Levantamentofotografico

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Programa de Pós-Graduação em Arquitetura e Urbanismo

TRABALHO PROGRAMADO

ESPAÇOS RESIDUAIS Leitura da paisagem e do território do Parque Industrial da Mooca por meio de levantamento fotográfico.



APRESENTAÇÃO O crescimento da cidade de São Paulo, passando de Vila à Região Metropolitana até se tornar a principal cidade da megalópole do Sudeste, exigiu fortes transformações em sua composição, alterando suas dinâmicas, reconstruindo sua paisagem e afetando diretamente sua população. Estamos cada vez mais globalizados e, como resultado, a vida pública tem seu espaço modificado. Dentro desta óptica, o levantamento fotográfico apresentado neste trabalho, realizado entre os meses de março e agosto de 2015 no parque industrial da Mooca, buscou revelar os espaços livres residuais no atual processo de evolução da urbanização no local.


PRELÚDIO Esta imagem foi escolhida para abrir este levantamento fotográfico por expor de forma breve um cenário muito particular à cidade de São Paulo. Nota-se que a paisagem atual é uma composição entre os vestígios do passado industrial, ilustrado pela chaminé das antigas fábricas, e o presente pós-industrial, evidenciado pela diversidade de edifícios no horizonte. O contraste entre antigo e novo se vê no skyline, dominado por edifícios que rodeiam o vale do rio, onde agora se concentram galpões subutilizados, formando uma paisagem em concreto, bastante árida. Este mesmo vale permite uma breve mostra do pôr do Sol na Cantareira, único vestígio de um elemento que não parece obra do homem. Ao voltar o olhar para o primeiro plano da fotografia, surgem alguns conflitos. Uma série de viadutos, que deveriam interligar e articular a cidade, sufocam o rio e acabam por segregar a região. A cena culmina na presença de um pedestre no viaduto, momento áspero, dado o destino incerto do transeunte que parece, claramente, não pertencer ao local.

Foto 1 - Vista geral do parque industrial da Mooca a partir do Expresso Tiradentes



VÁRZEA DO TAMANDUATEÍ: DE EIXO FUNDADOR À “TERRAIN VAGUES”

Ao analisar a área do parque industrial da Mooca é possível fazer uma breve retrospectiva acerca da fundação da cidade. A área é cortada pelo rio Tamanduateí, cujas várzeas foram as rotas que levaram os bandeirantes até as colinas, onde se deu o início a ocupação da cidade de São Paulo. Em meados do século XIX, com a chegado do café, é implantada a São Paulo Railway (Estrada de Ferro- Santos Jundiaí), que atravessava a região da Mooca, dando vazão à produção cafeeira do interior em direção ao porto. Em paralelo à implantação da ferrovia, foram executadas as obras de retificação do rio Tamanduateí, realizadas por Bresser em 1849 (Kahtouni, 2004).

Foto 2 - Vista do Rio Tamanduateí a prtir do Viaduto Grande São Paulo, ao fundo linha 10 da CPTM



VÁRZEA DO TAMANDUATEÍ: DE EIXO FUNDADOR À “TERRAIN VAGUES”

Estas duas grandes obras, a ferrovia e a retificação do rio, geraram áreas favoráveis à ocupação industrial, oferecendo amplos terrenos com baixo valor e servidos pela rede de trilhos e com isso numerosas fábricas passam a se instalar na região. Por consequência, são atraídos muitos operários para a área e seus arredores que, antes considerados periféricos, passam a ser densamente ocupados na década de 1960. Contudo, segundo Vasques (2005), a desaceleração econômica na década de 1960 imprimiu a diminuição do ritmo de crescimento da indústria paulista. Este fenômeno marcou a Metrópole Paulistana, dando início a migração da indústria para o interior do Estado, deixando como legado a formação de vastos “Terrain Vagues” nestas áreas industriais.

Foto 3 - Rua com galpões industriais desativados, novos edifícios da Mooca ao fundo



VÁRZEA DO TAMANDUATEÍ: DE EIXO FUNDADOR À “TERRAIN VAGUES”

Este deslocamento do eixo de industrialização, com o apoio da indústria automobilística, forçou a construção de novas rodovias, estabelecendo assim uma nova lógica de localização industrial, contribuindo para o sucateamento das “velhas” malhas ferroviárias (Queiroga, 2001). Deste modo, a região da Mooca, que é diretamente associada à história econômica de São Paulo, dada sua contribuição na industrialização da metrópole, passa a abrigar inúmeros galpões desativados e uma rede de trilhos que tem sua importância como eixo de movimentação da produção colocado em segundo plano, em detrimento da nova função principal, que se torna o deslocamento de passageiros.

