40. Hipoglicemia artefactual

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40. Hipoglicemia artefactual


40. Hipoglicemia artefactual

NML, 71 anos, feminino, branca, tem diagnóstico de mielofibrose e leucemização.

Está em tratamento com Hidroxiuréia, Manidipina, AAS, Nitrofurantoína. Alguns exames de rotina feitos recentemente detectaram concentrações plasmáticas de glicose em jejum muito baixas. A paciente relata que há 5 anos tem, às vezes, sintomas de mal-estar em períodos de jejum superior a 6 horas, que melhoram com a ingestão de alimentos. Nega síncope, crises convulsivas ou outros sintomas. Exame físico sumário: peso 50kg, altura 155cm, IMC: 20,8 Kg/m2 e esplenomegalia. Durante a investigação observamos glicemia jejum 59, 62, 39 e 7mg/dL (as glicemias capilares no momento da coleta sanguínea eram todas maiores que 70mg/dL) e a contagem de leucócitos no momento da coleta eram muito elevadas, conforme mostrado na tabela 1. Para complementação diagnóstica foi realizado o teste de jejum prolongado, encerrado apos 34 horas de jejum. Neste momento a glicemia capilar e sanguínea eram 69mg/dL e 65mg/dL respectivamente; a cetonemia era positiva (2,4mmol/L) e a insulinemia indosável (<2,5mcU/mL). Neste momento a paciente referia sintomas iguais aos que eram atribuídos à hipoglicemia.

Interpretação deste teste: O teste de jejum prolongado serve para identificar pessoas com hipoglicemia provocada pelo aumento da produção endógena de insulina como, por exemplo, na vigência de insulinoma. O paciente fica em jejum e se mede glicemia capilar e sanguínea até o aparecimento de cetonemia, ou de hipoglicemia.

Na vigência de hipoglicemia, se a insulinemia estiver mensurável dentro do valor

de referência ou elevada, concluímos que ela está proporcionalmente alta, porque na vigência de hipoglicemia uma pessoa normal deve ter inibição da secreção de insulina.


Quando um paciente com queixa de hipoglicemia refere sintomas na vigência de

glicemias normais podemos concluir que os seus sintomas na verdade não são consequentes de hipoglicemia. Este teste, portanto concluiu que os sintomas que a paciente tinha não eram relacionados a hipoglicemia e que não havia aumento de secreção de insulina.

Tabela 1: dados laboratoriais

Como se pode observar na tabela, há relação direta entre o aumento do número de leucócitos e os valores de glicemia, ou seja, quanto mais elevada a contagem de leucócitos menor a glicemia.

Sabe-se que o fluoreto de sódio adicionado aos frascos para dosagem de glicemia

inibe a glicólise in vitro, reduzindo a ocorrência de HA. Outros fatores também podem influenciar na medida da glicemia laboratorial, como: frascos expostos a altas temperaturas, tempo para análise, presença do Buffycoat, componente do centrifugado sanguíneo que contém leucócitos e plaquetas (Figura 1), amostras com volume maiores.


O número total de células parece ser o fator mais importante, independente do aumento do componente sanguíneo, mesmo sabendo que leucócitos consomem mais glicose que hemácias e plaquetas. No caso descrito, possivelmente a quantidade de fluoreto na amostra era insuficiente frente à hiperleucocitose. Conclusão: a Hipoglicemia artefactual (HA) é uma causa de hipoglicemia, identificada por valores de glicemia menores que 70mg/dL e ausência de sintomas, descrita em pacientes com hiperleucocitose (doenças mieloproliferativas e reação leucemóide) e está relacionada à glicólise excessiva in vitro devido ao aumento da celularidade.

Hipoglicemia artefactual deve ser considerada no diagnóstico diferencial em pacientes

com doenças mieloproliferativas e hipoglicemias assintomáticas.

Figura 1: representação dos componentes sanguíneos após a centrifugação


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