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Dados Internacionais de Catalogação na Publicação (CIP)
Neves, Vander José das. / Lima, Maria Tereza. /Mercanti, Luiz Bittencourt. / Costa, Denny José Almeida. (Orgs.) Metodologia ativas: inovações educacionais no ensino superior / Vander José das Neves / Maria Tereza Lima / Luiz Bittencourt Mercanti / Denny José Almeida Costa (Orgs.) Campinas, SP : Pontes Editores, 2019 Bibliografia. ISBN 978-85-2170-109-5 1. Educação - ensino superior 2. Formação de professores I. Título Índices para catálogo sistemático:
1. Educação - ensino superior - 371.9 2. Formação de professores - 370.7
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2019 - Impresso no Brasil
SUMÁRIO PREFÁCIO......................................................................................... 11 João Mattar INTRODUÇÃO.................................................................................. 15 Capítulo 1 FINLÂNDIA/BRASIL – O ENGAJAMENTO DO ACADÊMICO............... 17 Maria Tereza Gomes de Almeida Lima Capítulo 2 A MAIS VALIOSA MISSÃO DO PROFESSOR...................................... 41 Rodrigo Linhares Lauria Douglas Zampar Washington de Macedo Lemos Capítulo 3 O USO DE FERRAMENTAS TECNOLÓGICAS EDUCACIONAIS EM METODOLOGIAS ATIVAS DE ENSINO-APRENDIZAGEM: RELATO DE EXPERIÊNCIAS.............................................................. 55 Heberth Paulo de Souza Capítulo 4 ESTUDO DE CASO PARA UMA APRENDIZAGEM ATIVA.................... 67 Vander José das Neves Luiz Bittencourt Mercanti Gláucio Mazetto Siqueira Eliane Moreto Silva Oliveira Jaíne das Graças Oliveira Silva Resende Rubens Bagni Torres Vanessa Conrado Montalvão Torres Vinícius Guzzoni
Capítulo 5 TECNOLOGIAS DIGITAIS COMO METODOLOGIAS ATIVAS.............. 79 Luiz Bittencourt Mercanti Vander José das Neves Gláucio Mazetto Siqueira Rubens Bagni Torres Eliane Moreto Silva Oliveira Jaíne das Graças Oliveira Silva Resende Vanessa Conrado Montalvão Torres Capítulo 6 APRENDIZAGEM BASEADA EM PROJETOS: DEFINIÇÕES E APLICABILIDADES......................................................................... 93 Cleize Silveira Cunha Cristiane Silveira Cunha João Ozório Rodrigues Neto Mauro César Tavares de Souza Capítulo 7 JOGOS NA EDUCAÇÃO MÉDICA: UM RECURSO MOTIVACIONAL.... 105 Any Carolina Cardoso Guimarães Vasconcelos Tereza Cristina de Carvalho Souza Garcês Capítulo 8 EM AÇÃO: O PSICODRAMA NO ENSINO DE HABILIDADES E ATITUDES MÉDICAS..................................................................... 121 Maria Dulce Santiago de Carvalho Capítulo 9 APRENDIZAGEM BASEADA EM EQUIPES NA FORMAÇÃO MÉDICA...... 133 Rosa Gouvêa de Sousa Rodrigo Chávez Penha
Capítulo 10 JOGOS EDUCACIONAIS.................................................................... 145 Marcel Abrão Michel Calil Abrão Neto Capítulo 11 O USO DA SALA DE AULA INVERTIDA NAS PRÁTICAS LABORATORIAIS.............................................................................. 157 Michel Calil Abrão Neto Marcel Abrão Capítulo 12 GAMIFICAÇÃO E ENSINO: UMA EXPERIÊNCIA DE APLICAÇÃO DO GAME LIGHTBOT....................................................................... 169 Natália Elvira Sperandio Lívia Naiara de Andrade Capítulo 13 PBL PARA VIABILIZAR APRENDIZAGEM INTERDISCIPLINAR............. 185 Jaqueline Vieira Rangel Capítulo 14 O PAPEL DOLABORATÓRIO MORFOFUNCIONAL INTEGRADO MULTIESTAÇÕES EM UM CURRÍCULO MÉDICO INTEGRADO E BASEADO EM METODOLOGIAS ATIVAS:RELATO DE EXPERIÊNCIA.................. 197 Daniel Riani Gotardelo Nubia Cristina de Freitas Maia Márcia Hiromi Sakai Jaqueline Melo Soares Marcele Pereira Silvestre Gotardelo Maria José Sparça Salles
Capítulo 15 APLICAÇÃO DO TBL SOB A PERSPECTIVA DE DIFERENTES ÁREAS DO CONHECIMENTO............................................................ 213 Daniel Mapa Clemente Jader José de Carvalho Luciana Martins Ezequiel Sousa Lima Mariana Rezende Schuab Paulo de Jesus Chaves Capítulo 16 VISITA GUIADA COMO METODOLOGIA ATIVA NO ENSINO DE HISTÓRIA DA PSICOLOGIA......................................................... 225 Rodolfo Luís Leite Batista Capítulo 17 DIÁLOGO FILOSOFIA E PSICOLOGIA NA PERSPECTIVA DA SALA DE AULA INVERTIDA E DO SEMINÁRIO.......................................................... 239 José Mauricio de Carvalho Capítulo 18 CONSTRUTIVISMO E PBL PARA UMA FORMAÇÃO INTEGRAL.......... 253 Flávia Magela Rezende Ferreira Jaqueline Vieira Rangel Patrícia Uebe Ribeiro Raquel Auxiliadora Borges Capítulo 19 METODOLOGIAS ATIVAS COMO FONTE DE MOTIVAÇÃO PARA ALUNOS E PROFESSORES NO PROCESSO DE ENSINO-APRENDIZAGEM BASEADO EM COMPETÊNCIAS E HABILIDADES............................................... 271 Denny José Almeida Costa SOBRE OS COLABORADORES.......................................................... 287
Metodologia ativas: inovações educacionais no ensino superior
AGRADECIMENTOS
O projeto de publicação da obra Metodologias Ativas: Perspectivas teóricas e práticas no ensino superior (2018) e do livro Metodologias Ativas: inovações no ensino superior (2019) surgiu nas reuniões do Grupo de Estudos de Metodologias Ativas do Centro Universitário Presidente Tancredo de Almeida Neves (UNIPTAN). Com o propósito de documentar e compartilhar reflexões teóricas e práticas de professores do ensino superior, o Centro Universitário publicou o primeiro volume e agora reúne novas experiências acadêmicas do UNIPTAN, instituição do Grupo NRE Educacional, e de outras unidades desse mesmo Grupo. Os autores traçam em seus capítulos, de forma clara e didática, um panorama atual do ensino universitário por meio de trabalhos inovadores que fazem uso de metodologias ativas de aprendizagem. Nesse contexto, o professor não é mais a grande e única fonte de conhecimento dos acadêmicos. Os docentes instigam a aprendizagem que é buscada, discutida e construída pelo próprio estudante. Com Paulo Freire, o papel do professor é reconfigurado. Ele não mais transmite e faz do estudante um depósito de informações. O docente promove a observação, o questionamento, a investigação, o posicionamento crítico e a interação com as pessoas e com o mundo. Como organizadores deste livro, agradecemos a todos os autores que se dedicaram para escrever seus capítulos. Especialmente, agradecemos ao corpo diretivo do Grupo NRE Edu-
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cacional e ao UNIPTAN que, representado pela Professora Maria Tereza Gomes de Almeida Lima, Pró-Reitora de Ensino e Assuntos Acadêmicos, pelo Professor Heberth Paulo de Souza, Pró-Reitor de Pesquisa e Extensão, e pelo Reitor Ricardo Assunção Viegas, viabilizaram a publicação desta obra.
Metodologia ativas: inovações educacionais no ensino superior
PREFÁCIO João Mattar Uninter e PUC-SP
Além de traduções de livros importantes (BUCK INSTITUTE FOR EDUCATION, 2008; BENDER, 2014; HORN; STAKER, 2015; MAZUR, 2015; BERGMANN, 2016; VICKERY, 2016), têm sido publicadas em língua portuguesa obras de destaque focadas no uso de metodologias ativas no processo de ensino e aprendizagem (MATTAR, 2017; BACICH; MORAN, 2018; CAVALCANTI; FILATRO, 2018). Uma delas é o livro produzido no ano passado pelo grupo de professores do Centro Universitário Presidente Tancredo de Almeida Neves — UNIPTAN (NEVES; MERCANTI; LIMA, 2018). Este livro pode ser considerado uma continuidade do anterior, um ano depois, o que demonstra o fôlego de um grupo de pesquisa. Você terá a oportunidade de refletir sobre os resultados da aplicação de diversas metodologia ativas, como sala de aula invertida, método do caso, aprendizagem baseada em projetos, aprendizagem baseada em problemas, aprendizagem baseada em jogos, aprendizagem baseada em equipes (ABE) ou team based-learning (TBL) e psicodrama, a diversas áreas do conhecimento como: Administração, Pedagogia, Medicina, Direito, Filosofia, Psicologia, Educação Física, Engenharia e Medicina. O game Lightbot, por exemplo, é utilizado no ensino de linguagem de programação, gerando maior interesse e engajamento dos alunos e aproveitamentos satisfatórios na disciplina, além de envolvimento, dedicação, motivação, solução de problemas e potencialização da aprendizagem. 11
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O capítulo sobre o desenvolvimento e uso do jogo de tabuleiro de Gamificação de Métodos de Estudo e Pesquisa (GAMEP) destaca as tendências do uso de jogos no ensino de Medicina: os que visam aumentar o envolvimento dos médicos residentes no treinamento de simulação, promover educação sexual e prevenção de infecções sexualmente transmissíveis, auxiliar na formação de cuidados intensivos, treinar o tratamento de lesões por queimaduras e treinar etapas de decisão em uma sala de operação virtual. Os principais aspectos identificados após o uso do GAMEP foram: “disposição para aprender mais sobre os assuntos abordados; a motivação pela atividade desenvolvida; a melhora da interação social da turma; o aumento da concentração durante a aula e maior fixação dos conteúdos.” Você será também convidado a conceber outras estratégias de ensino como metodologias ativas, como, por exemplo, as visitas guiadas, que acabam por caracterizar o blended learning (ou a aprendizagem híbrida) em um sentido mais amplo do que a simples combinação entre o presencial e o online, como a mistura de espaços de aprendizagem que, por sua vez, abre caminho para o uso de outras metodologias ativas. Outra proposta interessante apresentada no livro é o uso de técnicas psicodramáticas no ensino de Medicina, em que os alunos tiveram a oportunidade de desempenhar tanto o papel de médicos quanto de pacientes, “experimentando o outro lado, o papel daquele que sofre, fato essencial para desenvolverem dentro de si o verdadeiro sentido do cuidado e o genuíno interesse pelo outro.” São também apresentados resultados de visitas de grupos de professores à Finlândia e ressaltadas as possibilidades de combinação entre tecnologias e metodologias, como no caso do mobile learning. As metodologias provocam mudanças tanto nos papéis dos professores quantos dos alunos. Nesse sentido, uma das conclusões deste livro é a importância dos processos de formação docente, 12
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para que sejam obtidos resultados significativos em sua aplicação. Com esta obra, este grupo de pesquisa demonstra mais uma vez ser uma referência no Brasil na prática, na investigação, na reflexão e no compartilhamento sobre o uso de metodologias ativas no ensino superior. REFERÊNCIAS
BACICH, Lilian; MORAN, José (org.). Metodologias ativas para uma educação inovadora: uma abordagem teórico-prática. São Paulo: Penso, 2018. BENDER, W. N. Aprendizagem baseada em projetos: educação diferenciada para o século XXI. Porto Alegre: Penso, 2014. HORN, M. B.; STAKER, H. Blended: usando a inovação disruptiva para aprimorar a educação. Porto Alegre: Penso, 2015. BERGMANN, Jonathan; SAMS, Aaron. Sala de aula invertida: uma metodologia ativa de aprendizagem. Rio de Janeiro: LTC, 2016. BUCK INSTITUTE FOR EDUCATION. Aprendizagem baseada em projetos: guia para professores de ensino fundamental e médio. 2. ed. Porto Alegre: Artmed, 2008. CAVALCANTI, Carolina Costa; FILATRO, Andrea. Metodologias inov-ativas na educação presencial, a distância e corporativa. São Paulo: Saraiva, 2018. MATTAR, João. Metodologias ativas para a educação presencial, blended e a distância. São Paulo: Artesanato Educacional, 2017. MAZUR, Eric. Peer instruction: a revolução da aprendizagem ativa. Porto Alegre: Penso, 2015 NEVES, Vander José das; MERCANTI, Luiz Bittencourt; LIMA, Maria Tereza (org.). Metodologias ativas: perspectivas teóricas e práticas no ensino superior. Campinas, SP: Pontes, 2018, VICKERY, Anitra. Aprendizagem ativa nos anos iniciais do ensino fundamental. Porto Alegre: Penso, 2016.
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INTRODUÇÃO
A presente obra tem o objetivo de ser um guia que reúne, de forma teórica e prática, uma abrangente coleção de Metodologias Ativas de Aprendizagem que são utilizadas em salas de aulas de muitas instituições de ensino superior do país. Ela conta com vasta experiência de seus autores no uso de Metodologias Ativas e delineia formas detalhadas de como praticá-las a partir dos princípios teóricos que as fundamentam. No decorrer do livro, o leitor irá se deparar com capítulos essenciais para uma boa prática de Metodologias Ativas dentro da sala de aula. Assim se poderá observar que sua abordagem permitirá a exploração de formas inovadoras de ensinar de maneira dinâmica no ensino superior e com o aluno no centro do processo de aquisição do conhecimento. Por vezes, esta obra servirá como referência para que professores possam se atualizar e encontrar caminhos menos engessados para trabalhar suas aulas fora do modelo curricular predominante e, por priorizar o maior envolvimento do aluno com metodologias ativas, ela auxiliará o docente a redesenhar suas atividades dentro da sala de aula e suas atitudes perante tantas mudanças no processo educacional contemporâneo. Com conteúdo claro, esta publicação tem o objetivo de promover entendimento teórico e prático sobre metodologias ativas para serem aplicadas no ensino superior. Discorrendo sobre modelos de inovações educacionais que atualmente norteiam professores e alunos dentro de incontáveis faculdades, centros universitários
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e universidades do Brasil e do mundo, os capítulos aqui reunidos não têm a pretensão de desqualificar o modelo de educação tradicional, no qual o professor é o centro do saber, mas pretende contribuir para a disseminação de métodos mais inovadores de ensino, no qual o aluno exerce maior protagonismo na busca do seu próprio conhecimento.
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Capítulo 1 FINLÂNDIA/BRASIL – O ENGAJAMENTO DO ACADÊMICO Maria Tereza Gomes de Almeida Lima RESUMO
Uma equipe de docentes brasileiros partiu rumo à Finlândia em junho de 2018. Além de estudar sobre a educação local, o grupo objetivava a elaboração de um projeto educacional a ser desenvolvido no Brasil. Uma das propostas lá desenhada buscou encontrar caminhos para envolver acadêmicos em seu processo de formação profissional. Os trabalhos iniciaram-se com os olhares voltados para os estudantes, mas entendeu-se que, antes deles, toda a equipe das instituições superiores precisava estar aderente à proposta. Entretanto, a participação de professores quanto aos pressupostos de disseminar concepções educacionais de corresponsabilidade com os estudantes é difícil, pois muitos profissionais da educação superior não passaram por uma formação capaz de lhes preparar para desafios pedagógicos. Nesse sentido, os brasileiros deslocaram o foco dos alunos e passaram a direcionar os trabalhos para a formação docente, alinhando a importância de elaborar um questionário com o propósito de entender as demandas do corpo docente para, posteriormente, construir atividades presenciais e módulos online capazes de suprir as necessidades do grupo. Três passos foram desenhados e implementados: a elaboração
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e aplicação de um questionário pedagógico, a tradução de um folder para um curso de formação docente na Finlândia e a leitura de um artigo destacando os cinco elementos que mais atendem às expectativas de acadêmicos finlandeses nos primeiros anos de graduação. A partir dessas análises, uma autoavaliação docente foi elaborada, aplicada e os resultados sinalizaram para a construção de módulos capazes de suprir os gaps dos professores investigados. Além dos módulos, estando o corpo acadêmico em diálogo com as propostas pedagógicas do século XXI, considerou-se a relevância de que um open space fosse estruturado entre todos os docentes e discentes ingressantes para que sugestões pudessem ser coletadas e implantadas nos próximos semestres dos cursos: semanas acadêmicas, visitas técnicas, conteúdos, metodologias, atividades e provas. O grupo de brasileiros entendeu que a mobilização dos estudantes só seria possível por intermédio de voz, vez e visibilidade dos estudantes. Nessa perspectiva, envolvendo e responsabilizando o graduando em sua formação profissional por meio de uma discussão realmente ativa, concluiu-se que a proposta de uma graduação personalizada, comprometida e voltada para o real é muito mais efetiva. INTRODUÇÃO
O sistema educacional da Finlândia tem sido alvo de olhares e reflexões de várias nações do mundo. O que eles fazem para que os estudantes tenham altos desempenhos em leitura, matemática e ciências? Para os educadores finlandeses, a resposta é curta e objetiva: menos é mais. Diferentemente do modelo educacional brasileiro, as crianças na Finlândia começam efetivamente seus estudos aos 7 anos de idade. Com períodos diários de aula relativamente curtos, poucas tarefas e férias de 13 semanas por ano, a educação maximiza o potencial individual do aluno por meio de uma pedagogia centrada no estudante, estimulando o trabalho em grupo, a experimenta-
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ção, a aprendizagem do fazer, o jogo e a alegria de aprender. A leveza escolar e o foco em atividades pedagógicas práticas são fundamentais para promover a aprendizagem dos estudantes, mas, certamente, esses motivos não são os únicos responsáveis pelo sucesso do modelo educacional finlandês. Com o propósito de conhecer a fundo a estrutura da educação local, professores de 16 escolas brasileiras partiram para o país nórdico em junho de 2018 por intermédio do Consórcio STHEM Brasil. Os docentes brasileiros fizeram uma imersão na cultura por três semanas, estudaram e debateram sobre: as peculiaridades da vida local, o constante plano de desenvolvimento docente, o novo código curricular nacional, o currículo por competência, os diversos perfis, métodos, modelos avaliativos e espaços de aprendizagem. De todas as reflexões e debates, dois pontos chamaram a atenção e foram relevantes para a estruturação de um projeto que será detalhado nas próximas páginas. O primeiro ponto refere-se à participação de toda a sociedade finlandesa na reelaboração de uma nova base curricular nacional. Ao longo de 10 anos, a sociedade de um modo geral, contando especialmente com pais, alunos e professores, reconstruiu a estrutura educacional do País. Cinco marcos sustentam o novo modelo: confiança, igualdade, colaboração, responsabilidade e respeito. O segundo ponto trata-se de um plano de formação profissional que é construído por todo cidadão finlandês, já que eles entendem que a aprendizagem acontece a todo tempo e por toda a vida – desde muito cedo, a criança conta com a ajuda dos pais e dos professores para traçar os objetivos que comporão seu plano de aprendizagem, assim como todo docente elabora seu plano de desenvolvimento profissional a curto, médio e longo prazo, revisitando-o constantemente. Especialmente esses dois pontos relacionados à educação finlandesa foram muito significativos para que uma proposta de trabalho fosse elaborada e implementada no Brasil, conforme 19
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compromisso firmado entre os professores brasileiros e os seus mantenedores. Cada participante elaborou um projeto em grupo, conforme afinidades, para aplicação posterior no Brasil. Os trabalhos deveriam impactar as realidades educacionais dos membros do grupo e seriam acompanhados pelos professores finlandeses. Um dos projetos delineados na Universidade de Ciências Aplicadas de Tampere (TAMK), o do Grupo NRE Educacional, objetivou analisar a forma como os finlandeses motivam e fazem com que os alunos sejam parte central do processo de construção da sua própria aprendizagem, pois o interesse do Grupo NRE é envolver e engajar cada vez mais seus alunos para que eles se tornem efetivamente responsáveis pelo traçado e construção de toda sua formação profissional. Tal fato impulsionou a elaboração de um projeto que detalharemos nas páginas a seguir. A ESTRUTURAÇÃO DO PROJETO FINLÂNDIA/BRASIL
Se toda a sociedade se mobiliza na construção de uma base curricular comum na Finlândia, as mudanças e inovações curriculares das instituições superiores brasileiras são direcionadas pelos instrumentos de avaliação do Ministério da Educação (MEC) e implementadas pelos mantenedores das escolas superiores. De forma pouco democrática, os gestores empreendem inovações nos ambientes de ensino para que as competências e habilidades discentes exigidas pelo MEC e pelo mercado de trabalho sejam desenvolvidas e estejam inseridas nas propostas curriculares do ensino superior. Propor e implementar transformações em planos pedagógicos de cursos, em ambientes institucionais e em rotinas acadêmicas sem ouvir e ter a participação efetiva dos maiores envolvidos nos processos educacionais, certamente, influencia o grau de responsabilidade e de motivação dos estudantes ao longo de sua caminhada acadêmica. Como construir o perfil de um egresso sem acompanhar as tendências de mercado local e regional das instituições de ensino 20
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e sem considerar as demandas da sociedade e daqueles que irão nela atuar profissionalmente? Com a ajuda e experiência de discentes finlandeses, os professores brasileiros desenharam um projeto com o intuito de encontrar caminhos para engajar e envolver os estudantes do ensino superior, tornando-os de fato os grandes responsáveis pela construção de sua formação. Ainda na Finlândia, o grupo se reuniu e as primeiras conversas aconteceram para delinear ações relacionadas e voltadas diretamente para os alunos. Ir direto ao ponto, pensar no resultado e pular algumas etapas para se atingir rapidamente um determinado objetivo são condutas de muitos brasileiros imediatistas, advertiram os professores da Universidade TAMK – baby steps and trust the process. Ainda na Finlândia, destacaram que a reformulação curricular local só pôde ser efetivada porque pequenos passos foram dados ao longo de 10 anos e a sociedade acreditou em todo o processo. Nesse caso, passos menores precisavam também ser redesenhados no projeto dos brasileiros. Foi então que a proposta inicial de trabalho foi reconfigurada, pois dificilmente os estudantes de uma faculdade se mobilizariam para participar de mudanças nos cursos e na instituição sem o envolvimento de toda a comunidade acadêmica. Ou seja, para atingir os alunos, as instituições de ensino precisavam engajar todo o seu staff – principalmente os professores. Entretanto, uma dúvida surgiu, como contar com a participação efetiva de docentes para empreender mudanças acadêmicas se muitos deles não estão preparados para reformular currículos e dialogar com os estudantes, inserindo-os em processos de mudanças no ensino superior? Diferentemente da rigorosa política finlandesa de formação docente – na Finlândia, um candidato só pode participar de um processo seletivo para lecionar se tiver feito uma graduação específica para tal e se tiver pelo menos três anos de experiência na sua área profissional, além disso, ele deverá ser acompanhado em 21
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sala de aula por um colega experiente ao longo de três anos –, os muitos docentes que hoje atuam nas universidades brasileiras são médicos, advogados, dentistas, engenheiros, ou seja, são profissionais experientes em sua área de formação, mas que não estudaram e não se formaram para atuar na docência. Vários deles não conhecem a fundo as propostas pedagógicas das instituições onde atuam, não participam efetivamente da construção das matrizes curriculares de seus cursos e, principalmente, não conhecem o atual papel do docente – mentor e arquiteto cognitivo dos alunos. Distantes das tecnologias e inovações educacionais, muitos professores não ingressam nas escolas superiores aptos a promover o protagonismo dos estudantes, a trabalhar com problemas reais e auxiliar o aluno a traçar o seu plano de formação profissional. A partir dessas reflexões, o primeiro passo do projeto foi então redefinido: antes dos estudantes, deveria ser estruturado um plano de desenvolvimento da formação do docente, capacitando o professor para atuar e dialogar com a educação deste século, já que não se poderia conscientizar o aluno sobre o seu “novo” papel sem primeiro transformar o docente e contar com sua ajuda para disseminar concepções educacionais inovadoras e de corresponsabilidade com os acadêmicos. O projeto foi então reconfigurado e, após tal ajuste, a próxima etapa foi desenhada: a elaboração de um questionário para ouvir os docentes quanto aos seus déficits de formação. A ideia era entender as demandas do corpo docente para posteriormente construir módulos capazes de preencher os gaps específicos deles. Com o propósito de levantar as principais competências e habilidades do educador do século XXI, a equipe de brasileiros fez uma busca no site da Universidade TAMK e encontrou um programa educacional para professor que discutia as competências que a vocação/profissão docente precisava ter. Cinco competências foram identificadas no documento. Imediatamente, o texto foi traduzi22
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do e as competências identificadas para atender os objetivos do grupo de brasileiros. Entretanto, a proposta precisava de ajustes para se adequar à realidade do Brasil. Não bastava aplicar aqui uma autoavaliação voltada para o professor finlandês. As especificidades da formação profissional do docente do Brasil precisavam ser consideradas. O fato de muitos professores universitários brasileiros não terem uma formação específica docente antes de iniciarem o trabalho em sala de aula fez com que as principais defasagens pedagógicas fossem investigadas antes mesmo de o questionário, propriamente dito, ser elaborado e aplicado. Nesse sentido, uma proposta docente autoavaliativa, contemplando especialmente questões pedagógicas (teorias do conhecimento: construtivismo e freireana, teorias avaliativas, elaboração de plano de aula, os diferentes perfis de aprendizagem, métodos de aprendizagem e intervenção pedagógica), foi elaborada e aplicada para todo o corpo docente (Anexo 1). A intenção era que a proposta finlandesa fosse complementada com o resultado dessa investigação pedagógica. Além disso, o artigo Imagined future – elements of a good first-year student experience de Harri Kukkonen (2016) indicado pela professora finlandesa Sisko Mällinen foi lido e de certa forma também incorporado à proposta de estruturação do questionário dos brasileiros (principais demandas dos docentes quanto a pontos pedagógicos, modelo autoavaliativo finlandês e elementos identificados na pesquisa de Kukkonen) (Anexo 2). O PRIMEIRO ANO DE GRADUAÇÃO DE UMA FACULDADE PERFEITA
No artigo Imagined future – elements of a good first-year student experience, Kukkonen (2016) publica o resultado de uma investigação que objetivou elencar os elementos que promovem o engajamento dos estudantes no primeiro ano universitário. A pesquisa foi desenvolvida com alunos, professores e demais colaboradores de uma universidade da Finlândia e, segundo os participantes, os 23
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cinco elementos que mais envolvem e atendem as expectativas dos acadêmicos no primeiro ano de graduação são: personalização, mentoria/orientação, autenticidade, colaboração e adaptabilidade. O autor ainda destaca que o relato dos estudantes foi o centro da estruturação, composição e resultado de suas investigações. Entretanto, o ponto de vista de outros membros da instituição e especialmente da figura chave do processo educacional, o professor, também foi considerado e relevante para todo o processo investigativo. De acordo com as informações coletadas na universidade finlandesa, uma boa experiência dos estudantes está associada a atividades práticas, situações e eventos que afetam diretamente a aprendizagem e o bem estar do acadêmico. O desenvolvimento de competências necessárias tanto para o estudo quanto para a vida profissional tornou-se o projeto pessoal de cada aluno – nenhuma experiência uniforme do acadêmico existe na prática. Os estudantes esperam e exigem apoio, aconselhamento e orientação que atendam às suas necessidades individuais. Esse tipo de serviço deve ser organizado de forma holística e não apenas centralizado em determinados setores institucionais. Se os estudantes envolvemse com seus pares, grupo de professores e outros membros da instituição, eles estarão mais propensos a experimentar o senso de pertencimento institucional. Vale ainda destacar uma estratégia identificada pela pesquisa que foi significativa para promover o engajamento dos estudantes no primeiro ano de formação acadêmica: a possibilidade de os alunos terem uma visão profissional de seu futuro, já que os sistemas humanos projetam para frente de si um horizonte de expectativas que traz o futuro ao presente – o que pensamos do futuro afeta nosso presente. O que é considerado verdade determina o que o indivíduo faz, por isso, suas ações de hoje guiam sua imagem de futuro. A universidade finlandesa, ao invés de apenas abordar experiências passadas dos estudantes, focalizou uma perspectiva
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mais abrangente e orientada para o futuro conforme a experiência do primeiro ano de graduação. Certamente, a idealização do futuro tornou mais palpável e concreto para o acadêmico um dos cinco elementos identificados na pesquisa que aguça o sentimento de pertencimento: a personalização. Se no início do curso, o aluno tem bem definido o papel profissional que desempenhará em seu futuro próximo, a personalização de seus estudos torna-se mais fácil e possível. A personalização é relevante porque coloca o estudante em uma situação de protagonismo e de responsabilidade, pois é ele quem escolherá o professor e o conteúdo que comporão o seu plano individual de trabalho. O estudo é visto como um projeto pessoal do acadêmico que o leva a reconhecer e ampliar suas propriedades psicológicas, tornando-o o principal responsável por seu processo de aprendizagem e por todos os seus resultados. O outro elemento identificado na pesquisa e que merece destaque para as discussões que aqui se fazem trata-se do trabalho institucional de mentoria/orientação. A equipe acadêmica que possui tal perfil e que conduz seu trabalho dentro dessa linha impede que o aluno se sinta sozinho e abandonado durante seus estudos. Em uma relação de respeito mútuo, professores e outros profissionais da escola estão sempre próximos dos estudantes para ouvir, conversar e encorajar cada um para a construção e envolvimento com sua própria aprendizagem. A função do mentor é de ajudar e de apoiar os indivíduos no gerenciamento de sua aprendizagem, maximizando seu potencial, desenvolvendo suas habilidades e melhorando seu desempenho para que se tornem o profissional que desejam. O terceiro elemento relacionado por Kukkonen (2016) é a autenticidade, cuja característica central é envolver o estudante em atividades que lhe são significativas porque apresentam desafios cognitivos do mundo real, propondo reflexões sobre teoria e prática. Esse elemento ajuda o aluno a reconhecer seus pensamentos, 25
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conhecimentos prévios e ações, possibilitando-lhe a formulação de seus objetivos de aprendizagem. Conectada tanto a ambientes de aprendizagem quanto a qualidade da interação, a autenticidade tem como parte essencial da aprendizagem o estudo de projetos reais representativos do mundo do trabalho, instigando soluções não rotineiras de problemas. Dentro dessa perspectiva, os estudantes desenvolvem habilidades relevantes para os empregadores: trabalho em equipe, pensamento/ raciocínio crítico, organização/montagem de informações e pensamento inovador/criativo. O quarto princípio identificado é o da colaboração. Esse elemento inclui ações que estão relacionadas com o aluno e para o aluno. Encontros individuais, discussões em grupo, cooperação entre diferentes campos, tudo isso está englobado nesse conceito. Projetos e problemas instigam a colaboração, pois os estudantes precisam negociar e compartilhar significados relevantes com parceiros internos e com parceiros do mundo real para a solução dos desafios propostos. Levando a uma desestabilização das funções que eram bem definidas, os projetos colaborativos fazem com que professores, alunos e parceiros externos ora aprendam ora ensinem. Colaborar é compartilhar dúvidas, angústias, experiências, tentativas, erros e soluções, é estudar em conjunto e criar conhecimento utilizando mídia social e tecnologia móvel como ferramentas de comunicação. Adaptabilidade é o quinto e último tópico identificado na pesquisa. Uma característica essencial da adaptabilidade é a criação de espaços flexíveis e plásticos para apoiar os processos de ensino e aprendizagem, incluindo a personalização de conteúdo e de processos de estudo no plano individual do aluno. Os planos dos acadêmicos são flexíveis e podem ser reestruturados, já que mudanças inesperadas na vida do estudante são entendidas e aceitas. A adaptabilidade refere-se à capacidade de enfrentar novos desafios e de lidar com mudanças.
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Em contextos educacionais e na vida profissional, a adaptabilidade pode ser entendida como um modo de pensar e uma atitude habitual capazes de modificar planos, currículos e estruturas para atender demandas mutáveis e novas em diferentes situações. Quando o estudante entra no mercado de trabalho, ele precisa saber lidar com ambientes complexos, redes de produção e comunidades de trabalho on-line. Adaptabilidade, colaboração, autenticidade, mentoria/orien��������������� tação e personalização são tópicos cruciais para as discussões aqui delineadas porque foram os itens considerados por alunos e equipe acadêmica de uma universidade finlandesa como fundamentais para o sucesso de uma formação profissional. Diante de tais considerações, competências e habilidades como essas devem atravessar de forma direta ou indireta um questionário que resultará em módulos online para promover o desenvolvimento de docentes, já que a intenção é ter professores alinhados a novas propostas educacionais para que os alunos também tenham acesso a elas por meio dos membros institucionais. FORMULAÇÃO, APLICAÇÃO E RESULTADO DO QUESTIONÁRIO DOCENTE UNIPTAN
Os cinco eixos identificados pela pesquisa de Kukkonen (2016) foram fundamentais para consolidar o questionário a ser aplicado em toda comunidade acadêmica do Centro Universitário Presidente Tancredo de Almeida Neves (UNIPTAN). Entretanto, além desses cinco elementos, questões pedagógicas precisavam ser investigadas e inseridas na proposta final. Qual competência pedagógica era demanda dos professores e deveria ser detalhada em várias habilidades na composição final do questionário docente? Nesse sentido, conforme discutido nas páginas anteriores, um questionário foi elaborado pelo Núcleo pedagógico do UNIPTAN e aplicado na formação docente de julho de 2018. O gráfico abaixo traz os seis eixos pedagógicos investigados e a classificação 27
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utilizada para representar os resultados. As respostas dadas pelos professores às seis perguntas descritas na imagem a seguir foram representadas por percentuais com barras coloridas para o seguinte grau de compreensão docente quanto aos temas analisados: nenhum (preto), regular (cinza) ou suficiente (branco). Figura 1 – Gráfico representativo dos percentuais das respostas dos docentes ao questionário pedagógico.
A partir das seis questões apresentadas no gráfico, percebeu-se que as perguntas sobre teorias do conhecimento (construtivista e freireana) (Questão 1) e sobre teorias avaliativas (Questão 2) apresentaram o maior índice de professores que se consideraram não ter nenhum grau de conhecimento sobre tais assuntos. Como as teorias do conhecimento atravessam várias discussões pedagógicas
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e, automaticamente, estariam presentes na estruturação de vários módulos online, optou-se por detalhar na proposta investigativa final habilidades relacionadas a processos avaliativos. O questionário pedagógico, além das questões objetivas, contemplou uma pergunta aberta, possibilitando ao professor escolher um assunto de seu interesse para ser estudado em um próximo evento de formação docente. Abaixo, a Figura 2 com os quatro tópicos mais pedidos e de maior interesse para aprofundamento do corpo docente. Figura 2 - Sugestões para aprofundamento da formação docente.
Dentre as sugestões elencadas pelos professores na questão aberta, os processos avaliativos e as metodologias ativas representam mais da metade das temáticas que a equipe gostaria de aprofundar seus conhecimentos. É relevante mencionar que alguns professores podem ter respondido querer estudar mais sobre teorias avaliativas na questão aberta, mas nem todos, obrigatoriamente, podem ter marcado a opção que não tinham nenhum conhecimento sobre o assunto na pergunta 2 do questionário pedagógico, Figura 1. Nesse caso, se esse fato ocorreu, entende-se que o não conhecimento a respeito de tal temática e o interesse em estudar o tópico podem ser maiores do que os números apresentados na referida questão. 29
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A partir da identificação da competência Avaliação e Feedback no questionário pedagógico como demanda docente, por intermédio do folder disponibilizado pela Universidade TAMK (2016) com as cinco competências do educador do século XXI e de acordo com a análise empreendida no artigo científico de Kukkonen (2016), com o destaque para os cinco elementos considerados relevantes pelos estudantes finlandeses para uma graduação de excelência, competências para a proposta autoavaliativa docente final foram estruturadas da seguinte forma: Criatividade e Inovação, Cooperação e Colaboração, Avaliação e Feedback, Personalização do Ensino e Educador/Mentor. A finalização do questionário ficou então configurada com cinco competências desmembradas em cinco habilidades. Nesse sentido, todos os docentes envolvidos na pesquisa responderam 25 questionamentos que foram mensurados por meio de seis escalas quanto ao nível de proficiência do professor em cada item. No início do questionário, as seis escalas foram categorizadas e detalhadas para orientação do participante, conforme proposto por Russo (2016): 0-NENHUMA: Estou ciente da informação, das ideias e das situações relacionadas a essa competência, mas não tive ainda a oportunidade de praticá-la. 1-LIMITADA: Comecei a praticar essa competência, porém o impacto das minhas ações é limitado. Meu desempenho é relativamente bom, mas eu sei que posso melhorá-lo. 2-BÁSICA: Eu pratico essa competência e faço planos de melhorias futuras. Reconheço a importância dessa competência e entendo como posso contribuir da melhor forma. 3-PROFICIENTE: Minhas ações atendem às expectativas dos alunos e minhas próprias. Procuro aplicar essa competência em outras áreas da minha vida. 4-AVANÇADA: Alcancei meus objetivos e pratico essa competência em diversas áreas. Meu trabalho é de alta qualidade e exerce impacto positivo sobre os outros. 5-EXPERT: Pratico essa competência com excelência em todos os aspectos da minha vida. Sou capaz de superar as expectativas nessa área e meu trabalho é considerado de alto nível, exercendo forte impacto sobre os resultados de todos. 30
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Em uma análise preliminar das respostas dos docentes, verificou-se que boa parte dos participantes da pesquisa marcaram as alternativas 3, 4 e 5 para todas as habilidades, sinalizando que eles consideravam ter um bom desempenho em todas as competências descritas. Nesse sentido, optou-se por investigar a maior concentração de respostas atribuídas às escalas 0, 1 e 2, já que esses índices evidenciam a necessidade de aprimoramento de um grupo de docentes. O gráfico abaixo expõe, de modo geral, como se comportaram as respostas para as cinco competências analisadas. Os eixos Criatividade e Inovação, Personalização do Ensino, Avaliação e Feedback foram identificados por um grupo de professores como os principais gaps a serem trabalhados. Gráfico 2. Porcentagem de Respostas 0 – 1 – 2 e 3 – 4 – 5
Nessa perspectiva, os módulos online devem abarcar as temáticas solicitadas pelos professores investigados, propondo o desenvolvimento de suas competências e habilidades. É digno de nota mencionar que a intenção é também elaborar um módulo que trate de metodologias ativas, conforme questão aberta do questionário pedagógico, e fazer com que todos os espaços virtuais sejam atravessados em diferentes momentos por considerações sobre a 31
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teoria construtivista e freireana. Os módulos serão elaborados em espaços virtuais, mas oficinas e atividades presenciais deverão ser propostas durante os encontros semestrais de formação docente. CONSIDERAÇÕES FINAIS
O projeto que aqui se delineou teve como foco a promoção da responsabilidade e do envolvimento dos alunos em sua formação profissional. Entretanto, não há como chegar até os estudantes sem incluir e contar com a participação de toda a comunidade acadêmica. É fundamental que especialmente a equipe de docentes conheça profundamente o curso onde irá atuar e que o papel do professor mentor esteja bem delimitado – estando o corpo docente em diálogo com as propostas do curso, o trabalho a ser desenvolvido com os estudantes poderá ser iniciado: o envolvimento dos acadêmicos em discussões maiores que resultem em intervenções rotineiras e transformações estruturais dos cursos. Comumente, em âmbito pedagógico ou físico, as mudanças que ocorrem nas instituições de ensino superior brasileiras não incluem efetivamente docentes e discentes. Tais solicitações geralmente partem dos mantenedores das escolas e são direcionadas pelos instrumentos de avaliação do Ministério da Educação (MEC). De forma pouco democrática, os gestores empreendem inovações nos ambientes de ensino para que as competências e habilidades discentes exigidas pelo MEC e pelo mercado de trabalho sejam desenvolvidas e estejam inseridas nos modelos educacionais das escolas superiores. Nesse sentido, o pouco envolvimento dos maiores interessados nos processos educacionais certamente resultará em um corpo docente e discente apático, desmotivado e sem responsabilidade com o traçado da formação profissional. Considerando, então, a relevância da participação efetiva de todos os personagens relacionados à estruturação, remodelação e inovação de uma proposta educacional, este projeto propõe que as instituições de ensino superior incluam os professores em toda a 32
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organização da graduação para em seguida abraçar os acadêmicos assim que as aulas começarem. Logo no início do primeiro período, é preciso que toda a estrutura acadêmica seja apresentada e detalhada para os ingressantes. A proposta é apresentar ao longo do primeiro semestre: coordenador, equipe de apoio, todos os docentes, disciplinas, metodologias, processos avaliativos, distribuição de pontos e atividades complementares. Assim que os alunos conhecerem o curso como um todo, a intenção é promover um open space no final do semestre para que docentes e discentes conversem e apresentem sugestões para os próximos períodos: temáticas para as semanas acadêmicas, possíveis visitas técnicas, novas possibilidades de conteúdos, metodologias, atividades avaliativas. Nesse momento, é importante o estudante escolher um professor da equipe para acompanhá-lo na construção de seu plano individual de desenvolvimento profissional. Ou seja, conforme a área em que pretende atuar, o acadêmico deverá escolher um docente para lhe apontar caminhos como: palestras, cursos, estágios, livros e outros materiais que tornarão sua graduação mais personalizada e capaz de atender seus anseios e objetivos. Dessa forma, quando os estudantes deixarem de receber de cima para baixo as informações de sua formação profissional – ementas e demais dados das disciplinas em curso, propostas de estágios, visitas técnicas e semanas acadêmicas no momento em que tais atividades forem acontecer –, ou seja, quando deixarem a postura passiva para participarem ativamente da organização do seu curso, com certeza, um processo respeitoso e reflexivo se iniciará. E é somente por meio desse respeito, com o direito à voz e vez, que a visualização do futuro próximo do acadêmico acontecerá e com ela as reflexões que serão capazes de traçar caminhos que o levarão à construção do profissional que ele pretende ser. Assim sendo, voz, vez e visibilidade apontam para o envolvimento e a responsabilidade do acadêmico que resultarão em uma aprendizagem ativa e uma formação realmente efetiva. 33
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REFERÊNCIAS
KUKKONEN, Harri. Imagined future: elements of a good first-year student experience. Journal of Finnish Universities of Applied Sciences, 14 nov. 2016. Disponível em: <https://uasjournal.fi/in-english/imaginedfuture-elements-of-a-good-first-year-student-experience/>. Acesso em: 07 nov. 2018. RUSSO, Dario. Competency measurement model. European Conference on Quality in Official Statistics (Q2016). Madri, maio/jun. 2016. Disponível em: <http://www.ine.es/q2016/docs/q2016Final00276.pdf>. Acesso em: 07 nov. 2018. TAMK - TAMPERE UNIVERSITY OF APPLIED SCIENCES. Participatory pedagogy in vocational teacher education. School of Vocational Teacher Education. 2016. Disponível em:<http://www.tamk.fi/documents/10181/20324/ TAOK_osallistava_peda_en_www.pdf/dd76ff4a-26a3-400e-bfd639a1ca324e59>. Acesso em: 07 nov. 2018. INDICAÇÕES BIBLIOGRÁFICAS
FONSECA, André Azevedo. Ensinar exige rigorosidade metódica: Pedagogia da Autonomia, de Paulo Freire [vídeo]. Disponível em: <https://www. youtube.com/watch?v=jlq0JGIiby8>. Acesso em: 29 out. 2018. ______. Ensinar não é transferir conhecimento: Pedagogia da Autonomia, de Paulo Freire [vídeo]. Disponívelem:<https://www.youtube. com/watch?v=vrwLeUwP4ho&list=PL0k4OibqI6p6dqDjVkxbtHwrtzzimNyn&index=16>. Acesso em: 29 out. 2018. FREIRE, Paulo. Educação como prática da liberdade. 31 ed. Rio de Janeiro: Paz e Terra, 2008. ______. Pedagogia da autonomia: saberes necessários à prática educativa. Rio de Janeiro: Paz e Terra, 2009. LEMOS, André. O que é cibercultura? Trecho do debate Educar na Cultura Digital. Bienal de São Paulo, 2010 [vídeo]. Disponível em: <http://www. youtube.com/watch?v=hCFXsKeIs0w>. Acesso em: 29 out. 2018. RAMAL, Andrea Cecília. O professor do próximo milênio. Disponível em: <http://www.saladeaulainvertida.pro.br/texto_0018.htm>. Acesso em: 29 out. 2018.
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ANEXO 1
As teorias do conhecimento hoje em voga buscam compreender a educação institucionalizada numa perspectiva que desloca o processo de aprendizagem da figura do professor para o aluno. O aluno é, nesse caso, o sujeito responsável pelo seu próprio processo de aquisição do conhecimento ao interagir com os objetos que o constitui. Nessa interação, na perspectiva construtivista, por exemplo, o erro do aluno não é considerado uma falha, mas uma parte da tentativa de aprendizagem, assim, o que melhor se considera é o processo de aprendizagem, o avanço de cada um a partir de si mesmo. No processo de aprendizagem, a estagnação é a negação da própria educação. Daí que o papel do professor é fundamental nesse processo. A ele cabem as intervenções pedagógicas necessárias para que o aluno siga “falhando”, mas não nos mesmos erros. Nesse contexto, o estímulo a autonomia do aluno não significa a dispensa do professor. Afinal, o Google pode informar, mas não planejar projetos de ensino com objetivos a serem vencidos, não pode avaliar e diagnosticar aprendizagens, não pode intervir de maneira a superar dificuldades, bem como não pode pensar em metodologias adequadas à facilitação da aprendizagem e em competências a serem atingidas. O que se percebe, portanto, nessas teorias, é a quebra da hierarquia entre docentes e discentes uma vez que ambos são corresponsáveis pelo ato educativo, realizado à base da reciprocidade. O clichê “o professor não é o único detentor do conhecimento” detona um novo tipo de relação entre os dois sujeitos do
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processo educativo. Se, porém, a relação não é hierárquica, temos que admitir que ela é assimétrica, como nos revela Paulo Freire. Ela é um encontro entre interlocutores diferentes, mas de igual importância no processo. • Qual é o seu grau de entendimento acerca das teorias do conhecimento como, por exemplo, a teoria construtivista e a freireana? Nenhum
Regular
Gostaria de aprofundar sobre essa questão?
Suficiente (
) Sim
(
) Não
• Qual é o seu grau de conhecimento acerca de teorias avaliativas? Nenhum
Regular
Gostaria de aprofundar sobre essa questão?
Suficiente (
) Sim
(
) Não
• Qual é o seu grau de conhecimento acerca da organização de um plano de aula, correlacionando objetivo, metodologia e nível de dificuldade da proposta avaliativa? Nenhum
Regular
Gostaria de aprofundar sobre essa questão?
Suficiente (
) Sim
(
) Não
• Na elaboração de seu plano de aula, são considerados os diferentes perfis de aprendizagem na construção do processo de conhecimento? Nunca
Às Vezes
Gostaria de aprofundar sobre essa questão?
Sempre (
) Sim
(
) Não
• Na execução dos planos de aula, você destina tempo para levantamento e resolução de dúvidas, levantamento de falhas no processo de ensino/ aprendizagem? Nenhum
Regular
Gostaria de aprofundar sobre essa questão?
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Suficiente (
) Sim
(
) Não
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• Você tem convicção na escolha de métodos em prol de uma aprendizagem significativa? Nenhuma
Regular
Gostaria de aprofundar sobre essa questão?
Suficiente (
) Sim
(
) Não
Gostaria de sugerir algo como temática para o aprofundamento de sua formação docente? Gostaria de sugerir um novo formato (modelo, dias, horários e períodos do semestre letivo) para as nossas próximas capacitações?
ANEXO 2 CRIATIVIDADE E INOVAÇÃO
0
1
2
3
4
5
Capacidade para resolução de problemas reais utilizando soluções inéditas. Capacidade de execução de ideias inovadoras nos ambientes de aprendizagem. Capacidade para utilizar ferramentas já existentes em diferentes contextos. Capacidade para buscar referências e propor melhorias nos processos ou produtos a partir das referências. Capacidade em diante das falhas ao executar as ideias inovadoras conseguir aprender com os erros e continuar com o processo. COOPERAÇÃO E COLABORAÇÃO Capacidade para assumir responsabilidades como membro em diferentes comunidades, redes e grupos de interesse. Habilidade em cooperar e colaborar com os alunos em diferentes situações de aprendizado. Capacidade para planejar e desenvolver habilidades de trabalho em equipe, seja com seu par ou alunos.
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Capacidade de compartilhar entre pares práticas bem-sucedidas de ensino-aprendizagem. Capacidade para adotar uma abordagem centrada no aluno, e para planejar e identificar fatores que possam aumentar ou diminuir o bem-estar deles AVALIAÇÃO E FEEDBACK Capacidade para avaliar as competências, o processo de aprendizagem e os resultados dos estudantes de forma individual ou em grupos. Capacidade para elaborar e avaliar os objetivos de aprendizagem, e as habilidades de maneira qualitativa ao utilizar metodologias ativas. Capacidade para elaborar e avaliar os objetivos de aprendizagem e conhecimento de maneira quantitativa, justa e individual. Capacidade de alinhar e disponibilizar junto aos alunos os critérios de avaliação levados em consideração para o processo de aprendizagem Capacidade de construir, receber e dar feedback críticos e construtivos aos seus pares, alunos ou coordenadores para utilizá-lo no processo de melhoria continua. PERSONALIZAÇÃO DO ENSINO Capacidade de identificar os diferentes tipos de aprendizado dos alunos e propor diferentes soluções para desenvolvimento de habilidades dos alunos. Capacidade de planejar e executar metodologias ativas que estimulem de maneira diferenciada o aprendizado dos alunos. Habilidade para usar ferramentas digitais e operar em ambientes virtuais de aprendizagem. Capacidade de identificar lacunas de aprendizado a partir de diferentes fontes (provas, plataformas, projetos e simulados). Capacidade de planejar e propor diferentes caminhos de aprendizado para os alunos.
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EDUCADOR E MENTOR Habilidade para planejar e facilitar os processos que estimulam o aprendizado de diferentes tipos de alunos e grupos. Capacidade de interagir com os alunos e grupos de forma a incentivar o aprendizado e o desenvolvimento de suas habilidades de resolução de problemas. Habilidade para lidar com a diversidade de alunos e de experiências de vida para facilitar o aprendizado. Habilidade de planejar e desenvolver a funcionalidade dos ambientes para apoiar e facilitar o aprendizado. Habilidade em formar alunos, enquanto cidadãos, sem permitir que suas ideologias pessoais influenciem no processo de formação.
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Capítulo 2 A MAIS VALIOSA MISSÃO DO PROFESSOR Rodrigo Linhares Lauria Douglas Zampar Washington de Macedo Lemos RESUMO
Este capítulo é um relato de parte das experiências vivenciadas durante três semanas na Finlândia no curso Educadores do Século XXI. Vale mencionar que, de todas as experiências e de todo o conhecimento construído durante esse período, o aprendizado mais valioso, que realmente está sendo transformador na vida dos autores, é a compreensão de algo aparentemente muito simples, mas que na realidade tem uma complexidade enorme. Durante o desenrolar do curso, junto com nossos experientes tutores, fomos discutindo e compreendendo que a missão mais valiosa do professor não é ensinar, mas sim, buscar formas de fazer com que os alunos aprendam. O que pode parecer um jogo simplório de palavras esconde um poder transformador na vida de um professor e de seus alunos, pois, quando numa face da moeda se tem a tarefa de apresentar os conteúdos de maneira completa, profunda e detalhada, na outra face temos a força e a responsabilidade de transformar alunos em profissionais capazes de analisar problemas complexos, trabalhar em equipe, ter pensamento criativo, além de conseguir desenvolver o life long learning, que é a motivação em continuar buscando o aprendizado e, desta forma, fazer com que 41
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o aluno ingresse em uma espiral virtuosa de desenvolvimento intelectual e profissional. Nesse sentido, temos como objetivo discutir as diferenças entre o trabalho do professor centrado no ensinar, daquele centrado no aprender. Em junho de 2018, os autores, juntamente com mais quatorze outros professores, todos de instituições de ensino superior privadas diferentes, fomos agraciados com mais que uma formação, mas com uma imersão de três semanas numa cultura completamente diferente da nossa, a finlandesa. MAS, AFINAL, QUAL O MOTIVO DA ESCOLHA DA FINLÂNDIA?