Foto 4 - Trilhos desativados



EVOLUÇÃO URBANA:

O DECLÍNIO DA METRÓPOLE INDUSTRIAL

A região do pátio industrial da Mooca apresenta um cenário que remete ao abandono e esquecimento. Ao analisar o processo de evolução da metropolização, a partir da década de 1970 com o declínio gradual da indústria, a cidade passa a ter suas principais atividades econômicas ligadas à prestação de serviços e ao comércio. Segundo Queiroga (2001): [...] Ao iniciar este século, estamos diante da terceira revolução industrial. Novas tecnologias e novas espacialidades se constroem. A dispersão da produção industrial e o fortalecimento de um terciário superior para além do território metropolitano, constitui, em diversos países, formações megalopolitanas. A perspectiva da razão de dominação, exercida pelas empresas globais, estrutura as principais relações sócio-espaciais de produção do território megalopolitano, subjugando as ações do Estado, dizimando solidariedades locais.

Essa marca histórica da transição entre a cidade industrial e o período técnico-científico-informacional deixa marcas claras no território e o pátio industrial da Mooca é um deles. Pode-se concluir que estas áreas abandonadas são fruto da materialização de uma nova fase do processo de evolução da Metrópole, onde a dispersão da produção industrial e o fortalecimento do setor terciário são sinais da formação da Megalópole do Sudeste.

Foto 5 - Catador em meio aos galpões desativados



EVOLUÇÃO DA OCUPAÇÃO DO TERRITÓRIO Até o momento, analisou-se o reflexo da nova ordem no território; mas, quando este é estudado, se torna inevitável o reconhecimento da sua população. Segundo Milton Santos (2001): “O território é o chão e mais a população, isto é uma identidade, o fato e o sentimento de pertencer àquilo que nos pertence. O território é a base do trabalho, da residência, das trocas materiais e espirituais e da vida, sobre as quais ele influi. Quando se fala em território deve-se, pois, de logo, entender que está falando em território usado, utilizado por uma população”. Um dos princípios afetados nesta nova configuração é o cidadão. Mas como é possível identificar quem é o cidadão megalopolitano? Afinal, por ter como base os fluxos constantes, a megalópole abre espaço para uma nova população, que não se fixa ao território, está em constante movimento na busca por novas oportunidades, mora em uma cidade, trabalha em outra, estuda em outro estado, viaja para outros países. Foto 6 - Construções das ocupações irregulares junto as antigas áreas industriais



EVOLUÇÃO DA OCUPAÇÃO DO TERRITÓRIO Ela também gera cidadãos híbridos. Segundo Queiroga (2001), “a megalópole ao abrigar imigrantes consegue gerar híbridos, cidadãos megalopolitanos diversos e com possibilidades de trocar, que mesmo remetendo a regionalismo, não mais respondem ao seu local de origem, mas clama uma identidade que se materializa no local da sua instalação”. São justamente estes novos cidadãos que configuram novas formas de ocupação do território, segundo Meyer (2001): Estão presentes dois padrões de ocupação nas áreas metropolitanas: o precário e incompleto, remanescente do período industrial, e o adaptado e qualificado, da nova fase pós-industrial. Tais padrões geram um processo contraditório na forma de ocupação e expansão das áreas metropolitanas. Criam-se territórios onde a precariedade e a modernização surgem de forma imbricada, produzindo novos espaços, de características híbridas, em que a desigualdade social pode ser espacialmente observada.

Foto 7 - Ocupações em Galpões abandonados



O FIM DA PRAÇA? Onde se encaixaria o espaço da praça? Para Queiroga (2001): Diante da celeridade do mundo contemporâneo, da crescente valoração da esfera da vida privada, das virtualidades e das práticas informacionais em tempo real à escala global, faz sentido dirigir nossa atenção à praça, esta velha invenção humana destinada à vida pública? A praça tem papel fundamental na construção do entendimento do meio urbano: ela proporciona o contato público impessoal entre os cidadãos que por ela passam; pode abrigar atividades diversas, como comércio, ócio, lazer, e em todas elas colaborar para a potencialização da razão comunicativa e, além disso, a praça é um importante local para representação do poder em suas diversas escalas.

