"Proclamem nas montanhas" TAG Curadoria - Janeiro/2025

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TAG — Experiências Literárias

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Publisher Rafaela Pechansky

Edição e textos Débora Sander, Rafaela Pechansky e Tatiana Cruz

Colaboradoras Laura Viola e Sophia Maia

Designers Bruno Miguell Mesquita e Lu Kohem

Capa TAG / Foto: Allan Warren

Revisores Antônio Augusto e Liziane Kugland

Impressão Impressos Portão

Olá, tagger

Acontagem de noites, meses, estações e anos firma marcos tão materiais quanto inventados no tecido do tempo. Talvez o ano-novo não seja mais que um ritual, mas rituais têm esse poder de jogar luz sobre o que é ínfimo e cotidiano e revelar a grandeza que existe ali. Rituais como a leitura nos estimulam a perceber o mundo, seus ritmos, cores, sons, dores e encantos. Ler nos conecta ao que levamos dentro e a realidades que estão a milhares de quilômetros de distância. Por tudo isso, o primeiro livro do ano é cheio de simbolismo e é sempre escolhido por nós com uma dose extra de cuidado, de leitores para leitores.

Proclamem nas montanhas é uma narrativa autobiográfica do consagrado escritor James Baldwin, que conta a história de um adolescente no Harlem da década de 1930. Filho de um pastor pentecostal dogmático e autoritário, John se debate entre a curiosidade pelo mundo e a incipiente descoberta da sexualidade, atormentado por ameaças concretas e imaginadas. A violência racial parece inescapável, assim como os imperativos morais da Igreja, que impregnam de culpa qualquer olhar ou pensamento associado à ideia extensiva de pecado — carregados de uma hipocrisia que o menino ainda não decifra completamente. A obra intercala pontos de vista para desvendar os caminhos acidentados que levaram o pai, a mãe e a tia de John a cultivarem vínculos de diferentes naturezas com a religião e com aquilo que cada um entende por Deus.

Enviar aos associados o único livro de Baldwin que seguia inédito no Brasil é um acontecimento que desperta na gente essa atmosfera de ritual e convida a um momento de meditação. Estendemos a você esse convite, confiantes e desejosos de que a experiência seja um pé direito para as leituras de 2025.

Feliz ano novo!

Experiência do mês

Para você ir preparando seu coração 04 06 10 16 20 22 24 26 29 30

Para inspirar o olhar e as ideias antes, durante e após a leitura

Por que ler este livro

Bons motivos para você abrir as primeiras páginas e não parar mais

A autoria

Um retrato caprichado de quem está por trás da história

A curadoria

Conheça Itamar Vieira Junior, que escolheu seu livro do mês

Dois dedos de prosa

De onde veio, do que fala, o que é o livro que você vai ler

Da mesma estante

Livros que poderiam ser guardados na mesma prateleira do livro do mês

Universo do livro

Livros, séries, filmes que orbitam o livro do mês

Leia. Conheça. Descubra.

Maya Angelou, uma artista multifacetada

Espaço da comunidade

Um espaço todo seu, para aproximar e celebrar a maior comunidade leitora do Brasil

Vem por aí

Experiência do mês

Seu livro além do livro: para ouvir, guardar, expandir, crescer.

O PLANNER MARAVILHOSO

DA LITERATURA

LATINO-AMERICANA

Para os apaixonados por livros, uma estante cheia de títulos por ler é quase como uma promessa de felicidade. Conhecer novas indicações e colocar novos autores no radar é um prazer quase tão importante quanto a leitura em si. É por essas e outras que a gente ama construir, a cada ano, um novo planner literário para vocês, taggers. E, do jeitinho que gostamos, a cada ano a gente escuta as provocações de vocês e expande juntos esse repertório de referências, para garantir que a literatura esteja sempre presente no horizonte de planos e no cultivo diário do prazer, da curiosidade e da presença que a leitura desperta na gente. Em 2025, o passeio é pelo universo forte, encantador e cheio de simbologias da literatura latino-americana. Com ilustrações incríveis da artista Arielle Martins e diagramação da designer Paula Hentges, o planner viaja pela América Platina, América Andina, América Central, México e Caribe. Além de indicações preciosas para desbravar a diversidade da literatura latino-americana, você vai encontrar textos que fazem um panorama sobre cada região e sobre diferentes gêneros literários, e também algumas ferramentas para organizar e realizar as leituras, desejos, sonhos e planos do ano que começa.

parece um dia como outro qualquer. da indiferença e da brutalidade em entorno — que o entristecem, embora surpreendam —, o rapaz tem uma inabalável de que tudo vai melhorar. família de John é uma das muitas que migraram do Sul dos Estados Unidos para o em busca de novas oportunidades de e de uma vida melhor. A paisagem York, no entanto, não corresponde expectativas, e o adolescente vai precisar percorrer novos caminhos para encontrar seu lugar no mundo.

Projeto gráfico

de James Baldwin, um dos autores admirados do século XX, aborda questões relacionadas ao racismo, sexualidade e aos direitos humanos. Proclamem nas montanhas — seu romance estreia, publicado originalmente em — é um livro semiautobiográfico arrebatador que descreve a jornada espiritual de um jovem empenhado em alcançar a salvação da própria alma.

Desenvolvida pelo designer Daniel Trench, com ilustração dos Irmãos Credo, a capa de Proclamem nas montanhas , além de um deleite para os olhos, é cheia de simbolismo e possibilidades de interpretação. Um feixe de luz clareia e torna ainda mais vibrantes as cores do lado esquerdo da imagem, recaindo sobre a silhueta de um homem que tem o olhar voltado para um livro aberto à sua frente. As formas geométricas ao fundo remetem de forma sutil ao mosaico de vozes que compõem a paisagem narrativa dessa história.

