41. Apneia do sono e diabetes
41. Apneia do sono e diabetes SL, 62 anos, masculino, porteiro de condomínio. O paciente é portador de diabetes há 6 anos, hipertensão arterial em uso de glibenclamida, metformina, enalapril, hidroclorotiazida, sinvastatina e AAS. Nos últimos meses vem reclamando de incapacidade para o trabalho porque tem muita dificuldade de permanecer acordado durante seus plantões na portaria do prédio. O controle do diabetes está bom, com hemoblogina glicada menor que 7%, assim como a pressão arterial. O paciente é obeso, cintura de 102 cm e IMC de 35kg/m2.
discussão O quadro descrito sugere fortemente que o paciente tem síndrome de apneia obstrutiva do sono.
A Síndrome da Apneia Obstrutiva do Sono (SAOS) é uma condição médica importante por
causa de sua morbidade e mortalidade. É caracterizada por pausas respiratórias durante o sono (apneias ou hipopneias) que são definidas como uma parada (apneia) ou redução (hipopneia) da passagem de ar pelas vias aéreas superiores (VAS). Estes eventos respiratórios ocorrem inúmeras vezes (até centenas de vezes) durante o sono, determinando sintomas e sinais que caracterizam a SAOS.
A SAOS pode ocorrer em qualquer idade, mas acomete principalmente homens
obesos entre 40 e 60 anos, sendo menos frequente em mulheres antes da menopausa. Em pessoas com obesidade grau IV a incidência ultrapassa 50%. O sexo masculino é mais afetado devido a diferenças anatômicas das vias aéreas, perfil hormonal e distribuição adiposa do tipo central nos homens (tronco e pescoço). Os sintomas da SAOS podem ser classificados em noturnos e diurnos. Os sintomas noturnos incluem roncos, pausas respiratórias, sono agitado com múltiplos despertares, noctúria e sudorese.
os roncos são produzidos pela vibração de alta frequência da úvula, pálato mole e paredes faríngeas, epiglote e língua. estão presentes em cerca de 90 a 95% dos casos de sAos. no início, é comum o cônjuge do roncador referir que o ronco era contínuo sem interrupções. Com a progressão da sAos, as pausas respiratórias aparecem e o ronco passa a ser descontínuo e de maior intensidade. sabe-se que a presença de roncos está relacionada à maior morbidade e mortalidade vascular em pacientes de meia idade independentemente de outros fatores de risco. sua intensidade pode ser graduada (tabela 1): Tabela 1: Escala de graduação do ronco
pontos 0 1-3 4-6 7-9 10
Características sem roncos roncos presentes, mas não interrompe o sono do parceiro (a) incomoda o parceiro (a) incomoda muito o parceiro (a) que não sai do ambiente de dormir incomoda muito o parceiro (a) que sai do ambiente de dormir
os sintomas diurnos são principalmente: sonolência excessiva, cefaléia matinal, déficits neuro-cognitivos, alterações de personalidade, redução da libido, sintomas depressivos, ansiedade. A sonolência excessiva pode ser definida clinicamente como dificuldade para manter um nível de alerta desejado ou como uma quantidade excessiva de sono. o paciente pode se queixar de cansaço, falta de energia, dificuldade de concentração, atenção ou indisposição. ou então ele pode referir dificuldade para manter atenção e vigília em tarefas monótonas. É necessário pesquisar se o paciente apresenta cochilos inadvertidos em situações sedentárias. para avaliação subjetiva de sonolência diurna pode-se empregar escalas como a epworth sleepiness scale. trata-se de um questionário de 8 itens graduado de 0 a 3 pontos para cada item, voltado para a avaliação subjetiva do grau de sonolência (tabela 2).
Tabela 2: Escala de Sonolência Epworth
A sonolência excessiva nos pacientes com SAOS é provocada pelo número de desper-
tares breves durante o sono noturno. Estes despertares são temporalmente relacionados com o término das pausas respiratórias. Os despertares breves não são lembrados pelo paciente e causam intensa fragmentação do sono sem reduzir necessariamente o tempo total de sono.
Diagnóstico
O diagnóstico de confirmação é feito pela polissonografia. Este exame é indicado para o
diagnóstico quantitativo com índices que documentam o grau de gravidade da SAOS. Durante o polissonograma, o paciente é monitorizado com registro do eletroencefalograma, eletromiograma do queixo e das pernas, eletrooculograma (olhos), eletrocardiograma, fluxo de ar nasal e bucal, esforço respiratório e saturação de oxigênio. O exame é realizado durante uma noite inteira, durando de 6 a 8 horas seguidas e todas as variáveis descritas acima são monitorizadas simultânea e continuamente.
