

gibis, manuais de instrução, graphic novels e os quadrinhos digitais. As histórias em quadrinhos podem servir para entreter ou instruir. Os veículos popularmente usados atualmente são em impressos e on-line. Quadrinhos digitais em CD e vídeo são menos frequentes. Os materiais usados são os mais variados quanto a imaginação do quadrinista permitir, tanto analógicos quanto digitais ou uma forma híbrida. E inclui todos os estilos, desde o mais representacional ao mais abstrato e simbólico. Os quadrinhos tem histórico de influência na produção cultural em sociedades letradas no mundo inteiro, com quatro grandes mercados de quadrinhos reconhecidos. No ocidente: o mercado europeu, onde as primeiras narrativas visuais em impressos surgiram a partir da renascença; e o mercado norte-americano, reconhecido por popularizar os quadrinhos através de tiras de jornais e depois com a versão colorida de super-heróis em revistas seriadas, que se espalhou pelo mundo e dominou as prateleiras de muitos mercados, nacionais e internacionais. E no oriente: o mercado japonês com sua versão dos quadrinhos com estilo único chamado mangá; e o mais recente, o mercado coreano, com seus mangás digitais conhecidos como webtoons.

O historiador Patrick Destenay (apud CAMPOS, 2015, p. 10), define história em quadrinhos como a “justaposição de imagens, variações de forma a criar um certo ritmo e balões saindo da boca dos personagens para expressar suas palavras ou ideias.” Baseado nesta definição, o primeiro quadrinho é uma edição de “The Yellow Kid” de Richard Outcault de 25 de outubro de 1896, na qual há uma espécie de diálogo em balões entre o personagem Yellow Kid e o papagaio. Mesmo assim é questionável, pois o uso dos balões não foi recorrente na época, nem mesmo pelo autor. E como afirma Campos (2015, p. 13): “The Yellow Kid” passou a ser considerada a primeira HQ. Apesar de não ser. Apesar de não ser nem a primeira tira de jornal do mundo. Apesar de não ser nem a primeira HQ norte-americana. Apesar de não ser sequer a primeira HQ do próprio Outcault, que já havia criado outras [...].

É válido elucidar aqui, que, ao menos para fins deste presente trabalho, independente de haver ou não um inventor dos quadrinhos de fato, o mais importante é explorar como essa mídia foi se transformando e se afirmando ao longo do tempo, com seus diversos formatos possíveis. Até porque, não há uma unanimidade absoluta de teóricos que afirmam, ou evidências suficientes que comprovam, a favor de algum determinado autor ou obra como sendo a derradeira. Essa é uma questão que parece ser bem relativa. Sua resposta depende a quem e quando se pergunta. Encontrar as origens das histórias em quadrinhos depende, sobretudo, de como a classe quadrinhos é definida categoricamente.

Com base no mesmo autor a respeito disso, também pode-se dizer que, olhar somente para Yellow Kid no cenário norte-americano como pioneiro, é ignorar o desenvolvimento dos quadrinhos na Europa, no oriente e até mesmo dos próprios conterrâneos antecessores a este. Segundo aqueles que afirmam o pioneirismo de Outcault, uma HQ precisa ter pelo menos três coisas:

Apesar disso, de uma maneira bem ampla, Rodolphe Töpffer é considerado o primeiro a

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os Quadrinhos” de 2000, com sua versão brasileira publicada em 2006 se dispôs a buscar. O CD-ROM nos anos 1990 era o meio para distribuir as publicações digitais numa época em que a internet ainda era muito precária, mas esse suporte não era muito prático ou popular. Enquanto websites distribuíam versões digitais dos quadrinhos e cresciam gradualmente.

sequência de imagens, balões e um personagem recorrente, que protagonize várias histórias — daí a escolha do Yellow Kid como marco inicial. Mas essa definição elimina tantos quadrinhos anteriores a 1986, exclui também uma imensa produção do século XX e XXI. [...] Nem os balões, nem os personagens recorrentes — Groensteen propõe que o ‘princípio fundador’ dos quadrinhos seria o que chama de ‘solidariedade icônica’, uma interdependência de imagens em uma espécie de jogo de relações.

QUADRINHOS DIGITAIS

Em grande parte das publicações, o layout ainda era muito ligado ao quadrinho convencional, mas alguns se arriscaram a uma apresentação quadro a quadro ou outro formato para se adequar a tela do computador, quebrando a convenção de imagens justapostas. Antes dos smartphones, os quadrinhos impressos ainda representavam mais vantagens por serem portáteis e mais nítidos do que os digitais em que tinham que ser acessados por computadores robustos ou por algum aparelho que lesse o CD-ROM e transmitisse para uma tela de televisão. Aparelhos eletrônicos também eram objetos caros e menos acessíveis do que revistas impressas. Apesar das desvantagens daquela época, Scott McCloud sempre viu potencial no meio digital para os quadrinhos, devido ao rápido avanço das novas tecnologias, o que provou-se verdade com o aprimoramento da experiência do usuário no ambiente virtual. Como afirma McCloud (2006, p. 203), que os quadrinhos digitais são digitais em termos técnicos, mas muitos deles ainda são ligados ao formato impresso.

Com o advento da interface para computadores e a Internet, a produção e distribuição de quadrinhos entre os anos 1990 e 2000 aos poucos foram se difundindo entre os meios digitais. Os quadrinistas que desbravaram o potencial da nova tecnologia para produzir seus quadrinhos experimentaram diversos estilos e meios de distribuição. Animações em flash, interatividade por meio de hipertextos e outros recursos foram utilizados em uma busca por um formato que ainda não havia sido estabelecido no meio digital, e o que o teórico e quadrinista Scott McCloud em seu livro “Reinventando

Após o surgimento dos dispositivos móveis como smartphones e tablets, o desafio passou a ser encontrar o formato adequado para uma história em quadrinhos digital, pois o suporte não era mais o papel e precisava se adaptar aos novos meios e necessidades dos leitores, sem deixar de lado sua principal característica de ser uma arte sequencial com imagens justapostas e sem se tornar uma forma de animação multimídia muito menos eficaz que uma produção de cinema, já que, de acordo com MCCLOUD (2006, p. 210), a animação em um quadrinho que representa o tempo através do

— (CAMPOS, 2015, p. 17).

Campos conclui que a definição do que é uma HQ tem mudado à medida que esta evolui, o que altera a percepção que se têm a respeito da história dos quadrinhos. E Campos abre espaço para refletir que é possível que, o que tenta-se definir como história em quadrinhos, na verdade possa ser o início de algo que vai muito além. Considerando a mistura com outras linguagens e as mudanças que surgem com os novos avanços tecnológicos. O que, nas palavras do autor “[...] já faz com que imaginemos as possibilidades futuras dos quadrinhos. E, como consequência, a possibilidade de mudanças radicais de perspectiva histórica. [...] É muito difícil prever o passado que o futuro nos reserva.” (CAMPOS, 2015, p. 17 e 18).

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popularidade. Estão se espalhando mundialmente depois do sucesso no seu país de origem, e outros mercados estão absorvendo gradualmente a contribuição coreana à história dos quadrinhos (CHO, 2016). Os webtoons coreanos simulam o formato de “trilha temporal” numa “tela infinita” que McCloud (2006) explanou e se adaptou perfeitamente em telas de computadores e principalmente nas telas dos smartphones. Ele usa o termo “tela infinita” para caracterizar o aspecto praticamente infinito de quadrinhos na web, em comparação com a página impressa de quadrinhos em papel (MCCLOUD, 2006, p. 222).

tempo, torna supérflua a representação do tempo por meio do espaço, proporcionado pelas calhas entre os painéis com imagens estáticas. O que torna muito mais viável concentrar esforços em design e praticidade, quando o propósito é encontrar um formato digital adequado para os quarinhos (MCCLOUD, 2006, p. 213). O termo webcomics significa quadrinhos publicados em um site. Já quadrinhos digitais é um termo mais amplo que se refere a todas as diferentes formas produzidas e distribuídas digitalmente, incluindo quadrinhos em CD-ROM. Grande parte dos quadrinhos digitais eram webcomics com hipertextos, pois as limitações da tecnologia dos anos 2000 ainda dificultava muito a criação de narrativas utilizando zoom ou barra de rolagem. Formatos com hipertextos permitem que uma narrativa possa ocorrer de forma “infinita” com opções “ilimitadas”, porém a narrativa seria fragmentária e não seria um todo visivelmente conectado. Ou, nas palavras de McCloud, um “mapa temporal”, “uma trilha única de um momento a outro” onde “avançar pelo tempo requer um movimento através do espaço” do inicio ao fim, sem interrupção.

OS WEBTOONS COREANOS Webtoon, a junção de web e cartoon, ou em coreano conhecido como manhwa, palavra que deriva do uso japonês dos caracteres chineses que significa mangá, é diferente do conhecido mangá japonês. Também é mais específico do que quadrinhos digitais e webcomics. É, de acordo com Cho (2016), um estilo artístico de webcomic com um sistema específico de produção. Sintetizando, webtoon é uma história em quadrinhos digital para web estilo cartoon coreano. A descrição de Cho (2016) sobre o estilo artístico é sintética, objetiva, e pontua cada característica essencial em uma webtoon. Parafraseando sua definição e comparando com o formato tradicional de história em quadrinhos impressa, webtoon é uma narrativa gráfica de formato longo com layout vertical estendido e uso criativo das calhas, criados para otimizar a leitura em telas de dispositivos digitais, oferecendo maiores possibilidades para o uso de cores e de textos, e que possui uma direcionalidade de visualização regulada pela tela do dispositivo usado pelo leitor, o que influencia na interpretação do tempo e do espaço.

As pinturas rupestres paleolíticas da caverna de Lascaux exemplifica bem um “mapa-temporal” da forma mais simples, que pode servir como uma pista para os quadrinhos “pós-imprensa”, assim como em pinturas nas tumbas egípcias e na coluna de Trajano (MCCLOUD, 2006, p. 214-218). Nos suportes mais variados, a dinâmica de leitura do tempo através do movimento no espaço permaneceu o mesmo, só sendo adaptado a uma página de revista onde a ordem dos painéis não necessariamente segue uma linha reta ou contínua, mas segue uma convenção de leitura de livros, da esquerda para a direita e de cima para baixo, no ocidente. Os quadrinhos dos principais mercados — americano, europeu e japonês — ainda estão no processo de romper o vínculo com a antiga tecnologia usada para distribuir as publicações. Enquanto isso, na Coreia do Sul, um formato de webcomic surgiu e ganhou impressionante

Ao contrário dos quadrinhos de super-heróis nos EUA, a maioria dos quadrinhos coreanos não tem sequelas. A maioria dos gibis e webtoons coreanos esteve mais próxima das

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formas de graphic novels; eles costumam variar de dois a dez volumes, cerca de duzentas a trezentas páginas para cada volume, e têm linhas de enredo ampliadas, que não levam a novas séries baseadas nos personagens principais e em uma estrutura narrativa repetitiva. — (CHO, 2016) (Traduzido pela autora).

A direcionalidade mais regulada do webtoon que controla a prática de leitura do leitor é ideal para tratar de diversos gêneros como terror, suspense, drama e ação, pois pode-se acumular tensão controlando a ordem e a disposição dos painéis que o leitor vê. Por exemplo, a calha pode aumentar para cenas de drama e suspense, ou pode diminuir em cenas de ação para dar a sensação de velocidade. Com o formato vertical e o fluxo de leitura mais regularizado, o papel das calhas em uma webtoon é diferente de uma história em quadrinhos tradicional. Segundo Cho (2016), em qualquer tipo de história em quadrinhos “[...] A calha é o espaço onde ocorre a participação mais ativa do leitor. É nesse espaço que o leitor conecta ativamente os painéis adjacentes para construir o fluxo narrativo ”. Em uma webtoon:

Outras características que variam de uma história em quadrinhos tradicional para uma webtoon é referente ao sistema de produção, distribuição e circulação cultural (Cho, 2016). Plataformas via web e/ou aplicativos, disponibilizam seus serviços de distribuição gratuitamente — embora Cho (2016) pontue que a tendência seja a monetização do conteúdo —, são abertas para criadores amadores e algumas até ensinam a produzir. A quantidade de visualização em uma produção interfere diretamente nos lucros das plataformas, que são com anúncios e aumento de tráfego. Com funções de comentários e acesso a redes sociais, a comunicação entre leitores e produtores é ativa, o que facilita no feedback e alinhamento de interesses de imediato.

[...] A calha é usada para criar um espaço visual diversificado para acompanhar o texto. A calha às vezes ocupa mais espaço do que os painéis e contribui ativamente para a narrativa de várias maneiras. Em alguns casos, é usado para expressar a duração do tempo e / ou alterações de localização pelo seu comprimento. Uma calha distintamente longa implica um longo período de tempo ou uma grande mudança de cenário. Em outros casos, a calha usa uma cor ou desenho de fundo que define o tom de toda a história… As calhas dos quadrinhos impressos convencionais são um espaço visualmente monótono, geralmente um espaço branco e estreito entre os painéis.

Essas plataformas seguem um modelo já estabelecido em redes sociais, com sistemas de avaliação, comentários, atualizações frequentes de conteúdo, casando com o formato vertical das narrativas, o que acredita-se que tornarão os webtoons cada vez mais populares devido ao formato de rolagem vertical com o qual as pessoas estão acostumadas em seus smartphones. O último ponto levantado por Cho (2016) sobre a produção, é a transmidialidade disponibilizada para quadrinhos digitais, abrindo um leque de possibilidades criativas como o uso de música de fundo, GIF, vídeo e outras formas de interatividade, apesar da grande maioria não utilizar esses recursos. É questionável o uso de GIF e vídeo, pois são arquivos mais pesados que podem não dar certo dependendo da qualidade da internet do usuário da plataforma, além de ir contra o conceito de representar o tempo através do espaço, como discutido anteriormente.