Depois de concluir a leitura, convidamos você a acompanhar o Podcast da TAG para conferir uma entrevista exclusiva e reverberar junto com a gente os sentimentos e reflexões despertados pelo livro do mês.

Para uma experiência de leitura ainda mais imersiva, preparamos uma seleção musical que vai transportar você para a atmosfera do Harlem dos anos 1920 e 1930 — com muito jazz e as sonoridades incríveis de artistas como Louis Armstrong, Duke Ellington e Billie Holiday.

Visite o app para saber mais sobre o livro e participar da comunidade.

Tradução de Paulo Henriques BriTTo

“O trabalho do grande escritor e ativista pelos direitos civis americano ofereceu avisos proféticos, generosidade de espírito e clareza como nenhum outro para pensar relações raciais.”

- The Guardian

“Você tornou o inglês americano honesto — genuinamente internacional. Você expôs seus segredos e o remodelou até que fosse verdadeiramente moderno, dialógico, representativo, humano.”

- Toni Morrison para James Baldwin

aniversário de catorze anos de John parece um dia como outro qualquer. da indiferença e da brutalidade em entorno — que o entristecem, embora surpreendam —, o rapaz tem uma inabalável de que tudo vai melhorar. família de John é uma das muitas que migraram do Sul dos Estados Unidos para o em busca de novas oportunidades de trabalho e de uma vida melhor. A paisagem York, no entanto, não corresponde expectativas, e o adolescente vai precisar percorrer novos caminhos para encontrar seu lugar no mundo.

de James Baldwin, um dos autores admirados do século XX, aborda questões relacionadas ao racismo, sexualidade e aos direitos humanos.

Proclamem nas montanhas — seu romance estreia, publicado originalmente em — é um livro semiautobiográfico arrebatador que descreve a jornada espiritual de um jovem empenhado em alcançar a salvação da própria alma.

Tradução de Paulo Henriques BriTTo

Por que ler este livro

No fascinante romance de estreia de um dos autores mais reconhecidos da literatura contemporânea, uma narrativa forte e imersiva, atravessada pela beleza e lirismo únicos da prosa de Baldwin. Dotado da originalidade notável de quem verdadeiramente volta às origens, o autor constrói um mosaico íntimo e revelador de olhares sobre a experiência negra nos Estados Unidos do começo do século 20. Ele entrelaça raça, gênero e religião em um livro que sustenta contrastes, ultrapassa fronteiras e permite enxergar o mundo com mais nitidez.

Logos não entram na 1a capa nem na 4a capa

Letter from a region in my mind

James Baldwin comenta o período de sua vida narrado em Proclamem nas montanhas.

“Passei, durante o verão em que fiz quatorze anos, por uma longa crise religiosa. Uso ‘religiosa’ no sentido comum e arbitrário, significando que, naquela época, descobri Deus, Seus santos e anjos, e Seu inferno ardente. E, como nasci em uma nação cristã, aceitei essa Divindade como a única. Supus que Ele existia apenas dentro das paredes de uma igreja — da nossa igreja — e também supus que Deus e segurança eram sinônimos. A palavra ‘segurança’ nos leva ao verdadeiro sentido da palavra ‘religiosa’, tal como a usamos. Portanto, para expressá-lo de outra maneira, mais precisa, durante meu décimo quarto ano, fiquei, pela primeira vez na vida, com medo — medo do mal dentro de mim e do mal fora de mim. O que vi ao meu redor naquele verão no Harlem era o que sempre havia visto; nada havia mudado. Mas agora, sem nenhum aviso, as prostitutas, cafetões e bandidos da Avenida tornaram-se uma ameaça pessoal. Antes, nunca me ocorrera que eu poderia me tornar um deles, mas agora percebia que havíamos sido produzidos pelas mesmas circunstâncias.

Muitos dos meus companheiros estavam claramente destinados à Avenida, e meu pai dizia que eu também estava me encaminhando para lá. [...]

*Publicado na revista The New Yorker em novembro de 1962.

Devido à maneira como fui criado, o desconforto repentino que tudo isso despertou em mim e o fato de que eu não tinha ideia do que minha voz, minha mente ou meu corpo poderiam fazer em seguida, fizeram-me pensar que eu era uma das pessoas mais depravadas da Terra. [...]

Eu não entendia os sonhos que tinha à noite, mas sabia que eles não eram sagrados. Aliás, eu sabia que minhas horas acordado estavam longe de ser sagradas. Passava a maior parte do tempo em estado de arrependimento por coisas que desejava intensamente fazer, mas que não havia feito.”

A grandeza multifacetada de James Baldwin

Romancista, ensaísta, dramaturgo, poeta e ativista, o autor de Proclamem nas montanhas foi gigante em tudo o que se propôs a fazer. Em 2024, teria completado 100 anos.

No velório de James Baldwin, em dezembro de 1987, uma notória amiga do escritor fez um discurso memorável. Toni Morrison, que nos anos seguintes seria consagrada com os prêmios Pulitzer e Nobel de Literatura, abriu sua fala expressando a sensação de não encontrar palavras para descrevê-lo. “A dificuldade é que a sua vida recusa sínteses — sempre recusou — e, em vez disso, nos convida à contemplação”, disse ela.

Em agosto de 2024, Baldwin teria completado 100 anos. Seja como teórico ou autor de ficção, ele criou textos corajosamente situados no corpo, no tempo e no espaço em que viveu, capazes de atravessar gerações e continuar reverberando de forma vívida as transformações sociais e políticas dos últimos 80 anos. Romancista, ensaísta, dramaturgo, poeta, ativista e um profundo observador da sociedade, o autor articulou de forma crítica e sensível a experiência de ser um homem negro e gay nos Estados Unidos do século 20.

