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Marcelo Ariel
Cosmogramas Rubra Cartoneira Editorial
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Ariel, Marcelo. Cosmogramas. / Marcelo Ariel. - - Londrina: Rubra Cartoneira Editorial, 2012. 1. Literatura Brasileira. 2. Poesia
Cosmogramas © Marcelo Ariel, 2012 Capa Revisão
Beatriz Bajo
outras obras publicadas da Rubra Cartoneira Editorial:
Beatriz Bajo domingos em nós (2012) Chico César rio sou francisco (2012) Karen Debértolis Prosa de palavras (2012) Reynaldo Bessa Não tenho pena do poema (2012)
Rubra Cartoneira Editorial Marcelo Ariel Anderson Fonseca Jesus Bajo Karen Debértolis Reynaldo Bessa MaicknucleaR Chico César Beatriz Bajo
1ª edição: abril de 2012
Rubra Cartoneira Editorial www.rubracartoneira.com.br http://rubra-c-editorial.blogspot.com
Londrina - PR 4
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MANIFESTO RUBRO POÉTICO CARTONEIRO (fragmentos) - Somos fundadores do fenômeno cartoneirismo no estado do Paraná. - Aliamos literatura, artes plásticas e consciência ecológica, utilizando da autonomia para a implementação da proposta editorial de descentralização do livro e valorização de todos os artistas implicados no projeto. - Assim como os precursores cartoneiros (o fenômeno cartoneirismo advém da iniciativa de algumas editoras utilizarem papelão para a confecção das capas de livros. Esse movimento nasceu em consequência da crise argentina de 2002 e culminou com a criação da Eloisa Cartonera e outras editoras estão sendo criadas na América Latina e alguns países da Europa, como Espanha e Alemanha), somos latino-americanos e temos as mãos e os corações abertos para o mundo, lutando por nossa identidade e autonomia cultural, política e sócio-econômica. - O projeto abre novas veredas editoriais, buscando outras estratégias para a gestão econômica, uma alternativa de negócio no mundo editorial adequado à realidade atual, oferecendo diversidade de preços, personalização de cada exemplar, diálogo entre as manifestações artísticas e laços amistosos pelo mundo por meio de traduções, produções, apresentações e venda em países de outras línguas. - Temos o vermelho vivo no peito e nos pés ( já que estamos na cidade da terra vermelha), confiança, coragem, paixão e amor uns pelos outros e grandes aspirações: nosso pigmento é intenso. - Nascemos em 2012, no ano da Lua, símbolo feminino como nossa rosa, que representa o sublime da nossa alma; a rosa como taça que recebe o orvalho e a chuva em suas pétalas, assim é a Rubra Cartoneira, que acolhe a poesia da vida e exala o perfume da arte.
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Marcelo Ariel
Cosmogramas
Rubra Cartoneira Editorial 2012
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sobre o autor: MARCELO ARIEL (Santos/SP, 1968). Poeta, dramaturgo e performer. Seus livros são Me enterrem com a minha Ar-15 (Scherzo-Rajada) (Dulcinéia Catadora, SP, 2007); Tratado dos Anjos Afogados (Letraselvagem, 2008), O céu no fundo do mar (Dulcinéia Catadora, SP, 2009), Coltrane Blues (Dulcinéia Catadora, SP, 2010), Conversas com Emily Dickinson e outros poemas (Ed. Multifoco, RJ, 2010), A morte de Herberto Helder e outros poemas (Sereia Ca(n)tadora, SP, 2011) e A segunda morte de Herberto Helder (21 Gramas, PR, 2011). Pode ser acompanhado em seu blogue http://teatrofantasma.blogspot.com/.
