Mai2017 "O Leopardo"

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IMPRESSÃO Impressos Portão

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Marina Brancher Pablo Valdez Rodrigo Antunes Suya Castilhos Tomás Susin Vinícius Carvalho Vinícius Goulart Vinícius Reginatto Wesley Osorio


Ao Leitor O mês de maio veio cheio de pompa: pela primeira vez em nossa breve história, temos um vencedor do Prêmio Nobel de Literatura como curador. O peruano Mario Vargas Llosa aceitou gentilmente nosso convite e selecionou um clássico para o clube. Porém, assim que recebemos sua indicação, preocupamo-nos: O Leopardo estava esgotado no Brasil havia anos, e a obra de Giuseppe di Lampedusa não está em domínio público. Para nossa sorte, a Companhia das Letras – detentora dos direitos autorais – já planejava publicar o livro; uma nova tradução estava em processo. A nosso pedido, concor-

daram em antecipar o lançamento, e conseguimos garantir que os associados sejam os primeiros a receber a obra – que ainda conta com mais de cem páginas de apêndices. Mais um detalhe: a edição que irá para as livrarias não será igual a nossa, é claro. Escapamos dos tiros dos irmãos Sisters para chegar à Itália de Fabrizio Corbera, em um período de turbulenta unificação. Um livro com descrições brilhantes e repleto de aforismos, como o célebre “Se quisermos que tudo continue como está, é preciso que tudo mude”. Não havia como esperar menos de um gigante como Llosa.



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O curador: Mario Vargas Llosa O livro indicado: O Leopardo

Risorgimento italiano A biblioteca de Umberto Eco

Filhos Ăşnicos

Boom latino-americano

O curador: Marcelo Rubens Paiva



O curador: Mario Vargas Llosa

estruturas de poder e suas imagens vigorosas sobre resistência, revolta e derrota individual”.

Nos anos 60 e 70 do século passado, o universo literário era agraciado pela ação de escritores nascidos em um espaço que a cultura europeia, de certa maneira, ignorava: a América Latina. Importantes transições e acontecimentos políticos no continente americano serviam como inevitável inspiração para autores do chamado boom latino-americano, liderado pelo argentino Julio Cortázar, o colombiano García Márquez, o mexicano Carlos Fuentes e o peruano Mario Vargas Llosa, curador deste mês. Reconhecido como um dos mais importantes escritores da atualidade, Vargas Llosa é também jornalista, dramaturgo e ensaísta. Recebeu, em 2010, o Nobel de Literatura, por “sua cartografia de

Jorge Mario Pedro Vargas Llosa, filho único de Ernesto Vargas Maldonado e Dora Llosa Ureta, nasceu em Arequipa, Peru, em 28 de março de 1936. O casamento de seus pais, no entanto, duraria apenas cinco meses, e ele passaria os primeiros dez anos de sua infância em Cochabamba, na Bolívia, sendo educado pela mãe e pelos avós maternos. Em 1946, foi para Lima, onde finalmente conheceu seu pai, que se reconciliou com Dora, e a família voltou a viver no Peru, país em que Llosa passaria por importante par-

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(1981) – esta inspirada no clássico da literatura brasileira Os sertões, de Euclides de Cunha. Mais recentemente, lançou Travessuras da menina má (2006), O herói discreto (2013) e Cinco esquinas (2016). te de sua formação. Na capital, estudou Letras e Direito e começou a dar os primeiros passos no jornalismo. Em 1959, mudou-se para Madri, na Espanha, e publicou o livro de contos Os chefes. Em seguida, foi para Paris, movido pelo sonho de viver em uma cidade onde a cultura fervilhava. Na capital francesa, exerceu as profissões de tradutor, professor de espanhol e jornalista da agência France-presse e começou, em definitivo, sua exitosa carreira literária.