Teve seus romances menosprezados por quem duvidava que fosse possível fazer política escrevendo ficção. Teve sua atuação no movimento negro questionada por trazer a pauta da sexualidade lado a lado com o recorte racial. Teve, enfim, muita coragem e sobretudo uma combinação impressionante de consistência e serenidade para firmar pé em seus temas e caminhos expressivos.

©Maria Austria

“A obra de James Baldwin é essencial para decodificar o mundo de hoje e apontar caminhos. O olhar atento para a herança da colonialidade é imprescindível para pensarmos o futuro.”

- Tobias Carvalho

INFÂNCIA E ADOLESCÊNCIA

Nascido no Harlem, em Nova York, Baldwin viveu o que havia de mais vibrante e doloroso naquele tempo e espaço. Entre os anos 1920 e 1930, o Renascimento do Harlem movimentou a região com a efervescência da cultura negra nos guetos, mas o racismo circulava com violência e sem qualquer dissimulação.

Neto de escravizados, o escritor era o mais velho de nove irmãos e nunca conheceu o pai biológico. A mãe se casou novamente quando ele ainda era criança. Seu padrasto, de quem herdou o sobrenome, era um pastor na igreja pentecostal do Harlem. Uma parte dessa história é contada em Proclamem nas montanhas, um livro declaradamente autobiográfico.

Em um longo, emblemático e envolvente relato em primeira pessoa publicado em 1962 na revista The New Yorker, James Baldwin revisitou algumas memórias que ilustram a brutalidade de suas experiências precoces como um menino negro, associando a violência racial à necessidade de buscar refúgio na igreja.

“Quando eu tinha dez anos, e certamente não aparentava ser mais velho, dois policiais se divertiram comigo ao me revistar, fazendo especulações cômicas (e aterrorizantes) sobre minha ascendência e provável capacidade sexual, e, para completar, me deixando deitado de costas em um terreno baldio do Harlem. Pouco antes e durante a Segunda Guerra Mundial, muitos dos meus amigos fugiram para o serviço militar, todos foram transformados lá, e raramente para melhor, muitos foram destruídos e muitos morreram. Outros fugiram para outros estados e cidades — ou seja, para outros guetos. Alguns recorreram ao vinho, ao uísque ou à agulha, e ainda estão nisso. E outros, como eu, fugiram para a igreja.”

Dos 14 aos 17 anos, Baldwin seguiu os mesmos passos do padrasto, atuando como pastor mirim na Assembleia Pentecostal de Fireside. Paralelamente, ele exercitava a escrita e era estimulado por professores a se aventurar na criação de textos de teatro e poesia.

Na Frederick Douglass Junior High School, foi aluno do poeta Countee Cullen, uma das vozes mais representativas do Renascimento do Harlem. Incentivado por ele, o adolescente foi estudar na DeWitt Clinton High School, no Bronx, onde se aproximou da revista literária da instituição, conheceu figuras importantes e ampliou seus horizontes. Foi nessa época que as inquietações que se insinuam em Proclamem nas montanhas ganharam mais corpo. Sua relação com o padrasto autoritário e com a moral religiosa esbarravam na compreensão da própria sexualidade e na complexidade da experiência com o racismo, o levando a sair da igreja e da casa dos pais para viver em Greenwich Village, bairro boêmio de Nova York.

“Era absolutamente claro que a polícia te espancaria e te prenderia enquanto pudesse passar impune, e que todos os outros — donas de casa, motoristas de táxi, ascensoristas, lavadores de pratos, bartenders, advogados, juízes, médicos e donos de armazém — nunca, por qualquer sentimento humano de generosidade, deixariam de usá-lo como válvula de escape para suas frustrações e hostilidades. Nem a razão civilizada nem o amor cristão fariam com que essas pessoas te tratassem como presumivelmente gostariam de ser tratadas”, escreveu Baldwin.

Apesar da visão crítica da igreja, que expressava abertamente, o escritor jamais recusou a complexidade da relação entre raça, sexualidade e religião. “Eu corria da escola para casa, para a igreja, para o altar, para ficar sozinho ali, para comungar com Jesus, meu querido amigo, que nunca me decepcionaria, que conhecia todos os segredos do meu coração. Talvez Ele conhecesse, mas eu mesmo não conhecia, e o acordo que fizemos, na verdade, lá ao pé da cruz, foi que Ele nunca me deixaria descobrir esses segredos”, afirmou. “Apesar de tudo, havia na vida da qual escapei um entusiasmo e uma alegria e uma capacidade de enfrentar e sobreviver a desastres que são muito comoventes e muito raros.”

“O encontro com o texto de James Baldwin é um júbilo, em que grandes personagens se apresentam com sensibilidade e espanto únicos. É igualmente notável que, na literatura de Baldwin, estejam também a coragem e a honestidade que pautaram a trajetória intelectual do autor.” - Fernanda Bastos

ESCRITOR E ATIVISTA

Durante os anos 1940, Baldwin passa a escrever textos como freelancer e capta a atenção do escritor Richard Wright, figura conhecida na luta contra o racismo nos Estados Unidos e que o apoiaria em mais de uma ocasião da sua trajetória intelectual e literária. Aos 24 anos, muda-se para Paris e passa a acompanhar de longe, mas com atenção afiada, o que acontece na sua terra natal. Vive a maior parte da vida na Europa, e é lá que publica seus primeiros livros.