— (CHO, 2016) (Traduzido pela autora).

Na tela de um smartphone, várias imagens com a mesma medida — geralmente acompanha a medida de uma tela de smartphone comum com resolução de 1080 x 1920 pixels no formato proporcional a 16:9 —, podem ser justapostas verticalmente para ampliar a sensação de continuidade e cada parte pode ser vista de acordo com a rolagem da tela do smartphone. Essa justaposição de

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A alguns anos atrás, o formato vertical poderia ser tedioso e agoniante para os leitores em geral por não possibilitar a visualização do todo e dificultar para o leitor o conhecimento do fim da história. Mas com o novo hábito criado pelo uso das redes sociais com a rolagem vertical, esse formato virou tendência. A Coreia, com a grande maioria da população com acesso a Internet de boa qualidade, soube aproveitar isso. “Essa diferença na produção / recepção na Coréia pode ter sido devida em parte à velocidade competitiva da Internet na Coréia, mas isso não pode explicar tudo.”(CHO, 2016).

imagens estendendo a verticalidade do layout aumenta a sensação de continuidade e causa diversos efeitos expressivos, distintos dos quadrinhos impressos. O espaço de tempo experimentado com a rolagem de um painel vertical extremamente longo, por exemplo, produz um efeito artístico cinematográfico e uma percepção de espaço e tempo diferente da de uma história em quadrinhos convencional. De acordo com Cho (2016), as calhas de uma webtoon também permite e exploração do espaço para distribuir conteúdo textual de várias maneiras. Os criadores de quadrinhos geralmente movem partes ou até todo o texto (legendas, monólogo, diálogo, narração e palavras para som ou movimento) fora do quadro. Realocar o texto para fora do painel pode dar o tom narrativo que o autor precisa, como criar a sensação de ter um narrador-personagem em primeira pessoa, ou efeitos diferentes dependendo do contexto.

Principais plataformas Segundo Cho (2016), antes do layout vertical, em 1999-2000, alguns websites como o N4 e Comics Today criaram páginas horizontais para serem ajustadas ao desktop. O primeiro webcomic coreano a usar o formato vertical foi o “Memórias de Pape e Popo” de Sim Sŭnghyŏn, publicado no portal Daum em 2002. Mas o formato ganhou popularidade com “Sunjŏng manhwa” de Kang P'ul no mesmo portal em 2003, sendo aderido por outros criadores neste e e no portal Naver.

Também há a possibilidade de fazer uma versão impressa dos webtoons. Já existem alguns modelos onde QR code são usados para que o leitor possa acessar conteúdos digitais diretamente do smartphone. E assim como os quadrinhos impressos, os webtoons são frequentemente adaptados para filmes, séries, novelas, musicais e teatro. “Os produtores da indústria cinematográfica costumam ler novos webtoons para encontrar possíveis cenários e oferecer ao criador um contrato mesmo muito antes do término da serialização do webtoon.” (CHO, 2016).

Após o sucesso na Coréia, os principais portais de webtoon vêm promovendo-os. Em 2012, a primeira plataforma online de quadrinhos norte-americana foi lançada pelo portal coreano Daum. Em 2014, o Naver lançou o LINE Webtoon, primeira plataforma mundial com website e aplicativo com conteúdos gratuitos, tradução para vários idiomas, atualizações diárias, rolagem por toque, opção de download, notificações push, seções de compartilhamento e comentários. Ambos são abertos para criadores e leitores não-coreanos e disponibilizam os webtoons coreanos traduzidos para o inglês. A intenção dos criadores dessas plataformas é expandir a popularidade dos webtoons para fora da coreia nos próximos anos.

Parafraseando Cho (2016), o webtoon é uma nova forma de mídia inovadora criada coletivamente que se tornou parte fundamental da cultura popular coreana e que têm o potencial de mudar a cultura geral dos quadrinhos para sempre. A Coreia dominou o formato de layout vertical, a característica mais significativa de uma webtoon, o que a fez se desvincular mais rapidamente das publicações impressas em comparação aos EUA e o Japão, principalmente.

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“Tapas” gamificação na experiência do usuário: “modelo de engajamento do usuário, com recursos como recompensas pelo compartilhamento ponto a ponto”. (GROSS, 2016). Esse modelo tem mostrado sua eficácia em gerar receita com conteúdo e envolver os usuários no aplicativos de jogos e é praticado pelos profissionais de UX design por todo o mundo.

Além do formato vertical, outra força impulsionadora dos webtoons foram as plataformas online de distribuição gratuita com um modelo de negócio voltado para a cultura mainstream e espelhado em redes sociais como Youtube e Instagram. Numa entrevista em 2013 para o portal “Den of Geek”, Chang Kim, fundador e CEO do Tapastic declara que a intenção é de sempre facilitar para o criador ou criadora de webtoon, disponibilizando a plataforma para que ele ou ela só precise se preocupar com a criação dos painéis e com o seu público leitor. Assim como faz o Youtube em relação aos criadores de vídeos.

“LINE Webtoon” O portal Naver, já mencionado antes, opera a plataforma LINE Webtoon desde 2004. Só em 2014, foi lançado em todo o mundo, tanto a versão para web quanto o aplicativo, dentro da família LINE da Naver Corporation, e hoje é o maior portal de webtoon do mundo. Além de ser a pioneira em plataforma para web smartphone, seu diferencial com relação ao Tapas está no modelo de negócio e em algumas configurações de sistema.

Você não precisa se preocupar em criar seu próprio site, não precisa se preocupar em gerenciar e não precisa se preocupar com as tendências do Google ou a otimização para dispositivos móveis, porque fazemos tudo. Fornecemos tecnologia e plataformas para que os criadores de conteúdo não precisem se preocupar com coisas maiores e possam se concentrar no que fazem de melhor, na criação de conteúdo.

Diferente da preferência por conteúdo mainstream do Tapas, nas palavras do fundador da plataforma, Junkoo Kim, em uma entrevista de 2015, “O LINE Webtoon estabeleceu o objetivo de obter todos os tipos de leitores, preparando diferentes ofertas de conteúdo”. Dessa forma, o LINE faz sua receita com merchandising, colocação de produtos e assinaturas que permitem aos usuários ler novos capítulos antes de serem disponibilizados para todos.

— (Chang Kim, 2013) (Traduzido pela autora).

A partir do ano de 2016, o app do Tapastic passou por muitas mudanças, inclusive o nome foiadaptado para “Tapas”. O modelo de negócio se tornou freemium, que oferece partes de conteúdo de graça para estimular a compra, assim como acontece em jogos como “Candy Crush”. A interface foi atualizada para os padrões atuais de design, e produtos premium foram adicionados ao lado dos gratuitos. Os leitores podem iniciar a leitura de livros e outras histórias de graça e pagar para desbloquear episódios subseqüentes ou pagar pelo livro inteiro, com preços baseados no valor de mercado atual. A plataforma também ganhou

O aplicativo é disponibilizado gratuitamente para dispositivos Android e iOS, e oferece conteúdos totalmente gratuitos inclusive para download possibilitando a leitura no modo offline. Também oferecem formas de monetizar alguns criadores de webtoon que se destacam mensalmente para continuarem a publicar seus conteúdos e aumentar ainda mais o sucesso tanto do artista quanto da própria plataforma.

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traços que fazem a personagem ter força para seguir em frente até seu objetivo final; Bônus — são características intrínsecas que ajudam na superação de obstáculos a medida em que a personagem avança, e quanto mais sutís eles forem melhor; Desafios — o oposto de bônus, essa categoria se refere a características físicas, mentais ou espirituais da personagem que a atrapalham, geralmente o que ela teme é o maior desafio dela na história, e para atingir o objetivo, a personagem deve superar esse medo; Idiossincrasias — traços que fazem a personagem se destacar, como um tique, um gosto muito pessoal ou uma opinião impopular, e tem grande efeito em personagens secundárias.

METODOLOGIA NARRATIVA Criação de personagens Segundo Schmidt (2018, p. 28-29), as personagens são os principais elementos de engajamento em uma história. É através delas que os leitores se identificam e se afeiçoam, criando uma empatia que torna a história uma experiência cativante e inesquecível. Essas são as metas que todos os escritores querem atingir, pois determinam o sucesso criativo e financeiro da história. Por isso, é importante levantar características da personagem como etnia, classe social, situação econômica e ofício. A ideia para o roteiro precisa estar ligada a personagem principal de maneira que, se houver alteração em um, o outro também deve mudar. A protagonista precisa fazer grande diferença na história, de maneira que, se fosse substituída por outra, a trama mudaria drasticamente.

Não precisa ser importante ou muito necessário, mas torna a personagem mais rica, mais interessante, memorável ou cômica. Pode servir de um truque que se crie a ilusão no leitor de que nem tudo importa, assim tem mais chances de o surpreender. Para essa tarefa, Schmidt sugere o uso de um diagrama, onde o objetivo está no centro e é o ponto de partida. Conforme os círculos são preenchidos, novas informações são adicionadas em círculos concêntricos. A direita, estão as coisas que trabalham a favor, e a esquerda contra, a personagem.

Os ingredientes essenciais de qualquer uma grande personagem, de maneira geral, são: objetivo — o que motiva a personagem a uma jornada, o que definirá o seu sucesso ou o fracasso. Esse objetivo pode se tornar outro, ao longo da jornada; Atributos particulares — são qualidades que tornam a personagem perfeita (ou o total oposto em caso de comédias e horror) para atingir o objetivo, o que faz dela a candidata perfeita para história; Motivação — o que justifica a vontade da personagem de não fazer mais nada além de atingir o objetivo; Background — a história por trás da vida da personagem que justifica seus atributos particulares, ligada a sua motivação. Somente após a definição da história e dos atributos, é possível definir o design visual das personagens (SCHMIDT, 2018, p. 30-31).

As seguintes características são chaves para definir propriamente o design visual das personagens: Esquema de cor — as cores possuem temas associadas a elas que podem contribuir com a personalidade e é uma boa maneira de contrastar uma personagem da outra; Silhueta — definir as formas também facilita identificar a personagem, pode dizer alguma coisa sobre sua personalidade e pode torná-lo mais fácil de ser lembrado; Marcas distintas — ajuda a manter o personagem distinguível apesar das variações que podem ocorrer no desenho no decorrer da história; Funcionalidade — antes de definir quais serão as roupas e os ítens que a personagem irá vestir, é fundamental pensar antes no que ela necessita fisicamente; Aparência — assim como a funcionalidade, é importante pensar antes no

Conforme Schmidt (2018, p. 32-36), uma personagem bem construída, possui várias camadas de complexidade. Existem categorias específicas para definir os atributos de cada camada, e ao preencher essas categorias, novas ideias para o roteiro também podem surgir. Essas categorias são: Atributos de motivação — são

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quão difícil é passar por tudo isso, e simbolizará uma grande vitória quando a personagem atingir seu objetivo.

que a aparência da personagem revela sobre quem ela é (SCHMIDT, 2018, p. 36-39). Todas as personagens devem ser criadas com as mesmas premissas, inclusive a vilã. Mas a vilã, ou antagonista, precisa ser criada depois da heroína da história, pois suas intenções e ideologias são opostas. A vilã não pode querer fazer o mal sem um motivo real, ela deve ter um objetivo em mente, e em sua perspectiva, deve acreditar que está certa. Segundo Schmidt (2018, p. 51) “As melhores vilãs fazem isso porque são grandes personagens primeiro e vilãs apenas por circunstâncias ou pontos de vista.” (Traduzido pela autora).

Uma técnica para visualizar a jornada, é desenhar uma linha onde o ponto inicial define como sua personagem começa e, no outro extremo, como ela termina. Pode-se indicar os grandes eventos ao qual a personagem passou e que a mudou. Essa linha não precisa ser seguida a risca. Se a personagem der voltas algumas vezes isso pode fazê-la parecer mais real. Talvez ela nem seja capaz de atingir seu objetivo, e tudo bem. O que importa é ser fiel às suas características. Ela pode servir tanto como um bom exemplo quanto um exemplo do que não deve ser feito (SCHMIDT, 2018, p. 41-42).

Dentre a protagonista e a antagonista, existem as personagens auxiliares. Elas não dirigem a história mas devem cumprir uma função, e também devem ter seus objetivos e motivações, mas sem exageros. Os arquétipos mais comuns para este tipo de papel, de acordo com Schmidt (2018, p. 62), são: “o velho mentor sábio, o ajudante engraçado ou simpático, a mãe amorosa, o pai duro, o melhor amigo do encrenqueiro e assim por diante.” Mas o melhor é evitar ser muito clichê, desafiando as expectativas do leitor trocando o papel do sábio de um velhinho paciente para uma garotinha arrogante, por exemplo.

Estrutura da história

A jornada ou o arco da personagem

Toda história pode ser resumida em uma única frase, reduzida às partes mais elementares. Posto todas as etapas anteriores, pode-se definir a sentença da história seguindo a seguinte estrutura, conforme Schmidt (2018, p. 43): "A personagem tenta atingir o objetivo realizando esta ação." Esta sentença é composta por quatro partes: personagem, objetivo, ação e conclusão. A conclusão é onde se reconhece se a personagem alcança o objetivo ou não (SCHMIDT, 2018, p. 45-46).