Foto 8 - XXX



O FIM DA PRAÇA? Partindo-se desse princípio, dá-se continuidade ao processo de investigação e análise dos diversos cenários presentes na região do pátio industrial da Mooca. O local é extremamente agressivo em relação ao homem. Como podemos observar na foto a seguir, o concreto é predominante, as edificações são hostis aos transeuntes, completamente fechadas e nada convidativas, e os espaços para troca são raros. Porém, ao dar continuidade na imersão no bairro, nota-se que os pontos de encontro e trocas ainda existem, mesmo que informalmente, como por exemplo as kombis ou pequenos barracos que se transmutam em bares e pontos de encontro no momento de saída dos trabalhadores das indústrias, dando indícios que ainda há espaço para as pracialidades na região. Além desses pontos, observou-se a presença de um campo de futebol, que mesmo confinado pelo sistema viário, ainda se presta ao encontro e é um breve respiro verde no emaranhado de concreto que se vê na região. A constância de uso é recorrente no local, mesmo em dias de semana, como pode ser observado na foto abaixo, registrada em uma tarde de quinta-feira.

Foto 9 - Campo de futebol na Avenida do Estado



QUESTIONAMENTOS FINAIS Ao final desta breve análise das condições de uso e ocupação da área deste trecho da Mooca, surgiram alguns questionamentos: como seria o processo de construção do meio urbano dentro desta nova realidade? A paisagem estaria entregue aos empreendedores globais, ou ainda teria espaço para colaboração das manifestações cotidianas? E qual seria o papel do arquiteto neste momento? Além disso, quem é a população que deve ocupar este local? Por quem deve ser apropriado? Seria a população dos cortiços e favelas os novos donos desse território? Ou este é um território da megalópole?

Foto 10 - Paredão de concreto junto aos galpões industriais




BIBLIOGRAFIA DONADON, Edilene Teresinha. “Terrain Vagues”: Um estudo das áreas urbanas

Sites Consultados

obsoletas, baldias ou derrelitas em Campinas. 2009. 184 f. Dissertação (Mestrado) - Curso de SÃO PAULO. Subprefeitura da Mooca. Prefeitura Municipal de São Paulo. Histórico.

Arquitetura e Construção, Faculdade de Engenharia Civil, Arquitetura e Urbanismo, Unicamp, Campinas, 2009.

2015. Disponível em: <http://www.prefeitura.sp.gov.br/cidade/secretarias/subprefeituras/ mooca/historico/index.php?p=435>. Acesso em: 20 jul. 2015.

KAHTOUNI, Saide. Cidade das águas. São Carlos: Rima, 2004. 176 p. SMDU. Secretaria Municipal de Desenvolvimento Urbano. Disponível em: <http:// QUEIROGA, Eugenio Fernandes. A megalópole e a praça: O espaço entre a razão de dominação e a ação comunicativa. 2001. 351 f. Tese (Doutorado) - Curso de Arquitetura, Faculdade de Arquitetura e Urbanismo, Universidade de São Paulo, São Paulo, 2001. MEYER, R. et al. (Coord). Pesquisa: política urbana metropolitana. São Paulo: LUME Laboratório de Urbanismo da Metrópole/FAU-USP/ Fupam, 2001 SANTOS, Milton. Pensando o espaço do homem. 5. ed. São Paulo: Editora da Universidade de São Paulo, 2012. _____________. Por uma outra globalização. 6ª São Paulo: Record, 2001. SOLÀ-MORALES, Iganasi de. Territorios. Barcelona: Gustavo Gili, 2002. VASQUES, Amanda Ramalho. Refuncionalização de Brownfields: Estudo de caso na Zona Leste de São Paulo. 2005. 160 f. Dissertação (Mestrado) - Departamento de Igce, Unesp, Rio Claro, 2005.

www.prefeitura.sp.gov.br/cidade/secretarias/desenvolvimento_urbano/>. Acesso em: 10 jul. 2015.



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