Este país, com apenas 5,6 milhões de habitantes, apresentou uma evolução surpreendente tanto no campo social quanto no econômico em apenas 30 anos. Essa incrível evolução foi fundamentada pela transformação em realidade de discursos que estamos cansados de ouvir e proferir: a igualdade de oportunidades para todas as crianças do país. Na Finlândia, o filho do operário, o filho do médico e o do político estudam na mesma escola (WALLIN, 2018). Em seguida, a Finlândia colocou em prática algo que é ainda mais conhecido por todos como sendo uma medida contundente em direção ao desenvolvimento social: uma forte valorização do magistério. Para que alguém se torne um professor na Finlândia, há diversos caminhos, sendo que essa complexidade pode ser percebida na Figura 1; porém, por todos eles, há a necessidade de realizar um treinamento direcionado ao ato da docência, o teacher’s training, ou seja, o treinamento para professores. Além disso, a Finlândia fornece ao professor grande autonomia, ótimas condições de trabalho, com ambientes próprios e uma remuneração de acordo com a importância que o professor tem para a sociedade. Dessa forma a docência se tornou a menina dos olhos das carreiras para os jovens, que preferem ser professores a médicos ou advogados (WALLIN, 2018). Essa situação cria um ambiente no
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qual a valorização do professor gera respeito e admiração dentro e fora de sala de aula, de modo tal que o professor é visto, de fato, como um respeitado guia do processo de aprendizagem, além de ter nesse respeito e valorização uma fonte de motivação para um trabalho inovador e eficaz. Figura 1: Como se tornar um professor na Finlândia
Fonte: Autor (2018)
Além disso a Finlândia tomou o caminho para um processo de ensino/aprendizagem extremamente inovador e pouco ortodoxo para nossa forma de pensar: reduziram a carga horária escolar, os trabalhos de casa e as provas (WALLIN, 2018). Isso demonstra o quanto repensar a educação é uma necessidade imposta na sociedade atual. Nossa vivência de professores nos mostra o quanto é difícil inovar em educação, e quanta resistência se enfrenta nesse processo por todos os atores envolvidos (sejam alunos, professores ou a comunidade). Entretanto, é também a nossa vivência que, ao lado do exemplo finlandês, mostra-nos o quanto essa inovação é necessária e gratificante. Podemos observar na Figura 2, a título de exemplo, o quanto uma sala de aula finlandesa é diferente das brasileiras já no tocante à apropriação dos espaços de aprendizagem.
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Figura 2: Uso de tecnologia, métodos e mobiliários alternativos na Finlândia
Fonte: Wallin (2018)
Por fim, coroando todas essas ações realizadas pela Finlândia, temos o resultado que este país vem atingindo, avaliação após avaliação, no ranking de educação da OCDE (Organização para Cooperação e Desenvolvimento Econômico), como podemos observar na Figura 3. Essa avaliação é realizada através do PISA (Programme for International Student Assessment), que analisa o nível de evolução dos estudantes do segundo grau na aquisição de habilidades em leitura, matemática e ciência (OCDE, 2018). Figura 3: Ranking da OCDE para Educação (Cinza claro Finlândia - Cinza escuro Brasil)
Fonte: Site OCDE (2018)
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A MUDANÇA DE VISÃO
Chegamos ao primeiro dia do curso cheios de ansiedade e ávidos para que fôssemos submersos a uma quantidade exaustiva de informações, trabalhos, leituras, horas extras e receitas prontas para aplicarmos em nossas salas de aulas. Entretanto, para nossa surpresa, o que experimentamos foi algo muito diferente disso: um curso compassado, com muitas discussões e reflexões, com visitas e até com uma aula na floresta. Vivenciamos na prática o que é ser aluno na Finlândia, pensando sempre em como são os espaços que ocupamos e as práticas que empreendemos enquanto docentes aqui no Brasil. No início do processo, nos sentíamos bastante perdidos com essa nova metodologia. Além disso, quando indagávamos sobre conteúdos, sobre manuais, sobre um direcionamento mais concreto para ações e trabalhos, sempre vinham as mesmas respostas: ""trust the process”, ou seja, confie no processo; e “baby steps”, que podemos traduzir diretamente como "passos de bebê”, implicando a necessidade de um processo que respeite o tempo necessário para que tudo o que estávamos aprendendo fizesse sentido e adquirisse tangibilidade. Isso tudo foi particularmente muito difícil de compreender, pois estávamos vivenciando algo completamente novo e ao mesmo tempo tínhamos uma carga de pressão psicológica vinda do fato de sabermos que o curso estava sendo custeado por nossos empregadores e que, quando retornássemos, seria cobrado um plano de ação para implementar as “práticas finlandesas” em nossas instituições. Aos poucos, entretanto, fomos nos acostumando e dando oportunidade para que o método funcionasse. No final das contas, para que isso acontecesse, foi preciso ter calma e confiança no processo, fundamentos também necessários aos que desejam implementar metodologias ativas e práticas inovadoras em suas salas de aulas e instituições. Hoje, percebemos que nossos mestres finlandeses desejavam que víssemos, sentíssemos, vivenciássemos o modelo educacional deles na prática, até porque tudo o que se
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faz lá está fortemente baseado em um grande pilar: a experimentação, o aprender fazendo. Logo no segundo dia de curso, o instrutor Juha, um finlandês extremamente carismático e simpático, nos levou a refletir sobre as metodologias de ensino que costumamos ver em sala de aula, métodos esses que estão enraizados dentro da maioria de nós, brasileiros, uma vez que foi a forma como aprendemos durante toda nossa vida, e que, do ponto de vista teórico, agrupam-se sob a denominação "método tradicional". Juha definiu sua visão do método tradicional como sendo o "Spray & Pray" (borrifar e rezar, em uma tradução livre), conforme se vê na figura abaixo. Figura 4: Spray & Pray
Fonte: Autor (2018)
Ele desenvolveu a correlação explicando que, no método tradicional, o professor começa com o Spray, ou seja, enche o quadro do mais belo conteúdo que consiga desenvolver da disciplina de sua responsabilidade e enuncia seu discurso, sua explicação, "borrifando” assim o conteúdo sobre os alunos. Depois disso vem o Pray, que é o ato de rezar para que os alunos entendam e absorvam aquele conteúdo que foi escrito no quadro e dito em sala de aula. Nesse momento, com esta visão que Juha habilmente criou em nossas mentes, começamos nossa viagem de reflexão sobre tudo que vivenciamos em anos e anos de salas de aula como alunos e como professores. 46
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Em seguida, foi debatido o ciclo de aprendizagem vivencial ou experimental formulado por David A. Kolb, em 1985, que é a representação da forma como o aprendizado acontece e, neste ciclo, a experimentação é considerada como um grande pilar do aprendizado. Figura 5: Modelo de Aprendizagem Vivencial
Fonte: Adaptado de Kolb (1997)
Como podemos ver na Figura 5, Kolb (1997) define o modelo de aprendizado vivencial como um ciclo com quatro quadrantes, que são a experiência concreta, a observação reflexiva, a conceituação abstrata e a experimentação ativa, os quais se relacionam da seguinte forma: A experimentação concreta é a base da observação e da reflexão. Tais observações são assimiladas na forma de uma teoria a partir da qual pode-se deduzir novas implicações para a ação. Tais implicações ou hipóteses servem então de guias durante a ação para criar novas experiências (KOLB, 1997 p-321).
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Durante nossa discussão sobre essa teoria, Juha nos lembrou que os alunos não são recipientes vazios de conhecimento, como vasos de plantas que precisam ser preenchidos de água, mas, sobretudo, são participantes ativos no seu processo de aprendizado, montando e construindo suas próprias competências. Essas reflexões, conjuntamente à teoria de Kolb, nos levaram a um segundo momento de autoanálise, e finalmente conseguimos perceber que estávamos diante de uma teoria bem sustentada, que havia sido posta em prática por um país inteiro com absoluto sucesso, e isso nos encantou. Por fim, para consolidar a mudança de visão acerca da missão do professor que estávamos vivenciando, nos foram apresentadas as dez competências necessárias ao profissional em 2020 (Figura 6), lista essa que é fruto de trabalho atualizado regularmente pelo FEM (Fórum Econômico Mundial, ou, em inglês, WEF - World Economic Forum), o “Future of jobs report” (Relatório do futuro do trabalho, em tradução livre). Esse relatório explora o conhecimento daqueles que estão em melhor posição para observar a dinâmica das forças de trabalho - Diretores de Recursos Humanos e de Estratégia - perguntando-lhes o que significam as mudanças que estão sendo impostas pela quarta revolução industrial, especificamente para o emprego, e as habilidades que serão necessárias aos trabalhadores. A visão é que a atual revolução tecnológica não se torne uma competição entre humanos e robôs, mas que seja um apoio para que as pessoas possam alcançar todo o seu potencial (WEF, 2016), conforme se apresenta na figura a seguir.
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Figura 6: Competências para o Profissional do Futuro
Fonte: WEF (2016)
Então, iniciou-se uma discussão na turma sobre qual seria a melhor forma de avaliar como essas competências estão sendo desenvolvidas nos alunos, mas, nesse momento, estávamos imersos em outros pensamentos mais fundamentais, pois, após ler e reler as competências necessárias ao profissional do futuro, e tentar fazer um paralelo com os métodos que empregávamos nas disciplinas que ministramos, percebemos a falta de intersecção, e então nos perguntamos: como nossas disciplinas estão ajudando nossos alunos a desenvolverem as competências que precisarão quando chegarem ao mercado de trabalho? Claro que poderíamos, com alguma dificuldade, enumerar algumas ações que atingiam de forma indireta uma ou outra competência, mas de forma pensada e planejada, realmente não havia contribuições relevantes. Mas, e agora, como mudar, o que é necessário fazer para conseguir alinhar o conteúdo com o desenvolvimento dessas competências? TEACHING X LEARNING, DO ENSINAR PARA A BUSCA DE FORMAS PARA O ALUNO APRENDER:
Bom, uma vez tendo passado pela parte mais complexa de uma transformação, que é o convencimento, o desenvolvimento de um novo mindset, o próximo passo era descobrir como colocar isso em prática. Então, ainda na primeira semana, realizamos uma visita à 49
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Proaktemia, que é um curso de graduação em Administração com ênfase em empreendedorismo da própria universidade que estava nos recebendo, a TAMK. Até aí tudo bem, mas havia um detalhe que faria toda a diferença e que transformou essa visita em algo revelador, o fato de ser utilizado em praticamente 100% da graduação a Aprendizagem Baseada em Projetos (ABP - em inglês Project Based Learning) que é uma metodologia ativa de ensino. A Proakatemia, definindo em um resumo rápido, é um espaço de coworking no qual as turmas de calouros são divididas em grupos de vinte alunos e cada grupo deve criar uma empresa real; isso mesmo, com o equivalente a um CNPJ e tudo mais, e geri-la para que obtenha sucesso. Na Proakatemia não existem professores formais; no local destes, existem coaches que ajudam os alunos a refletirem tanto em suas vitórias quanto nas suas derrotas. Neste sentido, os coaches não interferem nas empresas dos alunos, nem mesmo quando sabem que tomaram um caminho errado e vão acabar tendo prejuízo. Lembrando que o grande objetivo é o aprendizado, e este ocorre tanto quando há sucessos quanto quando há fracassos e, talvez, seja até mais intenso nos momentos de fracasso. Nessa visita nos foi revelado todo o poder que as metodologias ativas têm para o desenvolvimento do aprendizado e das competências dos alunos. Através de experiências completamente reais, porém em um ambiente controlado (dentro de uma universidade), os alunos conseguem entender de forma clara e concreta como os conceitos outrora confusos e abstratos são importantes e como são utilizados na vida profissional. Ou seja, nessa visita foi possível compreender de forma clara alguns dos principais pilares das metodologias ativas de ensino, que são: o aluno no centro da aprendizagem, a problematização da realidade, o trabalho em equipe e o professor como um facilitador do aprendizado. A seguir, apresenta-se na Figura 7 a síntese dos principais princípios que norteiam as metodologias ativas (DIESEL et al) 2018).
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Figura 7: Princípios que constituem as metodologias ativas de ensino
Fonte: Diesel et al (2018)
Em contraponto ao método tradicional, que apresenta a teoria primeiro e dela se parte para resolução de exercícios, discussões e etc., o método ativo busca a prática e dela parte para a teoria. Nessa mudança metodológica, há uma migração do "ensinar" para o "aprender", desviando o foco do professor para o aluno, que assume o protagonismo do seu aprendizado (SOUZA et al, 2014). Analisando como esses princípios se inter-relacionam e como de fato essas metodologias ativas atuam, começamos pelo princípio mais importante, porém também um dos mais complexos à compreensão, que é ter o aluno como centro do ensino e aprendizado. Esse princípio é traduzido em tirar este aluno da posição de expectador e colocá-lo no centro do processo de aprendizado, fazendo com que ele busque, através de problemas que façam sentido à sua realidade, o conteúdo necessário. A importância da metodologia ativa é realçada quando se levanta que a fragmentação dos conteúdos juntamente com a fal51
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ta de contexto social pode ser uma das causas de desmotivação, desinteresse e apatia dos estudantes. Dessa forma, percebemos a importância da defesa da visão de que a educação desenvolvida na escola precisa ter utilidade prática na vida do aluno, de forma que possibilite para este articular o conhecimento adquirido com possibilidades de aplicação prática real, ou seja, aprender com sentido, com significado de forma contextualizada (DIESEL et al., 2018). Um outro princípio importantíssimo é o papel do professor, que, dentro do método ativo, não é mais do protagonista do ensino, mas agora tem uma função muito mais desafiadora e importante, que é a de mediar, de facilitar a conexão entre o aluno, a situação que este vivencia e o conteúdo, através de dicas e orientações que motivem o aluno na busca do conhecimento. Essa visão é sustentada por Oliveira (2010), que relaciona o ato de ensinar ao de facilitar o aprendizado dos estudantes e isto faz com que, de um lado, o professor consiga enxergar o aluno como responsável pela construção de seus conhecimentos e, de outro, os alunos reconheçam o professor como o mediador do processo de aprendizagem e não como o proprietário dos conhecimentos. Voltando ao curso de Educadores do Século XXI, reafirmando a importância das metodologias ativas dentro da transformação do ensinar para a busca de formas para fazer o aluno aprender (Teaching X Learning), Juha cita uma frase que é creditada a Benjamim Franklin: "Diga-me eu esquecerei, ensina-me e eu poderei lembrar, envolva-me e eu aprenderei", frase esta que apresenta fundamentação teórica através da pirâmide de aprendizagem (Figura 9) desenvolvida pelo psicólogo William Glasser, que, no seu livro a Teoria da Escolha de 2001, evidencia através de sua pirâmide da aprendizagem que se consegue reter até 80% do que é aprendido quando fazemos. Podemos perceber pela pirâmide que, utilizando as metodologias ativas, é possível aprofundar o aprendizado da ponta para a base da pirâmide, buscando assim um aprendizado mais eficiente e eficaz (DIESEL et al., 2018).
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Figura 8: A Pirâmide de William Glasser
Fonte: Diesel et al. (2018)
CONCLUSÃO
Nesta transformação pessoal que vivenciamos durante essas três semanas na Finlândia, o que fica de mais valioso e que tenho certeza que será para toda a vida é a mudança de mindset em relação à missão do professor. Essa missão reside na responsabilidade de criar ambientes nos quais o alunos possam desenvolver competências, transformando-se em profissionais capazes de analisar problemas complexos, trabalhar em equipe, ter pensamento criativo e etc., além de conseguir desenvolver o life long learning, que é a motivação em continuar buscando o aprendizado e, desta forma, fazer com que o aluno ingresse em uma espiral virtuosa de desenvolvimento intelectual e profissional.
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REFERÊNCIAS
DIESEL, A.; BALDEZ, A. L. S.; MARTINS, S. N. Os princípios das metodologias ativas de ensino: uma abordagem teórica. Thema. v. 14, p. 268-288, 2017 Disponível em: < http://revistathema.ifsul.edu.br/index.php/ thema/article/viewFile/404/295> Acesso em: 15 jul. 2018. KOLB David A. A gestão e o processo de aprendizagem. In: STARKEY, Ken (editor).Como as organizações aprendem: relato de sucesso das grandes empresas. São Paulo: Futura, 1997. p.321-341 OCDE. Better Life Index educação. Site OCDE < http://www. oecdbetterlifeindex.org/pt/quesitos/education-pt/> Acesso em: : 25 out. 2018. OLIVEIRA, L. A. Coisas que todo professor de português precisa saber: a teoria na prática. São Paulo: Parábola Editorial, 2010. SOUZA, C. da S.; IGLESIAS, A. G.; PAZIN-FILHO, A. Estratégias inovadoras para métodos de ensino tradicionais: aspectos gerais. Medicina, v. 47, n. 3, p. 284-292, 2014. WALLIN, C. V. Como oportunidades iguais entre ricos e pobres ajudaram Finlândia a virar referência em educação. BBC News Brasil, <https:// www.bbc.com/portuguese/internacional-45489669>, Acesso em: 25 out. 2018. WEF. The future of jobs: employment, skills and workforce strategy, for the Fourth Industrial Revolution. World Economic Forum, 2016.
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Capítulo 3 O USO DE FERRAMENTAS TECNOLÓGICAS EDUCACIONAIS EM METODOLOGIAS ATIVAS DE ENSINO-APRENDIZAGEM: RELATO DE EXPERIÊNCIAS Heberth Paulo de Souza RESUMO
Nos últimos anos, os processos de ensino-aprendizagem, inclusive no ensino superior, vêm sendo influenciados por uma onda de materiais e métodos que descentram a figura do professor e dão foco nas ações empreendidas pelos próprios alunos, que se tornam os agentes do seu processo educativo. Nesse contexto, os recursos eletrônicos tornam-se importantes aliados não só para o aprendizado dos alunos, como também para o aprofundamento sobre as questões tratadas no espaço escolar. Este trabalho foi desenvolvido na forma de um relato de experiências resultantes de ações realizadas em duas turmas do Curso de Pedagogia do UNIPTAN envolvendo a confecção de aplicativos de aparelhos móveis e de estações de podcast. Apesar das dificuldades iniciais para os alunos lidarem com os recursos tecnológicos, o apoio dos colegas dos grupos de trabalho e o suporte fornecido pelo professor foram fundamentais para o sucesso das empreitadas. Ao final, percebe-se que os recursos tecnológicos, a despeito de causarem um estranhamento momentâneo inicial, tornam-se elementos motivadores para o aprofundamento dos conteúdos estudados, uma vez que
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os próprios aplicativos e podcasts exigem, para a sua confecção, o contato com uma ampla rede de recursos como textos, vídeos, áudios e similares, resultando trabalhos que se configuram como grandes hipertextos, os quais se ligam a uma série de outros conteúdos e questionamentos que atiçam a curiosidade do alunado. INTRODUÇÃO
A educação no Brasil vem passando por uma mudança de paradigma que descentra a figura do professor como o principal ator do processo de ensino-aprendizagem e confere ao aluno maior autonomia e responsabilidade sobre o seu próprio aprendizado. Esse paradigma não desconsidera ou diminui a importância do professor, mas a relativiza quanto à capacidade do aluno em ter acesso a informações e utilizá-las em favor do seu aprendizado – ações que, no modelo de ensino tradicional (no caso do Brasil herdado do modelo jesuítico), dependiam sobremaneira da atuação direta do professor, pois este é que filtrava tanto o teor das informações trabalhadas quanto a maneira como elas deviam ser articuladas. Temos notícia de alguns países que estão investindo mais nesse novo modelo, obviamente adaptando-o às condições e às necessidades locais, haja vista que nenhuma transformação anula o histórico do seu povo, das suas instituições, da sua política governamental. Ganha-se destaque aí a incorporação dos recursos da Informática no modelo educacional, resultante do boom provocado pelo advento da Internet e pela popularização do computador pessoal a partir do final do século XX, sem mencionar a ampla disseminação de recursos móveis especialmente no século XXI. A educação formal/escolar não poderia ficar imune às mudanças radicais de procedimentos e de valores que advieram com toda essa gama de recursos à disposição, literalmente, na palma das mãos dos estudantes. Acompanhando o rol da transformação paradigmática destes últimos anos, as próprias noções de tempo e de espaço são res56
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significadas. É muito tênue a linha divisória entre, por exemplo, o tempo de trabalho e o tempo de lazer, o tempo de aprender e o tempo de descansar, o espaço da escola e o espaço extraescolar. O tempo de trabalho avança dentro dos limites do tempo do repouso doméstico, o tempo de aprender adentra os finais de semana, o espaço da escola se amplia até os celulares, computadores, tablets que se encontram no espaço das residências e até do lazer. Barreiras de tempo e de espaço são rompidas, criando, nos dizeres de Machado (2016), a cibersocialidade, caracterizada pelo espaço de fluxos e pelo tempo intemporal. O espaço da realidade deixa de ser meramente físico para incorporar o espaço das redes sociais, por exemplo, que transcendem qualquer conceito da física newtoniana. E o tempo assume características de intemporalidade, o que há algumas décadas seria um conceito de absurda compreensão: ele não é medido em termos de segundos, minutos, horas, mas um tempo fragmentado que coexiste com a noção do tempo cronológico. Os indivíduos lidam com fragmentos de tempo, parcelas desvinculadas de qualquer noção de caráter mais objetivo; é o tempo do espaço de fluxos. O modelo educacional não poderia deixar de incorporar as características dela em seu modus operandi. A escola está inserida nessa realidade, ela faz parte de todo esse processo, e negá-lo seria atestar a sua ineficiência em praticar o que sempre pregou: aprender a aprender, adaptando-se às novas situações, mais do que absorvendo informações de maneira passiva e de modo acrítico. DESENVOLVENDO HABILIDADES
No contexto apresentado acima, surgem as metodologias ativas de aprendizagem como uma resposta a essa demanda no meio educacional, retomando algumas práticas bem recomendadas há décadas e aprimorando-as dentro de um novo padrão de valores – de uma sociedade mais autônoma, informatizada e detentora de novos padrões de tempo e espaço. A aprendizagem 57
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baseada na solução de problemas (PBL – Problem Based Learning) é um procedimento que surgiu na década de 1960 na área da Saúde (MORAN, 2013, p. 3) e que veio crescendo cada vez mais. Surgiram mais escolas e métodos inovadores, que se vão mesclando, ensejando o aparecimento de metodologias híbridas cada vez mais eficientes. E junto a esse quadro, os jovens estão passando cada vez mais tempo conectados, seja em computadores, celulares ou tablets, não somente acessando conteúdos, mas também gerando conteúdos nesses novos espaços (GARRIDO, 2011, p. 26). A prática que será aqui apresentada não é propriamente inédita, porém é uma apresentação de procedimentos e metodologias que atestam a eficiência desse novo modelo de ensinoaprendizagem em relação à possibilidade de se gerarem produtos tecnológicos de média complexidade como recursos auxiliares na aprendizagem de conteúdos e com uma interface tecnológica bem ao gosto das novas gerações. A utilização de alguns recursos metodológicos de ensinoaprendizagem, quando bem conduzida, estimula funções cognitivas específicas no aprendente, acentuando algumas habilidades, tais como mencionadas por Garrido (2012, p. 62): percepção, memória, imaginação, abstração e lógica. Algumas atividades pedagógicas centram-se numa dessas habilidades, ou num conjunto delas. Com a consciência de quais funções cognitivas são exigidas em determinadas atividades, o profissional da educação pode dosar melhor o seu plano de ensino, procurando diversificar o seu trabalho, proporcionando a utilização e o entrelaçamento de diferentes habilidades ao mesmo tempo em algumas práticas de ensino. A confecção de materiais inovadores para os alunos constitui uma prática bastante oportunizadora no sentido de estimular o lado cognitivo dos aprendentes, estimulando consequentemente habilidades que jamais se manifestariam em práticas corriqueiras que não se configuram como desafio. É o mesmo raciocínio que envolve as atividades de gamificação – o uso de jogos como recursos
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de aprendizado na educação – em que os alunos são desafiados o tempo todo, numa dosagem tal de forma que a atividade proposta não seja cansativa e enfadonha a ponto de não se constituir nenhum desafio e que também não seja de tão elevado nível abstracional a ponto de desestimular o usuário (FARDO, 2013). Encontrar o ponto de equilíbrio no nível da exigência por parte do professor, eis o aspecto crucial para o sucesso das atividades propostas. Paralelamente, porém, ao desenvolvimento de habilidades cognitivas especialmente voltadas para o uso de recursos tecnológicos, não se deve perder de vista a humanização dentro do processo ensino-aprendizagem. Rocha (2016) apresenta alguns aspectos muito interessantes sobre essa questão, que, embora o autor esteja mais preocupado com a sua aplicação especificamente no ensino a distância, pode muito bem referir-se ao trabalho com as tecnologias de uma forma geral: i) “Humanizar” muitas vezes pode ser interpretado como oferecer mais oportunidades de espaços e tempos de aprendizagem não convencionais; ii) “Humanizar” pode significar uma ação voltada para os currículos escolares, professores e projetos educacionais, baseando-se no tripé “aprendiz / currículo / mercado” ou “aprendiz / currículo / pesquisa”; iii) A humanização pode ser entendida como a disponibilização, em tempo integral, de várias linguagens e várias mídias; iv) No âmbito tecnológico-digital, a aprendizagem pode ser mediada por sistemas como alternativa para processar, interpretar e compreender sentimentos, ações e reações humanas em processo de aprendizagem, explorando as aprendizagens gamificada e ativa como estratégias;
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v) A humanização pode dar-se com o rastreamento de competências e habilidades próprias de determinados indivíduos ou grupos de indivíduos, através de artefatos lógicos. Com o intuito de abarcar todas essas potencialidades, foi desenvolvida uma proposta de atividade em turmas do UNIPTAN – Centro Universitário Presidente Tancredo de Almeida Neves, instituição da rede privada do estado de Minas Gerais, pertencente ao Grupo NRE Educacional, que será descrita no próximo tópico deste trabalho. PROPOSTA DE TRABALHO
O trabalho de que trata este capítulo foi desenvolvido em duas turmas do Curso de Pedagogia do UNIPTAN, especificamente do 4º e do 8º períodos. Esse Curso iniciou suas atividades no ano de 2012, tendo sido reconhecido pela Portaria MEC nº 494 de 29 de junho de 2015, sendo o único curso de licenciatura atualmente ativo na Instituição. Descreveremos a seguir, de forma esquemática, a proposta de trabalho em cada turma, constando os grupos de trabalho, a temática desenvolvida em cada grupo e mais alguns detalhes importantes: TRABALHO DESENVOLVIDO NO 4º PERÍODO DE PEDAGOGIA
Disciplina: Literatura Infantil Total de alunos na turma: 43 Material elaborado: Podcast Grupos de trabalho temáticos (aspectos biobibliográficos de autores da literatura infanto-juvenil internacionalmente reconhecidos):
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i) Esopo; ii) Jean de la Fontaine; iii) Irmãos Grimm; iv) Hans Christian Andersen; v) Charles Perrault; vi) Lewis Carroll; vii) Mark Twain; viii) Charles Dickens; ix) Monteiro Lobato.
O podcast (ou podcasting) é um recurso midiático composto por arquivos de áudio disponibilizados via Internet que podem ser atualizados constantemente e constituir-se na forma de playlists. Os podcasts mais comuns são compostos por melodias e músicas, mas existem também os formados por áudios de entrevistas, áudioaulas e similares, sendo esta a proposta de trabalho desenvolvida na turma em questão. Como parte das exigências para elaboração desse trabalho, foi solicitado que cada grupo entrasse em contato com alguma personalidade acadêmica (professor, pesquisador, etc.) preferencialmente que não integrasse o corpo funcional do UNIPTAN para realização de entrevista via áudio. Para isso, o professor orientou o cadastro dos alunos para buscas em plataformas especializadas, como Lattes, Academia.edu, LinkedIn e outras. Além disso, na playlist deveria constar a participação via áudio de todos os componentes dos grupos, para avaliação individual e em grupo. Após gravados os áudios, separadamente em blocos temáticos abordando dados biográficos, dados bibliográficos, características 61
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dos personagens, curiosidades literárias e trechos de obras de cada autor, as playlists foram organizadas e publicadas na plataforma SoundCloud (soundcloud.com), tendo sido, após avaliação e eventuais correções pelo professor, amplamente divulgadas na comunidade acadêmica, especialmente através das redes sociais WhatsApp e Facebook. Como resultados desse trabalho desenvolvido no 4º Período, temos os seguintes: i) maior aprendizado do conteúdo ministrado na disciplina, com envolvimento de todos os componentes dos grupos temáticos; ii) familiarização dos alunos com recursos de Informática e plataformas educacionais; iii) estabelecimento de redes de contatos com profissionais de várias áreas do conhecimento (especialmente em Literatura, Teoria Literária e Ciências Sociais); iv) aprendizado crítico e inovador, centrado no próprio aluno, com orientações esporádicas do professor. TRABALHO DESENVOLVIDO NO 8º PERÍODO DE PEDAGOGIA
Disciplina: Escola e Movimentos Sociais (disciplina eletiva) Total de alunos na turma: 34 Material elaborado: Aplicativo para aparelhos móveis Grupos de trabalho temáticos: i) O ciberespaço e a cibereducação: novas relações e novas linguagens; ii) As noções de tempo e espaço das redes sociais e suas influências na educação contemporânea; iii) A importância das redes sociais na educação contemporânea; iv) A expressão dos jovens através da música no período da Ditadura Militar; v) Contribuição do movimento estudantil universitário para o fim da Ditadura Militar;
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vi) A força da juventude estudantil no combate à Ditadura Militar; vii) A influência da escola nas manifestações estudantis no período da Ditadura Militar; viii) Movimento estudantil universitário na Ditadura Militar; ix) A voz de protesto da juventude contra a Ditadura Militar.
O aplicativo (comumente abreviado como “app” por via do original em inglês) é um programa utilizado em aparelhos móveis (celulares, tablets e similares) que pode ser baixado por qualquer tipo de usuário através da Internet. Uma característica fundamental desse recurso é a de se constituir numa espécie de hipertexto, cuja leitura ultrapassa a linearidade comum de textos tradicionais. Assim como as páginas de Internet de uma forma geral, um hipertexto normalmente se compõe de várias mídias (textos, áudios, vídeos, etc.), cujos links podem ser acessados sem obedecer a um padrão de leitura pré-estabelecido. Para a criação dos aplicativos foi utilizado o recurso da Fábrica de Aplicativos (fabricadeaplicativos.com.br), e os mesmos foram amplamente divulgados na comunidade acadêmica após a avaliação e eventuais correções realizadas pelo professor da disciplina. Para as divulgações, contou-se com inúmeras postagens nas redes sociais WhatsApp e Facebook. Como resultados desse trabalho desenvolvido no 8º Período, temos os seguintes: i) maior aprendizado do conteúdo ministrado na disciplina, com envolvimento de todos os componentes dos grupos temáticos; ii) familiarização dos alunos com recursos de Informática, especialmente pela desmistificação da ideia sobre a dificuldade de criar um aplicativo; iii) maior envolvimento com conhecimentos de outras áreas, como História e Ciências Sociais em geral; iv) aprendizado crítico e inovador, centrado no próprio aluno, com orientações esporádicas do professor.
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A construção dessa ferramenta tecnológica como um recurso didático em metodologias ativas de aprendizagem despontou com um elevado potencial pedagógico, a começar pelo fato de que as gerações mais jovens são muito familiarizadas com esses recursos – com a diferença de que, em vez de usuários passaram a ser autores/elaboradores dos mesmos, o que se constituiu num desafio bastante interessante e atraente para os alunos. CONSIDERAÇÕES FINAIS
O processo de construção dos podcasts e aplicativos foi bastante similar à utilização de games no ambiente escolar, em que os desafios vão sendo transpostos na medida da capacidade dos alunos, surgindo novas possibilidades, incitando sempre a criatividade. É fundamental destacar também o incentivo ao espírito de trabalho em equipe, sem o qual as ferramentas não seriam criadas e efetivamente utilizadas por usuários diversos, que puderam ter acesso às mesmas após ampla divulgação. Paralelamente a esse processo, ficou nítido o ganho dos alunos no âmbito da pesquisa, pois foi travado um contato direto dos discentes com dezenas de personalidades de destaque regional e até nacional na área acadêmica. Tais contatos estão se desdobrando em novas perspectivas acadêmicas, sugeridas pelos próprios alunos, como visitas pelos entrevistados ao UNIPTAN para realização de palestras para o alunado do Curso e amadurecimento de projetos para os trabalhos de conclusão de curso. REFERÊNCIAS
FARDO, Marcelo Luis. A gamificação aplicada em ambientes de aprendizagem. Novas tecnologias na educação. CINTED-UFRGS, v. 11, n. 1, julho de 2013. GARRIDO, Susane Martinos Lopes. Neurociências aplicadas na EAD. In: LITTO, F. M.; FORMIGA, M. (Orgs.). Educação a distância - o estado da arte - volume 2. São Paulo: Pearson, 2012. p. 61-70. Disponível em: <http://www.abed. org.br/arquivos/Estado_da_Arte_2.pdf>. Acesso em: 10/10/2016.
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______. Qual é o sentido da tecnologia? In: Computerworld, ano XVIII, nº 541, out. 2011. Disponível em: <http://computerworld.com.br/ estaticas/cwdigital/cw541.pdf>. Acesso em: 09 out. 2016. p. 26. MACHADO, Juliana Brandão. Cibersocialidade, sociedade em rede e educação: sobre mobilizações estudantis em tempos de redes sociais. Gavagai, Erechim, v. 3, n. 1, p. 81-97, jan./jun. 2016. MORAN, José Manuel. Metodologias ativas para realizar transformações progressivas e profundas no currículo. 2013. Disponível em: <http:// www2.eca.usp.br/moran/wpcontent/uploads/2013/12/transformacoes. pdf>. Acesso em: 12 out. 2016. ROCHA, Enilton Ferreira. Humanização da aprendizagem na EAD. Maio 2016. Disponível em: <http://www.abed.org.br/arquivos/Humanizacao_ Enilton_Rocha.pdf>. Acesso em: 13 out. 2016.
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Capítulo 4 ESTUDO DE CASO PARA UMA APRENDIZAGEM ATIVA Vander José das Neves Luiz Bittencourt Mercanti Gláucio Mazetto Siqueira Eliane Moreto Silva Oliveira Jaíne das Graças Oliveira Silva Resende Rubens Bagni Torres Vanessa Conrado Montalvão Torres Vinícius Guzzoni RESUMO
O modelo tradicional de ensino, em que o professor é o centro das atenções na sala de aula, é a prática predominante nas instituições de ensino superior do Brasil. Por outro lado, as práticas de metodologias ativas, que colocam o aluno no centro das atenções, têm ganhado cada vez mais espaços. Neste contexto, considerando a necessidade do aprendizado de conceitos, mecanismos bioquímicos e fisiológicos, técnicas de diagnósticos e tratamentos na área da saúde, faz-se necessária a participação ativa e efetiva do aluno na aquisição de seus conhecimentos. Sendo assim, o estudo de caso é uma abordagem de ensino que coloca o aluno da área da saúde diante de casos reais para que ele possa desenvolver um raciocínio lógico e coerente para tomada de decisões importantes e adquirir competências e habilidades técnicas que o permitam resolver casos clínicos reais. Este capítulo apresentará uma discussão
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aprofundada sobre estudo de caso clínico, discutindo a ocorrência de todas as suas etapas dentro da sala de aula. Por fim, este capítulo pretende facilitar, para alunos e professores, o entendimento do estudo de caso como forma de enriquecer e fortalecer o processo de ensino-aprendizagem no âmbito do ensino superior. Além disso, visa promover, no Brasil, maior difusão desta valorosa metodologia já tão presente nas práticas diárias de profissionais da saúde em todo mundo. INTRODUÇÃO
O estudo de caso é uma narrativa de um evento, de um caso clínico ou de qualquer situação que seja capaz de fazer a intersecção da teoria com a prática da vida real. Também conhecido como “aprendizagem baseada em casos” é uma poderosa estratégia de ensino centrada no estudante, capaz de impactá-lo por gerar pensamentos críticos, capacidades ampliadas de argumentação e possibilidades para resolução de problemas reais. O método baseia-se em situações reais (ou simuladas) denominadas “casos” e se caracteriza como sendo um dos métodos pedagógicos mais efetivos para estimular o desenvolvimento de habilidades analíticas a partir da resolução de problemas, relacionadas à vida real, até hoje implementados na educação em todo o mundo. Os casos em si não oferecem suas próprias análises, mas são narrativas que servem como bases para discussões de situações-problemas e são efetivos para estimular que os alunos apliquem teorias estudadas a situações de trabalhos reais (MERSETH, 1996). Este método, que coloca o aluno como elemento central de sua prática, é uma metodologia ativa de ensino-aprendizagem que faz parte dos currículos de muitas escolas de medicina, fisioterapia, enfermagem, odontologia, nutrição e outros programas de ciências da saúde em universidades nacionais e internacionais. Todavia, este método não se restringe apenas às áreas da saúde, tendo sido, inclusive, gestado em uma escola de direito dos Estados Unidos da América.
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O método é comumente referido como tendo sido criado na escola de direito de Harvard no ano de 1870 por Christopher Columbus Langdell. Por volta de 1915, muitas escolas de direito em vários países do mundo já empregavam o método, que na sequência acabou se espalhando, também, para a área de medicina. Em 1919, foi colocado em prática com grande sucesso na escola de negócios (cursos de administração e economia) de Harvard. Nos anos subsequentes este método de ensino e aprendizagem se disseminou para fazer parte dos currículos escolares secundaristas e universitários em todo o mundo (MERSETH, 1991). Considerando que o estudo de caso seja uma metodologia ativa eficaz para promover o ensino e a aprendizagem duradouros, o objetivo deste capítulo é proporcionar conhecimentos fundamentais para professores e alunos que queiram potencializar seus conhecimentos adquiridos na área da saúde. E aqui é necessário esclarecer que, embora este capítulo trate desta metodologia ativa com ênfase na área da saúde, a abordagem nele apresentada é de caráter universal, pois o mesmo mecanismo de aplicação pode contemplar quaisquer áreas do saber, bastando apenas que sejam feitos pequenos ajustes, plenamente adaptáveis para quaisquer disciplinas acadêmicas. O ESTUDO DE CASO NA ÁREA DA SAÚDE
Na área da saúde, o ensino e o aprendizado clínicos levam muito em consideração os estudos baseados em casos de pacientes, sendo esta uma prática já consagrada tanto na medicina quanto em áreas correlatas. Assim, professores e estudantes articulam seus conhecimentos teóricos e práticos por meio de dinâmicas analíticas e propositivas para resolução de situações-problemas (IRBY, 1994). A partir do caso apresentado aos alunos, podem ser estudadas e discutidas as condições clínicas, psicológicas e sociais do paciente. No que se refere à doença propriamente dita, podese estudar a fisiopatologia da doença. Na questão farmacológica,
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os benefícios medicamentosos, o abuso e a dependência química, o mecanismo de ação, o metabolismo, a meia vida plasmática, a excreção de princípios ativos, além do potencial toxicológico e efeitos colaterais. Ainda, é possível estudar tratamentos alternativos, exames diagnósticos, diagnósticos diferenciais, prognósticos do paciente e conceitos relacionados às ciências básicas (HERREID, 1994; BUDGELL, 2008). Normalmente, nos estudos de casos clínicos, os estudantes necessitam de um preparo prévio para realizá-lo, seja assistindo previamente a palestras ou aulas tradicionais sobre o assunto ou fazendo contato prévio com textos explicativos de conceitos básicos necessários para a identificação e o entendimento do problema central. O caso clínico deve ser apresentado no formato de uma narrativa acompanhada por questões e atividades capazes de desenvolver os níveis mais elevados da taxonomia de Bloom, permitindo ao estudante ir além das lembranças dos conhecimentos previamente adquiridos para a análise e resolução das questões que estão postas diante dele. Isso facilita o raciocínio interdisciplinar, concilia pontos de vista diferentes entre pares e promove intersecção de tópicos acadêmicos com o mundo real, levando em consideração as aplicações técnicas, científicas e sociais, o que promove motivação no estudante e incrementa o desempenho em avaliações, tanto teóricas quanto práticas. Assim, pelos motivos supramencionados, os casos clínicos devem ser estruturados a partir de experiências reais sempre que possível, deixando para segundo plano as situações hipotéticas (ANDERSON; KRATHWOHL; BLOOM, 2001; HERREID et al., 2011; BONNEY, 2015). O estudo de caso clínico, assim como todo estudo de caso, deve ser mediado pelo docente, que direciona seus alunos para análise do problema central a ser discutido. O professor é a figura que estrutura os grupos de estudo de caso e é o responsável por garantir o funcionamento adequado de cada grupo, de modo que seus membros (alunos) possam manter o eixo correto das discussões, pois o problema central a ser discutido é composto por muitas 70
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variáveis que também devem ser discutidas e, não raro, promove dispersão de ideias para longe do foco. As variáveis em discussão têm, muitas vezes, o poder de desfocar os alunos dos objetivos do aprendizado. Logo, o professor deve ser capaz de direcionar o foco dos alunos, mantendo a ordem e, obviamente, é também ele o responsável pela avaliação de cada um, tanto no quesito “desempenho pessoal” quanto “em grupo”. O caso clínico a ser discutido não pode ser limitado e deve permitir o estudo de diferentes tópicos, mobilizando diferentes competências de análises e promovendo diferentes possibilidades de resolução da situação-problema. Logo, o caso clínico deve permitir diferentes justificativas, contestações e soluções diversas, até que os membros dos grupos percebam os erros e os acertos e possam chegar a um denominador comum, que é o aprendizado sólido propriamente dito. A PRÁTICA DO ESTUDO DE CASO CLÍNICO
Ao escolher o estudo de caso clínico para ser trabalhado em sala de aula, o professor precisa ter em mente que a prática pode não se resumir em apenas uma ou duas aulas, sendo necessário, muitas vezes, dispender um tempo relativamente grande para se finalizar um estudo de caso de maneira eficiente. O professor deve, de antemão, estabelecer um tempo hábil compatível com as necessidades dos grupos para realização da tarefa e este tempo deve ser respeitado, já que alguns grupos podem finalizar o estudo de caso antes de outros. Caso aconteça de alguns grupos terminarem suas atividades antes do tempo previsto, o professor pode confeccionar desafios suplementares para estas equipes de modo a não incorrer em prejuízos para as que ainda estiverem realizando suas atividades. Além do tempo, é preciso ter em mente que os casos clínicos devem ser produzidos respeitando as competências e habilidades dos alunos naquele momento e de acordo com os objetivos da aprendizagem a ser desenvolvida naquele estágio da
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vida acadêmica, contendo o máximo de informações possíveis, com um relato de caso completo a respeito da situação-problema a ser estudada. E aqui é necessário dizer que os estudos de casos clínicos ficam mais interessantes quando o professor não apresenta previamente a solução final da situação-problema, deixando para os alunos a tarefa de descobri-la na companhia de seus pares. Nesta proposta, o professor deve direcionar os alunos na busca da solução por meio de questionamentos no decorrer do estudo do caso (SENAC, 2018). No estudo de caso clínico há uma sequência a ser seguida e que deve ser respeitada. Primeiramente, o professor deve sortear os grupos de estudos ou permitir que os alunos componham, por afinidade, seus próprios grupos; na sequência, o professor deve fazer uma preparação prévia dos alunos e então apresentar o caso; posteriormente, é necessário haver a discussão em grupo; por último, cada grupo apresenta suas conclusões para, então, todos os grupos produzirem uma conclusão em comum. Tal como se apresenta adiante (SENAC, 2018): 1. Divisão dos grupos: A montagem dos grupos deve ser discutida com a turma para que seja realizada da forma mais democrática possível. Todavia, o professor deve prestar bastante atenção na composição dos grupos e, sempre que possível, mesclar a presença de alunos mais participativos na aula com alunos menos participativos e, ao mesmo tempo, estimular a participação dos alunos mais tímidos. É interessante que a dinâmica do estudo de caso seja realizada ativamente por todos, pois isso facilita o alcance dos objetivos em pauta. 2. Preparação prévia e apresentação do caso: Uma das características do estudo de caso é a preparação prévia que se faz do aluno a respeito do assunto que estará em pauta no caso clínico, seja por meio de uma aula teórica convencional ou mesmo por meio de palestras de especialistas com ensinamentos de conceitos básicos ou até por meio de apresentações de vídeos. A partir de então, o docente deve apresentar o caso clínico a ser estudado. Inicialmente, o docente deve
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promover uma leitura individual atenta do caso apresentado e, a partir dessa leitura, é identificado o problema central e quais são as variáveis envolvidas no caso clínico. Nesta etapa, como o professor é o mediador de todo o processo, é ele quem auxilia na identificação de conceitos a serem estudados, promove questionamentos e auxilia os estudantes nas buscas das respostas para os questionamentos levantados. É o professor quem levanta novas questões para direcionar a resolução do problema, mas sem entregar para seus alunos as respostas prontas para as questões levantadas. 3. Discussão em grupo: Nesta etapa, os alunos apresentam, para seus pares, o que entenderam da leitura individual, obviamente levando em consideração seus conhecimentos prévios. São identificadas diferentes linhas de entendimento para, então, ser apresentada uma solução comum para o problema central do caso. O professor, nesta fase, deve identificar e registrar o desempenho de cada aluno dentro do grupo e, se necessário, solicitar que um ou outro expresse para seus colegas o que entendeu sobre o problema e dê sua contribuição para a solução do caso. 4. Conclusões: Cada grupo apresenta suas conclusões para os demais grupos. São discutidas, entre todos, as ideias levantadas e é o professor o condutor das discussões. A dinâmica desta etapa pode ser realizada por meio de perguntas, apresentações de cartazes ou mesmo através de slides em power point. Nesta etapa, os alunos entram em contato com diferentes pontos de vista e comparam ideias diferentes para a solução de um mesmo caso clínico, aparam arestas dos erros e compartilham os acertos. O apreço para a qualidade dos argumentos é fundamental e os alunos precisam, sempre, serem mantidos no centro das discussões para a resolução do problema.
A seguir, uma representação esquemática sintetiza a dinâmica do estudo de caso clínico:
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Figura 1: Representação esquemática sintetizando as etapas do estudo de caso clínico.
Um exemplo de estudo de caso clínico foi publicado em 1998 pela professora doutora Katie Larsen (LARSEN, 1998), da Illinois Wesleyan University, no periódico Honors Project e está mostrado na figura 2
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Figura 2: Um exemplo de caso real apresentado para estudo de caso clínico.
Do caso clínico apresentado na figura 2 estabelecem-se os objetivos a serem estudados: 1. Discutir definição, fisiopatologia, técnicas diagnósticas e possíveis tratamentos para as seguintes condições clínicas: a. Doença de Alzheimer b. Aterosclerose c. Depressão d. Convulsões e. Incontinência urinária 2. Desenvolver a definição de demência, considerando seus aspectos biológicos, filosóficos, psicológicos e aspectos sociais. Considere como esses vários aspectos podem impactar o tratamento de pacientes.
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3. Discutir sobre o Haldol e Prozac: a. Composições, mecanismos de ação b. Propriedades farmacocinéticas c. Contraindicações d. Efeitos colaterais e. Dependência f. Meia vida plasmática g. Vias de administração h. Metabolismo e excreção 4. Discutir conceitos a respeito dos seguintes itens: a. Mini-Mental State Examination b. Placas Amiloides difusas e neuríticas c. Emaranhados neurofibrilares d. Morte cerebral 5. Explicar os mecanismos de ação de antidepressivos no sistema nervoso central. 6. Discutir os aspectos éticos sobre doação de órgãos. 7. Considerando as condições fisiológicas vasculares e metabólicas, discutir mecanismos de desenvolvimento da placa aterosclerótica. 8. Discutir outros tratamentos possíveis, além dos medicamentosos, para Doença de Alzheimer. 9. Discutir as possíveis relações entre Doença de Alzheimer e Aterosclerose. 10. Neste item o professor indica a leitura de capítulos de livros e/ou artigos científicos sobre o assunto. Também, podem ser requisitados resumos para serem entregues ao professor após a leitura indicada.
Enfim, após a definição dos objetivos a serem estudados, segue-se na realização das próximas etapas do estudo de caso, que são as discussões entre os membros do próprio grupo, a discussão coletiva dos vários grupos e as conclusões.
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CONSIDERAÇÕES FINAIS
Muitas vezes o estudo de caso é confundido, na teoria e/ou na prática, com outras formas de metodologias ativas como, por exemplo, a “aprendizagem baseada em problemas” e as “discussões de casos”, o que dificulta seu entendimento teórico e sua prática. Assim, foi pensando em promover um norte mais claro para o entendimento do estudo de caso que este capítulo foi escrito, justamente para jogar um pouco mais de luz nas definições do que é e de como se pratica o estudo de caso dentro da sala de aula, facilitando os trabalhos para professores e alunos. Deve-se salientar, portanto, que o estudo de caso não se fecha no seu próprio contexto, descartando uma participação efetiva e profunda do professor, mas fecha, isso sim, um ciclo consistente de ensino-aprendizagem, pois é uma ferramenta ativa eficaz para solidificar o aprendizado previamente adquirido pelo aluno após uma aula teórica ou uma palestra. O estudo de caso potencializa a autonomia do estudante, gera autodeterminação, promove sociabilidade, autoconfiança e amplia a capacidade de retenção de conhecimentos duradouros, fundamentais para a prática profissional diária. REFERÊNCIAS
ANDERSON, L.W., KRATHWOHL, D., BLOOM, B.S. A Taxonomy for Learning, Teaching, and Assessing: A Revision of Bloom’s Taxonomy of Educational Objectives. 1. ed. New York: Ed. Longman, 2001. 352 p. BONNEY, K.M. Case study teaching method improves student performance and perceptions of learning gains. Journal of microbiology & biology education, v. 16, n. 1, p. 21-28. 2015. BUDGELL, B. Guidelines to the writing of case studies. The Journal of the Canadian Chriropractic Association, v. 52, n. 4, p. 199-204. 2008. HERREID, C.F. Case studies in science – A novel method of science education. Journal of College Science Teaching. Journal of College Science Teaching, v. 23, n. 4, p. 221-229. 1994. HERREID, C.F., SCHILLER, N.A., HERREID, K.F., WRIGHT, C. In case you are interested: results of a survey of case study teachers. Journal of College Science Teaching. v. 40, n. 4, p. 76-80. 2011.
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IRBY, D.M. Three exemplary models of case-based teaching. Academic medicine: journal of the association of American Medical Colleges, v. 69, n. 12, p. 947-953, 1994. LARSEN, K. A Case Study Analysis of the Relationship Between Atherosclerosis and Alzheimer’s Disease. Honors Projects. v. 75, n. 79, p. 1-44. 1998. MERSETH, K.K. The early history of case-based instruction: Insights for teacher education today. Journal of Teacher Education, v. 42, n. 4, p. 243-249. 1991. MERSETH, K.K.. Cases and case methods in teacher education. In SIKULA J. (ed.) Handbook of Research on Teacher Education, 2. ed. New York: Macmillan, 1996. p.772-744. SENAC. Metodologias ativas de aprendizagem. 1. ed. Rio de Janeiro: Ed. SENAC, 2018. 43 p.