De acordo com Schmidt (2018, p. 39), é através da jornada que a personagem se vê forçada a mudar, e essa mudança acontece durante o processo. O importante nessa etapa é definir onde e como a personagem começa e onde e como ela termina. É aqui que o enredo se torna totalmente ligado a personagem. Definindo as características da personagem dá para deduzir quais obstáculos devem estar no caminho dela durante a jornada. Para alcançar o objetivo, ela deve superar os obstáculos. Ela terá de lidar com a perda também, com situações que acabam fazendo-a retroceder. Mas isso é bom para o engajamento do leitor, que saberá o

Este será o enredo, e a partir dele, o resto da história se desenvolve. Mas, toda boa história precisa de um conflito, que geralmente, vem com a antagonista ou com obstáculos. A história começa a funcionar quando a personagem tem um objetivo claro, toma uma ação clara e entra em conflito no processo (SCHMIDT, 2018, p. 48-50). Pode haver vários conflitos, mas sempre terá um conflito central maior do que todos os outros, e geralmente, é algo pessoal para a personagem e é a causa direta ou indireta dos conflitos menores. “Para atingir o objetivo, sua personagem principal deve resolver o conflito central e, para fazer isso,

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A cena é o que marca um início e um final de um ato. No começo da cena, deve-se estabelecer o “quem, o quê, onde e quando” para orientar o leitor. A cena deve cumprir um propósito que é o de dar um passo adiante na história ou fornecer uma informação importante para o leitor (de forma sutil). Todas as cenas tem um local e um horário específico, e cada uma deve levar a outro lugar, para a próxima cena. Ela precisa entregar ou expor algo e deve fazer uma transição da carga emocional — super positiva, positiva, neutra, negativa ou super negativa — do início pro final (SCHMIDT, 2018, p. 57).

ela precisará superar qualquer número de pequenos conflitos ao longo do caminho.” (SCHMIDT, 2018, p. 51) (Traduzido pela autora). Conforme Schmidt (2018, p.54) “A estrutura da sua história é uma série de atos que terminam em um clímax final.” Ela é discutida em termos de atos, incidente incitante, cenas e pontos de virada/climax. Exemplo:

Ato 1 Incidente incitante Número de cenas Ponto de virada/Climax

A cena deve afetar o curso da história e do personagem. Algo deve ocorrer, e esse algo é o que Schmidt chama de ponto de virada, podendo haver mais de um por cena. “É o momento em que uma cena faz uma mudança dramática na direção e/ou no tom.” (SCHMIDT, 2018, p. 60) (Traduzido pela autora).

Pode haver quantos atos forem necessário, nem mais nem menos. Se a estruturas das personagens foram bem construídas e interligadas, os atos se auto-revelam. Eles devem ser descobertos e não criados. Sobre a definição conceitual dos atos, Schmidt (2018, p. 56) afirma que:

Há dois tipos de ponto de virada que se relacionam: o da personagem, este é o mais importante, pois sem ele o outro não tem sentido; e o do enredo, onde ocorre a mudança na direção da narrativa, e o qual só é válido se afetar as personagens. “Histórias são sobre uma personagem, e não um enredo.” (SCHMIDT, 2018, p. 94) (Traduzido pela autora). Após definir todos os aspectos citados anteriormente, constrói-se a coluna da história, onde são descritos os eventos principais com linearidade.

Do ponto de vista da estrutura, os atos são os maiores segmentos da sua história. Cada ato começa com um nível de tensão relativamente baixo e, em seguida, a tensão sobe de maneira bastante consistente ao longo de sequências e cenas até que a tensão seja liberada de alguma forma em um clímax de ato ou em um evento decisivo. Quando o ato culmina, a tensão na história diminui. Normalmente, um novo ato começa e a tensão começa a subir novamente. Os dois lugares em que esse ciclo é um pouco diferente estão em seu primeiro ato, simplesmente porque o incidente que desencadeia sua história deve estar lá. E no ato final da sua história, há um desfecho ligeiramente diferente que se segue, em vez do início de um ato totalmente novo.

O ideal, é que o escritor consiga sintetizar todos os principais elementos da história em uma única página de apresentação, como mostra o seguinte esquema por Schmidt (2018, p. 63) dividido em seções: Sentença da história; Premissa (um argumento mais impactante que a sentença); Cenário (descrição geral de onde ocorre a história); Descrição e biografia da personagem principal); Descrição e biografia da antagonista (ou principal obstáculo); e Coluna da história.

— (Traduzido pela autora).

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Script: o formato narrativo para HQs

tempo. Precisa-se ter sempre em mente que se trata de uma mídia visual onde as imagens precedem a palavra escrita.

De acordo com Schmidt (2018, p.89), a estrutura da história para o formato quadrinhos é composta por camadas. A primeira divisão a ser feita dentro do script é com a coluna da história, que deve ser seccionada por capítulos. Exemplo de estrutura: Intro (três páginas); Capítulo 1 (dez páginas); Capítulo 2 (dez páginas); etc. O número de maiores atos da história determina o número de capítulos. Estes capítulos geralmente são separados pelo maior ponto de virada no momento de maior tensão, ou quando ocorre um alívio da tensão, onde um ato termina. O primeiro cria uma curiosidade no leitor para ir ao próximo capítulo, e o segundo proporciona a sensação de um todo concluído.

Após esta etapa, Schmidt (2018, p. 115) descreve mais uma subdivisão, onde as cenas são subdivididas em páginas. Contudo, para fins desta pesquisa em particular, este tópico não é muito relevante, já que uma webtoon não possui divisão de páginas devido ao seu sistema de rolagem nos formatos digitais. As divisões em uma webtoon são um pouco diferentes, mas equivalentes. Considera-se que os capítulos equivalem às temporadas das webtoons e as cenas equivalem aos episódios. A divisão seguinte é sobre os painéis. No caso dos quadrinhos impressos, cada página é subdividida em painéis. Já nos webtoons isso ocorreria já na etapa das cenas ou episódios. No script, os painéis são numerados em ordem de leitura e contém informações organizadas para a criação da ilustração, tais como: descrição do cenário, diálogo, onomatopéias, os tipos de balões, etc. Cada painel deve ter apenas uma ação, ou pelo menos uma ação importante para o andamento da história, pois o leitor busca por algum acontecimento em cada um. A última divisão é com relação aos balões de diálogo, se houver. Também devem ser numerados em ordem de leitura (SCHMIDT, 2018, p. 127 e 131).

A segunda divisão ocorre com os capítulos, que são divididos individualmente por cenas. Neste momento, se prolonga uma lista de tópicos, onde aos poucos, e constantemente, são preenchidos por detalhes. O mais importante é que se saiba onde estão os pontos de virada e quando eles ocorrem. Lembrando que cada cena precisa começar com uma carga emocional e terminar com outra. Haverá cenas em que se deve fazer uma exposição obrigatória de informações necessárias para que o leitor conheça os detalhes da história. Elas podem ser feitas de formas sutis, como através do cenário, em um diálogo ou em situações que prestam um serviço a mais de diversão, por exemplo. A quantidade de cena determina o quão densa será a história (SCHMIDT, 2018, p. 98 e 110).

Estes são os fundamentos para escrever uma história em quadrinhos. A partir deste ponto começa o trabalho artístico de criar as imagens. É importante ter em mente alguns princípios de linguagem visual, simbolismo, tema, imaginário coletivo e outros aspectos que já foram abordados nesta pesquisa na seção sobre estilo, linguagem visual e características estruturais dos quadrinhos, que são importantes para alcançar eficiência na comunicação.

Nas primeiras seções do primeiro capítulo é onde mais se precisa estabelecer sobre as personagens, como nomes, relacionamentos, o mundo onde eles vivem, e sobre o que será a história, assim como chamar a atenção do leitor o suficiente para que ele queira continuar acompanhando. Mas em todas as cenas precisam transmitir alguma ideia de lugar e

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METODOLOGIA DE PROJETO DE DESIGN O método utilizado neste projeto de design é o método proposto por Bruno Munari no livro “Das Coisas Nascem As Coisas”, edição brasileira de 2008.

5ª ETAPA: criatividade (C) Dá-se início ao projeto. A ideia intuitiva é substituída pela criatividade, ou a forma criativa de se solucionar um problema. A criatividade se mantém nos limites impostos nos sub-problemas e na análise dos dados.

1ª ETAPA: definição do problema (DP). O processo de design auxilia tanto na criação de possíveis ideias quanto no processo de solução do problema. Ao resolver um problema, é preciso conhecê-lo e defini-lo para que se saiba os caminhos possíveis a serem tomados. Antes da ideia criativa, o método propõe definir o tipo de solução que se deseja atingir. São elas: solução provisória, solução definitiva, solução puramente comercial, solução fantasiosa (sem apelo comercial), solução que dure em um determinado momento, solução tecnicamente sofisticada ou solução simples e econômica.

6ª ETAPA: materiais tecnológicos (MT) Trata-se da análise dos materiais tecnológicos disponíveis para a produção. Assim, as soluções podem ser pensadas em termos de viabilidade. 7ª ETAPA: experimentação (E) Materiais e as técnicas disponíveis são experimentadas para que se possa descobrir formas diferentes de aplicação do mesmo produto. 8ª ETAPA: modelos (M) Construção de modelos, resultados das experimentações e amostras da etapa anterior. É onde soluções para sub-problemas começam a emergir para que se juntem na solução do problema global do projeto. Esboços ou protótipos são técnicas utilizadas para se construir um modelo econômico e rápido para a visualização do que pode vir a ser a solução do problema.

2ª ETAPA: componentes do problema (CP) Qualquer problema pode ser dividido em vários pequenos componentes, onde pequenos problemas se tornam evidentes e podem ser resolvidos por etapa. Aqui se reconhece as características funcionais, tais como: características materiais, psicológicas, ergonômicas, estruturais, econômicas e formais. O número de sub-problemas vai depender da complexidade do problema maior.

9ª ETAPA: verificação (V) Se refere a verificação dos modelos em termos de funcionalidade e técnica para que os melhores e piores aspectos possam ser levados em conta na construção do modelo final.

3ª ETAPA: coleta de dados (CD) Os componentes dos problemas são sintetizados. É feito um briefing mais detalhado possível, com dados sobre produtos relativos, os tipos, quantidade, qualidades, problemas, etc.

10ª E 11ª ETAPAS: desenho de construção (DC) e solução (S) Levando em consideração todas as indicações da etapa anterior, constroi-se então um modelo final, um protótipo de alta fidelidade que vai resultar na proposta para a solução do grande problema, para que então, na última etapa de solução, seja feita uma síntese dos dados levantados ao longo de todo o processo e cada etapa de produção até chegar na resposta, justificando a solução final.

4ª ETAPA: análise de dados (AD) Todos os dados devem ser analisados para que se saiba como os sub-problemas foram resolvidos em outros casos, quais caminhos se pode seguir e quais evitar para economizar tempo de produção. Com prioridade para a análise de valores técnicos, os estéticos são secundários. Faz-se, então, um briefing do produto em questão com informações relevantes, metas e expectativas.

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O PROJETO

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Com base nas análises e reflexões teóricas realizadas, inicia-se a etapa do desenvolvimento do do webtoon como projeto de design. O método utilizado neste projeto de design é o método, como descrito anteriormente, proposto por Bruno Munari no livro “Das Coisas Nascem As Coisas” da edição brasileira de 2008, suplementada por etapas metodológicas voltadas para a criação da narrativa. Dividiu-se o processo em cinco partes para melhor visualizar as etapas em níveis de materialização do projeto, facilitando a organização cronogramática. Estes níveis foram definidos como: nível 1: teorização; nível 2: problematização; nível 3: criação; nível 4: experimentação e nível 5: prototipação. A idealização prévia da história, levantamento de dados e a criação conceitual dos personagens foram realizadas simultaneamente aos levantamentos de dados no nível 1 do projeto, discutido nos capítulos anteriores deste presente documento. A partir do nível 2, inicia-se a segunda metade do TCC: o projeto gráfico em si. Nesta etapa, as metodologias se entrelaçam como uma só, todas as informações levantadas anteriormente ganham aplicabilidade e o projeto começa a se definir. No nível 3 é onde a produção de fato se inicia, estendendo-se ao nível 5, final do processo.

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NÍVEL 1

TEORIZAÇAO TEORIZAÇÃO

Enquanto preparava a primeira metade do TCC, toda a parte dos fundamentos teóricos e metodologias, coletava materiais, ideias e referências que considerava interessante para a construção de mundo da minha história.

Muito do que existe neste mundo ficcional surgiu de forma expontânea. Permiti tempo para minha mente processar e cultivar orgânicamente a criação. A coleta de dados para os fundamentos teóricos do TCC1 também enriqueceram meu imaginário.

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12. Rafe 1: Primeiro rafe de “To the Wind” ( “Ao Vento”).

Tudo começou com uma ideia. Imaginei um cenário fantástico num deserto tropical, inspirado no Saara. A partir disto surgiu um pequeno roteiro e duas personagens principais. Registrei. Estava plantada a ideia, a sementinha da criatividade.


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13. Primeiras ideias para o roteiro de “To the Wind” ( “Ao Vento”).