Grande parte da obra de Vargas Llosa, formada por mais de trinta livros, entre romances, ensaios e peças de teatro, é voltada para a crítica social e política e direcionada, principalmente, à sua terra natal. Nas obras, desenvolve um estilo narrativo autêntico, contando histórias a partir de variados pontos de vista, por vezes separados em tempo e espaço. Uma das preocupações do autor ao escrever é dar fluidez ao texto, priorizando a história e não a forma, como explicou recentemente, enquanto discorria sobre seu mais recente livro: “Em Cinco esquinas, como nos romances anteriores, a prosa trata de ser invisível, de desaparecer atrás da história que conta para que seja a história que pareça viver por si mesma. O método flaubertiano, que sempre foi o meu”. Nessa obra, conta Llosa, o grande desafio foi desenvolver um trabalho de linguagem que fosse o mais discreto possível, ao mesmo tempo em que apresentasse personagens que não falam da mesma maneira, que têm diferentes origens sociais, econômicas e culturais e vivem em uma sociedade complexa como a peruana.

O primeiro romance lançado por Vargas Llosa foi o aclamado A cidade e os cachorros (1963), inspirado em sua adolescência em uma academia militar em Lima, e trazia tons de denúncia sobre a realidade política do Peru, que vivia uma ditadura. A partir de então, lançou dezenas de livros, a grande maioria deles premiada e bem recebida pela crítica; a cada nova publicação, diferentes experimentações técnicas, que ajudaram a configurar o autor como um inovador de formas narrativas e estilísticas. Entre suas obras mais importantes, destacam-se A casa verde (1966), Conversa no catedral (1969), e A guerra do fim do mundo

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“Sua enorme capacidade narrativa é algo que o torna diferente e melhor do que todos os outros romancistas latino-americanos vivos. É essa força, esse luxo novelístico e esse domínio da matéria que imediatamente põem qualquer leitor sensível em um estado muito próximo ao da hipnose.” – Júlio Cortázar em carta a Vargas Llosa

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Antes identificado com o socialismo, defendendo a Revolução Cubana e todo o movimento de esquerda na América Latina nos anos sessenta, o autor mostrou-se desiludido e decepcionado com o governo de Fidel Castro e acabou por adotar posições liberais, despertando críticas da classe artística e até mesmo desfazendo amizades – foi supostamente por questões políticas que García Márquez e Vargas Llosa, antes muito amigos, brigaram e nunca mais se reaproximaram. A partir dos anos 1980, Llosa começou a tornar-se mais ativo politicamente no Peru e, em 1990, concorreu à presidência, perdendo no segundo turno para o candidato Alberto Fujimori. “A política é algo muito diferente do que pensamos quando estamos do lado de fora dela. O que acontece quando você enfrenta uma campanha eleitoral é que, depois disso, se torna muito pragmático ao encará-la. Há uma diferença em

viver a política na pele, nas ruas. Hoje sou uma pessoa muito mais pragmática em relação às minhas ideias e desconfio de abordagens demasiado intelectuais, demasiado teóricas.” Depois da experiência política, o autor voltou-se novamente à literatura e, no ano de 2010, recebeu seu prêmio máximo. “Lembro-me da madrugada em que me anunciaram que eu recebera o Prêmio Nobel de Literatura. Naquele momento, eu pensei: ‘Não vou deixar que esse prêmio me transforme em uma estátua, em uma espécie de boneco de papel-machê. Continuarei vivo até o fim, agindo e escrevendo com a mesma liberdade que escrevia antes de ganhá-lo’. Há essa ideia, de que depois de receber o Prêmio Nobel você vira uma estátua e acaba morrendo em vida. Pois bem: isso não aconteceu e espero que nunca aconteça comigo.”

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Quando convidamos Vargas Llosa para a curadoria, recebemos como indicação um clássico da literatura do século XX. O Leopardo retrata um período conturbado da unificação política da Itália, voltando-se à ótica da nobreza que perdia lentamente seus poderes. Poucos teriam maior capacidade de escrevê-la do que Giuseppe Tomasi, herdeiro da aristocracia e último a receber o título de príncipe da Ilha de Lampedusa.

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O livro indicado: O Leopardo

Era apaixonado pelos franceses Montaigne e Stendhal – este, seu maior ídolo literário – e tinha especial obsessão pelos ingleses Charles Dickens e Shakespeare. “Em Shakespeare, não existem personagens simbólicos, mas simplesmente um número de homens e mulheres que sofrem, lutam e morrem, como nós.” O teatro, por sinal, foi presente na vida do autor: durante suas férias, assistiu pela primeira vez peças como Hamlet, encenadas por um grupo de artistas itinerantes, em um pequeno teatro em Santa Margherita Belice.

