Caso44

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44. Cetoacidose diabĂŠtica em portador de diabetes tipo 2


44. Cetoacidose diabética em portador de diabetes tipo 2 MGJ, 48 anos, masculino, negro, treinador de futebol. O paciente consultava médicos com alguma frequência por causa de hiperlipemia caracterizada pelo aumento de LDL e de triglicerídeos e HDL diminuído (LDL em torno de 150 mg/dL, HDL entre 30 e 40 mg/dL e triglicerídeos entre 150 e 300 mg/dL). Suas glicemias variavam entre 92 e 108 mg/dl. Tem um irmão de 42 anos diabético, assim como seus pais.

Começou a ter poliúria e polidipsia três semanas antes da internação, que pioraram

muito rapidamente. Veio ao pronto socorro onde foi visto que ele estava desidratado, taquipneico e com os seguintes exames que caracterizaram cetoacidose diabética: pH= 7,20; BR= 10 mM/L; BE= -10 e cetonúria fortemente positiva. Admitido em terapia intensiva, foi hidratado e recebeu insulina endovenosa; o quadro de cetose demorou mais de 36 horas para reverter e após isso o paciente precisou de grandes doses de insulina para se manter sem hiperglicemia durante a internação na enfermaria (mais de 1,5 U/kg peso). Não foi encontrado nenhum fator predisponente para a cetoacidose: não havia infecção, pancreatite ou qualquer doença aguda.

Foi encaminhado para atendimento ambulatorial com NPH duas vezes ao dia. Uma

semana após a alta o paciente se mostrava bem. Sua altura era 178 cm, peso 105 kg, cintura 97 cm, PA 140/85 mmHg,IMC=33,1 kg/m2. Seus exames mostraram Glicemia de 187 mg/dL e Peptídeo C 3,1 ng/dL. O paciente foi orientado quanto a dieta apropriada e a atividade física, recebeu metformina e gliclazida e a dose de insulina reduzida progressivamente (cerca de 10% a cada semana) e após 3 meses foi suspensa totalmente. Recebeu também sinvastatina e losartana, mantendo controle adequado da pressão arterial, dos lipídeos e da glicemia durante os 18 meses seguintes.


DISCUSSÃO Este é um paciente com obesidade, hiperlipemia mista, hipertensão arterial num ambiente familiar fortemente preditivo de diabetes do tipo 2. Além disso, um dos exames realizados previamente ao quadro de cetoacidose mostrava glicemia de 108 mg/dL (glicemia de jejum alterada),caracterizando o estágio de risco para diabetes. A manifestação clínica de abertura do diabetes foi na forma de cetoacidose. Esta é uma das complicações mais graves do diabetes. Muitos pacientes apresentam náuseas, vômitos e dor abdominal. A desidratação é frequentemente presente, associada à desequilibrio eletrolítico e a acidose. Qual a causa desta descompensação? Embora o paciente não tivesse o diagnóstico de diabetes e não monitorasse suas glicemias domiciliares, não há evidência na história de qualquer alteração de hábitos que justifiquem uma piora metabólica aguda. Assim, para expilcar essa evolução tão veloz, devese procurar motivos que expliquem ou uma súbita diminuição da função de celula beta ou um rápido aumento de hormônios contrarreguladores. Descompensação diabética pode ocorrer na vigência de pancreatite aguda; no entanto, o paciente não tem história de pancreatite e não tem nenhum dos sintomas desta doença (febre, vómitos ou dor epigastrica grave que se irradia para as costas). Outra possibilidade seria a presença de uma infecção oculta que pode ser associada a aumento dos hormônios contrarreguladores e piora do metabolismo de carboidratos. Esta hipótese também não pode ser confirmada. Que tipo de diabetes este paciente tem? É clássico que a cetoacidose com frequência é a primeira manifestação do diabetes do tipo 1. A questão que se coloca então é: seria esta uma manifestação de um diabetes do


tipo 1 em um indíviduo com caracterísitcas de um diabetes tipo 2 (obesidade, história familiar importante, dislipidemia mista e glicemia de jejum alterada)? Mais recentemente a cetoacidose diabética tem sido reconhecida como uma complicação em pacientes com diabetes mellitus tipo 2. Desde meados dos anos 90, vem sendo descrito um tipo particular de diabetes que tem alguma facilidade em ter cetoacidose, nomeado como “diabetes atípica”, “diabetes Flatbush”, “diabetes tipo 1B”. Em geral, esses pacientes são obesos e após o episódio de cetoacidose diabética como primeira manifestação da doença, a evolução caracteriza-se como diabetes mellitus tipo 2. Nos Estados Unidos eles são em geral afro-americanos ou hispânicos. A descompensação resulta de supressão transitória da função das células beta, cuja causa é desconhecida. A ceotacidose ocorre quando há um desbalanço significativo entre a secreção de insulina e a de glucagon e de outros hormônios relacionados ao estresse, como catecolaminas, hormônio de crescimento e glicocorticóides; com isso a produção de corpos cetônicos aumenta. Para muitos destes pacientes, a insulinopenia é transitória: a função da célula beta melhora com a reversão da acidose e com uma secreção mais adequada de insulina a lipólise é reduzida. Fatores de risco para a Cetoacidose Diabética A cetoacidose diabética pode ser precipitada por uma doença aguda, como infecção, acidente vascular cerebral, infarto do miocárdio ou pancreatite aguda. Essas doenças agudas elevam hormônios contrarreguladores relacionados ao estresse. Drogas que afetam o metabolismo de carboidratos também são fatores de risco. Estes incluem glicocorticóides, diuréticos tiazídicos em altas doses (> 50 mg por dia), agentes simpatomiméticos e agentes antipsicóticas de segunda geração (também chamado antipsicóticos “atípicos”) como a clozapina e olanzapina. O péptido- C é produzido quando proinsulina é clivada em insulina e peptídeo C, em


uma proporção equimolar. Assim, a concentração sanguínea de peptídeo C pode ajudar a distinguir entre diabetes tipo 1 e tipo 2 no decurso da doença; ou seja, diabetes do tipo 1 com mais de 1 ano de diagnóstico as dosagens séricas são geralmente muito baixas. A dosagem de peptídeo não é útil no momento do diagnóstico, pois nesta fase mesmo as pessoas com diabetes do tipo 1 podem ainda demonstrar alguma secreção residual de insulina


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