NÍVEL 2

PROBLEMATIZAÇÃO

RESULTADOS DE PESQUISA

1ª ETAPA: PROBLEMA E DEFINIÇÃO DO PROBLEMA (DP). Adaptação do roteiro para quadrinhos, concept art e design de personagens para a proposta de webtoon de Stefany Araujo como produto de TCC. Solução fantasiosa (sem fins comerciais previstos).

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2ª ETAPA: COMPONENTES DO PROBLEMA (CP).

segunda que se iniciou do 116º até o 121º episódio, e contando. Segue a sinopse descrita na página principal da história: “Testemunhe o que os deuses fazem ... depois de escurecer. As amizades e as mentiras, as fofocas e as festas selvagens e, claro, o amor proibido. Porque afinal os deuses não são tão diferentes de nós, especialmente quando se trata de seus problemas. Elegante e envolvente, esta é uma das maiores histórias da mitologia - A tomada de Perséfone - como nunca foi contada antes.”

Características materiais: História em quadrinhos digital para web estilo cartoon coreano. Tecnologias de produção: Artesanais, como materiais de papelaria, e digitais, como software de criação e edição de imagem. Conhecimentos técnicos necessários: Aspectos técnicos de webtoon (espaçamento, leiturabilidade, clareza, formatação), estrutura de uma história em quadrinhos, linguagem visual, metodologia narrativa (construção de personagem, construção da jornada, construção de roteiro, etc.).

Produto “B”: “Subzero” Esta é uma produção que vem se mantendo pelo menos no top 10 por muito tempo. Consegue atingir leitores tanto masculinos quanto femininos, de idades entre 10 e 20 anos para masculino e entre 10 e 40 anos para feminino. É classificada principalmente como romance, mas também entrega uma mistura interessante de outros gêneros como drama, fantasia, ação e histórico. As cores são bem vivas na arte gráfica. É atualizada com um novo episódio toda segunda-feira, desde 22 de Outubro de 2018 até o presente momento com 83 episódios, e continua a ser produzido. Segue a sinopse descrita na página principal da história: “O que você sacrificaria para salvar sua família? Até onde você iria para proteger seu povo? Para Clove, a última princesa de um clã do Dragão quase extinto, a resposta é o impensável: CASE-SE com seu maior inimigo jurado em um esforço para trazer paz para sua terra.”

Nicho: Gêneros e sub-gêneros literários como ficção para jovens adultos, fantasia, mistério, histórico, aventura, amizade, identidade, relações, romance, seres antropomórficos, poderes elementais, mitologia. Entregáveis: Protótipo do episódio piloto e “bíblia” da produção.

3ª ETAPA: COLETA DE DADOS (CD) E 4ª ETAPA: ANÁLISE DOS DADOS (AD) Análise de produtos similares. Produto “A”: “Lore Olympus” Esta é uma produção que vem se mantendo no topo dos mais populares por meses seguidos. A maioria dos leitores, de acordo com a plataforma, são femininos, atingindo idades entre 10 e 40 anos. É classificada principalmente como romance, mas é enriquecida com aspectos multi gêneros como ficção fantástica e mitologia grega, e possui uma das artes gráficas mais coloridas da plataforma. É atualizada com um novo episódio todo domingo, desde 4 de Março de 2018 e continua a ser produzido. Recentemente ela se dividiu em duas temporadas. A primeira com 115 episódios e a

Produto “C”: “Castle Swimmer” Esta é uma produção que consegue estar entre as mais consumidas tanto entre o público feminino quanto o masculino entre 10 e 40 anos. Isso se deve pelo aspecto “heartwarming” da produção, termo utilizado na plataforma para classificar histórias que aquecem o coração. Mas é classificada principalmente como fantasia, misturando romance e drama. Seus

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vez por todas. (Uma reimaginação de 1001 noites baseado no romance YA {Young Adult Fiction ou Ficção para Jovens Adultos} de Renee Ahdieh).”

personagens são seres antropomórficos. O gráfico é bastante colorido e a tons pastéis. É atualizada todo domingo desde 5 janeiro de 2019 até o presente momento com 65 episódios divididos em duas temporadas. A primeira vai até o 41º mais quatro extras, e a segunda segue do 42º ao 65º com novos episódios a serem lançados. Segue a sinopse descrita na página principal da história: “O que acontece quando toda a sua vida é governada por uma profecia seu futuro predito por pessoas que você nunca conheceu, que morreram muito antes de você nascer. Essa é a história de duas jovens criaturas marinhas. Um que se acredita ser uma luz guia para seu povo, um Farol que os levará a um futuro brilhante e próspero. O outro é um príncipe adolescente cujo destino é MATAR o Farol para que SEU próprio povo possa prosperar. Quando ambos rejeitam o curso estabelecido para eles, isso leva a uma aventura estridente tão grande e imprevisível quanto o próprio oceano - e um romance que ninguém poderia ter previsto.”

Produto “E”: “Inarime” Esta é uma produção antiga, finalizada em 10 de novembro de 2017 e lançada em 20 de maio de 2016, com o total de 68 episódios. É classificada como super-herói, com temáticas mitológicas e seres antropomórficos. Segue a sinopse descrita na página principal da história: “Deuses antigos e novas batalhas; a sétima filha de Typhon ainda não nascida e suas incríveis aventuras tentando entender quem ela é e por que os Deuses do Olimpo são tão hostis com os seres humanos. Avise-o para acreditar em quem diz que são apenas “mitos”, são mais reais do que você pensa, e estão entre nós.”

Produto “F”: “Straylight Tiger” Esta é uma produção nova que ainda não está entre as mais populares mas mantém uma audiência sólida e é bem avaliada. É classificada como sci-fi e ação. Seus personagens são antropomórficos e possuem poderes elementais. A arte gráfica é bastante colorida. Ela é atualizada toda a quarta-feira desde 6 de julho de 2020, com 8 episódios até o momento, e segue em andamento. Segue a sinopse descrita na página principal da história: “Em um mundo onde os humanos podem se transformar em animais, manipular poderes elementais ou possuir armas criadas a partir de metais de outro mundo, um culto extremista surge com o desejo de dominar a cidade que une as três espécies. Para evitar isso, uma empresa chamada Lifewright Corporation recruta oito jovens talentosos e forma uma força-tarefa secreta que eliminará seus membros de uma vez por todas.”

Produto “D”: “The Wrath And The Dawn” Esta é uma produção que consegue se manter no top 10 dos mais consumidos pelo público masculino de 10 à 30 anos. É classificada principalmente como fantasia e romance, com um toque de mistério e aventura. A arte gráfica é colorida, mas não exageradamente. É atualizada toda terça-feira desde 4 de novembro de 2019, com 46 episódios até o momento, com a história ainda em andamento. Segue a sinopse descrita na página principal da história: “Khalid, o califa, toma uma nova noiva todas as noites apenas para executá-la ao nascer do sol. Portanto, é uma surpresa suspeita quando Shahrzad se oferece para se casar com Khalid. No entanto, Shahrzad tem um plano inteligente - não apenas para permanecer viva - mas para encerrar o reinado de terror do rei assassino de uma

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Produto “A”: “Lore Olympus”

Produto “B”: “SubZero”

Produto “C”: “Castle Swimmer”

Produto “D”: “The Wrath & the Dawn”

Produto “F”: “Straylight Tiger”

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14. Imagens retiradas de webtoon.com.

Produto “E”: “Inarime”


NÍVEL 3

CRIAÇÃO

5ª ETAPA: CRIATIVIDADE (C).

MAPA DA NARRATIVA Título: “To the Wind” (”Ao Vento”)

Geradores de conflito Logline: Nasima/Nia não lembra quem é quando é encontrada por Mayim e Adamina na costa do mar. Para recuperar sua memória, eles viajam pelo Grande Deserto em busca de sinais que ativam lembranças em Nia, seguindo cada um deles como se seguiria pegadas na areia do deserto. Mas ninguém esperava descobrir mistérios que abalariam a vida de todos.

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Tema e mensagem: Discutir como as narrativas podem servir a um resgate histórico da memória de um lugar e de um povo, e como o domínio de uma mídia de comunicação, neste caso a escrita, pode significar poder de controle e manipulação de um lado e esquecimento de outro. A história que nos é contada pode ser apenas a perspectiva ou a busca pela permanência histórica de um herói real ou construído, compreendendo apenas uma fração da verdade, distorcida pelas limitações humanas e pelo tempo. Hoje, a informação acontece de forma quase que instantânea, numa rapidez absurda. Até chegar a nós, ela é filtrada por inteligências artificiais com algoritmos programados para aprender os costumes humanos e entregar dados informativos, mais ou menos como um padeiro que sabe exatamente o que o seu fiel cliente prefere consumir. Tudo acontece muito rápido, tão rápido que nem nos perguntamos como isso acontece. Mas quanto tempo demoramos para realmente conhecer a verdade dos fatos?

Questão dramática central (o grande mistério a ser revelado): O conflito que existe entre as tribos do deserto foi causado por um poderoso império e seus propósitos políticos internos, que levou uma antiga grande civilização do deserto ao esquecimento e gerou muitas distorções históricas. Desfecho: Nasima/Nia recupera a memória e descobre o passado do deserto. O que a faz passar por um conflito interno e externo. As tribos do deserto entram em guerra até entenderem que um império do outro lado do oceano é a verdadeira causa de tantos conflitos.

Se manter informado hoje é cansativo. Buscar a verdade nesse mar de areia de dados, nesse vasto deserto de informação, onde o conhecimento está enterrado em uma tumba perdida e as ilusões são frequentes, é como buscar um livro específico na labiríntica biblioteca de Babel, com infinitas variações do mesmo livro. Sempre que busco saber de algo, mergulhada nesse metafórico mar de dunas, me pergunto se algum dia encontrarei uma fonte de água - ou de verdade -. Ou acabarei cega pela luz do Sol - ou do smartphone.

Protagonista: Nasima/Nia é uma jovem de 18 anos filha de um baronete do Império de Zamora. Habilidades: Interpretar códigos, símbolos e escrita. Além de dominar o elemento vento. Maus comportamentos: Curiosa, sempre mete o nariz onde não é chamada, teimosa, quer desafiar o status quo e possui o próprio senso de moralidade, o que causa maus entendidos. Ponto-fraco: Amnésia. Objetivo externo: Desvendar os mistérios d’O Grande Deserto e voltar para a casa. Objetivo interno: Descobrir quem é.

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15. Rafe 2: Protagonista (Nia/Nasima).

CONSTRUÇÃO DE PERSONAGENS:

Nasima/Nia (protagonista) Uma jovem de 18 anos filha de um baronete do Império de Zamora. Suas principais habilidades são Interpretar códigos, símbolos e escrita. Além de dominar o elemento vento. Curiosa, sempre mete o nariz onde não é chamada, teimosa, quer desafiar o status quo e possui o próprio senso de moralidade, o que causa maus entendidos. Sofre de Amnésia após sofrer um acidente. Seu objetivo é desvendar os mistérios d’O Grande Deserto, descobrir quem é e voltar para a casa. Irmã gêmea de Naomi, filha de Sir Nikomo com lady Minkah, sua mãe falecida. Estava sendo preparada para ser uma das concubinas do filho do odioso imperador Assur de Zamora, reino do vento, o príncipe Anipal. Ela e a gêmea, Naomi, eram muito controlada pelo pai. Tinham que aprender uma rígida etiqueta e seguir um código de ética e moral estritos. Nasima queria ser independente e, quando completou 18 anos, fugiu e voou o mais longe que pode, até que despencou na costa do continente d’O Grande Deserto. Sofreu algumas lesões e perdeu a memória. Seu núcleo-sombrio e de seu povo domina o elemento vento. Sempre carrega um codex com o significado de alguns símbolos antigos. É criativa, resolutiva, inspiradora, convincente, decidida, determinada, apaixonada, altruísta, as vez muito sensível a críticas, perfeccionista, distante e se cobra demais.

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Adamina (narradora co-protagonista)

(Obs.: Mais de 20 personagens foram desenvolvidas. Por questões de sinteticidade, neste documento apresenta-se apenas as duas: a protagonista e a co-protagonista.)

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16. Rafe 3: Co-protagonista e narradora personagem (Adamina).

Uma jovem de 19 anos que vive em Tharga. É um dos thargas nômades comerciantes e caçadores, pois é órfã e escolheu não ter filhos. Assim, ela não possui estrutura familiar para se manter, tendo que mostrar serviço para a sua tribo e ter abrigo. Adamina sempre teve um espírito aventureiro e conhece as rotas do deserto como os melhores nômades do deserto. Com sua experiência e convivência ela se torna apta a desempenhar uma posição importante na tribo, representando a memória de seu povo, passando a ser conhecida como Ada, a lorean (griot/barda). Seu núcleo-sombrio e de sua tribo domina o elemento areia. Costuma carregar uma bainha e uma espada. É charmosa, sensitiva aos outros, imaginativa, aventureira, reservada, curiosa, artística, independente, guiada pelos princípios, às vezes leva as coisas muito pro pessoal, irritadiça, pode agir de forma egocêntrica, imprevisível, competitiva.


CONTEÚDO PARA A BÍBLIA DA PRODUÇÃO: A MITOLOGIA DE “TO THE WIND” (“AO VENTO”)

De acordo com os registros históricos, “To the Wind” (”Ao Vento”) se passa em um período onde os habitantes de Dinariwen se dividem em quatro diferentes regiões e tribos: Tharga ao leste, Daraman ao sul, Gettara ao norte e Zamora a oeste. As três primeiras são localizadas no continente d’O Grande Deserto, a última é um arquipélago de terras férteis localizado do outro lado do Aman, o oceano entre Zamora e O Grande Deserto.