Giuseppe Tomasi nasceu em Palermo, na Região Siciliana da Itália, em 1896, filho de Beatrice di Cutò e Giulio Maria Tomasi, que em breve se tornaria príncipe da pequena Ilha de Lampedusa. Por conta da ascendência aristocrática – ainda que em uma época de decadência da classe –, desfrutou de uma juventude confortável; foi educado em casa por um tutor que lhe ensinou o inglês e o francês, este praticado com a mãe, mulher de personalidade forte e a quem Giuseppe foi muito apegado. O conhecimento linguístico incomum, acompanhado da influência familiar, levou-o a um grande interesse pela literatura europeia.

Em 1915, morando em Roma, chegou a estudar Direito, mas largou os estudos ao ser convocado para

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servir o exército italiano durante a Primeira Guerra. Lutou na violenta batalha de Caporetto e foi preso pelos austríacos. Depois de um tempo enclausurado na Hungria, conseguiu escapar e voltou a pé para a Itália, onde continuou seus serviços militares, ainda que a contragosto – suas cartas e declarações indicam uma ideologia pacifista. Giuseppe passou os anos seguintes viajando pelo norte da Itália e por diversos países europeus. No ano de 1925, em uma de suas passagens por Londres, visitando um tio diplomata, conheceu a baronesa da Letônia Alexandra Wolff Stomersee, estudante de psicanálise, com quem se casou sete anos depois, em Riga, território letão. Os dois viveram por um tempo no Palazzo Lampedusa, mas os constantes conflitos entre a mãe do autor e Licy – como era chamada – levaram a primeira a ordenar que Giuseppe se decidisse entre as duas. Fragilizado, optou por ficar com Beatrice, e Licy voltaria ao castelo de sua família, de onde ela trocaria cartas com o marido. Quando seu pai faleceu, em 1934, ele herdou o título de príncipe de Lampedusa, uma ilha que, na prática, não pertencia mais a sua família. Em 1940, enquanto a Itália ainda estava sob comando de Mussolini, Giuseppe seria convocado novamente pelo Exército ita-

Giuseppe Tomasi

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com seus mestres literários ingleses. Um fato, no entanto, o aborrecia mais do que qualquer outro: ao contrário dos ídolos, jamais escrevera um romance ou, ao menos, algo digno de nota. No verão de 1954, Giuseppe viajou para San Pellegrino a fim de acompanhar o primo e poeta Lucio Piccolo a uma convenção literária, onde este seria premiado por sua obra. Naquele momento, algo mudou no príncipe. “Estando matematicamente certo de que eu não era mais estúpido do que Lucio, sentei à minha escrivaninha e escrevi um romance”, ele confidenciaria a um amigo por carta. Giuseppe pôs em prática, finalmente, algo que prometera à esposa muitos anos antes: “Fazer um romance histórico, passado na Sicília, na época do desembarque de Garibaldi em Marsala, e baseado na figura de seu bisavô paterno, Giulio di Lampedusa, astrônomo”. Em apenas dois anos, O Leopardo estava finalizado.

liano, mas logo dispensado sob a alegação da necessidade de cuidar de suas terras, mas, possivelmente, também, pela suspeita das ligações exteriores que o autor mantinha – Giuseppe via o fascismo com certo cinismo, embora raramente se pronunciasse a respeito. Passou os anos seguintes em Capo d’Orlando (uma comuna italiana na região da Sicília) com sua mãe, primos e esposa, com quem finalmente se reencontrava. O Palazzo Lampedusa foi destruído por bombardeios dos Aliados em 1943, e Giuseppe perdeu a mãe em 1946. Depois de uma guerra que mudou toda a estrutura política da Itália, Giuseppe voltou a Palermo com Licy, e eles viveram sem filhos, em um palácio de condições mais precárias.

