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EM FAMÍLIAALMOÇO

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CONHEÇA QUEM ESTÁ POR TRÁS DO FUNNY FEELINGS, RESTAURANTE DE SÃO LEOPOLDO FAMOSO PELA EXPERIÊNCIA CRIATIVA E LÚDICA

Para que um estabelecimento ganhe o carinho e o reconhecimento da clientela, deve, além de servir boa comida, oferecer um atendimento individualizado — destacar-se no meio gastronômico é uma tarefa difícil, já que existem infinitas opções para o público decidir entre os preferidos. No entanto, há lugares que conseguem encantar e transformar um simples jantar ou café da tarde em uma grande experiência. Assim é o Funny Feelings, um bar café localizado no centro de São Leopoldo que, além de oferecer pratos saborosos de nomes inusitados, dispõe de um ambiente cheio de referências a filmes, séries e games.

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Do lado de fora, com uma pintura discreta e uma placa pequena indicando “Restaurante”, quem passa por ali não tem noção de tudo que aquele lugar pode proporcionar, mas até isso é uma estratégia dos donos. Fabiano Chaves, cofundador do Funny, conta que o motivo da fachada ser tão simples está no objetivo de surpreender quem passa pela porta de entrada.

“A fachada é extremamente discreta e isso é proposital. A gente gostaria que as pessoas, quando entrassem no Funny, mesmo olhando por fora, ficassem na dúvida se era aqui mesmo. Porque quando a pessoa entra, ela já dá de cara com um lugar grande, com uma iluminação bacana”, relata, enquanto estamos sentados em uma mesa do restaurante, em um sábado de outono. A música ao fundo está tão alta que Fabiano precisa pedir licença para baixar um pouco o volume e conseguirmos conversar. E esse é o clima de quem procura o Funny: descontração e bom humor.

A verdade é que a magia do Funny, muito além de estar na decoração atrativa, com centenas de objetos nas paredes, no bom gosto musical ou nos pratos criativos com nomes engraçados, como “bafo de bode”, “puta merda” e “a fera”, está nas pessoas que trabalham lá.

A gentileza, a alegria e a simpatia ao anotar um pedido são capazes de melhorar a noite de alguém.

n Fabiano esbanja simpatia atrás do balcão do Funny. Além da visão para os negócios, o cofundador do restaurante é muito criativo. Laura Coelho é gerente do Funny Feelings há sete meses. Já morou em seis estados diferentes e tem o desejo de trabalhar com Engenharia Química

É quinta-feira, estou sentada em uma mesa do lado esquerdo do restaurante. Um grupo de amigos está sentado atrás de mim. Parecem estar comemorando alguma coisa. Ou talvez só combinaram de se encontrar. Bem no centro, seis mulheres bebem drinks e dão risadas. Há um rapaz de cabeça baixa nessa mesma mesa. Ele parece estar triste, cansado. Logo ouvimos o grito dos garçons: “HELLBOY”. Esse é o sinal de que um prato está pronto. Uma música alta em referência ao filme toca. Todos reagem. O pedido então chega na mesa das mulheres. Não demorou muito para que o rapaz mudasse o humor. Talvez fosse fome.

Dirijo-me até o caixa, onde ficam alguns funcionários, e é aí que eu conheço a gerente do Funny, Laura Coelho, 32 anos, que está há sete meses à frente do cargo. Ela usa o cabelo liso, não é muito alta e tem algumas tatuagens. Quem a indicou para a vaga foi a amiga Laís, que trabalha anotando os pedidos dos clientes. Enquanto organiza alguns copos e monitora as saídas dos pedidos, ela me conta que, das experiências que já teve em outros empregos, o Funny é um paraíso. “A vibe é mais alegre, o pessoal é muito de boa”, diz.

Laura já morou em cinco estados diferentes além do Rio Grande do Sul: Rondônia, Mato Grosso, Mato Grosso do Sul, Paraná e Rio de Janeiro. “Sou rodada no Brasil”, brinca. A amiga ouve e reage: “Essa fala pode pegar mal, hein”. As duas dão risadas. Formada em Engenharia Química, Laura revela que tenta encontrar um emprego na área até hoje. “Está difícil”, expõe. A gerente, que já teve três bandas só de mulheres na adolescência, diz que não dava certo porque cada vez uma delas estava grávida. Mas relembra com carinho dos tempos vividos. “Era muito legal”, conta.

Trabalho duro e sonhos são duas coisas que se repetem em todas as histórias desta reportagem. Não seria diferente para Anthony Gustavo dos Santos Plaz, que com apenas 24 anos já trabalhou em cinco funções diferentes. O rapaz, assim como a maioria dos funcionários do restaurante, tem um estilo diferente. As tatuagens no rosto entregam um pouco da personalidade. Atualmente ele é cozinheiro do restaurante, depois que um conhecido o indicou para a vaga. O contato com o fogão surgiu através de uma experiência que teve em um café de Torres, mas também trabalhou por um tempo em uma pizzaria.

