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MUDAN\u00C7A EM IMPOSTO AFETA DIRETAMENTE TITULARES DE DIREITOS AUTORAIS

DETENTORES DE EMPRESAS QUE OPTARAM PELA TRIBUTAÇÃO POR LUCRO PRESUMIDO TERÃO DESCONTO ZERADO, CASO MEDIDA PROVISÓRIA DO GOVERNO SEJA APROVADA NO CONGRESSO

De São Paulo

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Em meio à série de medidas previstas nos dois pacotes fiscais apresentados pelo governo federal nos últimos meses para tentar diminuir o rombo das contas públicas, uma em particular afeta diretamente o bolso de grande parte dos compositores e de outros titulares de direitos autorais. A extinção dos descontos para a declaração de renda de pessoas jurídicas na forma de lucro presumido, opção mais simples e, portanto, prioritária de uma parcela considerável dos artistas que constituíram empresas para gerir seus direitos, vai elevar bastante o valor entregue anualmente ao leão. E tornar mais complexa a escolha do regime tributário pelo artista.

Como explica Taura Assis, gerente de controle financeiro e contábil da UBC, para fugir da alta tributação (de até 27,5%) como pessoa física, muitos artistas criaram empresas por meio das quais recebem seus direitos e, na forma de pessoas jurídicas, usufruem de alíquotas menores. No modo lucro presumido, que ignora abatimentos e tem cálculo automático, a regra atual institui que a margem de lucro sobre o faturamento da empresa é de 32% – ou seja, o cálculo do Imposto de Renda de Pessoa Jurídica (IRPJ) e da Contribuição Social Sobre Lucro (CSSL) só se aplica a 32% do total arrecadado. O que a equipe econômica propôs é zerar o desconto e passar a tributar 100% do que é recebido pelo titular da empresa.

PELO LUCRO PRESUMIDO, A COBRANÇA DE IMPOSTO DE RENDA DE PESSOA JURÍDICA INCIDE SOBRE 32% DO TOTAL FATURADO. COM A NOVA REGRA, INCIDIRÁ SOBRE 100%

No caso de artistas que lucram menos de R$ 120 mil por ano, o golpe será mais duro. É que estes têm um desconto ainda maior, e a tributação só incide sobre 16% do total que faturam. Além dos artistas, os atletas estão nominalmente citados na mudança proposta. A Receita Federal acredita que esses dois segmentos são responsáveis por uma esmagadora maioria dos casos de opção por lucro presumido – oficiosamente, fala-se em até 90% do total –, daí terem sido alvos específicos na medida provisória que apresenta esta parte dos pacotes fiscais e, se aprovada até o fim de dezembro, passa a valer já no ano que vem.

– A opção pela abertura de uma empresa e pela escolha do lucro presumido é perfeitamente legal, é uma tentativa legítima dos artistas de pagar menos imposto. Mas o governo entende que se trata de pessoas físicas querendo burlar o fisco. Eu conheço um monte de artistas que têm, de fato, editoras oficialmente constituídas, empregam pessoas, têm funcionários que cuidam da administração dos seus direitos. Com uma tributação tão maior, eles serão prejudicados – afirma Taura.

Ela lembra que outros dois tributos obrigatórios, o PIS e o Cofins, não sofrerão alterações. Ou seja, na forma de lucro presumido, as alíquotas continuam em, respectivamente, 0,65% e 3%. Já na modalidade de lucro real, que equivaleria, na prestação de contas de uma pessoa física, à declaração completa, as alíquotas são de 1,65% e 7,6%. Isso, no entanto, não garante que o lucro presumido permaneça mais vantajoso, pois, no lucro real, há abatimentos ligados a gastos variados, o que, dependendo do caso da empresa, pode tornar essa fórmula menos onerosa.

– Antes, a grande maioria dos artistas optava de cara pelo lucro presumido, que não requer a apresentação de notas para descontos no imposto nem maiores cálculos. Agora, terão que se sentar com um contador e avaliar caso a caso. Claro que vai ficar mais difícil eleger o regime fiscal – comenta a gerente financeira da UBC.

“NO BRASIL, A RECEITA TEM UMA CULTURA SEGUNDO A QUAL A VONTADE DE PAGAR MENOS IMPOSTO SE CONSTITUI, EM SI, EM ILEGALIDADE.”

Eduardo Navarro, Advogado tributarista

Como lembra o advogado tributarista Eduardo Navarro, a única maneira de evitar a perda do desconto seria o veto do Congresso à medida provisória. Em tese, mudanças tributárias deveriam se dar por meio de projetos de lei, mas, por entendimento anterior do Supremo Tribunal Federal (STF), houve extensão de tal prerrogativa aos atos provenientes do Poder Executivo, desde que chancelados pelo Parlamento.

– No Brasil, a Receita Federal tem uma cultura segundo a qual a vontade de pagar menos imposto se constitui, em si, em ilegalidade. Grande parte do mercado pratica a tendência de se constituir em empresa. Isso é realmente uma zona cinza tributária, mas não ilegal – assevera Navarro.

Com a tributação de, no mínimo, 24% (15% do IRPJ e 9% da CSSL) incidindo sobre o total faturado, fora outros impostos e adições no caso de lucros superiores a R$ 20 mil por mês, muitos artistas deverão desfazer as empresas e voltar a receber seus direitos autorais como pessoas físicas, pagando, portanto, a alíquota máxima de 27,5%. Já no caso de empresas que, de fato, funcionam como tal, com empregados e muitas despesas dedutíveis, Navarro crê que talvez o melhor seja optar pelo lucro real.

– Se você é uma empresa com muita despesa, deveria considerar ir para o lucro real. Porque, apesar da alíquota maior desses impostos, haverá muitas deduções. Agora, o fato é que a escolha já não é mais algo direto, passa a ser necessária uma análise comparativa dos diferentes cenários – conclui o tributarista.

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