A jornada de Nia, heroína da narrativa de “To the Wind” (”Ao Vento”), se passa em um mundo ficcional conhecido por seus habitantes como Dinariwen. Esse mundo existe em outra realidade, e nele habitam os seres Sensoriais e os Sombrios. Os Sombrios são seres imateriais forjados com o fogo primordial, e que perderam sua terra natal para outra espécie forjada da argila do próprio solo, e que dominaram todos os cantos daquele planeta, perseguindo os Sombrios como demônios. Então, os Sombrios foram obrigados a encontrar um exílio, um novo lar num planeta alternativo. Este planeta é o que se conhece hoje como Dinariwen.

Além das águas que circundam as duas grandes regiões, há o Tamza, uma extensa cadeia de montanhas vulcânicas onde existem, exilados em locais subterrâneos, Sombrios instáveis, sem simbiose, os Caóticos, que assumem uma aparência indistinta de névoa obscura, uma mancha ou uma fumaça. Quando um Caótico é designado a um Sensorial, percorre os fluxos dos ventos em direção ao recém nascido, que só pode recebê-lo se chorar ao ver a luz pela primeira vez. Caso contrário, a criança morre e o Sombrio se esvai. Se sobreviver, a criança não terá o Núcleo-Sombrio, mesmo que venha a chorar um pouco mais tarde.

Mas, para habitar alí, havia uma condição e um sacrifício a ser feito. Eles não podiam tomar o lar dos Sensoriais, mas podiam somar com eles. A condição foi se tornarem simbiontes junto aos Sensoriais. Só assim poderiam se manter estáveis naquele novo ambiente. O sacrifício seria a perda do seu livre arbítrio. Apesar disso, os Sombrios exerceriam uma forte, cotidiana e decisiva influência na vida dos Sensoriais. Eles influenciam no comportamento de elementos da natureza. Os Sombrios associados à energia dos minerais são naturalmente designados à seres que vivem em montanhas e cavernas; os de vento, à seres de terras altas e isoladas; os de água, á seres que vivem próximos ao mar ou leitos de rio; já os de areia, metal e tempestade são tipos raros, designados à seres que vivem em ambientes ou situações extremas.

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Para que o corpo habitado não entre em colapso, tanto os Sombrios quanto os Sensoriais devem procurar um equilíbrio Sombra-Sensorial. Caso contrário, o Núcleo-Sombrio e seu Fogo Primordial consumirá o corpo habitado aos poucos, transformando-o em cinzas, pó e fumaça esvaindo-se ao vento.

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1. Os Sombrios (The Dimmers) 2. Coroada (Crowned) 3. Orelhuda (Eared) 4. Aquatica (Aquat) 5. Listrada (Striped) 6. Farejadora (Sniffer)

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7. Panterina (Pantherine) 8. Draconiana (Draconiane) 9. Angelina (Angeline)

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17. Rafe 4: Seres mítológicos de “To the Wind” ( “Ao Vento”).

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18. Rafe 5: Cartografia de “Dinariwen”.

MAPA CARTOGRAFICO DE “DINARIWEN”.

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19. Rafe 6: Escritas ficcionais de “To the Wind” ( “Ao Vento”).

ELABORAÇÃO DOS SISTEMAS DE ESCRITAS FICCIONAIS

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Tharga: A tribo da areia Tharga é o local onde os nômades d'O Grande Deserto se concentram. Houve uma época em que o deserto ocupava uma área menor e mais ao interior leste do continente, e as tribos da areia viviam de pecuária mais a oeste. Alguns na região costeira, onde conviviam com imigrantes que haviam perdido sua terra natal. Eles aceitaram a presença dos estrangeiros após oferecerem mão de obra e mostrarem sua dominação sobre o elemento água.

20. Rafe 7: “Tharga”.

Assim, juntos prosperaram como civilização, até serem dizimados por um dilúvio. Depois disso, os poucos sobreviventes das duas raças se tornaram rivais, pois os thargas acreditavam que os daramans, dominadores da água, teriam causado a catástrofe, e declararam guerra. Assim, os thargas se juntaram aos seus semelhantes nômades do interior do deserto. Desde então, seguem uma crença religiosa monoteísta, da qual a deusa AVINA, também conhecida como “guardiã das tendas” é idolatrada. Os nômades não possuem um lugar fixo e vagam pelo deserto. Eles se deslocam durante a noite para evitar o Sol ardente que castiga o árido continente usando animais de carga. Praticam o comércio e a caça durante o dia.

As famílias mais ricas de comércio bem sucedido, possuem maior qualidade de vida e poder aquisitivo e, como consequência disso, são as dominantes. Quando precisam tomar alguma decisão, os mais velhos de cada família ou clã se reúnem para entrar em um acordo.

A dieta thargana é baseada em pão, carne, leite, cereais e frutas. Alguns se abrigam em tendas que ficam agrupadas em um círculo, e são feitas de tecidos grossos e escuros de peles de animais, que absorvem o sol ao longo do dia e garantem uma noite aquecida em meio ao frio intenso. Há os que ocupam pequenos abrigos feitos de sal ou calcário localizados ao longo da rota. Eles seguem uma organização dividida por clãs.

Os thargas são matrilineares. As mulheres administram, enquanto os homens ficam encarregados da venda e busca de matéria prima. Possuem um centro administrativo

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numa cidade subterrânea mais ao Sul, em Kanur, centro de Tharga, onde vivem thargas kanurianos de linhagem nobre, escravos e militares. HĂĄ um canal de ĂĄgua subterrânea mais abaixo da cidade que enche todo verĂŁo, o qanat. É a principal fonte de ĂĄgua de Tharga. Controlam as rotas comerciais a partir do deserto, praticam a pecuĂĄria de animais que podem sobreviver com pouca vegetação, vendem escravos, sal, Ăłleos, artesanato tĂŞxtil e utensĂ­lios de metais fundidos e trabalhados. Lorean ĂŠ uma importante designação atribuĂ­da Ă portadoras da histĂłria do povo Tharga que interpretam e disseminam oralmente as narrativas tradicionais atravĂŠs de poemas ou cançþes, adaptando-as ao momento. É uma espĂŠcie de biblioteca viva e que dependem fortemente da memĂłria. Geralmente, loreans sĂŁo membros do sexo feminino, responsĂĄveis por prover e manter viva a cultura de seu povo. AlĂŠm da função de contadoras, elas sĂŁo responsĂĄveis pela organização e ordem de eventos e reuniĂľes da comunidade, alĂŠm de serem importantes conselheiras.

Escrita Thag Embora pouco funcional, existe uma convenção sistemĂĄtica de sĂ­mbolos grĂĄďŹ cos na cultura thargana. Thag ĂŠ a escrita thargana, derivada de uma escrita antiga jĂĄ esquecida. Com o uso do princĂ­pio acrofĂ´nico, a thag se tornou uma escrita fonĂŠtica consonantal para registrar a lĂ­ngua falada thargana. Ela ĂŠ utilizada para correspondĂŞncias, etiquetas e jogos, tendo pouca inuĂŞncia na organização social da tribo. É sempre escrita na direção vertical de baixo para cima, da direita para a esquerda em um uxo bustrofĂŠdon. O substrato do suporte mais comum para a escrita ĂŠ feito de trapos, ou ĂŠ escrita em rochas. Mas ĂŠ frequentemente praticada na areia com os prĂłprios dedos ou bastĂľes.

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Daraman: A tribo da água Acredita-se que os daramans, ou povo da água, são descendentes de imigrantes de terras que foram tomadas por invasores. Então, eles fugiram e se instalaram na costa do continente conhecido atualmente como O Grande Deserto, onde uniram forças com nativos das enormes savanas e parte da floresta tropical que na época ainda cobriam grande parte da região. Essa união deu origem a uma civilização poderosa para aquele tempo. Os daramans eram, em sua maioria, plebeus e servos não letrados, condição designada a eles para que permanecessem no território já ocupado pelos thargas. O reino prosperou, até ser devastado por um dilúvio, deixando poucos sobreviventes. Dentre eles, alguns do domínio da água e outros da areia, os quais projetaram a culpa pela catástrofe aos dominadores de água, declarando guerra contra eles. Os daramans foram exilados para uma região costeira do extremo sul, onde se instalaram próximos ao golfo de Daraman. Sucederam algumas batalhas e embates contra os thargas, o que incentivou o treinamento do domínio da água para evoluir habilidades de defesa contra ataques. Os daramans são politeístas e entre as divindades está a deusa da terra AVINA.

21. Rafe 8: “Daraman”.

Em Daraman, todos possuem posições sociais semelhantes. As tarefas são divididas por idade e os mais velhos são os conselheiros e administradores. Inventaram o barco a vela, e redes de pesca. Vivem em casas feitas de barro, argila e pedregulhos ou em abrigos subterrâneos entre os cânions. Sua dieta é baseada em vegetais, frutas, grãos e peixes. Sobrevivem principalmente de artesanato, como marcenaria e tecelagem, além da

AW DAGLIA, A CIVILIZAÇÃO P ER DIDA As escrituras perdidas contam que, numa época remota, houve uma civilização avançada para seu tempo, mas que desapareceu sem deixar muitos vestígios. Sobreviveram alguns poucos camponeses de duas linhagens, da tribo da água e da areia. A imperatriz sobreviveu mas morreu em seguida, sendo enterrada em um túmulo em uma caverna ao centro norte d’O Grande Deserto. Sem instrução de escrita, os camponeses pintaram na parede, junto com as escrituras que já estavam lá, representações do dilúvio e da imperatriz. O povo de

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agricultura e da pecuária. Eles controlam as rotas comerciais marítimas, praticam a pesca, produzem vinhos, fundem e trabalham metais. Os daramans Mediadores são indivíduos nascidos com o dom ou a sensibilidade exigida para interpretar padrões de um determinado contexto, para que se obtenha uma visão ou projeção sobre acontecimentos do passado, presente e principalmente do futuro. Eles são considerados os porta-vozes dos Sombrios. Alguns interpretam sonhos, outros buscam resposta no mundo material ou utilizam outros meios.

Escrita Dak:

22. imagem ilustativa derivada da escrita Naxi.

Dak é a escrita daramante. Os símbolos dak são ícones do objeto que representam (pictogramas semasiográficos), podendo ser combinados para transmitir uma ideia não concreta. Não registra uma língua falada, nem mesmo a língua daramante. Com exceção dos símbolos que outrora registraram a língua morta de Awdaglia, que ficaram conservados com letras atribuídas a eles. Não há uma ordem certa para escrever em dak, pois os símbolos são peças para compor uma imagem que possa transmitir uma mensagem possível de ser interpretada, similar a uma narrativa, o que a torna um tanto quanto ambígua em algumas ocasiões. O suporte para a escrita picográfica é um papel feito de substratos marinhos.

Tradicionalmente, utilizam argila úmida e, menos frequentemente, pequenos objetos como conchas ou pedras, para grifar os símbolos conhecidos como grifos da Voz Oculta. Estes grifos são utilizados como oráculos pelos Mediadores, em parte derivados da escrita antiga, adaptados e criados para registrar as fases da lua e a posição de outros astros a fim de antever ocorrências de ordem natural ou oculta, auxiliando nas atividades socioambientais da tribo.

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Zamora, o império do vento: Os zamoros, ou povo do vento, são descendentes de habitantes do extremo norte, de regiões altas e frias. Com o avanço das geleiras ocorrido a milhares de anos, partiram para o sul em busca de temperaturas mais amenas, e encontraram um arquipélago biodiversificado, com áreas férteis, vulcões, cânions, lagos, rios, montanhas, encostas e vales. As ilhas eram ocupadas por nativos inofensivos para os zamoros, que foram expulsos, e os que se recusaram a sair, foram mortos ou aprisionados. Muitos se tornaram Mestiços dominadores do elemento tempestade.

23. Rafe 9: “Zamora”.

Assim, eles reconstruíram o império do vento e se tornaram exploradores aéreos com grande força militar. Temendo perderem suas terras novamente, observaram o avanço de uma civilização que prosperava no continente d’O Grande Deserto, e planejaram destruí-los. As autoridades levaram a população a não tolerar os avanços do poderoso e temido povo do deserto, fazendo-os acreditar que eles estariam planejando a invasão das ilhas e a destruição de seus lares, e que iam tornar seus habitantes em força escrava para seus ambiciosos propósitos de expansão. Assim, os zamoros se organizaram junto com os mestiços para causar a grande onda que extinguiu aquela civilização do grande continente. Desde então, eles têm vivido com este passado sombrio.

Os zamoros são politeístas, mas idolatram o deus Enlil como a divindade suprema. MSOGE (Ministério Sacro da Ordem e da Guarda Espiritual) é uma guilda, ou classe social, ou clero, do Império de Zamora, composta por membros de castas privilegiadas do sexo masculino, que são responsáveis por guardar ou revelar segredos históricos ao povo, em função do controle imperial.

Vivem em cidades e vilas construídas de argila e pedras. Sobrevivem do cultivo de trigo, cevada, vinhedos, agricultura de frutas e legumes, pecuária, pesca e caça. A organização social é centralizada, patriarcal e fundamentalista religiosa.