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índice
ilustrações: mandala 1 - Cida Bajo mandala 2 - Akemi Kusuno mandala 3 - Marcelo Ariel mandala 4 - Beatriz Bajo
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PREFÁCIO DO AUTOR................................... 09 Cosmograma 0.................................................. 13 Cosmograma 1................................................... 17 Cosmograma 2.................................................. 18 Mandala 1........................................................... 20 Cosmograma 3................................................... 21 Cosmograma 4.................................................. 22 Cosmograma 5.................................................. 23 Mandala 2.......................................................... 24 Sem título........................................................... 25 Salmo para a Palestina................................... 26 Cosmograma 6.................................................. 29 Nicanor Parra conversa com Holderlin enquanto Hilda Hilst sonha com Jean Luc Godard parecendo na verdade ser o oposto............................................................... 30 Sem título........................................................... 31 Mandala 3.......................................................... 32 Aviso.................................................................... 33 Love is all........................................................... 34 A vida na ilha.................................................... 35 Cosmograma 7.................................................. 36 Hilariodrama para Rimbaud........................ 37 Nota final do autor.......................................... 39 Mandala 4.......................................................... 40
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PREFÁCIO DO AUTOR Escrito especialmente para a RUBRA CARTONEIRA EDITORIAL de Londrina, uma ideia-ressonância que foi materializada por Beatriz e Jesus Bajo. Neste livro estão os fragmentos de coisas que escrevi dentro do mangue de Cubatão, uma série profundamente inspirada na audição do disco COISAS de Moacir Santos, o que o Mestre Moacir chama de Coisas eu chamo de Cosmogramas, trata-se da mesma energia espiritual da natureza, que ele traduzia como música e eu ambiciosamente traduzo como textos. Não me interessa mais escrever poesia, é um campo infestado de egomaníacos sutis, me identifico profundamente com o que o grande Nicanor Parra quer dizer quando chama a si mesmo de ‘antipoeta’, escrevo uma coisa híbrida entre o poema e a meditação koan do Zen. Me interessa mais o koan do que o poema. Ainda não desenvolvi a elegância suprema de não assinar mais meus textos, a própria ideia de autoria é ridícula como os conceitos de pátria, fronteiras, nomes e etc. Sou como você, um covarde, e não possuo a coragem extraordinária de viver sem um nome. Me tornar eu mesmo uma Coisa, um Cosmograma vivo. Marcelo Ariel
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Nota final do autor
Para Jesus Bajo, Margarida Llansol, Dora Ferreira da Silva e Hilda Hilst
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Os aspectos cosmológicos e cosmogônicos estão na primeira camada chamada de Infância com seus olhos de cão, de boi ou de cavalo e os aspectos lúdicos na segunda camada. Crianças grandes penetram nesse jardim, crianças pequenas jamais saíram dele. Aqui sim, temos uma metafísica da poesia ampliada até o tempo-eternidade, como uma materialização das melhores composições de Satie dentro do tempo sintético de Webern no espaço de uma rua ou de um dia. Na adolescência ou estado de perambulação interior temos a exploração onírica do acaso, algo que nos aproxima de uma síntese entre o fogo natural e o sobrenatural, em outra temporalidade que exige um silêncio de observação, que só teremos na velhice e que deveríamos exercitar depois, durante o resto de nossas mortes cronológicas ou solturas internas que só os que se afastam muito do barulho do mundo serão capazes de anular sendo ‘Ninguém’, principalmente do afastamento do mundo coberto de códigos de linguagem sempre se alterando sem significar jamais algo verdadeiro como um segredo. Estes leitores raros do véu não perdem o contato com o sentido mais simples e acessível desse sentimento sem nome que jamais teve qualquer relação com a paixão, com o dinheiro ou com a palavra e serão capazes de tocar na árvore da transformação destes códigos que fantasmagorizam o mundo em um abraço absoluto e através desse abraço na árvore do conhecimento do real, chegar a uma amálgama de silêncios onde desenho e símbolo evocam a única alma que existe e é tudo e todas as coisas. 39
(Não A-tor acende uma vela e a coloca na cabeça) Ivo Barroso: Mas Jean Arthur era orgulhoso demais, cético demais; enfim, ele era jovem e não conseguia desprezar as palavras, isso que ele chamava “lixo da Alma” Rimbô: Por outro lado, ele não conseguia perceber que a fé nas manhãs africanas era uma máscara da santificação do mundo.