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Capítulo 5 TECNOLOGIAS DIGITAIS COMO METODOLOGIAS ATIVAS Luiz Bittencourt Mercanti Vander José das Neves Gláucio Mazetto Siqueira Rubens Bagni Torres Eliane Moreto Silva Oliveira Jaíne das Graças Oliveira Silva Resende Vanessa Conrado Montalvão Torres RESUMO
O uso de tecnologias digitais para uma aprendizagem ativa no ensino superior tem crescido no Brasil, na esteira do desenvolvimento tecnológico mundial. Utilizar tais tecnologias de forma híbrida para que o aluno seja protagonista de seu próprio aprendizado tem sido uma vertente cada vez mais seguida no âmbito universitário. Este capítulo apresenta uma discussão a respeito das tecnologias digitais abordando sua influência no nosso dia-a-dia, a mudança que vem provocando no paradigma educacional, sua utilização como ferramenta de aprendizagem, suas vantagens, e dificuldades de aplicação. Destaca também como inovações: os portais educacionais, os aplicativos móveis e as videoaulas. Partindo desta premissa, demonstra para professores e gestores do ensino que o uso das tecnologias digitais de forma integrada às práticas pedagógicas contribui para uma educação de qualidade e desperta nos alunos o interesse pelo aprendizado, tanto dentro quanto fora 79
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da sala de aula, de forma dinâmica e efetiva, preparando-os melhor para enfrentarem os desafios diários no exercício profissional. CONSIDERAÇÕES SOBRE O USO DE TECNOLOGIAS DIGITAIS COMO FERRAMENTAS DE APRENDIZAGEM
Com a chegada da internet no Brasil, no final dos anos 1990, teve início um novo movimento em direção ao modo de nos comunicarmos, produzirmos conhecimento e compartilharmos informações em nossa sociedade. De lá para cá, em nível mundial, as tecnologias digitais de comunicação e informação (TDCI) evoluíram enormemente, impactando sobremaneira todos os setores da vida moderna. A atividade econômica global geradora de riquezas mediante a extração, transformação e distribuição de recursos naturais, bens e serviços, que tem como finalidade a satisfação das necessidades humanas, foi totalmente modificada em todos os seus setores, desde o setor de alimentação até o de segurança, passando também pelo setor da educação (ensino e pesquisa). Os computadores e softwares modificaram rapidamente nossa prática de leitura e escrita. Antes podíamos medir o índice de desenvolvimento da educação básica (IDEB) pelo percentual de “alfabetizados” da população. Hoje estamos mais interessados no número de indivíduos, que não só saibam ler e escrever, mas que sejam capazes de corresponder adequadamente às demandas sociais de leitura e escrita, isto é, indivíduos que as saibam usar de forma frequente e competente, os chamados indivíduos “letrados”. O termo letramento é utilizado para o processo de inserção numa cultura letrada. Ele representa uma ampliação do sentido de alfabetização e enquanto prática social favorece a interpretação dos discursos veiculados socialmente. O nível de letramento é determinado pela variedade dos gêneros de textos escritos - livros, jornais, revistas, artigos, bulas de remédios, receitas culinárias que uma pessoa consegue reconhecer. Paulo Freire, afirma que o domínio sobre os signos da linguagem escrita, mesmo no indivíduo 80
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alfabetizado, pressupõe uma experiência social anterior – a de leitura do mundo (FREIRE, 1984), a qual chamamos de letramento. Para o autor, a linguagem como fenômeno é estruturada do ponto de vista sócio-cultural de forma ativa e grupal. Se a escola, sendo a mais importante unidade de educação formal em nossa sociedade, precisou deixar de ser apenas um local para a transmissão do conhecimento para se tornar responsável por promover o letramento digital (RIBEIRO, 2016), foi para atender às necessidades dos jovens da Geração Z, os nativos digitais, precursores da cibercultura (LÉVY, 1999). Considerados geniais usuários desses recursos tecnológicos, esta geração já convive com essas “novidades” há mais de vinte anos, se considerarmos o ano de 1995, quando se popularizaram de forma marcante as tecnologias digitais no Brasil. Naquela época, iniciávamos uma tímida relação com a internet discada e o computador pessoal. Depois vieram os notebooks, as impressoras a jato de tinta, os tablets, a navegação por banda larga, os smartphones e tantos outros dispositivos que, hoje, de maneira automática fazem parte da nossa rotina. Mesmo que não quiséssemos, estamos há um bom tempo envolvidos numa relação explícita, e às vezes implícita, com as TDCI. E isto inclui a escola, ainda que timidamente nosso sistema de ensino venha tentando fazer o que já acontece intensamente para além de suas paredes. No sentido da pesquisa e do ensino, estamos ainda engatinhando em direção à produção e à aplicação do conhecimento construído com base na integração entre as TDCI e as práticas pedagógicas. O paradigma educacional da sociedade atual exige que os pesquisadores investiguem novas concepções e os professores repensem e atualizem o seu papel. A formação inicial e continuada dos professores deve estar atenta a estas questões. Neste sentido, a UNESCO (UNESCO, 2008) elaborou um projeto em que a proposta é de uma matriz curricular que relacione as ofertas dos cursos às metas políticas tendo em vista a melhoria 81
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educacional e o desenvolvimento econômico. O “Projeto de Padrões de Competências em TIC para professores”, sugere o aperfeiçoamento da prática docente através da integração do uso das inovações pedagógicas, entre elas, especialmente as TDCI. Seguindo a mesma linha, a Sociedade Internacional para Tecnologia na Educação (ISTE), sediada nos Estados Unidos, elaborou padrões para nortear a preparação de docentes na aplicação de atividades educacionais mediadas por tecnologias (ISTE, 2018). A ISTE orienta os educadores para uma prática pedagógica baseada em indicadores que os permitam desenvolver habilidades e competências para elaborarem atividades que irão facilitar as experiências de aprendizagem dos alunos, a criatividade e a inovação, seja de forma presencial ou em ambientes virtuais. Os indicadores que embasam a prática são sete: (a) Os educadores melhoram continuamente sua prática aprendendo uns com os outros e exploraram práticas comprovadas e promissoras que alavancam a tecnologia para melhorar o aprendizado dos alunos. (b) Educadores buscam oportunidades de liderança para apoiar o empoderamento e o sucesso dos alunos e para melhorar o processo de ensino-aprendizagem. (c) Os educadores inspiram os alunos a contribuírem de forma positiva para uma participação responsável no mundo digital. (d) Educadores dedicam tempo para colaborar com seus colegas e alunos afim de melhorar a prática, descobrir recursos e compartilhar ideias aplicadas na solução de problemas. (e) Os educadores criam atividades dirigidas autênticas e ambientes que identificam e se ajustam às diferenças existentes entre os alunos. (f) Educadores facilitam a aprendizagem com uso da tecnologia apoiando o aluno a atingir os “Padrões ISTE para Estudantes”. (g) Os educadores conhecem e utilizam dados para orientar o ensino e ajudar os alunos a atingirem seus objetivos de aprendizagem. Em Portugal, por exemplo, uma equipe de pesquisadores das universidades de Lisboa, de Évora e do Minho, tem se dedicado aos estudos da integração das TDCI na educação. Em 2008, o Ministério da Educação lusitano, através do Plano Tecnológico da 82
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Educação, definiu referenciais de competências em TDCI para professores (COSTA, 2008) com indicadores de desempenho em três domínios: (a) Uso instrumental - conhecimento de ferramentas e procedimentos. (b) Uso pedagógico - integração entre pedagogia e tecnologia e (c) Uso inovador e criativo. Tais padrões e indicadores do uso das TDCI na formação docente oferecem suporte para diversas pesquisas. Um dos modelos pedagógicos em voga atualmente é o Tecnological Pedagogical Content Knowledge (TPACK), que considera que a formação docente em TDCI deve ser feita a partir da interseção do conteúdo e da pedagogia (MISHRA, 2006). Onde são contemplados o conhecimento do conteúdo a ser ministrado, o conhecimento pedagógico e o conhecimento tecnológico. A estrutura do método tenta identificar a natureza do conhecimento requerido pelos professores para a integração tecnológica em seu ensino, ao mesmo tempo em que aborda a natureza complexa, multifacetada e pontual do conhecimento do professor. Contudo, de modo geral, podemos considerar escassas as pesquisas empíricas que verificam os níveis de proficiência docente na utilização das TDCI, bem como as formas de sua aplicação. As principais dificuldades encontradas para a aplicação das TDCI na educação fundamentam-se na formação insuficiente dos professores e no uso inadequado das tecnologias (MOERSCH, 1995). Estas, comumente são aplicadas em ações isoladas cumprindo exigências curriculares e reproduzindo o ensino tradicional sem que promovam mudanças ou inovações. A partir disto, MOERSCH (1995) propõe a implementação progressiva das TDCI na escola. Classificando os níveis de aplicação efetiva de “Não uso” (nível 0) a “Elaborado” (nível 6), percebeu-se que quando os professores ascendem de um nível para outro várias mudanças ocorrem na estrutura curricular. Desta forma, o foco do processo de ensino deixa de ser o professor e passa a ser o aluno. A tecnologia é utilizada para ampliar o entendimento de conceitos abstratos. As práticas de pesquisa substituem as aulas expositivas. Estratégias 83
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de monitoração da aprendizagem, como portifólios, autoavaliação e avaliação por pares ocupam o lugar da avaliação tradicional. Com base nessses modelos internacionais de avaliação da integração das TDCI nas práticas de ensino, VOSGERAU (2007) adaptou os níveis de aplicação efetiva para o contexto brasileiro. Os estágios vão de zero (não utiliza) a cinco (integração plena no plano de ensino e na prática do professor). O professor inovador integra à sua prática o conhecimento tecnológico, pedagógico e de conteúdo. Desenvolve atividades desafiadoras que conduzem os alunos a uma formação autônoma, colaborativa e transformadora da realidade. Para tanto, de acordo com a lógica dos níveis e padrões de aplicação das TDCI, esse professor deve ter o domínio das ferramentas tecnológicas disponíveis. Para que as TDCI alcancem os objetivos educacionais, o professor deve capacitar-se para aplicá-las, não no sentido técnico tornando-se um expert, mas familiarizando-se com o basicamente necessário para integrá-las à sua prática pedagógica. Mesmo obtendo um bom desempenho no uso pessoal das TDCI em seu cotidiano, os docentes ainda se encontram em processo de desenvolvimento quando pensamos em sua aplicação pedagógica. Esta migração do uso pessoal para o uso pedagógico das tecnologias é o principal entrave para a integração das TDCI na Educação (SILVA, 2014). Não podemos ainda assumir que os docentes do ensino superior possuam habilidades suficientes no manejo das tecnologias digitais e que sejam capazes de transformar o seu uso instrumental em uma utilização criativa e inovadora aproveitando suas imensas potencialidades pedagógicas. É urgente a necessidade de reorganização por parte das instituições de ensino superior que buscam oferecer uma educação de qualidade e formar profissionais preparados para atender às exigências da sociedade de informação, sabendo-se que estes objetivos não serão alcançados sem que se recorra às novas tecnologias (HUNG, 2012). Tais instituições, enquanto responsáveis pela 84
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formação dos futuros profissionais/pesquisadores, devem investir pesado em equipamentos e equipes de suporte técnico para que seus docentes possam melhor utilizar esses recursos, levando também os discentes a utilizá-los de maneira profícua. O USO DE APLICATIVOS MÓVEIS NO PROCESSO EDUCATIVO
O avanço tecnológico que permeia nossas vidas cotidianamente criou de forma global grandes fluxos de informação. O propagar das informações de forma livre contribui sobremaneira na construção do conhecimento. Se antigamente nos limitávamos a buscar o conhecimento nas coleções de livros, as chamadas “enciclopédias”, hoje, ele vem ao nosso encontro com o simples clicar do mouse através da rede mundial de computadores. E isto não se aplica somente à busca e à produção do conhecimento, estamos diante de um fenômeno que mudou totalmente o nosso modus vivendi. Estamos de tal forma “dependentes” virtuais e digitais. Prova disto, são os dados mais recentes (outubro-2018) fornecidos pela We Are Social, a maior rede de agências especializada em social media do mundo, em parceria com a HootSuite, uma plataforma de gerenciamento de mídia social integrada às redes sociais Twitter, Facebook, Instagram, LinkedIn, Google+ e YouTube. O relatório Q4 Global Digital Statshot (HOOTSUITE, 2018) aponta que 67% da população mundial - mais de 5,1 bilhões de pessoas - possuem um telefone celular, sendo a maioria smartphones. E através deles foram feitos nos últimos três meses 29 bilhões de downloads de aplicativos móveis. Aplicativos móveis são softwares (programas) criados para funcionar em dispositivos móveis como tablets e smartphones, através de um sistema operacional específico. São distribuídos por sistemas operadores como o Android da Google, o iOS da Apple, o Windows Phone da Microsoft e o BlackBerry OS da canadense BlackBerry. O sistema Android, por exemplo, classifica seus aplicativos móveis em 36 categorias, direcionadas a temas que vão desde casa
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e decoração; finanças; mapas e navegaçao; saúde e fitness até compras; comunicação; fotografia; arte e design, passando por temas como educação; medicina; livros, notícias e revistas, entre outros. Na categoria “Educação”, por exemplo, encontramos aplicativos voltados ao aprendizado de idiomas, anatomia humana, transtornos mentais, botânica, psicologia, interpretação e redação de textos, gramática, informática, matemática, história, astronomia e uma infinidade de outros conteúdos. Para ajudar ainda mais contamos com o apoio de aplicativos do tipo calculadoras científicas, dicionários e tradutores de idiomas. Estão também disponíveis em forma de aplicativos diversos cursos como de oratória, de libras (linguagem brasileira de sinais), de elétrica, de eletrônica, de guitarra e violão, entre outros. A abundância de aplicativos educacionais fez surgir uma nova modalidade de aprendizagem através de dispositivos computacionais móveis, chamada de m-learning (RODRIGUES, 2007). Por definição, inicialmente, m-learning seria a aprendizagem através dos palmtops, tablets e até mesmo através do celular. Porém, há quem considere restritiva a definição centrada nas tecnologias (POLSANI, 2003), preferindo adotar o termo n-learning (network learning). Para atender às atuais demandas sociais, as instituições de ensino superior devem contemplar no processo de ensino-aprendizagem, como métodos complementares, os modelos tanto de e-learning (ensino a distância) como de mlearning. Ambos os modelos são reconhecidos como eficientes alternativas de aprendizagem, seja ela formal institucionalizada ou informal. Sob a perspectiva pedagógica, a aprendizagem móvel deve ser dotada de três características (KEARNEY, 2012): personalização - lugar, tempo e ritmo de aprendizagem; colaboração - compartilhamento do conhecimento produzido; e autenticidade - contato com a realidade na resolução de problemas autênticos.
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OS PORTAIS EDUCACIONAIS E A APRENDIZAGEM
Por serem ambientes virtuais que promovem a aprendizagem, os portais educacionais também se enquadram nas TDCI. De acesso fácil e oferecendo grande interatividade com os usuários, constituem-se em poderosa ferramenta na integração entre tecnologia e educação. Os portais educacionais apresentam conteúdo bem organizado e facilmente disponibilizado, oferecendo comodidade e segurança para quem nele navega de forma produtiva e de acordo com as orientações do professor mediador. Com o conteúdo sempre voltado para a educação (GAMA, 2011), o portal educacional deve ter características específicas que o qualifiquem como tal. Entre elas temos: (a) Organizar os conteúdos - vídeos, livros, softwares, artigos, teses, dissertações e materiais externos disponíveis na web. (b) Oferecer canais de comunicação - fórum de discussão, blogs, caixa de sugestões e recados, registro de usuários para envio de publicidades. (c) Apresentar interface dinâmica - links externos, ferramenta de busca com possibilidade de acesso livre, restrito e misto. (d) Promover o desempenho - cursos para formação online, conteúdos digitais e recursos didáticos. (e) Prover informação direcionada a alunos, professores, pais e à comunidade; atualizar as informações com data de postagem; disponibilizar revistas, jornais e emissoras de rádio. (f) Disponibilizar serviços - gestão e alimentação de dados. (g) Dispor de sessão para FAQ - perguntas e respostas em relação ao uso do portal. Uma das grandes vantagens dos portais educacionais é a de poder contribuir para a aprendizagem aberta (PASSOS, 2018), ou seja, eles transferem conhecimento sem exigir do usuário quaisquer registros e sem a responsabilidade do ensino ser voltado para a formação profissional. Para elucidar o que foi exposto, segue o exemplo do portal “Aula de Anatomia”. O endereço eletrônico do portal é https://www.auladeanatomia.com/ novosite/. Em sua página inicial apresenta no canto superior esquerdo a sua logomarca. Ainda na parte superior, elenca 87
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as seguintes sessões com seus respectivos conteúdos: SISTEMAS - exibe janelas para os sistemas esquelético; articular; muscular; nervoso; cardiovascular; respiratório; digestório; urinário; genital; linfático; endócrino e tegumentar. ANATOMIA - traz os conteúdos sobre generalidades; aprendizagem; mural da anatomia; parte técnica e bibliografia. HISTÓRIA DO SITE - conta a história da webpage, a evolução da interface e mostra o vídeo com uma entrevista a seus criadores. CURSOS - oferece apostilas, provas simuladas, banco de questões objetivas e discursivas e jogos (palavras cruzadas e caça palavras) - todos estes itens trazem conteúdos referentes a cada um dos sistemas do organismo. Há também a oferta do “combo” - apostila; prova simulada; banco de questões objetivas-discursivas e os jogos - com todos os conteúdos referentes a um sistema específico. LOJA - apresenta endereço de e-mail da central da atendimento; janela de busca para os produtos oferecidos; ícones para login, cadastramento e carrinho de compras; na sessão institucional traz informações sobre a constituição da loja / política de privacidade / fisioterapia preventiva. Disponibiliza janela “fale conosco” para contato através de e-mail, facebook e google+. Apresenta certificação de confiabilidade da loja virtual; janela de cadastro de e-mail para envio de materiais promocionais e informa sobre as formas de pagamento e de envio dos produtos. DOWNLOADS - Disponibiliza de forma gratuita arquivos do acervo de aulas, palestras, cursos, palavras cruzadas e estudo dirigido, reunidas por sistemas do corpo humano. CONTATO - janelas para comunicação via e-mail com envio de mensagem. O website apresenta ainda links para o canal do YouTube, para os sites dos parceiros comerciais e para o perfil dos seus criadores. AS VIDEOAULAS COMO RECURSO EDUCACIONAL
A popularidade das videoaulas vem crescendo em meio às instituições de ensino superior e empresas de tecnologia educacional como Coursera, Khan Academy, FGV Online, Sebrae, entre outras.
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Elas se constituem como excelentes ferramentas para impulsionar a aprendizagem dentro e fora da sala de aula. Com vantajosa objetividade, conseguem explicar conteúdos em minutos, o que tomaria maior tempo na leitura de textos. Sem contar que podem ser assistidas várias vezes e a qualquer momento. Os nativos virtuais, aqueles da Geração Z, já estão bastante acostumados com as tecnologias, basta que sejam orientados quanto ao seu uso. Os vídeos, como recurso didático-pedagógico, oferecem a grande vantagem do conteúdo audiovisual, que estimula muito mais a percepção dos alunos e articula melhor as informações, descrevendo claramente aquilo que na forma textual não seria possível. É muito mais fácil percebermos como um processo se realiza ou como algo funciona através de uma imagem em movimento. Para corroborar com o exposto, estudos comprovam que os vídeos aumentam a motivação dos estudantes para aprender (BRAVO, 2011). Hoje é possível produzir videoaulas com baixo custo, mas antes de iniciar a sua produção, é importante definir que tipo de vídeo usar. Há diferentes tipos de videoaula (VIEIRA, 2014) e cada um desenvolve habilidades distintas, como vemos a seguir: (a) videopalestra - gravação de uma aula ou palestra ao vivo em auditório ou anfiteatro. (b) talking head vídeo - gravação de uma aula através de webcam, em close no interlocutor, onde o mesmo discorre sobre determinado tema. (c) voice over presentation - tipo de videoconferência na qual uma apresentação em PowerPoint é complementada com uma voz gravada que descreve os slides. (d) videoaula interativa - inclui slides do PowerPoint, recursos audiovisuais e outros, fornecidos pelo programa reprodutor de multimídia. A única dificuldade na produção e edição das videoaulas, está ligada a questões pedagógicas, isto é, transformar um material centrado no professor (apenas expositivo) em, pelo menos algo híbrido, capaz de estimular o aluno à interação e à aprendizagem ativa.
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CONCLUSÕES
A efetividade do processo de ensino e aprendizagem não depende exclusivamente das TDCI, mas as aulas podem se tornar mais atraentes através da sua utilização. Apesar de uma boa infraestrutura e recursos tecnológicos facilitarem a integração entre o ensino presencial e o online, é possível realizar atividades bastante estimulantes em ambientes tecnológicos mínimos. O importante é que as atividades propostas sejam mais centradas no aluno, promovendo a aprendizagem autônoma, colaborativa e personalizada. REFERÊNCIAS
BRAVO, E. et al. Video as a new teaching tool to increase student motivation. IEEE Global Engineering Education Conference (EDUCON), 638-642, 2011. COSTA, F. (coord.) et al. Competências TIC. Estudo de Implementação. Vol. 1. Lisboa: Gabinete de Estatística e Planeamento da Educação (GEPE), 2008. FREIRE, Paulo. Cartas a Guiné-Bissau: Registros de uma experiência em processo. Rio de Janeiro: Paz e Terra, 4a. ed., 1984. GAMA, Agleice Marques. Portal Escolar: educação sem distância com o uso de software livre. In: Anais do Congresso Nacional Universidade, EAD e Software Livre, 2011. HOOTSUITE; WE ARE SOCIAL. Relatórios especiais: o estado da internet no quarto trimestre de 2018. Disponível em: https://wearesocial. com/blog/ 2018/10/the-state-of-the-internet-in-q4-2018. Acessado em 26/10/2018. HUNG, E. S. O uso das TIC por docentes de cenários de ensino superior na Colômbia: Convergência. Revista de Ciencias Sociales, 19, 133-155, 2012. ISTE - International Society for Technology in Education. Standards for teachers. (2017) Disponível em: https://www.iste.org/standards/foreducators. Acesso em: 25/10/2018. KEARNEY, M. et al. Viewing mobile learning from a pedagogical perspective. Research in learning technology, v. 20, 2012. LÉVY, Pierre. Cibercultura. São Paulo: Editora 34, 264p., 1999. MISHRA, P., & KOEHLER, M. J. Technological Pedagogical Content Knowledge: A framework for teacher knowledge. Teachers College Record, 108(6), 1017-1054, 2006.
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MOERSCH, C. Levels of technology implementation (LoTi): A framework for measuring classroom technology use. Learning and Leading With Technology, 23 (3), 40-42, 1995. PASSOS, Marize L. S. Educação a distância no Brasil: breve histórico e contribuições da Universidade Aberta do Brasil e da Rede e-Tec Brasil. Vitória: edição do autor, 79pp., 2018. Publicação eletrônica. POLSANI, Pithamber R. Network learning (PDF). In: Rossett, A. (Ed.), A. Mobile learning essays on philosophy, psychology and education. (PDF). [S.l.]: Vienna: Passagen Verlag. pp. 139–150, 2003. RIBEIRO, Ana Elisa. Tecnologia digital e ensino: breve histórico e seis elementos para a ação. Linguagem & Ensino, Pelotas, v.19, n.2, p. 92, jul./dez. 2016. RODRIGUES, J. mlSynapse: Uso de m-learning no Ensino Superior. 2007. Dissertação (Mestrado em Gestão da Informação). Departamento de Economia, Gestão e Engenharia Industrial. Universidade de Aveiro. SILVA, Bento, et al. Aplicação e uso de Tecnologias digitais pelos professores do ensino superior no Brasil e Portugal. Educação, Formação & Tecnologias, 7 (1), 3-18 [Online], 2014. UNESCO. ICT Competency Standards for Teachers. Implementation Guidelines. Paris: UNESCO, 2008. VIEIRA, Isabel; LOPES, Ana Paula; SOARES, Filomena. The potential benefits of using videos in higher education. Proceedings of EDULEARN14 Conference 7th-9th July, Barcelona, Spain, 2014. ISBN: 978-84-6170557-3. VOSGERAU, D. S. A. R. Projeto Cri@Tividade – SME: Metodologia para a integração das TIC à prática pedagógica. Curitiba: SME, 2007.
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Capítulo 6 APRENDIZAGEM BASEADA EM PROJETOS: DEFINIÇÕES E APLICABILIDADES Cleize Silveira Cunha Cristiane Silveira Cunha João Ozório Rodrigues Neto Mauro César Tavares de Souza RESUMO
Metodologias ativas de ensino-aprendizagem são estratégias educativas adequadas para que o aluno seja o protagonista na construção do conhecimento. A Aprendizagem Baseada em Projetos (ABPj) é uma destas estratégias, que se diz adequada para utilização no século XXI. Ela pressupõe o emprego de modernas ferramentas tecnológicas, mídias sociais e do apoio da comunidade e de centros de pesquisa de ponta no mundo. O presente trabalho fará uma análise de seu uso como estratégia educativa, focalizando sua implementação na Escola Médica e ressaltando o papel dos atores envolvidos: aluno, professor, escola e comunidade. INTRODUÇÃO
O mundo globalizado impôs desafios educacionais aos educadores e aos pais, responsáveis pelo desenvolvimento dos futuros cidadãos. Acredita-se que a globalização foi promovida pelo Banco Mundial, cujo desafio, era o de educar grandes massas de alunos. O êxito desta empreitada dependia da criação de novas estratégias 93
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educativas. A educação passiva do aluno (a= sem lumina= luz), recebedor de grandes volumes de informações, teve que mudar para incorporá-lo como agente da sua própria formação, sob responsabilidade de um professor-tutor (modelo construtivista). Assim, surgiram as metodologias ativas de ensino-aprendizagem, dentre elas, a Aprendizagem Baseada em Projetos (ABPj) (RODRIGUES NETO, 2009; HARARI, 2016; RODRIGUES NETO, 2016). Trata-se de uma categoria de aprendizagem ativa oriunda do ensino das ciências e da matemática e baseada no trabalho do educador e filósofo americano John Dewey, da Universidade de Chicago. Esta metodologia parte de um problema real a ser investigado pelos alunos, conhecido como ÂNCORA; por exemplo: escrever uma peça de teatro; fazer um filme de curta-metragem, calcular o pouso de uma nave espacial na superfície de Marte. Voltada para a solução de problemas do século XXI, esta metodologia permite a utilização de ferramentas oriundas das tecnologias digitais de informação e comunicação (TDIC), capazes de prover informações relevantes para a solução do problema. Ao realizarem o projeto de ABPj, os alunos da turma, por exemplo, podem ser divididos em duas ou três equipes, cada uma sendo responsável pela abordagem geral do problema, assim como pela geração dos artefatos necessários para completar o projeto. Se o problema for um pouso em Marte, os alunos podem construir um paraquedas que se mostre eficaz em escala reduzida, na realização do projeto maior, em escala real. Na maioria dos projetos de ABPj pode haver uma variedade de soluções aceitáveis para o problema, devendo-se esperar que vários grupos de alunos apresentem soluções diferentes. Se o problema for: pousar uma nave em Marte; algumas etapas precisam ser pesquisadas. Quantas vezes já se pousou em Marte e em que condições? Como construir um paraquedas que evite o choque da nave com a superfície do planeta? etc. (BAUER, 2018). Com isto, pode-se ilustrar as 5 fases empregadas nesta metodologia:
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1. Propor de forma clara o problema aos alunos. 2. O grupo de alunos analisa o problema, pesquisa, raciocina, propõe ideias de solução; constrói artefatos relacionados à solução, utilizando todas as ferramentas digitais de pesquisa disponíveis. 3. A comunidade escolar e fora da escola trabalha em conjunto com as equipes de alunos para a solução da questão âncora. 4. Durante o processo os alunos são apresentados a inovações tecnológicas para a solução do problema, além de sua compreensão. 5. Os alunos criam um produto ou artefato que expresse para a comunidade, a solução do problema dada pelo grupo (KRAJCIK, 2001).
Poder-se-ia aplicar esta forma de construção do conhecimento na área de saúde através da elaboração ou da adesão a projetos de saúde em andamento. Por exemplo: acredita-se que no máximo em 10 anos, haverá o controle médico completo do mal de Alzheimer. Ao se empregar as etapas da Aprendizagem Baseada em Projetos, utilizando esta premissa como projeto, os passos seriam: 1. Como controlar o mal de Alzheimer em 10 anos? 2. O grupo de alunos analisa a histopatologia de cérebros acometidos por esta doença; estuda a fisiopatologia da doença; seus efeitos cognitivos, etc. 3. O professor responsável pelo projeto contata especialistas no Vale do Silício, na Califórnia, para esclarecer sobre os processos de solução. 4. Os especialistas do Vale do Silício apresentam nano robôs injetáveis que retiram do cérebro doente, os depósitos amiloides. 5. Os alunos constroem maquetes e esquemas de remoção da substância anômala do cérebro, dissertando sobre os efeitos esperados desta remoção.
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A figura abaixo esquematiza os elementos essenciais que envolvem os conhecimentos e as habilidades necessárias para o sucesso do emprego da Aprendizagem Baseada em Projetos. Figura 1: Elementos Essenciais para a ABPj. (Modificado de BENDER, 2015).
IDEIA CENTRAL
A premissa fundamental da ABPj é o aprendizado através da execução (o aprender fazendo), para que ele tenha um significado real. O produto do processo educativo deve ser palpável e útil para a sociedade. Para construir tal produto, os grupos de alunos precisam estar felizes e acreditar na viabilidade de sua construção. Constitui-se em uma ótima estratégia de ensino, porém sua implantação é dispendiosa devido ao aparato tecnológico necessário. Sua implantação requer os seguintes cuidados: objetivos de aprendizagem claros; suporte para a aprendizagem de professores 96
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e de alunos; oportunidades para revisão do processo e de auto avaliação e uma organização social que promova a participação e os resultados obtidos na aprendizagem que serão úteis para o progresso da comunidade. Estes princípios são responsáveis pela aquisição de conteúdos e habilidades, fazendo com que o aluno tenha domínio do seu processo pessoal de aprendizagem. A ABPj tem a vantagem de desenvolver nos alunos os 3 principais desfechos esperados para um bom método de ensino-aprendizagem: independência, responsabilidade e disciplina. Também promove as 3 características mais desejáveis para os cidadãos do século XXI: comunicação, negociação e colaboração (KRAJCIK, 2001; BENDER,2015). METODOLOGIA E LOGÍSTICA
Tudo na vida, e principalmente, no que se refere à educação, necessita de um planejamento eficaz. A primeira decisão a ser tomada é a de mudar o método de ensinar. Um professor isolado ou um grupo de professores, com o aval do projeto pedagógico do curso deve planejar de forma clara e concisa os objetivos educacionais que nortearão a atividade. Alunos do 5º ano do ensino fundamental são estimulados a estudar matemática através do projeto “Feira Livre” (COLÉGIO MONTESORI, 2018; ESCOLA SÁ PEREIRA, 2018). Os alunos são divididos em equipes e cada equipe se torna responsável por uma barraca na feira livre. O lucro obtido com a venda dos produtos é revertido para a aquisição de bens necessários para um asilo de idosos da comunidade. Assim os alunos treinam matemática e suas operações fundamentais, trabalho em equipe e acolhimento humano, já que são responsáveis pela entrega dos insumos ao asilo, interagindo com os idosos assistidos. O objetivo principal é claro: ensinar as operações fundamentais de matemática. A equipe de professores que planejou este projeto demorou 4 meses no planejamento, aprovação e execução dele. Esta ilustração das ações necessárias à implantação de um projeto, podem ser
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extrapoladas para qualquer nível de educação: ensino fundamental, educação de adultos e educação superior (BELL, 2011). COMO MOTIVAR OS ALUNOS?
A motivação dos alunos passa pela construção de problemas reais que possuam um significado efetivo para o grupo que desenvolverá a questão e que sejam adequados para o seu nível de escolaridade. Portanto, a escolha da ÂNCORA do projeto deve ser cuidadosa e deve contemplar objetivamente os objetivos de aprendizagem propostos quando da elaboração do projeto. Da mesma forma, o professor ou grupo de professores que propõe o problema deve estar familiarizado com as diversas etapas de sua solução e dispor de todas as ferramentas tecnológicas ou não, para finalizar o projeto. A escolha do tema feita pelos próprios alunos é a melhor estratégia de motivação. Normalmente esta escolha baseia-se na felicidade do grupo em trabalhar com aquele projeto, aumentado a chance final de sucesso. Cabe ao tutor observar nos encontros para a discussão do problema, se os alunos se mantêm focados e no caminho certo para sua solução (STIVERS, 2010; BUCK INSTITUTE, 2015). O PAPEL DO ALUNO
Para obter sucesso na ABPj, o aluno deve ter um mínimo de maturidade para trabalhar em equipe, desenvolver um estudo colaborativo com os demais membros do grupo, mostrando engajamento no processo. Os pequenos grupos de estudantes na ABPj, ao contrário de outras estratégias educacionais que utilizam estudo em grupo, são duráveis, o que facilita a discussão continuada, a reflexão e a revisão das informações pertinentes à solução do problema. É facultada ao estudante, a escolha dos colegas de classe com os quais ele deseja trabalhar, favorecendo o desenvolvimento das relações interpessoais através do convívio continuado. Essa estratégia facilita a efetividade do grupo de estudo e, o sucesso do 98
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grupo, corresponde ao sucesso da ABPj (STIVERS, 2010; BARRON, 2011; BENDER, 2015; BUCK INSTITUTE, 2018). Devem ser respeitados os sete direitos fundamentais dos indivíduos: respeito; informação (ter uma opinião e poder expressá-la livremente); ser atendido em objetivos e necessidades; poder expressar livremente seus sentimentos e opiniões, mesmo contrárias; ter problemas pessoais e erros perdoados; selecionar respostas adequadas para expectativas dos outros. Evita-se no ambiente educacional “matadores de relacionamentos” como: desprezo, crítica, ausência, posturas inflexíveis e posturas defensivas. As atividades educativas baseiam-se no princípio do consenso entre os membros do grupo e no estudo ativo, reflexivo, colaborativo e cooperativo. O aprendiz deve construir habilidades de pensamento crítico, comunicação interpessoal e cooperação nos estudos com os demais membros do seu grupo. As virtudes mais importantes requeridas para a execução da tarefa são: a paciência e a persistência. Espera-se que neste método de ensino, o aprendiz aprenda com seus erros, suas falhas de raciocínio e com as hipóteses de solução que não funcionam (STEVENS, 2013; RAVITZ, 2018). O PAPEL DO TUTOR
No modelo de ensino da ABPj não é só o papel do aluno que muda radicalmente, mas também ocorrem profundas mudanças no papel do professor. Um fato irrefutável é que: o currículo na ABPj é o projeto ÂNCORA; seja para um módulo ou para um curso inteiro. Existe uma intensa troca de experiências entre os alunos e o tutor, capaz de influenciar as diferentes maneiras de se solucionar conflitos como: o que é importante conhecer, como conhecer, como utilizar o conhecimento na solução do problema; quais ferramentas tecnológicas podem ser utilizadas para a solução, como consultar um projeto multicêntrico que faz parte de uma determinada proposição de ABPj para um módulo (BLEMENFELD, 1994; BARRON, 2012; RAVITZ, 2018).
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O PAPEL DA ESCOLA
A Escola pode optar por diversas formas de ABPj: ou apenas em um módulo de determinado curso; ou como estratégia curricular presencial ou de ensino a distância; ou como método instrucional durante um ano letivo. De toda forma o investimento é alto devido à necessidade de compra de aparato tecnológico para o suporte aos projetos. Determinados projetos são multicêntricos e exigem o contato com outras instituições de ensino e pesquisa para coparticipação de aprendizagem. Estratégias de sucesso passam por reforma das estruturas físicas de velhos laboratórios e pela instalação de tecnologia de ponta, dependendo da forma de ABPj escolhida. Necessita-se investir em impressoras 3D, acesso ilimitado à internet, compra de softwares específicos para o desenvolvimento dos projetos e para a construção dos produtos oriundos da solução deles. A atividade educativa proporcionada pela Escola deve se aproximar o máximo possível daquela desenvolvida pelos profissionais que executam estes projetos no seu ambiente real de trabalho cotidiano. Ela deve estimular a interdisciplinaridade, e capacitar os aprendizes a executar inúmeros papéis na construção do conhecimento que deve ser aplicado na vida futura. A Escola conta com a participação efetiva de outros membros da comunidade, dentro e fora da escola, como pais, cientistas, trabalhadores especializados, que poderão exercer um papel de motivadores; proverem fontes de informação e pesquisa; guias, críticos, avaliadores e mentores. A Internet e as redes sociais também são capazes de arregimentar outros membros da comunidade escolar, interligando de forma rápida vários envolvidos nos projetos. Elas permitem a publicação de resultados oriundos das soluções dos projetos e a exposição destes resultados em web sites (DOPELT, 2013; STEVENS, 2013; HARRIS,2014; BENDER, 2015; BENDER, 2017; HIGH QUALITY, 2018; RAVITZ, 2018; YAM, 2018).
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A ABPJ NA ESCOLA MÉDICA
A Escola Médica sempre utilizou metodologias ativas na formação do médico, em todas as eras: discussão de casos, atendimento presencial em ambulatório e hospital, sala de aula invertida. Era o “treinamento em serviço” presente no currículo das Universidades Federais desde 1974. O aumento das vagas em escolas médicas necessitava de métodos mais modernos de educação de massas, como a ABPj. Os autores deste capítulo utilizam esta metodologia para o 4º período de Medicina de uma Escola Médica do interior do Estado do Rio de Janeiro que adota o currículo modular. Os 60 alunos do módulo são divididos em 5 times de 12 alunos, com um representante eleito por eles, para cada time. O projeto ÂNCORA tem como objetivo principal discutir aspectos imunológicos através de um transplante de medula óssea para um portador de Leucemia Aguda. Cada time se responsabiliza por uma etapa: seleção de doadores; bancos de armazenagem de células; aspectos práticos do transplante de células; reações imunológicas ao transplante. As equipes pesquisam, debatem, realizam reuniões com os 3 professores-tutores, consultam especialistas, biblioteca, mídias sociais e Internet com vistas à solução do problema. O aspecto social envolvido consiste na motivação dos alunos para a doação de medula óssea para transplante. O planejamento da atividade pela equipe responsável dura em média, 4 reuniões para a definição dos objetivos, antes do início da atividade. Ao final da atividade é procedida a avaliação de desempenho dos alunos. Conforme previamente negociado com eles, a nota final da atividade consiste em: cada professor emite uma nota individual por aluno; o representante de cada time avalia a si mesmo e aos demais membros do seu time; por fim, cada aluno se auto avalia. A soma das 3 notas é dividida por 3 e emite-se a nota final da atividade. Ao final eles preenchem um questionário de avaliação do processo. O índice de satisfação total foi de 89% no último semestre de 2017. Portanto, a ABPj pode ser empregada para melhorar o desempenho do estudante de medicina em qualquer fase do curso médico, para ensinar 101
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qualquer conteúdo. Os objetivos educativos precisam ser claros, a disponibilidade de vários recursos eletrônicos ou não deve ser adequada e por fim, deve-se permitir a auto avaliação consciente da atividade, fornecendo feed back imediato para as ações educativas. CONSIDERAÇÕES FINAIS
O século XXI se caracteriza pelo elevado desenvolvimento tecnológico que deve auxiliar o homem na busca da felicidade. A Escola autoritária e o professor como fonte do saber perderam espaço muito rápido. O estudo participativo, colaborativo e centrado no aluno, torna o ambiente educacional mais alegre e mais eficaz na construção do conhecimento. Inúmeras estratégias participativas foram criadas com o nome de Metodologias Ativas de Ensino Aprendizagem e elas se encontram disseminadas nos mais variados espaços escolares mundo afora. A ABPj é uma destas metodologias que se diz apropriada para o ensino no século XXI. Para tanto, ela prevê o uso de alta tecnologia de informação, do processo científico e da colaboração entre escolas e comunidade como forma de afirmar a relevância deste método educacional. Neste século o ser humano experimentou uma acentuada melhoria na sua qualidade de vida e na sua expectativa de vida média. Grandes empresas de tecnologia do Vale do Silício estão à procura de gênios em ciência, capazes de promover melhoramentos na pesquisa científica, com o propósito de tentar controlar a maioria das doenças e aumentar a longevidade das próximas gerações de pessoas, utilizando a ABPj como ferramenta de seleção. Pelo que se nota, embora de inúmeras aplicações, ela pode ser curricular ou uma simples estratégia educativa, empregada por um professor isolado, que quer aumentar a qualidade do seu ensino em sala de aula. Seja como for, parece que a velha escola de decorar tabuada, nomes de rios, tabela periódica, está com os dias contados.
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REFERÊNCIAS
BARRON, B. J. S. et al. Doing with Understanding: lessons from research in Project-based learning. Journal of Learning Sciences (3-4): 271-311, 2011. BARRON, B. et al. Lessons from research on problem-based and Projectbased learning. The Journal of the Learning Sciences. 7 (3-4): 271-311, 2012. BAUER, I. Project based learning. Disponível em: www.democratic.co.uk, 2014. Acesso em 2018. BELL, S. Project-based Learning for the 21 st. Century: skills for the future. Clearing House, 83: 39-43; 2011. BENDER, W.N. Aprendizagem Baseada em Projetos: educação diferenciada para o século XXI. Porto Alegre: Penso, 2015. BENDER, W.N. 20 Strategies for STEM Instruction. Learning Sciences International. Palm Beach, fl.; 2017. BLEMENFELDT, P. et al. Lessons learned: how collaboration helped middle grade Science teachers learn Project-based learning. Elementary School Journal. 94 (5): 539-551, 1994. BUCK INSTITUTE FOR EDUCATION. Learning: a proven approach to rigorous classroom instruction in 2015. Disponível em: bie.org. Acesso em 2018. COLÉGIO MONTESORI. Projeto Feira Livre. Disponível em www. colegiomontessori.com.br/noticia/762/projeto-feira-livre. Acesso em 2018. DOPELT, Y. Implemetation and Assessment of Project-based Learning in a flexible environment. Int. J.Tech. and Design Education, 13: 255272; 2013. ESCOLA SÁ PEREIRA. Projeto Feira Livre. Disponível em: http://www. escolasapereira.com.br/pagina/609/. Acesso em 2018. HARARI, Y. N. Homo Deus: uma breve história do amanhã. São Paulo: Cia. Das Letras, 2016. HARRIS, M.J. The challenges of Implementing Project-based Learning in middle schools. Pittsburgh, 2014. HIGH QUALITY ORGANIZATION. A framework for high quality Projectbased Learning. Disponível em hqpbl.org. Acesso em 2018. KRAJCIK, J. S; BLUMENFELD, C.P. Project Based Learning. In: Cambridge Handbook of Learning Sciences. Cambridge, U.K., Chap. 19: 317-333; 2001. RAVITZ, J. Assessing the impact of online Technologies on PBL use in US high schools. Disponível bie.org. Acesso em 2018. RODRIGUES NETO, J. O. Proposição de Módulo Curricular de PBL para a disciplina de semiologia da Escola de Medicina do UniFOA. Dissertação de Mestrado. Volta Redonda, 2009.
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RODRIGUES NETO, J.O; CUNHA, C. S; SOUZA, M.C.T. Problematização: reflexões a partir de uma estória. Rev. Esc. Ciências Médicas de Volta Redonda: (1) 6-10, 2016. STEVENS, K. Project-based Learning. Journal of Problem-based Learning, 7 (2): 71-101; 2013. STIVERS, J., GOODMAN, B. Project-based Learning: a dynamic approach to teaching 21st. Century. Educational Psycologist. 50 (5): 123-130, 2010. YAM, L.H.S., ROSSINI, P. Implementing a Project-based Learning in a introductory property course. In: 16™ Rim Real Estate Society Conference. Wellington, 2010. Disponível em: usaustralia.org. Acesso em 2018.
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Capítulo 7 JOGOS NA EDUCAÇÃO MÉDICA: UM RECURSO MOTIVACIONAL Any Carolina Cardoso Guimarães Vasconcelos Tereza Cristina de Carvalho Souza Garcês RESUMO
Os jogos no processo educacional dos profissionais da saúde, inclusive na educação médica, constituem ferramentas motivadoras e capazes de potencializar e facilitar o processo de aprendizagem, permitindo a visualização de conceitos, bem como a construção do conhecimento, novas descobertas e aquisição de competências. Nesse contexto e diante da necessidade da aplicação de metodologias ativas voltadas para grandes grupos foi desenvolvido um jogo de tabuleiro, denominado GAMEP. Assim, este capítulo apresenta inicialmente as tendências atuais do uso de jogos na educação médica e, posteriormente, relata o desenvolvimento e a experiência da aplicação do GAMEP no módulo de métodos de estudo e pesquisa de um curso de medicina. A criação do design do tabuleiro teve como foco da experiência o aluno-jogador. Foi desenvolvido um conjunto de perguntas relacionadas ao conteúdo do módulo trabalhado ao longo do semestre agregadas aos enigmas das casas do tabuleiro: “Certo ou errado”, “Sorte ou azar”, “Quem sou eu?” e “Desafio do adversário”. O jogo apresenta princípios capazes de estimular o desenvolvimento cognitivo e o raciocínio lógico dos estudantes, assim como permite a fixação do conteúdo, 105
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contribuindo para uma aprendizagem significativa. A dinâmica da atividade permite a participação de todos os integrantes do grupo, propiciando uma interação social e a habilidade de trabalho em equipe. A experiência do desenvolvimento do jogo de tabuleiro trouxe êxito para a prática de um conteúdo pouco atrativo para estudantes de medicina, podendo ser aplicado para outros contextos e áreas desafiadoras na educação médica. INTRODUÇÃO
Com o advento da globalização, as informações são acessadas de forma mais rápida e fácil, gerando impactos em diversas áreas da sociedade, entre elas na saúde e educação (SANTANELLA, FEITOSA, 2009; FERNANDES, et al., 2016; SIGNORI, GUIMARÃES, 2016). Diante disso e do atual perfil dos alunos é essencial que os padrões de ensino-aprendizagem acompanhem esse processo evolutivo, com estratégias pedagógicas que busquem despertar a valorização das habilidades e experiências dos discentes, proporcionando uma aprendizagem ativa e significativa (RAMOS, LORENSET, PETRI, 2016; SIGNORI, GUIMARÃES, 2016). Nesse contexto, diversas ferramentas como o uso da tecnologia da informação, as simulações e outras formas de aprendizagem baseada em experiências e os jogos têm sido aplicadas na educação médica e vem se destacando como alternativas atraentes e inovadoras no processo educacional, auxiliando no desenvolvimento de uma nova geração de alunos (RAMOS, LORENSET, PETRI, 2016; SIGNORI, GUIMARÃES, 2016; HARUNA, et al., 2018). Os jogos são utilizados desde os primórdios da humanidade e fazem parte da cultura da espécie humana (CAFFREY, 2000; ORTIZ, 2005) contribuindo para o desenvolvimento e integração das sociedades nos âmbitos social, intelectual, moral e afetivo (ORTIZ, 2005; STRAPASON, 2013). Desde o princípio são utilizados para promover habilidades e o pensamento crítico (CAFFREY, 2000).
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Atualmente, os jogos educativos aliados à tecnologia têm sido incorporados no currículo educacional da formação dos profissionais da saúde, entre eles da área médica (GRAAFLAND, SCHRAAGEN SCHIJVEN, 2012; CAIN; PIASCIK, 2015). O uso dessas ferramentas contribui com um maior envolvimento dos participantes, torna o ambiente de aprendizagem mais interativo e seguro para praticar, analisar, adquirir competências e obter melhorias dos resultados nos processos reais (HARUNA, 2018; WHITE; LEWIS; MCCOY, 2018). Além disso, proporciona uma aprendizagem colaborativa, permite desafiar os alunos em diferentes níveis de desempenho, promove um feedback imediato, estimula a capacidade de aprender com os erros e proporciona melhorias no desenvolvimento dos aspectos comportamentais (CAIN; PIASCIK, 2015). Dessa forma, o presente capítulo visa apresentar as tendências atuais do uso de jogos na educação médica e, posteriormente, relata o desenvolvimento e a experiência da aplicação do GAMEP na disciplina de métodos de estudo e pesquisa de um curso de medicina. JOGOS EDUCACIONAIS
Os jogos educacionais são ferramentas que promovem a aquisição de habilidades, o pensamento científico e permitem o treinamento dos alunos através da motivação e dos estímulos cognitivos. Possuem como finalidade principal proporcionar o aprendizado, seja ele no contexto formal ou informal. Além disso, devem possuir regras, objetivos claros e utilizar estratégias coerentes que favoreçam o desenvolvimento do processo de ensinoaprendizagem (DONDI & MORETTI, 2007; NOEMI & MAXIMO, 2014; CAIN & PIASCIK, 2015). Para serem considerados jogos educacionais fazem-se necessários alguns elementos, entre eles a capacidade de promover uma aprendizagem significativa, funcionar como um instrumento estimulador da construção do conhecimento e possibilitar a compreensão e intervenção nos diversos fenômenos sociais e culturais. 107
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Além de envolver uma competição, a qual deve ter regras bem delimitadas, no alcance de determinado objetivo (ANTUNES, 2013). Diante disso, é notória a crescente utilização de jogos no processo educacional dos profissionais da saúde, inclusive na área médica, pois eles constituem ferramentas capazes de potencializar e facilitar o processo de aprendizagem, permitindo a visualização de conceitos, a revisão e fixação do conteúdo, bem como a construção do conhecimento, novas descobertas e aquisição de competências pelos discentes (HENDERSON, 2005; PESCADOR, 2010; ANTUNES, 2013; FERNANDES, et al., 2016; BIGDELI & KAUFMAN, 2017). Ao mesmo tempo, permite ao docente exercer o seu papel de facilitador, gerador de situações estimuladoras e avaliador desse processo (ANTUNES, 2013). Os jogos educativos constituem uma ferramenta fácil, motivadora e prazerosa, que estimula o desenvolvimento cognitivo, propicia uma atmosfera crítica, permite a interação entre os discentes e docente, além de um feedback imediato, facilitando o processo de ensino-aprendizagem (ANTUNES, 2013; CHU, et al., 2015; KASHIBUCHI, et al., 2015; BIGDELI; KAUFMAN, 2017). Além disso, são utilizados para auxiliar no ensino de conceitos difíceis, monótonos e desestimulantes tornando a aprendizagem mais envolvente para os discentes. Os jogos educacionais podem ser elaborados com diferentes níveis de dificuldade e promovem o desenvolvimento de habilidades profissionais e trabalho em equipe, que inclui o respeito mútuo, a vivência da disciplina e a imposição de limites, já que eles possuem regras pré-definidas (SCHAEFFER, 2006; ROSADAS, 2011; FERNANDES, 2016; GORBANEV, et al., 2018). No entanto, outro aspecto importante refere-se a quando e como os jogos devem ser utilizados, bem como a necessidade da elaboração de jogos projetados de forma eficaz, pois só assim são capazes de promover ganhos no engajamento e estimular a criatividade na resolução de problemas, a tomada de decisão, o raciocínio e a análise crítica (HARUNA, et al., 2018; GORBANEV, et 108
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al., 2018). Dessa forma, é importante que os discentes reflitam sobre o conhecimento e ações adotadas durante a atividade e recomenda-se o uso dos jogos em situações em que eles possam auxiliar de forma efetiva no alcance dos objetivos pré-estabelecidos (ANTUNES, 2013; MORRIS, et al., 2013). Os jogos bem construídos possuem uma estrutura específica com elementos essenciais, entre eles destacam-se: objetivos bem estabelecidos, pois são essenciais para fornecer um propósito ao jogo e manter o aluno focado. Além disso, devem variar conforme o nível do jogo, o que incentiva o aluno a buscar níveis mais altos. Ter regras específicas, pois impede que o discente busque caminhos mais fáceis e estimula a criatividade no desenvolvimento das estratégias a fim de alcançar os objetivos (CAIN & PIASCIK, 2015). Outro elemento primordial é a capacidade de fornecer um feedback, o qual visa informar sobre o progresso do aluno durante o processo, devendo ser claro, imediato e proporcionar um reforço positivo ao jogador. A participação deve ser voluntária e os participantes têm a liberdade de entrarem e saírem do jogo quando escolherem. Além disso, o jogo deve ter o fluxo, ou seja, a habilidade do jogador deve aumentar proporcionalmente ao nível de dificuldade do jogo, pois caso o participante tenha mais habilidade que o requerido durante a execução da atividade, ele ficará entediado. E caso o nível do jogo seja maior que a habilidade do jogador, ela ficará ansioso e desanimado (CAIN & PIASCIK, 2015). Diversos estudos têm sido realizados a fim de buscar explicações com base científica de como os jogos contribuem para um processo de aprendizagem efetiva (RAMOS, LORENSET, PETRI, 2016) e estimulam o prazer. Segundo alguns resultados, essa sensação de prazer está associada à ação de neurotransmissores, como a dopamina, a qual é conhecida como neurotransmissor da recompensa e é liberada quando há vitória em um desafio imposto. Além da ativação de áreas nervosas específicas em seres racionais,
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como da espécie Homo sapiens, propiciando o prazer intelectual (ROMANELLI, 2010). Conforme Ribeiro (2013), apesar de ser um assunto ainda em discussão, alguns estudos mostram resultados satisfatórios do uso dos jogos para reverter déficits de aprendizado característicos da dislexia. O uso dos jogos educacionais também estimula aspectos cognitivos e psicológicos como a emoção, capacidade de interagir com o outro, a percepção e a atenção, o que está de acordo com as perspectivas de Vygotsky (VAN ECK, 2006). Para que os jogos educacionais sejam aplicados, segundo Antunes (2013), são necessários quatro elementos importantes: capacidade de se constituir em um fator de autoestima do aluno, assim os jogos não devem ser extremamente fáceis ou difíceis, pois podem gerar um desinteresse e ainda diminuição da autoestima, associada à sensação de incapacidade e fracasso; condição psicológica favorável, dessa forma o professor é responsável por contagiar os alunos com o seu entusiasmo e prepará-los, além de utilizar os jogos como ferramenta aliada no combate à apatia e como instrumento nos desafios em grupo; condições ambientais, pois o espaço é um elemento fundamental no sucesso dos jogos; fundamentos técnicos, logo os jogos precisam ter início, meio e fim, além disso, não devem ser interrompidos e devem funcionar como estímulo para os discentes. TENDÊNCIAS ATUAIS DO USO DE JOGOS NA EDUCAÇÃO MÉDICA
Diante do desenvolvimento tecnológico e da necessidade de promover um ambiente de aprendizagem eficaz e atrativo, o uso dos jogos educacionais está em ascensão, pois são ferramentas que proporcionam um meio ideal para treinamento e estimulam o desenvolvimento de habilidades e competências exigidas na formação médica, além de ser um recuso motivacional para a aprendizagem efetiva. Aliado a isso, é importante ressaltar a preocupação com a segurança do paciente, o que exige treinamento 110
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dos profissionais médicos em ambientes simulados e também contribui para redução dos custos e morbidade dos enfermos (GRAAFLAND et al., 2012). Dessa forma, a aprendizagem interativa através dos jogos tem sido utilizada como uma potente ferramenta. Para isso, têm sido desenvolvidos jogos que possuam um objetivo desafiador, sejam divertidos, atrativos, tenham mecanismos de competição e proporcionem o desenvolvimento de habilidades, conhecimentos e atitudes aos participantes. Tais características correspondem aos “Serious games”, que são definidos como aplicativos de computador interativo, com ou sem componente de hardware, que podem ser jogados em plataformas como videogame, smartphones e computadores pessoais e constituem as últimas tendências na educação médica (GRAAFLAND et al., 2012). Diversos jogos têm se destacado, entre eles os que visam aumentar o envolvimento dos médicos residentes no treinamento de simulação (KERFOOT & KISSANE, 2014), promover educação sexual e prevenção de infecções sexualmente transmissíveis (HARUNA, et al., 2018), auxiliar na formação de cuidados intensivos (BOWYER, et al., 2008; YOUNGBLOOD et al., 2008), treinar o tratamento de lesões por queimaduras (KURENOV et al., 2009) e treinar etapas de decisão em uma sala de operação virtual como no jogo de Bypass de Artéria Coronária Off-Pump (OPCAB) e o jogo de Artroplastia Total de Joelho (COWAN, et al., 2010; COWAN, et al., 2011). Grande parte desses jogos estão voltados para as práticas e habilidade específicas da medicina e utilizam a tecnologia. Entretanto, poucos jogos são desenvolvidos para áreas básicas e de pouco interesse pelo estudante, como de epidemiologia e de princípios estatísticos, essenciais para o desenvolvimento de competências da Medicina baseada em Evidências.