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As leis sacras ensinadas através do SABE (Sacra Antiga Bíblia de Enlil), é o principal instrumentos utilizado para manter a ordem social. Dentro desta guilda existe uma hierarquia de cargos, que parte do MeSa (Mestre Sacro), alguns guardiões sacros dos condados e as subclasses de escribas (copistas, secretários, arquivistas, oradores, ouvintes e revisores). Meridi é o nome dado pelos zamoros à dimensão em que vivem, limitada pelas cordilheiras do Tamza, pelos oceanos e pelo céu, em um extenso horizonte, que sua tradição acredita ser o cordão que divide o Reino de Enlil além do céu e o submundo, debaixo da terra. O Grande Deserto é como chamam o grande continente árido, do outro lado do oceano Aman, com grande parte desértica, que, segundo a crença enlinistanista tradicional, é onde os desvirtuados passam a próxima encarnação, sendo castigados com um desejo de busca por algo desconhecido e inalcançável, sem comida nem água, até a morte, que chega lenta e dolorosamente, enquanto recorda com tamanha saudade a vida segura que tivera nas terras abençoadas de Zamora.

Escrita Zam: Zam é a escrita dos zamoros que adaptaram símbolos de uma antiga escrita estrangeira para o seu sistema de escrita alfa-silábico. É usada para registrar a língua falada zamor, e é escrita sempre na horizontal, da esquerda para a direita e de cima para baixo. As letras são organizadas em blocos monossilábicos chamados de zamogramas, seguindo um sistema CC/VV, onde C (consoante) e V (vogal) são ordenados um em cima do outro e ao lado de semelhantes em classe, dentro de um quadrado imaginário. Os zamoros escrevem em papel feito de uma combinação de substratos de plantas avermelhadas, no formato de rolos e códices.

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Gettara, povo do mineral Os gettaras vivem no alto das montanhas ao extremo norte do continente d’O Grande Deserto. Foram vistos poucas vezes e não se sabe muito sobre eles. São conhecidos por serem rápidos na escalada, muito hostis e ariscos. Usam mantos grosseiros feitos de pele de cabra para proteger das temperaturas baixas da região, um cajado para auxiliar na descida e subida em rochas, e arco e flechas para caçar animais e atacar invasores.

Escrita Get: Get, escrita gettariana, é graficamente semelhante aos da antiga civilização. Mas seu sistema se difere na organização e direção de escrita. É escrita de cima para baixo, da esquerda para a direita na vertical. Consoantes e vogais são organizados em monossílabas seguindo a ordem de vogais sempre a direita uma a baixo da outra, e as consoantes sempre a esquerda, uma a baixo da outra. Os gettaras utilizam pequenas pedras variadas para cada símbolo e entalham em paredes de rocha em alto relevo. Também escrevem em trapos.

24. Rafe 10: “Gettara”.

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25. Rafe 11: “Awdaglia�.

Awdaglia, a civilização perdida: As escrituras perdidas contam que, numa ĂŠpoca remota, houve uma civilização avançada para seu tempo, mas que desapareceu sem deixar muitos vestĂ­gios. Sobreviveram alguns poucos camponeses de duas linhagens, da tribo da ĂĄgua e da areia. A imperatriz sobreviveu mas morreu em seguida, sendo enterrada em um tĂşmulo em uma caverna ao centro norte d’O Grande Deserto. Sem instrução de escrita, os camponeses pintaram na parede, junto com as escrituras que jĂĄ estavam lĂĄ, representaçþes do dilĂşvio e da imperatriz. O povo de dividiu em duas tribos, a da areia e da ĂĄgua. Assim, sem nenhuma herança de Awdaglia, levando consigo alguns sĂ­mbolos que representavam coisas pessoais, cada tribo foi para um lado. Desde entĂŁo, sĂŁo inimigas declaradas. Com o tempo, a histĂłria da relação em comum entre os dois povos, foi se esvaindo da memĂłria coletiva. AVINA foi a Ăşltima rainha do reino de Awdaglia, e morreu alguns dias apĂłs o dilĂşvio varrer a civilização. Ela foi enterrada com honrarias dignas de uma deusa num tĂşmulo do subterrâneo de um oĂĄsis prĂłximo das montanhas do norte d’O Grande Deserto, nas regiĂľes da tribo Gettara. Os sĂşditos encarregados pelo serviço fĂşnebre levaram sua memĂłria viva atravĂŠs de suas lendas. A imperatriz ganhou o tĂ­tulos de divendade: “guardiĂŁ das tendasâ€? thargas, a “mĂŁe de todosâ€? ou a “deusa da terraâ€?.

Escrita Dag: Dag ĂŠ uma antiga escrita hĂ­brida que foi utilizada pela civilização perdida da regiĂŁo do golfo de Awdaglia. Tinha caracterĂ­sticas semasiogrĂĄďŹ cas, logogrĂĄďŹ cas e consonantais, possui semelhanças grĂĄďŹ cas com a escrita get e inuenciou na criação de escritas como a thag, a tak e a zam. A ordem de leitura ĂŠ da direita para a esquerda, de cima para baixo em bustrofĂŠdon. Foram descobertos escrituras em pedras e em rolo de um papel feito da polpa de uma erva extinta.

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JORNADA/ARCO DA PROTAGONISTA Nasima/Nia parte de uma falsa realidade construída para uma reconstrução gradual interna e externa.

ATO I (CAPÍTULO I) Incidente incitante: Nasima/Nia não aceita o casamento arranjado e a vida que leva. Número de episódios: 3. Ponto de virada/Climax: Nasima/Nia cai em uma terra desconhecida e perde a memória. ATO II (CAPÍTULO II) Incidente incitante: Nasima/Nia conhece os nativos. Número de episódios: 4. Ponto de virada/Climax: Como forasteira, Nasima/Nia não é aceita pelas tribos do deserto e a confiança em seus novos amigos é testada. ATO III (CAPÍTULO III) Incidente incitante: Nasima/Nia é exilada e precisa recuperar a memória para voltar para casa. Número de episódios: 4. Ponto de virada/Climax: Encontra ruínas de uma civilização perdida e recupera a memória. ATO IV (CAPÍTULO IV) Incidente incitante: Nasima/Nia é encontrada, capturada e levada de volta para Zamora. Número de episódios: 4. Ponto de virada/Climax: Nasima/Nia foge de volta para o Grande Deserto, interrompe a guerra e revela a todos os mistérios do passado.

O PROTÓTIPO ENTREGÁVEL Um prólogo contando a história mitológica do mundo de Dinariwen em forma de versos simulando um épico ancestral. A narradora será a co-protagonista, lorean da tribo da areia, Adamina, que discorrerá de uma forma lúdica e fluida, simulando uma cerimônia lorean na tribo Tharga, A Cerimonia do Fogo da Noite (The Night-Fire Ceremony). O conto é sobre a gênese do mundo, a mitologia dos Sombrios (the Dimmers), o grande dilúvio de Awdaglia, o conto de Avina, a deusa mãe, a rivalidade das tribos, até a queda da protagonista, Nia, na costa d'O Grande Deserto. Esta foi a solução para apresentar este universo desconhecido aos os leitores de forma didática e imersiva. Além de caber dentro do prazo de entrega do projeto.

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SCRIPT EPISÓDIO PILOTO (PRÓLOGO) E também a dos povos do vento conhecidos hoje como zamoros, que vivem no arquipélago à noroeste do deserto. 1° parte (início/entregável): Sob o poder do império de Zamora, estão os dominadores de tempestade, chamados de mestiços. Descendem dos povos do vento e dos povos da água.

Meu nome é Adamina. Conhecida como Ada, a lorean. Uma memória viva da tribo Tharga, Mestres das areias d'O Grande Deserto. Esta é uma história sobre nosso mundo. Esta é uma história sobre Dinariwen.

Os descendentes dos povos da água, os daramans, vivem na costa do continente d'O Grande Deserto.

Houve um tempo em que Éramos como as outras formas de vida. Mas a chegada dos Sombrios mudou tudo. Seres imateriais que vieram de outro mundo. Mas perderam seu lar para outra espécie Forjada da argila do solo Que logo destruíram. Então, os Sombrios encontraram exílio em nosso lar, Ainda sem nome e sem memória.

E existem os que não se encaixam em nenhuma tribo e preferem viver por si. São os metamorfos, dominadores de metal e descendentes dos povos do mineral e do mar.

3° parte (fim/continuação): Houve uma época em que a paz e a prosperidade reinavam entre thargas e daramans no antigo império de Awdaglia, localizado onde é hoje O Olho do Deserto.

2° parte (meio/continuação): Como eles não podiam se estabilizar neste novo ambiente, A solução que encontraram para sobreviver foi a simbiose. Os Sensoriais e os Sombrios teriam de encontrar um equilibrio Sombra-Sensorial e evitar o colapso do corpo pelo poder do Núcleo-Sombrio, feito do Fogo-Primordial.

Mas Awdaglia se afogou junto com a sua memória Depois que uma grande onda vinda do mar destruiu a civilização por completo. Os povos se declararam inimigos E os daramans levaram a culpa pela tragédia.

Dentro dos Sensoriais agora havia um núcleo de poder elemental. Cada raça com um tipo.

Desde então, batalhas foram travadas entre as duas tribos, areia contra mar, Tharga contra Daraman. Muitas vidas foram derramadas e memórias enterradas.

Nós, thargas, nômades do deserto, povo da areia, descendemos de duas raças:

Até que um dia, a chegada de uma forasteira mudaria tudo.

A dos povos do mineral conhecidos hoje como gettaras, o povo das montanhas do norte,

(FIM)

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1° PARTE (VERSÃO FINAL TRADUZIDA PARA O INGLÊS, LÍNGUA DE PUBLICAÇÃO CONVENCIONAL)

1° PARTE (VERSÃO FINAL EM PORTUGUÊS)

Títle: “Memory”.

Título: “Memória”.

Wellcome to our first Night-Fire ceremony! My name is Adamina. You can call me Ada, The lorean. A living memory of the Tharga tribe, The Great Desert's sand's masters. This is a story about our world, Dinariwen.

Bem-vindes à primeira cerimonia do Fogo! Meu nome é Adamina. Podem me chamar de Ada, A lorean. Uma memória viva da tribo Tharga, Mestres das areias d’O Grande Deserto. Essa é uma história sobre nosso mundo, Dinariwen.

There was a time When we were like The other forms of life: (Crowned Eared Aquat Striped Sniffer Pantherine Draconiane Angeline)

Houve um tempo Em que eramos como As outras formas de vida: (Coroada Orelhuda Aquatica Listrada Farejadora Panterina Draconiana Angelina)

But the arrival of the Dimmers Changed everything. The immaterial beings that came from another planet. However, they lost their home To another species forget of The clay from the soil That they soon completly destroyed.

Mas a chegada dos Sombrios Mudou tudo. Seres imateriais que vieram de outro planeta. Mas perderam seu lar Para outra espécie forjada Da argila do próprio solo Que logo destruíram por completo.

(The end as the begining. The fire that burns Is also the fire that lightens.) Then, here, the Dimmers found exile, A planet still without name. Still without memory. That’s how we, all the races of Sensory beings, began our journey to light.

(O fim foi o começo. O fogo que queima É também o fogo que ilumina.) Então, os Sombrios encontraram exílio aqui, Um planeta ainda sem nome. Ainda sem memória. Foi assim que nós, todos os seres Sensoriais, demos início à nossa jornada rumo à luz.

Continue…

Continua…

(FIM)

(FIM)

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26. Rafe 12: Storyboard.

STORYBOARD

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STORYBOARD Os recursos técnológicos de produção disponíveis eram lápis, borracha, sulfite A4 e uma digitalizadora A4. A maneira mais prática de construir um storyboard foi segmentar as folhas em colunas verticais, dando a seguimento da coluna anterior na coluna ao lado. Desta forma, pude visualizar as transições de forma ampla e contínua, obtendo um controle maior sobre o conjunto — o que me fez congitar a ideia de que, talvez, um rolo seja um formato mais adequado de papel para esta tarefa.

NAMING E LOGO ”Signs to the Wind” (”Sinais ao Vento”) foi o primeiro que veio em mente. Dizem que as primeiras ideias sempre são as melhores. Mesmo assim, cheguei a considerar outros nomes: “O Som do Mar de Areia” (”Sand Sea Sound”); “O Grande Deserto” (“The Big Desert”); “A espada e o Junco” (”The Sword and the Reed”); etc. O requisito era levar em conta a tradução para a língua de publicação convencional. Então, procurei atingir boa sonoridade, tanto em português quanto em inglês. A decisão do nome escolhido, — ”To the Wind” (”Ao Vento”) — além da boa sonoridade, se justifica também pelo que remete tanto ao tema dos fundamentos teóricos do TCC quanto ao universo ficcional da webtoon com uma protagonista que possui poderes elementais do vento. A palavra “sinais” ficou oculta, remetendo a questão da perda de memória e aumentando o ar de mistério. O conceito principal, a mensagem ou o significado por trás deste nome, é a memória que foi esquecida, sinais que se apagaram, rochas e areias que se modificaram e foram levadas ao vento. Na história, Zamora, o império do vento, foi o responsável pela destruição da civilização perdida de Awdaglia e pelo obscurencimento de sua glória original, tanto entre os zamoros quanto entre os nativos d’O Grande Deserto, descendentes dos awdaglianos. Os requisitos para o design do logo eram a adaptabilidade em fundos coloridos e a coerência de estilo junto à arte final adotada no webtoon.

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27. Rafe 13: Logo.

NAMING E LOGO

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NÍVEL 4 3

EXPERIMENTAÇÃO

6ª ETAPA: Materiais tecnológicos (MT) 7ª ETAPA: Experimentação (E) 8ª ETAPA: Modelos (M) 9ª ETAPA: Verificação (V)

Primeiros concepts, testes e vetores experimentais.