“Tão rápido quanto o sol se põe no céu Você se levanta e diz adeus a ninguém” Bob Dylan
“O espírito é aquilo mediante o qual as obras de arte, ao tornarem-se aparição, são mais do que são.” Adorno
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Hilariodrama para Rimbaud “Só sei cantar graças às sereias. Elas me ensinaram. Minha voz apenas mora em mim. Não é minha. É das sereias. É de Deus (.......) Acredito em Sereias. Certas pessoas conseguem ouvi-las, enxergá-las. Eu nunca as enxerguei. Mas as sinto, talvez porque queira senti-las. Creio que esteja no mesmo lugar em que as sereias se encontram. Uma benção!” Maria Bethânia
Rimbô: A fé queima tudo menos o silêncio (Não A-tor sentado em uma cadeira em um lugar que simula um deserto, pó de ser a avenida paulista ou o vão livre do masp en la noche) Himbaud: Gostaria que você falasse minha língua e não a língua dos escravos… Cruz & Souza: A língua do dinheiro? Rimbô: Sim, mas agora é tarde demais para voltar a fazer aquilo, o lixo que você chama de poesia. O lixo da Alma Cruz e Souza: No dia seguinte ele terá fé, isso é como se o brilho do Sol cintilasse sobre uma fina camada de gelo 12
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Cosmograma 7 1- O nascimento de Cristo é a fundação de uma mitopoética que é marcada pelo movimento da divindade que "desce" até a condição humana. 2- A humanização do Verbo assinalada pelo mesmo Anjo que havia expulsado o homem do Paraíso pode ser sentida pelas mulheres representadas no acontecimento mitopoético por Maria que, dentro do acontecimento, redime a expulsão de Eva. 3- É óbvio que após o nascimento de Cristo, Maria, mitopoema que representa todas as mulheres, sente em todos os tempos o esvaziamento e o abandono como partes do sentido do sagrado e isto todas as mulheres podem sentir através de um incomensurável movimento sinérgico dentro da rede de ligação entre o mitopoema e a teia de intuições.
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Cosmograma 0 Diálogo com Ângela A. Quando sua mão escreve, você está a aproximar-se de algo? M. Sim, de um calor nos pés. Às vezes quando escrevo poemas ou quando leio em voz alta alguns dos 'salmos de david', tenho a sensação de que meus pés estão descalços, mesmo que eu esteja calçado, de que eles estão plantados nas águas de um oceano. Um oceano de águas quentes, talvez com o Sol no fundo. Certamente é isso, há um Sol no fundo do mar. Existe a armadilha de projetar o sagrado nas palavras e, durante muito tempo, como um morcego preso pelo rabo em uma ratoeira, me sentia preso na tentativa de dar um sentido metafísico para a linguagem cotidiana, atualmente tenho a convicção de que 'A palavra' escrita ou falada é o 'reino do demônio' e que escrevendo podemos passar por elas como se atravessássemos uma ponte até chegar a um silêncio edênico, que começa nos ossos dos pés, até explodir na cabeça como uma auréola, por onde sai e sobe aos céus. Quando este silêncio quente chega ao coração, todas as palavras se dissolvem e nesse vazio-transparência podemos finalmente nos aproximar do que não pode ser dito, daquilo que nos Evangelhos é chamado de O Verbo, 13
o que torna possível a existência do 'paraíso' no mundo e não o oposto. Não podemos nos aproximar desse silêncio solar se estamos em algum lugar fora do mundo; muitos amigos meus poetas escrevem sua procura a partir de algum lugar fora do mundo, e isto torna difícil a sensação viva da existência do Éden, viva como o toque da mão do feto na placenta. Estudo muito 'A Bíblia' e dia-após-dia sei cada vez menos e sinto cada vez mais, por exemplo, senti anteontem que a resposta a Jó pode ser resumida como a lembrança vivíssima de que um dia fomos apenas uma simples célula, esta célula teve acesa dentro dela a sensação viva do Éden e sentiu a nossa presença. Do mesmo modo, podemos sentir o silêncio e o rastro harmônico do Éden como um lugar depois de todas as palavras. Há um poema de Hans Eszemberger que discute essa questão de um modo mais pragmático, diz o poema que quando alguém está feliz jamais pensa na palavra felicidade. De igual modo, estamos no Éden, nos aproximamos do Éden. Houve um prisioneiro que atravessou um campo de concentração ao meio-dia e antes de levar um tiro na cabeça, sentiu o Éden como algo um milhão de vezes mais real do que o regime nazista, do que o próprio campo de concentração. Existe também um campo de concentração das palavras e dele nos afastamos, sem a necessidade da morte como extensão do Ser. Para a filosofia concreta, nenhuma criatura finita tem acesso ao Ser, discordo com todas as minhas forças desse enunciado.