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CONCEPÇÃO DE UM JOGO DE TABULEIRO COMO FERRAMENTA MOTIVADORA E ESTRATÉGICA NO ENSINO MÉDICO
A idealização para o desenvolvimento de um jogo de tabuleiro partiu do desafio de envolver o engajamento e interesse dos alunos em práticas utilizando metodologias ativas de aprendizagem no módulo de métodos de estudo e pesquisa nos períodos iniciais do curso de Medicina. Os objetivos de aprendizagem no módulo consistem em desenvolver a capacidade dos alunos em delinear estudos quantitativos e qualitativos, bem como analisar e interpretar os dados de pesquisas científicas. Para isso, a introdução de conceitos básicos da epidemiologia e bioestatística é necessária para o alcance das habilidades e competências esperadas, porém nem sempre motivadora para o discente, principalmente por se tratar de assuntos que exigem raciocínio lógico e que envolvem muitas vezes números e cálculos. Outro aspecto a ser considerado foi a quantidade de alunos por grupos de aulas práticas que tinham um total de 40. Nesse sentido, os métodos ativos mais utilizados eram para grandes grupos como o Team Based Learning (TBL), Peer Instruction e Rotação por Estações de Aprendizagem. Assim, com o intuito de aprimorar e inovar os métodos de ensino ativo, um jogo de tabuleiro foi desenvolvido a partir da observação e experiência do uso de jogos não educacionais como o banco imobiliário. DESENVOLVIMENTO DO DESIGN E DINÂMICA DO JOGO DE TABULEIRO GAMEP
O desenvolvimento do jogo de tabuleiro de Gamificação de Métodos de Estudo e Pesquisa (GAMEP) tem como objetivo a interação social e a prática lúdica voltada para grupos grandes. O design do tabuleiro apresenta elaboração com foco na experiência do aluno-jogador, possibilitando-lhe chances diversas no exercício de seu processo cognitivo frente aos conteúdos de
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tipos de estudos epidemiológicos, amostragem, distribuição de frequências, correlação e regressão linear, testes de significância, de hipóteses e de Qui-quadrado. Como parte da dinâmica do jogo, todos os estudantes têm a oportunidade de participar, a partir da proposta de subdivisão da turma em 4 grupos menores. O jogo deve apresentar o número de rodadas suficientes para que todos os membros da equipe participem ativamente na mesa com o tabuleiro em posicionamento central. Cada rodada tem, assim, a participação de 4 jogadores, sendo um representante de cada equipe. Para evitar problemas de ajuda e dicas, a disponibilidade dos grupos foi dimensionada de maneira que o jogador da vez ficasse de costas em relação ao seu grupo (figura 1). Figura 1. Esquema ilustrativo da disposição espacial do GAMEP. Triângulo azul: jogadores da rodada; círculo de contorno azul: grupos; círculo vermelho: tutora e círculo azul: mesa da rodada com o jogo de tabuleiro).
Além da abordagem com foco na aprendizagem do aluno, o jogo tem como instrumento motivacional a probabilidade de experimentar a sorte com ganhos de prendas como chocolates e a possibilidade de desafiar o adversário com questões desenvolvidas pela equipe de apoio. Neste aspecto, na casa do jogo deno113
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minada “Desafio do Adversário”, as equipes têm a oportunidade de desenvolver suas habilidades e criatividades na elaboração de problemas utilizando material didático como livros da área, busca na internet e artigos científicos referentes aos assuntos. O objetivo desta tarefa é manter a equipe em atividade plena durante o jogo, proporcionando interação entre pares e de discussão do conteúdo do módulo. O jogo apresenta um formato analógico contendo: um tabuleiro, seis pinos plásticos de cores diversificadas, dois dados e três conjuntos de cartas (24 cartas com afirmativas para a resposta de “certo ou errado”, 24 cartas com o enigma “quem sou eu?” e 20 cartas de “sorte ou azar”) (figura 2). Figura 2. Estrutura e componentes do GAMEP
Na rodada da vez, três pinos são disponibilizados para iniciar a jogada com o dado e andamento no tabuleiro: um para cada dupla de jogadores de equipes distintas (grupo 1 vs grupo 4 e grupo 2 vs grupo 3) e um pino para a jogada entre os vencedores de cada dupla (campeão do grupo 1 vs grupo 4 contra o campeão do grupo 114
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2 vs grupo 3). Em cada rodada o grupo vencedor pontua no placar geral. Ao final, a equipe com maior número de rodadas vencidas torna-se campeã da competição. No tabuleiro, 30 casas contendo 4 tipos de problemas são disponibilizadas para o andamento dos pinos aleatoriamente: “Quem sou eu?”, “Certo ou Errado”, “Sorte ou Azar” e “Desafio do adversário”. Na casa de “Quem sou eu” e “Certo ou Errado”, após a leitura do enigma e afirmativa pela tutora, o primeiro jogador entre a dupla de competição a bater na mesa com a mão tem o direito de retirar e responder uma das cartas correspondentes. Em caso de erro da resposta, o jogador da dupla adversária ganha a disputa. Da mesma forma, para “Sorte ou Azar”, o primeiro jogador a bater a mão na mesa tem o direito de pegar uma carta com a possibilidade de vencer a disputa ao retirar a “sorte” ou perder em caso de “azar”. Além disso, na “sorte” o estudante recebia um vale chocolate e no “azar” pagava um “mico” pré-determinado e concordado anteriormente entre os grupos. RELATO DE EXPERIÊNCIA DA UTILIZAÇÃO DO GAMEP
O GAMEP foi desenvolvido no final do ano de 2016 e utilizado por duas tutoras do módulo de Métodos de Estudo e Pesquisa em 5 turmas diferentes do curso de Medicina. Por apresentar o conteúdo programático de todo o módulo, em todas as experiências o jogo foi aplicado no final do semestre com o objetivo de fixação do aprendizado. Em cada turma participante, os relatos dos estudantes foram coletados pelas professoras. Os principais aspectos identificados após o uso do jogo foram: disposição para aprender mais sobre os assuntos abordados; a motivação pela atividade desenvolvida; a melhora da interação social da turma; o aumento da concentração durante a aula e maior fixação dos conteúdos.
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Nas 5 aplicações da gamificação foram observados pelas tutoras um engajamento dos discentes nos três aspectos: comportamental, emocional e cognitivo. No aspecto comportamental, a atitude positiva e de vontade para a execução do jogo foram destacados, no emocional foi notória a alegria e prazer de jogar e quanto ao cognitivo marcado pelo interesse em alcançar níveis mais altos de compreensão dos conteúdos explorados. Dentre as sugestões trazidas pelos estudantes, apontou-se o desejo de que outros módulos do curso de Medicina utilizassem o jogo como ferramenta metodológica de aprendizagem ativa. Aspectos quanto ao tempo de resposta, justificativa e arguição do jogador foram colocados pelos alunos como elementos que poderão ser melhores definidos. CONSIDERAÇÕES FINAIS
O uso de jogos na educação médica é uma tendência atual, com destaque do uso de “Serious games” que capacita o estudante no desenvolvimento de habilidades técnicas e de treinamento de simulação com segurança. Portanto, estão mais voltados para as práticas de áreas específicas da medicina. Despertar o interesse do aluno de graduação de Medicina por áreas que correlacionam o uso de elementos de bioestatística e metodologia científica é um desafio. Assim, o desenvolvimento e uso do GAMEP como recurso motivacional no ensino médico, obtiveram resultados positivos quanto ao prazer proporcionado aos estudantes durante a aplicação do jogo, resultando num processo e desejo de aprender mais, além da facilidade em fixar o conteúdo. Assim, o GAMEP constitui um recurso de ensino-aprendizagem motivacional e de aplicabilidade para a educação médica, podendo ainda ser adaptado para outras áreas, em especial, para práticas que envolvem grandes grupos de alunos.
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Capítulo 8 EM AÇÃO: O PSICODRAMA NO ENSINO DE HABILIDADES E ATITUDES MÉDICAS Maria Dulce Santiago de Carvalho RESUMO
Em tempos em que novas metodologias de ensino apontam para a necessidade da educação pela ação e para a ação, desponta o psicodrama como abordagem didático-metodológica, oferecendo seus recursos e conduzindo o aluno não só à fixação de conteúdos, mas à vivência do aprendizado. Este capítulo oferece um relato sucinto de atividades realizadas na disciplina Habilidades e Atitudes Médicas, na qual, mediante um método dinâmico e interativo, os alunos têm a possibilidade de aprofundar o conhecimento teórico e vivenciar o papel de médico, desenvolvendo competências humanísticas na relação com o paciente. Por meio de jogos dramáticos e de papel, dramatizações e sociodramas, o aluno explora seu papel profissional e experimenta também o outro lado – o contrapapel de paciente, essencial para desenvolver a empatia e a sensibilidade ao sofrimento do outro. Através das técnicas psicodramáticas, o aluno vivencia emoções e se envolve com o papel profissional em construção, despertando para uma relação de encontro verdadeiro com o paciente, fundamentalmente, do encontro consigo mesmo no papel de médico.
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INTRODUÇÃO “Existem palavras sábias, mas a sabedoria não é suficiente, falta ação” (J.L. Moreno)
A escola esquece-se de ensinar ao aluno a ser espontâneo. O que temos presenciado no cenário educacional constitui um conjunto de práticas fossilizadas, em que o aluno se mantém no papel de receptor passivo do conhecimento sem participar ativamente da construção do seu processo de aprendizado. O professor, muitas vezes, se depara com sua própria dificuldade em ser espontâneo, buscar o novo e quebrar as conservas culturais (expressão utilizada por Moreno, criador do psicodrama, que significa produto cristalizado de uma ação criadora. Segundo ele, as conservas culturais são barreiras para a criatividade e o homem deve buscar novas e espontâneas formas de comportamento). O docente incomoda-se com a “preleção” solitária, que, frequentemente, profere em sala de aula, mas teme ousar algo diferente. O verdadeiro educador vai além: desloca-se da comodidade do seu papel profissional, rompendo com as amarras que o aprisionam e entregando-se em um processo de co-construção do conhecimento com seus alunos. No âmbito da formação em Medicina, aponta-se que os alunos são ensinados a usar o branco, a lavar bem as mãos, a auscultar, a apalpar, etc. A escola médica ensina a técnica. Não se ensina ao aluno a ser espontâneo e criativo frente ao paciente. O estudante de Medicina aprende a repetir padrões de comportamento, diversas vezes reflexo da relação professor-aluno. O relacionamento que estabelece com aquele ser doente encontra-se impregnado pela relação que teve com o docente em sua graduação. Nesse sentido, a disciplina Habilidades e Atitudes Médicas oferece ao aluno a construção do papel profissional do estudante de Medicina, tendo como pilar o autoconhecimento, sedimentado em um trabalho que resgata a espontaneidade e a criatividade, conduzindo ao treino do seu papel de médico, mas fundamentalmente 122
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à sensibilidade, ao sofrimento do outro pela experimentação do contrapapel - o papel do paciente. No campo das metodologias ativas de ensino, o psicodrama surge em sua vertente educacional, estimulando o binômio espontaneidade/criatividade no processo de construção do aprendizado do aluno, de modo que ele apreenda os conteúdos de forma ativa e possibilitando que saia do papel cristalizado de receptor de conhecimento. Criado pelo médico Jacob Levy Moreno, que expressava que a escola deveria romper com o universo mecânico de ensinoaprendizagem, o psicodrama desponta como um método de ação, alicerçado fundamentalmente em recursos teatrais, que associa a arte com o aprendizado, a incorporação de conteúdos e vivências com a construção e ressignificação do papel profissional. O método psicodramático consiste em passar da palavra à ação, sem, contudo, abandonar a primeira, utilizando técnicas que tornam o aluno ativo e participante. O psicodrama pedagógico, como modalidade do psicodrama, conduz o aluno a aprender em relação a situações e fatos, em conjunto com outros colegas, transcendendo o conhecimento para sua prática. Os objetivos se assentam na transmissão de um conteúdo novo, na assimilação de conteúdo já conhecido ou mesmo para desbloquear a criatividade. Por meio de recursos, em que o jogo dramático e o role-playing se inserem, utilizando as técnicas psicodramáticas, o professor-diretor guia os alunos, empregando dramatizações, as quais visam à compreensão ou aprofundamento de conceitos e ao treino do papel profissional. CARACTERÍSTICAS DO PSICODRAMA NO CONTEXTO DAS METODOLOGIAS ATIVAS DE APRENDIZAGEM
Guiados pela perspectiva dramática do psicodrama, destacamse cinco instrumentos que fundamentam o processo:
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O diretor, que é o professor, produtor da encenação, do teatro: tem a função de estimular a espontaneidade dos alunos, mantendoos aquecidos para a ação e ampliando, através das cenas, a visão do grupo para a solução de problemas existentes dentro do seu cotidiano. Sugere modificações, adapta os jogos às características do grupo e faz uso das técnicas psicodramáticas, tendo sempre os objetivos bem estabelecidos. Dirige e analisa a cena, podendo ampliá-la ou incrementá-la. O protagonista, que é o aluno que centraliza a história: é aquele que está em cena desvelando um enredo e representando um papel (específico) dentro do contexto ensino-aprendizagem. No âmbito da Medicina, é o aluno que está treinando seu papel de médico na relação com o paciente. O ego auxiliar, que é quem faz o contrapapel, conservando-se no lugar de paciente: é o ego auxiliar também que entra na cena fazendo duplos e espelho (técnicas psicodramáticas descritas a seguir) do protagonista e trazendo à tona elementos que podem estar se passando no campo subjetivo. Cenário: é a delimitação do espaço físico, para que ocorram as dramatizações/encenações. As cenas psicodramáticas acontecem dentro de um espaço delimitado que é o palco. Plateia: é quem assiste, mas pode participar também. Os alunos que ficam na plateia podem solicitar a entrada em cena fazendo duplos. Para que todo o trabalho psicodramático se intensifique, o professor-diretor utiliza técnicas psicodramáticas, instrumentos valiosos na percepção do próprio papel: Solilóquio: o professor-diretor solicita aos alunos que pensem em voz alta e deem voz aos seus pensamentos.
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Duplo: professor ou alunos da plateia entra(m) em cena como ego auxiliar, posicionando-se próximo(s) ao aluno protagonista, falando como se fosse(m) ele e lançando um foco de luz para algo que ele pode não estar percebendo. Espelho: o protagonista é retirado da cena e professor ou aluno da plateia entra em seu lugar, fazendo um espelho dele, a fim de que ele possa se ver em cena, ampliando sua percepção de si e possibilitando uma visualização mais esclarecedora. Inversão de papéis: protagonista e ego auxiliar/contrapapel trocam de papel. Aprofundando ainda mais em seus pressupostos, ressaltamos que o processo psicodramático deve ocorrer em algumas etapas: aquecimento, dramatização, compartilhamento e processamento. O professor-diretor inicia o trabalho através de um aquecimento. Realizar uma cena dramática sem conduzir os alunos ao seu aquecimento é como o jogador de futebol que entra em campo sem estar aquecido: seu desempenho será ineficiente. O aquecimento prepara o aluno para a ação, mobilizando-o externa e internamente, quebrando amarras e fazendo emergir sua espontaneidade-criatividade, mola propulsora para o ousar e se lançar nas cenas. O professor começa a aula com o aquecimento inespecífico, que é o primeiro momento dele com a turma naquele dia, iniciando o encontro. Seu objetivo é diminuir a tensão e promover um ambiente envolvente, desenvolvendo a espontaneidade e a criatividade. Nessa etapa, o professor explicita o tema do encontro/aula e utiliza técnicas psicodramáticas de aquecimento para promover a preparação corporal e mental dos participantes, como caminhar, andar em ritmos diferentes, respirar, alongar, etc.; podendo também escolher jogos dramáticos que já ambientem os alunos para receber consignas mais precisas. Em seguida, dá-se início ao aquecimento específico, que acontece dentro do contexto dramático, e os participantes são preparados para a caracterização da situação, para a construção dos papéis e para a cena. A partir desse momento, o professor caminha
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para a dramatização, que é a própria cena dramática em realização. A temática é apresentada em forma de cena-acontecimento, cujo conteúdo assenta em um problema, impasse ou conflito dentro do universo, no qual o estudante de Medicina está inserido. É nessa etapa que o diretor observa dificuldades e distorções quanto a condutas apropriadas por parte do aluno, propondo modificações no manejo das relações médico-paciente. É todo o processo de atuação, no qual ele é levado a se colocar no lugar do outro e desenvolver sua capacidade télica. As relações permeadas pela tele são movidas pela espontaneidade e pelo encontro, implicando uma forma de percepção interna mútua e verdadeira entre os indivíduos; a empatia em dupla via, em reciprocidade. Após a dramatização, ocorre o compartilhar: os alunos comentam o que observaram e sentiram. Representa as trocas do protagonista, plateia e direção. É a “leitura” por parte de todos, do que foi expresso dramaticamente, a percepção do papel desempenhado e suas implicações no aluno. Finaliza-se com o processamento, que retrata a análise do processo: o diretor encaminhando o grupo para a reflexão cognitiva. Consiste, portanto, num momento pedagógico, quando o aluno transfere o aprendizado para a prática. Cabe pontuarmos que todas as etapas e instrumentos da ação dramática devem ser respeitados. Ademais, as ferramentas do psicodrama não devem ser utilizadas como um arsenal técnico. Todo o trabalho psicodramático precisa estar vinculado às suas bases teóricas, sendo guiado por um profissional psicodramatista. A ABORDAGEM DIDÁTICO-METODOLÓGICO-PSICODRAMÁTICA
Nas aulas envolvendo a metodologia psicodramática, lançamos mão de uma variedade de jogos dramáticos e role-playing, buscando favorecer o treino do aluno no papel de médico a partir da vivência do seu papel complementar, experimentando o lugar depacientee desenvolvendo a sensibilidade ao sofrimento desse outro. É imprescindível se colocar nesse papel na formação enquanto médico.
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Consiste em um fator que permite desenvolver habilidades relacionais e atitudes humanas, captando a visão do mundo da outra pessoa, sua história e projeto de vida. Entre constantes movimentos de ação-reflexão, constrói-se o papel profissional do estudante de Medicina, emergindo competências afetivas, que são incorporadas à prática médica. As primeiras aulas se estruturaram em torno do autoconhecimento, na ênfase de o aluno ouvir-se e reconhecer-se enquanto pessoa, a fim de que pudesse se perceber e identificar como médico, utilizando-se de jogos dramáticos para propiciar o contato consigo próprio. No decorrer do conteúdo programático da disciplina, os objetivos se estenderam de modo a preparar o aluno para o desenvolvimento de habilidades no contato com o outro e o estabelecimento de uma relação médico-paciente pautada em atitudes humanísticas, enxergando-o como um ser contextualizado e complexo em sua existência. O psicodrama trabalha numa atmosfera lúdica, favorecendo um campo relaxado e estimulando a espontaneidade e a criatividade do aluno, que pode ser potencializada por jogos que promovam a abertura para o aluno mergulhar e se projetar nas vivências que emergem, alcançando maior expressividade. O jogo permeia toda a dimensão humana e torna difícil pensar a existência do homem desvencilhada desse contexto, uma vez que é essa ação que lhe confere a possibilidade de estabelecer relações com outras pessoas e objetos. No trabalho psicodramático, os jogos assumem posição de destaque, uma vez que o lúdico permite a entrada em cena de uma outra realidade, oferecendo o desdobramento cênico de aspectos da vida em diferentes possibilidades. Todo jogo precisa estar conectado com o objetivo e o conteúdo da aula. Não é o jogo pelo jogo, a técnica pela técnica. Os jogos dramáticos do psicodrama se diferem de dramatização e de dinâmica de grupo. No psicodrama, a diferença fundamental é que consiste em jogo, porque promove o lúdico, e é dramático pela proposta 127
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de trabalhar os conflitos e dificuldades que emergem. Conflitos que, no nosso enfoque educacional, restringem-se somente ao papel profissional e aos objetivos propostos pelo professor-diretor, permitindo uma transformação do aluno e mobilizando-o a buscar condutas diferenciadas. Num clima de jogo, o lúdico conduz o aluno a fixar o conhecimento e a explorar o conteúdo de modo vivencial. Nesse sentido, reforça-se que, por meio do jogo dramático, o participante vislumbra uma nova visão do fato e acessa outras possibilidades de ação. Para além desses aspectos, os jogos ainda permitem a integração e a reflexão, e envolvem emocionalmente os alunos no processo de conhecimento. O role-playing consiste no treino e desenvolvimento do papel de médico na díade médico-paciente. Através da improvisação, são levadas ao cenário dramático situações vividas ou imaginadas, que são vivenciadas no palco de uma realidade suplementar, do “como se”. No enfoque do psicodrama como metodologia ativa, a realidade suplementar consiste numa experiência, na qual o aluno, numa atmosfera ao mesmo tempo permissiva e acolhedora, pode vivenciar cenas que exteriorizam o personagem do médico internalizado dentro de si, desde aquele com padrão de conduta inadequada até a figura idealizada. Diante de situações imaginárias próximas ao seu cotidiano e semelhantes a situações reais, o aluno vivencia o papel de médico e também de seu complementar – o paciente, ampliando seu potencial criativo e experimentando outras possibilidades e novas formas de atuação profissional e de posicionamento no mundo. Nesse percurso, “todas as técnicas psicodramáticas nos conduzem a essa possibilidade existencial de viver a realidade suplementar, que é a realidade do psicodrama, a realidade da representação dramática”. UM EXEMPLO DE PSICODRAMA NA PRÁTICA DOCENTE
Dando seguimento ao conteúdo programático, em uma das aulas de Habilidades e Atitudes Médicas V, avançando conforme os
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objetivos da disciplina, iniciou-se com um aquecimento inespecífico, utilizando um conto como um jogo dramático com os alunos. Em subgrupos, eles deveriam associar a metáfora, trazida pelo conto, com a realidade da relação médico-paciente e, num momento posterior, criar cenas explorando os conteúdos trabalhados em aula através de role-playing. Surgiram, então, cenas que retratam a humanização-desumanização do cuidador, a acomodação e a frieza na relação com opacienteno decorrer da carreira profissional, a insensibilidade ao sofrimento do outro e o se colocar e se ver no lugar do paciente, a busca pelo sentido da vida através do cuidado e a importância da empatia e da humildade na relação estabelecida com aquele que é cuidado. O objetivo era promover a familiarização com o contexto do “como se”, facilitando a entrada dos alunos na dramatização que se seguiria e correspondendo a aspectos teórico-vivenciais explorados em sala de aula. Depois de terminadas as dramatizações relacionadas ao conto, foi realizado um psicodrama, com um caso clínico, emergindo um aluno para ser o protagonista – papel de médico, e outro para ser o ego auxiliar, o contrapapel – paciente, quando, utilizando as técnicas do psicodrama (duplo, solilóquio, espelho e inversão de papéis), os alunos demonstraram habilidades comunicacionais e competências afetivas. CASO CLÍNICO
Pré-adolescente de 13 anos trazida pela mãe para consulta, com queixa de dor de cabeça recorrente, acentuada há dois anos e apresentando isolamento nos relacionamentos sociais e familiares. A mãe é viúva há três anos, após acidente de carro em que a família toda estava (os pais, a adolescente e o irmão, agora com nove anos), e o pai faleceu. A mãe casou-se novamente. Palco demarcado; cenário preparado. Três alunos estão em cena: A (médico), B (adolescente-paciente) e C (mãe da paciente). Os demais constituem a plateia. O médico recebe em 129
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seu consultório mãe e paciente e, de forma cordial e empática, inicia a consulta. A pré-adolescente mostra-se um tanto rebelde, já sendo instigada pela fala provocativa da mãe relatando suas queixas. A aluna no papel de médica revela atitudes humanísticas, encarnando o médico que vem sendo trabalhado em sala de aula. No decorrer da consulta, o protagonista (médico) informa que gostaria que a mãe conversasse com a psicóloga do hospital, enquanto ela se dedicaria a conversar com a préadolescente (contrapapel – paciente), o que a mãe (ego auxiliar) assente com receptividade. Uma aluna entra em cena como ego auxiliar (psicóloga). Dessa maneira, estão no palco duas cenas, que, desdobradas, vão sendo trabalhadas, cada uma a seu tempo. A cena transcorre de modo que o médico vai conversando com a paciente e consegue criar um clima acolhedor, viabilizando a abertura e a penetração na história de vida dela. Alunos como plateia solicitam a entrada em cena para fazerem duplos do médico e também para entrarem no papel da paciente e revelarem aspectos que poderiam ser valorizados na conduta clínica. Surge uma história de bullying, de dúvidas com relação à sua sexualidade e um dado mais grave apontando possível abuso sexual pelo padrasto. O médico aborda também o acontecimento envolvendo o acidente de carro, que culminou na morte do pai da pré-adolescente. O ego auxiliar, no papel de psicólogo, conversa com a mãe tentando obter mais dados e clarear os fatos. O médico tenta convencer a paciente da importância de ela se abrir com a mãe. As técnicas psicodramáticas (inversão de papéis e duplo) conduzem-na a tomar a decisão de conversar com a mãe, o que, por sua vez também, na cena com o ego auxiliar-psicólogo, é facilitado. A consulta se encerra quando a mãe se dá conta do drama vivido pela filha e propõe uma modificação na dinâmica familiar. É visível o envolvimento da plateia desencadeando emoções e choro.
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CONSIDERAÇÕES FINAIS
Por meio do psicodrama realizado, foi possível perceber a incorporação do papel de MÉDICO, com letras maiúsculas, o médico humano, que valoriza o cuidado na dimensão existencial do ser doente. Os alunos tiveram, mediante técnicas psicodramáticas, a oportunidade de desempenharem o papel de médico e de se colocarem também no papel de paciente, experimentando o outro lado, o papel daquele que sofre, fato essencial para desenvolverem dentro de si o verdadeiro sentido do cuidado e o genuíno interesse pelo outro. A proposta psicodramática como metodologia ativa no cenário da formação em Medicina evidencia a significativa importância de conduzir o aluno a transpor para a sua realidade prática conteúdos pertinentes às habilidades e competências indispensáveis ao desempenho de suas funções. Permitindo a passagem para o “como se”, torna-se possível testar outras escolhas, conduzindo o aluno a vislumbrar outros caminhos e treinar seu papel profissional. REFERÊNCIAS
DATNER, Y.B. Jogando e aprendendo a viver. In: MOTTA J.C. (org.). O jogo no Psicodrama. 2. ed. São Paulo: Ágora, 1995. p. 85-95. KAUFMAN, A. Teatro Pedagógico: bastidores da iniciação médica. São Paulo: Ágora, 1992. MARINEAU, R.F. Jacob Lévy Moreno 1889-1974: Pai do Psicodrama, da sociometria e da psicoterapia de grupo. Tradução J.S.M. Werneck. São Paulo: Ágora, 1992. p. 166. MORENO, J. L. (1975). Psicodrama. Tradução A. Cabral. São Paulo: Cultrix, 1975. ROMAÑA, M.A. Do psicodrama pedagógico à pedagogia do drama. Campinas: Papirus, 1996. RAMALHO C.M. Psicodrama e Dinâmica de grupo. Aracaju, 2010. p. 36. Disponível em: https://professorsauloalmeida.files.wordpress. com/2015/10/psicodrama-e-dinamica-de-grupo.pdf.Acesso em: 29 out. 2018. SOLIANI, M.L.C. Realização simbólica e realidade suplementar. In: MONTEIRO, R.F. (org.). Técnicas fundamentais do psicodrama. 2. ed. São Paulo: Ágora, 1998. p. 62. YOZO, R.Y. 100 jogos para grupos: uma abordagem gestáltica para empresas, escolas e clínicas. São Paulo: Ágora, 1996.
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Capítulo 9 APRENDIZAGEM BASEADA EM EQUIPES NA FORMAÇÃO MÉDICA Rosa Gouvêa de Sousa Rodrigo Chávez Penha RESUMO
A Aprendizagem baseada em equipes (ABE) ou Team basedlearning (TBL) é uma metodologia ativa que por meio de atividades lúdicas e em equipe potencializa o aprendizado. Ela é composta por etapas como: preparação, garantia da preparação (por meio de avaliação individual, em equipe e apelação) e aplicação de conceitos. Esta estratégia utiliza como recurso didático a proatividade, a interação e a colaboração em equipe. Isto promove o aprimoramento de competências cognitivas, pessoais e sociais. No âmbito da formação de profissionais médicos, tal alcance de competência é desejado e regulamentado em Diretrizes Nacionais. Espera-se que o egresso médico possua em seu repertório além de domínio técnico-científico, também criatividade, liderança e recursos para trabalho em equipe. A ABE promove ao longo da formação médica oportunidades de desenvolvimento de repertórios de competência adequados com as necessidades de saúde atuais.
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INTRODUÇÃO
As práticas educacionais no Ensino Superior com foco na formação de profissionais de saúde têm sido objeto de pesquisa e debates nacionais e internacionais (MELLO, 2014). O cotidiano do trabalho e o exercício crítico reflexivo para ajudar na resolução das necessidades sociais e de saúde colocaram em xeque o repertório de formação tradicional dos profissionais, centrados na biologia, hospital e em um único profissional (FRANCISCHINI, 2008). Neste exercício de repensar as práticas de ensino aprendizagem surgem inovações de modo a prover o estudante com repertórios axiológicos mais diversos e complexos do que os centrados na doença. Neste sentido, somam-se ao domínio científico-tecnológico demandas como criatividade, planejamento, avaliação, trabalho em equipe, compartilhamento e propositividade (MELLO, 2014). Este circuito de raciocínio passa a ser foco e metodologias pautadas na curiosidade epistemológica do estudante e no sociointeracionismo ganham força e marcam muitas das inovações. A aprendizagem baseada em equipes traz este arcabouço pedagógico e discute por meio da ludicidade e da interação entre pares a aprendizagem do profissional de saúde. As metodologias ativas pretendem dar dinamicidade a esta aprendizagem ao promover o enfoque ao sujeito e sua história. Neste sentido, a aprendizagem é vista de forma ontológica ao ensino. A relação entre eles não é casual ou algo a ser cindido (PAIVA, 2016). No contexto das metodologias ativas, o ensino não é algo restrito à habilidade de dar aulas e a aprendizagem e não é algo mecânico ou acrítico (PAIVA, 2016). A aposta nas metodologias ativas está na perspectiva destas ressignificarem a relação entre ensino, aprendizagem e o impacto deste no exercício do futuro profissional. Entende-se que a opção metodológica pode ter efeitos sobre a cosmovisão do estudante e sua relação com o mundo (BODERNAVE & PEREIRA, 1995). Destaca-se aqui algo de 134
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relevância para este capítulo: o uso de metodologias ativas e sua consequência para a formação do profissional médico. Ao se entender que o médico está inserido na equipe de trabalho dos estabelecimentos de saúde, torna-se imperioso a axiologia de seu desempenho. Para tanto, se tem como referência a Constituição de 1988 e as Diretrizes Curriculares do Ministério da Educação de 2014 (BRASIL, 2014), onde a competência médica passa a versar sobre atenção, gestão e educação em saúde, demandando um perfil de competência crítico e reflexivo. REVISÃO DE LITERATURA
O emprego de metodologias ativas perpassa não somente a educação superior como o percurso da educação da criança e do adolescente (BODERNAVE & PEREIRA, 1995). No âmbito do Ensino Superior, no entanto, as metodologias ativas ganham destaque, principalmente, ao se estudar a formação de profissionais para a área médica e da saúde (PAIVA, 2016). As operacionalizações comumente identificadas para uso destas propostas são potencialmente aplicáveis em variados cenários, o que em si, é um benefício importante frente à complexidade do trabalho em saúde (CARRARO, 2011). Outros benefícios identificados nas metodologias ativas foram: o estímulo à autonomia do estudante e ao trabalho em equipe, a aproximação e integração entre a teoria e a prática, e o exercício de um raciocínio crítico e reflexivo (CARRARO, 2011). Estes benefícios ganham dimensões importantes quando se entende o perfil de médico egresso, orientado pelo Ministério da Educação. De acordo com o artigo três das Diretrizes Curriculares Nacionais (DCNs) para cursos de graduação em medicina: o graduado em medicina terá formação geral, humanista, crítica, reflexiva e ética, com capacidade para atuar nos diferentes níveis de atenção à saúde, com ações de promoção, prevenção, recuperação e reabilitação, nos âmbitos individual e coletivo, com responsabilidade
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social e compromisso com a defesa da cidadania, da dignidade humana, da integralidade do ser humano e tendo como transversalidade em sua prática, sempre, a determinação social do processo de saúde e doença (BRASIL, 2014).
Este corolário que compõe o perfil do médico egresso determina que os currículos médicos tenham como orientação as práticas pedagógicas e que estas primem por irem além da formação restrita ao raciocínio técnico-científico. Em alguns trechos das DCNs fica evidente a ênfase em metodologias ativas demandadas pelo MEC para efetiva formação deste médico. No artigo 29, a integração entre teoria e prática é enfatizada e deve ser construída pela valorização do uso de experiências no cotidiano em serviço de saúde e de forma interprofissional (BRASIL, 2014). Além disso, a orientação do currículo deve ser feita com centralidade no estudante e nas necessidades sociais e de saúde do território no qual está inserido (BRASIL, 2014). No artigo 32, as DCNs descrevem como operacionalizar a proposta de formação, tendo as metodologias ativas como meio descrito para tal (BRASIL, 2014). No universo das metodologias ativas (MAs), pode-se enumerar uma série delas utilizadas na formação médica: socialização (CARRARO, 2011), aprendizagem baseada em problemas (GOMES, 2010), grupos tutoriais, de facilitação (GOMES, 2010), aprendizagem em times (GOMES, 2010), mesas redondas (PEDROSA, 2011), pedagogia da problematização (MARIN, 2010), Arco de Maguerez (MARIN, 2010), debates (PEDROSA, 2011), oficinas (PEDROSA, 2011), filmes (PEDROSA, 2011), dramatizações (PEDROSA, 2011), dinâmicas lúdico-pedagógicas, aprendizagem baseada em projetos, dentre outras. Neste capítulo, trataremos de uma proposta de MA cuja operacionalização reside no compartilhamento de ideias entre times para a superação de um desafio proposto (BODERNAVE & PEREIRA, 1995), denominada Team Based Learning (TBL), com tradução para o português por aprendizagem baseada em equipes (ABE) (ABED, 2018). 136
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Esta estratégia foi desenvolvida por Larry Michaelsen durante a década de 1970 para uso em cursos de graduação de administração (BOLLELA, 2014). Sua intencionalidade educacional estava em provocar a interação e a colaboração entre alunos para a conquista de uma dada meta (MICHAELSEN, 2008). Para tanto, o autor organizou uma estrutura metodológica dividida por etapas: preparação (preparation), garantia de preparo (readiness assurance) e aplicação de conceitos aplication of course). De acordo com a tradução das obras deste autor, as etapas ganham nomes diferentes, no entanto, este capítulo utilizará os termos descritos acima, pois, são os consagrados em literatura brasileira (KRUG, 2016). A equipe docente identifica o tema principal que permeia a unidade curricular ou a ementa, denominada por Michaelsen como macrounidade. A equipe docente produzirá tarefa a ser executada pelo estudante em um momento fora de sala de aula, anterior a esta (preparação). Esta tarefa geralmente tem como recurso a busca e leitura de artigos relacionados à macrounidade. Em sala de aula, a equipe docente propõe exercício avaliativo acerca do tema lido (garantia do preparo). Em um primeiro momento, a atividade é feita individualmente. Logo em seguida é feita em equipe, pequenos grupos, usualmente entre 05 a 07 estudantes. Há o compartilhamento de cada equipe para a turma e a devolutiva pelo docente. A terceira etapa, aplicação dos conceitos, demanda a resolução de problemas e tomadas de decisão pelas equipes discentes envolvidas, com possível uso em sua prática profissional e/ou acadêmica. Nesta oportunidade, há também a devolutiva do docente (KRUG, 2016) A ABE demanda planejamento da macrounidade a partir dos objetivos a serem alcançados pelo estudante ao final daquela unidade curricular. Para tanto, a equipe docente deve ter claro para qual uso o estudante utilizará aquele conhecimento, considerando o contexto real do profissional, as decisões que poderão ser feitas e suas consequências. Definidos estes objetivos, a equipe docente deverá levantar os conhecimentos e princípios que trarão suporte para a tomada de decisão e resolutividade que o estudante terá 137
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para realizar a atividade, ou seja, como o estudante converterá aquele conhecimento em aplicação na sua "práxis" de forma ética (KRUG, 2016). Como a ABE tem por intenção o alcance de níveis de raciocínio como análise, aplicação e avaliação (FERRAZ & BELHOT, 2010), quatro aspectos devem orientar a implementação desta estratégia: equipes permanentes, responsabilização dos estudantes pela qualidade alcançada, devolutiva imediata, oportuna e ênfase na aprendizagem tanto individual (quanto) em grupo (MICHAELSEN, 2008). Para tanto, a escolha da equipe deve ser intencional, evitando: disputas internas, omissões em participação, afinidades acadêmicas, sociodemográficas ou de experiências prévias. Para tanto, existem instrumentos e questionários que ajudam nessa escolha de composição de equipe (KRUG, 2016). DESCRIÇÃO DE EXPERIÊNCIAS
O curso de graduação em medicina do UNIPTAN - Centro Universitário Presidente Tancredo de Almeidas Neves teve início no ano de 2014. Seu currículo foi construído a partir das Diretrizes Curriculares de 2014. Com isso, a orientação de uso de metodologias ativas ao longo dos seis anos de formação do médico egresso é dada como base dessa construção. O uso da aprendizagem baseada em equipes foi uma opção da equipe de docentes que atuam no eixo de Medicina Geral de Família e Comunidade (MGFC), um dos quatro eixos existentes no currículo. A aprendizagem baseada em equipes é utilizada enquanto estratégia pedagógica ao longo deste eixo. Abordaremos neste capítulo a implementação desta metodologia ao longo dos dois primeiros anos, uma vez que a primeira turma está, neste momento, finalizando o sétimo período e já passaram pelos dois primeiros anos um total de cinco turmas. Os dois primeiros anos de formação do estudante são orientados no eixo de MGFC para abordagens em território, comunidade, família e pessoa. Algumas metodologias como aprendizagem base138
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ada em projetos, o recurso lúdico de filmes e reportagens, assim como, mesas redondas e problematização percorrem o conjunto de métodos didático-pedagógicos com os quais as equipes docentes trabalham. A aprendizagem baseada em equipes é uma importante metodologia ativa que possibilita o alcance de objetivos curriculares como: conhecer e interpretar os pontos fundamentais dos processos psicossociais da comunidade, das famílias e das pessoas; atuar em equipe e em redes de atenção à saúde; compreender, analisar e avaliar as tomadas de decisão à luz do HumanizaSUS; trabalhar com instrumentos/ferramentas da Estratégia de Saúde da Família (ESF); trabalhar a interdisciplinaridade e trabalho em equipe; reconhecer e realizar com maior profundidade o diagnóstico territorial, comunitário, familiar e individual definindo prioridades, propondo e implantando formas de planejamento sustentável. As tarefas organizadas para os estudantes versam sobre tópicos que norteiam as práticas em saúde na Estratégia de Saúde da Família. A bibliografia principal foi escolhida para possibilitar o estudo técnico-científico destas práticas. Ao longo dos dois anos, os estudantes, divididos em pequenos grupos, participam de ações nas unidades de Estratégia de Saúde da Família. Para tanto, exercícios de preparação, garantia do preparo e aplicação dos conceitos são propostos e revisitados de acordo com o deslocamento individual do estudante, do grupo e da turma. Isto possibilita uma perspectiva avaliativa dos estudantes que orienta a equipe docente no que concerne à profundidade que cada macrounidade ganha. FERRAMENTAS IMPORTANTES
O uso de ferramentas pode ajudar na implementação da ABE ao trazerem ludicidade e aprimoramento na apresentação das tarefas de preparação, garantia do preparo e aplicação dos conceitos. O docente, ao longo do percurso de aprendizagem dos estudantes se depara com algumas situações-problemas como: dificuldade em avaliar o que foi aprendido pelo estudante, pouco tempo para
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abordar cada estudante em suas singularidades, estudantes dispersos e pouco envolvidos e uso frequente dos smartphones na aula. Alguns estudos evidenciaram que a presença de tecnologias que promovem a interação entre docente e discente têm efeitos positivos sobre a aprendizagem de todos. Exemplo disto é o sistema EduClick que permite o uso de entrevistas ou pesquisas em tempo real durante exposição dialogada, possibilitando que o docente evidencie a participação dos estudantes e o aprendido. Para uso em aprendizagem baseada em equipes existem alguns programas atualmente. O Socrative, por exemplo, pode ser usado por telefones celulares no momento de coletar as respostas individuais dos estudantes. O docente escolhe o formato das perguntas e a forma de apresentação aos estudantes. O Poll Everywhere possibilita ao docente apresentar às equipes os resultados individuais e de equipe em várias formas de representação gráfica como a nuvem de palavras. O Mentimenter é gratuito e permite que o docente ao perguntar algo receba imediatamente comentários sobre essa questão. O InfuseLearning permite que os estudantes possam responder por meio de prompts e perguntas em formatos de múltipla escolha, verdadeiro ou falso, resposta curta, desenhos ou diagramas. Existem endereços eletrônicos de ajuda ao usuário que disponibilizam suporte no uso destes instrumentos tecnológicos (MARTYN, 2007). DESCRIÇÃO DA PRÁTICA
As tarefas da ABE são iniciadas pela escolha da equipe. Cada equipe é composta por cinco a sete pessoas, agrupados por diversidade de composição para evitar dificuldades na criação da grupalidade. O docente então indicará a forma de preparação individual a ser feita em momento anterior à aula. Tal etapa, conhecida como preparação, é fundamental para o sucesso da metodologia, uma vez que o exercício de colaboração em grupo depende do empenho de cada membro e a primeira etapa é um marcador importante disto. 140
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A avaliação da garantia de preparo é realizada individualmente (iRAT) e depois pela equipe (gRAT). Este momento tem por objetivo checar se cada membro do grupo se preparou para a atividade e avaliar a aprendizagem em grupo. O exercício consiste em responder sem consulta a materiais questões de múltipla escolha. Em um primeiro momento, cada estudante escolhe as respostas que pensa que estejam corretas e no segundo momento em grupo verifica e troca informações acerca das escolhas individuais e de grupo. O docente pontua as questões conforme os objetivos do exercício, podendo pontuar mais ou somente pontuar as opções corretas. Para cada questão existe uma devolutiva imediata e oportuna por parte do docente. A última etapa, aplicação dos conceitos, é a oportunidade que os estudantes têm de aplicar o que foi aprendido ao fazerem tomada de decisão e resolução de problemas e a oportunidade de avaliação do nível de aprendizado por parte do docente (MICHAELESEN, 2008). Esta etapa é a mais longa e pode ser revisitada até o alcance da intencionalidade educacional. Os quatro princípios de elaboração desta etapa são os 4 S's: a. Problema significativo; mesmo problema, escolha específica e relatos simultâneos. Com isso, as respostas são mostradas simultaneamente para cada questão de um mesmo problema. Cada equipe defenderá por meio de argumentações suas escolhas. O docente deve estimular as trocas e o aprofundamento de argumentos (BOLLELA, 2014). Conclui-se, então, uma macrounidade de ABE. A avaliação dos estudantes na ABE passa por momentos individuais e de equipe. Pode haver avaliação entre os pares para aumentar a responsabilização pelo alcance da pontuação. A ABE pode ser avaliada na perspectiva formativa e na somativa também (MICHAELSEN, 2008). O docente pode pactuar a porcentagem de pontos de cada etapa junto com os estudantes (BOLLELA, 2014).
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PONTOS POSITIVOS E NEGATIVOS DA PRÁTICA
A ABE possui potencialidades e fragilidades reconhecidas em literatura. Conhecer esta estratégia educacional é importante para a compreensão da oportunidade de uso e sua potência na aprendizagem dos estudantes. São alguns pontos favoráveis à ABE: é uma metodologia ativa que possibilita a partir de um mediador a interação intra e entre grupos; estimula a autonomia e responsabilização dos estudantes e a aprendizagem por sociointeração; os estudantes desenvolvem através de trabalho em equipe aprendizagens relacionais e de colaboração; produz avaliativa em tempo imediato para o professor o que facilita o desenvolvimento da aula (BOLLELA, 2014). Como fragilidades ou cuidados na implementação da ABE têm-se de conforme a literatura (CUNHA, 2017): necessidade de qualificação do docente na ABE pois, muitos fazem sem domínio da estratégia; uso de exercícios acerca de conhecimentos descontextualizados da prática, ausência do contrato didático para convívio no grupo (LIMA, 2016). CONCLUSÃO
A Aprendizagem baseada em equipes é uma metodologia ativa, composta por etapas de preparação, garantia da preparação e aplicação de conceitos. Esta estratégia utiliza como recurso didático a proatividade, a interação e a colaboração em equipe. Isto promove o aprimoramento de competências cognitivas, pessoais e sociais. No âmbito da formação de profissionais médicos, tal alcance de competência é desejado e regulamentado em Diretrizes Nacionais. Espera-se que o egresso médico possua em seu repertório além de domínio técnico-científico, também criatividade, liderança e recursos para trabalho em equipe. A ABE promove oportunidades de aprendizagem em consonância com os objetivos das DCNs e é metodologia ativa com aplicação potente para o alcance das competências desejadas para o egresso médico.
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REFERÊNCIAS
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Capítulo 10 JOGOS EDUCACIONAIS Marcel Abrão Michel Calil Abrão Neto RESUMO
Este capítulo tem como objetivo apresentar os jogos educacionais como metodologias ativas de ensino que podem ser usados visando atrair o aluno e despertar um maior interesse por determinado conhecimento, auxiliar na introdução de temas considerados complexos, como também na revisão de temas já abordados em sala de aula. As brincadeiras infantis, jogos lúdicos e atividades em grupo são frequentemente utilizadas como ferramentas para o auxílio de dinâmicas de grupo, em que o principal objetivo é a socialização e o estreitamento das relações nesse curto espaço de tempo que poderá ser fundamental para o convívio de um grupo de pessoas. O uso de momentos de descontração associado a testes de conhecimento permite que os alunos desconstruam a relação de estudo e tédio, fazendo com que uma atividade em sala de aula passe a ter uma relação de prazer diretamente associada. A mistura entre ensino e diversão comumente apresentam bons resultados, estimulando alunos com bom desempenho a permanecerem ativos na disciplina como também ajuda no resgate de alunos que apresentam uma incerteza sobre sua capacidade de assimilar as informações já apresentadas.
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INTRODUÇÃO
Novos modelos de ensino estão sendo discutidos com maior entusiasmo por parte da comunidade científica, visto que há um consenso de que as gerações atuais apresentam a cada dia uma maior dificuldade em se enquadrar no ensino “tradicional” de aulas expositivas, e que as metodologias que buscam trazer o aluno para o centro do aprendizado apresentam melhores resultados quando avaliamos a absorção do conhecimento por parte dos alunos. Com a evolução tecnológica é compreensível que as salas de aula de 50 anos atrás sejam diferentes das atuais e que as demandas dos alunos acompanhem essas mudanças. A substituição de uma metodologia por outra, muitas vezes tem o objetivo de torná-la mais atrativa ao aluno, porém devemos ter o cuidado para não associarmos exclusivamente esse aspecto à necessidade de inovações tecnológicas. Uma vez que estamos abordando um público alvo diariamente envolvido por dispositivos tecnológicos como smartphones, tablets e notebooks se torna natural imaginarmos que esse tipo de ferramenta deveria ser incluída no planejamento. Esse engano é facilmente corrigido quando mergulhamos a fundo nos conceitos principais das metodologias ativas de ensino, em que os jogos educacionais se enquadram facilmente e nem sempre a tecnologia se faz presente. O fato de envolver um dispositivo tecnológico pode sim auxiliar em algumas dinâmicas, mas não necessariamente irá transformá-la em ativa. (DIESEL et al., 2017). Os jogos educacionais são modelos de atividades em que se procura envolver os alunos em dinâmicas de grupo ou individuais visando eliminar a percepção de uma atividade tediosa, cansativa e desmotivante. O professor/tutor tem a capacidade de utilizar a dinâmica de um jogo para introduzir um conteúdo de uma disciplina ou simplesmente revisá-lo em um momento oportuno. Lançar mão de atividades lúdicas que façam o aluno remeter-se a brincadeiras de infância, utilizar jogos de estratégia ou de perguntas e respostas estimulam uma competição entre os participantes. A imaginação
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está ao nosso lado quando tratamos de jogos educacionais, pois como o objetivo da dinâmica é atrair a atenção dos alunos e fazer com que eles não percam o interesse durante a atividade, o professor deve planejar suas ações para manter a intensidade do jogo. (QUIRINO et al., 2017; SILVA et al., 2017) O sucesso de uma dinâmica está diretamente relacionado com a organização e orientação prévia dos alunos. O jogo que será apresentado deve ser previamente revisado e avaliado sobre a facilidade de compreensão das regras e distribuição dos pontos aos participantes. Esse se trata de um ponto chave para que não ocorram interrupções frequentes, atrapalhando o andamento e a dinâmica da atividade. Outro fator a ser analisado é o nível de conhecimento que os alunos apresentam, bem como, o que se espera que os alunos atinjam após a participação na atividade, para que não seja um jogo muito mais de diversão do que de aquisição de conhecimento da disciplina. Esse questionamento deve ser feito constantemente pelo professor, caso contrário, os objetivos podem não ser alcançados, frustrando tanto o orientador quanto os alunos. (DOMINGOS & RECENA, 2010; LOZZA & RINALDI, 2017) A seguir, iremos apresentar duas propostas de jogos educacionais que são utilizados no Centro Universitário Presidente Tancredo de Almeida Neves (UNIPTAN). A aceitação dos alunos e os resultados observados pelos professores são significativos ao avaliar a evolução dos alunos nas disciplinas. DESAFIO ÀS CEGAS
O jogo educacional “Desafio às Cegas” é uma atividade desenvolvida no curso de odontologia do UNIPTAN, mais especificamente na disciplina de Anatomia Dental. O nome “às cegas” se deve ao fato da atividade ser realizada sem o contato visual entre os integrantes de um mesmo grupo. Os participantes devem ser capazes de identificar estruturas dentárias corretamente e transmitir a informação para outro participante utilizando apenas descrições 147
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verbais, sem auxílio de recursos visuais. O outro participante deve compreender a mensagem e exemplificar, por meio de um desenho, a informação recebida. A atividade consiste em um jogo no qual os alunos participantes trabalham em equipe para alcançarem a resposta correta. Modo de jogar:
A sala deve ser dividida em dois ou mais grupos e a cada rodada as duplas devem representar seus respectivos grupos alternadamente. A quantidade de participantes sugerida para cada grupo é de 10 alunos, formando, dessa maneira, 5 duplas em cada grupo. Duas cadeiras devem ser posicionadas, uma mais à frente e a outra no fundo da sala. As cadeiras devem permanecer, de tal forma que os alunos permaneçam de costas um para o outro. A cada rodada uma nova dupla ocupa as cadeiras de forma alternada entre os grupos até que todos os alunos participem. O aluno ocupante da cadeira no fundo da sala (A1) recebe uma imagem colorida e deve transmitir as informações para a sua dupla de maneira verbal, utilizando apenas termos técnicos relacionados à temática da atividade. O aluno ocupante da cadeira a frente da sala (A2) estará de posse da mesma imagem, porém, sem cores. Esse aluno (A2) deve ser capaz de colorir a imagem seguindo as orientações recebidas do aluno A1. Ao final, os desenhos devem ser comparados pelo professor e a pontuação analisada. Para cada estrutura identificada corretamente é concedido 01 ponto. A pontuação alcançada pela dupla é destinada ao somatório geral da respectiva equipe. Ao final da atividade, vence a equipe que atingir o maior número de pontos. Os desenhos devem ser escolhidos pelo professor conforme a temática da atividade e a necessidade de treinamento da nomenclatura. O exemplo que iremos apresentar é, frequentemente, utilizado na disciplina de Anatomia Dental, no curso de Odontolo148
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gia. O professor fornece ao aluno A1 o desenho de um dente que apresenta uma ou mais estruturas coloridas (figura 1), e fornece ao aluno A2 o mesmo desenho, porém, sem cores (figura 2). Figura 1: Face oclusal do 1º molar superior direito, com a vertente triturante mesial da cúspide disto vestibular evidenciada (TEIXEIRA et al., 2008). Figura 2: Face oclusal do 1º molar superior direito sem evidenciação (TEIXEIRA et al., 2008).
