FRAGILIDADE EDUARDO FERRIOLLI Professor Associado Coordenador da Divisão de Clínica Médica Geral e Geriatria Faculdade de Medicina de Ribeirão Preto Universidade de São Paulo
Tópicos • Definições de “Fragilidade do idoso” – Conceitos iniciais – Conceitos atuais – Conceitos mais aceitos
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Fisiopatologia Diagnóstico Consequências Prevenção e Terapêutica Conclusões Bibliografia
Conceitos iniciais (década de 80): funcionais • Idoso frágil: aquele com mais de 65 anos, dependente de outros para as Atividades de Vida Diária. (Woodhouse, 1988) • Idoso frágil: debilitado, que não poderia sobreviver sem o auxílio de outrem. (Gillick, 1989)
Década de 90: evolução para um conceito “fisiopatológico” • Síndrome consumptiva caracterizada por fraqueza e estado nutricional ruim. (Gillick, 1997) • Síndrome que resulta de redução multi-sistêmica na capacidade de reserva, de forma que vários sistemas fisiológicos estão próximos ou ultrapassam o limiar de falência clínica sintomática. (Campbell & Buchner, 1997)
Anos 2000: consolidação de um modelo “fisiopatológico” Estado de vulnerabilidade fisiológica relacionada à idade, resultante de reservas homeostáticas comprometidas, e uma capacidade reduzida do organismo resistir aos estressores. (Fried & Walston, 2001)
Comparação do efeito de um estressor sobre a capacidade funcional de um idoso não frágil e um idoso frágil
Capacidade funcional
Estressor (por exemplo, infecção urinária) Não-frágil
Independente Dependente
Adaptado de Clegg et al., 2013
Frágil
Modelo fisiopatológico Pessoas com algumas alterações relacionadas ao envelhecimento mais intensas seriam propensas à síndrome
Alterações mais frequentemente relacionadas à síndrome da fragilidade Redução da massa e da função muscular
SARCOPENIA Citocinas catabólicas
GH, esteróides sexuais Desregulação do cortisol
DESREGULAÇÃO NEURO-ENDÓCRINA
DISFUNÇÃO IMUNOLÓGICA Desregulação do cortisol
O ciclo da fragilidade Portadores dessas alterações, quando sofrem agressões externas (doenças agudas, perdas cognitivas, quedas, etc…) , ou mesmo o acúmulo de alterações do envelhecimento (anorexia, redução do paladar, redução do equilíbrio) entram em um círculo vicioso, auto-sustentado, de perda de energia
Esquema do ciclo central da Síndrome da Fragilidade Desnutrição crônica
Balanço nitrogenado neg. Massa muscular Sarcopenia
Gasto energético total
Taxa metabólica de repouso
Adaptado de Fried e colaboradores, 2001
O Ciclo da Fragilidade, com suas mĂşltiplas entradas
Adaptado de Fried e colaboradores, 2001
Isso tudo se converte em um declínio espiral de energia, um processo auto-sustentado sem autocorreção. Neste processo, os prejuízos iniciais e limitações precipitam novos declínios.
Diagnóstico: dois modelos diferentes • Modelo do Fenótipo – Fried e colaboradores, 2001
• Modelo dos déficits cumulativos – Rockwood e colaboradores, 2005
Critérios clínicos para o diagnóstico de Fragilidade (Modelo fenótipo – Fried e cols.) • Redução da força de preensão palmar • Redução da velocidade de marcha • Perda de peso não intencional • Sensação de exaustão • Atividade física baixa
Perda de peso n達o intencional Auto relato de perda de peso n達o intencional > 4,5 Kg ou > 5% do peso corporal, no ano anterior.