Aliás, se formos falar de todos os lugares que Anthony já passou, talvez faltariam páginas para o currículo extenso. Antes de trabalhar no Funny, ele vendia

CD e DVD na estação do trem de São Leopoldo. Em outro momento, chegou a trabalhar como servente de pedreiro em uma obra na parte da manhã, vendia os CDs das 16h às 20h no trem e aos finais de semana ainda fazia “bico” em uma barbearia. Foi até difícil conseguir anotar todos os detalhes. Mesmo trabalhando em todos esses lugares, tem uma coisa que bate mais forte no coração de Anthony: a música. O jovem teve contato com esse mundo ainda na escola onde estudava. Na Vila dos Tocos, bairro onde morava, conheceu pessoas e se interessou pelo rap. Foi aí que decidiu escrever algumas letras. Já fez show no Pepsi On Stage, Opinião e até mesmo no Planeta Atlântida, em 2020. Hoje em dia ele se dedica para a gravadora que pretende formar.

Anthony mora com a mãe e o padrasto em São Leopoldo. Conseguem pagar todas as contas e viver bem, mas nem sempre foi assim. Ele conta que já passou por muita dificuldade na vida, mas é grato à família por ter se tornado quem ele é hoje.

Nada deixa Anthony mais entusiasmado do que falar dos sonhos e os objetivos que busca realizar com a música. Apesar de ser um pouco tímido, foi quando entramos nesse assunto que ele se mostrou mais interessado. “Eu quero ser gigante, o maior”, diz, com toda a convicção. O desejo dele é que todo mundo saiba quem ele é. Que as pessoas entrem no carro e ouçam a música dele — foi o que me disse um pouco antes de ser chamado para voltar ao comando do fogão.

No Funny, encontrou uma

“coisa leve” mesmo trabalhando em um lugar estressante como a cozinha. “De todos os lugares que eu já trabalhei, é o que eu me sinto mais feliz. É um esquema de família. O Fabiano e a Fani se conectam com todo mundo. Tu sabe que vai ser tratado bem. O Fabiano é um grande amigo meu, me ajudou a evoluir mentalmente”, reconhece Anthony.

Por falar neles, é hora de conhecermos os dois personagens que estão por trás do Funny Feelings. Fabiano Chaves, 57 anos, e Elisabete Stefanie Thomaz, 56, apelidada carinhosamente de Fani, se conheceram em Caxias do Sul, cidade natal do casal. Os dois têm três filhos, dois netos e dois cachorros. Fabiano é fotógrafo há 18 anos e de vez em quando ainda faz algum evento pela região. Fani fez Serviço Social, mas não chegou a exercer a profissão.

O casal, conectado pelo talento e criatividade que os dois têm de sobra, conseguiu unir em um só lugar os sonhos que cada um almejava. Fabiano, de abrir um rock café, com um clima legal e descontraído. Fani, um espaço para servir os cupcakes que vinha produzindo em casa e vendendo pela região — aliás, foi daí que surgiu o carro-chefe do restaurante. Os bolinhos recheados começaram a ser feitos para a família. Fizeram tanto sucesso que ela se encorajou a vender em empresas. Logo já estavam distribuindo em São Leopoldo, Esteio, Sapucaia e Canoas. Sobrecarregada pela rotina de trabalho, encontrou um lugar para abrir a lojinha que tanto queria.

O primeiro espaço, localizado a algumas quadras do Funny atual, foi um sucesso quando inaugurado. As pessoas faziam fila e não se importavam de esperar, pois sabiam que a experiência valeria a pena. Não demorou muito para que o local ficasse pequeno para tantas ideias e pessoas que frequentavam. Logo se espalhou pela cidade a fama do novo restaurante em que “os atendentes gritam umas coisas”. A ideia de gritar o nome dos pratos surgiu porque um deles havia ficado de fora do cardápio. Para que não tivessem que produzir novos, Fabiano juntou a turma de funcionários e passaram a divulgar o prato dessa forma. Assim, toda vez que chamavam pelo nome, as pessoas olhavam com curiosidade.

Fabiano, com a sua barba grisalha comprida, fala com entusiasmo do empreendimento, mas é quando se refere à esposa que o olhar fica diferente e as palavras aparecem com facilidade. “A Fani é a verdadeira criadora disso tudo. Ela é uma confeiteira de mão cheia. É muito criativa. Uma gênia”, diz.

Para Fani, foi difícil acreditar que aquele espaço fosse ter tanto sucesso. “Eu achei que seria mais um café”, expõe. Ela atribui a habilidade na cozinha ao incentivo que sempre recebeu da família. “Os meus pais faziam um encontro com os filhos. Cada um tinha que cozinhar alguma coisa para a gente con- fraternizar. O meu pai era muito bom na cozinha, acho que vem dele essa aptidão”, explica.

Por trás de tanta originalidade, no meio de tantas ideias malucas, tem algo que faz com que as pessoas queiram voltar ao restaurante. Não apenas pelo jardim encantador que há nos fundos, ou pelo espaço aconchegante com inúmeras referências de séries que são consideradas favoritas, ou pela infinidade de pratos doces e salgados. O que faz o Funny ser tão singular são as pessoas que ali estão. E elas, assim como a maioria, enquanto trabalham, planejam aquilo que um dia ainda pretendem realizar. Os funcionários e os donos do restaurante representam o que o Funny tem de mais valioso: pessoas que não perdem a capacidade de sonhar. n n O espaço é todo decorado com objetos que fazem referência a séries, filmes e games

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