O aluno portador do desenho colorido (A1) deve ser capaz de descrever a estrutura pintada utilizando apenas as terminologias técnicas pertinentes à disciplina. Já o aluno portador do desenho sem cores (A2) deve ser capaz de reproduzir a pintura conforme apresentada no desenho da sua dupla. Exemplo abaixo de como transmitir a informação da figura 1 de maneira correta através de nomenclatura científica: O aluno A1 deverá falar: - O aluno A2 deverá colorir de cinza a vertente triturante mesial da cúspide disto vestibular. O jogo pedagógico Desafio às Cegas coloca o aluno em uma situação de limitação de sentidos, em que ele se vê obrigado a trabalhar apenas de forma verbal e ainda tendo que respeitar as regras de utilizar apenas a nomenclatura técnica. A atividade simula uma comunicação entre profissionais, sendo necessário transmitir uma informação de maneira extremamente precisa, pois, a tomada 149
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de decisão do aluno A2 está diretamente relacionada com a informação transmitida e o seu conhecimento sobre o tema. Ambos os alunos devem estar atentos e capacitados para a atividade, pois, se a informação passada ocorrer de maneira equivocada, o aluno A2 não terá êxito na atividade. Caso o aluno A1 passe a informação correta e o aluno A2 não tenha o total domínio sobre a anatomia (exemplo de nomenclatura anatômica: aresta transversal, aresta longitudinal, crista marginal, cúspide, fosseta, sulco principal, sulco secundário, tubérculo de carabelli, vertente lisa, vertente triturante) ou sobre a nomenclatura de orientação (exemplo de nomenclatura de orientação para: mesial, distal, vestibular, palatino, oclusal), o raciocínio da dupla não será concluído de forma correta e o aluno A2 não conseguirá finalizar a atividade. Este jogo tem como objetivo final estimular a compreensão dos alunos sobre a importância em dominar a anatomia e a nomenclatura de orientação já que ela será cobrada em sua rotina profissional no mercado de trabalho. Em uma conversa entre profissionais, cartas de encaminhamento e registros no prontuário clínico são exemplos de momentos em que o profissional utiliza seus conhecimentos para uma descrição detalhada. Caso a descrição seja feita de forma equivocada, poderá em algumas situações, resultar em prejuízos irreparáveis aos seus pacientes. QUIZ INTERATIVO
Uma proposta de jogo pedagógico muito utilizada nos cursos de graduação no UNIPTAN, e que sempre é muito bem recebida pelos alunos, é a competição individual de perguntas e respostas, onde o aluno é confrontado sobre temas já abordados em sala de aula. Esse tipo de atividade evidencia o domínio que o aluno apresenta sobre o tema proposto e promove uma comparação direta com seus colegas de sala. O jogo é extremamente interativo e utiliza uma ferramenta tecnológica para o seu desenvolvimento, aguçando a curiosidade e o interesse de quem participa. Podemos 150
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apontar dois elementos-chave incorporados a essa proposta que transformam o estudo em uma verdadeira disputa para definir quem sabe mais e quem conclui suas respostas mais rapidamente. A cada rodada de perguntas as respostas são reveladas simultaneamente e a atualização do ranking de posições é atualizada para os alunos, o que normalmente reflete em concentração do início ao final do jogo. A plataforma online utilizada para a dinâmica proposta é o Kahoot, uma plataforma de jogos interativos onde o professor pode preparar sua atividade de maneira gratuita através do site www. kahoot.com e realizar a aplicação online durante a sala de aula. Uma importante informação para quem optar em utilizar a ferramenta é estar atento para alguns detalhes: os alunos devem ter acesso a uma internet com boa velocidade, de preferência em uma rede wifi, pois como são muitos alunos utilizando a rede simultaneamente a atividade poderá ficar comprometida caso algum aluno seja desconectado ou seu jogo simplesmente pare de funcionar. Além do acesso à internet os alunos devem utilizar computadores, tablets ou smartphones durante a atividade, sempre realizando a conferência prévia da quantidade de bateria dos equipamentos para que não aconteça nenhuma falha durante o jogo. Inicialmente, o professor deve realizar o cadastro no site e definir quais serão as questões solicitadas para atividade (sugestão de quantidade: de 35 a 40 questões para uma atividade de 1h30). Durante a elaboração das questões o professor deve ter o cuidado para equilibrar a atividade com questões de diferentes níveis de dificuldade, contemplando questões de caráter fácil, médio e difícil (sugestão de porcentagem: 40%, 30% e 30%, respectivamente). No momento da atividade os alunos devem ser orientados sobre as regras do jogo de maneira que todas as dúvidas sejam esclarecidas antes do início da dinâmica, para que não haja interrupções, atrapalhando o andamento da atividade. Após as devidas orientações, os alunos devem entrar na “sala online” se identificando para o ranqueamento dos pontos. 151
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O jogo é extremamente dinâmico e a competitividade entre os alunos aumenta a cada questão respondida. As questões são cronometradas e os alunos devem estar atentos para cada questão projetada, pois quanto mais rápida for a resposta, mais pontos o aluno contabiliza. O enunciado e as alternativas são projetados em uma tela principal (figura 03) e o aluno deve responder em uma tela individual (figura 04), que está aparecendo em seu dispositivo pessoal. A cada questão respondida é projetada a quantidade de alunos que escolheram cada uma das alternativas (figura 05). Essa ferramenta é extremamente valiosa e deve ser explorada com bastante atenção pelo professor durante a atividade. Como as disposições gerais das respostas são projetadas, é possível identificar se existe um consenso de resposta ou se a turma se apresenta dividida. Por meio dessa análise o professor consegue identificar se existe algum conceito que necessita ser abordado novamente e possibilita, em tempo real, a identificação das maiores dificuldades dos alunos. Após a análise de tendência de respostas o professor projeta a pontuação dos participantes no scoreboard (figura 06). Dessa forma, a competição vai ficando mais evidente a cada resposta certa que o aluno realiza e identifica seu nome ultrapassando os colegas de turma no ranking. Ao final da atividade, o professor projeta um ranking dos 3 alunos que obtiveram a pontuação mais alta, o que simula a ideia de um pódio. Nesse momento, o professor pode aproveitar para valorizar os alunos que apresentaram o melhor resultado visando estimular que continuem buscando seu crescimento na disciplina e que os outros alunos almejem um resultado melhor em atividades futuras, para também receberem esse reconhecimento. O jogo pedagógico de perguntas e respostas é sempre uma ferramenta interessante para modificar a dinâmica da sala de aula e o espírito de competição é facilmente estimulado nos alunos. O fato do tempo das respostas ser computado como fator decisivo na pontuação faz com que haja pontuações diferentes para as mesmas respostas. Ainda que todos os alunos acertem a resposta, essa 152
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regra torna a dinâmica mais interessante, pois, constantemente, o ranking de posições sofre alterações. Caso contrário, alguns alunos poderiam se apresentar desmotivados por não identificarem a possibilidade de subir de posição. Figura 3: Kahoot – Tela principal com enunciado e alternativas. Figura 4: Kahoot – Tela individual de respostas. Figura 5: Kahoot – Tela com a quantidade de alunos que escolheram cada alternativa. Figura 6: Kahoot – Tela com o ranqueamento dos alunos.
É comum, no decorrer de um curso de graduação, que alguns alunos apresentem uma desmotivação quando se deparam com jogos de competição que dependem exclusivamente deles, sem o apoio de uma equipe. Na maioria das vezes, essa situação ocorre em períodos mais avançados, onde os próprios alunos já sinalizam quem eles acreditam que serão os vencedores, pois consideramnos os “melhores” alunos da sala. Ao analisar esse cenário, seria esperado que os alunos com baixo rendimento se espelhassem nos alunos com alto rendimento, visando sua melhora na disciplina, porém, isso dificilmente acontece sem uma intervenção docente. A postura do professor nesse momento é importante para manter
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o nível motivacional da turma, e incentivar algum aluno que possa demonstrar certo desinteresse. Em atividades com esse nível de dinâmica, o inesperado pode acontecer, pois, a velocidade que o aluno realiza as respostas influencia na quantidade de pontos que ele recebe. CONSIDERAÇÕES FINAIS
A dúvida sobre qual jogo educacional o professor deve utilizar em sala de aula é muito comum quando começamos a conhecer as diversas dinâmicas existentes. A escolha deve ser feita de maneira criteriosa, levando em consideração o perfil dos alunos que participarão da atividade e o objetivo que o professor almeja com a realização da dinâmica. A escolha do melhor momento para desenvolver o jogo passa pela análise do objetivo da atividade, pois é possível trabalhar com jogos que auxiliam a introdução de um novo conceito, assim como, a revisão de um conceito já abordado previamente em sala de aula. O que podemos perceber é que, de fato, um aspecto fundamental em uma dinâmica envolvendo jogos pedagógicos são as explicações iniciais da atividade, em que o aluno é condicionado e apresentado a todas as regras, evitando interrupções desnecessárias. REFERÊNCIAS
DIESEL, A.B.; ALDA, L.S.; MARTINS, S.N. Active teaching methodologies principles: a theoretical approach. Revista Thema, v. 14, n. 1, p. 268288, 2017. DOMINGOS, D.C.A.; RECENA, M.C.P. Elaboração de jogos didáticos no processo de ensino e aprendizagem de química: a construção do conhecimento. Revista Ciências e Cognição, vol. 15 (1): 272-281, 2010. LOZZA, R.; RINALDI, G.P. O uso dos jogos para a aprendizagem no ensino superior. Programa de Apoio à Iniciação Científica – PAIC, v. 18, n. 1, 2017. QUIRINO, T.M.F.; CAMPOS, C.C.V.; OSHIMA, R.M.S. O Uso de Jogos no Ensino Superior Como Estratégia Pedagógica. Revista Tecnologias na Educação, v. 22. Edição Temática VI. II Simpósio Nacional de Tecnologias Digitais na Educação (II-SNTDE).
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SILVA, C.; PIRES, G.C.; SILVA, G.T.; ALMEIDA, D.; TEIXEIRA, G.; ALMEIDA, I. Jogo educativo como estratégia didático pedagógica em um curso de graduação em enfermagem: um relato de experiência. Investigação Qualitativa em Saúde, v. 2, 2017. TEIXEIRA L.M.S.; REHER P.; REHER V.G.S. Anatomia aplicada à odontologia. 2ª ed. Rio de Janeiro: Guanabara Koogan, 2008.
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Capítulo 11 O USO DA SALA DE AULA INVERTIDA NAS PRÁTICAS LABORATORIAIS Michel Calil Abrão Neto Marcel Abrão RESUMO
As práticas laboratoriais consistem em uma importante metodologia de ensino e tornam-se fundamentais em cursos como a odontologia, por exemplo, com o objetivo de ampliar o desenvolvimento cognitivo do aluno através do aprimoramento das suas habilidades manuais. A destreza manual e o tato fino são habilidades que demandam treinamento, tempo e dedicação para atingirem níveis de excelência e, consequentemente, bons resultados clínicos. O treinamento laboratorial realizado previamente ao aluno iniciar os atendimentos aos pacientes, além da melhora na precisão da técnica, garante uma segurança maior para a realização do procedimento. Quando associamos as atividades laboratoriais com a metodologia de ensino baseada na sala de aula invertida, possibilitamos ao aluno um desenvolvimento maior do seu senso crítico e, consequentemente, uma evolução mais rápida da sua capacidade de discernimento dentre as técnicas mais adequadas para cada situação. Descreveremos a seguir alguns exemplos de práticas laboratoriais associadas ao uso da sala de aula invertida que tem demonstrado bons resultados e excelente aceitação pelos alunos. 157
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SALA DE AULA INVERTIDA
A metodologia da sala de aula invertida representa a tradução da terminologia na língua inglesa batizada como flipped classroom. Apesar de o seu formato ter sido esboçado no final da década de 90, esse método ganhou representatividade a partir do trabalho de Bergmann e Sams (2012), dois professores do departamento de química da Woodland Park High School, uma instituição de ensino em uma cidade do interior do Colorado/USA. Eles observaram que muitos de seus alunos eram esportistas e participavam de jogos estudantis com frequência em outras cidades não tão próximas, o que implicava em horas de percurso de ônibus na maioria das vezes. A consequência disso era que muitos desses alunos acabavam se ausentando de uma quantidade considerável de aulas, o que refletia diretamente no entendimento e acompanhamento da disciplina. Eles desenvolveram então vídeo aulas e passaram a divulgar na internet para que os alunos tivessem acesso àquelas aulas perdidas e não ficassem em defasagem com relação ao restante da turma. A repercussão foi muito maior do que eles imaginavam, e pessoas do mundo inteiro se manifestaram positivamente para aquele material. Em um determinado momento, Aaron Sams teve a percepção de que a verdadeira situação em que os alunos precisavam dele dentro da sala de aula era quando eles apresentavam dúvidas e precisavam da sua ajuda para explicitar algum conceito que havia ficado não muito bem definido. A partir daí começava a surgir a ideia de transferir o material básico para o aluno de forma prévia, para que a sala de aula se tornasse um local voltado para discussões de conceitos e esclarecimento de dúvidas, deixando de ser a principal fonte de informação. (BERGMANN & SAMS, 2012). O conceito da sala de aula invertida está fundamentado no aluno como construtor do conhecimento. O princípio dessa metodologia de ensino é que o aluno seja submetido a um contato prévio da temática proposta, buscando o conhecimento de forma ativa e desenvolvendo a sua análise sobre o tema. Esse tipo de 158
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proposta potencializa a formação crítica do estudante e estimula o surgimento de dúvidas e questionamentos (PEREIRA & SILVA, 2018). Quando a atividade é finalmente conduzida dentro da sala de aula, não cabe mais ao professor a tentativa de transferir o conhecimento para o aluno, mas sim, esclarecer as dúvidas que possam ter surgido e lapidar os conceitos que por ventura tenham sido interpretados de maneira equivocada. Além disso, o orientador tem a possibilidade de estimular discussões entre os integrantes da atividade, já que cada aluno pode ter interpretado o material conforme o seu entendimento, o que possibilita que eles visualizem o mesmo cenário em pontos de vista diferentes e aprimorem o senso crítico (VALENTE, 2014). Cada aluno tem um ritmo próprio de raciocínio e capacidade de compreensão. Quando a aula é apresentada de forma virtual e gravada, o estudante tem a possibilidade de conduzir o estudo no seu ritmo, interrompendo e repetindo as partes que identificar maiores dificuldades, trabalhando assim com uma aula personalizada para o seu perfil (NANCE et al., 2009). Ao analisarmos esse tipo de método, inicialmente podemos ter uma falsa impressão de que a sala de aula invertida se resume na realização extraclasse daquilo que o aluno faria em sala de aula e a finalização do seu dever de casa junto ao professor em sala, ou até mesmo concluirmos de forma equivocada que esse tipo de atividade seria uma maneira do professor trabalhar menos e transferir a responsabilidade para o aluno. De fato, o aluno passa a ser corresponsável pela construção do seu conhecimento, porém isso não diminui a importância do orientador e tão pouco torna esse trabalho uma tarefa fácil. Na verdade o professor tem a opção de customizar a aula de acordo com a necessidade dos alunos, tornando a aula mais dinâmica e atrativa, o que demanda mais planejamento e organização por parte do orientador para que a atividade alcance os objetivos almejados (KELLESARIAN, 2018). Esse tipo de metodologia exige a participação ativa tanto do corpo docente quanto dos alunos. É fundamental que o estudante aprenda a administrar seu tempo de estudo para potencializar 159
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seu desempenho em sala de aula. Em geral, os jovens atuais estão acostumados a utilizarem ferramentas tecnológicas, porém poucas vezes elas são direcionadas para o benefício acadêmico (BARBOSA et al., 2015). Na sala de aula invertida, além de incorporarmos o cotidiano tecnológico dos alunos aos estudos, estamos estimulando sua pró-atividade pela busca do conhecimento. O aluno passa a entender que a sua dedicação reflete diretamente no seu desempenho e resultados, por isso, é fundamental o papel do professor no incentivo às trocas de opiniões dentro de sala entre os colegas, o que desenvolve muitas vezes uma relação de cooperação entre eles (VALENTE, 2014). Uma grande vantagem que podemos observar é o tempo ganho em sala de aula para discussões e aprimoramento dos conceitos, otimizando um tempo precioso que seria despendido para explicação básica do assunto. O professor deve ser capaz de observar qual foi o nível de entendimento dos alunos referente ao material fornecido previamente, para que a atividade possa resultar no objetivo esperado. Os minutos iniciais da aula devem ser direcionados para essa finalidade, para que a partir daí o orientador consiga captar qual foi a capacidade de assimilação do conteúdo e se algum ponto necessita de uma discussão maior (BERGMANN & SAMS, 2012). Uma atividade de ensino que vem sendo aplicada em associação com a sala de aula invertida é o treinamento prático laboratorial. Uma boa parcela de cursos do ensino superior tem por característica a execução de procedimentos clínicos e laboratoriais que visam, na maioria das vezes, o preparo do aluno para a rotina prática da sua profissão, ou que por vezes tem a ideia de demonstração prática dos conceitos teóricos com a finalidade de fundamentação de uma determinada teoria (KELLESARIAN, 2018). Ao associarmos as duas práticas metodológicas de ensino, atividades práticas laboratoriais e sala de aula invertida, conseguimos potencializar os resultados dentro dos laboratórios principalmente pelo aumento no tempo de treinamento prático do aluno e na pos160
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sibilidade de realização de procedimentos mais complexos, visto que o aluno já é capaz de compreender o conceito fundamental que foi adquirido previamente através do material fornecido pelo professor. Além disso, o aluno tem a possibilidade de identificar previamente os pontos que precisam ser mais bem assimilados e esclarecidos durante a execução da atividade, refletindo em um aproveitamento melhor e um estudo direcionado para as necessidades de cada um (AZEVEDO, 2015). O PREPARO DAS AULAS
O aspecto fundamental está na produção de um material para disponibilização online e no planejamento de atividades que serão realizadas em sala de aula. Podemos apontar alguns detalhes que auxiliam no preparo desse tipo de material: Produção dos vídeos – Alguns aplicativos disponíveis atualmente são ferramentas excelentes para auxiliar nessa produção. O Camtasia Studio, por exemplo, é um aplicativo capaz de capturar em vídeo as imagens que aparecem na tela do computador e ainda incluir o recurso de áudio simultaneamente. O professor pode compartilhar uma aula aos seus alunos como se estivesse ministrando diretamente do seu computador. Outro aplicativo muito utilizado é o Edpuzzle que permite uma função de compilação de vídeos, onde é possível reunir um conjunto de arquivos de vídeos recortando apenas a parte que interessa em cada um deles. Permite ainda que o professor acrescente um áudio com a sua fala em algum momento que identificar necessário para comentar algum item importante ou estimular uma reflexão durante a aula. Conteúdo do vídeo – Um aspecto importante é utilizar apenas uma temática por vídeo, devendo este ser claro e objetivo. Vídeos que apresentam temas variados podem gerar uma dificuldade na compreensão do aluno. Tempo de duração do vídeo – Vídeos extremamente longos dificilmente são capazes de prender a atenção do aluno durante todo o
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tempo. Uma sugestão é o desenvolvimento de vídeos com duração em torno de 10 a 15 minutos. Quantidade de vídeos – É comum quando identificado êxito em alguma atividade, tentarmos incorporar cada vez mais esse recurso na rotina da disciplina. Nesse item cabe uma ressalva, pois o professor deve estar atento para não exagerar na quantidade de vídeos. O resultado disso pode acabar sendo uma sobrecarga de material extraclasse e possivelmente um desinteresse dos alunos. AS PRÁTICAS LABORATORIAIS
Em cursos da área da saúde, as atividades de treinamento laboratorial são essenciais, pois são elas que simulam a realidade dos atendimentos e promovem ao aluno a oportunidade de reprodução da teoria inerente a cada situação. A realização dos primeiros atendimentos a pacientes é motivo de extrema ansiedade e insegurança para os alunos, e, por esse motivo, as atividades de simulação de procedimentos em laboratório são tão importantes. (SEBOLD et. al, 2017) Ao longo dos anos fomos aprimorando essas atividades e percebemos que um ponto fundamental que representava um melhor rendimento do aluno na prática era exatamente o domínio da teoria antes do treinamento prático. Aprender fazendo é importante, porém, saber o motivo de estar fazendo é o que difere um cirurgião de um operador. Ter a capacidade de resolver uma intercorrência ou definir uma conduta perante uma variação da normalidade é tarefa destinada àqueles que dominam teorias e conceitos. Apresentamos a seguir duas disciplinas do curso de odontologia que apresentam diversas práticas laboratoriais e que são potencializadas quando associadas ao uso da sala de aula invertida. Disciplina de Anatomia Dental – Representa um dos primeiros contatos do aluno com o manuseio dos instrumentais e das práticas laboratoriais. É uma disciplina que possibilita, além do estudo da anatomia dental, o início do desenvolvimento das habilidades
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manuais. Durante a disciplina o aluno estuda as características de cada tipo de dente e promove esculturas dentárias em cera, seguindo padrões e escalas representativas dos dentes humanos. A rotina da disciplina na nossa instituição era a distribuição de um roteiro prático que apresentava as diretrizes e o passo a passo do procedimento no início da aula, para que ao final o aluno fosse capaz de reproduzir um dente em cera com as características de um dente real. Os alunos assistiam aulas teóricas previamente a atividade, porém observamos uma grande diferença na qualidade dos trabalhos apresentados quando passamos a fornecer também um conteúdo demonstrativo prévio. O professor realizava uma vídeo aula com todos os passos para a execução da escultura do dente, que seria o tema da aula seguinte, e disponibilizava na internet para que os alunos pudessem compreender a forma correta de execução de cada etapa. Um recurso muito utilizado para essa finalidade são os aplicativos de produção e reprodução de vídeos online, como o Edpuzzle, por exemplo. Esse tipo de material possibilita que o aluno assista ao conteúdo quantas vezes achar necessário, além de permitir que cada um concentre sua atenção nas etapas que considerem de maior dificuldade, tornando o estudo mais produtivo e personalizado. Observamos que os alunos passaram a se dedicar mais nas atividades extraclasse, inclusive utilizando as vídeo aulas como guia para o treinamento de esculturas em casa, o que representou em uma melhora significativa da qualidade dos trabalhos apresentados pelos alunos. Disciplina de Cirurgia I – Por tratar-se de uma disciplina que tem por característica representar a iniciação do aluno nas práticas cirúrgicas da odontologia, costumamos trabalhar com diversas atividades práticas nas aulas que antecedem o início dos atendimentos clínicos. Uma dessas atividades é o treinamento das práticas de sutura que pode ser realizada em diversos tipos de materiais como espumas densas, tecidos e até alguns tipos de frutas com cascas grossas e finas. O uso de diferentes tipos de materiais permite o treinamento em texturas e durezas diferen-
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tes, resultando em um aprimoramento da sensibilidade do aluno. Desenvolvemos alguns vídeos demonstrativos que simulam as técnicas de sutura e orientam cada passo que o aluno deve executar para que obtenha êxito no procedimento. Dessa forma, além de simular a técnica, conseguimos demonstrar a forma correta de empunhadura de cada instrumento, diminuindo consideravelmente os hábitos incorretos que os alunos geralmente adquirem no início das práticas em laboratório. Após a instituição da sala de aula invertida nas práticas de sutura, observamos que, além da qualidade dos procedimentos terem melhorado, os alunos passaram a realizar uma quantidade maior de técnicas diferentes durante a aula quando comparados aos alunos que não recebiam o material prévio, demonstrando como foi significativa a associação das duas metodologias de ensino. Outra atividade aplicada é o treinamento de técnicas cirúrgicas em mandíbula de porco e língua de boi, onde conseguimos representar de maneira muito similar as técnicas de exodontias, incisões, retalhos e síntese dos tecidos. Nos procedimentos cirúrgicos alguns detalhes são fundamentais para a execução correta da técnica e manipulação adequada dos tecidos, como, por exemplo, o posicionamento ideal e preciso dos instrumentos. A angulação incorreta de uma lâmina de bisturi pode comprometer o desenho do retalho e interferir diretamente no processo de cicatrização tecidual. Quando fornecemos algum material prévio ao aluno conseguimos demonstrar com mais clareza o que significa dizer que a lâmina de bisturi deve ser apoiada perpendicularmente aos tecidos no início e término da incisão, por exemplo, ou ainda que os alunos tenham a capacidade de compreender o que é um afastamento tecidual adequado quando a teoria preconiza que uma tensão excessiva seria capaz de lacerar o retalho. A visualização de um conceito teórico na prática, muitas vezes, torna-se um facilitador na compreensão e no processo de aprendizagem do aluno. Atualmente, existem alguns modelos fabricados para o treinamento das práticas cirúrgicas odontológicas, porém apresentam 164
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custos elevados, o que torna impraticável sua aplicação na rotina prática da disciplina. Os materiais alternativos sugeridos representam uma excelente forma de adaptação à realidade da economia do Brasil e são materiais que os alunos conseguem adquirir com facilidade. Observamos muitas vezes que eles se sentem motivados a adquirirem os materiais e continuarem os treinamentos fora de sala de aula acompanhando o conteúdo didático fornecido pelos professores. O estudo teórico realizado previamente ao treinamento prático contribui não só para a fundamentação do procedimento, mas também para a fixação do conhecimento. A possibilidade de obtenção das próprias experiências, através da tentativa e erro, proporciona ao aluno uma capacidade maior de correlação entre a teoria e a prática, tornando o aluno mais preparado para o enfrentamento dos desafios acerca de um plano de tratamento adequado. O professor deve utilizar a criatividade e propor atividades que despertem, não só o interesse do aluno, mas também suas habilidades manuais. A metodologia apresentada pode ser adaptada para todo tipo de prática laboratorial, seja para cursos da área da saúde ou cursos de outras áreas que demandem treinamento prático. A SALA DE AULA INVERTIDA É O MELHOR MÉTODO DE ENSINO?
Talvez a pergunta adequada fosse: A sala de aula invertida é o melhor método para os meus alunos? Esse é um tipo de pergunta que só o professor conseguirá responder. Cada grupo de alunos representa um perfil e necessidades diferentes, por isso, não podemos entender como verdade absoluta o sucesso de uma atividade aplicada em apenas um grupo específico de alunos. O elemento chave para conseguirmos melhores resultados dentro da sala de aula talvez esteja na capacidade do professor em dominar diferentes metodologias de ensino. O professor deve estar atento para identificar o perfil de cada grupo de alunos e avaliar
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inclusive qual é o método mais indicado para cada situação. Alunos que apresentam alguma dificuldade na leitura e interpretação de texto, naturalmente encontrarão mais dificuldade para assimilar o conteúdo em uma proposta de sala de aula invertida embasada na leitura de um artigo científico como complemento de um vídeo interativo, por exemplo. A leitura do artigo servirá como complemento para alguns, porém poderá se transformar em um transtorno para outros. Os alunos possuem características individuais específicas, como, níveis diferentes de formação escolar, maturidade, responsabilidade e interesses pessoais. A compreensão da melhor maneira de estimular a busca pelo conhecimento para cada perfil de aluno deve fazer parte da rotina diária de um orientador, inclusive avaliando o comprometimento do grupo com o tipo de atividade proposta. Se por algum motivo o aluno não se sentir motivado a realizar o estudo fora da sala de aula, o resultado será comprometido. Da mesma forma, alunos que trabalham durante o dia e cursam a disciplina no período noturno, talvez não tenham a disponibilidade fora do horário de aula necessária para concluir o estudo e deixarão de alcançar os resultados esperados. Outra realidade que deve ser considerada é a possibilidade de trabalharmos com alunos que não possuem os recursos tecnológicos necessários para o acompanhamento do material fornecido pelo professor, sendo esse um fator limitante do uso dessa metodologia conforme apontado por alguns autores. (PEREIRA & SILVA, 2018). CONSIDERAÇÕES FINAIS
O método de ensino ideal é aquele que o seu aluno necessita, portanto, cabe a nós professores adaptarmos o ensino para cada situação. A sala de aula invertida é uma excelente ferramenta que compõem esse cenário de construção do conhecimento e pode ser trabalhada de maneira versátil, inclusive auxiliando outros métodos como as práticas de laboratório aqui descritas. A transmissão do
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conhecido é uma tarefa que demanda uma constante atualização e adaptação à evolução do comportamento social. O domínio de diferentes metodologias de ensino e a identificação do momento adequado para aplicação de cada uma delas, talvez seja o diferencial para alcançarmos resultados cada vez melhores. REFERÊNCIAS
AZEVEDO, R.A. et al. Comparative effectiveness of dental anatomy carving pedagogy: a systematic review. Journal of Dental Education, v. 79, n. 8, p. 914-21, 2015. BARBOSA, M.F.; BARCELOS, G.T.; BATISTA, S.C.F. Sala de aula invertida: caracterização e reflexões. Congresso Integrado da Tecnologia da Informação, 2015. BERGMANN, J.; SAMS, A. Flip your classroom: reach every student in every class every day. 1. ed. Colorado: ISTE and ASCD, 239p. 2012. KELLESARIAN, S.V. Flipping the dental anatomy classroom. Dentistry Journal, v. 6, 23, 2018. NANCE, E.T.; LANNING S.K.; GUNSOLLEY, J.C. Dental anatomy carving computer-assisted instruction program: an assessment of student performance and perceptions. Journal of Dental Education, v. 73, n. 8, p. 972-79, 2009. PEREIRA, Z.T.G.; SILVA, D.Q. Metodologia ativa: sala de aula invertida e suas práticas na educação básica. Revista Iberoamericana sobre Calidad, Eficacia y Cambio en Educación, 16(4), p. 63-78, 2018. SEBOLD, L.F.; BÖELL, J.E.W.; GIRONDI, J.B.R.; SANTOS, J.L.G. Simulação clínica: desenvolvimento de competência relacional e habilidade prática em fundamentos de enfermagem. Rev enferm UFPE online, Recife, 11(Supl. 10):4184-90, out., 2017. VALENTE, J. A. Blended learning e as mudanças no ensino superior: a proposta da sala de aula invertida. Educar em Revista, Curitiba, edição especial n. 4, p. 79-97. Editora UFPR94, 2014.
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Capítulo 12 GAMIFICAÇÃO E ENSINO: UMA EXPERIÊNCIA DE APLICAÇÃO DO GAME LIGHTBOT Natália Elvira Sperandio Lívia Naiara de Andrade RESUMO
Enquanto professores nos deparamos a todo momento, em nossas práticas pedagógicas, com dificuldades que, muitas das vezes, possuem suas raízes no ensino tradicional. Assim, o docente possui grandes desafios impostos pela atualidade, sendo um deles despertar o interesse de alunos que se encontram conectados, a diferentes ferramentas tecnológicas, a todo momento, que estão expostos a um número constante de informações. É nesse contexto que o uso dos games, no processo de ensino-aprendizagem, emerge. Diante disso, o presente capítulo tem como proposta apresentar a forma pela qual a gamificação pode servir como importante ferramenta no ensino. Para isso, faremos um breve relato do uso do game Lightbot no ensino superior. Nossa proposta consiste em demonstrar de que forma esse game pode auxiliar no desempenho de alunos na disciplina de Linguagem de Programação. Como resultado, observamos que, ao trazermos o game Lightbot para nossa prática de ensino, tivemos maior dedicação dos alunos, resultando na motivação na ação, solução de problemas e potencialização da aprendizagem.
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CONCEITO DE GAMIFICAÇÃO
Acreditamos que, antes de adentrarmos no conceito de gamificação, torna-se necessário direcionarmos nosso olhar ao que concebemos como game, já que, mesmo sem haver um consenso completo entre os estudiosos da área, a gamificação é concebida, de modo superficial, como a transposição de elementos do game, do jogo, para diferentes contextos. Diante disso, surge o seguinte questionamento: o que entendemos por game? Iniciamos nosso debate com o conceito apontado por Huizinga (1938, p.13), que descreve o jogo/game como [...] uma atividade livre, conscientemente tomada como “não-séria” e exterior à vida habitual, mas ao mesmo tempo capaz de absorver o jogador de maneira intensa e total. É uma atividade desligada de todo e qualquer interesse material, com a qual não se pode obter qualquer lucro, praticada dentro de limites espaciais e temporais próprios, segundo uma certa ordem e certas regras. Promove a formação de grupos sociais com tendência a rodearem-se de segredo e a sublinharem sua diferença em relação ao resto do mundo por meio de disfarces ou outros meios semelhantes.
A esse conceito, podemos acrescentar os postulados de Jane McGonigal (2011), que propõe que os jogos possuem quatros elementos: objetivo (que envolve o trabalho dos jogadores para determinada finalidade), as regras (envolve as limitações que os jogadores terão para o alcance desse objetivo, tornando o jogador capaz de explorar as possibilidades que possui, liberando e motivando sua criatividade), feedback (possibilita aos jogadores visualizarem seu estado dentro do jogo) e, por último, a participação voluntária. Nesse mesmo contexto, Kapp (2012) conceitua jogo como sistema em que os jogadores possuem um desafio abstrato, composto por regras, interatividade e feedback. Como forma de aprofundar 170
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esse conceito, o autor promove a descrição de cada elemento que o compõe, sendo esses itens concebidos da seguinte forma: • Sistema: conjunto de elementos interconectados, o que implica uma relação muito próxima entre as partes envolvidas, já que o que acontece com uma dessas partes influencia diretamente a outra; • Jogadores: as pessoas envolvidas na execução desse sistema; • Desafio: esse sistema tem como propósito fazer com que os jogadores envolvidos sejam capazes de cumprir determinados objetivos, que, na maioria das vezes, não são de fácil execução; • Abstrato: consiste no fato de os jogos serem, em grande parte, abstração da realidade. Sendo importante destacar o fato de não lidar com uma réplica da situação real, mas elementos dessa situação, sua essência; • Regras: essas são as responsáveis pela estruturação do jogo. Ou seja, determinam seu funcionamento, sua sequência, a validade das ações e condições da vitória; • Interatividade: para ser jogo deve ter interação entre os jogadores, com o sistema, com o conteúdo proposto; • Feedback: esse consiste na possibilidade de resposta aos jogadores, sendo essa instantânea, direta e clara. O interessante dessa possibilidade é permitir aos jogadores uma mudança de conduta através de um feedback que pode ser tanto positivo quanto negativo.
Com o conceito de game em mente, podemos prosseguir nossa discussão, passando agora à apreciação do termo gamificação. Ao direcionarmos nosso olhar e atenção para o campo da gamificação, a primeira questão que devemos considerar é o fato de que ela não deve ser vista como novidade. O que acontece é que a palavra em si é nova, porém suas estratégias não podem ser vistas como inovadoras. A palavra gamificação tem sua origem vinculada
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à indústria de mídias digitais, ganhando popularização na segunda metade do ano de 2010. Mas como podemos conceitualizar gamificação? Para Deterding et al (2011), esse termo pode ser concebido como o uso de elementos do game fora do contexto dos games. Assim, a gamificação consiste na utilização dos games para outras propostas que vão além do seu uso no entretenimento. Logo, podemos considerar que, a partir dessa definição, na gamificação os elementos dos games acabam sendo transferidos para outros contextos, atividades, e neles empregados. Seguindo nessa mesma linha, Kapp (2012) aponta que a gamificação possibilita o uso de mecânicas, estética e pensamentos dos games que possibilitam o envolvimento das pessoas, a sua ação, a promoção de atividades e solução de problemas. O USO DA GAMIFICAÇÃO NO CONTEXTO DE ENSINO
Por que o uso de games?
Ao nos depararmos com um ambiente de ensino-aprendizagem completamente diferente daquele vislumbrado pelo ensino tradicional, com alunos conectados a todo momento, envolvidos em um emaranhado de informações, em um mundo imerso na cultura digital, nos deparamos com o seguinte questionamento: como prender a atenção desses alunos? Como despertar o interesse e engajamento desses discentes? É nesse momento que o uso dos games no contexto de ensino-aprendizagem emerge. No entanto, o que a gamificação poderia nos oferecer? Ao trazer a gamificação para o contexto de ensino, podemos recorrer aos elementos que fazem parte da gamificação e aplicá-los. Com isso, teremos a possibilidade de promover maior envolvimento e dedicação de nossos alunos. Ou seja, com essa proposta teremos a possibilidade de motivar a ação, solução de problemas e potencialização da aprendizagem nas diversas áreas do conhecimento.
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Por isso, na educação formal, a gamificação tem ganhado grande destaque, pois, além de lidarmos com indivíduos que conhecem e dominam as técnicas dos games, estamos diante de uma área que necessita de inovações, de novas estratégias para lidarmos com sujeitos inseridos em contextos digitais, o que os tornam desinteressados pela metodologia tradicional de ensino. Além disso, como apontam Lee e Hammer (2011), muitos dos elementos já aplicados no contexto escolar possuem proximidade com os games, tais como: os alunos recebem pontos ao cumprirem determinadas tarefas; esses pontos são traduzidos em notas, recompensando nossos alunos quando desempenham comportamentos que são desejados e, quando ocorre o contrário, esses são “punidos”. Ao final do semestre, os alunos que conseguirem esse desempenho “sobem de nível”, isto é, são aprovados. Porém, os autores destacam que não há engajamento entre os alunos, que o ambiente escolar não envolve os alunos, como ocorre em um processo de gamificação, o que provoca resultados que não são desejáveis, como trapaça, desamparo e abandono. Para eles, ao trazermos a gamificação para o ambiente escolar, teremos como possibilidade ampliar o cognitivo de nossos alunos (por meio dos jogos, os jogadores estarão diante de sistemas complexos de regras que serão explorados por meio de experimentação ativa e por meio da descoberta). Aqui vale destacar o fato de, na maioria das vezes, não deixarmos claro para os nossos alunos o benefício que determinada atividade possui. Com a gamificação nossos alunos terão a possibilidade de questionar o caminho do seu próprio aprendizado. Ou seja, com a gamificação seremos capazes de trabalharmos com tarefas claras, práticas e com resultados imediatos e não a longo prazo. APLICANDO A GAMIFICAÇÃO NO CONTEXTO ESCOLAR
Como colocado acima, enquanto professores estamos diante de uma delicada situação: como promover um processo de ensino173
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aprendizagem realmente significativo? Como chamar a atenção de nossos alunos? Como envolvê-los em nossas práticas diárias? Acreditamos que um dos caminhos para alcançarmos determinadas respostas esteja na utilização da gamificação no contexto escolar. Diante dessa afirmativa, faremos nessa seção a apresentação de uma prática pedagógica pautada na utilização da gamificação. A aplicação desse game teve como público-alvo os alunos do curso de Engenharia Civil, na disciplina de Informática Aplicada. Para isso, iniciaremos com a descrição do game eleito para essa prática: game Lightbot. O game Lightbot
O Lightbot é concebido como um videojogo educativo que possibilita a apreensão de conceitos de programação de software. O jogo foi desenvolvido por Danny Yaroslavski e está disponível como um jogo flash online e um aplicativo para telefones celulares Android e IOS. A finalidade do jogo consiste em comandar um pequeno robô para navegar em um labirinto e acender as luzes. Os jogadores têm a possibilidade de organizar os símbolos, presentes na tela, para comandar o robô a andar, girar, pular, acender uma luz e assim por diante. À medida que as lições progridem, o labirinto e a lista de símbolos tornam-se cada vez mais complicados. O interessante é que o jogador não necessita digitar nada, nenhuma linguagem de programação, bastando arrastar os ícones das instruções até o seu programa. Diante do supracitado, acreditamos que o Lightbot pode ser utilizado em aulas de iniciação à programação de computadores, para auxiliar na resolução de problemas de lógica, por meio da definição de comandos sequenciais, criação de procedimentos e comandos de repetição. Aplicação metodológica
Como forma de aplicarmos o presente game, seguimos a metodologia abaixo descrita: 174
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Em um primeiro momento, aplicaram-se três avaliações diagnósticas. A utilização de tais justifica-se pela autenticidade dos resultados por elas garantida. Como forma de exemplificarmos tais resultados, apresentamos o gráfico abaixo: Gráfico 1: Resultado das avaliações diagnósticas
Fonte: as autoras
Finalizada a avaliação, passou-se à aplicação do game em sala de aula. Essa aplicação foi dividida em três momentos, baseada nos níveis apresentados pelo game, uma vez que os níveis apresentam conceitos de lógica de programação diferentes. Momento I – aplicação do LightBot, nível I (básico). Nesse momento, a proposta foi que os alunos desenvolvessem a lógica sequencial de comandos. Abaixo algumas imagens do Lightbot.
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Figura 1: imagens do game Lightbot
Fonte: www.lightbot.com/flash.html
Na Figura 1b, da primeira fase do nível básico, é possível observar que o jogador deve inserir comandos para deslocar o boneco (robô) do ponto inicial até o ponto azul. Os comandos possíveis são: seta para deslocar para frente, setas para que o boneco vire para a direita ou para a esquerda, e comando da lâmpada (que deve ser acionado quando o boneco estiver no ponto final). Somente após a inserção de todos os comandos é que o jogador deve clicar sobre o botão de início (seta verde que indica play). Na Figura 1c é possível observar que os comandos definidos pelo jogador são apresentados na lateral direita. Momento II – aplicação do LightBot, nível II. Nesse segundo momento, a proposta é demonstrar aos alunos aplicação de procedimentos. O jogo permite a criação de blocos de comandos denomi-
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nados de P1, que podem ser chamados durante a sequenciação dos movimentos do boneco. Com esse nível completo, espera-se que os alunos tenham compreendido a aplicação dos procedimentos, que são pequenos comandos chamados no decorrer da programação geral, assim como se espera que os alunos compreendam sua aplicação fora do game. Nesse nível, podemos trabalhar com os alunos a ideia de procedimentos, ou seja, criar comandos padrão e chamá-los dentro da programação quando necessário. Na imagem da Figura 1c, fase do nível II, percebe-se como vários deslocamentos feitos pelo boneco são iguais e que eles podem ser criados como um procedimento (P1) e ser chamado nos comandos sequenciais. Momento III – aplicação do Lightbot, nível III. Nesse terceiro momento, a proposta foi demonstrar aos alunos a aplicação dos comandos de repetição. O conceito é muito próximo do nível anterior, com a diferença de que no nível II seriam definidos procedimentos, e neste nível o jogador poderia definir quantas vezes esse procedimento pode ou deve ser repetido. Com esse nível completo, espera-se que os alunos compreendam a aplicação das repetições de comandos, bem como sua aplicação durante a disciplina. Neste momento, o jogo introduz um conceito conhecido como estrutura de repetição, que são comandos usados para fazer com que comandos iguais se repitam por determinado número de vezes. O game permite a criação dos procedimentos, e nessa criação a chamada dos procedimentos criados anteriormente. Essa permissão do game faz com que os alunos desenvolvam a ideia de sequenciação de comandos que devem ser repetidos por algumas vezes, como acontece nas estruturas de repetição no desenvolvimento de programas.
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As avaliações diagnósticas foram aplicadas em três dias, e os resultados obtidos foram utilizados como parâmetros iniciais de análise de desempenho dos alunos. Na primeira avaliação diagnóstica (anexo 1), que abordou um conceito de lógica através da sequência de passos para uma dobradura de papel, os alunos apresentaram um aproveitamento positivo de 91%. A segunda avaliação (anexo 2) apresentou uma proposta de um símbolo lógico, que, dependendo dos valores digitados, executa operações matemáticas diferentes. Devido ao aumento da complexidade da questão abordada, os alunos apresentaram um aproveitamento de 36%. Observou-se nessa avaliação que os alunos apresentam déficit na execução de operações matemáticas com números negativos, identificando o valor -21 como menor que o valor -22. Aqui foi possível evidenciar que, devido à dificuldade matemática com números negativos, os alunos não conseguiram identificar os comandos corretos a serem executados. A terceira avaliação diagnóstica (anexo 3) apresentou aos alunos uma questão lógica sobre a identificação das relações entre as pessoas de uma família (filha, filho e irmãos) a partir de várias dicas. O resultado apresentado foi um aproveitamento de 96% satisfatório e superior ao desempenho apresentado na primeira avaliação diagnóstica. Aqui já se pode perceber a melhoria dos alunos no conteúdo, uma vez que a primeira e a terceira avaliação tratavam de questões lógicas, com a diferença de que a terceira avaliação foi aplicada no terceiro dia de aula da disciplina, momento no qual os alunos já haviam sido introduzidos ao conceito de lógica de programação.
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Figura 2: aplicação do game Lightbot
Fonte: as autoras
RESULTADOS
Tendo como base o conceito de Kapp (2012)3, em que o jogo deve ser entendido como um sistema em que os jogadores possuem um desafio abstrato, composto por regras, interatividade e feedback, optou-se por uma pequena adaptação no terceiro momento de aplicação do Lightbot, no qual os alunos foram convidados a, além de executarem os três níveis do jogo, cronometrarem o tempo gasto para a conclusão do game. Os resultados estão expostos no Gráfico 2, o qual demonstra que alguns alunos apresentaram tempos reduzidos, variando entre 14,5 e 15,2 minutos, e outros alunos gastaram um tempo maior para finalização, variando entre 44,5 e 48,3 minutos. Calculando uma média de tempo entre todos
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os alunos, o tempo gasto para a conclusão foi de 31,5 minutos. Essa adaptação na metodologia proporcionou um desafio novo, fazendo com que os alunos tivessem motivação de finalizar primeiro que os colegas o jogo, e não simplesmente finalizar o nível 3. Além disso, o tempo também foi utilizado como um parâmetro para confrontar a contribuição do jogo no desempenho dos alunos na disciplina. Gráfico 2: Tempo gasto para conclusão do game Lightbot
Fonte: as autoras
A proposta do Gráfico 3 foi analisar a relação entre tempo e desempenho, uma vez que, posteriormente à realização do terceiro momento de aplicação do game, os alunos foram submetidos a uma avaliação que abordou conceitos de lógica de programação trabalhada no game.
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Gráfico 3: Relação entre tempo gasto e aproveitamento na prova
Fonte: as autoras
No gráfico 3 o tempo gasto está visível na linha azul enquanto que o desempenho dos alunos na prova está expresso na cor vermelha em uma escala numérica entre 0 e 1. Observa-se que alunos com tempos reduzidos para finalização do game, 14,5 e 15,2 minutos, apresentaram bom desempenho na prova, com aproveitamento variando entre 1 e 0,75. Alunos com aproveitamento inferior a 0,75 apresentaram tempos superiores a 31 minutos, que foi o tempo médio da turma. Essa relação entre tempo e aproveitamento reforça a ideia de que o uso da gamificação no contexto escolar pode promover um processo de ensino-aprendizagem mais significativo, pois chama a atenção dos alunos, colocando-os em um contexto divertido que proporciona a cooperação e colaboração para construção do conhecimento. CONSIDERAÇÕES FINAIS
Com a aplicação do game Lightbot observamos maior interesse e engajamento dos alunos na disciplina de Linguagem de Progra181
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mação, apresentando aproveitamentos satisfatórios na disciplina, além de ter possibilitado o envolvimento e dedicação através da motivação, solução de problemas e, principalmente, potencialização da aprendizagem. REFERÊNCIAS
DETERDING, S. et al. Gamification: toward a definition. In: CHI 2011 Workshop Gamification: Using Game Design Elements in NonGame Contexts. Vancouver, Canadá, 2011. Disponível em: <http:// gamification-research.org/wpcontent/uploads/2011/04/CHI_2011_ Gamification_Workshop.pdf>. Acesso em: 10 ago. 2018. HUIZINGA, J. Homo ludens: versucheinerbestimmung des spielelements der kultur.1938. Publicado originalmente em 1944. Tradução para língua portuguesa: Homo Ludens: O Jogo Como Elemento da Cultura. São Paulo, SP: Perspectiva, 1999. KAPP, K. The Gamification of Learning and Instruction: Game-based Methodsand Strategies for Training and Education. Pfeiffer, 2012. LEE, Joey J.; HAMMER, J. Gamification in Education: What, How, Why Bother? Academic Exchange Quarterly. 2011. Disponível em:<http://www. gamifyingeducation.org/files/Lee-Hammer-AEQ-2011.pdf>. Acesso em: 10 ago. 2018. MCGONIGAL, J. Reality Is Broken: Why Games Make Us Better and How They Can Change The World. Nova Iorque: The Penguin Press, 2011.
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Avaliação diagnóstica II Uma calculadora diferente possui a tecla operatória •, que faz a seguinte conta entre dois números, denotados aqui por A e B: A • B será igual ao produto de A por B se A for um número maior ou igual a B; A • B será igual a A2 − B2 se A for um número menor que B. Usando essa calculadora, Marcos teclou 2 • 5 e, em seguida, usou o resultado apresentado pela calculadora, teclou • , e depois teclou o número −22. O resultado obtido por Marcos ao término das operações descritas foi: a). 925. b). 462. c). - 43. d). - 384. e). - 638. Avaliação diagnóstica III Maria tem três filhos, Bianca, Celi e João, e seis netos, Ana, André, Beth, Cláudia, Fernando e Paula. Sabe-se que: Bianca tem três filhos(as). Celi tem dois filhos(as). João tem um(a) filho(a). Cláudia não tem irmãos. Beth é irmã de Paula. André não tem irmãs. Com essas informações, pode-se afirmar que Ana é: a) filha de Celi. b) prima de Beth. c) prima de Paula. d) filha de Bianca. e) filha de João.