Exaustão Duas perguntas do questionário CES-D Na última semana com que frequência: • Sentiu que teve que fazer esforço para dar conta das suas tarefas habituais? • Não conseguiu levar adiante as suas coisas? • Respostas: “sempre” “na maioria das vezes (3 a 4 dias/sem)”
Baixa força de preensão palmar • Dinamômetro tipo Jamar®, ajustado para o nível 2 • 3 tentativas de esforço máximo com o membro dominante
• Valor expressos em kgf e ajustados por gênero e Índice de Massa Corporal • 20% menores valores da distribuição da população
Baixo nível de atividade física • Minnesota Leisure Time Activities Questionnaire - 18 atividades diferentes realizadas na semana anterior (frequência e duração). • Valores expressos em kcal/sem e ajustados para sexo e peso. •
20% menores valores da distribuição da população
Lentidão • Caminhar 4,6 metros em passo habitual - 3 tentativas
• Registro do tempo para percorrer a distância • Valores ajustados por gênero e altura.
• 20% maiores valores da distribuição da população.
Critérios clínicos para o diagnóstico de Fragilidade (Modelo fenótipo – Fried e cols.) • Ausência de critérios: não há fragilidade • 1 ou 2 critérios presentes: pré-fragilidade
• 3 ou mais critérios presentes: fragilidade
Diagnóstico clínico: Modelo dos déficits cumulativos (Rockwood e colaboradores) • Índice de fragilidade
• 92 variáveis de sintomas, sinais, alterações laboratoriais e déficits • Índice: proporção de variáveis presentes em 92
– Ex.: 20 déficits presentes: 20/92 = 0,22 • A lista foi reduzida para 30 variáveis
Comparação dos dois modelos • Grande sobreposição para o diagnóstico • Fenótipo: categórico (frágil ou não)
• Índice de fragilidade: maior discriminação de fragilidade moderada ou grave • Fenótipo: novas propostas para um modelo mais contínuo
Síndrome da Fragilidade do Idoso: prevalência • Varia de 4 a 59%, em diferentes estudos • Fenótipo: – 9,9% fragilidade – 44,2% pré-fragilidade • Mais prevalente em: – Mulheres (9,6% versus 5,2% em homens) – Mais idosos (aumento com a idade) – Locais menos desenvolvidos – Menor escolaridade – Maior número de medicações
Síndrome da Fragilidade: Consequências 60 50 40 30 20 10 0 Hospit.
Quedas
Frágil
Fried et al., 2001
Piora AVDs
Não frágil
Morte
Outros desfechos relacionados à Síndrome da Fragilidade Mortalidade
Institucionalização
Incapacidades
Quedas
Comorbidades
FRAGILIDADE
Atividade Física Tempo de internação
Piora balanço e marcha
Imobilização
Hospitalizações
Perda da independência
Resposta estressores
Tratamento da Síndrome da Fragilidade ATIVIDADE FÍSICA
INTERVENÇÕES DIETÉTICAS
INTERVENÇÕES FARMACOLÓGICAS
ATIVIDADE FÍSICA • Efeitos fisiológicos no cérebro, sistema endócrino, sistema imune e músculos
• Melhoras: – Mobilidade – Capacidade Funcional
• Efeitos leves a moderados em estudos • Treinamentos de força e equilíbrio são mais efetivos
INTERVENÇÕES DIETÉTICAS
• Poucas evidências • Pode haver algum benefício, quando associadas à atividade física
INTERVENÇÕES FARMACOLÓGICAS
• Poucos experimentos • Evidências controversas
INTERVENÇÕES FARMACOLÓGICAS
• Inibidores da enzima de conversão da angiotensina – Possível efeito benéfico para a musculatura, em estudo • Testosterona – Resultados positivos em alguns estudos, quando há deficiência
INTERVENÇÕES FARMACOLÓGICAS • Hormônio de crescimento – Nenhum efeito sobre musculatura. Efeitos adversos • Vitamina D – Potenciais benefícios sobre quedas, ossos e musculatura, em estudo
Síndrome da Fragilidade: Prevenção • Cuidados com a saúde, desde a fase pré-natal
• Alimentação adequada • Atividade física – Pode ser iniciada em qualquer fase da vida • Ausência ou cessação do tabagismo • Ausência ou cessação do etilismo
Síndrome da Fragilidade: Prevenção • Tratamento rápido de doenças agudas • Tratamento e/ou controle de doenças crônicas – Hipertensão arterial – Dislipidemias – Osteoporose – Osteoartrite – Diabete melito