Proclamem nas montanhas (1952) foi seu romance de estreia, e Notas de um filho nativo (1955), sua primeira obra de não ficção. São volumes de inspiração autobiográfica, que marcam um reencontro arrebatador do autor com suas origens e uma tomada de posição contundente na luta por direitos civis. Já no romance O quarto de Giovanni (1956), a sexualidade desvia das convenções e da moral da época ao narrar a história de um homem expatriado em Paris que acaba de assumir um noivado com uma mulher quando se envolve em um affair com outro homem.

Em 1957, ele volta aos Estados Unidos e torna-se uma importante voz no movimento que combatia a segregação racial no país. Se aproxima do Partido dos Panteras Negras e de nomes como Martin Luther King Jr., Malcolm X e Nina Simone. Na virada para a década de 60, publica na imprensa regularmente e viaja pelo sul dos Estados Unidos, discursando em comícios e doando seus cachês ao movimento. Em 1962, publica o romance Terra estranha, um poderoso retrato da cena de jazz nova-iorquina, que toca em tabus como bissexualidade e relações inter-raciais. No ano seguinte, publica Da próxima vez, o fogo (1963), com ensaios provocativos sobre a construção de sua identidade.

Com a intensificação da perseguição aos Panteras Negras, Baldwin volta à França. Lá, publica um novo romance, Se a rua Beale falasse (1974), sobre um casal do Harlem que sofre os efeitos devastadores do racismo e da desigualdade social. O livro inspirou o filme homônimo de 2018, dirigido por Barry Jenkins, vencedor do Oscar por Moonlight.

UMA

OBRA INTERSECCIONAL

O percurso intelectual e literário do autor se alinha ao que, na virada dos anos 90, seria cunhado por Kimberlé Crenshaw como interseccionalidade — o arranjo de marcadores sociais que formam a experiência de uma pessoa no mundo. No caso de Baldwin, sua identidade racial o constitui tanto quanto sua sexualidade e sua condição de expatriado, por exemplo. Todos esses temas permeiam sua obra, que dá conta de um habilidoso entrecruzamento de todas essas camadas em narrativas e dialoga de forma ampla com as inquietações humanas — o amor, os desencontros, o desejo de pertencer, a busca por si mesmo e pela felicidade.

A inclusão da dimensão queer em sua obra custou a ele certa tensão dentro do movimento nacionalista negro. Um dos episódios mais conhecidos foi um ataque homofóbico de Eldridge Cleaver, um dos líderes do Partido dos Panteras Negras, que fez críticas agressivas a Baldwin no livro Alma no exílio (1968).

Em entrevista à Folha, o escritor João Silvério Trevisan, que acompanha a obra do autor desde os anos 60, falou da dificuldade que havia de incorporar o debate sobre a experiência gay no campo progressista. “Existia essa ideia de que o socialismo seria uma varinha mágica que mudaria tudo, inclusive a cabeça das pessoas. Nós achávamos isso uma balela, porque conhecíamos elementos da esquerda que deveriam ser nossos parceiros e que não aceitavam homossexualidade. A obra de Baldwin contemplava uma briga que nós estávamos fazendo dentro da esquerda em relação à autonomia dessas lutas, que se complementam”, afirmou.

“Além de sua incansável e poderosa luta pelos direitos civis da população negra em um ambiente extremamente racista, Baldwin também deu voz às questões LGBTQIA+ em um período em que o debate sobre sexualidade era silenciado. Abordar esses temas com tanta franqueza em suas obras foi um ato de imensa coragem e uma fonte de inspiração. Com Baldwin, encontrei na literatura uma história de amor entre dois homens que me emocionou profundamente e me deu forças para encarar um fantasma que, por tantos anos, eu insistia em esconder de mim mesmo.”

- Pedro Pacífico

“Ancestralidade e identidade são mobilizadas por todos, não apenas por

não brancos.”

O curador do mês, Itamar Vieira Junior, conversou com a gente sobre o impacto da obra de Baldwin em seu percurso literário e a presença da intersecção racial e religiosa em seus próprios livros. Ele prepara o volume final da trilogia que começou com Torto arado

Já fazia algum tempo que você tinha indicado esse título para a TAG Curadoria, e estamos muito felizes por finalmente conseguir enviar aos associados a primeira tradução brasileira do romance de estreia de um autor tão emblemático. Quando você leu esse livro pela primeira vez, e como foi esse encontro?

Li Proclamem nas montanhas em 2019. Fiquei bastante impactado com a atualidade do romance de Baldwin e sua narrativa envolvente. Publicado originalmente em 1953, o livro traz uma abordagem vanguardista e corajosa sobre raça, gênero e homossexualidade. A descoberta vivida por John e toda a teia de personagens que o cerca nos lembra que a vida de muitos ainda é definida pelo nosso passado. Lembra-nos de que a cor da pele e nossas origens podem determinar o lugar social que ocupamos no mundo.

O curador do mês

Nome:

Itamar Rangel Vieira Junior

Nascimento:

Salvador, 6 de agosto de 1979

Profissão:

Escritor e geógrafo

Duas ou três coisas sobre ele:

1 TERRA E TERRITÓRIO

Licenciado e mestre em Geografia e doutor em Estudos Étnicos e Africanos pela UFBA, Itamar Vieira Junior tornou-se, antes de ser escritor, funcionário do Incra, órgão federal para implantação da reforma agrária. A luta pela terra tem lugar cativo no seu trabalho como pesquisador e servidor público, o que explica a profundidade e a consistência com que o tema atravessa sua produção literária.

2 FENÔMENO

EDITORIAL

Vencedor dos prêmios Leya, Jabuti e Oceanos, tornou-se um dos escritores mais lidos do Brasil desde que lançou Torto arado (2019), que conta a história de duas irmãs crescendo em uma fazenda no sertão da Bahia. Com mais de 800 mil exemplares vendidos, o livro compõe uma tríade ao lado de Salvar o fogo (2023) e de outro título ainda não publicado. Além dos romances, lançou o volume de contos Doramar ou a Odisseia (2021).