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Capítulo 13 PBL PARA VIABILIZAR APRENDIZAGEM INTERDISCIPLINAR Jaqueline Vieira Rangel
RESUMO
A disciplina Psicologia Forense traz um desafio a mais para os estudantes de Direito, por exigir maior abstração para a compreensão dos temas e posicionamentos baseados em expressões subjetivas, comuns a atendimentos humanísticos, mas incomuns ao pensamento objetivo e pragmático que o exercício da profissão de advogado exige. Ademais, utilizar a interdisciplinaridade para articular temas de Psicologia e Direito desafia a estratégia pedagógica comum e por isso optou-se por realizar uma atividade de Problem Based-Learning (PBL), com os alunos do nono período de Direito do UNIPTAN (Centro Universitário Presidente Tancredo de Almeida Neves). Entre os objetivos da atividade esperava-se estimular a aprendizagem interdisciplinar e colaborativa, estimular a crítica e a reflexão profissional, desenvolver nos alunos a capacidade de acompanhar seu próprio processo de aprendizagem e convidá-los a analisar os temas sob um ângulo diferenciado ao habitual. Utilizando um questionário, os alunos puderam avaliar seu resultado de aprendizagem a partir do PBL e sobre a condução didática da professora, sendo que 96,3% dos alunos considerou que a metodologia utilizada contribuiu para o seu processo de aprendizagem. 185
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INTRODUÇÃO
As formas de se alcançar aprendizagem evoluem e se modificam com o passar do tempo. Pesquisadores e estudiosos da área afirmam que a forma como se aprende atualmente é bem diferente de como se aprendia há cinquenta anos ou menos. Segundo Cosenza e Guerra (2011) a neurociência tem ajudado neste sentido e suas descobertas demonstram, por exemplo, que nosso cérebro aprende por conexões em rede que sugerem a imperativa necessidade de abertura dos espaços de aprendizagem para o mundo, ampliando redes sociais e tecnológicas, pessoais e institucionais convertendo essas relações em ótimas oportunidades de aprendizagem. Um processo de ensino diferenciado consegue ajudar o aluno a alcançar melhores experiências de aprendizagem. Em todas as iniciativas em que o aluno é questionado, instigado, motivado e orientado os resultados são superiores aos que se apresentam se o lugar do aluno for mantido como receptáculo passivo de objetivos de ensino que fazem pouco sentido em sua vida prática. Ao acrescentar reduzido valor acadêmico e funcional o aprendizado fica comprometido pela falta de motivação e engajamento do aluno. Nesse contexto o trabalho do professor tem se modificado e seu papel como orientador de aprendizagem ganha relevância. A possibilidade de levar os alunos a irem mais longe com elevada motivação instigando questionamentos pode e deve ser valorizada. As metodologias ativas centradas na relevante atividade do estudante na construção de seu próprio processo de aprendizagem a partir de contextos cada vez mais flexíveis, trazem inúmeras possibilidades de combinações em atividades diferenciadas. Blikstein (2016) apontou para a necessidade de se construir outras formas de aquisição da aprendizagem e superar as dificuldades motivacionais dos alunos, preparando-os para um desempenho profissional mais produtivo e eficaz. O estímulo da articulação entre teoria e a prática em forma de resolução de problemas torna-se
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assim, um dos principais objetivos da atividade apresentada neste texto, bem como a reflexão crítica e o protagonismo do aluno. CONSTRUINDO UMA APRENDIZAGEM SIGNIFICATIVA
Diversos modelos teóricos têm se ocupado em discutir as formas de aquisição da aprendizagem e as possibilidades de envolvimento dos alunos neste processo. A falácia da motivação intrínseca e absoluta que previa alunos chegando aos cursos totalmente auto motivados e ávidos pela absorção de conceitos, técnicas e práticas faz tempo que não combina com a realidade dos bancos escolares. Decorre, portanto, a necessidade de se compreender qual seria a melhor forma de promover a aprendizagem e de favorecer a expansão do conhecimento. Nos anos em que Paulo Freire escreveu sua obra prevalecia o modelo de educação nomeada “educação bancária” onde apenas o educador era considerado como sujeito e o educando “depósito” ou receptor de conteúdos memorizados ingênua e mecanicamente. Freire (2003) destaca então a importância da dialogicidade que considera a participação de ambos, educadores e educandos, que ensinam e aprendem mediatizados pelo mundo, pela experimentação da vida. O autor considera esta própria “educação bancária” como uma desconfiguração do caráter histórico ou da historicidade da experiência humana vez que, contraditoriamente, o educador é autoridade e protagonista do processo de ensino-aprendizagem enquanto os educandos são pensados e escutam dócil e disciplinadamente executando tudo que foi prescrito. O diálogo pedagógico no processo educativo nunca esteve tão bem difundido e aceito como nos dias atuais. Esta prática dialógica tem possibilitado a evolução do processo de ensino e aprendizagem de uma forma mais condizente com a proposta de educação para a liberdade de expressão e construção do pensamento crítico e inovador. Freire (1970) continua a defender que os homens são seres de procura e que sua vocação ontológica é humanizarem-se. 187
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A dialogicidade deve ser praticada, portanto, como essência da educação e prática da liberdade. Outra questão a se considerar é que este processo de ensino diferenciado deve pressupor um processo avaliativo igualmente singularizado. Vários autores têm se dedicado a propor ações avaliativas coerentes com as metodologias ativas. Demo (1994) considera avaliação como uma coleta de dados a serem utilizadas a posteriori para ponderar as atividades realizadas pelos alunos de forma individual ou em grupos. Assim, o domínio de instrumentos teóricos e a assertiva realização de atividades experimentais e de sistematização de dados, denota a qualidade em que o processo educativo se desenvolve. Não obstante o sucesso de um processo de avaliação exija planejamento e competência por parte do avaliador, a participação autônoma dos alunos neste processo favorece resultados mais corretos. Uma das possibilidades de avaliação, proposta por Bacich e Moran (2017), seria a disponibilização prévia de uma auto avaliação. Esta ação permite ao estudante a participação e o acompanhamento das atividades ao longo do período de forma mais atenta e motivada, evitando a situação passiva de somente aguardar a avaliação externa, ou seja, do professor, mas compreender que esta vai depender de sua conscientização como sujeito aprendente. Há várias menções na literatura que consideram a avaliação somativa tão necessária quanto a avaliação formativa, considerando nessas duas a proposição de feedback aos alunos, diminuindo discrepâncias e favorecendo a autonomia discente (LUCENA, 1992). Este feedback é considerado essencial pois, através dele se retoma o desenvolvimento da aprendizagem. Somados a esses diferenciais importa acrescentar que a relação interpessoal entre professores e alunos, por motivos variados, pode não se estabelecer de forma sólida e positiva. Fernández (1991) sinaliza para a forma de articulação entre o sujeito aprendente e a instituição de ensino representada pela pessoa do professor,
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como um dos aspectos que interferem na aprendizagem. Se mal elaborada esta relação pode constituir um sintoma ou inibição que afeta diretamente o desejo e o estímulo para aprender. Aliada ao trabalho com relações interpessoais na aprendizagem desenvolvido de forma competente destaca-se a promoção da autonomia dos estudantes que proporciona maior motivação para as atividades. Guimarães (2003), reforça que os sujeitos são mais propensos a realizarem uma atividade quando acreditam que o fazem por vontade própria e não por atenderem a demandas externas. Através desta percepção seus comportamentos tendem a ser mais intrinsecamente motivados influenciando a experiência pessoal de autonomia. À vista disso destacam-se a aprendizagem ativa e a aprendizagem híbrida. A primeira que enfatiza o envolvimento direto do aluno, de forma reflexiva e participativa em todas as fases do processo de ensino e a segunda que compartilha e flexibiliza espaços, tempos, atividades e tecnologias que compõem este processo ativo de aprendizagem (Bacich e Moran, 2017). Estas características viabilizam a motivação para aprendizagem, essencial para o sucesso de qualquer atividade pedagógica. O MÉTODO PROBLEM BASED-LEARNING – PBL
A Aprendizagem Baseada em Problemas aparece como mais uma estratégia didática ativa que valoriza a capacidade de o aluno aplicar conhecimentos em situações reais ou simuladas, mas que denotam um contexto significativo. Esta metodologia motiva os estudantes através da problematização, da cooperação e da partilha de conhecimentos. O aluno assume o lugar de protagonista de seu próprio aprendizado por meio da pesquisa. A análise dos referenciais teóricos sobre PBL traz definições diferentes sobre o tema, acrescentando outras atribuições ao seu significado o que permite sua aplicação em diversas áreas de co-
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nhecimento e níveis de ensino diferenciados, contribuindo para sua expansão. Barrows (1986), apresenta o PBL como método promotor de uma aprendizagem centrada no aluno e funciona como estímulo para o desenvolvimento de habilidades de resolução. Nele os professores são facilitadores do processo de produção de conhecimentos. Na definição de Delisle (2000, p. 5), o PBL é “uma técnica de ensino que educa apresentando aos alunos uma situação que leva a um problema que tem de ser resolvido”. Outros autores como Barrel (2007) e Leite e Esteves (2005), apresentam o PBL como um estímulo à curiosidade que leva a fazer perguntas e levantar dúvidas acerca das diversas situações estudadas. Nesse sentido, o desafio funciona como um incentivo ao comprometimento pessoal com a própria aprendizagem. Apresentamos como contribuição a estes conceitos a compreensão do PBL como uma estratégia que tem como centro o aluno e que possibilita que este aprenda de forma cooperativa com produção individual e grupal, utilizando análise crítica em contexto significativo e sempre em interação com o professor. Na extensa literatura produzida sobre o PBL observa-se uma certa consonância em relação às suas características básicas. Estas referem-se à promoção da aquisição de conhecimentos, desenvolvimento de habilidades, competências e atitudes em todo processo, bem como, impulsiona estes seus princípios em diferentes contextos da vida dos alunos. Na verdade, toda estrutura do PBL foi desenvolvida para que os alunos aprendam a pesquisar de forma metódica e sistemática e a trabalhar de forma cooperativa e funcional, complementando sua atuação individual. DESCRIÇÃO DA ATIVIDADE
Ao final do curso de Direito espera-se que os futuros profissionais sejam capazes de articular todo o conjunto de informações, 190
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leis e doutrinas aprendidas durante a graduação, na solução de problemas em contextos significativos. Confiando no desenvolvimento desta habilidade optamos por realizar uma atividade de Problem Based-Learning (PBL), com os alunos do nono período de Direito do noturno no UNIPTAN. A disciplina Psicologia Forense traz um desafio a mais, por exigir maior abstração para a compreensão dos temas e posicionamentos baseados em expressões subjetivas, comuns a atendimentos humanísticos, mas incomuns ao pensamento objetivo e pragmático que o exercício da profissão de advogado exige. Ademais, o exercício da interdisciplinaridade articulando na mesma atividade Psicologia e Direito desafia a estratégia pedagógica comum. Entre os objetivos da atividade esperava-se estimular a aprendizagem interdisciplinar e colaborativa, estimular a crítica e a reflexão profissional, desenvolver nos alunos a capacidade de acompanhar seu próprio processo de aprendizagem e convidar os alunos a analisar temas sob ângulo diferenciado ao que ele já se habituou. A atividade desenvolveu-se em três momentos. Primeiro os alunos tiveram contato com o material do trabalho, seus objetivos e forma de execução. Três temas diferentes foram entregues aos alunos divididos em cinco grupos. Os temas estavam relacionados a conteúdos do Plano de Ensino trabalhados durante o semestre: psicopatologia e homicídio, conflitos familiares e mediação de conflitos. Cada tema foi apresentado com estudos de casos, referências bibliográficas e as situações problema para as quais se deveria apresentar as soluções pensadas pelo grupo. O acompanhamento da atividade também foi dividido, sendo que no segundo momento todos os grupos apresentaram o andamento dos trabalhos até o momento, as linhas de análise do caso e as hipóteses de solução, além de um relatório sobre a participação dos membros do grupo na execução da atividade. Finalmente, no último encontro cada grupo apresentou o cenário do tema, as situações problema, a análise do grupo e as bases teóricas e práticas utilizadas para esta análise juntamente com as soluções encontradas. Para a apresentação final os grupos poderiam se
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organizar como quisessem, utilizando o recurso tecnológico que melhor se adaptasse à situação. Para a avaliação, no último encontro foi entregue um questionário para cada aluno responder sobre seu resultado de aprendizagem a partir do PBL e sobre a condução da mesma pela professora. A proposta de personalização da avaliação disponibilizando aos alunos uma auto avaliação, objetivava mobilizar seu acompanhamento pessoal e sua participação nas atividades. Como resultados, 96,3 % dos alunos considerou que a metodologia utilizada contribuiu para o seu processo de aprendizagem. Esses resultados mostraram que as etapas do processo de ensino realizado por meio do PBL foram eficazes e confirmam a sua relevância para a promoção e aperfeiçoamento da aprendizagem interdisciplinar articulando conteúdos da Psicologia e do Direito. Acrescenta-se a esta análise a realização por parte dos alunos de uma reflexão crítica sobre a prática, com capacidade não só para captar seus avanços e suas dificuldades, mas principalmente suas resistências em superar obstáculos rejeitando, muitas vezes, uma visão mais ampliada da situação, que se pode observar na narração de uma aluna: “Sou extremamente objetiva e vivenciei uma situação que me fez repensar meu método de abordagem. Certamente serei mais humana frente aos conflitos apresentados. ” Entre outras exposições dos alunos esta reforça que a aprendizagem através de métodos ativos demandam um importante aprimoramento nas relações humanas. Não obstante, uma das fragilidades apresentadas pelo método PBL nesta experiência relaciona-se com uma expressiva insegurança dos alunos ao iniciar as atividades. De certa forma os estudantes se sentiram confusos e perdidos com a liberdade de análise que lhes foi sugerida na abordagem e na busca de soluções dos casos. As questões sobre bibliografia, apresentação, como deveria ser a participação do grupo entre outras, influenciaram no tempo de análise que pôde ser dedicado ao estudo de caso. Talvez em função disso, algumas análises de grupos ficaram mais centradas nos trabalhos, teorias e atuação profissional que esses alunos desempenham. 192
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Os anexos relacionados a este trabalho podem ser observados adiante, no final do capítulo. CONCLUSÃO
Este capítulo não teve a pretensão de ser mais um “elogio ao método”. Foi apenas o reflexo do envolvimento da professora com a qualidade das discussões e aprendizagem dos alunos. As narrativas expressam resultados que motivam a continuidade do trabalho e das pesquisas relacionadas a outros métodos para ensinar. Numa das avaliações a aluna explica: “...é praticamente impossível trabalhar em uma área isoladamente. Dito isso, quando unimos a psicologia e o direito, ambos se completam, uma vez que a psicologia nos auxilia na tentativa de explicar os atos dos indivíduos para um julgamento coerente, para fazer justiça no caso concreto.” Também sugerem que a metodologia empregada “contribuiu no sentido de demonstrar que a abordagem interdisciplinar é essencial para que o advogado esteja preparado para compreender e atender os casos mais complexos. ” Esta análise informa ao professor(a) que em sua formação o aluno busca angariar subsídios teóricos e práticos para sua atuação profissional e que o sucesso desta busca é fator motivacional para a aprendizagem Foi possível ainda perceber a importância que os alunos dão ao seu protagonismo na aprendizagem: “Ouvir e aprender com meus colegas de sala podendo expressar também a minha opinião sobre os assuntos foi essencial para o meu processo de aprendizagem.” Assim percebe-se que ao utilizar uma metodologia que favorece a centralização do aluno na aprendizagem, o professor não somente motiva como estabelece uma relação de confiança com o aluno. Seria como se dissesse: eu confio e acredito que você tem total possibilidade de construir o seu conhecimento com os meios de que dispõe.
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REFERÊNCIAS
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ANEXO 1 CENTRO UNIVERSITÁRIO PRESIDENTE TANCREDO DE ALMEIDA NEVES
Curso: Direito 9º período Disciplina: Psicologia Forense Profa. Jaqueline Vieira Rangel 41 alunos; 7 grupos de 5 alunos e um grupo de 6 alunos. PBL 1 – Psicopatologia e Homicídio
Cenário
Enfoque psico-jurídico do psicopata homicida
Temas a serem trabalhados com relação ao Plano de Ensino
Tópicos da psicologia relacionados ao direito, à criminologia e psicopatologia. http://dspace.idp.edu.br
Fonte para contextualização do problema
CASOY, Ilana. Serial Killers: made in Brasil. Rio de Janeiro: DarkSide Books, 2014, p. 303-309 SCHECHTER, Harold. Serial killers, anatomia do mal; tradução de Lucas Magdiel – Rio Janeiro: Dark Side books. Pg. 391 – 393
Situação-problema
Qual a eficácia da legislação brasileira para o diagnóstico e persecução criminal de psicopatas homicidas? É possível apresentar a temática sob a perspectiva da lei de execuções penais, apresentando modelos prisionais enfocando o indivíduo psicopata?
Avaliações
Formativa: em 2 encontros, apresentação dos resultados parciais (21/06/18) Somativa: em 1 encontro, entrega de relatório de pesquisa escrito do caso, dos estudos e conclusões com apresentação em slides. (28/06/18)
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O relato da história dos psicopatas Pedro Rodrigues filho e Jeffrey Dahmer permite análise e comparação quanto a diferentes tipos de psicopatas. Utilizando as duas histórias é possível trazer óticas diversas quanto ao tratamento legal destinado aos indivíduos considerados psicopatas homicidas. ANEXO 2 AVALIAÇÃO DO PROCESSO – 28/06/2018
Neste processo de aprendizagem visamos desenvolver outras habilidades de discussão, comparativos e análises de casos a fim de instigar e desenvolver novos conhecimentos e percepções para nortear futuros julgamentos a partir das sugestões de ação elaboradas pelo grupo. Em conclusão, solicito a cada aluno um feedback por escrito respondendo à seguinte questão: “ No seu ponto de vista, esta metodologia contribuiu para o seu processo de ensino aprendizagem? ” Em que sentido? ______________________________________________________ ________________________________________________________________
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Capítulo 14 O PAPEL DOLABORATÓRIO MORFOFUNCIONAL INTEGRADO MULTIESTAÇÕES EM UM CURRÍCULO MÉDICO INTEGRADO E BASEADO EM METODOLOGIAS ATIVAS:RELATO DE EXPERIÊNCIA Daniel Riani Gotardelo Nubia Cristina de Freitas Maia Márcia Hiromi Sakai Jaqueline Melo Soares Marcele Pereira Silvestre Gotardelo Maria José Sparça Salles RESUMO
As tendências contemporâneas em educação médica indicam a utilização de estruturas curriculares centradas no estudante e que privilegiem a integração básico-clínica desde o início do curso. Neste contexto, o objetivo deste capítulo é descrever o modelo do Laboratório Morfofuncional Integrado Multiestações em um currículo integrado implantado multicentricamente no Brasil, um modelo que está inserido num eixo curricular estruturante que prevê a utilização de várias estratégias educacionais para a abordagem das ciências básicas e aplicadas: tutoria (aprendizagem em pequenos grupos), ambiente virtual de aprendizagem (TICs) e sala de aula (palestras). O modelo consiste em um ambiente para o desenvolvimento de atividades educacionais em três áreas, organizadas por disciplinas associadas: 1) anatomia; 2) bioquímica/fisiologia; 3) citologia/histologia/genética/embriologia. Os 197
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estudantes fazem rodízio cumprindo tarefas que duram de 30-50 minutos em cada estação e geralmente empregam-se 2-3 estações por laboratório, com um número de 5-8 participantes por estação. Sobre a experiência do método, a mudança do papel do professor nos laboratórios de ciências básicas e aplicadas e a disponibilidade de tempo para reflexão e planejamento das atividades são os principais desafios do modelo. O planejamento estrutural do laboratório e o dimensionamento adequado do número de estações e do tempo empregado no desenvolvimento de cada uma, por área do conhecimento, representam variáveis de destaque para a obtenção dos resultados pretendidos. Por fim, este modelo tem permitido observar maior engajamento, curiosidade e motivação dos alunos em um ambiente colaborativo. Ainda, demonstra que é possível adequar metodologias ativas aos laboratórios de áreas básicas, promovendo integração entre a teoria e a prática de forma interdisciplinar. INTRODUÇÃO
A fragmentação de conteúdos em disciplinas isoladas de ciências básicas é uma herança do modelo flexneriano de estruturação curricular, em que os determinantes de caráter puramente biológicos e a ênfase nas especialidades médicas assumem o protagonismo em detrimento a uma visão social e holística no contexto da formação médica (PAGLIOSA, 2008). Em oposição a esse modelo, as diretrizes atuais em educação médica recomendam a adoção de um currículo integrado e que privilegia a interação básico-clínica desde o início do curso, com vistas à formação generalista, trazendo ao estudante o papel central no processo de ensino-aprendizagem e destacando o desenvolvimento de competências para o trabalho em equipe e para o atendimento das necessidades de saúde do indivíduo, da família e da comunidade. A realidade das diretrizes atuais reflete também o contexto sociocultural da atualidade em que as pessoas vivenciam
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a aprendizagem de diferentes formas, individual, em redes, por intercâmbios e em grupos, num processo integrativo (MENIN & PETRONI-MENNIN, 2006; AFMC, 2009; AAMC-HHMI, 2009; FRENK et al., 2010; MSAC, 2012; LCME, 2013; BRASIL, 2014; BRAUER & FERGUNSON, 2014; GMC, 2018). No modelo clássico de ensino laboratorial em ciências básicas, os professores fornecem orientações detalhadas sobre os procedimentos em estruturas conhecidas como “roteiros de prática”, em que os estudantes repetem ou confirmam o que já está escrito nos livros didáticos sem uma reflexão crítica, sem uma contextualização com a vida profissional e sem o desenvolvimento de atributos como a criatividade, a inovação e o “aprender a aprender”. Além disso, com frequência ocorre a dissociação dessas práticas com o restante das atividades educacionais previstas verticalmente e horizontalmente para o currículo (MATSUO, 2011). Nesse contexto, vislumbra-se a necessidade de mudanças metodológicas no tocante à condução das atividades práticas laboratoriais previstas para os primeiros anos do curso médico. Há descrição na literatura de várias iniciativas nesse sentido, quer nos currículos híbridos (WILKERSON, 2009; YAQINUDDIN, 2016) ou no modelo PBL (DAHLE, 2002; WILKERSON, 2009), sendo que muitos autores apontam ser, para além de um modismo ou de uma inovação, uma ferramenta estratégica para promover precoce integração básico-clínica e teórico-prática na formação médica. Pretende-se aqui relatar a experiência do modelo de Laboratório Morfofuncional Integrado Multiestações (LMIM) em um currículo integrado e baseado em metodologias ativas - centrado no estudante - implantado multicentricamente no Brasil. Quanto ao significado de LMIM, segue-se: “Laboratório”, por privilegiar a indissociabilidade entre teoria e prática no processo de ensino-aprendizagem.
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“Morfofuncional”, pelo fato dos professores serem preparados e estimulados a elaborar atividades educacionais com um sentido clínico, interdisciplinar e aplicável à prática profissional, em um contexto mais amplo, em oposição ao modelo fragmentador e limitado comumente encontrado nas disciplinas de ciências básicas. “Integrado”, por dialogar permanentemente com os objetivos educacionais previstos para aquele momento do curso, e pela interação horizontal e vertical que guarda com as outras unidades curriculares. “Multiestações”, pelo papel motivador, desafiador e instigador que o docente assume ao refletir e elaborar múltiplas atividades e tarefas coerentes com a concepção pedagógica adotada - a aprendizagem centrada no estudante por meio de metodologias ativas. DESCRIÇÃO DA EXPERIÊNCIA
Na estrutura curricular, baseada nos órgãos e sistemas do corpo humano, o LMIM encontra-se inserido nos módulos do Eixo de Sistemas Orgânicos Integrados, perpassando os 5 primeiros semestres do curso médico. Neste eixo de formação, além do LMIM, os seguintes métodos são utilizados: tutorias, também chamadas de Aprendizagem em Pequenos Grupos (APG), metodologia baseada no PBL (Problem Based Learning); palestras e ambiente virtual de aprendizagem ou Tecnologias de Informação e Comunicação (TICs). A estratégia condutora para o alcance dos objetivos educacionais é a APG, em que, na frequência de 2 (duas) vezes por semana, os alunos estipulam objetivos de aprendizagem a partir de situações-problema seguindo passos adaptados do PBL. O alcance dos objetivos traçados no APG é feito no ambiente extraclasse e potencializados com as tarefas e desafios a serem trabalhados nos outros ambientes: LMIM, TICs e sala de aula (palestras).
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A figura 1 mostra as estratégias de ensino-aprendizagem utilizadas no Eixo Estruturante Curricular denominado “Sistemas Orgânicos Integrados”.
Figura 1: Representação esquemática das estratégias de ensino-aprendizagem utilizadas no Eixo Estruturante Curricular denominado “Sistemas Orgânicos Integrados”. LMIM = Laboratório Morfofuncional Integrado Multiestações. TICs = Tecnologias de Informação e Comunicação (ambiente virtual).
Preliminarmente, há que se destacar a necessidade de premissas básicas para o adequado funcionamento do LMIM como, por exemplo, para o primeiro e segundo anos e primeiro semestre do terceiro ano: 1) Planejamento estrutural, incluindo materiais e equipamentos de laboratórios multidisciplinares agrupados por áreas e conteúdos afins, sendo: 1º Ano laboratório de anatomia, laboratório de bioquímica e fisiologia, laboratório de histologia, biologia celular e molecular, genética e embriologia.
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2º Ano e primeiro semestre do 3º Ano laboratório de patologia clínica, imunologia, microbiologia, parasitologia laboratório de anatomopatologia e farmacologia laboratório de radiologia 2) Proximidade física dos laboratórios, quando possível, com a finalidade de suportar o modelo de rotações entre os pequenos grupos (Figura 2)
Figura 2: Esquema ilustrando o fluxo de alunos entre os laboratórios integrados e suas respectivas estações.
3) Preparação dos professores não apenas quanto aos métodos utilizados, mas também quanto à ênfase na integração básico-clínica e teórico-prática nas interações vertical e horizontal previstas para o currículo.
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4) Conciliação de agenda dos professores, pelo fato dos alunos percorrerem diferentes estações, nos diferentes laboratórios acima descritos, no mesmo dia e horário. 5) Dimensionamento adequado do número de estações e do tempo empregado no desenvolvimento de cada uma, por área do conhecimento. Geralmente empregam-se 2 ou 3 estações por laboratório, com um número de 5 a 8 participantes por estação. Considerando-se o total de 6-9 estações, estima-se a capacidade de 48 a 72 estudantes trabalhando simultaneamente (16 a 24 alunos por laboratório). Quanto ao desenvolvimento de habilidades e orientações direcionadas aos docentes, há investimento na formação de professores que utilizem a criatividade e a inovação para o planejamento das atividades práticas, de maneira flexível e voltada para as necessidades de aprendizagem dos estudantes de acordo com os objetivos e competências exigidas pelo currículo, que é integrado. O professor deve deixar de ser aquele que apenas expõe, demonstra e condiciona, tornando-se mediador, motivador e provocador do processo ensino-aprendizagem. Para a elaboração das estações e das tarefas a elas atribuídas há uma lista de perguntas norteadoras sobre as quais o professor deve refletir com vistas ao planejamento satisfatório das atividades (Quadro 1).
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Quadro 1: Perguntas norteadoras para o planejamento e execução das tarefas relacionadas às estações no LMIM
1. Qual percentual do tempo de aula utilizado para orientações e para exposição de conteúdo? (deve ser o mínimo possível) 2. As estações estão em número e com duração suficiente para o tempo de aula? (2 a 3 estações para 100-110 minutos de aula em cada laboratório) 3. Como as estações se relacionam com o último ou com os dois últimos problemas da APG? (o professor deve compreender o seu papel em um currículo integrado e estar inteirado dos objetivos de aprendizagem dos problemas) 4. Como as estações se relacionam com o que está acontecendo nos outros ambientes do LMIM? (o professor deve trabalhar em sintonia com os conteúdos dos demais laboratórios de áreas afins) 5. Essa relação está implícita ou explícita? (na medida do possível, deverá se mostrar explícita) 6. Se estiver implícita, qual(is) mecanismos foram utilizados para conferir maior clareza ao estudante? (nesse caso, recursos como demonstração ou uma breve exposição poderão ser utilizados) 7. Houve interação básico-clínica na maioria das estações? (sim, desejavelmente) 8. No Laboratório de Cito/Histo/Genética/Embrio houve correlação explícita com a anatomopatologia e com a clínica? (sim, desejavelmente) 9. No Laboratório de Anatomia houve uma estação explícita de anatomia topográfica e uma de anatomia radiológica? Houve correlação anatomo-clínica? (sim, desejavelmente) 10. No Laboratório de Fisiologia houve correlação com a semiologia, farmacologia ou com a clínica? (sim, desejavelmente)
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11. Houve variabilidade de métodos e de estímulos entre as estações e entre as aulas? (sim, desejavelmente) 12. Quais os princípios pedagógicos utilizados em cada estação? (aprendizagem significativa, autonomia do estudante, auto-regulação da aprendizagem, trabalho em equipe, “aprender a aprender”, etc.). 13. Qual a opinião dos alunos sobre as estações? (o feedback dos educandos deve ser encorajado como um dos meios para o aprimoramento contínuo e dinâmico da parte dos docentes) 14. As estações são independentes entre si? Há certa autonomia dos alunos no cumprimento das tarefas/dos objetivos de cada estação? (pelo fato de, em alguns laboratórios - p.ex.: anatomia - haver apenas um professor para interagir com 2 ou 3 pequenos grupos simultaneamente).
A duração das atividades de cada um dos três laboratórios e o intervalos inter-rodízios devem ser respeitados, para que haja descontração e descanso por parte de todos os atores envolvidos: professores, alunos e técnicos. Geralmente empregam-se três tempos de 100-110 minutos com dois intervalos de 20-30 minutos. O delineamento dos conteúdos a serem trabalhados nas estações é feito com antecedência por um grupo de professores pertencentes a todas as áreas, básicas e clínicas, onde os conhecimentos, habilidades e atitudes esperadas para os estudantes, semanalmente, são distribuídas horizontalmente intra-módulo (Sistemas Orgânicos Integrados) e inter-módulos (Habilidades e Atitudes Médicas), ratificando a integração horizontal do currículo (Figura 3).
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Figura 3: Distribuição de conteúdos nas atividades educacionais de dois módulos (Sistemas Orgânicos Integrados e Habilidades e Atitudes Médicas) desenvolvidos no 1º período – exemplo: Sistema Circulatório.
DISCUSSÃO
Uma das maiores dificuldades da proposta do LMIM é a adaptação do professor que, no modelo tradicional de ensino, está habituado a ser o centro do processo de ensino-aprendizagem, utilizando como principal ferramenta a aula expositiva com transferência passiva de conteúdo, mediada ou não por roteiros de práticas laboratoriais. Participar desse novo conceito requer que o docente desconstrua vários paradigmas e busque inovações criativas para atingir os objetivos educacionais. Essa problemática é inerente à implantação de um currículo baseado no uso sistemático de metodologias ativas. Não obstante, há que se considerar também a necessidade de desenvolver, nos estudantes, uma nova forma de
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aprender e de interagir, pois a quase totalidade do corpo discente também é proveniente de modelos tradicionais de ensino: aulas expositivas do ensino médio ou de cursinhos pré-vestibulares. Busca-se, no contexto de um currículo integrado, e não apenas nas atividades laboratoriais, uma ressignificação do papel do professor em que ele precisa abandonar uma didática meramente instrumental e tecnicista em favor de uma prática reflexiva e articuladora dos múltiplos processos de formação (FERREIRA, 2016). O desafio de implantar e desenvolver o LMIM é contínuo. As estações criadas precisam permitir ajustes dinâmicos para correção de eventuais falhas em atingir os objetivos. Algumas limitações podem ser encontradas diante da dificuldade em abordar alguns temas muito conceituais que inviabilizam a criação de estações autônomas. Nesses momentos, vídeos explicativos ou pequenas exposições de conceitos são utilizados para introduzir o assunto a ser desenvolvido nas estações. Há necessidade de o professor perceber e quantificar, sumariamente, o conhecimento prévio dos estudantes para que as atividades não se desenvolvam muito além de suas capacidades, gerando desmotivação. O equilíbrio de “quando” e “quanto tempo” investir nessa estratégia é uma habilidade a ser desenvolvida pelo professor, vivenciando o processo no decurso das aulas - “aprender e construir fazendo”. A implantação do LMIM exige planejamento prévio, com previsão de infraestrutura e materiais a serem utilizados, além da descrição de toda a dinâmica de rotação nas estações. Equalizar o tempo de cada estação de forma a permitir que o rodízio ocorra sem comprometer a execução de todas as tarefas planejadas é uma incumbência que o professor precisa assumir, a fim de que os objetivos sejam alcançados e não haja prejuízo de conteúdos fundamentais. A disponibilidade de tempo para o planejamento de estações e de outras atividades educacionais permanece como desafio para o professor, principalmente se o campo de atuação do mesmo envolver
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outras carreiras. Nesse contexto, é salutar que sejam reforçadas as visões de que educar bem demanda reflexão, trabalho e planejamento e de que a maior preocupação do professor durante o período de preparação de uma atividade deve ser “o quê”- no sentido de se questionar para escolher conteúdos essenciais para a formação do profissional e “como” - no sentido de que sejam usadas estratégias que favoreçam o aprendizado do aluno. O professor assume o papel de gestor, organizador e mediador de percursos coletivos e individuais a serem percorridos pelos alunos (MORÁN, 2015). Assumindo o papel de mediador e planejador da aprendizagem nesse modelo, o professor responsável tem de atentar para a participação homogênea dos alunos em cada estação do LMIM. A diversidade entre os alunos e os eventos dispersivos, que diminuem a atenção dos alunos, prejudicam a atividade em equipe fazendo-se necessária a construção de estações com metodologias diferentes no mesmo dia a fim de buscar o interesse e a motivação do aluno continuamente. As estações onde há uma participação mais ativa do discente são as que logram maior êxito. Comandos para execução de tarefas relacionadas com os assuntos e objetivos de aprendizagem previstos para a semana e que finalizam com exemplos de aplicabilidade no exercício profissional aguçam mais a curiosidade dos alunos. Elaborar atividades em um contexto interdisciplinar, buscando integrar conhecimentos básicos com os clínicos, está no cerne do processo e proporciona ao aluno uma visão prática da atuação profissional, o que colabora para a sedimentação permanente do aprendizado. Algumas estações são finalizadas com perguntas sobre os assuntos abordados no laboratório a fim de que o próprio aluno avalie o seu nível de aprendizado. As respostas são disponibilizadas impressas ou esclarecidas pelo docente em um momento de fechamento da atividade. O feedback “dos alunos” e “aos alunos” assume papel fundamental no processo, pois, além de estimular uma autorreflexão
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sobre o aprendizado da semana, sinaliza as atividades e intervenções passíveis de aprimoramento para os atores envolvidos no processo. Nesse sentido, são requeridas técnicas apropriadas de feedback aliadas a ferramentas para monitoramento e verificação da aprendizagem (versus avaliação da aprendizagem) durante e após as atividades no LMIM (MCKIMM, 2009; LUCKESI, 2011). Sintetizam-se, abaixo, os principais desafios relativos à aplicação do modelo, partindo-se da premissa que todos os professores receberam formação específica para atuar em currículo baseado em metodologias ativas: - Manter a atenção dos alunos de forma homogênea; - Criar estações que sejam autônomas e, preferencialmente, reflexivas, já que nem sempre o professor consegue acompanhar o andamento de todas simultaneamente; - Encontrar ou desenvolver tecnologias e simuladores eletrônicos para algumas atividades ou temáticas em que esses recursos são escassos ou indisponíveis; - Adequar a metodologia a alguns assuntos de abordagem complexa, dificuldade que pode ser superada à medida que o professor se aproprie progressivamente de novas metodologias e tecnologias educacionais; - Diversificar as estações para manter a motivação e a atenção dos alunos; - Atentar para os eventos que dissipam a atenção dos alunos (conversas paralelas, celulares, desinteresse, dentre outros); - Cumprir fielmente o tempo destinado a cada laboratório, respeitando os intervalos previstos para descanso e restabelecimento intelectual; - Prover feedback oportuno e qualificado de forma contínua aos estudantes.
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CONCLUSÃO
O modelo do LMIM pretende demonstrar que é possível adequar as metodologias ativas nos ambientes de laboratório no curso de medicina e, potencialmente, em outros cursos da área de saúde. A estratégia é capaz de promover a interação entre a teoria e a prática de forma interdisciplinar e integrada, verticalmente e horizontalmente, com as unidades curriculares, colocando sempre o estudante como o centro do processo de ensino-aprendizagem, na busca autônoma de seu conhecimento mediado pelo professor. Estudos para avaliação do impacto educacional do uso do LMIM são necessários e estão sendo desenvolvidos. REFERÊNCIAS
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Capítulo 15 APLICAÇÃO DO TBL SOB A PERSPECTIVA DE DIFERENTES ÁREAS DO CONHECIMENTO Daniel Mapa Clemente Jader José de Carvalho Luciana Martins Ezequiel Sousa Lima Mariana Rezende Schuab Paulo de Jesus Chaves RESUMO
As metodologias ativas de aprendizagem são ferramentas que evidenciam o aluno como protagonista da construção do conhecimento. Dentre tais metodologias, a aprendizagem baseada em equipes, também conhecida como TBL (do inglês "team based learning”), é uma estratégia educacional empregada na educação que promove o desenvolvimento de competências fundamentais. Por intermédio dessa prática há o incentivo ao desenvolvimento da tomada de decisão e do trabalho colaborativo e efetivo em equipe. Tendo em vista a relevância da aplicação do método na formação dos discentes, a proposta desse trabalho é descrever e analisar experiências de aplicação do TBL nos cursos superiores de Administração, Engenharia de Produção, Engenharia Civil, Psicologia e Educação Física do Centro Universitário Presidente Tancredo de Almeida Neves no ano de 2018. A análise foi realizada com base no feedback dos discentes participantes por meio da aplicação de questionários após a prática, e na percepção dos aplicadores. Deste
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modo, puderam ser apontados os pontos fortes da metodologia proposta e as oportunidades de melhoria para experiências futuras, em cada área analisada. Foi constatado que, de modo geral, há grande adesão e aceitação do método nos cursos analisados. Além disso, verificou-se a necessidade de existir uma explicação para o entendimento da ferramenta, seja para quem irá aplicá-la ou o preparo para quem irá fazê-la. De qualquer maneira, evidenciouse que as etapas e a condução da aplicação da ferramenta devem ser realizadas de forma clara e informativa para que não existam barreiras à sua execução. INTRODUÇÃO
De acordo com Freire (2014), o ensino não deve objetivar formar profissionais com o perfil de obediência ou reprodução de leis e atitudes que foram aprendidas na escola. Esse aspecto do autor revela um caráter de liberdade de ensinar e aprender, com a integração dos componentes do ensino e aprendizagem ao processo de estruturação do conhecimento. Nesse sentido, uma ação metodológica ativa mais exigente se faz necessária, possibilitando a compreensão, e por outro lado, outorga a autonomia de erigir seu próprio conhecimento (SISK, 2011). Dentre outras formas de ensinar, por meio das metodologias ativas, destaca-se a aprendizagem em equipes (TBL, do inglês "team-based learning”). O TBL é um recurso ativo de ensino, possibilitando uma atmosfera motivadora e altamente coorporativa (CHNG et al., 2011). Esse método revela uma grande aderência por parte dos discentes por se sentirem construtores do seu próprio conhecimento (ZGHEIB et al., 2011). Isso propicia aos estudantes um ambiente educacional mais fomentador, avultando o interesse pelos assuntos abordados em sala de aula (MICHAELSEN et al., 2004). Dentre os vários benefícios do TBL para a educação, destacam-se, além do envolvimento dos alunos, uma otimização do ensino-aprendizagem e maior qualidade na comunicação (RAVINDRANATH et. al, 2010). 214
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O TBL modifica o formato de aula tradicional e em especial o papel do professor. Em vez de um instrutor que apenas transmite os conceitos para os alunos em sala de aula, no TBL, o professor tem a função de mediador e os estudantes têm a responsabilidade de buscar e debater o conhecimento. O aluno que é o protagonista do processo de aprendizagem (THOMPSON et al., 2007). Como será estudado, o TBL segue uma metodologia e requer um preparo antecipado das atividades a serem aplicadas. Não foi encontrada na literatura nenhuma restrição quanto ao uso da técnica nas diferentes áreas do conhecimento. Torna-se, portanto, interessante entender se há diferenças na preparação, aplicação e no feedback dos alunos de diferentes cursos acerca das atividades (KIM et. al, 2012). Ainda, a descrição e troca de experiências de aplicação TBL pode auxiliar o docente na preparação de sua própria atividade. O presente capítulo busca descrever e analisar experiências de aplicação do TBL nos cursos superiores de Administração, Engenharia de Produção, Engenharia Civil, Psicologia, Educação Física e na capacitação dos professores do Centro Universitário Presidente Tancredo de Almeida Neves (UNIPTAN), São João del Rei-MG. PREPARAÇÃO DAS ATIVIDADES
De acordo com Bollela et al. (2014), a estruturação de uma atividade de TBL se inicia pela formação de equipes, que deve conter entre cinco e sete alunos. Tal grupo deve ser constituído de forma heterogênea a fim de garantir com que haja equilíbrio entre as equipes. Como é mostrado na Figura 1, o TBL permite com que o aluno se engaje e aprenda por meio de uma sequência de atividades, que serão descritas de forma resumida a seguir. Reforça-se que o objetivo desse capítulo não é a descrição da técnica, o qual se recomenda a leitura das referências desse capítulo. Entretanto, uma compreensão das etapas faz-se necessária para compreender como foi realizado o preparo das atividades analisadas nesse capítulo. 215
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Figura 1: Passos do TBL. Elaborado pelos autores.
A primeira etapa da metodologia, conforme descrito por Bollela et al. (2014), consiste de uma atividade de preparo préclasse, que pode incluir filmes, estudos individuais, dentre outros. Os professores responsáveis pela preparação do TBL no UNIPTAN utilizaram-se de videoaulas, textos e artigos científicos de sua área de conhecimento para essa etapa. Ainda, cada professor utilizou materiais relacionados à sua área de atuação e algumas situações interligadas a sua disciplina. Na etapa seguinte, em sala de aula, ocorrem testes para verificação desse preparo. O termo Rat (“Readness assurance test”) pode ser traduzido como "Garantia do preparo” e objetiva verificar se o estudante está apto a realizar atividades de forma individual e auxiliar sua equipe nas fases seguintes. O i-Rat consiste de um teste individual contendo de 10 a 20 questões objetivas e que devem ser respondidas pelo estudante sem qualquer consulta a outros materiais (Bollela et al., 2014). O g-Rat é a garantia de preparo em grupo, a ser realizado pela equipe pré-estabelecida. Nesse teste, os estudantes respondem às mesmas perguntas da etapa anterior. Há, portanto, discussão acerca da escolha da melhor resposta, o que reforça a responsabilidade dos alunos junto aos seus colegas e promove comunicação e argumentação, dentre outras habilidades (Bollela et al., 2014). É importante que o grupo tenha acesso a um mecanismo de feedback imediato, seja eletrônico ou não, como uma raspadinha ou cartão 216
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de respostas com adesivos. Dessa forma, podem debater sobre as escolhas tomadas e optar por nova resposta em caso de erro. Os professores do UNIPTAN utilizaram de adesivos em suas atividades para fornecer esse feedback, como pode ser visto na Figura 2.
Figura 2: Exemplo de cartão de feedback. Elaborado pelos autores.
A seguir, segundo Bollela et al. (2014), ocorre a apelação, no qual os grupos que não concordarem com a resposta podem contra argumentar. A apelação deve ser realizada formalmente por escrito, em formulário próprio e deve conter argumentos claros e embasados na literatura. Por último, ocorre a aplicação dos conceitos por meio da proposição de um problema significativo, relacionado com a área de atuação da futura profissão do estudante. Essa atividade pode ser realizada por meio de questões objetivas, questões abertas ou "verdadeiro ou falso". Há algumas características relevantes nessa etapa: primeiramente, ela deverá ser a mais longa, uma vez que culmina na aplicação do conhecimento adquirido ao longo das etapas. O problema, como já mencionado, deve ser significativo, o que permite com que o estudante se prepare para situações reais no mercado de trabalho. Todas as equipes devem receber o mesmo problema, de forma a promover o diálogo e debate próximo ao fim da atividade. As respostas devem ser bastante claras e curtas, possibilitando sua visualização pelos outros grupos. 217
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Como forma de auxiliar o docente no entendimento do TBL, segue abaixo um descritivo de algumas das atividades aplicadas. No curso de Engenharia de Produção do UNIPTAN, o TBL foi aplicado na disciplina de fenômenos de transporte e o tema da fase de aplicação do conceito foi o dimensionamento de fornos, aspecto real que um engenheiro poderá lidar em sua vida profissional. Na atividade, os alunos deveriam indicar qual o material mais indicado para o forno em questão, baseado em dados relacionados com a disciplina. A atividade contou ainda com amostras reais dos materiais utilizados na prática industrial. Como material pré-classe foi enviado um pequeno texto contextualizando o dimensionamento de fornos. No curso de Engenharia Civil, foi aplicado o TBL na primeira semana de aulas do período letivo nos seguintes períodos e disciplinas: segundo período, Desenho Técnico Computacional; quarto período, Mecânica dos Solos I e sexto período, Estradas de Rodagem II. Objetivou-se utilizar a metodologia como atividade niveladora, visto que em todas as disciplinas aplicadas é requerido um conhecimento prévio de disciplinas anteriores cursadas pelos alunos. O material pré-classe foi de livre escolha, sendo os alunos instruídos que haveria uma dinâmica niveladora para revisar os conhecimentos prévios, e assim direcionar melhor o foco e o andamento da disciplina adequando-se às características da turma. Na aula seguinte foi aplicado um teste individual com dez questões objetivas. O mesmo teste foi aplicado para as equipes, que foram formadas por meio de sorteio, de forma a favorecer a heterogeneidade dos grupos. Na sequência foram apresentadas duas situaçõesproblema, aplicadas à ementa da disciplina e à vivência da rotina profissional de um engenheiro civil. Além disso, na aula seguinte foi aplicado um questionário para que os alunos pudessem expor suas opiniões e experiências com a atividade proposta, sugerir melhorias e relatar inconformidades.
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Ainda no curso de Engenharia Civil do UNIPTAN, foi realizado um TBL na disciplina de Física I (Fundamentos de Mecânica Clássica) no segundo período. O objetivo dessa atividade foi rever os conceitos sobre cinemática, estudados no ensino médio, para trabalhar com problemas mais próximos da realidade, no ensino superior, por meio de ferramentas matemáticas mais sofisticadas, como o cálculo diferencial. As equipes foram compostas por cinco alunos. Na formação dos grupos, as diferenças em relação ao conhecimento e ao perfil pessoal (tímido ou extrovertido) foram priorizadas a fim de favorecer o surgimento de equipes com níveis parecidos de interatividade. Na primeira fase, a pré-classe, foi disponibilizado para os alunos uma vdeoaula com duração de 15 minutos sobre cinemática. Na etapa seguinte foi aplicado um teste com 10 questões de múltipla escolha elaborado a partir da videoaula. Na terceira e última fase foi proposto que as equipes solucionassem um problema simulando uma situação real. Para isso, as equipes tiveram que aplicar os conceitos de cinemática discutidos nas duas etapas anteriores. No curso de Administração do UNIPTAN, a disciplina de Organização Sistemas e Métodos foi escolhida para a aplicação de um TBL e a atividade foi realizada para validação do projeto integrador do curso (construção de um negócio real pelos alunos) e para conduzir as etapas realizadas no projeto de forma mais profissional possível pelos docentes. Isso significou, trabalhar primeiramente com envio prévio de um vídeo sobre a questão da sustentabilidade, e, posteriormente, com questões relacionadas aos tipos de negócios escolhidos por cada equipe. Nas próximas etapas, cada equipe foi dividida em tarefas e funções interligadas para resolução de uma situação existente na cidade de SJDR por meio da criação de um negócio. Tanto o professor como a própria equipe avaliaram as atividades realizadas por cada participante. Após avaliação, foi dado um feedback à equipe e a cada membro participante, a fim de realizar melhorias no processo de construção dos negócios, bem como melhorar o desempenho dos seus membros e o seu desenvolvimento.
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O TBL também foi aplicado nos cursos de Psicologia e Educação física do UNIPTAN, seguindo a mesma metodologia. Verifica-se que a preparação da atividade, independentemente da área do conhecimento, centraliza a busca por conhecimento no aluno, que se torna personagem principal do processo de aprendizagem. APLICAÇÃO DO TBL
A aplicação do TBL foi realizada pelos diferentes cursos no UNIPTAN e suas principais características são relatadas a seguir, sendo o maior foco dado à última fase, de aplicação do conceito por meio de um problema significativo. Com relação à etapa pré-classe, como já foi descrito, buscouse reduzir o volume de informações enviadas, de forma a centrar esforços nos pontos cruciais das atividades e tornar possível que todos pudessem realizar essa etapa. Verificou-se que o controle dessa etapa, no sentido de contabilizar os alunos que fizeram a atividade, é complexa. Assim, é importante ressaltar que a etapa de preparo é altamente dependente do aluno. A etapa de garantia de preparo individual (i-Rat) foi aplicada em todos os cursos com bastante tranquilidade. Verificou-se em todas as turmas que o comportamento dos alunos na execução dessa fase foi semelhante à de uma prova tradicional. Na etapa do g-Rat, os alunos argumentam sobre a resposta correta, o que estimula a comunicação entre os mesmos. Considerando que a formação dos grupos favorece a troca de ideias entre membros que possivelmente não se comunicam com frequência, essa situação acaba por simular o mercado de trabalho, no qual são necessárias habilidades para comunicação transfuncional. Um fato em comum na aplicação de todos os TBL's foi que, no momento da divisão das equipes, houve reclamações quanto à separação dos grupos já "existentes" em sala. A metodologia requer equilíbrio entre os grupos. Portanto, foi necessário diá-
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logo para demonstrar aos alunos a importância dos critérios de formação dos grupos. Após essa etapa, Bollela et al. (2014) ressalta a importância do feedback imediato como forma de auxiliar os alunos no processo de aprendizagem. O sistema de raspadinhas ou adesivos permite que os alunos escolham uma resposta e, caso não seja a verdadeira (fato que se revela ao remover o primeiro adesivo ou raspadinha), tomem nova decisão acerca da resposta correta. No UNIPTAN, essa característica da metodologia levou os alunos a repensarem suas posições e a forma de resolver o exercício. Em busca da resposta correta, eles tiveram de trocar experiências e ideias entre si, o que é positivo para o processo de aprendizagem. É ainda interessante destacar que não foi verificada apelação nos TBL's aplicados. A terceira etapa, conforme já mencionado, possui grande importância metodológica. Como é uma atividade no qual é proposto um problema significativo, fica nítido o maior engajamento dos estudantes. Ao mostrar as respostas, os grupos devem fazê-lo de forma simultânea, diminuindo a interferência entre elas. Nessa etapa, ficou claro aos professores a necessidade do gerenciamento do tempo da atividade, uma vez que as discussões podem tomar um tempo exagerado, vindo a prejudicar a atividade. Ao fim da atividade, foram aplicados questionários para os alunos, de forma a receber feedback das atividades realizadas. Destaca-se que, de forma geral, a aceitação das atividades foi bastante satisfatória. Verificou-se que os alunos se interessam bastante pela etapa em grupo, o que pode demonstrar certo desconhecimento acerca da construção do conhecimento ao longo das etapas. A Figura 3 mostra uma compilação dos dados do feedback dos alunos a respeito do TBL aplicado na disciplina de Fenômenos de Transporte (Engenharia de Produção), comprovando esse fato.
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Figura 3: Compilação de dados do feedback dos alunos da disciplina de Fenômenos de Transporte (Engenharia de Produção). Elaborado pelos autores.
Ainda, é importante destacar que nenhum aluno marcou a opção "Não achei interessante", o que reforça a aceitação da atividade. Em destaque, a fatia representando o termo "Outro" se refere em sua maioria à pedidos de alunos para que os grupos não fossem escolhidos de forma aleatória. O mesmo fato foi relatado por professores que aplicaram TBL's nos outros cursos. Portanto, reafirma-se a ideia de que a metodologia deve ser explicada aos alunos antes de sua aplicação. CONCLUSÃO
De forma geral, verificou-se uma boa aceitação da metodologia nas cinco áreas do conhecimento em que foi aplicado o TBL, que foi comprovado por meio da aplicação de formulário de feedback. Analisando-se os dados do estudo realizado, poder-se-á citar que algumas condicionalidades devem existir para que o TBL seja aplicado com êxito. Na maioria dos relatos, a questão "tempo" e a discriminação de cada etapa, bem como seu preparo, foram de 222
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suma importância para o desenvolvimento das atividades. Uma dificuldade encontrada foi a resistência inicial de alguns participantes em serem separados das equipes habituais. Nesse contexto, finaliza-se esse capítulo propondo uma reflexão acerca do incentivo da mudança cultural, por parte dos docentes, na percepção dos alunos quanto ao TBL. Deve haver um cuidado com a interação mediador/aluno e a preparação do ambiente, incentivando a participação como passo para o desenvolvimento individual do aluno e, consequentemente, a construção de sua autonomia. REFERÊNCIAS
BOLLELA, V. R.; et al. Aprendizagem baseada em equipes: da teoria à prática. Medicina (Ribeirão Preto. Online), 2014, 47.3: 293-300. CHNG E, Y. E.; SCHMIDT, H. G. Effects of tutor-related behaviours on the process of problem-based learning. Adv Health Sci Educ Theory Pract. 2011;16(4):491-503. FREIRE, P. Pedagogia da autonomia: saberes necessários à prática da educativa. 49. ed. Rio de Janeiro: Paz e Terra, 2014. KIM, M. K; et al. Incorporation of Bloom’s taxonomy into multiple-choice examination questions for a pharmacotherapeutics course. Am J Pharm Educ. 2012. MICHAELSEN, L. K.; et al. Team-Based Learning: a transformative use of small groups in college teaching. Sterling, VA: Stylus Publishing, LLC, 2004. p. 27-50. RAVINDRANATH, D; et al. Trainees as teachers in team-based learning. Acad Psychiatry. 2010. SISK, R. J. Team-Basead Learning: Systematic Research Review. Journal of Nursing Education, v. 50, n. 12, p. 665-9, 2011. THOMPSON, B. M.; et al. Team-based learning at ten medical schools: two years later. Medical Education, v. 41, p. 250- 257, 2007. ZGHEIB, N.K; et al. Using team-based learning to teach clinical pharmacology in medical school: student satisfaction and improved performance. J Clin Pharmacol. 2011.
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Capítulo 16 VISITA GUIADA COMO METODOLOGIA ATIVA NO ENSINO DE HISTÓRIA DA PSICOLOGIA Rodolfo Luís Leite Batista
RESUMO
As transformações originadas com as tecnologias de informação e comunicação geram debates acerca da eficiência dos processos educativos e da formação dos estudantes. Mudanças pedagógicas são necessárias para atender de maneira mais adequada às demandas da sociedade contemporânea e as metodologias ativas de aprendizagem se apresentam como alternativa neste cenário. Esse conjunto de práticas pedagógicas de enfoque construtivista buscam ampliar o interesse, o engajamento e a aprendizagem em diferentes níveis de ensino. Este capítulo discute a realização de visitas (guiadas e/ou técnicas) como uma metodologia ativa de aprendizagem e apresenta uma experiência no ensino de graduação. Busca-se também ampliar a produção sobre a docência de história da psicologia, em razão da escassez de trabalhos brasileiros sobre esse tema. Para tanto, descreve-se o planejamento da visita como prática pedagógica - de sua organização à avaliação. Considera-se que esta atividade permitiu, aos estudantes, expandir seu espaço de aprendizagem; identificar indícios históricos da presença da psicologia em contexto local e favoreceu a integração de estratégias de pesquisa, mediação de conteúdos programáticos e atividades 225
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práticas. Ao professor, garantiu a reflexão sobre suas estratégias de ensino e a adequação de seu repertório profissional ao público atendido. Espera-se que este trabalho contribua com o debate sobre metodologias ativas de aprendizagem e com as reflexões sobre a ampliação do espaço educativo para o ensino superior. INTRODUÇÃO
Vivemos um período de transformações originadas por desenvolvimento de tecnologias de informação e comunicação, que tem impactado o cotidiano da educação desde o nível básico ao ensino superior. Essas tecnologias afetam a constituição do ser humano, alterando suas formas de aprender e ensinar, e desafiam os educadores a modificar suas práticas pedagógicas para melhor receber seus alunos e potencializar seus processos de aprendizagem. Como ensinar nos dias de hoje? Os professores têm sido incentivados a construírem novas formas de transmissão de informações, uma vez que estratégias didáticas consideradas tradicionais e amplamente difundidas em universidades se mostram cada vez mais insuficientes em uma sociedade tecnológica. No entanto, seria ingênuo considerar que a inovação resida exclusivamente no uso de dispositivos digitais em sala de aula. Nesse sentido, Rocha (2014) argumenta que a implantação de mudanças efetivas na docência está condicionada à compreensão, por parte do professor, dos motivos pelos quais as mudanças são operadas e, somamos a isso, à necessidade de democratização de acesso a tecnologias digitais de qualidade. Uma alternativa construída nesse cenário são as metodologias ativas e a formação docente para essa perspectiva pedagógica. Este capítulo discute a realização de visitas (técnicas e guiadas) como uma metodologia ativa de aprendizagem. Para tanto, consideramos algumas definições e exemplos dessas metodologias. Aproximamos as visitas a propostas pedagógicas atuais e apresentamos nossa experiência de ampliação do ambiente de aprendizagem, na qual o espaço urbano foi apropriado para o ensino de
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história da psicologia. Esperamos contribuir para a prática docente daqueles que buscam atender os princípios e compromissos da legislação educacional brasileira, acompanhando as demandas contemporâneas. AS METODOLOGIAS ATIVAS DE APRENDIZAGEM: BREVE CONCEITUAÇÃO E EXEMPLOS
As metodologias ativas de aprendizagem são definidas de várias maneiras. Moran (2015) afirma que elas são práticas, jogos, projetos, atividades personalizadas e/ou colaborativas que permitem ao aluno aprender melhor. Essas estratégias contribuem para a construção de processos mais avançados de reflexão, integração cognitiva, generalização e reelaboração de práticas. Para Pereira (2017), são propostas construtivistas que buscam levar o estudante a autonomia e ao gerenciamento da própria aprendizagem. Elas são técnicas que favorecem as capacidades críticas e reflexivas do educando e, consequentemente, o seu real engajamento no processo educativo (LIMA, 2017). Neste início de século, o uso das metodologias ativas tem reconfigurado as feições das instituições educativas, pois, para serem implementadas, elas exigem novas formas de organizar os currículos, processos, espaços e rotinas de ensino. Entretanto, é importante ressaltar que não é preciso uma reformulação geral das instituições e das práticas docentes para que essas metodologias possam ser implementadas. Desse modo, Pimentel e Teixeira (2018) apresentam possibilidades de adequação de atividades usuais dos professores (como a realização de aulas participativas, as atividades mediadas em grupo, o uso das redes socais e as práticas individuais em sala) à lógica das metodologias ativas. As autoras defendem que essas adaptações são fundamentais para que o professor gradativamente reconstrua seu perfil profissional e não encontre grandes dificuldades na aplicação metodológica nas salas de aula.
