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head SwimRun PT team

Rui Dolores é Nº1 do Ranking Nacional em Duatlo Cross, Triatlo Cross e 4º do Ranking Profissional XTerra europeu 2019. Hugo Baluga é Vice-campeão AG de Duatlo Cross e Triatlo Cross e Meia Distância. Os dois formam a HEAD SwimRun PT Team, a dupla masculina vencedora do Campeonato Nacional de SwimRun. Estes SwimRunners tranquilos e humildes, apesar dos seus títulos, baseiam a sua colaboração em valores e paixões comuns. Descobrem-se e falam sobre a atualidade do COVID 19, a família, aspirações, a importância do SwimRun nas suas vida quer em termos pessoais, desportivos e profissionais.

KARINE VIE ||

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Em 2019, assistimos à consagração de uma nova dupla SwimRun. Este sucesso é o fruto de uma história comum: são da mesma cidade, praticam o mesmo desporto, são do mesmo clube. Decidiram avançar este um novo desafio juntos.

Como nasceu a HEAD SwimRun PT Team ?

Rui Dolores descobriu, ainda a solo, o SwimRun em 2017 na prova da Arrábida, o primeiro evento em Portugal. Desde logo ficou entusiasmado com a dinâmica da modalidade. Mais tarde, em 2019, desafiou o Hugo. Para além de já se conhecerem desde há muitos anos, a Head Portugal e o Rui, que era o treinador e colega de equipa dele do Hugo em Triatlo, perceberam a vantagem que seria ter Baluga na equipa. “Para além de estarmos equilibrados a nível físico, o que é muito importante para desfrutarmos melhor da experiência, o facto de treinarmos juntos torna as coisas mais fáceis na gestão e na estratégia de prova, pois sabemos os limites, os pontos fortes e os fracos um do outro” explica o treinador grandolense.

Esta oportunidade foi uma autêntica surpresa para Hugo Baluga. “Confesso que não estava à espera deste convite. Mas a confiança que a HEAD e o Rui Dolores depositaram em mim, deu-me uma motivação extra!”. Quando começou com 6 anos a praticar Triatlo, Hugo não era um jovem prodígio. Incentivado pelo seu irmão, praticava desporto pela harmonia que existia na escola de Triatlo do Amiciclo de Grândola e não pela competição. O seu treinador na altura acreditava nas suas capacidades e incentivava-o, mas ele só se permitia sonhar com vitórias e títulos. “Sempre olhei para o Rui Dolores como uma referência. Mas eu nunca pensei conseguir estar entre os melhores... Hoje sei que estou mais perto!“ declara com sinceridade.

Formar uma dupla treinador-atleta é uma vantagem, mas também desafios

A HEAD SwimRun PT Team, “funciona como equipa e não há o papel de treinador-atleta” afirma Rui. Para a dupla, a autoridade do treinador não é um privilégio, nem uma prioridade. A hierarquia não se manifesta dessa forma tradicional. Não há ascendência, há situações. “Todas as provas têm particularidades e situações únicas. Talvez eu, de uma forma natural, tenha mais iniciativa, dê mais indicações ao longo da competição simplesmente por uma questão de experiência em SwimRun. Mas a leitura de prova dos dois é igualmente importante para tomar as melhores decisões.”

Outra problemática é a paixão. Neste caso, a importância que o desporto ocupa na vida de um atleta, o que às vezes pode provocar conflitos numa família ou num casal. Mas ainda mais quando se pratica um novo desporto radical, que se está a desenvolver, como é o caso desta aventura à volta do SwimRun.

A sociedade mudou muito quanto à visão e promoção do desporto, em termos de instalações, mentalidades, investimento, evolução técnica. Mas nesta mudança social, a história familiar continua a condicionar a prática desportiva, como exemplo positivo ou negativo. “Sem dúvida que o contexto familiar é importante para incentivar a continuação ou abandono de um jovem no desporto. Desde criança que eu e a minha irmã praticamos natação, os nossos pais sempre estiveram presentes. Mais tarde, na minha adolescência, o meu pai, que foi jogador amador de futebol antes de eu nascer, começou a fazer alguns passeios de BTT em lazer, altura em que também me iniciei na modalidade. No meu caso sempre pude contar com eles, tanto no incentivo presencial como nas necessidades e custos associados.” Relembra Rui Dolores.

A história de Hugo Baluga é diferente. “Os meus pais nunca foram ligados ao desporto, mas sempre me apoiaram no que podiam. A Margarida (a minha namorada) apoia-me e sempre que pode, acompanha-me nos treinos e competições. Neste momento, é a minha principal motivação. O apoio familiar é fundamental para nós, atletas.”