Conclusões • A Síndrome da Fragilidade do idoso é um conceito em evolução
• Há uma fisiopatologia própria, embasada em um círculo vicioso de perda de energia e de reservas • A prevalência varia de 9 a 45% • Relação com desfechos negativos
Conclusões • O tratamento é baseado em atividade física resistida • Intervencões dietéticas podem contribuir (estudos em andamento) • Algumas intervenções medicamentosas podem ser benéficas,
novas estratégias vem sendo desenvolvidas • A prevenção é viável e deve ser buscada
Referências – Woodhouse KW, Wynne H, Baillie S et al. Who are the frail elderly? Q J Med 1988; 68:505-6 – Gillick MR. Long-term care options for the frail elderly. J Am Geriatr Soc 1989; 37:1198-203 – Campbell AJ, Buchner DM. Unstable disability and the fluctuations of frailty. Age Ageing 1997; 26:315-18 – Fried LP, Tangen CM, Walston J et al. Frailty in older adults: evidence for a phenotype. J Gerontol A Bil Sci Med Sci 2001; S6:M146-56
Referências – Rockwood K, Song X, MacKnight C et al. A global clinical measure of fitness and frailty in elderly people. CMAJ 2005; 173:489-95 – Sanders JL, Boudreau RM, Fried LP et al. Measurement of organ structure and function enhances understanding of the physiological basis of frailty: the Cardiovascular Health Study. J Am Geriatr Soc 2011; 59:1581-88 – Clegg A, Young J, Iliffe S et al. Frailty in elderly people. Lancet. Publicado online, February 8, 2013. http://dx.doi.org/10.1016/S0140-6736(12)62167-9. – Ferriolli E, Formighieri PF, Moriguti JC. O idoso frágil. In: Lopes AC, Amato Neto V. (Org.). Tratado de Clínica Médica. 1a Edição. Editora Roca Ltda, São Paulo - SP, 2004. 4454-4461.
Papel da Enfermagem A atuação do enfermeiro junto ao idoso deve estar focalizada na educação para a saúde, no “cuidar” tendo como base o conhecimento do processo de senescência (envelhecer sem doença, processo natural de maturação do organismo) e senilidade (fase final do envelhecimento onde ocorrem limitações físicas e funcionais que podem determinar a ocorrência de doenças) e no retorno da capacidade funcional para a realização das suas atividades, com o objetivo de atender às suas necessidades básicas e alcançar sua independência e felicidade. (BRUNNER; SUDDARTH, 2006).
Diagnósticos de Enfermagem comuns na síndrome da Fragilidade •
Mobilidade física prejudicada –
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Nutrição alterada: menos do que as necessidades corporais –
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É uma limitação no movimento físico independente e voluntário do corpo ou de uma ou mais extremidades. Possui como características definidoras relacionadas aos indicadores de fragilidade: instabilidade postural; mudança na marcha; lentidão de movimentos; tremor induzido pelo movimento; dor ou desconforto; falta de conhecimento quanto ao valor da atividade física; IMC acima dos 75% apropriados para a idade; prejuízos sensório-perceptivos; intolerância à atividade / força e resistência diminuída; estilo de vida sedentário; má nutrição, perda da integridade óssea. É a ingestão insuficiente de nutrientes para satisfazer as necessidades metabólicas. Possui como características definidoras relacionadas aos indicadores de fragilidade: perda de peso com ingestão adequada de comida; incapacidade para ingerir ou digerir comida ou de absorver nutriente causada por fatores biológicos, psicológicos ou econômicos; peso corporal 20% ou mais baixo do ideal, relato de sensação de sabor alterado. Déficit no autocuidado Capacidade prejudicada para desempenhar ou completar atividades: alimentação, banho/higiene, higiene íntima, para vestir/arrumar-se. Possui como características definidoras relacionadas aos indicadores de fragilidade: incapacidades decorrentes da mobilidade prejudicada; fraqueza ou cansaço; prejuízo perceptivo ou cognitivo; desconforto; prejuízo neuromuscular/músculo esquelético, barreiras ambientais.
