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Sunalizer entrevista: Henrique Ribaldo Filho
Presidente da Cooperativa de Energização e Desenvolvimento do Vale do Mogi (Cervam) participou de um bate-papo sobre o setor de cooperativas elétricas, abordando sua regulamentação e o futuro
Especialmente nos centros urbanos, muitos consumidores de energia elétrica ignoram que existem outros distribuidores além das concessionárias mais conhecidas. Contudo, ao longo da expansão das áreas habitadas, foi necessária a criação de entidades que atendessem parte da população que não estava na rota (ou nos interesses) dessas grandes empresas, como as zonas rurais.
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Foi nesse cenário que, em 1964, nasceu a Cooperativa de Energização e Desenvolvimento do Vale do Mogi (Cervam), a partir da iniciativa de agricultores dos municípios de Porto Ferreira, Santa Rita do Passa Quatro, Pirassununga e Santa Cruz das Palmeiras – todas no interior de São Paulo –, que acreditaram que era possível levar energia ao campo. Dessa forma, a Cervam fixou-se como uma autorizada de distribuição de energia.
Contudo, devido a mudanças nas regras da Agência Nacional de Energia Elétrica (Aneel), em novembro de 2018, a cooperativa assinou a nova regulamentação para ser uma Permissionária do Serviço Público de Distribuição de Energia Elétrica, mantendo como fonte geradora as próprias concessionárias, com as quais já mantinha contrato. Dentro da região atendida, as negociações acontecem com a Elektro e a Companhia Paulista de Força e Luz (CPFL), em uma representação de 88% e 12% respectivamente.
Totalizando 55 anos de serviços, a Cervam se expandiu também para Descalvado e Aguaí (no mesmo estado), e passou a atender loteamentos criados devido ao crescimento do perímetro urbano, além de diversas indústrias, e clientes de grande porte e consumidores com sistema de irrigação. Só em Porto Ferreira, são mais de 400 ligações. Hoje, são cerca de 4,5 mil consumidores atendidos.
Recentemente e já pensando no futuro, a cooperativa instalou painéis solares em sua sede, como forma de estudar e testar a tecnologia que, a cada dia, se mostra mais viável enquanto fonte renovável. Tendo o serviço sido realizado com a assistência da Sunalizer, aproveitamos para conversar com Henrique Ribaldo Filho, presidente da Cervam, a fim de conhecer um pouco mais desse universo, discutir o cenário energético do Brasil e os próximos passos em direção ao desenvolvimento sustentável.


Em quais aspectos a atuação da Cervam se diferencia das concessionárias?
Nosso atendimento é mais local. Com isso, conhecemos quase todo mundo que é atendido e conseguimos dar uma assistência muito boa, tanto na parte rural quanto urbana. Assim, nos distinguimos como um exemplo de boa atuação empresarial na região.
Qual sua avaliação da atuação da Aneel na regulamentação do setor?
Eles pegaram o modelo de concessão das grandes empresas e aplicaram também para as pequenas, que são as cooperativas. Somos cerca de 60 no Brasil, no ramo de energia elétrica, entre Rio Grande do Sul, Paraná, Santa Catarina, São Paulo, Rio de Janeiro e Mato Grosso do Sul. Por isso, acho que eles erraram ao igualar as cooperativas às concessionárias, sendo que deviam ter diferenciado mais claramente permissão e concessão. Porque, no fim, a diferença entre nós é apenas o tamanho, o número de consumidores, mas tivemos um aumento na quantidade de trabalho, demandando mais mão de obra e, consequentemente, mais gastos. Mesmo assim, a Aneel tem feito o papel dela, já que precisa normatizar todo o setor.
Não existe diferenciação nem em relação a incentivos e impostos?
Temos cerca de 600 cooperados, entre as quase 4.400 ligações, os quais conseguem isenção de ICMS, PIS e COFINS sobre o ato cooperativo. Mas é só isso. Já o consumidor final nosso e das concessionárias enfrentam os mesmos encargos.
Então, por que mudar de autorizada para permissionada?