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São diversas as modalidades de metodologias ativas. As leituras e os estudos dirigidos, os estudos de caso e a resolução de questões-problema são exemplos de práticas costumeiramente conduzidas pelos professores e que podem ser adaptadas de modo a garantir maior participação do estudante em sua execução. Há também o uso das tecnologias de informação e comunicação, dos jogos pedagógicos e propostas de gamificação. Ademais, existem modelos de aprendizagem por pares (o Peer Instruction) ou em times (o TBL - Team Based Learning), os projetos integradores e a aprendizagem baseada em projetos ou problemas (o PBL - Problem Based Learning). Os PBLs, criados originalmente para o ensino de Medicina, preveem o estabelecimento de papéis em grupos tutoriais de aprendizagem e podem ter objetivos investigativos, construtivos ou explicativos. Cada modalidade deve ser utilizada respeitando os princípios formativos do nível de ensino. Nos cursos de graduação, a inserção dessas metodologias concretiza competências e habilidades profissionais conforme as Diretrizes Curriculares Nacionais. É desejado que as metodologias ativas modifiquem os modos de agir da comunidade escolar. De seu lado, o professor é convidado a deixar o papel de detentor e transmissor unilateral de informações e deve assumir função mais flexível e dinâmica de mediador de conteúdos. Para isso, ele precisa identificar e conhecer os sentidos envolvidos na formação de seus estudantes, dialogando de maneira a motivá-los e a tornar a aprendizagem significativa (MORAN, 2014). Esse entendimento das intenções e expectativas dos alunos favorece a proposição de atividades pertinentes, que serão realizadas com mediação do docente. Por sua vez, o estudante cria novas formas de usar as tecnologias digitais em favor de seu estudo; ressignifica práticas tradicionais de ensino, remodelando-as às necessidades de seu tempo, e reconhece a importância de sua ação coordenada para o aprendizado de conteúdos programáticos e a construção de uma postura cidadã. Em síntese, as metodologias ativas exigem uma reconfiguração da prática docente em favor da
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construção de novos perfis de estudantes e a formação de profissionais preparados para demandas atuais. A literatura revisada mostra diversas vantagens das metodologias para o ensino de graduação, como a ampliação do interesse e da participação dos estudantes como resultado de práticas pedagógicas mobilizadoras. Além disso, elas ocasionam a retomada de diversos saberes (pessoais, afetivos, artísticos, científicos, etc.) e promovem a integração entre teoria e prática durante a aprendizagem. Em contrapartida, os alunos podem se dispersar facilmente das tarefas propostas, exigindo do professor contínua flexibilidade para que seus objetivos sejam alcançados adequadamente. Embora não sejam práticas dispendiosas, o planejamento de aulas em metodologias ativas demanda tempo de preparação do docente e financiamento das instituições de ensino. Nesse sentido, políticas educacionais e institucionais efetivas são bem-vindas para que esses métodos não se tornem mais um modismo acadêmico. A REALIZAÇÃO DE VISITAS PARA O ENSINO DE DIFERENTES DISCIPLINAS
Ao produzirmos uma breve revisão em periódicos e eventos dedicados a métodos de aprendizagem, encontramos publicações que caracterizam as visitas guiadas e as visitas técnicas como metodologias ativas usadas nos diferentes níveis e modalidades de ensino previstos pela legislação brasileira. Junqueira (2017) relata uma experiência de visita técnica como recurso pedagógico para o curso técnico em Química de uma cidade do Rio Grande do Sul. Monezi e Almeida-Filho (2005) argumentam a importância da visita técnica para o ensino de Engenharias. Nesse sentido, Mingotte et al (2018) apresentam uma experiência de ensino híbrido em que foram articulados a visita técnica e a sala de aula invertida para o curso de Engenharia Agronômica, no interior paulista. Souza (2015) descreve a utilização dessa metodologia em cursos de licenciatura em Ciências Biológicas, em Roraima. Por sua vez, Badaró et al (2016) pesquisaram qualitativamente a percepção de
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estudantes em Enfermagem sobre a realização de visitas técnicas para o aprendizado de habilidades de administração hospitalar. Esses alunos apontaram a aproximação com o mercado de trabalho e a integração teoria-prática como aspectos positivos desse método de ensino. Há também estudos sobre a realização de visitas guiadas para a docência em História (COMPAGNONI, 2008; SILVA, 2010). Os exemplos mencionados mostram a diversidade de áreas do conhecimento em que as visitas podem ser utilizadas para aumentar o engajamento dos estudantes nas práticas de ensino ou desenvolver habilidades e competências referentes a perfis profissionais específicos. Diante disso, perguntamo-nos: o que podemos denominar como visitas guiadas e visitas técnicas? Ao utilizarmos esses conceitos, descrevemos as mesmas práticas de ensino? Mais adiante, esclarecemos estes e outros pontos. AS VISITAS GUIADAS
A visita guiada é a visitação a determinado ambiente (reconhecido por sua importância social, cultural ou natural), acompanhada por profissionais nele especializados. É uma prática de ensino bastante difundida em instituições de ensino norte-americanas e europeias e, em contexto brasileiro, bastante utilizada na educação básica. A realização desse tipo de visitas possibilita que os estudantes interajam com o patrimônio material e imaterial de uma comunidade e reflitam sobre os elementos constituidores da identidade local. A visita guiada é um método de aprendizagem baseada na concepção de que o espaço urbano - e as instituições nele estabelecidas - como um território de formação humana. Nesse sentido, Araújo e Quaresma (2014) caracterizam dois modos de interação entre o estudante e o espaço visitado: por um lado, amplia-se o conhecimento apresentado em sala de aula e, por outro, constroem-se novos saberes (acadêmicos ou não) em sua experiência durante a atividade.
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Para que a visita guiada atinja adequadamente seus objetivos, é fundamental que o professor e seus estudantes a planejem com antecedência. Araújo e Quaresma (2014) propõem quatro etapas para sua efetivação. Na primeira delas, o professor determina o local a ser conhecido e estabelece um pré-roteiro de visita com base em seus objetivos de ensino, para que os estudantes interajam com a realidade local. Em seguida, realizam-se aulas preparatórias à visita guiada, nas quais os alunos são munidos de informações para o bom aproveitamento da atividade. Nesse momento, é aconselhado que o professor também discuta as estratégias avaliativas, garantindo o bom enquadre da tarefa e que a visita não seja vista como mero passeio. A terceira etapa é a execução da visita propriamente dita, quando o grupo é acompanhando por profissionais ou técnicos no ambiente a ser conhecido. Por fim, ao retornar à sala de aula, realizase a avaliação proposta mediante à produção de registros orais, iconográficos e/ou escritos, articulando-os aos conteúdos trabalhados. Nessa fase final, o professor pode construir estratégias de ensino híbrido em que articule a visita guiada a outras metodologias ativas. A principal vantagem das visitas guiadas é possibilitar aos estudantes refletirem sobre as relações entre o ser humano e seus espaços de circulação a partir de diferentes campos disciplinares. Por exemplo, visitar um museu ou uma exposição artística permite problematizar o papel da memória social no cotidiano e aspectos referentes à preservação e à conservação de peças históricas. Quando realizada em uma empresa ou indústria, evidencia a função social do trabalho em suas manifestações ligadas a produção e gestão. Desse modo, a visita guiada possibilita a mediação dos conteúdos programáticos, gera prazer estético e a reflexão acerca de relações entre indivíduo e sociedade. AS VISITAS TÉCNICAS
A visita técnica é uma estratégia de ensino bastante consolidada na educação profissionalizante e tecnológica e em cursos de
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graduação de diversas áreas – especialmente nas de Saúde. É uma atividade conduzida em grupos, mas que também exige o comprometimento individual do estudante. Embora geralmente produza menor fruição estética, esse tipo de visita é fundamental para que o aluno acesse ambientes reais onde sua futura profissão é exercida. No contexto das metodologias ativas, ela tem recebido novos significados: deixando de ser entendida somente como vistoria a ambientes de trabalho, passa a ser vista como real possibilidade de aprendizado de papéis laborais. Para que a visita técnica tenha êxito, é necessário que ela seja adaptada às peculiaridades dos diferentes níveis de ensino. Nesse sentido, o professor também deve considerar os objetivos e os conteúdos programáticos de ensino, inserindo-a em uma sequência didática e adequando-a sempre que necessário. Em uma recente publicação sobre metodologias ativas, o Serviço Nacional de Aprendizagem Comercial (2018) sugere a organização de uma visita técnica em três grandes etapas: inicialmente, em contato com os estudantes, o professor prepara os roteiros, levanta informações e faz um planejamento operacional (meios de transporte, horários, custos, etc.) da atividade. Em seguida, procede-se a visita propriamente dita, quando os estudantes utilizam variados recursos para se inserirem e avaliarem o local inspecionado. Finalmente, são apresentadas as conclusões, mediante à análise de informações produzidas durante a atividade e são executadas as estratégias avaliativas (como os já mencionados relatórios descritivos, debates, seminários e rodas de conversa). Os estudos sobre visitas técnicas mostram que elas motivam os estudantes a interagir com ambientes produtivos, permitindolhes se colocar em situações de aprendizagem em cenários reais de trabalho. Elas permitem a contextualização teórico-prática de conteúdos discutidos em sala de aula e aprofundam temáticas do curso por meio de práticas ativas e reflexivas. Dentre outras, essas são importantes vantagens da visita técnica.
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UMA VISITA PELO NÚCLEO HISTÓRICO DE SÃO JOÃO DEL-REI COMO ESTRATÉGIA PARA O ENSINO DE HISTÓRIA DA PSICOLOGIA
Diversos pesquisadores (FIERRO, 2014; LHULLIER, 2009) defendem investigações sobre o fazer docente e a produção de materiais didáticos para o ensino de história da psicologia, a fim de que essa disciplina não seja caracterizada como desinteressante, enfadonha ou um passatempo de intelectuais. Para evitar essas concepções, o recurso a metodologias ativas de aprendizagem pode ser uma boa solução. Na produção internacional, há relatos de criação de jogos de tabuleiro, jogos de cartas e calendários históricos por estudantes de universidades estadunidenses (ABRAMSON et al., 2009). Outro trabalho mostra o uso do Google Earth para conhecer locais prestigiosos para a psicologia ao redor do mundo (STEVISON, BIGGS, ABRAMSON, 2010). Em nosso país, há produções e práticas ativas no ensino de história da psicologia na graduação e na pósgraduação (LOUREIRO; BAPTISTA, 2007): na PUC-SP, Guedes (2014) e Barêa (2009) produziram materiais didáticos, jogos interativos e exposições como estratégias para disseminação de conhecimento. Na UERJ, ocorrem visitas guiadas ao centro do Rio de Janeiro e ao Instituto de Pesquisa e Memória Pretos Novos com estudantes de psicologia. Na UFMG, passeios ao Memorial Helena Antipoff, em Ibirité, são feitos durante eventos de pesquisadores da área. No interior gaúcho, exibem-se desenhos animados e outras práticas de ensino acontecem em um centro de memória. Nessa esteira, buscamos inserir a experiência aqui descrita, ocorrida em São João del-Rei. O curso de Psicologia do Centro Universitário Presidente Tancredo Neves foi implantado no 1° semestre de 2018, em São João del-Rei. A história dessa cidade se construiu marcada pela exploração aurífera e arquitetura barroca durante o período colonial. No último século, a cidade buscou retomar sua importância político-econômica na região, perdida com o declínio do ciclo do ouro, por meio da criação de fábricas têxteis e de reformas urbanas.
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Hoje, é reconhecida pelo turismo histórico e vida universitária. O levantamento de obras raras na Biblioteca Baptista Caetano de Almeida (NEPOMUCENO; CAMPOS, 2004) e pesquisa sobre um laboratório de psicologia (BATISTA, 2015) mostram a relevância local também para a história da psicologia em Minas Gerais. Destarte, realizar uma visita pelo núcleo histórico são-joanense se torna uma possibilidade de refletir acerca da historicidade da constituição humana (e das ciências que a tomam como objeto) em diferentes períodos e informar-se sobre a história da psicologia em contexto local e métodos historiográficos. Esta visita buscou tornar os estudantes capazes de discutir as dimensões (políticas, econômicas e sociais) que perpassam a produção de práticas/saberes psicológicos e reconhecer a importância da unidade curricular “História da Psicologia: ciência e profissão” para sua formação profissional. Desse modo, o docente apresentou a proposta de atividade e agendou sua realização com os alunos. A partir de então, os estudantes foram orientados a pesquisarem individualmente instituições de guarda da memória são-joanense e informações sobre a história da psicologia local. Ocorreram aulas expositivas sobre os objetos, os métodos e a importância do estudo de história da psicologia, para que os estudantes se informassem a respeito da produção acadêmica dessa disciplina. Passou-se à visita propriamente dita: na data acordada, os estudantes percorreram, em pequenos grupos, diferentes trajetos entre o centro universitário e o núcleo histórico, motivados a identificarem elementos que constituíram a identidade local. Ademais, identificaram dispositivos psicológicos (como clínicas, consultórios, serviços de trânsito e educação) e construíram questionamentos sobre a profissionalização da psicologia e sua presença no mercado de trabalho local. O professor buscou sanar dúvidas surgidas ao longo do trajeto e construiu articulações com os temas trabalhados em sala de aula. Após a visita, os estudantes retomaram suas pesquisas e registros para produzirem relatórios narrativos, que serviram como avaliação da atividade e auxiliaram a discussão, em sala de aula invertida,
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sobre tópicos em história da psicologia. O recurso a narrativas é aconselhado para motivar os estudantes a produzirem autonomamente o conhecimento (MORAN, 2015). Ao avaliarmos nossa experiência, consideramos que esta visita integrou os três movimentos indispensáveis para que a aprendizagem ativa tenha êxito: o individual, o grupal e o orientado (MORAN, 2015). Os estudantes construíram conhecimento por meio da preparação prévia para a atividade em aulas expositivas e com leituras e pesquisas realizadas autonomamente. Eles também compartilharam informações com colegas de classe e, orientados pelo professor, interagiram no/com o espaço visitado. Este foi o momento grupal da aprendizagem. Enfim, os estudantes integraram conteúdos programáticos e informações adquiridas, realizando a avaliação da atividade mediante à escrita do relatório. Essa sequência didática tornou a aprendizagem mais significativa e contextualizada, equilibrando-a em seus níveis individual e grupal. CONSIDERAÇÕES FINAIS
Este capítulo apresentou as visitas (técnicas e guiadas) como metodologias ativas para diferentes níveis de ensino. Elas superam dificuldades encontradas, especialmente, na aplicação de práticas ativas às ciências humanas e devem ser cada vez mais utilizadas no ensino universitário. Também são vantajosas pela interdisciplinaridade, pois permitem a integração de conteúdos com origens distintas em uma atividade coordenada. Nossa experiência mostrou como a visita guiada pode dar concretude e interatividade ao ensino de história da psicologia, tornando conteúdos mais significativos. Em síntese, as atividades pedagógicas fora da sala de aula se constituem como valioso instrumento de aprendizagem, cuja utilização deve ser estimulada como fator alternativo e inovador. Em outras oportunidades, sugere-se integrar a visita a atividades online, pois existem alguns museus e centros virtuais de história da psicologia, e visitar o Museu da Loucura, em Barbacena. A ampliação do 235
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espaço educativo se mostra bastante bem-vinda e efetiva para o ensino contemporâneo. REFERÊNCIAS
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Capítulo 17 DIÁLOGO FILOSOFIA E PSICOLOGIA NA PERSPECTIVA DA SALA DE AULA INVERTIDA E DO SEMINÁRIO José Mauricio de Carvalho RESUMO
Neste capítulo apresenta-se a experiência da aplicação de duas metodologias ativas da aprendizagem, a sala de aula invertida combinada com seminário. Essas técnicas foram empregadas no conteúdo curricular Filosofia e aplicadas no primeiro período do curso de psicologia. A combinação dessas metodologias teve por objetivo utilizar o seminário para verificar, de forma ativa, como o aluno havia elaborado o conhecimento dos textos e filmes indicados nos trabalhos em casa. Dessa forma, o seminário substituiu, de forma mais proveitosa, aquela etapa da sala de aula invertida que consiste na discussão das dúvidas e estruturação do processo de aprendizagem. Na preparação para a aula os alunos foram orientados a fazer, em casa, um resumo dos textos, que eram um artigo de psicologia publicado em cadernos de cultura de jornais de grande circulação e um capítulo do livro Iniciação Filosófica de Karl Jaspers, destacando as partes consideradas mais importantes e anotando eventuais dúvidas. A orientação foi para que os estudantes anotassem especialmente os pontos do texto onde fosse identificada relação entre a psicologia e filosofia e/ou onde fos-
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sem observados fundamentos filosóficos nas teorias psicológicas presentes nos artigos. Capítulo e artigo foram comentados nos seminários, em sala, de modo que as dúvidas aparecessem nas discussões e intervenções. No final do seminário, os alunos escreviam novamente o resumo, incorporando as novidades aprendidas em sala ou destacavam as partes não contempladas nas anotações feitas em casa, de forma oral, para os colegas. INTRODUÇÃO
Neste capítulo relata-se a experiência de aplicação do método de aprendizagem ativa sala de aula invertida no primeiro período do curso de psicologia do UNIPTAN. A técnica foi utilizada de forma combinada com o seminário, também ele uma metodologia ativa da aprendizagem. Essas duas técnicas foram aplicadas juntas de maneira que o estudante lesse e resumisse em casa o material disponibilizado para ele e aprofundasse o assunto, debatendo-o posteriormente em sala de aula. Os textos para leitura foram os capítulos do livro Iniciação Filosófica de Karl Jaspers (JASPERS, 1987) e pequenos artigos de psicologia, publicados em cadernos de cultura de jornais de grande circulação, sendo o mais utilizado o Caderno Pensar do jornal Estado de Minas. Quando necessário para melhor compreensão dos artigos, também foram indicados filmes e documentários. O conteúdo curricular Filosofia integra a grade do curso de psicologia do UNIPTAN com duplo propósito: O primeiro é geral, comum a toda introdução à filosofia oferecida nos cursos universitários e, segundo, oferecer ao estudante um contato sistemático com a meditação filosófica. O que se espera, neste caso, é mostrar a especificidade dessa construção cultural diante da religião, arte e ciência. Sabe-se que o fazer filosófico é singular, mas é desafio do homem problematizar a realidade1 (VYGOTSKY, 2007). E nesse ponto tivemos uma dificuldade inicial que foi escolher uma parte da longa tradição filosófica de mais de dois mil e quinhentos anos
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que está na raiz da cultura ocidental. Uma parte dessa tradição, mas ainda assim capaz de oferecer ao estudante o entendimento dos diferentes objetos das disciplinas filosóficas como a ontologia (estudo dos objetos em geral que inclui a metafísica), a ética (estudo do bem e dos valores), a estética (uma reflexão sobre o belo), a lógica (exame das formas de raciocínio), a epistemologia (investigação sobre o conhecimento humano). O outro propósito é específico e tão importante quanto o primeiro. Consiste em contemplar a preocupação institucional de oferecer formação interdisciplinar que integre teoria e prática, constituindo-se em modelo diferenciado de aprendizagem. Os conteúdos oferecidos envolveram contato com a maioria das disciplinas filosóficas e possibilitaram aos graduandos verificar sua articulação com conhecimentos próprios da psicologia vivenciados na teoria e na prática de forma interligada. A relação da filosofia com as ciências, no caso especificamente a psicologia, é uma forma de propiciar ao estudante uma compreensão ampla do processo educativo, que mesmo quando contempla assuntos específicos espera prepará-lo para a jornada do espírito humano1 (VYGOTSKY, 2007). Desse modo, aproximou-se o conteúdo filosófico dos problemas e questões da psicologia sem o que o aluno demorasse muito a perceber, se em algum momento do curso fosse capaz de fazê-lo, que a filosofia está na raiz das teorias psicológicas, na sua fundamentação e diferenciação. REVISÃO DA LITERATURA E SUA FUNDAMENTAÇÃO
As metodologias ativas da aprendizagem não significam simplesmente o ensino com uso de tecnologias, que podem e devem ser feitas tanto mais quanto o objeto a ser ensinado favoreça o uso. O fundamental para que uma metodologia seja ativa é que ela articule dois princípios pedagógicos que vêm sendo trabalhados pelos educadores há algum tempo: I. conduzir o processo de aprendizagem respeitando as singularidades da malha intelectiva
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de cada estudante, isto é, acompanhando seu ritmo de aprendizagem e II. aproximar o processo de aprendizagem da sua vida e das suas experiências práticas. Articulando esses dois princípios pedagógicos básicos conseguimos um terceiro que é tornar o estudante responsável e ativo no processo de aprendizagem. Dessa forma o estudante aprende fazendo e interagindo. Educadores conhecidos destacam há algum tempo a importância da interação entre os estudantes para a aprendizagem. Isso aparece nas propostas de Vygotsky (1896-1934)1 (VYGOTSKY, 2007) e Paulo Freire (FREIRE, 1996). Esse último sugeria utilizar a experiência dos alunos no processo de aprendizagem e que se transformasse as aulas num espaço interativo2. João Mattar lembra, no prefácio que escreveu para o livro Metodologias ativas: perspectivas teóricas e práticas no ensino superior, o vínculo que Paulo Freire apontava entre a interatividade e a responsabilidade com a própria aprendizagem, pois ele (In: NEVES, MERCANTI, LIMA, 2018, p. 9): Defende uma educação interativa e dialógica, pressupondo uma corresponsabilidade do aluno por seu processo de aprendizagem (...). Nos Estados Unidos John Dewey já defendia, há muito tempo o learning-bydoing. Aprender fazendo também envolve participação ativa do aluno no processo ensino aprendizagem.
Com isso, evita-se que a instituição escolar se limite a ser apenas repetidora de conteúdo, já que as gerações mais velhas têm a tarefa de transmitir às mais novas o saber acumulado para ajudá-las no enfrentamento dos problemas que a vida renova. A questão é que, como a vida modifica os desafios, a transmissão do conhecimento consolidado precisa vir junto do estímulo para a descoberta e a construção de novos desempenhos e saberes, pois tudo o que 1
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Sobre interação social no processo de aprendizagem comentou o psicólogo (VYGOTSKY, 2007, p. 20): “O caminho do objeto até a pessoa e desta até o objeto passa através de outra pessoa. Essa estrutura humana complexa e o produto de um processo de desenvolvimento profundamente enraizado nas ligações entre a história individual e a história social”. Freire escreve em Pedagogia da autonomia: saberes necessários à prática educativa (FREIRE, 1996, p. 136): “o sujeito que se abre ao mundo e aos outros inaugura com seu gesto a relação dialógica em que se confirma como inquietação e curiosidade, como inconclusão em permanente movimento para a história”.
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o homem concebe é histórico3 (ORTEGA e GASSET, 1994). Por isso, o ensino universitário há muito contempla a indissociabilidade entre ensino e pesquisa, unindo o saber consolidado aos novos saberes produzidos. Quanto ao respeito ao ritmo do estudante e sua preparação para a pesquisa pode-se considerar que sejam essas as missões da escola: o respeito ao ritmo de aprendizagem e a ampliação do conhecimento (SANTOS, 1987, p. 424): A escola tem, portanto, duas funções primordiais: conhecer o aluno e orientá-lo em função desse conhecimento. É claro que os aspectos sociológico e psicológico da educação estão intimamente relacionados, mas nem por isso é impossível esta distinção importante. O currículo dos estudos é simples meio que a escola usa para poder, com maior ou menor precisão, conhecer o tipo de homem que está germinando no adolescente (jovem). Neste sentido, mais uma vez se torna claro que a escola não é fundamentalmente transmissora de saber, mas órgão de descoberta e orientação. Quanto às técnicas empregadas na experiência descrita neste capítulo, o seminário é atividade empregada, com sucesso, no exame e aprofundamento de uma temática qualquer. Trata-se de procedimento muito utilizado nas ciências humanas e sociais, embora possa ser empregado em qualquer área. Normalmente muitos assuntos suscitam debates e comentários em sala, mas que sem a devida problematização e abordagem teórica não se consegue o conhecimento necessário do conteúdo curricular. Portanto, o desafio quando se usa o seminário é organizar as condições de aprendizagem do conteúdo que vai ser debatido. Assim, a construção do seminário começa com a indicação de uma bibliografia preliminar que ofereça um conhecimento mínimo do conteúdo a ser debatido em sala associado a algo que o aluno já domine (GIL, 1997, P. 77): “para desenvolver o aprendizado mediante utilização de conheci3
O filósofo espanhol Ortega y Gasset comenta com propriedade a historicidade do conhecimento humano no ensaio Apuntes sobre el pensamento su teurgia y su demiurgia (v. V, 1994, p. 540): “todo conceito com pretensões de representar alguma realidade humana leva inclusa uma data, ou o que é igual, toda noção referente à vida especificamente humana é função de um tempo histórico”.
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mentos e experiências anteriores”. Dessa forma, é possível oferecer o conhecimento necessário num determinado conteúdo curricular devidamente explicitado nos objetivos da disciplina. Além disso, é oferecida uma bibliografia complementar e estimulada a pesquisa sobre o conteúdo a ser debatido, de modo que, além do mínimo necessário para a participação do estudante, ele possa aprofundar os conteúdos na medida de seu conhecimento, interesse e curiosidade ou (ibidem): “dar oportunidade aos alunos para formular princípios com suas próprias palavras e sugerir aplicações para esses princípios”. Uma vez indicado o material para estudo e pesquisa o passo seguinte é feito na sala de aula. Pergunta-se aos estudantes se houve algum conteúdo que não tenha ficado claro o suficiente ou que tenha chamado especialmente sua atenção. Uma vez apresentadas as dúvidas os próprios colegas procuram, inicialmente, solucioná-las e, havendo pesquisas complementares e acréscimos, o estudante apresenta o resultado da sua investigação. Somente então o professor intervém para aprofundar a questão, estabelecer nexos, ou solucionar uma dúvida que ainda não tenha tido a merecida abordagem. Dessa forma, o professor não deixa de trabalhar os conteúdos e expô-los de forma sistemática, bem como aprofundálos na medida necessária, todavia deixa aos estudantes autonomia para não apenas trazer o resultado da investigação, mas propor novos assuntos relacionados aos antigos. Durante essa exposição o professor estimula ao estudante externar o seu ponto de vista ou interpretar o problema com base na teoria estudada. Quanto à sala de aula invertida, ela é uma técnica de ensino que pretende inverter a forma tradicional de ensinar, isto é, deixar que o estudante faça fora da sala de aula aquele trabalho de contato com o conteúdo antes feito na sala, como ler um texto, assistir um vídeo, ou ouvir uma exposição. Realizando esse trabalho em casa, far-se-á na sala de aula aquilo que antes se fazia em casa, como resolver problemas, fazer atividades e, no nosso caso, identificar um transtorno ou executar um projeto. A técnica começou a ser 244
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desenvolvida por autores americanos como Eric Mazur, autor de Peer instruction: User’s manual” e Gregor Novak, que publicou “Justin-time Teaching”. O princípio articulador da técnica é simples e desejada pelos professores dos diversos conteúdos em qualquer modelo de aprendizagem, o aluno ir para a sala de aula com o conhecimento prévio do que será examinado. A técnica preconiza que o aluno já tenha um contato com o conteúdo que será trabalhado em sala. É evidente que se ele já dominar boa parte do conteúdo será mais fácil a sistematização ou aprofundamento que o professor realizará na sala de aula. O planejamento da técnica precisa ser feito observando-se o desenvolvimento do conteúdo, sua evolução, pré-requisitos e identificando-se adicionalmente as habilidades necessárias ou que serão trabalhadas na atividade. Normalmente isso pode ser feito misturando-se atividades on-line com outras realizadas of-line. Entendido o mecanismo da sala de aula invertida, já deve ter ficado claro que o seminário foi utilizado como técnica complementar, como forma de sistematizar as atividades que seriam desenvolvidas na sala de aula, de modo a identificar o que os alunos aprenderam fora dela, completando essas informações e tirando as dúvidas, fazendo da aula um momento dinâmico e interativo. DESCRIÇÃO DA PRÁTICA
A combinação das duas técnicas foi realizada para quase todas as aulas de filosofia oferecidas no primeiro período do curso de psicologia. A sala de aula invertida foi construída com os artigos de jornais, retirados principalmente do Caderno Pensar do jornal Estado de Minas. Os artigos foram baixados e disponibilizados para os alunos no aplicativo WhatsApp no grupo da turma. O outro material, que também foi trabalhado em casa, foram os capítulos do livro Iniciação Filosófica, de Karl Jaspers (JASPERS, 1987). Finalmente, filmes e documentários comentados nos artigos também precisaram ser assistidos em casa para favorecer a compreensão 245
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dos artigos. Esses filmes e documentários, com seus respectivos comentários, estavam no YouTube e o link para acesso também foi enviado para o grupo da turma. Essa estratégia metodológica foi pensada de forma articulada com a avaliação e para cumprir o objetivo de relacionar questões de psicologia com fundamentos e reflexões de caráter filosófico, um dos objetivos da unidade curricular entregue à coordenação do curso no início do semestre: Explicitar a relação entre Filosofia e Psicologia. As atividades dos alunos foram realizadas unindo o ambiente online e offline. Filmes e documentários foram obtidos diretamente da internet e os artigos puderam ser acessados também pela internet diretamente na página do jornal Estado de Minas ou lidos no link enviado para o grupo. Quanto aos capítulos do livro, eles precisaram ser lidos no livro de Jaspers. Vejamos um exemplo para ilustrar como foi a aplicação durante o semestre. Antes de iniciar o semestre foi feita uma programação detalhada de cada aula, escolhendo-se um capítulo do livro de Karl Jaspers e um artigo do Caderno Pensar. Também foram usados poucos artigos do Caderno Pensar do jornal Correio Brasiliense. Uma das aulas foi dedicada ao estudo do capítulo 6 da Iniciação filosófica de Karl Jaspers, que aborda a visão contemporânea sobre o homem. Nele, Jaspers fez uma síntese do que as ciências humanas e biológicas disseram do homem na segunda metade do século passado. Depois, Jaspers explicou de que modo a filosofia pensa o homem nesse mesmo período (JASPERS, 1987, p. 59/60): O homem é acessível a si próprio numa dupla modalidade: enquanto objeto de investigação (das ciências) e enquanto existência de uma liberdade inacessível a qualquer estudo. No primeiro caso, referimo-nos ao homem como objeto; no outro, ao não objeto que o homem é, e de que se compenetra quando toma consciência de si próprio. O que seja o homem não se conhece exaustivamente pelo que acerca dele se sabe; pode-se pressentir na origem dos nossos pensamentos
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e atos. O homem é fundamentalmente mais do que pode saber acerca de si mesmo.
Entre as ciências mencionadas no capítulo de Jaspers, o médico psiquiatra deu especial relevo àquelas voltadas para o homem. Por outro lado, a análise do homem enquanto sujeito de liberdade, tema da antropologia filosófica e da ética, foi igualmente examinada por ele. Uma vez escolhido o capítulo do livro, ele foi aproximado de um artigo encontrado num jornal de cultura que contemplasse questões filosóficas e psicológicas, o qual foi examinado na aula seguinte. Entre os artigos disponíveis para ser aproximado do capítulo sobre o homem, foi escolhido O processo de humanização do psiquiatra Marco Aurélio Baggio, onde ele comenta o filme canadense Invasões bárbaras. Naquele artigo o psiquiatra abordou diversos aspectos da compreensão contemporânea do homem, combinando questões de filosofia como: “a inutilidade de se abraçar ideologias, crenças e modismos”. Essas teorias e crenças passam conforme muda a compreensão das gerações. O personagem central do filme é o professor Rémy Girard, que teve câncer, doença que se agravou ao longo da trama. Seu filho o amparou como pôde. E, desse episódio, o psiquiatra concluiu ser necessário a humanização no tratamento médico e nas relações humanas em geral. Escreve (BAGGIO, 2003, fl. 4): “o cineasta Denys Arcand usou o câncer e a condição terminal de vida de Rémy Girard para mostrar como um belo processo de humanização de pessoas pode acontecer. É a morte, mais uma vez, escoltando os vivos e ensinando-lhes a melhor maneira de viver.” Também foram disponibilizados, para os estudantes, links de trechos do filme, bem como o filme completo que, uma vez assistido, ajudaria no entendimento da trama objeto do artigo de Marco Aurélio Baggio. A aula iniciou-se com um aluno resumindo o filme e comentando as impressões que teve ao assisti-lo. Em seguida, a turma foi dividida em grupos e houve meia hora para que os grupos levantas247
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sem eventuais dificuldades na leitura do texto ou na compreensão do filme. Em seguida, as dúvidas não solucionadas no debate em grupo foram apresentadas ao professor, que as respondeu e apontou pontos de aproximação do artigo de Marco Aurélio Baggio e o capítulo da obra de Karl Jaspers examinado na aula anterior. Naquele momento consideramos que foram superadas as dificuldades de entendimento dos dois textos. Seguiu-se o tempo do seminário, no qual foram apresentadas questões formuladas pelo professor e dirigidas a um dos grupos, solicitando que um aluno daquele grupo escolhido a comentasse. Em seguida, a palavra foi franqueada para que qualquer aluno pudesse responder a questão, concordasse, discordasse ou completasse o que havia sido falado. Procurou-se esgotar a questão. Ao final da aula o professor fechou a discussão amarrando o artigo com o capítulo comentado na aula anterior. O comentário de encerramento da aula se concentrou numa parte do capítulo abaixo transcrita (JASPERS, 1987, p. 60): Tomamos consciência da nossa liberdade quando reconhecemos certas exigências em relação a nós próprios. Depende de nós cumpri-las ou eximirmo-nos a elas. Não podemos com seriedade contestar que decidimos algo, que consequentemente essa decisão nos compromete, que somos responsáveis.
Um outro exemplo de utilização dessas técnicas se deu quando da apresentação do capítulo cinco da Iniciação Filosófica, cujo título Exigência Absoluta, nos coloca diante dos comandos morais que obrigam absolutamente a consciência. Sobre o princípio ético comenta autor (JASPERS, 1987, p. 49): “a característica do absoluto é, porém, que a ação se fundamenta em algo perante o qual a vida, como totalidade, seja relativa e não suprema”. Esse capítulo do livro, como o anterior, foi estudado em casa e discutido em sala de aula num seminário. Depois de ficarem resolvidas as dúvidas e dificuldades, foi indicado para a aula seguinte a leitura do artigo Fumaça de Auschwitz, da psicanalista e filósofa Maria Thereza Waisberg, publicado no Caderno Pensar do jornal Estado de Minas. 248
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Naquele artigo a autora comenta o comportamento perverso do austríaco Josef Fritzl e estende o transtorno psicopatológico para a família Fritzl e até para a sociedade austríaca, que como não percebeu o que se passava na casa dos Fritzl, também não percebeu a perseguição feita aos judeus durante a segunda guerra mundial, mostrando-se uma sociedade ainda doente. Nesse artigo a psicanalista comenta a etiologia do comportamento perverso partindo das observações de Freud e atualizando o que se conhece do quadro. Ela explica (WAISBERG, 2009, p. 3): “Nesta perspectiva, a perversão adulta é uma regressão; é uma lei a ser simbolizada e internalizada pela criança como interdição ao incesto”. E completa sua explicação acrescentando que sem a incorporação de interdições éticas a pessoa desenvolve o comportamento perverso (ibidem): As pesquisas de Freud e dos psicanalistas mostram que as perversões são afecções altamente diferenciadas, e de tal maneira, que a sua complexidade e limite devem ser encontrados na fronteira onde as sociedades definem as regras e padrões de convivência usualmente convencionados como normais.
Ela completa (ibidem): “a perversão surge como persistência ou reaparecimento de um componente parcial da sexualidade”. O Seminário realizado para exame do artigo permitiu mostrar a importância das interdições morais na construção da personalidade, bem como as modificações nos padrões morais nas últimas décadas que mudaram da repressão da sexualidade para uma maior liberação do gozo. Essa interpretação psicanalítica tanto propiciou o aprofundamento em sala das raízes antropológicas e filosóficas da psicanálise, quando a comparação entre a interpretação da crise social contemporânea pelos psicanalistas e pela psicologia fenomenológica. Essa discussão permitiu apresentar a crítica feita por Jaspers à psicanálise no capítulo oitavo da Introdução ao pensamento filosófico, onde ele explica como o desenvol249
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vimento de teorias psicológicas científicas podem se degenerar quando deixam o espaço em que se articulam e pretendem se afirmar como teorias totais da cultura (JASPERS, 1993, p. 88): “não vejo prova empírica da tese segundo a qual a repressão produziu grandes obras espirituais”. O artigo permitiu ainda explicitar a diferença do modo como os psicanalistas pensam a condição humana e a maneira como as outras escolas de psicologia o fazem. Mostrou-se como essas diferenças dependem da visão de homem e de mundo que está na raiz das diferentes escolas e que ambas as coisas são de caráter filosófico. Na raiz das dificuldades contemporâneas estava, para autores como Karl Jaspers, nas neuroses sociais entendidas de forma diversa dos psicanalistas. Autores como o psiquiatra criador da análise existencial Vitkor Frankl assim comentam a neurose social e uma delas em especial a noogênica (FRANKL, 1976, p. 3): Se nós buscarmos as causas de tal vácuo existencial podemos encontrar as seguintes explicações: ao contrário dos animais, os instintos e impulsos não ditam ao homem o que ele deve fazer. E hoje, as tradições não lhe dizem, como antigamente, o que precisa ser feito. Sem conhecimento daquilo que deve e precisa fazer, o homem também não sabe ao certo o que quer. E qual é a consequência? Ou ele quer apenas aquilo que os outros fazem e isso é conformismo. Ou, ao contrário, faz apenas aquilo que os outros querem – o que querem dele. Nesse caso temos o totalitarismo.
A conclusão da atividade foi a elaboração de um texto onde os alunos, reunidos em pares, fizeram uma relação entre o capítulo sobre a ética visto na aula anterior e o artigo da psicanalista Tereza Waisberg, explicitando as dificuldades decorrentes de um tempo que fragilizou as regras morais na visão dos psicanalistas. Alguns mencionaram a diferença na abordagem das diferentes escolas de psicologia da crise de cultura de nosso tempo.
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VIRTUDES E DIFICULDADES NO USO DAS PRÁTICAS PROPOSTAS
A principal virtude encontrada nestas atividades foi permitir que os estudantes examinassem os artigos sobre psicologia e o livro de Karl Jaspers, interpretassem seu conteúdo e fizessem boas sínteses, aproximando as teorias psicológicas de sua fundamentação filosófica de forma mais participativa, permitindo que as intervenções do professor pudessem se situar em conteúdos complementares e de aprofundamento. Dessa forma, as intervenções em sala ampliaram o debate planejado e anteciparam uma conclusão que Jaspers apresentou no final do livro sobre a independência que a filosofia proporciona, que é frente a pensamentos já estruturados e saberes consolidados (JASPERS, 1987, p. 103): “A independência do homem filosofante consiste em não ficar sujeito aos seus pensamentos, cativos neles como se dogmas fossem, em mantê-los sobre seu domínio”. Outra virtude importante do uso das técnicas foi a boa participação dos alunos, tanto na resposta às atividades como na aposição de questões correlatas inicialmente não previstas. O maior problema encontrado para o desenvolvimento dessas duas metodologias ativas combinadas foi ajustar a atividade dos seminários ao tempo das aulas. Mesmo com aulas geminadas dificilmente conseguimos articular a participação de todos os alunos no comentário das questões que elaboraram e nos complementos que eles desejavam trazer. A outra dificuldade, observada na atividade, foi a ausência dos pré-requisitos necessários à compreensão dos textos filosóficos. Quase todos os alunos haviam tido aulas de filosofia no segundo grau, mas o conhecimento que traziam era superficial e insuficiente, de modo que a compreensão dos textos indicados consumiu um tempo da aula maior que o inicialmente previsto para o esclarecimento de conceitos e interpretação do conteúdo, o que pediu a intervenção frequente do professor e algumas aulas de revisão ao longo do curso.
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CONCLUSÃO
O uso das metodologias permitiu o cumprimento dos objetivos de ensino propostos para o conteúdo curricular e assegurou a boa participação dos alunos em sala. O uso dos dois métodos e forma combinada permitiu o aprofundamento do assunto no cumprimento dos objetivos permitindo concluir a importância do humanismo em contraposição às ideologias e o papel crítico do pensamento filosófico. Jaspers concluiu isso no seu livro, mas os alunos observaram também a relação entre a dignidade humana (base moral dos direitos humanos) e as abordagens do cuidado terapêutico e psicoterapêutico. A discussão também foi enriquecida com indagações sobre a eutanásia e as implicações jurídicas que a envolve, em complemento ao debate ético inicialmente programado. REFERÊNCIAS
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Capítulo 18 CONSTRUTIVISMO E PBL PARA UMA FORMAÇÃO INTEGRAL Flávia Magela Rezende Ferreira Jaqueline Vieira Rangel Patrícia Uebe Ribeiro Raquel Auxiliadora Borges RESUMO
A educação contemporânea, na perspectiva da produção de conhecimentos significativos, requer ações colaborativas, interativas e dinâmicas no processo de aprendizagem. Nesse contexto, o Problem Based Learning (PBL) ou, Aprendizagem Baseada em Problemas, valoriza a capacidade de aprender a aplicar o conhecimento na solução de problemas reais ou fictícios a partir de um contexto significativo. Paralelamente, a proposta educacional construtivista preconiza que o conhecimento se dá por meio da interação, em que o aluno é o sujeito protagonista da aprendizagem e o educador um importante facilitador na construção coletiva do saber. Assim, o objetivo desse estudo é compreender como o PBL dialoga com as práticas construtivistas para a formação integral dos alunos. A metodologia utilizada será uma análise descritiva, considerando duas experiências de PBL em turmas distintas do curso de Pedagogia UNIPTAN – Centro Universitário Presidente Tancredo de Almeida Neves. A atividade será realizada por meio da análise das práticas de PBL à luz dos princípios construtivistas. Os dados serão colhidos
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por meio da observação da atividade aplicada, aliada a um questionário de autoavaliação proposto aos alunos. Espera-se que esses estudantes demonstrem envolvimento nas atividades, ampliem suas potencialidades cognitivas de problematização e solução das questões propostas, desenvolvam autonomia e autogestão da aprendizagem, ou seja, expressem atitudes que reverberem em ações de respeito, tolerância e trabalho em equipe, tão essenciais para a formação do pedagogo. INTRODUÇÃO
Atualmente, as mudanças no currículo pressupõem a transição da disciplinaridade para a interdisciplinaridade, bem como apresenta novas estratégias de ensino e de aprendizagem, como é o caso das metodologias ativas que têm como principal característica colocar a aprendizagem centrada no estudante, que passa a ser o protagonista de seu próprio aprendizado. Mais que propiciar o domínio dos conhecimentos, acredita-se que seja imprescindível que os alunos aprendam a pensar, a correlacionar a teoria à prática, a buscar de forma criativa e adequada as soluções para problemas que surgem no seu cotidiano. Neste contexto, cabe ao professor pensar e planejar a sua prática educativa considerando tanto a individualidade de seus alunos quanto a forma de cada um aprender, com a finalidade de realizar uma mediação pedagógica que conduza todos os alunos à construção do conhecimento. A teoria Construtivista do conhecimento, preconizada por Jean Piaget, no séc. XX, compõe esse cenário com muita propriedade. No construtivismo, o processo de interação do aluno com o assunto proposto, o questionamento e reflexão, juntamente com o auxílio do professor, configuram a construção do aprendizado. Através disso, é possível afirmar que a utilização do construtivismo no ensino proporciona o aumento do interesse dos alunos pelo assunto que está sendo tratado, visto que os mesmos são responsáveis pela manutenção de seu próprio conhecimento (ALBERGARIA, 2010). 254
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O Problem Based Learning (PBL) ou, Aprendizagem Baseada em Problemas tem se destacado como uma metodologia de ensino e aprendizagem colaborativa, construtivista e contextualizada através de estudos de casos reais ou criados que motivam e valorizam a construção de conhecimentos, além de promover habilidades de solução de problemas e trabalho em grupo (SCHMIDT, 2001). CONSTRUTIVISMO E AUTONOMIA NA APRENDIZAGEM
O olhar contemporâneo sobre os modos de se pensar e fazer educação tem provocado os educadores. A dinâmica estabelecida nas relações para construção dos saberes coletivos tem como pano de fundo processos participativos, mais dinâmicos e objetivos, sem perder o foco com as demandas da realidade. O desafio é propiciar processos interativos de construção do conhecimento, por meio de uma aprendizagem colaborativa que desenvolva habilidades necessárias à obtenção dos resultados desejados. Para além de uma proposta pragmática, tem-se a formação integral como intenção efetiva. Ao educador, cabe pensar e planejar o ato educativo, considerando-se as particularidades dos alunos e seus diversos estilos de aprendizagem, além de assumir a tarefa de refletir sobre os modelos educacionais existentes, realizando uma mediação pedagógica capaz de colocar o aluno como protagonista de sua aprendizagem. A condução do trabalho educativo nessa perspectiva suscita um novo desafio: o entendimento de como o aluno aprende, como constrói e sistematiza o conhecimento. Teoricamente, destaca-se neste cenário a teoria Construtivista de Jean Piaget: Construtivismo é, [...] uma teoria, um modo de ser do conhecimento ou um movimento do pensamento que emerge do avanço das ciências e da Filosofia dos últimos séculos. Uma teoria que nos permite interpretar o mundo em que vivemos. (BECKER, 1994, p.3)
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Piaget desconstrói a ideia de um universo de conhecimento dado, seja na bagagem hereditária (apriorismo), ou pelo meio social ou físico (empirismo). Toma o conhecimento como uma construção, um movimento do pensamento humano que se expressa de modo particular e muito próprio em cada indivíduo. Conforme CAVALCANTE (2011), Jean Piaget foi o responsável por uma das maiores contribuições no campo da psicologia cientifica contemporânea, na área específica do comportamento cognitivo. As aplicações de sua teoria do desenvolvimento encontram-se muito difundidas, no campo pedagógico e na explicação do desenvolvimento cognitivo. (2011, p.16)
A teoria construtivista evidencia os diferentes estágios vivenciados pelo aluno no processo de aquisição/construção dos conhecimentos, explicitando como se desenvolve a inteligência humana e como levar o aluno a ser autônomo. Entendendo, portanto, que conhecer é uma ação que demanda esquemas de assimilação e acomodação, num processo constante de reorganização, que é fruto da atividade daquele que interage com o mundo. Desta forma, a ação pedagógica pautada nessa teoria deve se embasar nas condições concretas do aluno e no conhecimento dos estágios de seu desenvolvimento em relação aos esquemas de elaboração mental, no respeito a sua individualidade dentro do contexto do grupo no qual está inserido. No construtivismo, o processo de interação do aluno com o assunto proposto, o questionamento e reflexão, juntamente com o auxílio do professor, configuram a construção do aprendizado. Através disso, é possível afirmar que a utilização do construtivismo no ensino proporciona o aumento do interesse dos alunos pelo assunto que está sendo tratado, visto que os mesmos são responsáveis pela manutenção de seu próprio conhecimento (ALBERGARIA, 2010).
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Portanto, a psicologia genética traz para as questões pedagógicas discussões muito relevantes para o entendimento das relações entre desenvolvimento e aprendizagem, evidenciando uma ação educativa ajustada às situações pedagógicas e às características da atividade mental construtiva do aluno em cada momento de sua escolaridade, propiciando também aprofundar a compreensão sobre o processo de desenvolvimento na construção do conhecimento e dos mecanismos pelos quais as crianças constroem representações internas de saberes construídos socialmente. Segundo Piaget (1982), há um esquema de interdependência entre o sujeito e seu meio, num sentido de organização, estruturação e explicação a partir do vivenciado. Para o autor, o conhecimento não é uma cópia da realidade, nem mesmo uma imitação, mas o que constitui o ato de conhecer e modificar, transformar o objeto, compreender o processo dessa transformação, compreendendo como o objeto é construído. Tais abordagens levam a profundas reflexões na vivência educacional. O trato dado ao conhecimento proposto durante as aulas inclui processos de construção coletiva do saber, ou são atos reprodutivos, informativos e prontos? O saber é algo dinâmico que interage com as ciências e realidades diversas do mundo ou é estanque, desprovido de sentido, distantes da vida? A aprendizagem é instigante, desafiadora e criativa ou apenas algo a se cumprir, a aprender e reproduzir? Enfim, esses e outros inúmeros questionamentos devem compor o cenário das demandas pedagógicas mais relevantes. Expandindo-se este viés teórico, destaca-se outro autor que relaciona-se com o construtivismo, porém, numa perspectiva socioconstrutiva e que muito pode contribuir para o tema em pauta: trata-se do psicólogo russo Lev Vygotsky. Este pensador enfatiza a importância do papel do indivíduo na aprendizagem, valorizando a interação entre as condições sociais e a base do comportamento humano. Na teoria de Vygotsky, os instrumentos psicológicos servem para ordenar e reposicionar as informações externas.
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Aprendemos e nos desenvolvemos ao longo de nossas vidas, nos relacionamos em nossos ambientes sócio históricos, estabelecendo trocas, construindo sentidos, compartilhando, enfim, agindo sobre nosso meio, nosso ambiente. O que aprendemos depende muito do que somos, de nossos pré-requisitos, de nossa história pessoal e também de nossos processos afetivos e cognitivos, ou seja, do que nos é dado biologicamente e também daquilo que o ambiente nos favorece em termos de desenvolvimento, salientando aprendizagens significativas. Quando os alunos discutem juntos um problema, eles o fazem a partir de suas experiências e aprendizados, reestruturando e reorganizando o conhecimento. Cavalcante (2011) salienta que, na perspectiva da construção do conhecimento, o aluno não aprende apenas de forma espontânea e nem mesmo esse conhecimento é transmitido de forma mecânica pelos professores ou pelo meio, mas sim como um resultado da interação entre sujeito, que é elemento ativo pronto para compreender e resolver as questões advindas do meio social em que vive. Entende-se ainda, segundo o mesmo autor, que o sujeito age sobre os objetos e constrói suas categorias de pensamento, organizando seu próprio mundo. Essas questões provocam uma revisão das pedagogias voltadas para o ensino- aprendizagem, levando a uma proposta que seja capaz de enfrentar as questões que afetam as relações entre o aluno e a sociedade. Não há obviamente um modelo único, adequado a todas as realidades, pois isso será contrário a tudo o que sabemos sobre as diferenças que constituem os alunos, famílias e educadores, fruto de suas várias inserções históricas e culturais na sociedade. No construtivismo, o professor assume o papel de facilitador para a aprendizagem do aluno, não sendo apenas um transmissor de conhecimentos. Dessa forma, o aluno desenvolverá o saber através das interações com seu ambiente e abstração das situações propostas, fazendo a construção do aprendizado única a cada um.