Ainda assim, mesmo com uma boa percepção dos benefícios desportivos, o SwimRun pode preocupar os familiares pela dificuldade e o formato das provas. “Tal como nós atletas, no início eles acharam um pouco estranho o facto de nadarmos calçados e com palas ou corrermos com todo o equipamento ‘às costas’” reconhece Rui, “mas depois de verem alguns vídeos, ficaram rendidos à beleza e ao desafio da modalidade. É importante envolver as pessoas que mais gostamos mesmo que de uma forma diferente daquela que é ser atleta.”

Para a HEAD SwimRun PT Team, a dedicação é efetivamente um fator fundamental de sucesso. Mas não é o único. Existem outros: a gestão da prova, a desconstrução dos problemas e do medo, o dever cumprido.

“Nunca fui de partilhar os resultados com a minha família, mas gosto que se sintam orgulhosos de mim. Por isso, a superação pessoal é o meu principal estímulo” assume o Hugo. A parte psicológica é essencial. “Efetivamente a auto-superação do desafio é a principal fonte de motivação. A parte competitiva ou a conquista de um determinado objetivo é importante, sim, mas não depende apenas de nós. Se dermos o nosso melhor, cruzarmos a meta com essa certeza, é a sensação de dever cumprido” analisa o Rui Dolores.

Gerir uma prova de SwimRun

A gestão de prova no SwimRun passa muito pelo equilíbrio e entreajuda da dupla. A estratégia pré-definida ideal é, estudar previamente as informações dadas pela organização sobre o percurso e definir um plano pré-prova com os segmentos em que cada membro da dupla lidera ou impõe o ritmo conforme as suas características. “No fundo, ver onde cada um é mais forte para poder ajudar o outro”, resume o Rui Dolores , antes de completar : “Apesar deste plano muitas vezes ser ajustado durante a prova por fatores que não se controlam à partida, é importante sair com um plano definido para ser mais fácil tomar decisões no momento e facilitar na comunicação entre nós. Mesmo seguindo esta estratégia prédefinida, os momentos chave dependem do desenrolar da competição. Não há nada em particular que me assuste no SwimRun. Poderia dizer que não sou grande apreciador de águas frias, mas tudo é uma questão de desconstrução do problema na nossa mente e a mensagem que ela passa para o nosso corpo. Sendo o SwimRun um desporto praticado em dupla por si já transmite segurança e sentindo o apoio de toda a organização com elementos em água e terra ao longo do percurso, sintome sempre em segurança” avalia. E o Hugo conclui com humildade “a única preocupação que tenho no SwimRun é o facto de poder não estar ao nível exigido. Felizmente sou muito bem acompanhado pela NewID coaching, o que me permite continuar no bom trabalho.”

Acerca do medo, a filosofia do Rui não varia, “O medo é nada mais que uma dúvida para algo desconhecido. A confiança deve ser trabalhada através da realização de pequenas tarefas, até desconstruir a ideia de que algo é difícil ou impossível. Tal como em tudo na vida, há uma evolução e isso apenas depende da nossa dedicação e força de vontade em atingi-la. Como eu diria ao Rui de há 15 anos, afinal não existem assim tantos impossíveis. Faço aquilo que gosto para continuar a acreditar, pois é o melhor caminho para um dia mais tarde recordarmos histórias e não sonhos.”

Para muitos atletas, na hora de formar uma dupla, o facto de ser ridículo, ou de existir uma diferença de idade e de nível pode ser uma preocupação. Incomoda alguns, mas outros acham que se torna uma mais valia.

“A diferença de idade não é um fator condicionante. No entanto a diferença de ritmo é significativa nas duplas desequilibradas que procuram ser competitivas, porque obriga o mais forte ir ao encontro do ritmo do mais lento e o mais lento acaba por, muitas vezes, ter de se esforçar demasiado e ser penalizado com um desgaste maior“, reflete a parte competitiva do Rui. “No caso do objetivo da dupla ser apenas desfrutar e terminar pelo desafio, aí funciona bem uma dupla de amigos ou casal que pretende desenvolver este espírito de grupo e entreajuda“ relativiza a parte descontraída do multi-campeão.

Acabar com o medo do ridículo

Quanto ao ridículo, o Hugo que, no seus inícios desportivos também tinha poucas facilidades e duvidava muito de si mesmo, é categórico: “Ninguém se deve sentir ridículo ou ter medo dos preconceitos. O SwimRun é uma modalidade com um ambiente muito descontraído. Devemos sim, concentrarmo-nos nossos objetivos, desfrutar das maravilhosas condições que o SwimRun nos proporciona e nunca desistir de objectivo! Como eu diria ao Hugo de há 10 anos, temos de aproveitar cada momento e acreditar sempre que tudo é possível. Se trabalharmos, se nos dedicarmos e nos focarmos na meta, iremos ser sempre recompensados. Uns obtêm o resultado mais cedo, outros mais tarde, mas vai acabar por aparecer!”