“O Leopardo é uma dessas obras literárias que aparecem de tempos em tempos e que, uma vez que nos deslumbram, confundem-nos, porque nos confrontam com o mistério da genialidade artística.”

Lampedusa sentia-se estagnado. Por volta dos cinquenta anos de idade, pensou que a vida que levara, quase inteiramente dedicada à leitura, ainda poderia trazer-lhe algum prazer e dedicou-se a um grupo de jovens intelectuais. Em furtivos encontros em cafés, lecionava informalmente e transmitia tudo o que de mais prazeroso aprendera

– Mario Vargas Llosa

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O romance nos conta a trajetória de cinquenta anos da família aristocrata de Fabrizio Corbèra, príncipe de Salina, no contexto do Risorgimento italiano, já na iminência da ascensão da burguesia e consequente decadência da nobreza. A história inicia-se no ano de 1861, quando o revolucionário Giuseppe Garibaldi e sua tropa de oitocentos homens desembarcam em uma Itália até então fragmentada em pequenos reinos, prestes a se unificar. O príncipe e sua família – cujo brasão ostenta um imponente felino – são naturalmente contrários ao processo que acompanham, mas o sentimento de impotência é o que verdadeiramente reina.

mente perdoados em confissões); sente-se distante dos filhos, em quem não reconhece a própria personalidade; seu sobrinho, por quem sente afeição, está seduzido pelo movimento revolucionário. Desamparado, busca alívio na companhia do cachorro Bendicò, em caçadas e na astronomia. Ele sabe do inevitável e mostra-se flexível com as mudanças: entende que a melhor maneira de atravessar esse complicado momento da sua classe é adaptar-se; compreende, também, que sua condição social e mesmo pessoal o manterá com uma resignação cheia de orgulho nobre – um orgulho ferido. Seria árdua a tarefa de elencar todas as qualidades do romance de Giuseppe di Lampedusa – há que se deixar, também, para que o leitor as reconheça, absorva e, então, decida o que mais lhe toca; dois dos seus grandes trunfos, entretanto, são evidentes o bastante para que sejam mencionados. Primeiro, o retrato histórico de uma realeza em decadência, seus dilemas éticos, seu desprezo pela burguesia que cresce vertiginosamente, resignação com as mu-

Fabrizio, um homem de porte físico impressionante, líder natural, inteligente e intuitivo – qualidades acompanhadas por inseguranças e fraquezas –, está amargurado não só com a situação política, mas também com a frivolidade e deturpação de suas relações familiares: acredita que ama a esposa, porém realiza viagens secretas com o padre particular da família para praticar adultérios (rapida-

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danças e inevitável passagem do tempo, toda a contextualização do sentimento de uma classe que se extingue nos é apresentada com precisão – e sutil ironia – pelo autor, um legítimo herdeiro da aristocracia, guiado e inspirado por seus antepassados. Segundo, a grande capacidade descritiva e o apuro estético de Lampedusa; as incontáveis passagens repletas de detalhes belos e minuciosos refletem a influência da literatura francesa (que alterna muitos adjetivos com precisas escolhas de palavras) e inglesa (reflexões irônicas e autodepreciativas). Em uma dessas magníficas passagens, tamanhas são a riqueza e a exuberância da descrição do aroma do jardim dos Salina, que o narrador, consciente de sua façanha, sentencia: “Era um jardim para cegos”.

tradicional demais e não atendia aos pressupostos da literatura da época, cada vez mais afastada de uma ideologia aristocrática. Em 1959, é finalmente publicada e torna-se a obra de maior vendagem da Itália, sendo somente superada por O nome da rosa, de Umberto Eco, mais de vinte anos depois. Recebeu uma versão cinematográfica de sucesso no ano de 1963 e continua sendo lembrada como uma das obras mais importantes do século XX. Lampedusa não pôde sentir o prazer de ver seu feito mundialmente reconhecido, mas obteve êxito em eternizar um mundo que ruía lentamente.