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28. Vetorização 1.


29. Vetorização 2.


30. Vetorização 3.


NÍVEL 5 3

PROTOTIPAÇÃO

10ª ETAPA: Desenho de construção(DC) 11ª ETAPA: Solução (S) Protótipo entregável.

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31. Protótipação 1.


biblia

After all storms always comes a calm.

Depois de toda tempestade sempre vem a bonança.

Esta é uma produção voltada para a mídia webtoon (publicação convencional em inglês), a princípio projetada como produto de TCC em design gráfico por Stefany Araújo.

TÍTULO “To the Wind” (”Ao Vento”). G Ê NE RO High Fantasy and YA (Young Adults) (Alta fantasia e Jovens Adultos).

Nasima/Nia não lembra quem é quando é encontrada por Mayim e Adamina na costa do mar. Para recuperar sua memória, eles viajam pelo Grande Deserto em busca de sinais que ativam lembranças em Nia, seguindo cada um deles como se seguiria pegadas na areia do deserto. Mas ninguém esperava descobrir mistérios que abalariam a vida de todos.

T E M A E M E N S AG EM Discutir como as narrativas podem servir a um resgate histórico da memória de um lugar e de um povo, e como o domínio de uma mídia de comunicação, neste caso a escrita, pode significar poder de controle e manipulação de um lado e esquecimento de outro. A história que nos é contada

32. Protótipação 2.

L O G L I NE


DE S F E C H O Nasima/Nia recupera a memĂłria e descobre o passado do deserto. O que a faz passar por um conflito interno e externo. As tribos do deserto entram em guerra atĂŠ entenderem que o um impĂŠrio do outro lado do oceano ĂŠ a verdadeira causa de tantos conflitos.

com honrarias dignas de uma deusa num tĂşmulo do subterrâneo de um oĂĄsis prĂłximo das montanhas do norte d’O Grande Deserto, nas regiĂľes da tribo Gettara. Os sĂşditos encarregados pelo serviço fĂşnebre levaram sua memĂłria viva atravĂŠs de suas lendas. A imperatriz ganhou o tĂ­tulos de divendade: “guardiĂŁ das tendasâ€? thargas, a “mĂŁe de todosâ€? ou a “deusa da terraâ€?.

N I A, A P R O TA G O N I S TA Uma jovem de 18 anos filha de um baronete do ImpÊrio de Zamora. Suas principais habilidades são Interpretar códigos, símbolos e escrita. AlÊm de dominar o elemento vento. Curiosa, sempre mete o nariz onde não Ê chamada, teimosa, quer desafiar o status quo e possui o próprio senso de moralidade, o que causa maus entendidos. Sofre de AmnÊsia após sofrer um acidente. Seu objetivo Ê desvendar os mistÊrios d’O Grande Deserto, descobrir quem Ê e voltar para a casa. Irmã gêmea de Naomi, filha de Sir Nikomo com lady Minkah, sua mãe falecida. Estava

sendo preparada para ser uma das concubinas do filho do odioso imperador Assur de

Zamora, reino do vento, o príncipe Anipal. Ela e a gêmea, Naomi, eram muito controlada pelo pai. Tinham que aprender uma rígida etiqueta e seguir um código de Êtica e moral estritos. Nasima queria ser independente e, quando completou 18 anos, fugiu e voou o mais longe que pode, atÊ que despencou na costa do continente d’O Grande Deserto. Sofreu algumas lesþes e perdeu a memória. Seu núcleo-sombrio e de seu povo domina o elemento vento. Sempre carrega um codex com o significado de alguns símbolos antigos. É criativa, resolutiva, inspiradora, convincente, decidida, determinada, apaixonada, altruísta, as vez muito sensível a críticas, perfeccionista, distante e se cobra demais.

A DAM I N A, N AR R A DO R A E C O - P ROT AGONIS T A Uma jovem de 19 anos que vive em Tharga. É um dos thargas nĂ´mades comerciantes e caçadores, pois ĂŠ ĂłrfĂŁ e escolheu nĂŁo ter filhos. Assim, ela nĂŁo possui estrutura familiar para se manter, tendo que mostrar serviço para a sua tribo e ter abrigo. Adamina sempre teve um espĂ­rito aventureiro e conhece as rotas do deserto como os melhores nĂ´mades do deserto. Com sua experiĂŞncia e convivĂŞncia ela se torna apta a desempenhar uma posição importante na tribo, representando a memĂłria de seu povo, passando a ser conhecida como Ada, a lorean (griot/barda). Seu nĂşcleo-sombrio e de sua tribo domina o elemento areia. Costuma carregar uma bainha e uma espada. É charmosa, sensitiva aos outros, imaginativa, aventureira, reservada, curiosa, artĂ­stica, independente, guiada pelos princĂ­pios, Ă s vezes leva as coisas muito pro pessoal, irritadiça, pode agir de forma egocĂŞntrica, imprevisĂ­vel, competitiva.

Escrita Dag: Dag Ê uma antiga escrita híbrida que foi utilizada pela civilização perdida da região do golfo de Awdaglia. Tinha características semasiogråficas, logogråficas e consonantais, possui semelhanças gråficas com a escrita get e influenciou na criação de escritas como a thag, a tak e a zam. A ordem de leitura Ê da direita para a esquerda, de cima para baixo em bustrofÊdon. Foram descobertos escrituras em pedras e em rolo de um papel feito da polpa de uma erva extinta.

A M I TO L O G I A DE “ TO TH E W I N Dâ€? (“ AO VE NT Oâ€? ) A jornada de Nia, heroĂ­na da narrativa de “To the Windâ€? (â€?Ao Ventoâ€?), se passa em um mundo ficcional conhecido por seus habitantes como Dinariwen. Esse mundo existe em outra realidade, e nele habitam os seres Sensoriais e os Sombrios.

AVINA foi a Ăşltima rainha do reino de Awdaglia, e morreu alguns dias apĂłs o dilĂşvio varrer a civilização. Ela foi enterrada com honrarias dignas de uma deusa num tĂşmulo do subterrâneo de um oĂĄsis prĂłximo das montanhas do norte d’O Grande Deserto, nas regiĂľes da tribo Gettara. Os sĂşditos encarregados pelo serviço fĂşnebre levaram sua memĂłria viva atravĂŠs de suas lendas. A rainha ganhou o tĂ­tulo de deusa, representando a “guardiĂŁ das tendasâ€? thargas, a “mĂŁe de todosâ€? ou a deusa da terra.

P LAN ET A DIN AR IW EN

33. Protótipação 3.

AVIN A


6. MEMORIAL DESCRITIVO O TCC foi uma jornada e tanto. A medida em que avançava nas etapas do projeto, percebia que tinha um pouco de tudo o que eu aprendi dentro do Senac e fora dele. Finalmente entendi, na prática, o significado e a importância do repertório num projeto de design. De fato, cada momento da minha vida simboliza um degrau até o aqui e agora. Ser bolsista no Senac representa muito. Mas antes disso, ter feito alí um curso técnico durante o ensino médio, em 2014, foi o meu ponto de virada. Um verdadeiro divisor de águas. Prometi para mim mesma que se eu pudesse cursar a faculdade de design no campus, a biblioteca seria o lugar ao qual visitaria com mais frequência. Foi assim que tive acesso a centenas de livros e nunca me limitei a nenhum assunto. Decidir um tema para o TCC foi complexo. Meu primeiro estágio foi voltado para a área de UX e UI design em uma startup de publicidade e tecnologia. Foi uma experiência desafiadora, mas enriquecedora. No mesmo semestre, em 2018, participei de um workshop no Senac sobre webtoon. Foi meu primeiro

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enfrentar durante todo o primeiro semestre do ano. Além, é claro, de lidar com os efeitos da pandemia e suas consequências. Foi um ano desafiador para o mundo inteiro, literalmente. Não foi fácil, mas assim que tomei a decisão e apontei uma meta, pude enxergar com mais clareza o que estava na minha frente o tempo todo. Descobri e redescobri outras coisas que também somaram para o meu projeto: a tipografia utilizada na arte gráfica do filme “Pantera Negra”, inspirada em diversas escritas africanas, principalmente a tifinagh dos tuaregues, nômades e semi-nômades do deserto do Saara, não só contava com uma tipografia estilizada mas também com um novo sistema alfabético, com novos grafes exclusivos para representar propriamente a escrita ficcional de Wakanda, mesmo latinizada. Foi surpreendente descobrir esta riquesa de detalhes numa produção como esta. Outras produções que enriqueceram meu imaginário e meu senso de estética foram, principalmente, “DaVinci's Demons”, “Avatar: A Lenda de Aang”, “Avatar: A Lenda de Kora”, “Brand New Animal”, “O Lobo Bom”, “A Princesa Mononoke” e “Nausicaa no Vale do Vento”. Além de “Sky”, um RPG de vôo para smartphone dos mesmos criadores de “Journey”, uma jornada no deserto.

contato com o gênero. Neste momento pude perceber as relações entre UX/ UI e webtoon e entre quadrinhos e design no geral. Ainda não sabia como, mas aquilo faria parte do meu TCC. Entre sistema de linguagem dos quadrinhos e sistema de design de interfaces digitais havia muito a ser dito, para quem ainda não havia se aprofundado no assunto. Mas meus interesses intrínsecos em linguagem escrita e simbólica — que me acompanham desde que eu me lembre assistindo a filmes como “O Código Da'Vinci”, “Em Nome da Rosa” e “Sherlock Holmes”, estudando sobre proporção áurea, grid, geometrias sagradas, tipografia, história da escrita, da teoria da comunicação e do conhecimento, Charles Sanders Peirce, Arthur Conan Doyle, vivenciando memes e pichações do cotidiano de quem vive na cidade de São Paulo — me guiaram inconsciente ou conscientemente até aqui. Apesar de reconhecer esses padrões, ainda havia muito ruído que dificultava o esclarecimento e a simplificação de tudo aquilo na minha mente. Além de períodos conturbados, por assim dizer, na minha vida pessoal que me levaram a trancar a faculdade por um semestre, no último ano, início do TCC, na segunda metade de 2019. Até então, havia estudado diversos assuntos como a vida e obra do neurologista Oliver Sacks — que teve um trabalho incrível de vida a respeito de linguagem, música, sinestesia e distúrbios neurológicos (indicação de leitura do professor Anderson no período pré-TCC) — os livros de Eisner e McCloud, a vida e obra de Wassily Kandisnky, as análises de Marshal Mcluhan, “Síntese da Linguagem Visual” por Donis Dondis, “Shapes for Sound” de Donaldson Timothy, a vida e obra de Leonardo Da'Vinci, “Duna” de Frank Herbert, dentre outros. Sem dúvida ajudaram a enriquecer meu trabalho e minhas conclusões, direta ou indiretamente.

Durante a pesquisa teórica, coletei referências para o roteiro. Dentre elas estão o mito de Sócrates sobre Thoth e Thamus descrito em “Fedro” por Platão, que retrata a posição de Sócrates contra o uso da escrita, a lenda de Dédalus e Ícarus, as histórias dos fenício e suas colônias no magrebe, as escritas nas Ilhas Canárias, as lendas sobre Atlântida e o olho do Saara, a história da rainha Tim Hinan conhecida pelos tuaregues como "a das tendas" ou "a mãe de todos", Sherazade e os contos das “Mil e uma noites”, os djinns da mitologia árabe, as mitologias sobre o surgimento das escritas nas diversas culturas, as histórias sobre os grandes reis letrados como Alexandre o Grande da Grécia Antiga e Assurbanipal da Assíria (Mesopotâmia), as histórias da antiguidade sobre dilúvio, os deuses antropomórficos, a biblioteca de Babel de Jorge Luís Borges, etc.

2020 começou intenso. Precisava me rematricular e decidir o tema do TCC em meio a sérias complicações de saúde que tive de

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O LOGO

O estilo é cartunesco, muito comum em artes sequenciais. A estética caligráfica usada em “To The Wind” ou “Ao Vento” simboliza algo fluido como o vento e indica implicitamente a mão de uma pessoa, um ser humano, criador de símbolos e moldador do ambiente ao seu redor. A pena é um ícone da caligrafia, bem como um índice de pássaro e um símbolo do elemento ar — os pássaros são os animais que representam o império do vento (Zamora), origem da protagonista (Nia) —. Os zamoros são uma espécie de seres antropomórficos (em parte pássaros). A nuvem faz referência ao balão utilizado na linguagem dos quadrinhos para expressar pensamentos. Ou seja, ela carrega em sí ideias, assim como símbolos. Malha e margem de segurança

Mas neste conceito, foi atribuído um significado mais profundo à nuvem: atualmente, ela é usada como uma metáfora para “banco de dados”. Sua capacidade de guardar grandes quantidades de informação é exponencialmente superior ao da memória biológica humana, porém, ao relegá-la por uma artificial, conhecimentos e saberes que poderiam ser sintetizados no Ser podem obscurecer-se. Assim como uma nuvem pode indicar tempestades que causam inundações — como em “To The Wind”, o dilúvio que destruiu “Awdaglia” levando sua história ao esquecimento —, a nuvem metafórica representa um paradóxo: inundação de dados e, ao mesmo tempo, obscurecimento de conhecimento, trevas. Apesar de tudo, depois da tempestade vem a bonança.

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+ Aplicações

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PALETA CROMÁTICA Inspiradas nas cores da areia do deserto do Saara e variações do céu para, em conjunto, transmitirem a atmosfera de “Dinariwen” — fantasia, calma e mistério. Tons roxos do céu são complementares aos amarelos da areia.