A comunicação e colaboração para enfrentar os elementos climáticos, da natureza e do nosso próprio corpo constituem a pedra angular do SwimRun. Esta modalidade permite desenvolver competências desportivas. Mas, segundo a HEAD SwimRun PT Team, até melhora outras áreas da vida.

Uma constatação que faz o Hugo, à luz das suas particularidades, “Sempre me foi dito que as minhas caraterísticas não me permitiriam ser rápido e que deveria experimentar distâncias maiores nas provas de Triatlo. Por isso, tenho apostado principalmente em Triatlo Cross, Duatlo e Triatlo Meia Distância. O SwimRun tem-me ajudado bastante nestas modalidades que adoro, porque exige mais treino em terreno montanhoso e assim trabalho mais nas águas abertas, principalmente para o Triatlo Cross. Também gosto do ambiente, do caráter desafiador da modalidade que nos dá a sensação de liberdade!”

E a referência do Hugo, o Nº1 do Ranking Nacional em Duatlo Cross e Triatlo Cross não contradiz : “Considero o SwimRun um excelente complemento na preparação do Triatlo Cross, pois desenvolve situações de prova que fortalecem física e tecnicamente o atleta, como o nadar de palas e pullbuoy ou correr em trilhos técnicos e muitas vezes mais exigentes que um Triatlo Cross. Em outras áreas da vida também tem um papel construtivo ao incentivar o espírito de equipa, partilha e entreajuda que se aplicam no nosso dia a dia, seja no trabalho, na escola ou na interação com a comunidade em geral.”

Treinar em tempos de COVID-19

O COVID mudou a nossa realidade. Todos nós somos afetados. Todos esperamos que a situação termine e muitos atletas esperam ansiosos pelas provas. Até lá, trata-se de nos adaptarmos, não desistir dos treinos e dos objetivos.

“Este terrível vírus apareceu e complicou a vida de todos. Provas importantes foram canceladas e os treinos condicionados desmotivam um pouco. Então, procurei motivação de outra forma, para continuar em boa forma. Pedalar em casa, corridas curtas em locais pouco frequentados, trabalho com elásticos simulando a natação e treino funcional. Apesar disso acredito que este ano ainda haja competições. Mas o mais importante é que fiquemos todos bem!”, espera o Hugo.

Uma visão que partilha com o N°4 europeu de Xterra que já tinha agendado provas internacionais. Teve de cancelá-las e mudar os hábitos : “Depois de perceber o verdadeiro impacto que trouxe para a nossa sociedade e a impossibilidade de competir e viajar nos próximos meses, acabei por adotar um treino base para manter a condição física, mas sobretudo, o equilíbrio emocional. Neste período de pandemia mantive o treino de ciclismo (maioritariamente indoor), corrida e treino funcional respeitando as normas de isolamento e segurança recomendadas e adaptadas à realidade do local onde vivo, o Alentejo.

Penso que continuar a praticar atividade física nesta fase é importante, mas competir não é uma prioridade. No entanto, em algumas modalidades como o SwimRun, com algumas adaptações de regulamento incluindo, por exemplo, partidas separadas e distanciamento entre atletas, talvez seja possível praticar sem risco acrescido de contágio. Terá que prevalecer o bom senso e avaliar cada situação individualmente.”

A palavra “esforço” é uma evidência para definir a HEAD SwimRun PT Team. Ninguém ganha uma prova de SwimRun ou de outra modalidade sem esforço. “Ponderação” também é fácil de perceber para quem conhece um pouco esta dupla. Já sabia por ter visto provas muito difíceis e emocionantes que o Rui, tanto nas vitórias como nos momentos em que não atingia os seus objetivos, é uma pessoa reservada, para não dizer fechada. Mas o que realmente me emociona e impressiona até hoje é que, mesmo assim, nestes momentos de decepção duros (em que devia ter ainda menos vontade de falar) ou de alegria intensa, sempre conseguiu conservar o seu sorriso e umas palavras simpáticas e elogiosas para os adversários. Essa atitude reflete uma análise objetiva e justa do valor das provas. Do Hugo, descobri o seu passado de triatleta numa conversa com o Rui e associei a imagem dele a um relatório de Norbert Kranz (o atual diretor técnico da FFH em Desporto de verão e Técnico do INSEP) sobre a diferença entre os desportistas jovens com muitas facilidades e os “esforçados”, duas palavras fundamentais: disciplina e mérito.

Mas desde o início desta entrevista surgiu a palavra “paixão”... paixão pelo desporto e pela vida. E esta palavra não me parecia compatível com as anteriores, quando na realidade é tudo o contrário. A associação das três palavras “esforço, ponderação e paixão” é a única explicação do sucesso da HEAD SwimRun PT, e a atitude dos verdadeiros campeões. 

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