Giuseppe di Lampedusa não publicaria O Leopardo em vida. Faleceu em 1957, um ano depois de finalizar o livro, vítima de câncer de pulmão. Suas duas tentativas de publicá-lo seriam em vão; em uma delas, sofreria rejeição da editora italiana mais renomada da época, a Einaudi: a obra foi entendida como

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ECOS da leitura



Risorgimento italiano do Reino da Itália, em 1861 – a capital Roma seria incorporada apenas em 1870, quando o processo de unificação chegou ao fim.

A trama de O Leopardo tem início em um momento decisivo da história política do território que conhecemos hoje como a Itália. O chamado Ressurgimento italiano foi o processo de unificação de pequenos Estados, todos absolutistas ou monárquicos, divididos a partir do Congresso de Viena (1814-1815) e dominados por potências estrangeiras.

Um dos personagens mais importantes da etapa final do Risorgimento foi Giuseppe Garibaldi, que, recém-chegado da Revolução Farroupilha no Brasil, desembarcou no Reino das Duas Sicílias – onde vive o príncipe Fabrizio no romance – e ajudou a burguesia a assumir o poder.

Ideais revolucionários e nacionalistas, no entanto, começaram a surgir, incentivados pelo progresso econômico, amadurecimento das instituições e Revolução Francesa de 1789, assumindo da mesma forma o lema “liberdade, igualdade e fraternidade”. Sucederam-se diversas tentativas de libertação, batalhas sangrentas e anexações territoriais que culminaram na proclamação

Trazemos neste Eco um mapa com a divisão dos reinos a partir do Congresso de Viena, visando a um maior envolvimento e compreensão histórica para o associado durante a leitura da obra de Giuseppe di Lampedusa.

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A antibiblioteca de Umberto Eco

Umberto Eco (1932-2016), o primeiro escritor italiano a superar a marca de vendas de O Leopardo em sua terra natal, com o romance O nome da rosa (1980), foi um dos pensadores mais importantes de seu tempo. Filósofo, literato, bibliófilo, professor e linguista, Eco é o autor da célebre frase: “Quem não lê, aos setenta anos, terá vivido uma vida só. Os que leem terão vivido cinco mil anos. Ler é a imortalidade em retrospecto”. Grande parte dos seus leitores não sabe, mas o autor construiu uma fantástica biblioteca em sua casa, em Milão, com mais de trinta mil títulos. No livro A lógica do cisne negro (2007), publicado pela editora Best Seller, o escritor libanês Nassim Nicholas Taleb a apelidou de “antibiblioteca”, acrescentando que Eco é o exemplo de alguém que entende como deve ser encarada uma biblioteca pessoal:

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“Umberto Eco pertence a um pequeno grupo de acadêmicos que são enciclopédicos, inteligentes e interessantes. Ele é dono de uma biblioteca pessoal enorme (contendo trinta mil livros) e separa os visitantes em duas categorias: aqueles que reagem dizendo, ‘Uau! Signore professore dottore Eco, que biblioteca você tem! Quantos desses livros você já leu?’ e aqueles – uma pequena minoria – que entendem que uma biblioteca particular não serve para inflar o ego, mas é uma ferramenta de pesquisa. Os livros já lidos são muito menos valiosos que os não lidos. A biblioteca deveria conter o máximo do que você não conhece conforme seus recursos financeiros, taxas de hipoteca e o atualmente inflexível mercado imobiliário permitem. Você vai acumular mais conhecimento e mais livros conforme envelhece e o crescente número de livros não lidos nas prateleiras olharão para você ameaçadoramente. Na verdade, quanto mais você sabe, maiores são as fileiras de livros não lidos. Vamos chamar essa coleção de livros não lidos de ‘antibiblioteca’”. Nós sabemos bem como é isso. A cada mês, além do livro enviado, ingressam em nossa antibiblioteca outros livros do mesmo autor, obras do curador, leituras relacionadas... E por aí vai.

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Filhos únicos Embora tenha escrito uma autobiografia e alguns contos, Giuseppe Tomasi aventurou-se a escrever apenas um romance, que, no entanto, virou best-seller. Ele não foi o único.

Oscar Wilde

Margaret Manuel Antônio de Almeida

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Mitchell


Memórias de um sargento de milícias

ne. Um ano depois a Ward, Lock & Company publicou uma versão ampliada e revisada. Wilde faleceu em 1900, com quarenta e seis anos.