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Isso torna a prática docente desafiadora, uma vez que é necessário planejar atividades diferenciadas de acordo com os níveis de desenvolvimento da turma, buscando desestabilizar os alunos para que avancem em seus estágios e levando-os a elaborar novas respostas para suas hipóteses. A postura do educador na atualidade deve ser de levar o aluno ao enfrentamento de contradições, pensando sobre o conteúdo proposto, resolvendo problemas, decidindo, agindo/ interagindo sobre/com o objeto de conhecimento, estabelecendo trocas sociais com seu grupo escolar e familiar. O cenário educacional tem propiciado um vasto contexto de possíveis práticas educativas de viés construtivista, aliando o lúdico ao processo de aquisição e construção do conhecimento, para que as aulas se tornem mais prazerosas ao aprendiz, despertando a atenção e interesse pelo conteúdo ensinado (ALMEIDA, 2006). O PBL ou, Aprendizagem Baseada em Problemas inclui-se entre as novas tendências construtivistas visto que trata-se de uma metodologia de ensino e aprendizagem elaborada de forma colaborativa, construtivista e contextualizada, que emprega problemas da vida real ou fictícios, para motivar e dar foco à construção de conhecimentos, além de promover habilidades de solução de problemas e trabalho em grupo (SCHMIDT, 2001). O aprendizado ocorre a partir da apresentação de problemas, reais ou simulados, a um grupo de alunos. Para solucionar este problema, os alunos recorrem aos conhecimentos prévios, estudam, debatem, pesquisam, adquirem e integram os novos conhecimentos. A retenção do conhecimento é facilitada pela integração e a lida prática com os saberes, que podem ser mais acionados, resgatados e transformados, quando o estudante estiver diante de novos problemas. A proposta de resolução de problemas reais faz com que o aluno se mantenha engajado em sua realidade para transformála. Ao lidar com questões desafiadoras do cotidiano o aluno tem uma melhor abstração e maior interesse pelo o que está sendo 259
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explicitado. O PBL enfatiza o trabalho coletivo e o aprendizado colaborativo entre os sujeitos. A aplicação das atividades de PBL, envolve diversos alunos com funções específicas a desempenhar, sendo este mesmo centro do processo e sua ação protagonista será determinante na aplicação do método: [...] os alunos são apresentados a um problema, pré-elaborado por um conjunto de docentes, e, com a facilitação de um tutor, são estimulados a discutir e elaborar hipóteses. Esta situação motivadora nos grupos tutoriais leva a definição de objetivos de aprendizagem, que serão os estímulos para o estudo individual. (THOMSON JC, p. 45, 1996)
Dentre os diversos momentos da aplicação da atividade, destaca-se a função do tutor do grupo no incentivo aos demais membros da equipe, provocando uma dinâmica produtiva entre os participantes. Como no construtivismo, no PBL os conhecimentos não estão prontos e nem servem a um determinado fim específico, pensa-se que a proposta metodológica ajusta-se às intenções construtivistas salientando o aprendizado individual por meio das interações sociais em que o sujeito internaliza o saber até o ponto em que se torna capaz de trabalhar de forma mais independente. Aliando as considerações ora apresentadas, estas motivações nos levaram a refletir sobre as práticas educativas no curso de Pedagogia e no quanto elas precisam interagir com estas propostas pedagógicas. Percebe-se que os cursos de formação acadêmica necessitam de um modo geral transformar-se e reorganizar suas práticas educacionais de modo a estruturá-las criticamente diante das transformações sociais. As práticas são reorientadas em função da nova forma de conceber o aluno, percebendo-o como sujeito histórico e cultural que constrói seu conhecimento na interação com o objeto de aprendizagem, através da mediação de seu meio e do educador.
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Ao curso de Pedagogia do UNIPTAN foi proposto atividades de PBL, como uma prática construtivista acreditando que esta forma de conceber a educação traz significado à aprendizagem e expressa formas de ensinar e de aprender mais dialógicas permitindo aos alunos assumirem posturas mais ativas e autônomas no processo de aprender. Quando o aluno tem a oportunidade de interagir com seus pares e compartilhar os significados do processo ensino aprendizagem, as condições se tornam favoráveis aos processos de assimilação e acomodação implícitos na construção/reconstrução de conhecimentos. Se para o construtivismo as aprendizagens variam de acordo com o indivíduo, não faz sentido a prescrição de regras e métodos. Por isso, ressalta-se que é bem provável que haja uma importante interface entre o PBL e o Construtivismo que, aliados propiciam relevante aprendizado. As experiências vivas e vividas pelos alunos fornecem respostas às questões que a vida lhes impõe e fazem rever e escolher os melhores caminhos a percorrer, em um novo modo de caminhar. Acredita-se que compreender a educação pelo viés da construção crítica, da interação e compartilhamento de ideias é um propósito essencial, sobretudo para o curso de formação de educadores. DESCRIÇÃO DAS ATIVIDADES
Na perspectiva da construção do conhecimento pelo aluno de forma autônoma e experiencial optou-se por desenvolver em três disciplinas do curso a Aprendizagem Baseada em Problemas (ABP) ou Problem Based Learning (PBL) que tem como objetivo levar o aluno a compartilhar suas experiências e aprendizagens e compreender a aplicabilidade dos conteúdos aprendidos. Essa estratégia foi proposta para a turma do quarto período na disciplina Gestão Educacional e no oitavo período nas disciplinas Políticas e Administração dos Sistemas de Ensino e Libras – Língua Brasileira de Sinais do curso de Pedagogia do UNIPTAN - Centro Universitário
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Presidente Tancredo de Almeida Neves, situado na cidade de São João del-Rei – MG. A atividade foi realizada no mês de setembro de 2018 na turma do quarto período e no mês de outubro na turma do oitavo período e, ao utilizá-la, partiu-se do princípio que o aluno deve estar no centro de seu processo de ensino e aprendizagem, comprometendo-se e compreendendo que é ele próprio quem produz o conhecimento. Com a turma do quarto período, além de desenvolver um tema do Plano de Ensino utilizando o PBL, a docente também optou por praticar outros métodos ativos com o objetivo de não só ajudar a fixar o tema da disciplina estudada como a aprimorar as técnicas de Quizz e Estudos de Casos. Inicialmente na contextualização do trabalho os alunos foram levados a discutir o conceito de gestão educacional e, em grupos, criar a representação desse conceito em cartolina, através de desenhos, esquemas, textos, ou outra forma criativa, seguido pela apresentação deste trabalho para toda a turma e finalizando com uma discussão geral. A fim de fixar o conceito desta temática, considerada muito importante no rol da disciplina, foi apresentado à turma um vídeo da professora Heloísa Lück, no qual ela analisa a conjuntura da gestão educacional na literatura nacional. A autora também descreve a prática de gestão dentro dos ambientes escolares. Além do vídeo foram apresentados à turma dois textos que trazem o conceito e as dimensões da gestão escolar, o papel do pedagogo como integrante da equipe de gestão, bem como a importância da construção do Projeto Político Pedagógico da Escola de forma coletiva e participativa dentro de uma gestão democrática. Sabendo-se que as aprendizagens são ativas quando o aluno constrói e contextualiza os conceitos estudados em situações concretas do cotidiano, a proposta de realizar um PBL com os alunos dessa turma objetivou identificar os saberes por eles construídos e ao mesmo tempo levá-los a buscar mais informações sobre o tema em pauta. Entretanto, na área da Gestão Educacional não se encon-
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tram com facilidade casos já prontos que atendam a um objetivo específico. Por este motivo os alunos foram novamente divididos em equipes e cada equipe elaborou um caso de gestão a partir dos temas relacionados no Plano de Ensino da disciplina Dimensões da organização da gestão escolar: planejamento e organização do trabalho escolar, monitoramento de processos educacionais e avaliação institucional, gestão de resultados educacionais, além das Dimensões da implementação da gestão escolar: gestão democrática e participativa, gestão de pessoas, gestão pedagógica, gestão administrativa, gestão da cultura e do cotidiano escolar. Passou-se a seguir ao desenvolvimento do método PBL. Conforme Borges et al (2014) é necessário seguir sete passos para concretização da proposta, a saber: 1. Leitura do problema, identificação e esclarecimento de termos desconhecidos. 2. Identificação dos problemas propostos. 3. Formulação de hipóteses (“brainstorming”). 4. Resumo das hipóteses. 5. Formulação dos objetivos de aprendizagem. 6. Estudo individual dos objetivos de aprendizagem. 7. Rediscussão do problema frente aos novos conhecimentos adquiridos (2014, p. 5).
Sendo a turma bastante numerosa, para que o método pudesse ser bem-sucedido foi proposta a divisão dos alunos em oito grupos. Cada grupo recebeu um problema para discussão, diferente daquele que havia elaborado, ou seja, a equipe resolvia o estudo de caso que outra equipe havia elaboraRespeitando as etapas para concretização do método os alunos iniciaram a leitura dos 263
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problemas fazendo a identificação do vocabulário. Em seguida, em uma análise conjunta os grupos foram levados à identificação do problema proposto e buscaram (dentro dos pequenos grupos) formular hipóteses para a resolução do mesmo. Um aluno, escolhido como secretário, foi anotando todas as hipóteses e as resumiu para posterior estabelecimento de um plano de trabalho. Cada grupo buscou então formular os objetivos de aprendizagem, ou seja, definiram quais eram as necessidades de pesquisa e aprofundamento de conhecimentos para que pudessem chegar a uma resposta/solução para o problema com respaldo teórico no campo da Gestão Educacional. Nesse sentido os grupos se organizaram para que cada aluno pudesse pesquisar e aprofundar seus conhecimentos de forma individualizada, possibilitando que eles mesmos definissem as lacunas de conhecimento. Esses estudos foram realizados ao longo de uma semana, atendendo aos objetivos formulados. Finalmente o grupo se reuniu após uma semana de estudos independentes para rediscutir o problema frente aos novos conhecimentos adquiridos. Nessa etapa a figura do professor como tutor foi indispensável para a finalização do estudo de caso. Avaliando todo processo foi possível perceber que os alunos se envolveram muito e colaboraram uns com os outros, o que otimiza as habilidades para o trabalho em equipes, cada um respeitando o espaço e opinião do outro ao mesmo tempo que cada componente do grupo se sentia responsável pela condução e sua participação no processo. Também como critério de avaliação foi estabelecido um diálogo com a turma, oportunizando uma avaliação do método de trabalho com o PBL sendo que estes declararam se sentir mais confiantes na construção dos conceitos sobre gestão educacional, pois tiveram a oportunidade de compartilhar, discutir, pesquisar e pensar uma solução para um problema do cotidiano na gestão de uma escola. Os alunos se expressaram de forma positiva podendose observar através de recortes como: “Eu gostei de aprender analisando uma situação prática da escola, foi legal pensar primeiro em 264
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um problema real e depois pesquisar sobre a literatura que aborda a gestão. Parece que aprende mais e de forma mais duradoura do que se apenas ouvisse a explicação do professor sobre o assunto”; “Na Educação sempre há algo novo a ser aprendido. Aprender a buscar conhecimento e se atualizar é muito importante e esse método ajuda nesse sentido. ” “Muito bom trabalhar em grupos, cada um tem algo a contribuir. ” Partindo dessa avaliação, observa-se que a metodologia empregada com a turma do quarto período de Pedagogia alcançou o objetivo previsto, que era motivar os alunos e levá-los a uma busca ativa do conhecimento, além, é claro de estabelecer as condições para o trabalho colaborativo em equipes. A atividade de PBL interdisciplinar, com os alunos do oitavo período do curso de Pedagogia que cursam as disciplinas de Libras – Língua Brasileira de Sinais e Políticas e Administração dos Sistemas de Ensino -, foi realizada no mês de outubro de 2018. Inicialmente abriu-se um espaço de discussão sobre as políticas públicas de inclusão da pessoa surda, possibilitando maior compreensão dos temas, da legislação e do posicionamento pessoal dos alunos em relação às políticas inclusivas, o que contribui de forma significativa para a construção do conhecimento sobre os conteúdos das duas disciplinas. No primeiro encontro, três temas diferentes foram entregues aos alunos divididos em seis grupos, temas esses que relacionavamse a conteúdos dos Planos de Ensino da disciplina Libras: escola bilíngue, inclusão do aluno surdo e formação de professores. Cada tema foi apresentado com referências bibliográficas, cenário atual das circunstâncias e situações-problemas inseridas em estudos de casos pelos quais os grupos deveriam se pautar no desenvolvimento da atividade. Neste momento todas as observações e discussões em grupo foram acompanhadas pelas duas professoras da disciplina que se revezavam analisando as dúvidas, suscitando a participação de todos e promovendo a busca incessante de hipóteses para a so-
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lução das questões apresentadas nos casos. Ao final das discussões os grupos se organizaram para realizar os estudos individuais e a composição do debate a ser realizado na aula da próxima semana. No segundo encontro os um dos grupos apresentou as discussões anteriores e as possíveis soluções encontradas para os casos. Para o seminário os grupos poderiam se organizar como preferissem, utilizando algum recurso tecnológico ou não, da forma que melhor se adaptassem à situação. O seminário que seria em apenas uma aula teve que se estender à próxima em função do debate produtivo estabelecido na turma. Os critérios de avaliação planejados desde o início das atividades nas duas turmas estavam baseados na responsabilização dos alunos pela própria aprendizagem. Uma vez que o PBL deve resultar em tornar os estudantes cada vez mais autônomos faz sentido que eles se encarreguem de julgar se os objetivos de aprendizagem foram atingidos. Há ainda a avaliação do processo de resolução de problemas em grupo, como o aluno se portou em relação ao grupo, se teve uma participação positiva, se estar em grupo ajudou na aquisição das habilidades necessárias para resolver a questão, entre outras observações que foram sugeridas aos alunos no momento da avaliação da atividade. De acordo com as respostas obtidas tanto na avaliação oral e conjunta quanto na autoavaliação realizadas nas turmas obteve-se como resultado uma aprovação de 96% dos alunos quanto à utilização do PBL para desenvolver os tópicos específicos previstos no Plano de Ensino das disciplinas. Houve também aprovação de 98% quanto à aprendizagem decorrente dos debates em grupos e plenária para apresentação de resultados. Na autoavaliação pessoal, 98% dos alunos manifestaram por escrito os impactos positivos da atividade. Na solicitação de feedback os estudantes responderam a seguinte questão: “Do seu ponto de vista, esta metodologia contribuiu para o seu processo de aprendizagem? Em que sentido? ” O retorno apresentou respostas como: “Ótima oportunidade de
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expor as ideias”; “ ... proporcionou aprender e discutir de forma coletiva e percebi que houve grande interação por parte da turma em todas as situações-problema”; “...trouxe um debate sobre as disciplinas de forma dinâmica em que todas puderam participar e ter bom aproveitamento”; “...foi possível esclarecer dúvidas e também aprender possíveis caminhos para colaborar no processo de aprendizagem significativa de alunos com habilidades funcionais diferenciadas abordando o tema da inclusão, assunto relevante e notável na sociedade ”. Muitas vezes os estudantes têm um feedback avaliativo tão tarde que este não auxilia no seu processo de aprendizagem, vez que não o aluno o recebe num formato inadequado e de forma a não sanar as dúvidas e erros na hora em que a atividade está acontecendo. Para ser útil o retorno de uma avaliação deve ser oportuno e estimulante, para auxiliar no incessante crescimento dos alunos de modo a ajudá-los a avançar. Este pode ser considerado um ponto muito positivo do método PBL, pois a autoavaliação permite que os estudantes pesem com mais cuidado o que sabem e o que fazem e o que precisam saber e fazer. Além disso, quando o aluno escreve sua reflexão de aprendizagem e submete-a à avaliação é uma oportunidade de aprendizagem reflexiva. Não obstante à grande maioria de apreciações positivas alguns estudantes não avaliaram tão bem a atividade, mencionando: “... alguns alunos têm mais facilidade que outros para expor suas opiniões o que faz com que quem tem dificuldade fique desmotivado e não assimile o conteúdo”. Esta resposta e outra que não explicita os motivos da apreciação indicam uma certa fragilidade do método, pois estimular à exposição oral das ideias acaba viabilizando a participação maior de alunos com mais facilidade de comunicação. Faz-se necessário, portanto, que conhecendo seus alunos, o professor utilize alguma estratégia para viabilizar a participação de todos para não comprometer os resultados do método.
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CONCLUSÃO
Este trabalho não se encerra aqui. As modernas exigências sócio educacionais impulsionam novos métodos de aprendizagem e o PBL, como muitos outros, tende a ser revisto, modificado e atualizado conforme as variadas demandas didático pedagógicas em diferentes ambientes sociais. A melhor expectativa é que as salas de aula se transformem em salas de aprendizagem significativa, onde tenham lugar o pensamento livre e crítico e a busca de soluções inovadoras e comprometidas com a transformação social e cultural do meio em que se vive. Ao longo do tempo os resultados da utilização de métodos de aprendizagem ativa na formação de um cidadão crítico e atuante, como o PBL, serão reconhecidos socialmente percebendo-se os métodos ativos com uma função social libertadora do pensamento e propícia à reflexão crítica, uma vez que, o trabalho docente deixa sempre em aberto uma solução a ser construída e aplicada na sociedade. REFERÊNCIAS
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Capítulo 19 METODOLOGIAS ATIVAS COMO FONTE DE MOTIVAÇÃO PARA ALUNOS E PROFESSORES NO PROCESSO DE ENSINO-APRENDIZAGEM BASEADO EM COMPETÊNCIAS E HABILIDADES Denny José Almeida Costa RESUMO
Este capítulo apresenta uma temática que abrange dois universos que funcionam de modo complementar e suplementar. De um lado, professores com uma série de atividades e de protocolos a serem seguidos, além da tarefa, muitas vezes difícil de ser executada, que é desenvolver habilidades e competências diversas em turmas heterogêneas. De outro, temos alunos com os mais variados perfis de aprendizagem que precisam cumprir etapas e administrar um sistema de pontuação estático quantitativo. Entre eles, a constante indagação acerca do que é considerado útil, do que é funcional e, mais que isso, de quais são as vontades intrínsecas de cada parte para a construção do saber. O objetivo deste trabalho foi dialogar teorias pedagógicas, a partir de Paulo Freire e outros autores, com os princípios metodológicos ativos de duas práticas a fim de se chegar a um denominador comum para o questionamento: como podem as metodologias ativas funcionar como propulsão para que todos os envolvidos no processo pedagógico de educação sintamse motivados para desenvolver conhecimento? As análises e os
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confrontos das concepções teóricas concernem a considerações parciais que elucidam a prática ativa como meio de se equacionar as inquietações de todos os envolvidos do processo. Isso os torna membros partícipes de um mesmo lado ao invés de se cristalizar a velha dicotomia dos dois lados, ou seja, são todos responsáveis pelo ensino e pela aprendizagem. EDUCAR DE MODO ATIVO RUMO AO SENSO CRÍTICO O educador democrático não pode negar-se o dever de, na sua prática docente, reforçar a capacidade crítica do educando, sua curiosidade, sua insubmissão. Uma de suas tarefas primordiais é trabalhar com educandos a rigorosidade metódica com que devem se “aproximar” dos objetos cognoscíveis. E esta rigorosidade metódica não tem nada a ver com o discurso bancário meramente transferidor do perfil do objeto ou do conteúdo . É exatamente nesse sentido que ensinar não se esgota no tratamento do objeto ou do conteúdo , superficialmente feito, mas se alonga à produção das condições em que se aprender criticamente é possível. (FREIRE, Paulo. Pedagogia da autonomia. 2011, p. 28)
Em sua última obra publicada em vida, no ano de 1996, o educador e filósofo recifense Paulo Freire enfatiza sobre a necessidade do rigor de um método que auxilie o aprendiz a se aproximar do conhecimento. A respeito disso, deixa claro que não se trata de olhar para o aluno como um depositário de conteúdos e ementas, como mero receptor de algo que não possui. Pelo contrário, faz-se imprescindível criar oportunidades para que o aprendizado crítico se efetive. À beira do século XXI, o estudioso fazia uma leitura do ensino brasileiro que vislumbrava as percepções de educação que começariam a emergir décadas depois. A escola, que sempre teve o “poder de transmitir informações”, precisaria se reinventar para dar conta de gerações cada vez mais conectadas, com acesso a informações
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múltiplas e que precisariam de métodos ainda mais “rígidos”, do ponto de vista da efetividade, para continuar cumprindo seu papel. Nas salas de aula atuais encontramos uma série de indagações que partem tanto do aluno quanto do professor. Com relação ao ensino, o docente, muitas vezes se questiona sobre o que precisa executar para que seus alunos aprendam. Como ir além dos conteúdos elencados nas matrizes curriculares para construir habilidades e competências? É possível criar as condições de criticidade elucidadas por Freire? Os discentes, por sua vez, questionam o professor sobre a utilidade do que se aprende. Muito se quer saber sobre a funcionalidade dos itens em pauta. Mais do que a reflexão, para além da interpretação, o que se deseja saber, primordialmente, é para que serve e se há moeda de troca. Não raro ecoam-se vozes “vale nota?”, “cai na prova?”, “preciso anotar?”. A relevância do que é ensinado pelos professores parte da premissa da importância que será dada ao tópico ministrado. Se ele estiver nas provas e simulados e seu peso fizer diferença na nota daquele que dominar o assunto, sim, é importante. Se a proposta é refletir, raciocinar, elaborar hipóteses ou até mesmo debater sobre determinado tema, sem qualquer pontuação, a pertinência, para o alunado, diminui. Obviamente, não se pretende aqui condenar a postura do aluno – até que ponto não estaria certo ao trazer à tona tais indagações? – e também não seria justo julgar as práticas utilizadas pelos docentes. Esses, via de regra, possuem repertório suficiente para o drible de questionamentos que cerceiam a prática educativa. O que se coloca em pauta é como dialogar mundos que, aparentemente, estão afastados por ideologias que parecem não ser convergentes. Além dessas interrogações que pairam de ambos os lados, precisamos nos lembrar de que a maioria das instituições de ensino brasileiras, sejam elas públicas ou particulares, recebem alunos com graus distintos de interesse, de nível cultural, de vivências e, não obstante, de conhecimento. Essa mistura de fatores associada 273
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a condições de aprendizagem adversas torna o objeto de estudo, na maioria das vezes, repetitivo, monótono, isolado, cansativo e cada vez mais distante do que espera o aluno e do que projeta o professor. Falta adequação aos dois lados da moeda, ou seja, há inadequação cada vez mais ampla, profunda e grave entre os saberes separados, fragmentados, compartimentados entre disciplinas, e, por outro lado, realidades ou problemas cada vez mais polidisciplinares, transversais, multidimensionais, transnacionais, globais, planetários (MORIN, 2003, p.18)
Se pensamos na composição escolar, nos dizeres de Morin, e identificamos gerações de alunos com dificuldades e necessidades cada vez mais heterogêneas, obviamente passamos a analisar o papel que o docente ocupa nesse espaço educativo. A pergunta que surge ao lermos o final da epígrafe deste texto é “como produzir condições de aprendizado crítico a partir desses contextos polidisciplinares, transversais, planetários?” E é partir dessa indagação que seguem as discussões propostas neste trabalho. PERFIS DE APRENDIZAGEM: BREVES PERCEPÇÕES TEÓRICAS
Para o encadeamento das ideias, à guisa de uma interlocução entre as indagações levantadas inicialmente e as metodologias ativas de ensino, façamos uma breve análise de algumas das principais vertentes de aprendizagem que sustentam o comportamento educacional dos séculos XX e XXI. Na história do pensamento filosófico e pedagógico sobre a aprendizagem, desde meados do século XIX, podemos dizer, em linhas gerais, que houve a ascensão de correntes que se dividem em comportamentais, cognitivas e humanistas. Ou seja, a maneira como se aprende foi estudada por diversos pesquisadores que chegaram a esses eixos.
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Na linha comportamental, situam-se autores como Pavlov, Watson e Skinner que, excetuando-se questionamentos intrínsecos de cada um deles, trabalharam as ideias de que o indivíduo responde a estímulos exteriores, pouco importando o processo mental envolvido na aprendizagem. Essa perspectiva teórica ainda trata o sujeito como um ser passivo e que é moldado por outrem. Além disso, pensa-se que todos os indivíduos aprendem do mesmo modo, em qualquer circunstância. De acordo com Skinner (1972, p.4), “ensinar é o ato de facilitar a aprendizagem; quem é ensinado aprende mais rapidamente do que quem não é”. Se isolamos essa frase de seu contexto, poderíamos pensar que o autor pudesse se referir aos moldes mais contemporâneos de ensino-aprendizagem, em que o professor atua como orientador na construção do conhecimento. No entanto, pode-se perceber pela lógica de sua teorização que esses dizeres se alinham ao fornecimento de situações e posteriores indicações de quais itens precisam ser observados, feitas pelo professor, para que o aprendiz exercite determinados comportamentos que possam ser ensinados. Outra abordagem teórica de pensamento diferente do comportamentalismo abarca o cognitivismo. Nesta seara, destaca-se o pensamento de que o aprendizado acontece pela via do pensamento, da análise, da percepção de que um conjunto de fatores opera para a construção do que vem a ser o aprender. Corpo, mente e sociedade operam juntos nesse trabalho. O conhecimento, portanto, é construído pelo indivíduo através da interação entre esses elementos. Comungam dessa lógica autores como Piaget, Vygotsky, Ausubel, Gardner. Diferentemente dos comportamentalistas, esses pesquisadores acreditam no indivíduo enquanto agente ativo do processo de ensino-aprendizagem. Nesse aspecto, Vygotsky, por exemplo, amplia as relações de ensino-aprendizagem na medida em que apresenta que não
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podemos limitar-nos a um único nível de desenvolvimento. Tem de se determinar pelo menos dois níveis de desenvolvimento de uma criança, já que, se não, não se conseguirá encontrar a relação entre desenvolvimento e capacidade potencial de aprendizagem em cada caso específico. Ao primeiro destes níveis chamamos nível de desenvolvimento efetivo da criança. Entendemos por isso o nível de desenvolvimento das funções psicointelectuais da criança que se conseguiu como resultado de um específico processo de desenvolvimento já realizado (VYGOTSKY, 2001, p. 111).
O autor dialoga com as premissas idealizadas por Piaget. Em relação à Piaget, as ideias de Vygotsky apresentam a novidade da história social, na qual a construção do aprendizado se liga, também, às relações que o aluno desenvolve em seus círculos sociais, numa perspectiva construtivista. Maslow, Wallon e Rogers são estudiosos que integram a linha humanista. Nela, as condições intrínsecas dos aprendizes são levadas em consideração, tais como fatores motivacionais para se aprender algo. A ausência de linearidade dos mecanismos de aprendizagem, a junção entre afetividade e cognição e as condições de autoconhecimento favorecem as orientações feitas pelo docente, por exemplo. Enquanto Wallon se preocupou com a pessoa em si, Piaget teve seu foco na análise da inteligência. O autor chegou à conclusão de que o indivíduo assimila informações para engrandecer seu conhecimento através de uma seleção de itens que acontece naturalmente. Depois, esse indivíduo acomoda essas informações de modo a retê-las, a partir de um repertório cognitivo intrínseco (DESLANDES, 2006). A partir da lógica construtivista, Piaget fixou-se na análise de como o sujeito apreende sobre o universo de uma maneira espontânea. A interação com a realidade possibilita a organização de dados exteriores e a construção do conhecimento a partir de estruturas mentais que
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são formadas, criando noções de causa, quantidade, volume, proporção e outras mais. As teorizações sobre a aprendizagem aqui apresentadas servem para analisarmos como as práticas em sala de aula precisam ser constantemente repensadas. A variedade de fatores que encontramos no cotidiano escolar pode e deve ser avaliada para que os objetivos de um processo educativo sejam alcançados. A singularidade do indivíduo leva à composição de turmas completamente diferentes entre si, e que, em seu bojo, isoladamente, já carregam características que são heterogêneas demais para encerrarem as discussões sobre um modo único de ensinar e aprender. Nesse contexto, podemos pensar que as metodologias ativas de ensino e aprendizagem dialogam intimamente com a necessidade de pensar na fusão dessas teorias e na análise de quais delas têm-se feito mais eficientes em sala de aula. Diante da pluralização dos ambientes e da multiplicidade de olhares sobre os indivíduos, fechar-se em uma única hipótese de construção do conhecimento é como ignorar que a modernidade e a pós-modernidade alteraram os meios de vivência e convivência da sociedade. METODOLOGIAS ATIVAS DE APRENDIZAGEM: UMA SAÍDA PARA A MOTIVAÇÃO DE ALUNOS E PROFESSORES
Qualquer prática em sala de aula pode ser efetivada como ativa ou não. Depende da ótica de cada docente e da maneira como se desenvolve cada prática. Para títulos de identificação e análise desses itens é preciso entender que metodologias ativas de aprendizagem apontam para um caminho distinto de métodos tradicionais pré-estabelecidos, nos quais o professor concentra em si toda a fonte do saber. Nas propostas ativas, o foco da aprendizagem é o aluno. Ele protagoniza a tarefa, deixando para segundo plano a ação docente. É o discente quem pensa, articula ideias, faz relações e constrói,
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ao seu tempo, o conhecimento. Ao contrário do estilo em que o professor passa vários minutos ou até horas explanando conceitos de um dado conteúdo, no método ativo essa exposição seria dividida em vários momentos, de modo que o aluno tivesse uma participação e possibilidade de interação durante o processo. É importante ressaltar que a utilização das metodologias ativas não pressupõe a anulação das aulas expositivas. Cabe ao professor elaborar estratégias que sejam pertinentes para a turma e o nível que está lecionando, compatíveis com o conteúdo a ser ministrado, no tempo que ele dispõe. Isso quer dizer que em nem todas as aulas, obrigatoriamente, o docente precisa trabalhar com ferramentas ativas durante todo o tempo. Precisa-se pensar nessa adequação aos moldes do sistema educacional brasileiro para que o fracasso de algumas tentativas de aplicação metodológica ativa não seja um fator de desmotivação do trabalho. Olhar para essas práticas como formas que podem ou não funcionar em determinados contextos é algo que impulsiona o professor a estar sempre na busca do desenvolvimento de suas práticas pedagógicas e percorrendo caminhos diferentes para a construção de habilidades e competências previstas nos planos pedagógicos curriculares. Nesse aspecto, é necessário traçar objetivos claros para cada sequência didática. Para tanto, é fundamental apropriar-se do que significa, de fato, auxiliar os discentes a construírem suas competências e habilidades. Entende-se por habilidade a capacidade de saber fazer algo específico. É a aplicação de determinado conhecimento para alcançar determinado resultado. Na perspectiva de Perrenoud (2000), a habilidade seria a operacionalização de faculdades mentais que levam o indivíduo a executar determinada tarefa ou tomar uma decisão. Nesse aspecto, infere-se que habilidade é algo menos amplo e mais específico em relação ao conceito de competência.
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Por competência, segundo Perrenoud (2000), compreende-se a capacidade de articular uma série de itens cognitivos para desenvolver performances diante de situações específicas em contextos do cotidiano. O exercício da competência envolve uma complexidade de fatores que perpassam âmbitos individuais, emocionais, afetivos e sociais para o desenvolvimento de um cidadão consciente, crítico e ciente de seu espaço na sociedade. Desta forma, pode-se questionar como ensinar a partir de habilidades e competências? Por onde começar: ensinando habilidade e depois a competência ou o contrário? Em uma análise mais minuciosa, verifica-se que se trata de um ciclo que tem por premissa o que o aluno já carrega de bagagem, alinhado ao que orienta a perspectiva piagetiana de construtivismo. Tal ciclo se desencadeia na medida em que diante de um determinado conteúdo para ser trabalhado e que o aluno precisa desenvolver itens desconhecidos, ele vai precisar acionar uma determinada competência já adquirida para, então, conseguir apreender uma nova habilidade. Em perspectivas futuras, essa nova capacidade de fazer algo vai se somar a outras habilidades, possibilitando o desenvolvimento de competências inéditas. O trabalho encarado de maneira cíclica sempre dependerá da ação discente, o que tem um link direto com os protocolos a serem desenvolvidos por métodos ativos de aprendizagem, pois se há valorização do que já foi construído até então, o protagonismo do alunado entra em cena. Em contrapartida, a responsabilidade do professor aumenta na medida em que precisa criar processos para potencializar o conhecimento do aluno, mas, ao mesmo tempo, diminui, ao passo em que se desloca do papel de detentor de um conhecimento que precisa ser transmitido a indivíduos que nada sabem sobre temáticas x ou y. Ao minimizar o peso carregado pelo docente, essa perspectiva de trabalho pode funcionar como uma mola propulsora porque não encerra o processo de ensino-aprendizagem. No esquema tradicio279
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nal, se o aluno não aprende o que o professor expõe em sala, há uma nota ruim na avaliação formal (prova escrita individual sem consulta – ao final das explanações de um conteúdo) e o processo (de onde o aluno saiu e onde ele chegou, por exemplo) fica de escanteio. Por sua vez, o culpado pelos discentes não terem obtido sucesso acaba sendo do docente. Em uso de métodos ativos, o professor não carrega uma “culpa” por ter “fracassado” durante suas aulas. Se o foco é o aluno e ele fracassa, podemos pensar que o peso disso pode ser dividido entre ambas as partes ou até mesmo dividido entre as partes e outros fatores, um deles, por exemplo, o tipo de atividade solicitada ou algum fator externo ao processo. Ao não se sentir o causador do problema, o professor tem maiores condições de mudar de posicionamento, reelaborar suas ideias e alterar a rota dos procedimentos sem desacreditar de si. A segurança de que não necessariamente apenas ele é o responsável pelo mau desempenho dos alunos pode ser uma alavanca para encorajar os alunos que mais precisam de incentivo para os estudos. Muito se fala sobre o desinteresse de alunos no processo de aprendizagem. Facilmente poderíamos ter um leque de depoimentos que versam sobre o quanto algumas aulas e alguns conteúdos são considerados desmotivadores. Se aprofundarmos as pesquisas, baseadas nessas falas comuns de alunos, poderemos perceber o quanto são inúmeras as variáveis que fazem os discentes chegarem a essa conclusão. De outro lado, complementando e suplementando esse discurso, professores endossam sobre o que analisam diante das posturas de suas turmas. A lógica discursiva parte de uma premissa de que o alunado não aprende ou aprende mal porque não se sente motivado, não tem interesse pelo que está sendo visto. Muitos docentes ainda incorporam a essa fala o dado de que já “tentou de tudo” e não obteve êxito. Apoiados nesse discurso, a maioria se sente incapaz de operar mudanças e, obviamente, desmotivam-se.
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Pretendemos chamar a atenção aqui para o fato de que se os discursos convergem é porque algo não está trilhando um bom caminho. Esperar, milagrosamente, pela mudança discente é como “lavar as mãos” e acreditar que, enquanto profissional, o professor não é capaz de, pelo menos, provocar e incitar a mudança de postura de seu aluno. O que se propõe expor, após a análise dos diversos perfis de aprendizagem, é como alguns processos das metodologias ativas de aprendizagem talvez possam servir de mote para a operacionalização da mudança que se pretende fazer no ensino. PEER INSTRUCTION E SALA DE AULA INVERTIDA: ALGUMAS POSSIBILIDADES
A prática desenvolvida por Eric Mazur, da universidade de Harvard, e que tem logrado êxito nas universidades estadunidenses trata-se de inserir alguns questionamentos ao longo de uma aula expositiva e que os alunos tenham tempo para pensar e formular suas hipóteses de respostas individuais para depois dialogar com seus pares. Algo que obriga o desenvolvimento da argumentação discente no momento da construção do conhecimento. A partir das respostas dos alunos, o professor toma medidas que vão desde ao “reensino”, caso a porcentagem de acertos da turma seja inferior a 30%; passando pela discussão entre grupos, caso a porcentagem fique entre 30% e 70%; e apenas relembrar alguns tópicos, passando para outros, caso haja mais de 70% de acertos. Nessa prática, o feedback aluno-professor é feito através de uma interação constante e o aluno passa da condição de mero ouvinte a um membro participativo da aula, que precisa agir para aprender (MAZUR, 1996). A prática colabora para que o foco da aprendizagem seja a busca pelo estudo em sua fonte e evita que o processo seja baseado em transmissão de conteúdos/informações por parte do professor.
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A instrução feita por colegas favorece a criação de um ambiente colaborativo onde os alunos sentem-se confiantes para dialogar e tirar dúvidas inicialmente entre os pares, para depois checar com o professor, caso necessário. Nesse aspecto, o professor assume um papel de orientador, nas linhas do que pensava Paulo Freire – o professor como mediador do aprendizado. Essa prática se faz possível mediante a outras premissas que embasam a ideia da Sala de Aula Invertida. Testada e comprovada por Bergman e Sams (2016), professores pesquisadores estadunidenses, a sala de aula invertida (Flipped Classroom), segundo os autores, coloca o aluno em evidencia ao fazê-lo pensar no conteúdo antes mesmo de ser abordado em sala pelo professor. O método, inicialmente, começou de um processo de gravação de aulas feito pelos docentes e enviados aos alunos como tarefa para ser realizada em casa. No período da aula, os ajustes seriam feitos baseando-se no que os alunos não compreenderam do tópico estudado. Ao desenvolver a prática, os professores sentiram algumas necessidades e começaram a aprimorar o processo, como, por exemplo, possibilitar que cada aluno avance em sua construção do conhecimento de maneira a respeitar o ritmo de aprendizado individual. A inversão que ocorre em relação à sala de aula é que as atividades desenvolvidas em sala passam a ser um dever de casa e a prática dos conceitos através de exercícios (por exemplo) começa a ser realizado em sala. No entanto, os próprios autores Bergman e Sams (2016) enfatizam que é preciso uma mudança de paradigma na concepção escolar e na mentalidade dos alunos, por exemplo, no ensinamento de preceitos importantes de como assistir aos vídeos ou ler os textos anteriormente e que tipo de perguntas devem ser feitas – uma instrumentalização discente faz-se necessária. Outro aspecto importante abordado pelos pesquisadores é que a inversão não consiste em algo único, pronto e acabado, mas que vai depender de muitas variáveis que cercam o universo acadêmico. 282
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Cabe ao professor eleger como, quando e porque inverter a sala de modo que se obtenha os resultados almejados. A fusão das duas técnicas para uma sequência didática de determinado conteúdo pode abrir portas para um aprendizado mais efetivo e estimulante. Se pensarmos nas práticas construtivistas aqui elencadas poderíamos pensar que a sala de aula invertida prepara os alunos para que não haja o estranhamento do conteúdo. Com isso, o professor fará o aproveitamento daquilo que o aluno já construiu. Nessa perspectiva, o docente estaria preparando os alunos para o desenvolvimento de novas habilidades a partir de competências em processo de desenvolvimento. Nota-se, por exemplo, que o peer instuction serviria como um mecanismo de checagem do aprendizado, se aplicado posteriormente à sala de aula invertida em uma mesma turma. CONSIDERAÇÕES FINAIS
As metodologias ativas podem servir de motivação para professores que querem renovar seu repertório e acreditam no potencial de seus alunos, uma vez que elas partem do pressuposto de que o aluno deve agir, que ele deve ser o “ser atuante” do processo educativo. As metodologias ativas são motivadoras para os alunos porque eles começam a ver a utilidade do que é ensinado e de uma forma cíclica voltamos aos questionamentos do início do capítulo. Como poderíamos, de fato, promover uma inovação em sala de aula, transpondo a lógica do aprendizado instrucional e partindo para uma lógica mais participativa, na qual professores e alunos conseguem interagir e, a partir dessa interação, construir conhecimento? Os caminhos oferecidos pelas práticas que envolvem as metodologias ativas parecem motivar os envolvidos porque descentralizam o “poder” da sabedoria e o dissolve para o grupo aprendiz.
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Para além disso, é preciso associar as práticas com as metodologias ativas com a análise dos discentes feita a partir das teorizações pedagógicas apontadas acima, pois elas é que mostram ao professor qual o melhor caminho a ser traçado. Quando o docente tem o domínio das diversas formas que os indivíduos tem de aprender, ele tem a possibilidade de mesclar suas práticas e tornar suas aulas mais dinâmicas, eficazes e produtivas. Ter a consciência de que somente algumas competências e habilidades de apenas uma parte dos estudantes serão desenvolvidas se utilizarmos apenas um método de ensino (sobretudo se esse método for centralizado na figura do professor) pode ser a chave para as transformações. O deslocamento do olhar da educação para sistemas mais abertos, flexíveis e que abracem as novas gerações de alunos parece ser o caminho para a efetivação e melhoria de um ensino que não apresenta soluções mágicas de resolução de problemas escolares, mas por outro lado, aponta caminhos desafiadores para a mudança de paradigmas pré-estabelecidos por um tempo que já não condiz com as condições reais e atuais de ensino-aprendizagem. REFERÊNCIAS
DESLANDES, Keila. Psicologia: uma introdução à psicologia Cuiabá: EdUFMT, 2006. MAZUR, E. Peer instruction: a user’s manual. Reading: Addison-Wesley, 1996. 253 p. MORIN, Edgar. A cabeça bem-feita: repensar a reforma, reformar o pensamento. Tradução Eloá Jacobina. - 8a ed. -Rio de Janeiro: Bertrand Brasil, 2003. 128p PERRENOUD, Phillipe. Construir competências é virar as costas aos saberes? In: Pátio – Revista Pedagógica, Porto Alegre, n. 11,p. 15-19, nov. 1999. Disponível em: <http://www.unige.ch/fapse/SSE/teachers/ perrenoud/php_main/php_1999/1999_39.html>. Acesso em: 10 out. 2018. PERRENOUD, Phillipe et al. 10 novas competências para ensinar. Porto Alegre: ArtMed, 2000. PALHARINI. Cristiano. Peer instruction: uma metodologia ativa para o processo de ensino aprendizagem. In: https://cristianopalharini. wordpress.com/2018/07/25/ Acesso em 06 novembro 2018.
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SKINNER, Burrrhus Frederic. (1972). Tecnologia do ensino. (Rodolpho Azzi, Trad.). São Paulo: Herder, Ed. da universidade São Paulo, 1972. ______.Ciência e Comportamento Humano. São Paulo: Martins Fontes, 2003. VYGOTSKY, Lev Semyonovitch. Pensamento e Linguagem. São Paulo: Martins Fontes, 1998.
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SOBRE OS COLABORADORES Any Carolina Cardoso Guimarães Vasconcelos Mestre em Biotecnologia pela Universidade Federal do Piauí (UFPI). Doutorado em andamento no programa RENORBIO – UFPI. Professora do curso de Medicina e Diretora Acadêmica da Faculdade de Ciências Humanas, Exatas e da Saúde do Piauí/Instituto de Educação Superior da Vale do Parnaíba. Cleize Silveira Cunha Mestre em Ensino em Ciências da Saúde e do Meio Ambiente pelo Centro Universitário de Volta Redonda. Doutoranda em Enfermagem e Biociências pela UNIRIO. Professora nos cursos de Medicina e Fisioterapia do Centro Universitário Presidente Tancredo de Almeida Neves. Cristiane Silveira Cunha Mestre em Ensino em Ciências da Saúde e do Meio Ambiente pelo Centro Universitário de Volta Redonda (UniFOA). Doutoranda em Ciências pela UNIRIO. Professora de Semiologia Médica da UniFOA. Daniel Mapa Clemente Mestre em Metalurgia e Conformação de Metais pela Universität Duisburg-Essen. Professor do Centro Universitário Presidente Tancredo de Almeida Neves. Daniel Riani Gotardelo Mestre em Farmacologia Clínica pela Universidade Federal do Ceará. Doutorado em andamento no Instituto de Pesquisas Energéticas e Nucleares da Universidade de São Paulo. Coordenador do curso de Medicina do ITPAC Palmas. Professor Adjunto do Módulo de Sistemas Orgânicos Integrados (Farmacologia V) do curso de Medicina do ITPAC Palmas.
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Denny José Almeida Costa Graduado em Letras pela Universidade Federal de São João Del Rei (UFSJ). Mestre em Letras pela UFSJ. Professor nos cursos de Administração, Educação Física, Ciências Contábeis, Engenharias Civil e de Produção do Centro Universitário Presidente Tancredo de Almeida Neves (UNIPTAN). Douglas Zampar Mestre em Letras pela Universidade Estadual de Maringá. Professor do Centro Universitário Integrado. Eliane Moreto Silva Oliveira Mestre e Doutora em Ciências de Alimentos pela Universidade Federal de Minas Gerais. Docente nos cursos de Educação Física e Enfermagem do Centro Universitário Presidente Tancredo de Almeida Neves (UNIPTAN). Coordenadora de Pesquisa do UNIPTAN. Flávia Magela Rezende Ferreira Mestre em Educação pela Universidade Federal de Lavras. Professora no Centro Universitário Presidente Tancredo de Almeida Neves. Gláucio Mazetto Siqueira Mestre em Ciências (Neurociência/Neurofísica) pela Universidade Federal de São João del-Rei (UFSJ). Doutor em Ciência (Bioengenharia Neuronal) pela UFSJ. Professor de Fisiologia Humana nos cursos de Medicina e Enfermagem do Centro Universitário Presidente Tancredo de Almeida Neves. Heberth Paulo de Souza Mestre em Língua Portuguesa pela PUC-MG. Doutor em Linguística pela Universidade Federal de Minas Gerais. Realiza Pós-doutorado pela Faculdade de Medicina da Universidade Federal de Juiz de Fora. Professor de Língua Portuguesa e Metodologia Científica no Centro Universitário Presidente Tancredo de Almeida Neves (UNIPTAN). Pró-Reitor de Pesquisa e Extensão do UNIPTAN.
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Jader José de Carvalho Mestre em Ciências (Química e Física de Materiais) pela Universidade Federal de São João del-Rei (UFSJ). Doutorado em andamento pela UFSJ. Professor de Física no Centro Universitário Presidente Tancredo de Almeida Neves. Jaíne das Graças Oliveira Silva Resende Mestre em Ciência pela Universidade Federal de Lavras. Especialista em Microbiologia pela PUC-MG. Professora nos cursos de Medicina, Educação Física e Enfermagem do Centro Universitário Presidente Tancredo de Almeida Neves. Jaqueline Melo Soares Mestre em Ciências Veterinárias pela Universidade Federal de Uberlândia. Doutora em Ciências pela Universidade Federal de Minas Gerais. Professora do curso de Medicina no módulo de Sistemas Orgânicos Integrados (Genética e Embriologia) do Instituto Metropolitano de Ensino Superior (IMES/Univaço) de Ipatinga-MG. Jaqueline Vieira Rangel Mestre em Educação pela Universidade Federal de Juiz de Fora. Professora de Psicologia da Educação – Aprendizagem e Desenvolvimento do curso de Pedagogia do Centro Universitário Presidente Tancredo de Almeida Neves. João Ozório Rodrigues Neto Mestre em Ensino em Ciências da Saúde e do Meio Ambiente pelo Centro Universitário de Volta Redonda (UniFOA). Professor de Semiologia Médica da UniFOA. José Mauricio de Carvalho Mestre em Filosofia pela Universidade Federal de Juiz de Fora. Doutor em Filosofia pela Universidade Gama Filho. Professor Titular Aposentado da Universidade Federal de São João del-Rei. Professor de Psicologia no Centro Universitário Presidente Tancredo de Almeida Neves.
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Lívia Naiara de Andrade Mestre em Ciências da Computação pela Universidade Federal de Minas Gerais. Coordenadora Geral de Pesquisa e Extensão e Professora do Centro Universitário Presidente Tancredo de Almeida Neves. Luciana Martins Ezequiel Sousa Lima Mestre em Administração pela Fundação Universidade Regional de Blumenau. Doutoranda em Administração pela PUC-MG. Professora do curso de Administração no Centro Universitário Presidente Tancredo de Almeida Neves. Luiz Bittencourt Mercanti Graduação em Educação Física pela Universidade Federal do Rio de Janeiro (UFRJ). Mestre em Ciências da Motricidade Humana pela Universidade Castelo Branco. Professor no curso de Educação Física do Centro Universitário Presidente Tancredo de Almeida Neves (UNIPTAN). Marcel Abrão Mestre em Odontologia com ênfase em Ortodontia e Ortopedia Facial pela PUC-MG. Professor e Coordenador do curso de Odontologia do Centro Universitário Presidente Tancredo de Almeida Neves. Marcele Pereira Silvestre Gotardelo Mestranda em Ensino de Ciências e Saúde pela Universidade Federal do Tocantins. Coordenadora do Laboratório Morfofuncional Integrado do ITPAC Palmas. Márcia Hiromi Sakai Mestre em Saúde Coletiva pela Universidade Estadual de Londrina (UEL) e Doutora em Medicina e Ciências da Saúde pela UEL. Professora Titular do curso de Medicina da UEL. Maria Dulce Santiago de Carvalho Mestre em Psicologia pela Universidade Federal de São João del-Rei. Professora no Curso de Medicina do Centro Universitário Presidente Tancredo de Almeida Neves.
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Maria José Sparça Salles Mestre em Genética pela McGill University – Canadá. Doutora em Ciências Biológicas (Genética) pela Universidade de São Paulo. Professora Associada da área de Embriologia na Universidade Estadual de Londrina. Maria Tereza Gomes de Almeida Lima Graduada em Letras pela Universidade Federal de São João Del Rei (UFSJ). Mestre em Letras/Teoria Literária e Crítica da Cultura (UFSJ). Doutora em Letras/Literatura Comparada pela Universidade Federal de Minas Gerais (UFMG). Pró-Reitora de Ensino e Assuntos Acadêmicos do Centro Universitário Presidente Tancredo de Almeida Neves (UNIPTAN). Mariana Rezende Schuab Mestre em Engenharia Civil pelo Centro Federal de Educação Tecnológica de Minas Gerais. Professora no Curso de Engenharia Civil do Centro Universitário Presidente Tancredo de Almeida Neves. Mauro César Tavares de Souza Mestre em Medicina Geral (Cirurgia Gastroenterológica) pela Universidade Federal Fluminense. Doutor em Cirurgia Torácica pela Universidade Federal do Rio de Janeiro. Coordenador Geral dos Estudos Complementares – ITPAC. Michel Calil Abrão Neto Graduação em Odontologia pela PUC-MG. Especialista em Cirurgia e Traumatologia Bucomaxilofacial. Professor no curso de Odontologia do Centro Universitário Presidente Tancredo de Almeida Neves. Natália Elvira Sperandio Mestre em Letras pela Universidade Federal de São João del-Rei (UFSJ). Doutora em Estudos Linguísticos pela Universidade Federal de Minas Gerais. Pós-Doutorado pela UFSJ. Professora do Centro Universitário Presidente Tancredo de Almeida Neves.
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Nubia Cristina de Freitas Maia Mestre em Oftalmologia pela Universidade Federal de São Paulo (UNIFESP). Doutora em Ciências pela UNIFESP. Professora do curso de Medicina no módulo de Sistemas Orgânicos Integrados (Fisiologia) do ITPAC Palmas. Professora Titular do curso de Medicina da Universidade Federal do Tocantins. Patrícia Uebe Ribeiro Mestre em Educação pela Universidade Federal de São João del-Rei. Professora do curso de Pedagogia do Centro Universitário Presidente Tancredo de Almeida Neves. Paulo de Jesus Chaves Mestre em Bioengenharia pela Universidade Federal de São João del-Rei. Professor e Coordenador do curso de Fisioterapia no Centro Universitário Presidente Tancredo de Almeida Neves. Raquel Auxiliadora Borges Mestre em Educação pela Universidade Federal Fluminense. Professora e Coordenadora do curso de Pedagogia do Centro Universitário Presidente Tancredo de Almeida Neves. Rodolfo Luís Leite Batista Mestre em Psicologia pela Universidade Federal de São João del-Rei. Doutorando em Educação pela Universidade Federal de Minas Gerais. Professor no curso de Psicologia do Centro Universitário Presidente Tancredo de Almeida Neves. Rodrigo Chávez Penha Mestre pelo programa de Saúde Pública e Meio Ambiente da Escola Nacional de Saúde Pública da Fiocruz – RJ. Professor no curso de Medicina da Universidade Federal de São João del-Rei e no curso de Medicina do Centro Universitário Presidente Tancredo de Almeida Neves.
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Metodologia ativas: inovações educacionais no ensino superior
Rodrigo Linhares Lauria Mestre em Gestão e Estratégia pela Universidade Federal do Paraná; Professor do curso de Engenharia de Produção do Centro Universitário Augusto Motta (UNISUAM /RJ). Rosa Gouvêa de Sousa Mestre em Bens Culturais e Projetos Sociais pela FGV-RJ. Professora no curso de Medicina da Universidade Federal de São João del-Rei e no curso de Medicina do Centro Universitário Presidente Tancredo de Almeida Neves. Rubens Bagni Torres Mestre em Engenharia Mecânica (Materiais e Processos de Fabricação) pela Universidade Federal de São João del-Rei. Coordenador e Professor do Curso de Educação Física do Centro Universitário Presidente Tancredo de Almeida Neves. Tereza Cristina de Carvalho Souza Garcês Mestre em Biotecnologia pela Universidade Federal do Piauí (UFPI). Professora do curso de Medicina da Faculdade de Ciências Humanas, Exatas e da Saúde do Piauí/Instituto de Educação Superior da Vale do Parnaíba. Vander José das Neves Graduado em Fisioterapia pela Universidade Metodista de Piracicaba (UNIMEP). Mestre e Doutor em Odontologia na área de Fisiologia Oral/ Fisiologia Humana pela Universidade Estadual de Campinas (UNICAMP). Realizou Pós-Doutorado em Fisiologia Humana - Fisiologia de Órgãos e Sistemas pela Universidade de São Paulo (USP). Professor de Fisiologia Humana nos cursos de Medicina, Odontologia e Educação Física do Centro Universitário Presidente Tancredo de Almeida Neves (UNIPTAN). Vanessa Conrado Montalvão Torres Graduação em Educação Física pela Universidade Presidente Antônio Carlos. Mestre em Saúde Mental pela Universidade Federal de São João del-Rei.
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Metodologia ativas: inovações educacionais no ensino superior
Vinícius Guzzoni Mestre em Odontologia pela FOP/UNICAMP. Doutor em Ciências Fisiológicas pela Universidade Federal de São Carlos (UFSCar). Professor do Centro de Biotecnologia no Programa Multicêntrico de Ciências Fisiológicas da Universidade Federal da Paraíba. Washington de Macedo Lemos Mestre em Engenharia de Produção pela Coppe/Universidade Federal do Rio de Janeiro. Professor das Faculdades Dom Bosco.
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