3 MEMÓRIA

A força narrativa de Itamar encontra suas raízes nos múltiplos significados da memória — íntima e coletiva, presente e ancestral. O escritor baiano tem nas suas origens a proximidade com o campo, seja por laços familiares ou pela atuação com camponeses na luta pela reforma agrária.

O que James Baldwin representa na sua trajetória como leitor, como pessoa e como escritor, se é que é possível separar essas instâncias? Baldwin é um desses autores fundamentais, assim como a Toni Morrison, que me ajudaram no processo de escrita a compreender quando a experiência humana íntima é atravessada por nossa história social. Permitiu que eu rompesse com o paradigma da experiência branca e entendesse a diversidade da nossa história. Pessoas negras, indígenas, pessoas mestiças vivem experiências distintas pautadas na desigualdade e no racismo que ainda dividem o nosso mundo.

Essa é uma história atravessada por tensões raciais e religiosas, contempladas à altura da complexidade que essa intersecção pode ter. De diferentes formas e obviamente em outro contexto, você também explora esse tema em Torto arado e em Salvar o fogo. Do Harlem ao interior da Bahia, que sentidos a religião pode agregar na demarcação da identidade da população negra?

Em Proclamem nas montanhas há uma passagem em que uma personagem faz uma analogia à história dos hebreus escravizados no Egito, que levaram um enorme tempo para se libertar. Essa história ecoa profundamente entre os herdeiros da diáspora na América por razões que já conhecemos, ainda que o cristianismo seja uma religião colonial e faça parte dessa engrenagem opressora que promoveu o apagamento de crenças e ontologias nativas.

Na Bahia, essa experiência foi igualmente violenta, mas resistiram nos nossos corpos saberes que de alguma forma permitiram o florescer de experiências fundamentais que evocam uma ancestralidade negra e indígena. Ancestralidade e identidade são mobilizadas por todos; por pessoas de ascendência judia etc., não apenas por não brancos.

Pessoas brancas que ocupam lugares de privilégio nos recordam suas histórias para continuar ocupando um lugar de privilégio. As crenças que despontam em Torto arado e Salvar o fogo ajudam a contar um pouco sobre a dimensão íntima das personagens dessas histórias, assim como o cristianismo pentecostal faz parte da vida das personagens de Proclamem nas montanhas.

Recentemente, você escreveu um livro voltado ao público infantil, Chupim, retomando o universo de Torto arado para dialogar com crianças sobre a realidade do campo. O que motivou você a criar esse projeto?

Eu me formei leitor na infância, e crianças — convivo com elas — são tão inquietas quanto os adultos quando se trata de pensar o mundo. Querem entender as raízes da nossa desigualdade e nos perguntam sobre isso a todo momento. Essa é a minha pequeníssima contribuição para a formação de leitores nesse momento fundamental de nossas vidas.

Como andam seus projetos literários? Você está trabalhando em algum livro no momento? Estou ocupado com a escrita do romance que encerra o tríptico iniciado com Torto arado . Histórias que de alguma maneira me ajudaram a refletir sobre como o legado colonial e escravagista ainda impacta nossas vidas.

Primeiro livro que li: Lúcia Já-vou-indo, Heloísa Penteado

Livro que estou lendo: Casta: as origens de nosso mal-estar, Isabel Wilkerson

Livro que mudou minha vida: Amada, Toni Morrison

Livro que eu gostaria de ter escrito: Grande sertão: veredas, Guimarães Rosa

O último livro que me fez chorar: Pequenas coisas como estas, Claire Keegan

Último livro que me fez rir:

Mais uma vez, Olive, Elizabeth Strout

Livro que eu dou de presente para as pessoas: Cem anos de solidão, Gabriel García Márquez

Livro que não consegui terminar: A montanha mágica, Thomas Mann (mas pretendo voltar)

Território de sonho, luta e violência

A força e a brutalidade do bairro onde cresceu Baldwin, retratado no livro do mês, epicentro de uma verdadeira revolução cultural no começo do século 20

Uma revolução política só acontece verdadeiramente à medida que suas transformações são assimiladas culturalmente. A história da libertação negra nos Estados Unidos é um exemplo potente dessa premissa, e uma parte emblemática desse processo se deu no Harlem, cenário de Proclamem nas montanhas.

Localizado na região norte da ilha de Manhattan, em Nova York, o bairro foi um epicentro cultural e social nos Estados Unidos entre 1920 e 1960. Esse período foi crucial para a demarcação da identidade afro-americana e para a formação de um movimento que deixou marcas indeléveis no país, começando no Renascimento do Harlem, que originou uma efervescência cultural sem precedentes a partir dos anos 20, se estendendo até o avanço da luta pelos direitos civis.

No começo do século, o Harlem foi o destino de milhares que deixaram o sul rural e supremacista do pós-abolição em busca de melhores condições de vida e oportunidades no norte do país, no que ficou conhecido como a Grande Migração. Assim, entre 1920 e 1930, a região transformou-se em um centro cultural e econômico para a comunidade negra. O movimento reuniu trabalhadores, intelectuais, artistas, músicos, escritores e ativistas, criando um cenário pulsante de resistência política e celebração da cultura negra. Era uma oportunidade inédita de preencher a brutal lacuna de identidade simbólica que o apagamento da escravidão tinha deixado.

O Harlem tornou-se o coração do jazz, gênero que rapidamente conquistou os Estados Unidos e o mundo. Nos anos 30, o bairro era conhecido por clubes como o Cotton Club e o Savoy Ballroom, que atraíam tanto residentes locais quanto visitantes de toda a cidade e tiveram performances de músicos como Duke Ellington, Louis Armstrong e Billie Holiday.