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A vida na ilha Sim, ela foi a democratização absoluta da graça...me lembro quando todas as cascas foram dissolvidas e a bem-aventurança ainda estava lá...a absolvição geral e irrestrita de toda a humanidade...o cancelamento do suicídio do espírito etc. Você ainda estava lá quando a terra parecia vazia e totalmente devastada...ainda estava lá para ver a rosa como se imerso em um cubo de trevas de onde precisa mergulhar em um bosque oceânico para encontrar as luzes mais profundas para iluminar os altos sentidos de uma beleza tão óbvia que é quase invisível...A Beleza do Brasil.
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A. De quê/quem você é íntimo? Love is all “Quando se enfatiza apenas a abertura radical para o outro, isso pode equivaler a um fechamento extremamente idiossincrático, se essa abertura não for operacionalizada num conjunto de regras estabelecidas. Caso contrário, tem-se apenas a abertura radical para a alteridade, e isso também pode ser o nome de um fechamento. (..........................................) Também é certo afirmar que quando se traduz a abertura para o outro num conjunto de normas positivas de comunicação, também se fecha a dimensão de alteridade." Slavoj Zizek O amor em oposição à impossibilidade do diálogo total não se nutre das noções abstratas do outro, construídas a partir do que podemos chamar de absolutismo do imaginário-nomeador; ao contrário, ele se inicia quando, no autêntico encontro humano, todos os rótulos são retirados e o rosto do outro pode ser visto num vislumbre como parte-do-ser-equivalente-ao-misterioso-desconhecimento-do-mundo, ou seja, o outro sem rótulos e sem nome construído pelo êxtase-aniquilamento do tempo é o vislumbrevertigem da Alma. John Stolen Hell no ensaio 'O roubo do Léxico: Juliano Garcia Pessanha' 34
M. Do estranhamento-amor, ele é como uma névoa prateada que não queima quando chegam os primeiros raios da manhã edênica, insisto muito no Éden, porque ele não é uma ideia. A. Há amizade entre o homem escritor e o homem civil? M. Sim, através do Poema desaparece a separação entre uma coisa que vê e a coisa vista, sou inimigo da visão dicotômica entre vida e literatura, tenho a profunda fé na fusão entre Hamlet e Shakespeare, Hamlet escreveu todas as peças de Shakespeare. Um cão é um cão-lobo e não um lobo-cão. A. Qual a sua espinha? Com o quê/quem conversa? M. Com o Querubim, ora é um cão, ora é uma criança, ora é um lobo, ora é uma árvore que fala. O Ser é uma pergunta-resposta? A. O que aprendeu escrevendo? M. Escrevendo aprendi a ler, do mesmo modo, quando alguém ama, aprende a escutar.
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A. Há impropriedade? M. Na dúvida, sim. Este trabalho que fazemos exige uma fé para além do pensamento e da palavra. Mas existem os que vivem no reino do entre e nesse caso as impropriedades são constantes e absurdas. A. Como você lê? Você é leitor do que escreve? Como vê aqueles que o leem? M. Não saber e não ver são atributos da fé. Não sei o que é e não vejo o que me lê. Não sei quem são, nem o que são. Mas sei de um modo sobrenatural que eles estão perto de mim, estou do outro lado da calçada na rua que aparece nos sonhos deles, sejam eles computadores ou pessoas, árvores ou nuvens, pedras ou lagos.