Manuel Antônio de Almeida Memórias de um sargento de milícias foi lançado em 1852 e é o único livro de Manuel Antônio de Almeida. O autor nasceu em 1831 e faleceu em 1861, tendo escrito artigos, crônicas e críticas para os jornais de sua época. Já Memórias foi publicado como folhetim, de 1852 a 1853, pelo jornal Correio mercantil, e ficou marcado pelo estilo jornalístico e direto, utilizando a linguagem das ruas, das classes médias e baixas, em contraste com o romantismo vigente da época.

E o vento levou Margaret Mitchell

Publicado em 1936, E o vento levou é um dos livros mais vendidos de todos os tempos. A obra venceu o Prêmio Pulitzer de Ficção de 1937 e foi adaptada para o cinema em 1939, proporcionando a Margaret Mitchell o exato tipo de fama que ela queria evitar, a ponto de se recusar a escrever outro romance. Atualmente, o livro tem uma venda anual estimada em setenta e cinco mil cópias, o que é impressionante para uma obra com mais de oitenta anos.

O retrato de Dorian Gray Oscar Wilde

Oscar Wilde possui uma obra extensa de poesias, ensaios, peças de teatro e novelas, mas possui apenas um romance, O retrato de Dorian Gray. A primeira versão do livro foi publicada em 1890 pela Lippincott’s monthly magazi-

Doutor Jivago Boris Pasternak

Boris Pasternak não pôde publicar Doutor Jivago na então União Soviética, devido ao teor anticomunista do romance. Os originais foram contrabandeados e editados na Itália, em 1957, tornando-se um best-seller e levando o autor russo a ser laureado com o Prêmio Nobel de Literatura de 1958. A memorável adaptação para o cinema também ajudou a popularizar a obra e o nome do autor ao redor do mundo.

Boris

Pasternak 23


O boom latino-americano foi um movimento literário que despontou nos anos 60 e 70, quando a obra de romancistas latino-americanos foi amplamente divulgada na Europa e no resto do mundo. Entre tantos nomes importantes que surgiram nessa época, quatro se destacam: Julio Cortázar, da Argentina, Carlos Fuentes, do México, Gabriel García Márquez, da Colômbia, e Mario Vargas Llosa, do Peru. Apresentamos brevemente os três companheiros literários do nosso curador.

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nhecido por seus ensaios sobre política e cultura. Fuentes foi um grande admirador de Machado de Assis, que considerava o único autor da América Latina do século XIX a ter seguido a tradição de Cervantes – a chamada “tradição de la Mancha”. Sua obra é extensa, tendo escrito peças de teatro, ensaios, contos e romances. Entre outros livros, destacam-se: A morte de Artemio Cruz (1962), Aura (1962), Gringo velho (1985), Cabeça da hidra (1978), Zona sagrada (1967) e O espelho enterrado (1992).

Julio Cortázar Nascido em 1914, é considerado um dos autores mais inovadores e originais de seu tempo, mestre do conto curto e da prosa poética. Foi o criador de novelas que inauguraram uma nova forma de fazer literatura na América Latina, rompendo os moldes clássicos a partir de narrações que escapam da linearidade temporal e em que os personagens adquirem autonomia e profundidade psicológica inéditas. Seu livro mais conhecido é O jogo da amarelinha, de 1963, que permite diversas leituras orientadas pelo próprio autor. Cortázar inspirou um grande número de cineastas, entre eles, Michelangelo Antonioni, cujo longa-metragem Blow-up foi baseado no conto “As babas do diabo”, do livro As armas secretas.

Gabriel García Márquez Nosso querido Gabo nasceu em 1927 e foi escritor, jornalista, editor e ativista político. Considerado um dos autores mais importantes do século XX, foi também um dos escritores mais traduzidos no mundo, com mais de quarenta milhões de livros vendidos em trinta e seis idiomas. Recebeu o Nobel de Literatura de 1982 pelo conjunto de sua obra, que, entre outros livros, inclui o aclamado Cem Anos de Solidão. Nossos associados já tiveram a oportunidade de desfrutar de sua sagacidade em Doze contos peregrinos, enviado em dezembro de 2015.