A cena literária e artística também borbulhava. Escritores como Langston Hughes, Zora Neale Hurston e Claude McKay foram figuras fundamentais no Renascimento do Harlem, explorando temas de identidade racial, injustiça social e libertação na poesia, no teatro, em romances e em obras de não ficção. Esses textos eram frequentemente publicados na revista Opportunity, projeto do sociólogo Charles S. Johnson que reconhecia e divulgava a produção literária daquele período tão prolífico. A circulação desses escritores ampliou o debate sobre os direitos civis e a luta contra a segregação racial, temas que ecoariam nas décadas seguintes.

Após a Segunda Guerra Mundial, se intensificou ainda mais o descontentamento com as lógicas racistas que persistiam naquela sociedade, impulsionando a mobilização política no bairro, que via surgirem novos líderes comunitários e ativistas. A era do jazz deu lugar ao bebop, uma corrente mais experimental e menos comercial, marcada pela improvisação e representada por músicos como Charlie Parker e Dizzy Gillespie. O bebop desafiava as convenções musicais e era, em certo sentido, uma forma de resistência cultural, refletindo a luta por liberdade e autodeterminação.

Essa fascinante resistência fazia frente à proporcional violência racista que alcançava o bairro todos os dias. A oferta de empregos subalternizados à população negra aprofundou, com o passar dos anos, a pobreza da região. Junto a isso vinham os golpes do deliberado sucateamento dos serviços de educação e saúde do bairro, a repressão policial e a injustiça penal. Como consequência óbvia, a criminalidade também aumentava.

Nessa síntese não é difícil traçar paralelos com qualquer periferia urbana brasileira contemporânea, onde os sonhos de uma teia múltipla de vozes desafiam os estreitos limites impostos a todo tempo pelo poder. Esse elo íntimo entre as experiências afrodiaspóricas nos Estados Unidos e em outros territórios ganha mais nitidez em narrativas como a de Baldwin, fundamentais para expandir nossa compreensão do mundo para além das fronteiras do colonialismo.

Da mesma estante

Livros que poderiam ser guardados na mesma prateleira do livro do mês, para quem quiser continuar no assunto.

CANÇÃO PARA NINAR MENINO GRANDE,

Conceição Evaristo

Pallas, 136 pp.

Na escrevivência de Evaristo, uma narrativa poética e profunda sobre experiências negras, com reflexões poderosas sobre a complexa construção da masculinidade de homens negros e seus efeitos nas relações com mulheres negras.

O PAGADOR DE PROMESSAS, Dias Gomes

Bertrand Brasil, 154 pp.

O calvário de um homem simples, acompanhado por seu burro de estimação, para cumprir uma promessa feita a Iansã. Uma obra teatral clássica que mobiliza reflexões profundas sobre sincretismo e intolerância religiosa.

SALVAR O FOGO, Itamar Vieira Junior Todavia, 320 pp.

Uma família partida que vive em um povoado rural da Bahia está no centro desse romance em que o percurso íntimo dos personagens reflete os traços da vida social, emocional e cultural brasileira e onde convergem temas de raça, território, religião, ancestralidade e cultura afro-indígena.

GARANTA SEUS LIVROS AQUI:

Lá no site, além de aproveitar seu desconto de associado TAG, você tem mais informações sobre os livros — e muitas outras dicas!

A

COR PÚRPURA, Alice Walker

José Olympio, 336 pp.

Tradução de Betúlia Machado, Maria José Silveira e Peg Bodelson

No sul dos Estados Unidos do começo do século 20, uma mulher negra atravessa experiências de violência racial e de gênero que se estendem da infância à vida adulta, em uma história marcada pela dor, mas também pela beleza e força dos laços humanos.

JAZZ, Toni Morrison Companhia das Letras, 216 pp.

Tradução de José Rubens Siqueira

Um cinquentão que vende produtos de beleza no Harlem da década de 20 assassina sua amante adolescente, disparando as idas e vindas de um enredo trágico e apaixonado, narrado com primor por uma das maiores escritoras da literatura estadunidense.

MEMÓRIAS DA PLANTAÇÃO,

Grada Kilomba Cobogó, 248 pp.

Combinando psicanálise com estudos de raça e gênero, a escritora, psicóloga e multiartista portuguesa traça um panorama das dinâmicas de expressão do racismo no cotidiano, contado através de pequenas histórias.

Universo do livro

Livros, séries, filmes que orbitam o livro do mês

O aniversário de catorze anos de John Grimes parece um dia como outro qualquer. Apesar da indiferença e da brutalidade em seu entorno — que o entristecem, embora não o surpreendam —, o rapaz tem uma fé inabalável de que tudo vai melhorar. A família de John é uma das muitas que migraram do Sul dos Estados Unidos para o Harlem em busca de novas oportunidades de trabalho e de uma vida melhor. A paisagem de Nova York, no entanto, não corresponde às expectativas, e o adolescente vai precisar percorrer novos caminhos para encontrar seu lugar no mundo.

EU NÃO SOU SEU NEGRO DOCUMENTÁRIO DO DIRETOR HAITIANO RAOUL PECK BASEADO NO MANUSCRITO INACABADO REMEMBER THIS HOUSE E NO LIVRO THE DEVIL FINDS WORK, DE BALDWIN.

A obra de James Baldwin, um dos autores mais admirados do século XX, aborda questões relacionadas ao racismo, à sexualidade e aos direitos humanos. Proclamem nas montanhas — seu romance de estreia, publicado originalmente em 1953 — é um livro semiautobiográfico arrebatador que descreve a jornada espiritual de um jovem empenhado em alcançar a salvação da própria alma.