Aviso O poema não é você, ele apenas passa por você, mas você depende dele para ser, ele vem do não-ser e explode delicadamente sem ninguém perceber, se você se importa mais com o poeta do que com o poema, ele explode fora de você (John Stolen Hell em ‘A fúria do que não existe’) “ Me disseram que você falava a minha língua e não a língua dos escravos, a língua do dinheiro, essa parte de nós que preferimos no lugar da outra que tememos, a língua do deserto...” (Rimbaud dentro de Van Gogh)
Nota: Publicado originalmente no blog Epidermias de Ângela Castela Branco.
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Aviso O poema não é você, ele apenas passa por você, mas você depende dele para ser, ele vem do não-ser e explode delicadamente sem ninguém perceber, se você se importa mais com o poeta do que com o poema, ele explode fora de você (John Stolen Hell em ‘A fúria do que não existe’) " Me disseram que você falava a minha língua e não a língua dos escravos, a língua do dinheiro, essa parte de nós que preferimos no lugar da outra que tememos, a língua do deserto..." (Rimbaud dentro de Van Gogh)
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Cosmograma 1 Os grandes poetas serão arrancados de seus nomes como leões e leoas ficarão vagando no deserto onde o vento cantará a luz única do dia e da noite uma partitura semiapagada escrita na pele das coisas a canção da vida nas horas eternas dentro dos dias efêmeros eles serão como galhos entrelaçados de árvores arrancadas pelo vento.
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Cosmograma 2 Seus olhos serão sempre o paraíso aberto respirando sonhos seu rosto desaparece e depois volta entra no dia como esse silêncio escrevendo seu nome: seus olhos despertando para a visão dos oráculos cada vez mais interiores lutando contra a aflição dos espaços em branco se dissolvendo na matéria escura (O transe da terra) Aqui a maior concentração de ruído é em volta da biblioteca, a cidade e o silêncio não tem vez, como em uma peça do Clube Noir a escuridão é o corpo do silêncio fora dela, mortos em sonho, a vida é um intervalo que não sabemos aproveitar, pensamos dentro de uma conexão constante que se torna com o tempo abstrata. 18
Sem título a solidão é o esqueleto da aura principalmente quando é o símbolo da ausência da Alma e essa é a essência do nosso tempo. A infância mítica pode ser a dimensão inacessível da afetividade profunda. Não existe nenhuma passagem em todo o Proust nem em seu duplo objetivado Freud sobre a potência mítica e esquecida da infância, um mistério biológico que sempre analisamos como se fosse uma idade contínua e um esboço da vida do espírito congelada na memória autônoma de um sonho.
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Nicanor Parra conversa com Holderlin enquanto Hilda Hilst sonha com Jean Luc Godard parecendo na verdade ser o oposto
Como se Brecht tivesse escrito seus Salmos por causa da impossibilidade de acessar as visões de Ezequiel: Assim vivemos.
Nicanor Parra: Não estou muito interessado em ser um poeta, antes um antipoeta e assim defender a poesia de seu incômodo e essencial mediador. Holderlin: Cantar os antigos, Divinos e bem aventurados, jamais foi cantar a si, tanta clareza é inimiga da visão, assim como é sua morte o sono da luz, chamado escuridão, mas se fôssemos, como antes do nome, puros espíritos, faríamos soar em tudo este silêncio solar, que Marcelo Ariel canta no poema anterior. Hilda Hilst: Você tem as mesmas pretensões controladoras do imanente do Sr. João Cabral? Godard: De modo algum, confundi a Senhora com Madame Duras, devo me deslocar até um sonho mais reconhecível. Quem são estes dois homens azuis? Hilda Hilst: Aquele dos cabelos longos até a cintura, parece ser Holderlin e o outro, não sei, deve ser João Cabral. Essa voz que vem de dentro É a voz do mar. Ela pergunta-nos: onde está a morte?