Carlos Fuentes Carlos Fuentes Macías nasceu em 1928, no México, e foi romancista, novelista e ensaísta. Além de suas obras de ficção, também ficou co-

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Espaço do Leitor Os curadores como associados da TAG Todos os meses, acompanhamos a ansiedade entre os associados para descobrir qual é a próxima obra do clube, bem como o mimo e o resultado final do kit. Para todos os apaixonados por literatura, essa ansiedade é normal — o mais legal é que, assim como você, nossos curadores também anseiam pelo momento em que o kit da TAG chegará, mesmo já sabendo o título da obra enviada. Dedicamos este Espaço do Leitor às mensagens de alguns dos curadores após o recebimento do kit.


Oi! Recebi o kit. Ficou muito legal! Muito! Vocês são muito profissionais. Espero que os membros da TAG se envolvam com O xará e que vocês mantenham a qualidade desse projeto tão importante para o país e para todos nós, amantes dos livros. Obrigada pela honra do convite, adorei participar. Beijo carinhoso, Martha

Martha Medeiros

Curadora do mês de fevereiro. Indicação: O xará, de Jhumpa Lahiri

Querida TAG, Meu kit chegou!!! Ficou muito bom! A edição está bonita, bem-acabada, perfeita. E o material informativo é muito rico e bem feito. Tentei imaginar o prazer do sócio que o recebe, o quanto de informação há ali para ele. É tão difícil hoje escolher livros em livrarias apinhadas por uma oferta avassaladora, gêneros misturados nas mesas das novidades, e tão pouca informação. O leitor da TAG há de sentir-se protegido, orientado. Parabéns! Foi um prazer ter participado desse esforço conjunto para levar bons livros até a casa do leitor. Um abraço grande, Marina

Marina Colasanti Curadora do mês de março. Indicação: A câmara sangrenta e outras histórias, de Angela Carter

Daniel Galera foi além: não aguentou a euforia ao receber o kit de abril e compartilhou a foto da caixinha, prejudicando a experiência de alguns associados: Oi! Recebi a caixa com o kit do Irmãos Sisters. O material está lindo, que barato o saquinho com as moedas. E só pra teu conhecimento, porque vai que alguém reclama com vocês: no calor do momento, tirei uma foto e tuitei a minha indicação. Instantes depois um seguidor me respondeu dizendo que eu tinha estragado a surpresa, e me dei conta da cagada: muitos associados podem não ter recebido ainda, e a surpresa é parte da graça. Deletei o tweet na mesma hora. Espero que não tenha causado muito dano :P Um abraço, Daniel

Daniel Galera

Curador do mês de abril. Indicação: Os irmãos sisters, de Patrick deWitt


A indicação de

Polêmico. Esse é melhor adjetivo para o protagonista da história escolhida por Marcelo Rubens Paiva aos associados da TAG. Nascido na União Soviética durante os anos quarenta, o personagem cresce em meio ao caos: no underground russo, envolve-se com bandidos, militares, escritores. Ao atingir a maioridade, decide fugir desse ambiente, e parte para os EUA em busca de prestígio. Acompanhamos, então, um homem que passa por experiências como poeta, mendigo, político e escritor de sucesso. Uma história quase inverossímil – se não fosse verídica. O livro é considerado um “romance de não ficção” e sagrou-se vencedor dos principais prêmios literários da França. Contemporâneo, o autor utiliza-se de uma narrativa veloz, direta ao ponto - muito parecida à do próprio curador, que vocês tiveram o prazer de conhecer em Ainda estou aqui (2015).

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“Em 2017, faz cem anos da Revolução Russa. O livro que indiquei é fantástico, uma forma de ver como era a rotina na União Soviética, especialmente a dos jovens que não se encaixavam com as normas do partido. Bem-vindo a um dos eventos mais importantes do século XX, narrados com paixão e inteligência.” – Marcelo Rubens Paiva


Este foi o kit de NOVEMBRO DE 2017. Para adquirir este e outros kits passados, acesse a nossa loja: www.loja.taglivros.com



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