A classificação do nível de gravidade da SAOS deve ser feito baseado nos índices
polissonográficos, na intensidade dos sintomas, impacto nas funções cognitivas, sociais e profissionais e a presença de risco cardiovascular.
Determinação do nível de gravidade da SAOS SAOS leve
dessaturação da oxihemoglobina discreta. Índice de apnéia-hipopnéia entre 5 e 20 eventos por hora.
SAOS moderada
sonolência excessiva moderada. dessaturação da oxi-hemoglobina moderada. Índice de apnéia-hipopnéia entre 20 e 40 eventos/hora. Arritmias cardíacas. sonolência excessiva intensa
SAOS grave
dessaturação da oxihemoglobina grave. Índice de apnéia-hipopnéia > 40 eventos por hora. Arritmias cardíacas graves e sintomas de insuficiência cardíaca ou insuficiência coronariana.
diAbetes tipo 2 e sAos diabetes tipo 2 e sAos são distúrbios comuns que frequentemente coexistem. existe uma alta prevalência de sAos em pessoas com diabetes tipo 2 ou intolerância à glicose e, inversamente, existe uma alta prevalência de diabetes tipo 2 e alterações metabólicas em pessoas com sAos. Além disso, existe uma ligação entre sAos e hipertensão arterial e doença Cardiovascular (dCV). uma explicação para essa sobreposição é a presença de fatores de risco compartilhados, tais como a obesidade, mas por outro lado vários estudos mostram que estes duas condições podem ser associadas independentemente da obesidade.
Quando as pessoas têm diabetes tipo 2 ou SAOS, a International Diabetes Federation
(IDF) recomenda o rastreamento para a outra condição. Pessoas com SAOS devem ser examinadas rotineiramente para excluir a presença de doença metabólica e diabetes tipo 2. Pessoas com diabetes devem ser rastreados por meio de questionários para SAOS, particularmente quando apresentam sintomas clássicos, tais como apnéias testemunhadas por outras pessoas, ronco pesado ou sonolência diurna. Pessoas com diabetes e hipertensão refratária devem também ser consideradas para triagem, uma vez que o tratamento da SAOS pode melhorar a pessão arterial.
Tratamento O tratamento da SAOS tem como objetivo programar medidas que detenham o colabamento das VAS durante o sono melhorando também o tônus muscular dessas vias. As recomendações incluem a redução de peso, redução na ingestão de álcool, uso de tratamento com Continuous Positive Airway Pressure (CPAP) ou aparelhos dentários. CPAP utiliza uma máscara que é usada sobre o nariz ou boca enquanto se dorme. A máscara é ligada a uma máquina que proporciona um fluxo contínuo de ar comprimido. A pressão positiva ajuda a manter as vias aéreas abertas de modo a não prejudicar a respiração. Dispositivos orais, tais como aparelhos dentais, podem ser feitos por dentistas de modo a manter abertas as vias aéreas durante o sono O tratamento da obesidade deve ser enfatizado e definido de acordo com as necessidades individuais, preferencialmente envolvendo uma avaliação e intervenção multidisciplinar e personalizada. Pacientes que seguem planos de alimentação e atividade física individualizados são mais bem sucedidos na perda de peso em longo prazo, quando comparados a pacientes que seguem cardápios prescritos preestabelecidos. A possibilidade de hipotiroidismo deve sempre ser descartada, uma vez que em alguns casos a reposição com tiroxina pode levar ao desaparecimento da apneia.
Às vezes indica-se tratamento cirúrgico quando se identificam anormalidades
anatômicas da via aérea passíveis de correção, particularmente aumento das amídalas e adenóides ou pólipos nasais ou alterações faciais tais como a mandíbula pequena ou desvio de septo nasal.
Recomendações para pacientes com SAOS 1) Perder peso; 2) Evitar álcool no mínimo 4 horas antes de dormir; 3) Evitar medicamentos sedativos ou antialérgicos e anti-histamínicos; 4) Evitar dormir em decúbito dorsal; 5) Evitar refeições pesadas à noite; 6) Evitar bebidas com cafeína, no mínimo 4 horas antes de dormir; 7) Evitar fumar, no mínimo 4 horas antes de dormir; 8) Levantar a cabeceira da cama 15 a 20cm pode ajudar e, eventualmente, dormir sentado em poltrona.