Intolerância à atividade / Risco de intolerância –
Estar com (ou em risco de experimentar) energia fisiológica ou psicológica insuficiente para suportar ou completar as atividades de vida diárias sugeridas ou desejadas. Possui como características definidoras relacionadas aos indicadores de fragilidade: relato verbal de fadiga ou fraqueza; frequência cardíaca anormal ou da pressão sanguínea à atividade; repouso no leito ou imobilidade; estilo de vida sedentário, desequilíbrio entre a oferta e a demanda de oxigênio.
Diagnósticos de Enfermagem comuns na síndrome da Fragilidade •
Dor –
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Alterações sensoriais/percepção –
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Mudança na quantidade ou no padrão dos estímulos que estão sendo recebidos, acompanhada de resposta diminuída, exagerada, distorcida ou prejudicada a tais estímulos. Possui como características definidoras relacionadas aos indicadores de fragilidade: distorções auditivas, visuais, gustativa, olfativa, etc.; desorientação no tempo, no espaço ou com as pessoas; mudança na resposta usual dos estímulos; estresse psicológico; desequilíbrio eletrolítico/bioquímico, estímulos ambientais insuficientes.
Incontinência urinária funcional –
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Experiência sensorial e emocional desagradável que surge de lesão tissular real ou potencial ou descrita em termos de tal lesão (Associação Internacional para o Estudo da Dor); pode ter início súbito ou lento, de intensidade leve à intensa, constante ou recorrente. Aguda quando tem término antecipado ou previsível e duração de menos de seis meses e Crônica quando não tem término previsível e dura mais de seis meses. Possui como características definidoras relacionadas aos indicadores de fragilidade: fadiga; anorexia; incapacidade física/psicossocial, mudanças de peso.
Incapacidade da pessoa que é usualmente continente de alcançar o banheiro a tempo de evitar a perda da urina. Possui como características definidoras relacionadas aos indicadores de fragilidade: perda da urina antes de alcançar o banheiro; pode ser incontinente apenas de manhã cedo; sente desejo de urinar; é capaz de esvaziar completamente a bexiga; cognição prejudicada; visão prejudicada; limitações neuromusculares; alterações nos fatores ambientais, enfraquecimento das estruturas de suporte pélvico.
Risco para lesão –
Risco de lesão, como resultado de condições ambientais interagindo com os recursos adaptativos e defensivos do indivíduo.
Diagnósticos de Enfermagem comuns na síndrome da Fragilidade Possui como características definidoras relacionadas aos indicadores de fragilidade: • Externos: – Modo de transporte; pessoas ou fornecedores de serviços; físicos (estrutura de edifício, etc.); nutrientes (vitaminas, tipos de alimentos); biológicos (imunização), químicos (poluentes, drogas, cafeína, álcool, etc.).
• Internos: – Psicológicos (orientação afetiva); má nutrição; perfil sanguíneo anormal (leucocitose/leucopenia, fatores de coagulação alterados, anemia, etc.); disfunção imune; hipóxia tecidual; idade do desenvolvimento (fisiológica, psicossocial), físicos (mobilidade alterada, pele lesada).
Intervenções de Enfermagem • • • • • • • • • • • • • • •
Suporte à função cognitiva; Promover a independência nas atividades de autocuidado; Atender a socialização e intimidade Promover equilíbrio da atividade e repouso; Dar suporte e educar os cuidadores; Exercício (evitar atividade física 6 horas antes de dormir); Melhorar a mobilidade; Orientar a técnica de caminhar; Realizar banho aquecido e massagem; Promover o autocuidado; Melhorar a nutrição e eliminação intestinal; Observar sinais objetivos e subjetivos relacionados aos distúrbios do sono; Avaliar as atividades de lazer; Avaliar o ambiente físico, Aconselhar uma alimentação, hidratação e mobiliários adequados.