Tradução de Paulo Henriques BriTTo

ISBN 978-85-359-3950-7

DOIS ESTRANHOS

CURTA-METRAGEM GANHADOR DO OSCAR, QUE TRATA DA VIOLÊNCIA RACIAL NOS ESTADOS UNIDOS.

MOONLIGHT

FILME DE BARRY JENKINS QUE NARRA A HISTÓRIA DE UM HOMEM NEGRO E GAY DA PERIFERIA DE MIAMI, ENTRELAÇANDO REFLEXÕES DE RAÇA, CLASSE E GÊNERO.

Logos

MACHADO DE ASSIS

ESCRITOR BRASILEIRO QUE

REGISTROU A PERSISTENTE

LÓGICA DA ESCRAVIDÃO E DO RACISMO NO PERÍODO PÓS-ABOLIÇÃO EM CONTOS

COMO “O CASO DA VARA” E “PAI CONTRA MÃE”, ASSIM COMO JAMES BALDWIN.

“Transmitindo de maneira tão sincera como o mundo se apresenta do ponto de vista de uma garota negra, ela contou a todos que podem ler ou sentir o que significa ser um homem ou uma mulher negra neste país.” James Baldwin

Meu pai e suas apostas é uma história poderosa e comovente sobre a busca pela dignidade e a luta contra adversidades intransponíveis. Louise Meriwether tece uma narrativa cativante, com elementos autobiográficos, que oferece um registro perspicaz da experiência de viver no Harlem dos anos 1930, sob o prisma de Francie, uma corajosa garotinha de doze anos. Este livro é uma jornada tocante pelas lutas e triunfos de uma família determinada a vencer as probabilidades e encontrar seu lugar no mundo.

NO HARLEM,

SÉRIE DA NETFLIX SOBRE TRÊS AMIGOS DA PERIFERIA DE SÃO PAULO QUE VIVEM A TRANSIÇÃO DA ADOLESCÊNCIA PARA A VIDA ADULTA

RODEADOS PELAS PROMESSAS E PELA OPRESSÃO DAS DROGAS, DA VIOLÊNCIA E DA RELIGIÃO.

LEIA. CONHEÇA. DESCUBRA: Maya Angelou

“Ensaísta, romancista, poeta e dramaturgo. Ele também é meu amigo, irmão, professor e parceiro de correspondência.” Foi assim que Maya Angelou apresentou James Baldwin em 1975, ocasião em que o entrevistou em um programa de TV. Além de cultivarem uma amizade belíssima, Angelou e Baldwin compartilharam várias paixões: a música, a luta pelos direitos civis, o interesse genuíno pela complexidade humana e, claro, a palavra escrita.

©Chester Higgins

Nome

Marguerite Ann Johnson

Nascimento

4 de abril de 1928

Saint Louis, Missouri, EUA

Morte

28 de maio de 2014

Winston-Salem, Carolina do Norte, EUA

Cantora, jornalista, ativista política, dançarina, diretora, atriz, roteirista e escritora. Maya Angelou foi uma artista multifacetada como poucas — e, dentro do universo literário, não foi diferente. Com uma bibliografia extensa, a escritora é mundialmente conhecida e celebrada por seus poemas, ficções, ensaios, autobiografias e livros infantis.

Nascida em 1928, Maya Angelou teve que enfrentar desde muito cedo as implicações de ser uma mulher negra nos Estados Unidos daquele tempo. Depois de uma infância marcada por abusos, aos 17 anos ela encontrava-se sozinha com um bebê recém-nascido, o que a levou a vários trabalhos informais como garçonete, motorista, dançarina de clubes noturnos e prostituta. Foi depois de um breve casamento, já na década de 1950, que Angelou conseguiu se dedicar à sua verdadeira paixão: a arte. Suas apresentações em clubes de São Francisco chamaram a atenção de agentes locais, o que lhe rendeu seus primeiros contratos.

Nessa mesma década, Maya faria suas primeiras apresentações nacionais e internacionais, lançaria o álbum de música Miss Calypso e começaria sua carreira literária. Foi nesse contexto que conheceu James Baldwin e muitos outros artistas e personalidades negras associados à luta pelos direitos civis, entre eles Martin Luther King Jr., com quem desenvolveu uma relação estreita de companheirismo e ativismo.

Mudou-se para o Egito nos anos 1960, país onde dedicou-se à carreira jornalística, escrevendo para The Arab Observer. Retornou aos Estados Unidos em 1964, com o objetivo de ajudar Malcom X a estruturar a Organização da Unidade Afro-americana. Foi depois do assassinato de Malcom X e de Martin Luther King Jr. que Maya, profundamente abalada, voltou-se ainda mais para a escrita, resultando na publicação do seu primeiro livro: Eu sei por que o pássaro canta na gaiola.

A obra alçou Angelou à posição de celebridade imediatamente. Foi indicada ao National Book Award de 1970, traduzida para vários idiomas e figura até hoje em diversas listas de livros mais influentes do mundo.

Infelizmente, a obra também está presente em outra lista, mais sórdida, sendo considerada uma das dez mais frequentemente banidas das salas de aula e bibliotecas dos Estados Unidos, um indicador tanto do impacto da publicação quanto do racismo da sociedade.

Para além da sua prolífica carreira literária, Maya ganhou cinco Grammys, foi indicada a um Emmy e recebeu vários prêmios por sua atuação em diversos campos da arte. Influenciou também diversos músicos e cantores, como Steven Tyler, Fiona Apple e Kanye West. Se você quiser saber mais sobre Maya, há na Netflix um documentário especial sobre a autora: Maya Angelou – e ainda resisto (2016), de Bob Hercules e Rita Coburn Whack. Em 2010, a artista recebeu do então presidente Barack Obama a mais alta condecoração civil americana, a Presidential Medal of Freedom. Maya Angelou faleceu quatro anos depois, em 2014, deixando um legado inestimável.