Identidade visual do logo/marca #FFFFFF R: 255 G: 255 B: 255 C: 0 M: 0 Y:0 K: 0 #000000 R: 0 G: 0 B: 0 C: 100 M: 100 Y: 0 K: 100

“Zamora” #C75979 R: 199 G: 89 B: 121 C: 11 M: 84 Y: 36 K: 0

#E0B889 R: 134 G: 108 B: 163 C: 54 M: 69 Y: 10 K: 0

#342058 R: 52 G: 32 B: 88 C: 91 M: 100 Y: 43 K: 12

#C75979 R: 66 G: 72 B: 115 C: 87 M: 84 Y: 38 K: 3

GRADIENTE Ângulo: -120º / 60

GRADIENTE Ângulo: -120º / 60

“Tharga” TIPOGRAFIA

#E0B889 R: 224 G: 184 B: 137 C: 9 M: 35 Y: 51 K: 0

Indie Flower é usada nos textos de diálogo do webtoon. Sua estética caligráfica, boa legibilidade em tamanho reduzido e a similaridade do traço com minha letra foram características que levaram à escolha desta font.

#342058 R: 52 G: 32 B: 88 C: 91 M: 100 Y: 43 K: 12 GRADIENTE Ângulo: -120º / 60

“Daraman” #5FA098 R: 95 G: 160 B: 152 C: 81 M: 17 Y: 48 K: 0 #342058 R: 52 G: 32 B: 88 C: 91 M: 100 Y: 43 K: 12 GRADIENTE Ângulo: -120º / 60

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FORMATAÇÃO PARA WEBTOON

O software de criação utilizado foi o Adobe Illustrator. Possibilita reunir todas as pranchetas com as proporções de imagem obrigatórias do episódio em um único arquivo para, então, obter um panorâma completo das transições de cena, facilitando no processo de criação e obtendo um controle maior sobre o conjunto. Ao salvar em PDF, as cofigurações de resolução podem ser editadas em outro arquivo do Illustrator ou em outro software de edição de imagem, como o Adobe Photoshop. Uma imagem (prancheta) deve ter menos de 800 px de largura e 1280 px de comprimento, JPG, JPEG e formato PNG e até 2 MB de tamanho de arquivo. O DPI sugerido é 72 ou mais. O lote de imagens pode ter até 20 MB.

H: 1280 px

W: 800 px

mínimo de 72 DPI

cada img até

2 MB

lote de até

20 MB

= 10 img de 2 MB cada ou = 20 img de 1 MB cada

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Fonte: br.pinterest.com

PAINEL SEMÂNTICO (MOODBOARD)

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34. Moodboard (Fonte: br.pinterest.com).


8. CONSIDERAÇÕES FINAIS “Sócrates estava certo” — faço das palavras de CARR (2009, p. 179) as minhas —. As pessoas ficaram menos dependentes do conteúdo da sua memória biológica e mais dependentes de marcas externas, não sobre a escrita, mas sobre sua forma mais recente — a Internet. Com ela a memória inerente do ser humano ganha uma função mais próxima de um index, onde não precisa saber o conteúdo, bastando saber onde encontrá-lo. Me conscientizei disso quando notei que o meu frenquente uso do Google Keep (um dos produtos da Google para salvar notas sistemáticamente) não estava aumentando meu conhecimento, só a quantidade de dados na “nuvem”. Sabia onde encontrar as informações, mas meu pensamento sobre tudo o que lia estava ficando raso. Minha mente fazia menos esforço para recordar de algo quando sabia que poderia encontrar a resposta no Google com menos esforço.

Com essa pesquisa minha intenção foi investigar como a escrita, um instrumento criado pelo homem a milhares de anos, que vem se modificando de várias formas e influenciando também em todos os aspectos da vida humana, pode determinar o resgate ou o esquecimento de culturas inteiras e servir de instrumento para uma comunicação sistemática, eficiente e convencional, ou até mesmo como instrumento de poder e manipulação. Para transformar então, temas contemporâneos, e ao mesmo tempo milenares como este em uma narrativa gráfica em formato webtoon, buscando uma abordagem e aprofundamento nas questões a respeito das fronteiras entre escrita e imagem, tais quais os recursos gráficos utilizados em histórias em quadrinhos como expressões simbólicas e onomatopéias. Além de explorar o tema “o uso da escrita em diferentes sociedades” dentro do próprio roteiro.

A previsão de Sócrates “talvez tenha sido prematura, mas não errada.” A riqueza de conexão da nossa própria mente se enfraquece em detrimento da hiperconectividade que a web nos oferece, consequentemente interferindo na nossa identidade como indivíduos e como entes responsáveis por uma cultura social a ser mantida ou reimaginada. A alienação é o preço que pagamos por negligenciar nossas capacidades por tecnologias externas que, sim, amplificam nossas habilidades naturais, mas ao passo em que as entorpecem. O meio é a mensagem. A máxima de Marshal McLuhan que sintetiza o pensamento de que a mídia que usamos, pouco percebida pelas pessoas em detrimento do conteúdo que carrega, afeta mais os nossos hábitos do que a informação que transmite. (CARR, 2020, p.195 e 210-211). Sobre a Internet e smarphones substituíndo nossas capacidades mentais: “[...] temos os dados mas perdemos o significado. [..] Os dados, são ‘memória sem história.’” (Cynthia Ozick apud CARR, 2020, p. 238) (Traduzido pela autora).

Busquei provocar um pensamento crítico sobre o uso dos meios de comunicação. Questionar quais formas a escrita ganhou nos dias de hoje, como, por quê, por quem, para quem e para quê ela é utilizada, em quais contextos ela não se aplica e como isso também afeta a vida das pessoas. Até que ponto manipulamos os meios de comunicação e até que ponto somos através deles e por eles manipulados? É possível conhecer a verdade nesse período da pós-verdade e das fake-news? Questionar até que ponto relegamos nosso pensamento crítico às inteligências artificiais alimentadas por informações codificadas (em outras palavras, linguagem escrita), e como esse comportamento que confunde informação e conhecimento, evidenciado pelo fenômeno Google, é um reflexo, por definição, reverso e ampliado do que no passado ocorria com outras formas de linguagem escrita. A narrativa é contada do ponto de vista de alguém com terceiras intenções ou ela é fiel aos fatos ocorridos?

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Nada aqui é argumento contra a tecnologia: fazer isso seria discutir contra nós mesmos. Na verdade, é um argumento a favor do envolvimento mais atencioso com a tecnologia, acoplado a um entendimento radicalmente diferente do que é possível pensar e saber do mundo. Sistemas computacionais, como ferramentas, enfatizam um dos aspectos mais potentes da humanidade: nossa capacidade de agir efetivamente no mundo e moldá-lo aos nossos desejos. Mas revelar e articular esses desejos, e garantir que eles não rebaixem, sobreponham, eliminem ou apaguem os desejos dos outros, continua sendo nossa prerrogativa.

[...] estamos, hoje, conectados a vastos repositórios de conhecimento, e ainda assim não aprendemos a pensar. Aliás, vale o oposto: aquilo que se pensa para iluminar o mundo, na prática, o escurece. A abundância de informação e a pluralidade de visões de mundo que hoje nos é acessível através da Internet não renderam uma realidade consensual coerente, mas a despertada pela insistência fundamentalista em narrativas simplistas, teorias da conspiração e política pós-factual. É em torno dessa contradição que virá a nova idade das trevas: uma era na qual o valor que depositamos no conhecimento é aniquilado pela abundância desse produto rentável, e na qual procuramos em nós mesmos novas maneiras de entender o mundo. Em 1926 H.P. Lovecraft escreveu: 'A coisa mais misericordiosa do mundo, penso eu, é a incapacidade da mente humana em correlacionar todo o seu conteúdo. Vivemos em uma ilha plácida da ignorância em meio a mares negros de infinito, e não se pensou que íamos viajar longe. As ciências, cada uma progredindo em sua direção à parte, até o momento pouco dano nos causaram; mas algum dia a junção do conhecimento dissociado abrirá perspectivas tão apavorantes da realidade, e da posição temível que nela temos, que ou ficaremos loucos com a revelação ou fugiremos da luz mortal na paz e segurança de uma nova idade das trevas.'

— (BRIDLE, 2019, p. 21-22).

Não vamos nem podemos entender tudo, mas somos capazes de pensar. A capacidade de pensar sem reinvindicar, ou memso buscar, um entendimento completo é a chave para a sobrevivência na nova idade das trevas porque [...] em geral é impossível entender tudo. A tecnologia é e pode ser guia e auxiliar desse pensamento, desde de que não privilegiemos seu output: os computadores não estão aqui para nos dar respostas, mas são ferramentas para fazer perguntas. [...] entender uma tecnologia de maneira profunda e sistemática geralmente nos possibilita reconstruir sua metáforas a serviço de outros modos de pensar.

— (BRIDLE, 2019, p. 19-20).

— (BRIDLE, 2019, p. 14-15).

Fomos condicionados a pensar nas trevas como espaço de perigo, até de morte. Mas as trevas também podem ser espaço de liberdade e possibilidade, um espaço de igualdade. Para muitos, o que é discutido aqui será óbvio, pois sempre viveram nas trevas que parecem tão ameaçadoras aos privilegiados. Temos muito a aprender sobre o não saber. A incerteza pode ser produtiva, até mesmo sublime.

Portanto, devemos reconhecer a importância do que estamos relegando — até com uma certa ingenuidade, ou total ignorância — à tecnologia e usá-la de forma mais consciente, para que não percamos as características que costumamos definir como humanidade. Parafraseando CARR (2020, p. 168), encontremos um equilíbrio mental entre ser “eficientes em coletas de dados” e ser “ineficientemente contemplativos”. Cada coisa a seu tempo.

— (BRIDLE, 2019, p. 24-25).

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7. REFERÊNCIAS

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BURSZAN, David. Interview with Chang Kim, CEO and Founder of Tapastic. Portal Den of Geek, 2013. Disponivel em: <https://www.denofgeek.com/culture/interview-with-c hang-kim-ceo-and-founder-of-tapastic/> Acesso feito em: 9 abr. 2020.

HIGOUNET, Charles. História Concisa da Escrita. São Paulo: Parábola Editora, 2003.

CARR, Nicholas. The Shallows: What Thhe Internet is Doing to Our Brains. London: Norton, 2ª ed., 2020.

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SAMPAIO, Adovaldo Fernandes. Letras e Memória: Uma Breve História da Escrita. São Paulo: Ateliê Editorial, 2009. SAMPSON, Geoffrey. Sistemas de Escrita: Tipologia, História e Psicologia. São Paulo, SP: Editora Ática, 1996.

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MEGGS, Philip B. Meggs’ History of Graphic Design. 5ª ed. - Hoboken, New Jersey : John Wiley & Sons, 2012.

119


8. LISTA DE IMAGENS

Figura 1: “Um ser simbólico” (releitura de DONALDSON, 2008).

Figura 2: Grafite e pichação (referência em SAMPAIO, 2009, p. 259).

Figura 10: Capitalis Monumentalis e Capitalis Quadrata (Representação ilustrada). 48-49

0-1

Figura 11: Escrita coreana (Representação ilustrada).

18-19

50-51

Figura 3: Cuneiforme (Representação ilustrada).

32-22

Figura 12: Rafe 1: Primeiro rafe de “To the Wind” ( “Ao Vento”).

72

Figura 4: Caligrafia chinesa (Representação ilustrada).

34-35

Figura 13: Primeiras ideias para o roteiro de “To the Wind” ( “Ao Vento”).

73

Figura 5: Escritas Egípcias: Hieroglifica e Hierática cursiva (Representação ilustrada). 38-39

Figura 14: Imagens retiradas de webtoon.com.

77

Figura 6: Tifinagh (Representação ilustrada).

40-41

Figura 15. Rafe 2: Protagonista (Nia/Nasima).

80

Figura 7: Escrita fenícia (Representação ilustrada).

42-43

Figura 16. Rafe 3: Co-protagonista e narradora personagem (Adamina).

81

Figura 8: Linear A e Linear B (Representação ilustrada).

44-45

Figura 17: Rafe 4: Seres mítológicos de “To the Wind” ( “Ao Vento”).

46-47

Figura 18: Rafe 5: Cartografia de “Dinariwen”.

Figura 9: Escrita grega arcáica (Representação ilustrada).

120

82-83

84


Figura 19: Rafe 6: Escritas ficcionais de “To the Wind” ( “Ao Vento”)

85

Figura 28. Vetorização 1.

101

Figura 20: Rafe 7: “Tharga”

86-87

Figura 29: Vetorização 2.

102

Figura 21: Rafe 8: “Daraman”

88-89

Figura 30: Vetorização 3.

103

89

Figura 31: Protótipação 1.

105

Figura 23: Rafe 9: “Zamora”.

90-91

Figura 32: Protótipação 2.

106

Figura 24: Rafe 10: “Gettara”

92

Figura 33: Protótipação 3.

107

Figura 25: Rafe 11: “Awdaglia”.

93

Figura 34: Moodboard (Fonte: br.pinterest.com).

Figura 26: Rafe 12: Storyboard.

97

Figura 27: Rafe 13: Logo.

99

Figura 22: Imagem ilustativa derivada da escrita Naxi.

121

114-115




@_beinq STEFANY ARAร JO DA SILVA

Centro Universitรกrio Senac 2020


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