Começamos a partir do decreto 62655, que nos dava autorização de uso limitada à parte rural. Entretanto, muitas vezes, nos deparamos, dentro da nossa área, com indústrias ou mesmo grandes negócio, que para as concessionárias seriam interessantes. Ou seja, eles queriam ficar com a carne, enquanto deixariam a gente com o osso. Mas aprendemos a brigar e lutar por aquilo que era direito. Inclusive, íamos continuar como autorizada, mesmo as concessionárias diminuindo, constantemente, o valor de desconto para o uso da energia. Mas chegou ao ponto de eles ameaçarem tirar a poligonal (área de atuação) das cooperativas que não aceitassem a nova regulamentação. Isso nos obrigou a mudar. Nisso, o trabalho da Aneel é importante. Afinal, diante do poder econômico das grandes concessionárias, poderíamos até enfrentar um problema social, já que, sem a devida regulamentação, elas poderiam acabar colocando o preço que quisessem na energia fornecida. Mas todos, concessionárias, permissionárias e autorizadas, precisam seguir as regras da Aneel.
Esse cenário prejudica o crescimento das cooperativas ou o nascimento de novas?
Comparado às cooperativas financeiras, é possível ver o expressivo aumento destas por todo o Brasil. E isso porque o Banco Central ofereceu melhores condições a elas, em relação aos grandes bancos. Já as cooperativas de distribuição não podem mais aumentar. Aquelas que já existiam, continuam – ainda que algumas tenham fechado e outras, sido vendidas. Mas não é possível mais abrir cooperativas de eletrificação.
Existem conflitos na coexistência com as concessionárias?
Tentamos um bom convívio. Mas quando sentimos que temos problemas, recorremos à Aneel ou à Companhia Energética de São Paulo (CESP). São órgãos que ajudam na parte de Justiça. Porque essas empresas acreditam que não deveria existir cooperativas, apesar de terem sido responsáveis por seu surgimento.
Em que sentido elas tiveram essa influência?
As cooperativas nasceram diante de uma necessidade da área rural, já que as concessionárias não a atendia. Na época, década de 1960, para essas empresas não compensava fazer o atendimento e isso forçou a criação das cooperativas. Inclusive, após estudar esses cenários, descobri que algumas concessionárias até induziram a população a montar as cooperativas, porque assim não precisavam fazer a parte delas. Nessas áreas, o que manda é a quantidade de transformadores por quilometro de rede e, antes das cooperativas, eram poucos.
Além da mudança do status, a Cervam promoveu ou precisou passar por outras adaptações?
Acredito que na condição de distribuidora de energia, somos pioneiros na geração para consumo próprio no prédio
administrativo, por meio da energia solar. Acho que, assim, contribuímos para que nossos clientes e a comunidade em geral possam “ver com seus próprios olhos” que o sistema funciona e que a economia de energia pode ser obtida de forma eficaz.
Qual é a extensão do uso dessa tecnologia na cooperativa?
Por enquanto, colocamos a energia solar só na sede da Cervam. Mas o fato é que olhamos para ela avaliando seu potencial para distribuição. Colocamos na sede para conquistar mais conhecimento sobre essa tecnologia e começar a avaliar sua presença. Mas a ideia é levar essa energia para nosso grupo de cooperativas do estado de São Paulo, que inclui 16 entidades, para que possamos nos unir e gerar em escala. Se conseguirmos, no futuro, implantar uma usina fotovoltaica grande, conseguiríamos injetar na rede para continuar fornecendo com melhores condições.
A distribuição de energia elétrica no campo é uma questão ainda complicada, já que, por vezes, continua se apresentando de forma limitada. Como a cooperativa avalia a situação?
Da nossa parte, construímos uma rede sólida, inclusive, fazendo a reforma de todas as linhas, manutenção, equipamentos novos. Dessa maneira, as áreas, pelo menos aqui da região, ficam bem atendidas. Os produtores, especialmente, ficam bem assistidos.
As quedas de energia continuam como um problema recorrente nas áreas rurais?
Henrique Ribaldo Filho, presidente da Cervam, e Vitor Hugo Delsin, engenheiro eletricista
Contra as intempéries naturais, não há o que fazer. Vento, chuva, raios podem interferir no fornecimento. Então, o importante é ter assistência rápida. Por isso, temos uma plantão 24 horas.

Enrique Ribaldo Filho e o engenheiro Vitor Hugo Delsin (CERVAM)