NÃO TROCARIA

MINHA JORNADA

POR NADA

Coletânea de ensaios breves, íntimos e cheios de força, em que a autora compartilha as experiências de uma vida prolífica e suas reflexões sobre temas fundamentalmente humanos, com a habilidade admirável de uma grande contadora de histórias.

EU SEI POR QUE

O PÁSSARO CANTA

NA GAIOLA

Nesse poético, íntimo e arrebatador romance de estreia autobiográfico, Maya conta sua história da infância à adolescência ao retratar uma menina negra que encontra nas palavras um alívio para um imenso fardo de violência e abusos.

Eu aprendi que as pessoas vão esquecer o que você disse, as pessoas vão esquecer o que você fez, mas nunca esquecerão o que você fez elas sentirem.

POESIA COMPLETA

Em uma reunião da produção poética de Angelou, as reflexões sobre raça e gênero que atravessam toda a obra da autora ganham contornos poderosos, reiterando sua relevância como romancista, poeta e ativista.

Espaço da comunidade

Já que a chegada de um novo ano sempre inspira transformações, decidimos mudar um pouquinho o formato deste espaço dedicado a cultivar nossas trocas com vocês, taggers. Neste mês você ainda vê por aqui a Madame TAG, mas, em outros, ela cederá lugar para outros conteúdos — sobre os encontros promovidos pelos associados Brasil afora, sobre eventos literários que nos possibilitam encontrar vocês pessoalmente ou o que mais surgir pela frente e reforçar, de um jeito ou de outro, o laço precioso da nossa comunidade de leitores.

Querida Madame TAG,

Sou assinante há lindos 7 anos e só posso dizer que ao longo deles eu fui presenteada com as mais diversas emoções e aprendizados. Seguindo o norte do “quem lê nunca tá sozinho”, gostaria de lhe pedir um conselho literário. Em minha família recebemos a repentina notícia que deixou a vida um tanto de cabeça para baixo: minha mãe está com um câncer terminal e tudo se desenrolou em um contexto de surpresa e rapidez. Uma vez que a morte se torna tão próxima e tão presente, que livros você indicaria para uma família que se torna cuidadora e para alguém que passa a ouvir mais o termo “cuidados paliativos”?

Um beijo, Karina

Querida,

Sua mensagem me toca de muitas maneiras. Pela notícia avassaladora que sua família recebeu, é claro, mas também por sua sensibilidade em buscar nos livros uma forma de recuperar o eixo da vida e caminhar ao lado da dor, que é inescapável. Mal acabava de ler o que você contou e lembrei de Os cem anos de Lenni e Margot, um romance de Marianne Cronin que convida a enfrentar a morte celebrando a vida. Dias de se fazer silêncio, de Camila Maccari, é uma história delicada sobre uma menina de 11 anos que lida com a iminência da morte de seu irmão. Aos prantos no mercado, de Michelle Zauner, expõe a grandeza afetiva do cotidiano ao retratar uma protagonista que atravessa o luto pela morte precoce da mãe. Em Cuidar até o fim: como trazer paz para a morte, as palavras da médica e escritora Ana Claudia Quintana Arantes podem ser um abraço reconfortante neste momento. Espero que minhas indicações estejam à altura do gesto de confiança que essa mensagem representa. Desejo força e muito amor pra você e sua família!

O aniversário de catorze anos de John Grimes parece um dia como outro qualquer. Apesar da indiferença e da brutalidade em seu entorno — que o entristecem, embora não o surpreendam —, o rapaz tem uma fé inabalável de que tudo vai melhorar. A família de John é uma das muitas que migraram do Sul dos Estados Unidos para o Harlem em busca de novas oportunidades de trabalho e de uma vida melhor. A paisagem de Nova York, no entanto, não corresponde às expectativas, e o adolescente vai precisar percorrer novos caminhos para encontrar seu lugar no mundo.

No próximo mês

Uma narrativa encantadora e intensa sobre o amor entre dois homens, ambientada na Polônia dos anos 1980, em pleno declínio do regime comunista. A partir do olhar dos protagonistas, o romance entrelaça o despertar emocional da juventude e a busca por uma vida autêntica em meio a um complexo, opressivo e polarizado contexto político. Este aclamado romance de estreia de um autor polonês vai capturar você pela escrita poética e pela profundidade emocional dos personagens.

A obra de James Baldwin, um dos autores mais admirados do século XX, aborda questões relacionadas ao racismo, à sexualidade e aos direitos humanos.

Proclamem nas montanhas — seu romance de estreia, publicado originalmente em 1953 — é um livro semiautobiográfico arrebatador que descreve a jornada espiritual de um jovem empenhado em alcançar a salvação da própria alma.

Tradução de Paulo Henriques BriTTo

As capas de livro frequentemente são verdadeiras obras de arte, não é mesmo? Recortando a página ao lado, você pode transformar esse projeto gráfico em um item exclusivo, seja como elemento decorativo ou colecionável. O verso também é especial, com uma linda citação do autor para complementar a imagem.

Agora é só soltar a criatividade! E se compartilhar nas redes, não se esqueça de nos marcar no @taglivros – adoramos ver as ideias de vocês ganhando vida.

Você acha que sua

dor e seu desgosto não

têm precedentes

na

história do mundo, até que você lê.

“Libertar-se era uma coisa, reivindicar a propriedade daquele eu liberto era outra.”
– TONI MORRISON

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