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Cosmograma 6 Muitos poemas poderiam ser extraídos da Mínima Moralia ou do silencioso amanhecer ‘Vá tomar no seu cu’ diz a memória para o Ser é só mais um louco gritando no ponto de ônibus seu Maesltrom Não, este poema não contorna uma nitidez estratégica até tocar o dia do seu nascimento tão obscuro límpido quanto o dia da sua morte ‘Esquecimento é libertação’ diz a História usando uma máscara de ausência segurando a cabeça do leão ‘Me converto em impossível nada’ enquanto ouvimos Extra data do Sonic Youth no celular é o som do espírito saindo, arranhando o crânio, as sinapses etéreas fugindo para a copa das árvores,
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‘Mas eu deixo um rastro harmônico, seus merdas’ canta o próprio esquecimento de dentro da explosão solar, muitos poemas poderiam ser retirados de dentro desse silêncio que se materializa como luz dentro do ruído que somos, mas não há tempo... 29
que se apague da mente dos poetas este canto, onde Querubins sem braço com a cabeça enfaixada brincam com Azrael, O Poeta do povo dirá ao pisar no teu Solo: Sentimos o nascimento Dos braços, A queda Das asas E a das folhas Da árvore do bem e do mal, Agora nos consola Saber Que a palavra Mais sublime Não ilumina o suficiente, Que uma língua tocando a outra Não ilumina o suficiente Somente o olhar dos animais pacíficos Pastando nos teus campos Palestina Como a morte E o amor Iluminam este silêncio Dos mortos Para sempre.
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Cosmograma 3 Acordar exigirá uma codificação do estranhamento, a linguagem entrará devagar em nosso campo, Ela não é como a luz embora igualmente efêmera e constante, como esse surto cósmico das manhãs ela sequestra o ser pedindo como resgate o ausente sentido para um silêncio tão antigo. Sendo assim nunca termina ‘o acordar’ Porque a própria vida não contém suficiente espaço para você despertar.
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Cosmograma 4 Se és luz, não te tornes ser Maior será a mente de fora, atrás de cada expensamento. que explode ao tocar no Sol de silêncio depois da morte.
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este calor desenhando um arco em volta do teu coração Uma auréola de alegria e paz ao redor de qualquer rosto Palestina Amar qualquer rosto será mais do que amar uma Nação, Erramos quando pensamos Que o amor estava Ali, o amor é este lugar É qualquer rosto vivo e está aqui, Não é o deslocamento do azul do céu, Palestina Não é o sangue derramado não é o dinheiro, esta onda que avança por dentro do sangue de inúteis exércitos até o fundo do oceano, destino de todo o ouro e depois sobe. volta até a absurda praia dos ossos. Palestina Eis o triunfo do amor Secando o mar de sangue . Teus mortos Verão o Sol frio como a Lua Incipit parodia Do mais real do que o sonho. Palestina Cesse de cantar a canção do impossível para a aragem do campo das beatitudes,
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Salmo para a Palestina Uma rosa de Sal não afunda; Ama. Uma rosa de cristal não morre: Brilha. Uma rosa de luz não compreende: Vive. Você ouvirá todas as rosas cantando seu nome Palestina No jardim que antes estava fechado para ti. Palestina A folha secando na areia não será mais a morte, mas o êxtase da fusão com o céu que tu agora chamas de chão, Palestina Será como uma oração 26
Cosmograma 5 O poema pré-existente em camadas de tempo o tempo consumindo apenas a crisálida deixando intacta a camada das sensações exteriores onde você jamais foi atingido continuam as ondas do Sol de milhões de corpos formando uma única vida da Alma onde o próprio Sol é o óvulo enviando sinais chamas de uma força metafísica maior do que o tempo
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Sem título no tempo do tempo de todos os tempos acontece a descoberta do tempo ontológico. a pesquisa do dialógico como matéria da criação de camadas de superposição dentro do poema. o cinema como etnopoesia. superação do estilo como surto. concha trincada por onde escapa a luz. Do início do fim da dicotomia corpo e espírito. retorno das pesquisas com o Butô. vida celular das imagens. vida cósmica do silêncio. ilusão dos conselhos municipais desfeita. retorno da poesia metafísica. antidrummond. antijoão cabral. mais próximo de thom yourke. bjork, satie. gil scott heron. ijikata. antipoeta
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